06 19 Março 2010

Em foco
Um fórum de
recrutamento de À procura de uma carreira
e do regresso a Angola
quadros para Angola
juntou no último
fim de semana, num
hotel de Lisboa,
mais de meio milhar
de candidatos.
Organizado pela EIC,
esta iniciativa é uma
resposta à carência
de quadros nacionais
e à pressão da
angolanização.

Texto de Manuela Sousa Guerreiro

Fotos de Bruno Barata

Sexta feira, 12 de Março, são 17

horas e o hall do Hotel Mariot, em
Lisboa, está cheio de jovens. Ali-
nhados, em fila, esperam pacien-
temente para fazer a sua credencia-
ção no Fórum Elite Angolan Careers,
uma acção de recrutamento de qua-
dros, organizado pela Elite Interna-
tional Careers (EIC), específica pa-
ra o mercado angolano. Este ano,
mais de sete mil interessados res-
ponderam às campanhas de promo-
ção e de divulgação organizadas pe-
la empresa de recrutamento inglesa
um pouco por toda a Europa. Des-
tes, foram pré-seleccionados cer-
ca de 500. À sua espera estão 150
executivos seniores, a represen-
tar mais de três dezenas das maio-
res empresas que actuam em Ango-
la. O encontro é uma oportunidade
única para jovens, e menos jovens,
angolanos, e não só, apresentarem
a sua experiência, a sua formação e
as suas qualificações e, assim, con-
seguirem conquistar um lugar nu-
ma das maiores empresas a operar
no país. À hipótese de um emprego,
de uma boa remuneração e de uma
promessa de carreira, aliciantes que
valem só por si, acresce um bilhete
de regresso a Angola, ainda que pa-
ra muitos destes jovens tal signifi-
que um retorno a um país que pou-
co conhecem e que não visitam há
largos anos. Vanda Domingues, an-
golana, desempregada, recém-li-
cenciada em Marketing por uma
universidade portuguesa faz par-
te do grupo seleccionado para estar
presente na acção de recrutamen-
to. Com três entrevistas previamen-
te agendadas, sabe que ali pode es-
tar o seu primeiro emprego e está
Quadros angolanos são procurados em Portugal
disposta a agarrar a oportunidade.
“A expectativa é muito grande, é
uma hipótese de conseguir um em-
prego e iniciar a minha carreira. Es-
tar aqui representa também uma hi-
pótese de regressar a Angola, o que
não significa propriamente um re-
gresso a casa, porque estou há mui-
tos anos a viver em Portugal e uma
pessoa habitua-se”, confessa. O
crescimento e o dinamismo empre-
sarial angolano contrastam, em lar-
ga medida, com as poucas oportu-
nidades que o mercado português,
e também o europeu, oferecem ac-
tualmente a quem terminou uma li-
cenciatura e tem ambição de cons-
truir uma carreira. Mais do que os
laços sentimentais, é este factor
que acaba por motivar muitos jo-
vens angolanos na diáspora a re-
gressarem mais cedo ao país. Neste
aspecto, Irene é, talvez, uma excep-
ção. Angolana, a viver em Portugal
há 18 anos, afirma que o regresso a
Angola sempre esteve nos seus pla-
nos. “Terminei a minha licenciatu-
ra em Economia há cerca de um ano
e meio. Estive um ano numa univer-
sidade dos EUA, para aperfeiçoar o
meu inglês e as minhas competên-
cias, e agora quero regressar a An-
gola. Sinto que é meu dever con-
tribuir para o desenvolvimento do
país”, explica. “Como nunca perdi
o contacto e conheço bem a reali-
dade local penso que não terei mui-
tos problemas em adaptar-me”, re-
mata. Mas à iniciativa da EIC não
responderam só jovens à procura
do primeiro emprego, muito embo-
ra estes sejam a maioria. Os cabelos
brancos de António Gomes denun-
ciam-no e destacam-no entre a mul-
tidão. Com carreira feita em Portu-
gal, “numa empresa de engenharia
de grandes sistemas eléctricos”, es-
te engenheiro de formação, actual-
mente a exercer funções de gestão
e chefia, quer continuar o seu per-
curso profissional no país onde nas-
ceu. “Tenho aqui uma hipótese de
regressar e de ingressar numa em-
presa com uma grande actividade
no ramo energético e, assim, iniciar
uma outra etapa do meu percurso
profissional. Conheço bem Angola
e vou lá com muita frequência mas
costumo dizer que quem muito jo-
vem saiu do seu ninho com facilida-
de se adapta aos grandes desafios e
aos ambientes mais inóspitos”, sus-
tenta.
Agarrar os melhores
À espera, para conhecer estes can-
didatos estão as empresas. Na sua
grande maioria multinacionais, em
expansão e crescimento no mer-
cado nacional. Este ano inscreve-
ram-se no fórum organizado pe-
la EIC 32 empresas, menos seis do
que na primeira edição do evento
que decorreu em Portugal, há pre-
cisamente um ano. Reflexo da cri-
se económica mundial e do abran-
damento que a economia angolana
registou em 2009. À semelhança
da primeira edição, petrolíferas,
bancos e construtoras estão maio-
ritariamente representadas, o que
não é de estranhar porque são es-
tes os sectores que maior dinamis-
mo e crescimento registam. Pese
embora o mau momento que o sec-
tor petrolífero viveu no ano transac-
to, Angola já é o maior produtor de
petróleo da África ao Sul do Saara e
dadas as perspectivas de estabilida-
de do mercado internacional, esta
indústria volta, lentamente, a reto-
mar os seus planos de investimento
temporariamente suspensos devido
à diminuição da procura e dos pre-
ços do petróleo. O que, na prática,
vai aumentar as suas necessidades
de recrutamento de quadros quali-
ficados. Um recurso que, ao contrá-
rio do petróleo, em Angola escas-
seia. “A angolanização é um tema
caro à Total EP Angola, não só devi-
do à nossa estratégia de internacio-
nalização e especificação de qua-
dros, como também à necessidade
de desenvolver a nossa actividade
neste país”, reconhece Jorge Abreu,
director geral adjunto da petrolífera
em Angola. Nos últimos quatro anos

a Total recrutou mais de 400 técni-
cos e quadros superiores angola-
nos. “O processo de recrutamento
é contínuo e envolve uma grande
preocupação com a qualidade dos
recursos, com a sua integração na
empresa e na indústria petrolífe-
ra, e com a definição de um plano
de formação técnica e de desenvol-
vimento pessoal que é contínuo”,
explica o responsável. Este investi-
mento estratégico está directamen-
te ligado ao plano de expansão da
actividade da Total em Angola. Nos
próximos cinco anos a empresa es-
pera duplicar a sua produção de pe-
tróleo bruto, que hoje ronda os 540
mil barris/dia, e estender a sua ac-
tividade a outros segmentos, como
sejam a refinação e a área da ener-
gia renovável. Projectos “que nos
dão visibilidade e que representam
uma aposta clara numa presença a
longo prazo neste país”, sublinha
Jorge Abreu. A par da Total, tam-
bém empresas como a Chevron, a
Sonamet, a Technip, o projecto An-
gola LNG, a Oceaneering, a Halli-
burton ou a Sacoil não faltaram ao
fórum. Para além do sector ener-
gético, também o desenvolvimento
da área financeira tem contribuído,
de ano para ano, para o aumento do
emprego qualificado em Angola.
2010 não será, a esse nível, uma ex-
cepção e a participação neste fórum
de grupos como o MillenniumAn-
gola, o Banco de Desenvolvimento
Africano ou o Standard Bank, con-
firmam-no. Enquanto o primeiro
está numa fase de forte expansão
neste país, os dois últimos prepa-
ram o arranque, em força, da sua
actividade em Angola. Oficialmen-
te, o escritório do BAD, em Luanda,
ainda não foi inaugurado mas a es-
trutura já existe e será através de-
la que a principal instituição finan-
ceira multilateral africana pretende
dinamizar o seu apoio à reconstru-
ção do país. Já o Standard Bank, o
maior banco africano, recebeu, em
Dezembro de 2009, luz verde do
Banco Nacional de Angola para ini-
ciar a sua actividade como banco
universal. O processo de constitui-
ção daquela que será 20ª institui-
ção financeira em Angola ainda não
está concluído, mas o banco pre-
tende inaugurar os seus primeiros
três balcões (dois em Luanda e um
no Lobito) no segundo semestre de
2010, num investimento que ron-
dará os 50 milhões de USD. Não é,
pois, de estranhar que o stand mon-
tado pelo Standard Bank na área de
exposição do fórum Elite Angolans
Careers tenha sido um dos mais visi-
tados pelos candidatos. Neste espa-
ço concentraram-se uma boa par-
te das empresas que participam no
fórum, por se tratar duma oportu-
nidade extra para apresentarem a
sua actividade e se darem a conhe-
cer. Para os candidatos foi a últi-
ma oportunidade para conseguirem
marcar uma entrevista que lhes po-
de mudar o rumo e a vida.
Seis meses de preparação prévia
O trabalho de preparação
de cada fórum de recrutamento
é longo e intenso. Seis meses an-
tes de cada evento a EIC identi-
fica comunidades angolanas um
pouco por todo o mundo e realiza
Miguel Vieira, director Geral da Elite International Careers para África
Uma plataforma com vantagens
para empresas e candidatos
Com sede no Reino Unido, a EIC providencia soluções criativas
de consultoria de recrutamento e de recursos humanos. Uma
actividade que está em expansão no mercado angolano.
Os números desta segunda edição
do fórum Elite Angolan Careers
em Lisboa surpreenderam pela
positiva?
Este ano tivemos um maior núme-
ro de stands de empresas na nossa
área de exposição, mas tivemos um
menor número de empresas inscri-
tas, o que é um reflexo da crise eco-
nómica mundial e do abrandamen-
to da economia angolana. Contudo,
o evento não deixa de ter o mesmo
impacto nem de gerar o mesmo en-
tusiasmo, quer nas comunidades de
angolanos espalhada pela Europa,
incluindo a Rússia – onde pela pri-
meira vez nos deslocámos – quer no
próprio meio empresarial. Temos
um conjunto alargado de empresas
que participam pela primeira vez e
que são entidades de renome inter-
nacional como a consultora Accen-
ture, o grupo Standard Bank ou o
próprio Banco Africano de Desen-
volvimento, que vai usar as nossas
plataformas de recrutamento não
só em Lisboa como em Luanda e
em Joanesburgo para seleccionar
quadros para o seu escritório em
Luanda.
Que novidades introduziu a EIC
nesta edição?
Organizamos uma conferência
sobre recursos humanos, na qual
participaram os responsáveis das
áreas de recursos humanos das 32
empresas inscritas, e para a qual
trouxemos de Angola o professor
associado e investigador da Fa-
culdade de Direito da Universida-
de Agostinho Neto, José Octávio
Serra Van-Dúnem. Dinamizámos e
aumentámos a área de exposição,
o que permite às empresas contac-
tarem com um maior número de
candidatos e, assim, aumentarem
as hipóteses de recrutar mais e me-
lhores candidatos.
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O stand montado pelo Standard Bank, que inaugura
três balcões em Angola no segundo semestre deste
ano, foi dos mais visitados
campanhas de divulgação e de in- à triagem dos curriculum vitae Por fim, seis semanas antes do
formação sobre as oportunidades (CV) de todos os candidatos ins- fórum a equipa recebe o feedba-
existentes, deslocando-se aos critos e envia os CV que melhor ck das empresas participantes,
países onde estas comunidades se adequam às necessidades de procedendo ao convite dos can-
se encontram. Três meses an- cada empresa, de acordo com os didatos seleccionados para as
tes do evento a equipa dá início perfis indicados pelas mesmas. entrevistas.
De edição para edição, este mo- vimento de
delo de recrutamento afirma-se C a r re i r a ,
como uma ferramenta útil? da Elite
Sem dúvida, o que inclusive justi- Angolan
fica a nossa expansão para outros Careers,
mercados. Por ano, a EIC organiza está mar-
sete eventos internacionais. Três cado para
dirigidos ao mercado angolano, os dias
em Lisboa, Luanda e Joanesburgo; 17 a 19
dois para a Arábia Saudita, que têm de Junho,
lugar em Londres e no Bahrein. Te- em Luan-
mos um outro para a Nigéria, que da, e em
se realiza em Lagos, e outro para a Novembro
América Latina, que terá lugar em realizar-se-á
Barcelona. Para as empresas que o fórum de
participam é um excelente inves- recrutamento
timento porque conseguem recru- na cidade de
tar de uma só vez 15 ou 20 bons Joanesburgo,
quadros, com um custo reduzido, África do Sul.
comparado com outros modelos
de recrutamento. Para além disso,
aumentam a sua base de informa-
ção sobre possíveis candidatos que
podem usar mais tarde. E é preci-
so não esquecer que estes fóruns
constituem ainda uma excelente
plataforma de marketing e de bran-
ding para estas empresas.
E quais as vantagens para os can-
didatos?
O facto de, num único espaço, te-
rem hipóteses de contactar direc-
tamente com um grande número
de responsáveis pelas áreas de
recursos humanos de grandes
empresas, que de outra forma não
teriam. Uma percentagem de can-
didatos sai daqui já com pelo me-
nos uma oferta de emprego, mas
muitos deles irão ser chamados
ao longo dos próximos três me-
ses. As empresas sabem que têm
que ser rápidas porque a procura
de bons quadros é grande.
Os próximos fóruns de recruta-
mento para Angola já têm data
marcada?
A segunda edição do Fórum de
Formação Contínua e Desenvol-