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Capitulo 17 A Independéncia em Resumo Os impérios Politicos que, em finais do século xx ¢ nO inicio do século xx, foram Proclamados, em Affica, de forma tio orgulhosa e con- fiante, como prolongamentos inevitaveis ¢ Permanentes da Civilizacdo curopeia, duraram apenas trés escassas Seragdes. Nos anos 60, 0 sistema any Historia Da Arnica Astransformagdes verificadas naatitude das poténcias coloniais emrela- g30 a Africa do século xx estiveram amitide interligadas e influenciaram-se mutuamente, numa variedade de combinagdes por vezes desconcertante, determinadas por circunstancias histéricas especificas na Europa ¢ em Africa. No entanto, para efeitos de analise, podem distinguir-se trés vias de evolugdo, Primeiro, como ja foi referido, as duas guerras mundiais de 1914-18 e 1939-45 ¢ a depressdo econémica entre elas serviram sobretudo para abalar a confianga da Europa ocidental na sua missao civilizadora, e em seguida para provocar um declinio consideravel na sua capacidade real de manter o dominio imperial. Isto levou, em segundo lugar, a uma rapi- dez cada vez maior em reconhecer que o sistema colonial continha a sua propria destruic&io, dado que civilizar era um dos seus objectivos expressos e sem divida a sua justificagdo moral. Quer o3 europeus apreciassem ou nao esses resultados, ¢ embora tenham tentado firmemente controla-los no seu préprio interesse, nfo puderam evitar 0 facto de 0 controlo colonial ser educativo. O estabelecimento de qualquer colénia implicou a criagao de um certo sistema formal de escolarizagdo para as suas populagées, ainda que para os tomar servidores mais eficientes ¢ instrumentos de extracgde de riqueza. Mas, além disso, quase toda a aceao dos governantes coloniais em Africa — criag’o de novos sistemas de contrlo politico, propagagio do cristianismo, desenvolvimento de novos meios de transporte, introdugado de novas formas de agricultura ou de exploragao mineira, aproveitamento de fontes de energia, instalacdo de novas industrias ¢ tecnologias, expansio da economia monetaria ¢ de mercado e, talvez mais importante, a procura de méo-de-obra assalariada para estas ¢ muitas outras actividades — foi em sentido geral profundamente educativa. Portanto, os africanos aprende- ram inevitavelmente a querer realizar tudo isso em beneficio proprio, ¢ em certa medida também aprenderam a fazé-lo, quer adaptando as suas orga- nizagdes tradicionais, quer as formas de organizagao europeia. Deste modo, por um lado, os nacionalismos africanos foram encoraja- dos ¢, por outro, os europeus dificilmente conseguiram continuar a recusar- -lhes a satisfa¢do das suas pretensbes. Na realidade, na década de 50 os europeus comecavam a compreender que nao havia vantagem em igno- far as pretensdes dos africanos 4 independéncia politica — este foi o ter- ceiro factor de transformagao. O segundo objectivo principal do império, o aproveitamento dos mercados ¢ dos recursos coloniais em beneficio de uma economia industrial instituida e gerida pelos europeus ocidentais ¢ pelos seus aliados, foi igualmente atingido. Uma vez que se pensava que 478 A INDEPENDENCIA EM RESUMO esse aproveitamento econdmico era inevitdvel ¢ irreversivel, ele ndo seria anulado com a eliminago do dominio politico por parte da Europa. Além disso, ver-se-ia em breve que qualquer tentativa de manter esse dominio pela forga poderia realmente vir a diminuir as Vantagens econémicas resul- tantes do que fora anteriormente realizado, perante as press6es politicas locais ¢ num clima cada vez mais hostil a perpetuacdo do dominio colonial. Assim, comegava a esbater-se a necessidade de conservar o império, na mesma proporgdo da vontade anterior de manté-lo, A descolonizagao iniciou-se a norte do Sara, em especial no Nordeste Africa, em circunstancias que tiveram pouca importincia para 0 resto do continente, Em primeira lugar, com a tnica excepeo das terras planalti- cas etiopes (que de qualquer forma possuiam uma historia bastante par- ticular), esta parte do continente integrara-se durante séculos no mundo muculmano. Participou, portanto, no movimento reformador islamico que come¢ou a ganhar impulso no decurso do século xix, produzindo no $6 ‘oportunistas politicos, come Muhammad Ali, que sentiam necessidade de se por a par da Europa ocidental, mas ainda pensadores filasdficos e poli- ticos que procuraram desenvalver o proprio Islao, a fim de demonstrarem que os europeus nao tinham necessariamente de monopolizar as jiniciati- vas de modernizacao, Os ensinamentos desses homens foram altamente facilitados pela destruig&o do Império Otomano durante a Primeira Guerra Mundial, o qual servira muitas vezes como baluarte que preservava o Is]ao ‘tradicional de grandes transformacées. O Império Otomano era jé letra morta em Aftica. Na pratica, 0 seu des- membramento nao trouxe outras consequéncias politicas além da declaracio da Inglaterra, em 1922, de que o Egipto era um Estado soberano com o qual Se propunha negociar um acordo para ass¢gurar os seus Proprios interesses a respcito de questdes como o Canal do Suez. Ocorreram, contudo, impor- ‘antes mudangas nos paises islimicos da vizinha Asia, 0 que no péde deixar de exercer a sua influéncia sobre og povos muculmanos do Notte de Africa, A Turquia passou a ter um govemo reformador presidido por Kemal Ata- turk. Noutras regides, os arabes alcangavam a independéncia, como no caso da maior parte da Arabia, com Ibn Saud, ou a promessa de independéncia nacional sob mandatos ingleses ou franceses que pretendiam ser de curta durarao. De facto, o Iraque tomou-se um reino independente em 1932, ¢ as mandatos dos outros territérios nio passaram da Segunda Guerra Mundial, Por essa altura, a colonizacao hebraica na Palestina constituiu também um forte estimulo para 0 nacionalismo Arabe militante. 479 Histoa pa Arnica Em geral, o reformismo islamico ¢ as mudangas politicas reais ou pro- metidas nos paises arabes vizinhos do Préximo. Oriente, em particular, deram origem a uma nogdo de frustragdio entre a geragfio jovem do Norte de Africa. Por um lado, o dominio colonial proporcionou-Ihes um novo acesso — embora restrito — ao pensamento politico ¢ tecnolégico moderno. Por outro, ndo hes ofereceu reais oportunidades de pér em pratica as suas novas ideias a nao ser como participantes secundarios nos mecanismos do dominio colonial. O resultado foi o aparecimento de movimentos macio- nalistas que procuraram subverter esse dominio. Se todos os outros meios falhassem, devia ser utilizada a forca, e nesse caso os nacionalistas arabes em Africa esperavam receber auxilio material, assim como inspiragao, da parte dos arabes do Proximo Oriente. No entanto, até 4 Segunda Guerra Mundial, tanto a Franca como a Itilia sentiram-se suficientemente segu- ras no Norte de Africa para no ter de ceder terreno, ¢ nas suas colénias o nacionalismo ndo teve outra alternativa sendo tornar-se clandestino ou refugiar-se no dominio do intelectualismo. Contudo, em 1922, no Egipto, a Inglaterra declarou unilateralmente a sua intencdo de persistir na promessa feita no momento da ocupacao do pais quarenta anos antes. Exprimira 0 seu desejo de cooperar com um regime local egipcio que estivesse de acordo com as suas exigencias espe- cificas em relago 4s comunicagdes com a india. Seguiram-se, portanto, muitos anos de debate politico mais ou menos aberto, que enyolveu os trés principais protagonistas. O primeiro foi o partido nacionalista, o Wafd, que venceria quaisquer eleigdes livres. Todavia, qualquer governo Wafd tinha tendéncia para entrar em conflito com um dos outros protagonistas ou com ambos. Estes cram os descendentes de Muhammad Ali que ocupavam o trono, primeiro o rei Fuad (até 1936) ¢ depois o rei Faruque, e 03 Ingle- ses. Ambas as partes possuiam interesses que sentiam ser ameagados pelos nacionalistas, e nenhuma delas estava disposta a abdicar dos seus poderes tradicionais. Os governos Wafd eram portanto frequentemente demitidos ¢ substituidos por governos de «moderados», isto é, de representantes da classe detentora da riqueza. Mas estes nao podiam depender do apoio do rei, assim como nfo podiam esperar apoio do povo, e deram, por sua vez, lugar a um periodo de governo palaciano. Esse facto forgou os moderados a aliarem-se com o Wafd para obterem eleigdes livres, e o ciclo repetiu-se novamente. Por fim, o Wafd ¢ os Ingleses compreenderam que nenhum conseguia destruir a base do poder do outro e que fariam melhor em che- gar a um compromisso. O resultado foi o tratado de alianga anglo-egipcio 480 A INDEPENDENCIA EM RESUMO de 1936. A ocupacao militar do Egipto pelos Ingleses deveria terminar, embora estes pudessem manter uma forga militar limitada a uma zona estreita ao longo do Canal do Suez, por um periodo de vinte anos. Entretanto, a Segunda Guerra Mundial comegou trés anos depois. O Norte ¢ o Nordeste de Africa tomaram-se importantes teatros de opera- GOs, € a sua histéria divergiu ainda mais da restante histéria do continente devido a esse facto. A consequéncia mais imediata da guerra foi a Ingla- terra sentir necessidade de defender a todo o custo o Egipto ¢ o seu canal contra o Eixo italo-alemao e quaisquer possiveis aliados seus no Médio Oriente. Em vez de as tropas inglesas retirarem para a zona do Canal, foram reforcadas para se oporem a ameaca directa de importantes foreas italianas que flanqueavam o vale do Nilo eo mar Vermelho na Libia e na Etidpia. Os soldados ingleses, indianos ¢ afticanos tiveram pouca dificul- dade, de modo algo surpreendente, em derrotar os Italianos na Etidpia ¢ na Somélia. Mas os primeiros éxitos ingleses na Libia levaram ao reforgo dos Italianos, através de um corpo de elite alemio, do que resultou a invasio do Egipto por um exército do Eixo em 1942, que chegou a 100 km de Ale- xandria e a uma distancia pouco maior do canal do Suez. Alguns Egipcios Pensaram que a sua libertacdo em relacdo aos Ingleses estava préxima. Mas 0 acordo da Inglaterra com o Wafd manteve-se firme, e foi utilizada a ameaga da forga para impor ao rei Faruque um governo Wafd, Ainda em 1942, a Inglaterra ¢ os seus aliados, que incluiam jd os Esta- dos Unidos, conseguiram Preparar uma importante ofensiva no Norte de Africa. © exército italo-alemao foi derrotado definitivamente em El-Ala- mein e logo a seguir repelido para oeste ao longo do litoral da Libia em direceao a Tunisia. Visto que a Franga se encontraya entdo ‘ocupada pelos Alemies, foi desembarcado em Marrocos ¢ na Argélia um exército anglo- -americano com 0 objective de avancar para oeste em direceo a Tuni- sia, a fim de desferir o golpe final. A estes desembarques opuseram-se ini- cialmente os oficiais fiéis ao governo francés de Vichy. Uma vez que a Inglaterra ¢ os Estados Unidos tinham declarado recentemente, na Carta Atlantica de 1941, que nao procuravam qualquer expansao «territorial ou de outro tipo» ¢ que respeitavam «o direito de todos 08 povos escolherem a forma de governo que mais lhes agradasse», essa reacedo francesa veio a dar razo aos nacionalistas do Magrebe ¢ ao seu ponto de vista de que 4 Franga estava decidida a conservar 0 seu império no Norte de Africa a qualquer preco. Houve mesmo ‘um curto periodo, no inicio de 1943, em que os Alemdes tiveram esperanga de que o partido nacionalista tunisino, 48] ‘A SENEGAL (1080) 1B cAvex (r008) © Guiné-mssay jaar) © GUINE EQUATORIAL (ro6a) E SURCUINA FASO (1590) Mauhicis vse) TO) inepercsente am 1055: ‘Paloes onde heuves mudanga no nen Indapenddelnconseaica 958-1859 ee es Indepercincs corsequds om 1969-1984 Surmuina Foo ‘anigo ane Watts Indeparténcia consoguits en 1985-1060 opatics Demosuca , | ‘ndependincia sonbeguida em 1970-1979 de Conga ‘Antigo Zaire FE lrcaperaitness conseguits 8 pate de 040 Feptttea Arabe numa om dacvesio. ‘SaraulDemocriicn antigo Sera Ocidental =) Mapa 12 —O percurso para a independéncia, Historia DA ArRica autoridade africana que lhes parecesse mais apropriada. Na Libia, o candi- dato evidente foi o chefe dos Sanusiyya, uma fariga da Cirenaica, fundada em 1843, que conseguira resistir firmemente aos Otomanos, primeiro, ¢ depois 4 ocupagio italiana e que fornecera um pequeno contingente de voluntarios para lutar ao lado dos Ingleses em 1940-43. Em 1950, Idris el-Sanusi foi cleito rei de uma unio federal da Cirenaica ¢ da Tripolitania, €no ano seguinte a Libia tomou-se um reino independente. No que respeita a Eritreia, foi dificil resistir 4 pretensao da Etiépia que afirmava ser esta uma das primeiras regides perdidas pelo seu império, ¢ que deveria por- tanto ser-[he restituida. Assim, em 1952, tornou-se uma provincia federada da Etiépia. Quanto aos Somalis, tinkham sido sibditos tribais turbulentos quer da Italia quer da Inglaterra. Inicialmente, houve relutancia em aceitar a argumentagdo dos jovens nacionalistas somalis, animados pela derrota italiana ¢ a unificag3o temporaria da maior parte das suas populacGes sob a administragio inglesa, de que ja era tempo de criar uma Somalia unificada que pudesse tornar-se rapidamente independente. Em vez disso, foi con- cedida & Italia, pelas Nages Unidas, uma comissao de dez anos.a fim de preparar a sua antiga colonia para a independéncia, enquanto a Inglaterra sé comprometia a respeitar um programa semelhante no seu protectorado. Esses objectives foram atingidos em 1960 e ambos os territérios foram reunidos na Republica Independente da Somalia. Entretanto, o fim da guerra trouxe como efeito a possibilidade de regu- larizagao das relagdes anglo-egipcias e a preparagaio de um novo acordo que substituiria o tratado que expirava em 1956. Contudo, a politica egip- cia encontrava-se numa situagdo altamente instavel. O rei Faruque estava decidido a recompor-se da humilhacdo sofrida em 1942, enquanto o Wafd se prejudicou aos olhos dos nacionalistas mais jovens pela sua colabora- ¢do com os Ingleses no tempo da guerra. Cada parte procurava manter a sua influéncia por meios pouco escrupulosos. Os assuntos internos foram negligenciados a favor da formagdo da Liga Arabe e da defesa dos arabes da Palestina contra as pretensdes de os imigrantes judeus se instalarem em Israel. As negociacées com a Inglaterra foram interrompidas mais de uma vez, principalmente devido ao facto de os Egipcios insistirem que o Sudao era territério egipcio, enquanto os Ingleses argumentavam que © futuro estatuto do pais era um problema para os Sudaneses decidirem. Em 1948-49, a incompeténcia ¢ a corrupcio palaciana e de politicos orto- doxos foram evidenciadas pela derrota esmagadora infligida ao exército egipcic na primeira guerra israelo-arabe. O controlo parecia escapar para 484 A INDEPENDENCIA em RiesuMo as mos da plebe urbana influenciada por radicais mugulmanos ou socia- listas. Contudo, as circunstdncias do fiasco em Israel desgostaram a tal Ponto um grupo de jovens oficiais do exército, cujo dirigente era o coronel Gamall Abdul Nasser, que decidiram que 0 Egipto necessitava de recome- gar tudo de novo, muito préximo da orientagfio de Arabi Paxd setenta anos antes. Em 1952, levaram a cabo um golpe de estado que forcou a abdica- gio de Faruque ¢ 0 seu exilio; no ano seguinte, foi declarada a Reptiblica, tomando-se Nasser, logo a seguir, seu presidente. A acco imediata mais importante de Nasser e dos seus colegas, ¢ que lhes garantiu um apoio devotado por parte do povo, foi uma reforma agraria que eliminou os pro- prietérios que até entio tinham dominado a vida politica e econdmica do pais. Relativamente as telagdes externas, compreenderam, de forma rea- lista, que era mais importante libertar o Egipto dos tltimos vestigios da ocupacdo militar estrangeira do que insistir em manter as suas ambicdes imperialistas tradicionais no Sudo. Em pouco tempo, foram concluidos acordos com a Inglaterra que conduziram ao fim do tratado de 1936, asse- guraram a retirade das viltimas tropas inglesas da zona do Canal, em 1955, ¢ instituiram em 1953 um periodo de transigdo de trés anos Para concessiio de autonomia para o Sudio, no fim do qual as suas populacées teriam de decidir o seu futuro. Na tealidade, 1956, o Sudao recusou a manuten- $40 da ligacao com o Egipto e optou pela independéncia completa, Poucos anos depois do fim da Segunda Guerra Mundial, todo o Nor- deste africano, desde a Libia até 4 Somilia, alcangara a independéncia do dominio estrangeiro. Isso ndo significava certamente que os seus proble- mas tivessem terminado. O Egipto iria sofrer novas gueiras desastrosas com Israel ¢ em 1956, a coberto da primeira delas, veria mesmo as tropas inglesas e francesas reocuparem a zona do canal por um breve periodo, como reacedo ostensiva contra a nacionalizagao da Companhia do Canal do Suez; e todos os outros paises nao tardariam a sofrer tmudangas radicais nas suas fortnas de governo. Contudo, a destruigdo do império italiano, ¢ a anterior concordancia dos Ingleses com a independéncia do Egipto, do Sudo e da Somalilandia, revelaram que o plano de constituigdo de gover- nos indigenas livres do dominio europeu existia hd mais tempo e de modo. mais claro entre as populagdes do Nordeste africano do que entre as do Magrebe. Aqui, os efeitos imediatos do fim das campanhas da Segunda Guerra Mundial no Norte de Africa foram totalmente diferentes. Os danos reais que o desembarque anglo-americano ¢ a curta ocupa¢ao italo-alema da Tunisia acarretaram A autoridade francesa fizeram nascer esperancas 485 Historia pa Arnica que foram rapidamente goradas. Foi restabelecido 0 dominio francés no exacto momento em que os africanos do Norte viam outros territérios dra- bes, especialmente os do Médio Oriente, conseguir obter a liberdade total em relagdo 4 tutela colonial. As reclamacées dos nacionalistas argelinos, tunisinos ¢ marroquinos de que a assembleia constituinte da IV Republica Francesa Ihes devia conceder pelo menos uma autonomia local foram sim- plesmente ignoradas. O maximo que a Argélia obteve em 1947 foi um novo estatuto constitucional que alargou a cidadania francesa a todos os mugulmanos, mas que defendeu os interesses da Franca e dos seus colonos concedendo apenas aos 7 500 000 de Argelinos tantos representantes no parlamento francés como aos colonos, que eram cerca de 1 000 000. Na Tunisia ¢ em Marrocos, os Franceses puderam refugiar-se atras do mito de que estes paises cram administrados pelos governos do bei e do sultio, respectivamente, Dai resultou na Tunisia o recurso imediato dos naciona- listas do Neo-Destour 4 constestacdo violenta. Por outro lado, em Marro- cos, a maior parte do pais era controlada pelos Franceses, através das suas aliangas com os chefes berberes locais, tradicionalmente hostis 4 soberania do sultéo. Deste modo, 0 préprio sultio tornou-se o foco das incitagdes nacionalistas. Os Franceses tentaram contrariar esta situag3o em 1953 ini- citando os chefes a revoltarem-se contra 0 sultdo, que foi depois exilado. Contudo, essa acedo transformou-o num heréi nacional, mais do que era anteriormente, e em breve teve inicio uma oposi¢do armada contra o domi- nio francés nos bairros operdrios das principais cidades. Em 1954 os nacionalistas encontravam-se em franca revolta por todo © Magrebe. Os Franceses compreenderam rapidamente que o perigo maior estava na Argélia, Aqui era, com efeito, onde eles mais teriam a perder, onde existiam investimentos Tealmente consideraveis, e onde a sobrevi- véncia, ¢ mesmo as vidas de cerca de um milhdo de curopeus pareciam depender da manuten¢o do dominio francés. Ao invés, era na Argélia que as comunidades locais mais tinham sofrido com a presenca dos Fran- ceses. A modernizacdo da economia devido 4 colonizacdo assim como 20 capital francés implicava que os estrangeiros detinkam a maior parte das boas terras ¢ das posigdes mais compensadores. Os naturais argelinos estavam a ser convertidos num proletariado deprimido e frustrado. Muitos pensavam que a melhor forma de utilizar o seu novo estatuto de cidaddos franceses era procurar emprego em Franea; dentro em pouco havia tantos Argelinos nas profissdes humildes em Franca como Franceses que ocupa- vam os cargos mais altos na Argélia. Contudo, a situagdo na Argélia era 486 A INberenpENcia EM RESuMO tal que em 1954, quando um dos grupos nacionalistas decidiu que nao havia outra solugdo sendo erguer o estandarte da revolta armada contra os Franceses, se tormou logo evidente que nao sé a revolta podia contar com © apoio dos nacionalistas 4rabes em todo o mundo iskimico, mas que também nao haveria um tnico Argelino a Opor-se-lhe. Em dezoito meses constituiu-se a Frente de Libertagao Nacional (FLN), que conduziu a luta em toda a zona rural com tal éxito que os Franceses tiveram dificuldade em manter a sua posi¢io. A crise na Argélia levou os Franceses a reavaliar a situac4o na Tunisia © em Marrocos com o objectivo de analisar se os seus interesses nesses dois protectorados nao seriam mais bem defendidos acedendo as preten- sdes dos nacionalistas 4 autonomia. Em 1954, este principio foi acordado com a Tunisia, ¢ no prazo de um ano estava no poder um governo do Neo- -Destour. Em Marrocos, ocorreram transformacdes ainda mais radicais. Em 1955, havia uma revolta aberta nas cidades ¢ tinham comecado as insurreigdes armadas no campo, onde mesmo os chefes berberes se decla- Tavam entao ao lado do sultio exilado. No final desse ano, este regres- sou e no inicio de 1956 a Franca concordou que Marrocos fosse de novo uma monarquia independente. Essa atitude teve TepercussGes imediatas na Tunisia ¢ no pequeno protectorado da Espanha em Marrocos. A accao dos Franceses contra o sultio em 1953 fora unilateral; 0 governo espanhol continuou a considerar-se como'o Jegitimo soberano dessa zona. Portanto, quando a Franca modificou a sua politica e reconheceu a independéncia do sultéo, a Espanha nao teve outra altemnativa sendo seguir os mesmos pas- 50s e acabar com 0 seu protectorado. A independéncia de Marrocos con- duziu naturalmente a exigéncia por parte da Tunisia da sua independéncia total. Contudo, ali a monarquia nunca fiincionara como foco das aspiragdes nacionalistas; deste modo, em 1957 foi proclamada uma reptiblica ¢ Habib Bourguiba, dirigente do Neo-Destour ao longo de todas as vicissitudes desde a sua fundagao em 1934, tomou-se 0 seu presidente. Entretanto, na Argélia, os Franceses estavam empenhados numa guerra total que recordava a conquista inicial, Nao lhes era muito dificil policiar as grandes cidades, onde grande parte da Populacao era francesa, mas os seus esforgos para dominar o meio rural conduziram na pritica ao emprego de um exército de 500 000 homens ¢ ao uso de métodos de Tepressao ainda mais drasticos. Contudo, em 1958, os comandantes desse exército e os colonas estavam confiantes de que a Argélia podia continuar sob dominio francés. No entanto, na propria Franca, os Franceses cram cada vez mais criticos 487 Historia pa AFRICA acerca dos custos da guerra em homens e dinheiro, € ainda acerca dos méto- dos utilizados paraa levar a cabo, a ponto de os oficiais do exército € os colo- nos comegarem a duvidar se os governos da IV Republica pretendiam sus- tentar essa guerra. Deram, portanto, inicio 4 sua propria revolta. Isto trouxe novamente De Gaulle ao poder em Franga, onde ele instituiu em pouco tempo a V Republica, que elimmou as dividas ¢ as fraquezas parlamenta- res que tinham atingido a sua antecessora. De Gaulle era considerado um homem forte, fora o inice a lutar pela integridade da Franca Jogo a seguir a sua derrota pela Alemanha. E ele era-o, com efeito, mas era igualmente um realista pragmatico que em 1940 compreendera rapidamente a necessidade de ganhar para a sua causa as colénias francesas. Em menos de um ano, De Gaulle concluira que a economia e a sociedade francesas dificilmente conseguitiam sobreviver a0 esforgo de manter a sua presenca tradicional na Argélia. Os seus interesses mais legitimos exigiam que aos Argelinos fosse permitido decidir o seu préprio futuro. A consequéncia imediata disso foi um novo levantamento de colonos, no inicio de 1960, que recebeu. fraco apoio por parte do exéreito, cujas fileiras cram compostas essencialmente por recrutas, e De Gaulle nao se deixou intimidar quando alguns colonos come- garam posteriarmente a langar mao do terrorismo. Em 1961, comegaram as negociagdes entre as autoridades francesas e 0 governo provisério instituido pelos nacionalistas argelinos em 1958. Finalmente, em 1962, chegou-se a um acordo, de que o futuro da Argélia deveria ser determinado por um refe- rendo. O resultado deste era uma concluso previsivel, e nove em cada dez eolonos abandonaram a Argélia. Os custos da guerra para 0s Argelinos foram elevados, Cerca de um tergo de milhao de Argelinos perdera a vida, ¢ muitos mais tinham sido obrigados a deixar as suas casas, muitas das quais foram destruidas durante os combates. No entanto, eles tinham finalmente a opor- tunidade de reconstruir o pais 4 sua maneira. A Africa a sul do Sara nao foi directamente envolvida nas campanhas da Segunda Guerra Mundial. No entanto, os efeitos dessa guerra, como ja foi indicado, iriam agravar as tensGes tanto no desenvolvimento econé- mico como educacional, o que iria em breve conduzir 4 necessidade de modificagées politicas. Isto tornou-se mais evidente ¢ urgente na Africa ocidental. Como se viu, ja na altura da chegada dos primeiros comerciantes a0 litoral, as téc- nicas de organizagao econémica ¢ politica tinham por vezes atingido um alto nivel e cerea de cinco séculos de comércio europeu continuo tinham implicado novas ¢ importantes transformagdes econémicas, assim como 0 483 A INperenpéncia EM RESUMO inicio de uma educaedo a curopeia muito antes de terem sido constituidas colénias pelos curopeus. Desta forma, os que viriam a assumir 0 poder na Africa ocidental tiveram menor necessidade de acentuara «modernizagion dos seus suibditos do que noutras regides a sul do Sara, Com efeito, foi ape- nas de um modo gradual que os africanos do litoral compreenderam que Se esperava que eles fossem servidores € nao parceiros dos europeus, na nova situagao de mudanga e desenvolvimento. A medida que isso aconte- ceu, foram igualmente compreendendo que tinham ja ao scu alcance uma tesposta que s¢ impunha ao dominio politico europeu. Consistia na orga- niza¢ao de uma reac¢Zo nacionalista que encontrou inspiracdo directa nas realizagdes dos africanos ocidentais ao longo da histéria, ¢ que se orga- nizou segundo os moldes curopeus em clubes, associagSes profissionais, c4maras de comércio finalmente sindicatos e partidos politicos. Neste aspecto, podiam competir com os europeus no seu préprio terreno com a finalidade de conseguirem apoderar-se das novas estruturas de poder e de modermizacfio que estas estavam a erigir. Os africanos ocidentais no eram os tnicos nesta situasdo. Comecou a desenvolver-se na periferia dos Ppovoamentos europeus uma situacSo bas- tante idéntica logo que se radicou na Africa do Sul. A forma como as con- feréncias que conduziram a formag4o da Unido da Africa do Sul em 1910 ignoraram por completo as questdes referentes 4 maioria ndo-europeia pro- vocou em pouco tempo 0 aparecimento do Congresso Nacional dos Nati- vos da Africa do Sul (mais tarde designado Congresso Nacional Africano), no qual se reuniram para defender a sua causa intelectuais, professores, ministros das igrejas, advogados, jornalistas ¢ outros africanos. Contudo, na Africa do Sul, este movimento do despertar politico africano encontrou- -se pouco tempo depois numa situagao dificil. Os lideres do ANC, desde 9 reverendo John Dube ¢ Solomon Plaatje nos primeiros anos até ao chefe Albert Luthuli ¢ ao professor Z.K. Matthews na 6poca da sua interdi¢ao final em 1960, eram fundamentalmente homens moderados, Supunham. que © debate racional e publico podia servir para fazer recuar ou para miti- gar a série de medidas adoptadas pela minoria branca dominante a fim de limitar ou diminuir a liberdade dos nao-europeus. Nao quiseram acredi- tar que os dirigentes brancos ndo atenderiam aos argumentos discordan- tes que pudessem acarretar sérios inconvenientes 4 Ppreservacdo da eco- nhomia e da sociedade europeia — por exemplo, a retirada da sua forca de trabalho ou a ruptura do sistema do passe que controlava os movimentos dos nfo-europeus. Assim, 0 ANC foi perdendo a iniciativa em proveito 489 Historia Da ArRica de grupos mais radicais que apelavam mais directamente ao proletariado negro, como por exemplo, o Sindicato de Trabalhadores da Industria e do Comércio, dirigido por Clements Kadalie nos anos 20, ou o Congresso Pan-Africano (PAC) iniciado por Robert Sobukwe em 1959. Contudo, as actividades de tais organizagdes apenas serviram para consolidar as fileiras da hostilidade dos brancos & concess&o de quaisquer direitos substanciais aos ndo-curopeus ou de participa¢do na sua sociedade, ¢ serviram ainda para incentivar uma repressio ainda mais severa contra qualquer accdo dissidente de natureza politica ow sindical. Quando, por fim, 1960 0 PAC iniciou a oposicao das massas africanas contra as leis do passe(*), 0 resultado foi o massacre de Sharpeville, a proibicfo de toda a actividade politica dos africanos, tanto do ANC como do PAC, ¢ o fim das ligagées legais entre racgas na Africa do Sul, com a excepodo apenas da situagao nos Bantust0es cujos termos eram ditados pelos brancos. Na Africa oriental e central, a organizago politica africana em moldes curopeus ou quase europeus foi estimulada pela combinagado da educagao missiondria inicial com as tenses posteriores provocadas pela colonizacao europeia. Um dos primeiros exemplos consistiu numa série de associagses politicas que se constituiram entre os Quicuios durante a crise politica do inicio dos anos 20. Existiu ainda uma importante actividade politica no Sul do Uganda, que competiu com os territérios da Africa ocidental na criagao de um ensino secundario de nivel relativamente elevado, assim como na formagZo de uma classe prospera de agricultores indigenas. No entanto, durante muitos anos 0 objectivo dessa actividade politica nfo foi a trans- feréncia do dominio inglés na colonia mas a modernizagao dos reinos tra- dicionais, em particular do Buganda, e a defesa ¢ desenvolvimento dos acordos com a Inglaterra contra a ameaga de uma Unido da Africa Oriental dominada pelos colonos do Quénia. Na Rodésia do Sul, a evolugdo seguiu o modelo da Aftica do Sul, nao obstante com o atraso de uma geragdio e em circunstdncias mais desesperadas. A primeira contestagao moderna impor- (*) Pass laws, no original. Legislagao instituida na Africa do Sul que criou um quadro legal para a segregagao entre brancos e ndo-brancos (os Indianos, por exemplo, também estavam abrangidos), a impossibilidade de os nfo-brances nao poderem exercer cargos superiores ao branco mais mal remunerado na companhia é para limitar as movimentagSes dos nfio-brancos. Foram revogadas em 1986, Devem o seu nome a obrigatoriedade de qualquer branco ter de levar consigo um «domb pass», um documento, 490 A Inperenpéncia EM RESUMO- tante contra a dominacdo curopeia foi a greve organizada com éxito pelos trabalhadores africanos do caminho-de-ferro em 1945. A posterior consti- tuigdo de uma Federacao permitiu uma Tepresentarao politica limitada para 0s afficanos. Apesar de os partidos politicos nacionalistas afticanos mais tadicais, entretanto surgidos, terem sido Proibidos na década de 60, os poli- ticos curopeus estavam Preparados para entabular conversagGes com os lideres afticanos tepresentativos, embora continuassem a no querer alte- Yar a sua politica para satisfazer as exigéncias daqueles. Mas, de uma forma geral, antes dos anos 50, a quantidade de afri- canos das colénias do centro e do leste que obtinham acesso a um nivel elevado de educagio era geralmente muito Pequena para alimentar uma actividade politica Permanente com algum grau de sofisticagaio. Um indice revelador deste facto é fornecido pelos dados dos diplomados pela universidade. J4 em 1960, quando a maior parte das colénias era inde- pendente ou prestes a sé-lo, o mimero de africanos diplomados em ter- ritérios extensos como o Congo Belga, a Africa Equatorial Francesa ou o Tanganica era da ordem dos cinquenta ou menos (em comparacao, por exemplo, com cerea de 5000 Para a Costa do Ouro ou para a Nigéria ¢ cerca de 1000 para o Senegal). Nessas citcunstincias, a formagao das igrejas separatistas aetiopesn constituiu a mais tipica reacc4o ao dominio colonial ¢ as pressdes euro- peias. O que acontecen aqui foi que os africanos adquiriram nas mis- ses os aspectos essenciais da f€ cristi c a educagiio suficiente para os propagarem. Mas rejcitaram a relagio entre o cristianismo, a cultura e 0 sistema coloniais que o tinham trazido a Africa, ¢ insistiram em desen- volver a religifio num sentido mais adaptado as necessidades sociais dos africanos. Igrejas deste tipo nao eram um fenémeno novo, nem por isso invulgares na Africa ocidental ou austral. Nos tempos modemos, 0 maior movimento sincrético pode encontrar-se talvez nas numerosas igrejas aladura(*) da Africa ocidental, Contudo, aqui na Africa austral depois de 1920, as igrejas separatistas tiveramn tendéncia a ser apoliticas, ser vindo como substitutos para a organizacdo dos lacos sociais tradicionais em dissolugfio ou como outro tipo de refiigio em relacao ao desconten- tamento geral. (*) Designacao de origem ioruba, atribuido a algumas pequenas igrejas e sei- tas religiosas independentes espalhadas pelo ocidente afticano e em especial na Nigéria. Tinham a sua frente «profetas-curandeiros», OR) 491 Historia pa Arnica Na Africa ocidental ¢ central, contudo, na falta de verdadeiras organi- zagdes realmente politicas, os movimentos das igrejas separatistas pude- Tam servir para mobilizar os descontentes activos relativamente a situa- ¢ao colonial. Em 1915, por exemplo, uma revolta mal sucedida contra os Ingleses no Malaui foi dirigida por John Chilembwe, um africano educado na América que criara a Sua instituiggo missiondria. No entanto, Chilem- bwe tinha poucos seguidores, ¢ foi possivelmente mais um politico a agir num ambiente apolitico.do que um lider de uma igreja verdadeciramente africana. Por outro lado, a igreja Quimbanguista(“) no Congo Belga ¢ o movimento Quitavala — uma tendéncia religiosa com influéncia das Tes- temunhas de Jeova americanas — na Zambia podiam assumir a forma de revoltas populares contra a autoridade estabelecida. (Parece, no entanto, ter sido importante a natureza e néio a cor da autoridade, Assim, enquanto os Quimbanguistas adquiriram prestigio, depois de o Congo Belga se tor- nar independente, e mesmo, em 1970, pertencer ao Conselho Mundial das Igrejas, o regime zambiano pdés-colonial encontrou oposi¢4o declarada da parte da igreja Lumpa fundada por Alice Lenshina.) Um outro factor tem de ser levado em consideragdo para se explicar a razao pela qual, a sul do Sara, os movimentos nacionalistas africanos surgi- ram ¢ conseguiram atingir os seus objectivos, na Africa ocidental mais do que em qualquer outra regio. A explicagao reside no facto dea Africa oci- dental ter sido particularmente influenciada pelas ideologias internacionais que criticavam o sistema colonial, ou que podiam ser utilizadas para o eri- ticar. O enfraquecimento das massas negras na Africa meridional tornou- -as talvez igualmente receptivas, ou ainda mais, a essas ideologias. Foram um alvo ébvio do marxismo internacionalista, por exemplo, ¢ houve uma pequena minoria de brancos sul-africanos dedicados e prontos a apoiar a propagaco da teoria anticolonial. Contudo, nas condigdes da Africa do Sul, as autoridades nfo concederam qualquer oportunidade aos movimen- tos politicos baseados nessas ideologias. O mesmo suceden na Africa ocidental, na época colonial, onde os comu- nistas confessos ou suspeitos, assim como a sua literatura e organizagdes foram normalmente proibidos. Contudo, a sociedade do litoral da Africa ocidental tomara-se tao aberta que era praticamente impossivel impedir 0 acesso da classe instruida as ideologias de esquerda ¢ radicais. Pelo menos iz (*) Movimento conhecido oficialmente por «lgreja de Jesus Cristo pelo Pro- feta Simio Quimbango», amplamente difundida no Zaire. (N.R.) 492 A Inperenpéncia et RESuMO a partir de 1850, uma grande quantidade de africanos ocidentais fora para Edimburgo, Londres, Paris ¢ outtos centros de ensino superior; na década de 20, os de lingua inglesa tinham comegado a ir também para os Estados Unidos. Nesses paises, encontravam Tepresentantes dos povos oprimidos de outras regides do mundo (¢ também os seus aplicados protagonistas brancos). Os africanos ocidentais possuiam evidentes afinidades com 03 negros das Indias Ocidentais ¢ dos Estados-Unidos, que estavam em prin- cipio mais conscientes do que eles da necessidade de defender em primeiro lugar os povos de cor da pressio da dominacao branca e depois contesta- -la. Os africanos ocidentais de lingua inglesa foram bastante influencia- dos por importantes lideres negros do Nove Mundo como Marcus Garve e W.E.B. DuBois. Participaram, nomeadamente, numa série de Congresses Pan-Africanos sob a influéncia de DuBois (embora no promovidos por ele) que se realizaram a partir de 1900 em Londres, Paris, Lisboa, Nova Torque ¢ Manchester. Por altura do ultimo deles (Manchester, 1945) aquilo que comegara por ser essencialmente um movimento dos negros do Novo Mundo tornara-se com efeito, a escola de formacdo dos futuros lideres dos movimentos de independéncia na Africa anglofona, ¢ em particular da Africa ocidental. E enquanto os africanos ocidentais de lingua inglesa aderiram 4 corrente do pan-africanisme, os de lingua francesa associavam- -se aos das Indias Ocidentais de lingua francesa, como Aimé Césaire, para desenvolver uma doutrina paralela, a da négritude. Essencialmente, o pan-africanismo ¢ a négritude eram portadores da mesma Mensagem, embora a abordagem através da cultura anglo-sax6nica ¢ da lingua inglesa fosse de certo modo mais pragmatica ¢ menos filoséfica ou poética do que a abordagem da questio através da cultura e da lingua francesas. O homem negro ndo era necessariamente uma réplica inferior do homem brane; ele possuia a sua cultura e histéria distintas. No caso de ele os da sua natuteza se unirem e assimilarem aquilo de que necessitavam da cultura europeia no deixando que ela os absorvesse, a nagSo africana renas- ceria € poderia igualar ou exceder tudo o que os brancos tinham realizado. Na década de 40, regressaram a Africa ocidental muitos homens que eram portadores destas ideias, e a situagdo que encontraram nas regides do litoral cm finais da Segunda Guerra Mundial era ideal para a sua propaga- ¢40. Isso verificou-se em especial nas colénias mais avangadas nos aspec- tos econdmico e educative, que eram acima de tudo os territérios ingleses, € em especial as zonas meridionais da Costa do Ouro e da Nigéria (embora esse tipo de situacdo, e talvez as suas dimensdes, fossem semelhantes no 493 Hisroa pa Arrica Senegal ¢ comegassem a sé-lo na Costa do Marfim). Nestas regides, exis- tia um mamero consideravel de africanos que em grande medida se tinham emancipado das restrigdes da sociedade tradicional: religiosos, escriturd- trios e lojistas com instrugao primdria pelo menos, um ntimero cada vez maior de assalariados, ¢ muitos agricultores que possuiam rendimentos em dinheiro, provenientes de cultivo de produtos para o mercado mundial, receitas que eram relativamente elevadas devido as caréncias de matérias- -primas no tempo da guerra e no pés-guerra. A eles juntava-se agora um novo e importante factor, os homens que tinham adquirido educagdo ¢ expe- riéncia consideravel no servico militar durante a guerra. Muitos tinham, na tealidade, obtido novas perspectivas na luta ao lado dos soldados brancos ingleses e franceses contra os imperialistas inimigos brancos ou amarelos no Norte e no Nordeste africano, no Extremo Oriente ¢ na prépria Europa, Ao todo, havia cerca de 200 000 homens nessas condigées, distribuidos de forma mais ou menos uniforme pelas coldnias inglesas ¢ francesas. Dado que o efcito directo ou indirecto da sua participagdo consistira na liberta- ao de paises como a Etidpia, a Birmania, a india e mesmo a Franca, do dominio estrangeiro, os afticanos ocidentais em geral ¢ esses homens em particular foram naturalmente levados a interrogar-se sobre o motivo de esses beneficios Ihes serem recusados. Todas essas pessoas, especialmente os ex-soldados, procuravam uma vida melhor agora que a guerra terminara. Os ideais da Carta Atlantica ¢ das NagGes Unidas foram muito divulgados. Eles acreditavam, assim como os seus senhores coloniais, que a guerra fora uma vitoria sobre as for¢as da tirania ¢ da opressao. Contudo, os seus proprios paises no eram livres. Ainda em 1943 e 1944-0s Ingleses estavam a colocar as tiltimas pedras do dominio indirecto na Costa do Ouro. Em breve se considerou uma atitude esteril o estabelecimento de maiorias negras nos conselhos legislativos da Costa do Ouro e da Nigéria em 1946 ¢ na Serra Leoa em 1948, que fora inicialmente considerado por ambos os lados como um avan¢o radical. Poucos elementos africanos foram eleitos directamente — ¢ estes foram- -ho através de pequenos eleitorados nas cidades principais; a maioria era designada pelos chefes ou pelos governos coloniais, ¢ para todos os efeitos estes conseguiram levar a cabo a sua politica sem impedimentos. Existiu uma desilusdo semelhante do lado francés. Sob a direcgfio de De Gaulle no periodo da guerra, realizou-se em Brazzaville, em 1944, uma importante conferéncia de funciondrios coloniais. Ela veio a recomendar modificagdes importantes na estrutura do império colonial francés. Todos 494 A InperenpEncia EM Resumo- 0s stibditos das colénias francesas deveriam tornar-se cidad3os franceses e, nessa qualidade, com direito a ter representacdo na assembleia consti- tuinte que deveria elaborar uma nova constituig¢do para a Franpa e para as suas colénias. O império devia ser transformado numa Unido na qual as colénias deveriam compartilhar uma parte das responsabilidades no seu governo local através de assembleias eleitas. Muito deste programa foi de facto incorporado na constitui¢o proviséria de Abril de 1946. Contudo essa constituicao foi rejeitada num referendo em que os eleitores franceses da metrépole cram preponderantes e a verdadeira constituigao da IV Repti- blica, de Outubro de 1946, veio a ser menos favordvel para as colénias. Os seus habitantes tornaram-se cidadios, mas ndo em pé de igualdade. Nem todos recebiam esse direito, e as eleigdes eram feitas separadamente em circulos que atribuiram infiuéncia indevida aos que tinham sido cida- daos na II] Republica — os residentes franceses nas coldnias, assim como um pequeno nimero de africanos. O grau de autonomia local atribuido as coldnias ¢ 4s suas novas assembleias territoriais era também menor do que aquilo que se esperava. O sentimento geral de frustragao aumentou devido as circunsténcias em que a Inglaterra e a Franga se envolviam nos principais projectos de desenvolvimento colonial. Eles reforgaram naturalmente as esperangas dos africanos acerca do nove mundo que procuravam. No entanto, por causa das caréncias mundiais em bens essenciais, as vantagens resultantes desses projectos foram de inicio muito menos evidentes do que o afluxo de técni- cos, conselhciros ¢ professores curopeus para os concretizar, Desse modo, © controlo ¢ o dominio europeus pareciam estar em vias de consolidagaio numa altura em que os africanos, sobretudo os antigos membros das forcas armadas, sentiam enormes dificuldades em encontrar boas oportunidades, especialmente os empregos para os quais s¢ sentiam aptos devido as suas qualificagdes © experiéncia. Os bens de consumo eram igualmente escas- sos e dispendiosos, de modo que as maiores receitas dos agricultores e dos assalariados nao produziam as vantagens desejadas. Fundamentalmente, isso era sem divida resultado do esforgo imposto pela guerra 4 economia mundial ¢ pela reconstrugdo do pés-guerra. Todavia, devido ao comércio de importagao ¢ exportagio na Africa ocidental, todo dirigido na pratica por um punhado de importantes companhias ecuropeias, 0 africano ociden- tal comum nfo podia deixar de concluir que as suas dificuldades econdmi- cas eram provocadas pelo desejo destas companhias em explorar a situagio a fim de obter maiores lucros para os seus accionistas. 495 Historia pa Arnica A frustragao fermentou primeiro na Costa do Ouro, a colénia que mais beneficiara com as relagdes com os europeus, ¢ que tinha portanto as maio- Tes esperangas. Em Fevereiro de 1948, houve tumultes nas maiores cida- des do Sul e no Achanti, tendo como principal objectivo os armazéns das mais importantes companhias comerciais dos europeus. Constituiram, no entanto, uma perturbagaio menor do que aquelas que os Ingleses enfrentaram ou viriam a enfrentar noutras regides (por exemplo, na india); a lista oficial de baixas foi de 29 mortos e 237 feridos. Contudo, deram o-alerta para os dirigentes da politica colonial inglesa. A Costa do Ouro fora sempre con- siderada uma colénia-modelo, aquela onde os afticanos tinham alcangado © maior progresso € prosperidade, ¢ onde houvera inclusivamente pouca violéncia desde a revolta dos Achantis em 1900. For enviada imediatamente uma comiss&o de inquérito. Esta concluiu desde logo que o problema fun- damental cra o de a constituigao de 1946 para a Costa do Ouro «estar ultra- passada 4 partida», ¢ se revelar absolutamente inadequada As necessidades do que se pensava ser uma nova nagéo em evolugdo. Recomendava que os africanos deveriam ajudar a redigir uma nova constituigio, que seria o primeiro passo no avango répido para a autonomia, sendo o poder gradual- mente transferido do executivo da administracdo colonial para os ministros africanos responsdveis perante uma assembleia nacional. Essa proposta foi rapidamente aceite pelo governo inglés. Este deve ter pensado que a Inglaterra nao conseguiria enfrentar as pretensées da Africa ocidental 4 autonomia no momento em que combatia uma revolta comu- nista na Maldsia, e que a sua posigfo econémica na Africa ocidental era suficientemente forte para poder lucrar com a cooperaco de um governo nacionalista africano educado a maneira ocidental, e moderado, em vez de ser arruinado por ele. Isto foi claramente demonstrado na Convencao da Costa do Ouro Unida, uma associacao politica criada em 1947 por J. B. Danquah, um advogado proeminente, ¢ por outros profissionais liberais ¢ homens de negécios confortavelmente instalados, e que desenvolveram a tradi¢ao de Casely Hayford e do Congresso Nacional da Africa Ocidental Inglesa dos anos 20. Danquah e todos os seus colegas importantes, com excepedo de um, foram convidados a associar-se a redacgdo da nova cons- tituigdo, ¢ isso foi realizado em 1951, com relativamente poucas emendas por parte do Ministério das Colénias. Contudo, a excepeao era importante. ‘Tratava-se de Kwame Nkrumah, um homem muito jovem que, nos seus tempos de estudante na América e na Inglaterra, sentira todo o impeto do novo pan-africanismo (foi um des principais participantes no Congresso 496 A INDEPENDENCIA EM RESUMO de Manchester em 1945). N&o via os seus colegas como verdadeiros lideres do partido nacional que, segundo ele, devia explorar a situagdo. Na realidade, acreditava que eles se tinham vendido aos Ingleses. Portanto, afastou-se deles, procurou o apoio das massas no meio do descontenta- mento gencralizado no Sul da Costa do Ouro, ¢ canalizou-o pata o seu Par- tido Popular da Convengo [CPP, na sigla inglesa] com um programa de «independéncia fmediata» e de «acgao positiva» (isto €, greves e beicotes) para a conseguir. Isto acarretou imediatamente um conflito com as auto- nidades inglesas. Entretanto, a ordem de prisio para Nkrumah e os seus colaboradores principais apenas serviu para aumentar a sua popularidade e em 1951 o CPP obteve quase todo os lugares através das eleicGes directas para a nova Assembleia Legislativa. O Ministério das Colénias eo novo govemnador enviado para a Costa do Ouro, Sir Charles Arden-Clarke, fez © mesmo raciocinio que fora feito em 1948, ¢ Nkrumah ¢ os seus colegas foram convidados a ocupar a maior parte dos cargos ministeriais no con- selho executivo. As duas personalidades cooperaram a partir de entio com uma compreensdo e uma habilidade politica invulgares. Apesar de aleuma oposigdo conservadora ¢ tradicionalista, especialmente nalgumas regides, © resultado foi a Costa do Ouro passar a constituir um membro indepen- dente da Comunidade Britinica ¢ das Nagées Unidas em 1957, O nome europeu de Costa do Ouro foi afastado, fazendo 0 novo Estado renascer o nome de Gana, o primeiro Estado da Africa ocidental na Histéria, Logo que foi aceite na Costa do Ouro-o principio de um rapido pro- gresso 10 sentido da independéncia, esta nfo mais podia ser negada 4s outras coldnias da Africa ocidental. Contudo, cada uma delas apresentava proble- mas que faziam com que 0 seu progresso fosse de certo modo mais lento. O problema na Nigéria foi o de ser dificil elaborar uma constituicéo democra- tica que fosse imediatamente funcional ¢ accitavel para todas as regides de um territério tao vasto ¢ populoso. A Nigéria do Norte era a zona por exce- léncia do dominio indirecto, onde de facto a influéncia inglesa servira para apoiar o poder de uma aristocracia tradicional ¢ conservadora muculmana, que olhava para um Islao ideal no passado, em vez de olhar para o futuro € para novos tipos de sociedade que os mugulmanos do Norte de Africa e do Médio Oriente tentavam edificar. Dai resultou que mais de metade da populagao da Nigéria foi afastada de modo mais ou menos deliberado das transforma¢Ges profundas que estavam a afectar o Sul. Aqui existiam dois. agrupamentos nacionalistas rivais. O Conselho Nacional da Nigéria e dos Camardes (CNNC), dirigide por Nnamdi Azikiwe, um pioneiro do estilo 497 Historia pa Arica nacionalista adoptado por Nkrumah (que fora em certa medida seu disci- pulo) na Costa do Ouro, educado na América, e que ¢stimulara os Iorubas da Nigéria ocidental a criar uma associa¢ao prépria, a principio cultural mas politica em ultima insténcia, o Grupo de Aceao, dirigido por Obafemi Awolowo. Dai resultou que 0 prestigio do CNNC passou a identificar-se com as aspiracées dos Ibos do Leste da Nigéria, ¢ que os dois partidos comecaram a competir entre si pata obter apoio noutras regides do pais. A resposta imediata a esta situagZo foi tornar a Nigéria numa federa- ¢40, na qual o Norte, o Leste ¢ o Oeste detinham uma administragiio regio- nal que caminhava ao seu ritmo e a sua maneira para a autonomia local. Esse objectivo foi atingido pelo Oeste e pelo Leste em 1957, ¢ pelo Norte dois anos depois. Contudo, ndo chegou a ser efectivamente resolvido 0 problema de como garantir no centro um governo estavel ¢ eficaz, para o qual a Inglaterra pudesse transferir 0 poder. Nenhum partido nacionalista conseguiu adquirir 0 controle do governo federal visto que, tendo por base a populacao, o Norte detinha metade dos lugares da Assembleia Federal. viria a ser criada uma aparéncia de maioria democratica na Assembleia quando o Congresso Popular do Norte (CPN) = que, apesar do seu nome, era um partido conservador dos emires do Norte ¢ dos seus adeptos — for- mou uma coligagao com o CNNC, o grupo nacionalista mais radical. O CNNC esperava, desta forma, alcangar rapidamente a independéncia para a Nigeria, e aumentar 0 seu poder em todo o pais. No entanto, para 0 CPN isto constituia uma accfo tactica destinada a dominar o Sul e a impedir os seus dinamicos emigrantes de perturbar a sociedade do Norte ¢ o seu sistema politico enquanto se fazia algo no sentido de preparar o seu povo para receber a administragao da mao dos Ingleses. O resultado foi corrup- cao, ineficdcia, e procedimentos intoleraveis, em especial para os Iorubas do Oeste ¢ outros povos que foram excluidos do aparelho politico. Foi, no entanto, a esta coligagdo de conveniéncia que a Inglaterra concedeu a inde- pendéncia da Nigéria em 1960. A Serra Leoa enfrentou um problema semelhante ao da Nigéria devido ao enorme desnivel existente no progresso educativo ¢ econémico entre os crioulos da colénia e os habitantes muito mais numerosos do protectorado do interior. Contudo, este desnivel pareceu ser resolvido a favor dos objec- tivos da politica inglesa, com a formagiio de um Partido Popular da Serra Leoa dirigido por Milton Margai, um médico do protectorado, ¢ a indepen- déncia foi portanto reconhecida em 1961. A Gambia era mais pequena ¢ mais pobre do que a Serra Leoa; na realidade, niio era facil prever o modo 498 A INDEPENDENCIA er ResuMo como um pequeno pais com um ter¢o de milhao de habitantes conseguiria tormar-se um Estado independente vidvel. Contudo, 0 seu Povo née@preten- dia perder a identidade numa fusio como Senegal, cujo territério o rode- ava por trés ladas. Organizaram-se politicamente e em 1965 adquiriram a independéncia do seu pais. A ripida descolonizagaio da Africa Ocidental Inglesa a partir de 1948 nao deixou de ter efeitos politicos sobre a politica ffancesa em relacio as suas coldnias vizinhas na Africa ocidental e equatorial. Isso notou-se mais claramente no caso especial da Togolandia. Depois de 1945, 03 mandatos da Sociedade das Nacées foram convertidos em situagdes de tutela perten- centes 4 nova Organizaco das Naedes Unidas (com excepeao do Sudoeste Africano, para a qual a Africa do Sul preferiu a fic¢dio de que o mandato estava ainda em vigor). A Togolindia inglesa fora sempre administrada integralmente com a Costa do Ouro, ¢ em 1956, quando se tomou evidente que ¢sta iria obter a sua independéncia, a maioria da sua populagio deci- diu tomar parte nela. Isto forcou os Franceses a conceder-lhes a autonomia relativamente ao seu territério sob tutela (que em 1960 passou a ser uma reptiblica independente). Contudo, nessa altura os Franceses estavam a libertar-se da situagdo. provocada pelo recuo em relagao as promessas feitas na Conferéncia de Brazzaville, primeiro pela habil exploragdo pelos seus lideres africanos do aumento da fraqueza politica da IV Republica, ¢ depois pelo regresso de De Gaulle ao poder em consequéncia da crise da Argélia. Se em 1946 os africanos tinham aleangado menos do que desejavam, as coisas ja n4io esta- vam como anteriormente. Possuiam agora uma base legal para a actividade politica nas colénias, a fim de contrabalangar o dominio da Franca. Além disso, ainda que para eleger um Tepresentante a legislatura de Paris que agora controlava os seus destinos fossem precisos dez vezes mais cidaddos em Africa do que cidadios franceses em Franga, pelo menos cada colénia estava entao representada naquela legislatura. A primeira resposta africana a esta nova situa¢do foi a criagao do Ras- semblement Démocratique Africain (RDA) que incluia quase todos os Seus representantes politicos, ¢ para tal cooperava com 0 Partido Comu- nista Franeés, a unica oposi¢do efectiva na legislatura francesa nos ultimos anos da década de 40. Contudo, isso atraiu a hostilidade implacavel dos administradores franceses em Africa, © entre 1948 ¢ 1950 estes consegui- Tam praticamente suprimir 0 RDA em todas as colénias, Sob a direcgdo de Felix Houphouét-Boigny, homem de alguma riqueza oriundo da Costa 499 Historia pa Arrica do Marfim, o RDA alterou a sua tactica. Comegou a oferecer os votos do seu pequeno mas coerente corpo de representantes na legislatura francesa a qualquer governo que em compensacao fizesse concessdes as coldnias. Nos anos 50, a natureza da politica francesa era tal que qualquer dos nume- rosos governos de coligacdo de entao necessitavam desse apoio: se pre- tendessem continuar a deter o poder. Na realidade, Houphouét e outros africanos comegaram a ser recompensados com noiieagées ministeriais. Em 1956, portanto, Houphouét e o RDA obtiveram a aprovagao de uma loi-cadre (lei-quadro) que permitiu o estabelecimento em cada colénia de uma assembleia eleita localmente com poderes reais para controlar a poli- tica e as finangas. Nem todos os lideres africanos ficaram satisfeitos com algumas das suas implicagdes. O RDA nunca foi bastante forte no Senegal, cujos eleitores, recordados da sua longa tradigdo de estreita associa¢o com a Franea, preferiram uma linha mais independente, ¢ onde Léopold Sen- ghor, o principal apéstolo da négritude, surgiu como um sucessor mais capaz de Lamine Gueye. Senghor argumentava que a loi-cadre dividia as Federacées da Africa Ocidental e Equatorial em territories isolados que eram demasiado pobres e pequenos pata fazer face as presses por parte da Franca. Esta politica era particularmente desvantajosa para 0 Senegal, que até entio tinha beneficiado pelo facto de ser a base de todos os servicos federais na Africa ocidental ¢ era realmente vantajosa apenas para aquelas colénias, como a Costa do Marfim, de Houphouét, ou o Gabao, na Africa Equatorial, que passavam entdo por uma revolugdo econémica comparavel & que ocorrera na Costa do Ouro ha uma geragdo. A maior parte dos outros territérios estava demasiado dependente do auxilio da Franga para conse- guir uma autonomia significativa. Dentro do RDA, estes argumentos foram repetidos por Sekou Touré, um homem muito mais nove do que Houphouét Boigny que nunca estivera no parlamento francés mas que adquirira, no entanto, grande prestigio na Guiné Francesa através da organiza¢do do seu movimento sindical. Em 1958, alV Repiblica caiu ¢ De Gaulle regressouao Poder. De Gaulle decidiu que a ideia de que as coldnias negras eram inequivocamente posses- sdes francesas podia ser to prejudicial para os interesses da Franga como a manutengZo da sua presenga sem restri¢des na Argélia, A Constituigao da sua Repablica avangou, portanto, com o conceito de uma Comynunanté francesa. Nesta comunidade, as colénias podiam tormar-se «territérios ultra- marinos» legalmente iguais 4 Franga, ¢ seus parceiros num governo central 500 A Inpepenpéncis EM RESUMO comum para tratar das questdes externas, da defesa e da politica econémica em geral. Quando essa Constituigao foi apresentada ao eleitorado num refe- tendo em Setembro de 1958, cada calénia pode escolher entrea associagao 4 Comunidade ou a opgao pela independéncia completa fora dela. Todas as colénias votaram pela comunidade com excepedo da Guing, Aqui, a influéncia de Sékou Touré assegurou um voto «Nao» em massa, pelo que os Franceses retiraram todo o seu pessoal, equipamento ¢ auxilio. Contudo a Guiné sobreviveu a esta sumaria manifestacao do que poderia acontecer a uma colénia que nao alinhasse com De Gaulle. Foi-lhe ofere- cida imediatamente ajuda por parte do Gana assim como a unido politica com este, onde Nkrumah, na perspectiva de garantir uma posicao de domi- nio interme absolute, dedicava entiio as suas energias principais ao objec- tivo de constituir uma uniao de Estados africans livres sob asua lideranga messianica. Em breve, a Guiné recebeu também auxilio, talvez mais palpa- vel, da parte dos paises comunistas da Europa e Asia. A sobrevivéncia da Guiné foi indubitavelmente um factor que persu- adiu os lideres de todos os outros territérios coloniais.a evitar os lagos misticos com que De Gaulle procurara atrai-los. O Senegal e 0 Sudao fran- cés foram os primeiros, em 1959, associando-se no que designaram por Federacao do Mali, e pedinda depois ¢ obtendo uma independéncia com- pleta enquanto permaneciam na Comunidade, Com efeito, esta federacdo desfez-se no ano seguinte, adoptando o Suddo o nome de Mali. Embora as economias dos dois parceiros fossem essencialmente interdependen- tes, nao chegaram a um acordo sobre as prioridades do futuro desenvol- vimento. O Senegal necessitava de todo 0 auxilio que pudesse obter a fim de manter a super-estrutura Pesadissima que herdara da antiga Federagio da Africa Ocidental Francesa, enquanto os Iideres do Mali sentiam neces- sidade de uma evolugdo radical para desenvolver o seu pobre territério do interior. Depois desta experiéncia, no entanto, todos os governos territo- riais compreenderam que a Comunidade de De Gaulle era um pormenor desnecessario. Cada um negociou o seu acordo com a Franca pelo qual era reconhecida uma independéncia legal e completa. Mas todos continua- ram a receber da Franea assisténcia financeira consideravel assim como no campo do desenvolvimento, com excepgdo da Guin ¢ do Mali, que adop- laram posigées ideoldgicas inaceitaveis, ¢ a Costa do Marfim e 0 Gabiio, que nao necessitavam dela, A febre da descolonizacao atingiu entio 0 seu Ponto culminante. No continente alcangara jas fronteiras do Congo Belga e, com excepeao das 501 Hisrorta pa Arrica Possesses portuguesas, todas as restantes colénias a contrairam até que chegou ao cordon sanitaire constituido pela Rodésia, que protegia os bran= cos da Africa do Sul. No Congo, os Belgas continuavam o seu caminho, até 1958-59, indi- ferentes a0 que estava a acontecer no resto do continente. J4 em 1956 fora considerada altamente idealista a sugestaio de que podiam empenhar- -s¢ num plano de 30 anos para preparar a sua colénia para a independén- cia. Contudo, em 1968, a situagio cemecou a modificar-se. Um antigo governador-geral do Congo tornou-se ministro das Colénias em Bruxelas, ea «descolonizacao» foi oficialmente referida pela primeira vez. Foram criados nas maiores cidades conselhos electivos, ¢ os partidos politicos congoleses comecaram a surgir, aliis em bases essencialmente regionais ou éticas. Pela primeira vez, um nimero ‘importante de Congoleses come- ou a viajar para fora do Congo, para a Bélgica e outros paises. Trés con- Seguiram assistir a uma conferéncia de movimentos para a independéncia africana —incluindo Patrice Lumumba — que Nkrumah reuniu em Acra em finais de 1958. Os Belgas tinham ja compreendido que com a perspectiva da independéncia para o Congo Francés — cuja capital Brazzaville estava separada da capital de Congo, Leopoldville (actual Kinshasa), apenas pela largura do rio -, a politica tradicional de total isolamento da sua colénia ja nio seria mais praticavel. A consequéncia foi inspirar o proletariado urbano em Leopoldville em Janeiro de 1959 a ir para as ruas; considerava.a independéncia relativamente ao dominio curopeu como a tnica solu¢ao possivel para o seu descontenta- mento social e politico. Os tzmultos foram mais considerdveis do que os da Costa do Ouro onze anos antes: a lista oficial das baixas tegistava 49 mortos € 379 feridos (incluindo 49 europeus). A resposta belga foi, por um lado, prender os chefes politicos locais; por outro, Prometer a independéncia ao Congo. No prazo de um ano, 0 governo ¢ 0 parlamento belgas negociavam os termos da independéncia com os Ideres congoleses (alguns dos quais foram para 0 efeito libertados da prisSo), que representavam varios partidos politicos, dos quais cerca de seis possuiam alguma dimensiio. Em Maio de 1960, realizaram-se eleigdes para uma Assembleia Nacional, e no dia | de julho foi proclamada a Repiblica do Congo Independente. Os Belgas tinham apostado em como a sua presenga continuada seria essencial & sobrevivéncia do territério do Congo, sabendo, na realidade, que este pouca preparacdo tivera para a independéncia. Isto era em parte verdade na medida em que o Congo carecia quase totalmente de homens 502 A TNDErENDENCIA EM RESUMO preparados para gerir um Estado modemo, tendo por isso grande neces- sidade da ajuda exterior. Mas era também, infelizmente, verdade, na medida em que nenhum lider ou partido politico neste extenso territério possuia qualquer tipo de implanta¢ao nacional. Lumumba, que veio a ser © primeiro-ministro, ¢ 0 seu Movimento Nacional Congolés, eram os que mais se aproximavam daquela situacdo, mas detinham apenas umn quarto dos lugares na Assembleia, e cerca de metade da sua influéncia provi- nha so de uma das seis provincias. Nao conseguiram obter a confianga de homens como Joseph Kasavubu, o lider bacongo e primeiro Presidente da Repiblica, ou de Moisés Tshombé, cujo poder se baseava no Catanga © num entendimento com as companhias mineiras europeias; ambas as partes pretendiam uma constituigao federal. E, dentro de alguns dias, toda a estrutura se desmoronou com um levantamento dos soldados africanos (nenhum deles acima do posto de sargento) da Force Publique, a forga militar e policial conjunta, essencial para a manutengao da ordem, que pensavam que a independéncia significava a libertagao do controlo exer- cido pelos oficiais belgas. O resultado foram mutilagdes e 0 caos ea ten- tativa de secessao do Catanga, 0 que provocow a intervencdio das Nagdes Unidas (inclusive de importantes contingentes de soldados de outros Esta- dos africanos), antes de a unidade ser imposta pelo general (mais tarde Presidente) Mobutu Sese Seko, com o auxilio de um significativa apoio ocidental. O pais recebeu entdio novamente o nome de Zaire, ¢ a sua pro- vincia do Catanga tornou-se o Shaba. A crise do Congo de 1960-65 dificilmente constituin um feliz prenun- cio para o prosseguimento da descolonizagio na Africa ocidental ¢ central. Na realidade, foi um elemento importante para confirmar a hostilidade dos restantes grupos de colonos em reconhecer os direitos dos afficanos, tanto na Africa de expressao Portuguesa como inglesa. Dado que a independén- cia do Burundi e do Ruanda, os dois reinos africanos que tinham feito anteriormente parte da Africa Oriental Alema mas que se tinham tornado mandatos e sob tutela belga, se seguiu em 1962 logicamente A independén- cia do Congo, as restantes prioridades da descolonizagao eram essencial- mente as inglesas ¢ as portuguesas. Em Inglaterra, todos os partidos poli- ticos estavam entao firmemente empenhados nela, Argumentavam entado que, nao obstante os colonos, as coldnias inglesas da Africa oriental ¢ cen- tral, embora mais mal equipadas para se autogovernarem do que o Gana oua Nigéria, estavam mais bem preparados nesse aspecto do que o Congo. Durante algum tempo houve oportunidades de um ensino secundario, ¢ os 503 Historia pa Arrica conselhos legislatives proporcionaram meios rapidos para iniciar os africa- nos na tarefa de orientar 0 governo a nivel nacional. O Tanganica foi 0 caso mais simples de resolver, A primazia dos imte- Tesses afficanos no territério fora realcada nos termos do mandato da Sociedade das Nagdes e da tutela das Nagdes Unidas, a ponto de os pou- cos colonos europeus nfo terem conseguido obter uma posigao politica favoravel em relacdo aos africanos, cujos representantes participaram pela primeira vez no Conselho Legislativo em 1945. Os prejuizos dai decor- Tentes para as instituigdes tribais nos primeiros anos da ocupagiio euro- peia até 1918, assim como a grande-expansdo da lingua e da cultura suaili, permitiram 4 Unido Nacional Africana do Tanganica, fundada em 1954 por Julius Nyerere, diplomado pela Universidade de Edimburgo, criar um movimento nacional. Nyerere também conseguiu ganhar a confianga dos colonos assim como da administragao britanica. Dai resultou que o Tanga- nica operou uma lenta transi¢&o para a independéncia que foi concretizada em 1961. No entanto, logo em 1964 verificon-se uma violenta Tevolta no vizinho Zanzibar, onde o regime 4rabe do sultdo (que no ano anterior vira Testaurada a sua independéncia) foi substituido por uma repiiblica popular africana que em breve alinhou com o mundo comunista. Quase simultane- amente, foi abafada com 0 auxilio inglés uma revolta no pequeno exército do Tanganica. Nyerere sobreviveu, no entanto, a este golpe e pouco tempo depois procurou dominar o evidente extremismo em Zanzibar efectuando a unido da ilha com a sua propria repiblica, que recebeu entio a designacao de Tanzania. O Uganda, onde os africanos também haviam acedido ao Conselho Legislative em 1945, comparado com o Tanganica tinha um problema ainda mais pequeno com os colonos. Por outro lado, enfrentou sérias difi- culdades provenientes dos diferentes niveis de desenvolvimento ¢ dos micronacionalismos. Tal como na Nigéria, o Norte estava econémica e educacionalmente atrasado em comparago com 0 Sul, mas foi aqui que predominou o dominio indirecto. Na realidade, a intervenciio inglesa tinha apoiado totalmente os reinos bantos a sul do Uganda. Fomecera apoio aos pedidos de modemiza¢do, em especial no Buganda, ¢ utilizara amitide a sua populacdo vezes como agentes de expans&o do poderio inglés. No entanto, de inicio, as pretensées do Uganda a independéncia e a sua eapacidade em organizar-se para esse fim foram muito comprometidas pelo subim- perialismo bem organizado dos Bagandas sob a direco’io do seu Kabaka. ‘Todavia, circunstincias totalmente fortuitas nos anos de 1961-62 levaram 504 A INDePENDENCIA EM RESUMO os Bagandas a aderir a uma coligacdo com o partido nacionalista, dirigido por Milton Obote, que representou as aspiragGes da maior parte dos gru- pos ¢tnicos, e em 1962 a Inglaterra resolveu conceder @ independéncia ao Uganda. Do ponto de vista dos Ingleses, os principais problemas da descoloni- zacéo na Africa oriental © central iriam provavelmente surgir naqueles ter- nitories onde os colonos brancos jA tinham obtido uma ceria transferéncia do poder politico no seu préprio interesse. No que dizia respeito a Africa central, no entanto, a criagdio da Federago da Rodésia e Niassalandia tinha obtido o resultado acidental de aglutinar a opinido dos africanos em cada territério a volta de uma exigéncia nacionalista coesa de «um homem, um voto». Logo que a Rodésia do Norte ¢ a Niassalandia deixaram a Federa- 40, a Inglaterra chegou rapidamente a um acordo como Congresso Nacio- nal Africano da Zambia, dirigida por Kenneth Kaunda, é com 0 Partido do Congresso do Malaui, chefiado por Hastings Banda. Em 1964, estes dois territérios tornaram-se os Estados independentes da Zambia e do Malaui, respectivamente. A situagiio no Quénia nao foi tio simples, Em 1950, a caréncia afli- tiva de terras face ao rapido crescimento da populagao africana tanto nas montanhas como nas planicies, juntamente com o manifesto bloqueio de quaisquer oportunidades de contestacao ou de progresso politico para os africanos — ambos os fenémenos resultantes da colonizagao europeia —, criaram uma situagio de tipo argelino. Em 1950, um nimero cada vez maior de Quicuios, 0 pove mais atingido, estava a juntar-se a um movi- mento designado Mau-Mau, por meio de um juramento ritual secreto. Dois anos mais tarde, os activistas Mau-Mau, com bases de apoio nas flores- las vizinhas, assaltaram continuamente as terras montanhosas € mataram indiscriminadamente colonos ¢ os Quicuios que haviam tido a sorte de possuir terras ou empregos razoaveis. Foi necessdria a intervencaio das tro- pas inglesas para restabelecer 0 controlo e eliminar os Mau-Mau, algo que 86 foi totalmente concretizado em 1959. No entanto, os Mau-Mau servi- ram de pretexto para convencer o governo inglés de que era preciso fazer alguma coisa para minorar a fome de terra Por parte dos africanos e para obter @ participaco efectiva dos africanos no governo do Quénia. Surgiu, no entanto, um novo problema pelo facto de, uma vez restabelecida a vida politica normal, o mais forte partido politico africano, a Unido Nacional Africana do Quénia (KANU), parecer ser em especial um partido de Qui- cuios ¢ Luos aos olhos dos membros de outros gTupos étnicos. Para os 505 Historia pa Arnica Ingleses, ele estava igualmente comprometido pela suposta cumplicidade do seu lider, Jomo Kenyatta, como movimento Mau-Mau. Em 1961, foram 0s rivais da KANU que, como apoio dos nao-africanos, constituiram o pri- meiro governo nacional. A independéncia teve de aguardar a libertapao de Kenyatta da prisdo (1961), 0 que deu origem primeiro 4 coligacSo entre a KANU € os nacionalistas rivais ¢ depois disso a uma vitéria eleitoral deci- siva, em 1963, de Kenyatta e da KANU. A Inglaterra teve de lidar entio com a solucao da simagao da Rodésia. Aqui, o insucesso da Federac3o levou os calonos a continuarem sozinhos. Numa elei¢ao geral realizada em 1962, eles asseguraram o regresso de um. Zoverno incondicionalmente de direita, que tomou providéncias no sentido de esmagar os partidos nacionalistas africanos ¢ a0 mesmo tempo exigiu a Inglaterra a independéncia completa. O primeiro-ministro inglés traba- Ihista, Harold Wilson, pensou ser possivel levar o seu homélogo rodesiano, lan Smith, a concordar com certas concessdes a fazer a thaioria africana como compensagio por essa independéncia. No entanto, enganou-se de todo relativamente ao homem e ao estado de espirito da maior parte dos colonos. Em 1965, Smith e o seu governo fizeram uma declaracdo unila- teral de independéncia para a Rodésia, Nenhum pais do mundo a reco- nheceu, nem mesmo a Affica'do Sul. Contudo, os rebeldes contavam com a simpatia ticita ¢ com o apoio dos brancos dos outros pontos da Africa meridional, ¢ as sangées econdmicas impostas @ Rodésia pela Inglaterra ¢ pelas Nacées Unidas dificilmente podiam ser eficazes enquanto aquele pais tivesse acesso livre aos portos de mar da Africa do Sul e da colonia portu- guesa de Mogambique. Exceptuando o problema insolivel da Rodésia, a Inglaterra ficou entio livre dos seus compromissos coloniais em Africa, Com efeito, os regimes ditatoriais de Espanha ¢ Portugal eram as tinicas poténcias coloniais que restavam em 1965. Em 1958, a Espanha seguiu o exemplo belga e reco- nheceu precipitadamente a independéncia da Guiné Equatorial, isto é, das ilhas de Fernando Pé e Anobom e de um enclave continental adjacente com cerca de 16 000 km*. Durante algum tempo, a Espanha conservou o Sara Espanhol, imediatamente a sul de Marrocos, que —tal como Marrocos — Possuia reservas valiosas de fosfatos, o fertilizante natural que come- ava ater uma importancia crucial para a agricultura mundial. No entanto, em breve considerou oportuno aceitar as reivindicagbes de Marrocos ¢ da Mauritania para dividir entre eles aquele territério escassamente povoado. No entanto, até 1974 Portugal continuou a ser uma poténcia colonial no 506 A INDEPENDENCIA EM RESUMO. sentido mais tradicional do termo, apesar de afirmar que nao possuia col6- nias mas apenas algumas provincias do seu territério, que por acaso se situayam no ultramar. Dai resultou que em meados dos anos 60 Portugal se encontrava nas suas trés colénias — Guiné, Angola ¢ Mocambique — a bra- gos com uma guerra de guerrilha em grande escala, activamente apoiada a partir dos territérios vizinhos independentes (assim como 0 eram as incur- sdes de guerrilhciros na Rodésia). Nos inicios dos anos 70, metade do orcamento portugués destinava-se a custear as forgas armadas em Africa, criando desse modo uma tensdo muito mais forte na sua economia do que sucedera com a guerra argelina em relagdo a Franga. Finalmente, em 1974, © exércita e o povo portugués estavam jd fartos da situago e desenca- dearam a revolta. Uma das primeiras medidas do govemno foi reconhecer as exigéncias dos nacionalistas africanos em relacdo a independéncia dos seus territories. Dado que esta revolugdo garantiu o fim da ditadura que governara Portugal desde 1926, parecia que os africanos tormavam desse modo extensivos a um pove europeu os beneficios da liberdade. A independéncia de Mocambique veio dificultar muito mais a vida @ comunidade colonial na Rodésia que dez anos antes declarara a sua inde- pendéncia unilateral. Até entSo, a resistencia armada ao regime colonial limitara-se a ataques violentos ¢ nem sempre muito eficazes oriundos da Zambia, através do rio Zambeze. Mas, a partir de 1975, os Rodesianos passaram a ter uma longa fronteira terrestre em comum com um regime marxista nascido de dez anos de acg&o militar bem sucedida contra as for- gas armadas terrestres ¢ aéreas portuguesas. Os negros na Rodésia, que queriam Iutat por um governo auténomo no seu proprio pais, tinham agora muito maior facilidade em obter as armas ¢ o treino militar adequados, e n&o tardou que toda a Rodésia se visse envolvida numa guerra de guer- tilha fora das cidades. Esta circunstincia veio exercer um esforgo cada vez maior sobre os recursos materiais ¢ morais de uma sociedade colo- nial relativamente pequena, agravado pelo facto de a recessio mundial dos anos 70 reforcar 0 efeito das sangGes impostas ao comércio do seu pais. Em 1977, lan Smith tivera de aceitar que 0 reconhecimento internacional do seu regime s6 teria lugar se aceite 0 principio do governo pela maio- tia. Porém, nenhum dos dois maiores partidos estava disposto a coepe- rar com cle; na verdade, tinham-se conseguido unir recentemente numa Frente Popular, tendo como lider ideolégico Robert Mugabe, com vista a melhor continuarem a luta armada. Por isso, Smith nao teve outra alterna- tiva sendo negociar com politicos africanos mais flexiveis. O resultado foi 507 Historia pa Arrica uma nova Constituigio que parecia a partida prometer 0 sufrdgio universal €, no entanto, reservar uma fun¢do privilegiada para os eleitores brancos. Em 1979, ao abrigo desta constituigao, foi empossado um governo multi- -étnico chefiado por um primeiro-ministro negro, 0 bispo Abel Muzorewa, © o pais passou a designar-se por Zimbabué-Rodésia. Mas este governo no conseguiu nem garantir 0 reconhecimento internacional, nem por termo & guerra Com Os nacionalistas — que, na realidade, se estava a tornar cada vez Mails sangrenta ¢ feroz. Deu-se 0 caso de 1979 ser também 0 ano em que se realizou na capi- tal zambiana de Lusaca uma das reunides regulares dos Chefes de Estado da Comunidade Briténica. Os lideres de todos os Estados afticanos inde- pendentes eram firmes apoiantes da luta dos negros rodesianos e¢ estavam de igual modo a ficar cada vez mais apreensivos com o pais. Por conse- guinte, como eram membros da Comunidade, convenceram Mugabe ¢ os seus colegas, durante a conferéncia de Lusaca, a reunir-se com Smith e Muzorewa numa mesa-redonda em Londres, depois de a Grd-Bretanha ter sido persuadida a convocd-la. A press4o britinica sobre ambas as partes desta conferéncia levou a um acordo de revogagiio da declaragfio unilateral de independéncia, ¢ temporariamente a Rodésia voltou a ficar sob a algada britanica, enquanto se negociava um cessar-fogo, as guerrilhas eram desar- madas e desmobilizadas, ¢ se realizavam eleigdes ao abrigo de uma nova Constituigdo que garantia 0 principio de «um homem um voto» mas que também pela primeira vez dava aos eleitores brancos 20 assentos nos pri- meiros sete anos numa legislatura de 100. Nas eleigdes realizadas em 1980, a ala da Frente Popular de Mugabe alcan¢ou uma vitoria esmagadora, ¢ ele retomou 0 cargo de primeiro-ministro num novo Zimbabue. Chegara ao fim o periodo formal de controlo politico europeu dos assuntos africanos. 508

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