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Algumas reflexões sobre a veterinária

Conversando via rede com dois amigos refletíamos sobre os rumos que toma a
Veterinária e constatávamos que cada vez mais o veterinário é menos valorizado e cada vez
mais a categoria busca reproduzir modelos sem a menor reflexão sobre o que faz. Há todo um
discurso de capacitação, formação e ao mesmo tempo assistimos a uma baixa de
competências técnicas e humanas. Transcrevo algumas considerações que fiz num dos nossos
colóquios.
“Noto também o esvaziamento dos saberes e fico pesaroso por isso. Vejo um
esvaziamento também da profissão. A veterinária tem se fechado em si mesmo, olhando
apenas para o seu próprio umbigo. E o pior, fica olhando para o próprio umbigo, mas por ser
estrábica e míope perde o centro e não consegue ver a realidade. Temos perdido o respeito
por nós mesmos, temos deixado de lado uma formação abrangente e critica para nos
abraçarmos a ritos medíocres.
Estamos matando a semiologia e a clinica, abusando dos exames complementares
sem a menos noção da patologia clinica, do diagnostico por imagem, dos testes imunológicos.
Não refletimos sobre o que falamos, sobre o que engolimos, sobre o que vomitamos em cima
dos outros, dos proprietários. Ouvimos o galo cantar, não sabemos onde, mas pintamos e
reproduzimos o galo de raça que cantou, um lindo Brahma de penas brancas douradas e
negras, patas cobertas de pena. Arrogantes sentenciamos que o galo que cantou e não vimos
era assim e se não for assim não era o galo. Deixamos de lado o conhecer e construir
conhecimento para nos voltarmos para o prescrever, leviano prescrever sobre o que não se
conhece, para quem não se conhece. Nos reduzimos a prescritores. Mas prescritores
competentes, pois nos vestimos impecavelmente de branco. Andamos de branco para todo
lado, desfilando a nossa arrogância e prepotência e esquecendo qual seria a razão do branco,
mas recriminado que se limita a usá-lo a ambientes restritos e com potencial de contaminação
para delimitar áreas de acesso.
Estamos empobrecendo, mas não é o empobrecimento financeiro e social que me
preocupa. O que me preocupa é o empobrecimento cultural. Levantamos a bandeira do
técnico. Somos técnicos e tudo que não é técnico não nos interessa, é coisa menor. Sem
perceber que o técnico tem que saber ler a realidade e para isso não basta à técnica é preciso
se formar na sensibilidade, na compreensão de mundo, na capacidade de ver o outro. De
saber que por trás do animal tem um ser humano que é o sentido da nossa ação. Sem nos
darmos conta a nossa bandeira de excelência técnica está nos empobrecendo como técnicos.
Está nos tornando incompetentes tecnicamente. Está nos tornando qualificados apenas para
reproduzir a técnica e não para adequá-la ao que precisamos, ao que o proprietário precisa, ao
que a sociedade precisa.
Vivemos num inflar de egos, com grandes fogueiras de vaidade, que não nos aquecem,
apenas nos ofuscam. Vivemos sem perceber o paradoxo do nosso tempo e nossa formação, a
contradição na qual nós mesmos deixamos a nossa categoria se afundar. Sem perceber vamos
caindo no trabalhador touro do taylorismo. Aquele trabalhador submetido a um trabalho
escravo, pois não liberta. Um trabalhar que deve apenas executar o seu trabalho sem
questionar a que propósito está servindo. Quando menor for o nosso horizonte de visão
melhor, melhores trabalhadores touros seremos. Logo não há necessidade de formação de
qualidade, qualquer coisa serve, pois não há mais espaço para a universidade, a pluralidade de
pensamentos que constrói a pratica reflexiva. Entra aqui o paradoxo: precisamos cada vez
mais de uma formação mais estreita e de qualidade pior (afinal vamos apenas reproduzir o que
despejam sobre nós), a nossa lógica burguesa é, porém meritocrática e diz que as benesses
devem ser dadas para o mais qualificado (ainda que abra espaço para discutir qual
qualificação) e cria-se a cada dia mais e mais etapas de formação. Eis o paradoxo: o
"Mercado" (deus mercado tão cantado e decantado) quer o trabalhador touro taylorista, a nossa
formação burguesa quer títulos. Esse paradoxo não gera um conflito insolúvel, pelo contrario,
ele é uma galinha dos ovos de ouro para o Capital. Tanto que o Banco Mundial resolveu se
meter na política educacional dos países periféricos, dizer no que se deve e no que não se
deve investir. E a partir da premissa que a graduação não forma ninguém para o mercado de
trabalho propõe uma redução do tempo dos cursos para no máximo três anos, mas que o ideal
seria menos, pois a formação para o trabalho se daria na pós-graduação. Pós-graduação que
não precisa ter compromisso acadêmico, tem apenas que qualificar para apertar um parafuso
especifico com uma chave especifica (começamos a ver esse filme com os mestrados
profissionalizantes, os MBA´s, os cursos de especialização e cada dia uma outra novidade
surge).
Nesse cenário não é de se estranhar que órgãos em crise de identidade passem a
buscar novos meios de se legitimar (veja o Exame de Qualificação Profissional do CFMV que já
tem até cursinho preparatório via Internet). Conhecendo esse direcionamento e sendo capaz
de somar dois mais dois fica difícil não olhar com preocupação a tal de Flexibilização curricular
proposta pela LDB e que passa a ser a tônica dos processos de reforma curricular.
É incrível, mas abraçamos as panacéias com uma facilidade surpreendente. Deixar que
um estudante que sequer conhece qual a extensão do curso que ele por algum motivo
escolheu (muitas vezes de forma equivocada) trace o é ou não importante para a sua formação
é de uma ingenuidade maquiavélica, não há liberdade na falta de verdadeira opção. O mero
desejo ou achismo não gera consistência para uma decisão consciente. Estamos mais uma
vez reduzindo o horizonte da categoria, estamos criando uma grande viseira.
E a técnica é a viseira que nos damos, nos travestimos de especialistas "aqueles que,
segundo alguns, sabendo tudo de nada". Nos vangloriamos disso, pois é melhor que ser
generalista "aquele que sabe nada de tudo", não somos capazes sequer de refletir que esses
conceitos foram alterados em nome de uma lógica que não a da vida. Generalista era o
profissional que tinha condições de atuar em todas as áreas (ou na maioria delas)
decentemente, sendo capaz de ser linha de frente e quando o problema ficasse por demais
exarcebado, sabia a que colega recorrer. Um colega especialista, que era aquele sujeito que
sabia o básico de tudo e sabia alguma coisa de uma forma especial. O especialista tinha a
noção do todo.
É essa visão do todo que a cada dia mais falta nos faz. A interdisciplinaridade deve a
todo custo ser resgatada ou estaremos fadados a sermos técnicos medíocres, seja envergando
chapelão, cinto fivelão, canivete e botina, suja de bosta de vaca e achando que quebrar a cara
em rodeio universitário é o supra-sumo, seja vestido todo branco como se isso fosse um
atestado de competência profissional. Ser peão não nos qualifica como veterinários e se roupa
branca qualificasse cabeleireiros entram exímios veterinários...
É preciso abrir espaços para que os horizontes da veterinária essa profissão tão rica,
tão rica que citar o bordão de "21 em 1" é reduzi-la a sua porção menor. Precisamos fomentar
não só a interdisciplinaridade, mas também o multiculturalismo, a divergência, a diversidade de
olhares e opiniões ou estaremos fadados a ser uma profissão sem valor e sem respeito, talvez
até extinta como as profissões que o Rubem Alves enumera para falar da formação do
educador.
Salve o técnico com técnica apenas dentro da técnica, que reconheça o seu direito de
ser o que quiser, de ser louco se assim o quiser, de ser completo, de ter cultura, de ler poesia,
de escrever poesia, de fazer política. Salvemos o profissional ser humano e cidadão.”
É preciso urgentemente resgatar nossa integridade, salvar nossa categoria profissional
e o atual momento é o momento e não admite omissão.

Idael Christiano de Almeida SANTA ROSA


Departamento de Medicina Veterinária
Universidade Federal de Lavras

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