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LOUT RM Valor LOSO GOR ee, cm ZY) iB Nae fee Tee , OD. N. Fiscal 2 rama aes Procedéncia., : INDICE Pag Proficio & 2 edico os... sees. see IX Prefécio & 1. edigio XII CAPITULO 1 FILOSOFIA DO DIREITO E CIENCIA 4 DO DIREITO Sumario: © divéfeiorentre os filésofos e os juristas — Filésofos e juristas at procura do conereto — Vigéncia,eficécin e fandamento 1 CAPITULO 2 DIMENSOES DA EXPERIENCIA JURIDICA. idade na Alemanba — A tridime imensionalismo na Franca — A tr ‘mensionalidade na érea do “Common Law" — O.tridimensio- nalismo na cultura ibésiea — A lidade em outras ‘reas culturais — Tridimensionalidade especifica 23 CAPITULO 3 POSICAO DO TRIDIMENSIONALISMO JURIDICO CONCRETO ‘Sumério: Scus primrdios em 1940 — Integragdo de fato, valor norma ¢~ Confronto com outras formas de tridimensionalismo especifico — A experiéncia juridica como estrutura tridimen- sional — Outros aspectos da teoria tetas CAPITULO ¢ TRIDIMENSIONALISMO E DIALETICA DE IMPLICACKO-POLARIDADE Sumério: © culturalismo juridico da Escola de Baden suas PS sm ounoscologia e dialéien de complementasiedeas — © normativismo juridico concrete 67 CAPITULO 5 ‘TRIDIMENSIONALISMO E HISTORICISMO AXIOLOGICO Saméric: © Diveto como experitnia histéicocultural — A pew dade eatosfonte da experincia ico juridica — Objeh see ubietvidede na vide do dict — As Sty “certezaseguransa” e “ordem-justiga” seesetteteennee 12 Prefacio a 2° Edicao * ccondmicas © poltioas, refletem-se no sentido de solueSoa jue idiews concretas, vinculadas @ experiéncia e aos valores da A Citnela do Direito, sobretuio a partir da Segunda Grande Guerra, vem se caracterizundo por uma erescense Tuta contra o formalismo, o que implica reptidio ae solugdes pura monte adstratas. Deseja-se cada vez mais cofrelarionar as Giigbes juridicas com a situagéo concreta na qual vivom 03 ‘individwos ¢ 03 grupos, <, Adolo, a8 presen edisio bruit, © preficio quo excrevi special in, cone terry ato Btfoinada pela Univenidade do Chie, aay Vane ‘M80, como forma de retribuir & gentileea. dos iustees mestcs sedenns Prefacio a 1° Edicao ‘Nonhuma tooria jurtdica € valida se no apresenta pelo menos dois requisitos essenciais, entre si intimamente relacionados: 0 primeiro consiste em atender ds exigéncias da Sociedade atual, fornecendo-the categorias légicas adequadas @ concreta solugid de seus problemas; o segundo refere-se @ Sua insercdo no desenvolvimento ge oa, Onceltos Jormulados possam constituir profunda ‘inovagio €m confronto gom-as convicedes dominantes, A originalidade do Jusfilésofo ow do Surista, nao re- gulta de transformacées radicais, como pode ocorrer nas ma. ‘tagdea de 180° que, vez por outra, parecem allerar “ab ‘imis fundamentis” as estruturas das ciénciag fisico-matematious, nio como simples fruto do! cogitagdes cerebrinas, lato nd, obetante, howve quem se apresentasse, hd pouco tempo con, XI ae 4) a preocupagdo pelos problemas da vida huma- na, 0 que go reflete em todas as formas da Filosofia existencial; 2) a compreensdo do indivtduo e, por conseguinte, de seus dircitos ¢ deveres, no em abstrato, mas na conerecdo de swas peculiares circunsténcias, como 0 demonstra a chamada Etion da Situacd ©) @ afirmagéo paralela, tanto nos dominios da Teoria do Conhecimento como nos das ciéncias huma- nas, de que “é mister volver ds coisas mesmas”, con- soante formula amplamente divulgada pela Filosofia fenomenolgica, Outros exemplos poderiam ser lembrados, mas esses so bastantes para compreender-se por quais razdes a Ciéncia Juridica, que é uma das componentes essenciais do- mundo da cultura, passou a abandonar @ colocagdo de seus problemas de mancira abstrata, evitando discussées meramente verbais, ® por conseguinte, cortas contraposicdes genéricas ou absohi- tas que suscitaram, até bem pouco tempo, polémicas infe- cundas, Dat falar-se, especialmente nas tiltimas décadas, em Direito como experiéncia, terminologia que prefiro, e que é, lids, 0 titulo de uma de minkas obras principais; em concre- ao juridiea, ov no Direito como vida humana objetivada etc., todas expressdes que, apesar das idéias que as distinguem, correspondem, porém, a uma mesma aspiractio no sentido de harmonicar a légica das regras juridicas com as exigéncias reais da vida social, Nesse sentido verificam-se, no campo juridico, algu- mas alteracdes de fundo, como @ afirmagiio, por exemplo, de uma verdade esquecida no clima individuatista anterior, de que 0 legislador ¢ 0 jurista devem ter sempre presentes alguns Pressupostos bésicos de ordem moral, A titulo de exemplo, Tembro 0 movimento da “sovialidade do Direito”, a volta soluges fundadas no exame da “naturesa das coisas”, bem: como 0 reconhecimento de que é impossivel redusir a vida x juridica a meras formulas ldgicas ou a um simples encadea- mento de fatos, devendo reconhecer-se a essencialidade dos Princtpios éticos, 0 que explica o fregilente apelo que se volta @ fazer a idéias como a de eqiiidade, probidade, boa fé etc, a fim de captar-se a vida social na totalidade de suas significa g6es para 0 homem situado “em razdo de suas circunsténcias”, Nosse contexto parece-me Ucito afirmar que o tridi- mensionalismo juridico tem 0 mérito de evitar a redugiio da Ciéncia do Direito a uma vaga Axiologia Jurtdica, pelo reco- mhecimento de. que néo sio menos relevantes os asp rates ao plano dos fatos ou d ordenagio das normas, o qué implica, penso eu, uma compreensito dialétioa ¢ compleméntar dos tres fatores operantes na unidads dindmioa ax experténcia juridica, r Adotada essa posigao, 0 problema da “concregiio ju- ridica” adquire giais Seguros pressupostos metodoligicos, per- ‘mitindo-nos apneciar, dz mancira complementar, a interdisci- plinaridade das diversas pesquisas relativas @ realidade juri- dica, 0b 08 prismas distintos da Filosofia do Direito, da So. ciologia Juridica, da Ciéncia do Direito, da Etnologia Juri a etc. A compreensdo unitdria e orgdnica dessas perspect. ‘vas implica 0 reconhecimento de que, néo obstante a alta relevdncia dos estudos légico-tingitisticos, tudo somado, 0 que hid_de_essencial no Direito ¢ 0 problema de seu contetido eis So Paulo, janeiro de 1979 0 Autor XI “teoria tridimenstonat”, ibruch € Roscoe Pound, ndo torge i ndio teriam conse. idénticas, muito em- tos filosdficos, & evi. enéricos « abstratos, = > mara situd-la de dindmica, do neg = de Ayrazme consigqnar aqui que, nessa tarefa, nfo me lem feltado a compreensdo ¢ o estimulo de ilustres jusfilésojos contemporaneos, dentre os quais destaco, pela afinidade espi- ritual que nos une, os nomes ilustres de Luis Recaséns Siches ¢ de Luigi Bagolini, a quem dedico estas paginas. Sd0 Paulo, novembro de 1967 © Autor “expetitncia juridiea” como problema epistemolégico fundamental, com a con ente renovagio dx Dogmitica Juridica, em termos coneretos © oporacio- ral. De csrto modo, o presente estudo comstitui uma introdugio Aqvela obrs, que marea © estado atual de minhas pesquisas justilosofias. Cf. também, MIGUEL REALE, Ligdes Preliminares do Dircito, 62 ed,4Sio Paulo, 1973, ‘bem como, para o estudo dos prestupdstos gerais du preschte monogralis, a mina obra Experiéacia e Culture, Sio Paulo, 1977 Capitulo 1 Filosofia do Direito e Ciéncia do Direito * © DIVORCIO ENTRE OS FILOSOFOS: E OS JURISTAS 1. A verifieacio de que nossa época a ume Profunda renovac&o nos estudos filos6fico-juridieos e, o que € bem mais significativo, a um crescente interesse > por parte dos préprios juristas pela Filosofia do Direito, demonstra que © problema da razio de ser desta disciplna ndo pode ser _abstracto, mas suas necessirias correlagoes fatores hist6ricos e sociolégicos dos quais tude _observada. Se volvermos, com efeito, a atengdo para a proble- mética juridica ainda dominante nas iltimas décadas do sf culo passado, f4cil 6 reconhecer que, no obstante o chamado renascimento do Direito Natural, quer segundo a orientacéio feokantians, quer sob a influéncia eldssica ou a neotomista, @.grande maioris dos juristas permaneceu apegada quase que exclusivamente aos aspectox técnicos ¢ formais do dircito, nos limites de suas aplicagées praticas imediatas, revelando certa margem de desconfianca ou de reserva para com as especula- ‘Ges_filosGfico-juridicas. Reconheeiam eles, em tese, a impor- tancia da Filosofia do Direito como uma ordem de conhec mentos indispensdveis & cultura do jurista, mas nfo admitiam, em geral, que daquela forma de conhecimento pudessem de- fluir_conseaiiéncias essenciais a tarefa da Ciéncia do Direito como tal Essa tomada de pasigio era, alids, compartilhada pelos aultores mesmos da Wilosofia do Direito, que situavam as sues pesquisas antes e depois do trabalho de ordem cientifica, ficando o jurista alheio as cogitagdes filos6ficas no decorrer de_todo_o seu labor positive. Km verdade, & Filosofia Juri- ica, consoante ponto de vista entGo prevalecente, eram reser- vadas duas ordens de estudos: uma de aleance preliminar ou Propedéutico, concernente sobretudo A metodologia do direito; outra de canter mais geral, destinada a esclarecer as cone- x6es ou correlagées entre a Ciéncia do Direito e as ciéncias sociais ¢ histdrieas * ‘Nao resta divida que, enquanto perdurou o primado da Filosofia positiva, como atitude geral englobante de varias orientagdes afins, como as de Comte, Spencer ou Stuart Mill, 1. © lustre mestre brasileito, integrado na Escola Positiva, PEDRO LESSA, apés o colsjo de visias definigdes da Filosofia do Dircito, invocando fs estudos de SPENCER, ICILIO VANNI PUGLIA, terminava por cance- bela como “a parte geral da citneia juridica, que determina © método aplick vel a0 estudo cientfico do direito, expie sistematicamente os prineipios funda- meniais dos varios ramos do saber juridio, e ensina as relagSex deste com 25 ‘iencias antropolOgieas e sovais” (Estudos de Filosofia do Direito, 2+ ed, 1916, pg. 95). Alitude timida, como se v8, quase de compromisso, ¢ que implicava suprimir qualquer distinggo entre Filosofia do Direlto © Teoria Geral do Di- rite, de conformidade, aliss, com a compieensio da Filosofia como uma “eneslopédia das ciéncias”. Referindo-se & situagto do problema, anos de- pois, FRANGOIS GENY ainda observava que a Filosofia Geral, considerads na forma que se tomar entio “quase clissica na Franga”, fazia “da Metodo- Jogi gos citncias a parts mais viva da Légica” (Science et ‘Technique en Droit Privé Positif, 2° ed, 1922, vol. 1, pag. 167), 0 que se traduzia, no plano juri- ico, nas duas tarefas essencinis, a metodoldgica © a siscmética, 2 houve certa correlagdo ou eorrespondéncia entre a8 idéias do- minantes ¢ a atitude do jurista, o qual, na esfera particular de sua ciéncia, procurava obedecer aos critérios metodolégicos vigentes nos demais ramos do conhecimento; mas néo é menos certo que a atitude positivista, no seu affi de objetividade es- trita, levava 0 jurista a exacerbar o culto dos textos legais, com progressiva perda de contato com a realidade histérica ¢ ‘05 valores ideais, Ninguém pode ignorar a alta significagio das contri- buigdes que & Ciéncia do Direito trouxeram a Escola da Exe- ese, 0s pandectistas germanicos ou a “Analytical School”, movimentos que guardam entre si profunda correspondéncia, sobretudo no que toca ao aprimoramento dos conceitos téenicos © ao rigor atingido nas obras sistemticas; mas, como muitas veres s6i acontecer, o aparelhamento conceitual passou a valer em si e por si,,esterilizando-se em esquemas fixos, enquanto 8 vida prosseguia, sofrendo aceleradas mutagdes em seus con- tros de interesse, Estabeleceu-se, em certo momento, um verdadeiro Aualismo ow uma justaposigdo de perspectivas, como yesse um direito para o jurista e um outro para o fildsofo, sada_um_deles_isolado em sen dominio, sem que a tarefa de um repercutisse, de maneira direta e permanente, na tarefa do_outro, Acresce que quando eminentes filésofos do direito reagiram contra 0 positivismo, o evolucionismo ou o histori- cismo empfricos, fizeram-no com base no apriorismo formal dos neokantianos, ¢ tal orientago era a menos propicia a jma correspondéncia com o saber do jurista, nos pola na- tural_diversidade de linguagem, como pela atitude mesma de ‘fastamento_da.problemética_positiva, considerada as vezes de aleance secundério ou empirieo, Por tais. motivos, o di- voreio entre a Filosofia e a Ciéncia ainda mais se_acentuou, comprometida, até mesmo aquela tacita ou implfcita copres- Pondéncia que, apesar de tudo, vigorara em pleno clémas po- sitivista ‘Nem mesmo faltaram atitudes extremadas, felizmen- te excepeionais, vangloriando-se 0 filésofo, enfaticamente, da ‘nutilidade de suas pesquisas para 0 jurista, e 0 jurista vendo, por seu tumo, na Filosofia do Direito um simples adoro ou complemento humanistico da Jurisprudéneia, que devia ser positiva em suas origens, em seus métodos e em seus fins. 2, Pois bem, tal divorcio teorético 86 foi possivel, nao obstante todas as suas insuficiéncias e contradicdes, ate ¢ enguanto a sociedade ocidental se manteve firme em suas estruturas, e 0s sistemas dos codigos e das leis pareceram corresponder, em linhas gerais, as relagées. fundamentais da convivéncia humana, Indo ao fundo do problema, poder-se-ia, contudo, ponderar que determinadas_princpios tiloséfico-juri- dicos continuaram sendo pressupostos pacificamente pelos ju- ristas no instante de suas investigagées puramente, dogmati- cas, Conservavam-se, de certa forma, fiéis & atitude adotada ‘por Savigny,/o qual, apés distinguir no_direito um_elemento individual e particular « cada povo e um outro geral, fundado sobre a natureza comum da humanidade, contentava-se com esta referéneia genérica ao segundo fator: “O fim geral do direito — escrevia ele — provém da lei moral do homem do ponto de vista cristo, Pois o Cristianismo nao se pée apenas ‘como regra de nossas agdes; de fato, cle modificou a huma- nidade, e ele se reencontra no fundo de todas as nossas idéias, ‘mesmo daquelas que Ihe parecem ser mais estranhas e hostis” ‘Uma vez assentes esses pontos de vista, é claro que ‘uma das tarefas fundamentais da Filosofia do Direito, a ati- nente a indagagdo da tabua dos valores que fundamentam a ordem jurfdica positiva, j4 era dada como resolvida e concor- demente implicita no direito positive, subsistindo apenas o problema de como os fins universais da moral cristf se ma- nifestam na particularidade de cada povo, segundo 0 espfrito que Ihe € proprio. Na realidade, porém, a consideragso deste 2. SAVIGNY, Traité de Droit Romain, trad, Guénoux, Paris, 1855, ty pi. Si 4 segundo elemento, que teria aberto a possibilidade de wma compenetragio mais profunda entre Filosofia do Dircito ¢ Gigneia do Direito, nao mereceu maiores estudos: os “histo- ricistas” nfio foram além de referéncias imprecisas, de ins- piragdo romantica, sobre o primado ou a maior autenticidade dos usos e costumes, em confronto com as leis, por serem aqueles considerados mais achegados & fonte viva da conscién- cia popular, Semethantes teses foram, porém, perdendo con- sisténcia até serem absorvidas pelos valores téenicos ¢ praticos que informavam a Jurisprudéncia dominante na Escola da Exegese e na dos pandectistas®, A suposta correspondéncia entre a infra-estrutura social eo sistema de normas vigentes levava, por conseguinte, 6 jurista a concentrar a sua atencdo nos elementos conceituais 01 logico-formais, nao havendo razdes para se distinguir entre Filosofia do Direito e ‘Teoria Geral do Direito, & qual se acabou dando 0 nome feqiiivoco de “Enciclopédia Juridiea”. Quando, Gores Wich amet do stccin nabetlas |obmetor cee parceher que havia poderosas razbes' de conflito entre os fatos e os eédigos, pode-se dizer que cessou, como por encanto, “o sono dogmatico” dos “téenieas do direito” e as cogitar6es filosbfico- juridiens reconquistaram a perdida autonomia, Reconhecido, com efeito, o desajuste entre os siste- mas normativos e as correntes subjacentes da vida social, os dominios da Ciéncia do Direito viram-se agitados por uma nova “ventania romantica”, tal como foi qualifieado 0 movi- mento do “Direito livre” (Freies Recht) ou da libre recherche 3. Ih tem sido aponiado, ¢ tal consideragio vale como sinal de uma Aendéncia dominate no séeulo XIX, que, & medida que a Escola Historica veio progredindo em suas anélises dogmaticas, foi diminuindo seu interese pelos problemas postos pelo Volksgelst, reduzindo-se, afioal, o sew historicismo a ‘uma anétise extrinseea das fontes do dircito: 0 “pandectismo” absorveu 0 “istarciemo®. Em corto momento, © conceptualize juridico (Begriffsuris- ‘prudSke) impora tamibém nos. quadrantes da Escola, pois os elementos hist6- ‘cos passam a valet apenas como maios servico do conhecimento sistems- tico © dogmties do diteito, com base na exegese do-Direito Romano de Tus: tiniana, Cf. LEGAZ Y LACAMBRA, Filosofia del Derecho, 1953, pigs. 90 © seg. . du droit, chegando a ser postos em xeque 03 elementos de cer- teaa indispensiveis & ordem juridica positiva, Foi através dos debates sobre a teoria geral da interpretagéo que as inquieta- Ges filoséfico-juridicas penetraram nos redutos da Ciéncia Juridica, fazendo com que viessem & tona, ou, por outras palavras, que se elevassem & plena consciéncia teorética os pressupostos que jaziam subentendidos na Jurisprudéncia con- Ao mesmo tempo, a Filosofia do Direito embebia-se ica positiva, achegando-se mais concretamente ds cexigéncias praticas do direito, Francois Gény fixou com preciso a nota caracteris- tica da nova fase da vida do Direito, ao demonstrar que que antes era tido pelo jurista como esseneial (“‘o papel e 0 valor das fontes formais”) passara a um plano subordinado, visto como, “no sendo seniio modos contingentes de expressio de uma realidade permanente, as fontes devem ficar subordi- nadas a essa realidade mesma” *, Donde a conclusao: “B, pois, na esséncia e na vida mesma do direito positive que, antes de mais nada, nos cabe penetrar, recolo- cando-o no meio do mundo social, do qual ele € um elemento integrante, para estudé-lo em fungdo das forgas intelectuais e morais da humanidade, que, somente elas, the podem dar real valor””®, Estdvamos, porém, apenas no inicio de um longo e atormentado proceso, que duas guerras mundiais e sucessivas revolucées de Ambito universal iriam acelerar, pondo em crise todo o sistema do direito, porquanto a crise do direito no é sen&io um aspecto relevante da crise geral da civilizaco con- temporainea, De tal sorte que imprevistos fatores ideol6gicos 0 violento impacto das ciéncias sobre a sociedade acentuaram, ainda mais o significado problemético e contingente das estru- turas juridico-formais. 4. GBNY, Sclence et Technique, cit, tT, pép. 41. * 5. Mem, Widem FILOSOFOS E JURISTAS-A PROCURA DO CONCRETO 3. A busca do esseneial e do conereto surge, assim, como uma exigéncia indeclindvel dos novos tempos, Hé um chamado vivo para a Filosofia do Direito, porque esté em Jogo o destino mesmo das hierarquias axiolégieas de enja estabilidade os codigos eram ou ainda se pretende sejam re- flexos. No ineessante renovar-se das normas juridicas, 0 di- reito, que se quer ou que se espera, passa a ganhar terreno sobre o direito que se tem e se ama, Uma atitude inquieta de jure condendo prevalece sobre as trangililas ponderagdes de jure condito, de sorte que a Ciéneia do Direito toda ela esta imersa na problemética do futuro, o que quer dizer do destino humano, em geral; donde a impossibilidade de uma Ciéncia Juridica ausente, distante dos conflitos que se operam no mundo dos valores e dos fatos, Entrecruzam-se, de certa forma, as perspectivas; per- dem preciso as linhas delimitadoras dos campos de pesquisa; complicam-se e se confundem, &s vezes, os temas da Filosofia do Direito, da Teoria Geral do Direito, da Sociologia Juridica ete. como resultado mesmo da instabilidade e das perplexi- dades reinantes, 0 que exige seja novamente reproposto um problema que parecia superado: 0 da classificagdo do conhe- Cimento do diroito, em cujo contexto as relacdes entre Filo- sofia do Direito e Teoria Geral do Direito marcam um aspecto particular, Se no séeulo passado, em pleno.predominio posi- tivista, o problema da classificacdo das ciéncias assumiu os caracteristicos de assunto central da Filosofia, j4 agora a atitude © 0 propésito dos estudiosos so bem outros, de ordem puramente epistémologica, resultantes do fato de terem sur- gido diversas disciplinas destinadas 2 pesquisa da experiéneia do direito, tais como a Sociologia Juridica, a Psicologia Juridi- ca, a Etnografia Jurfdiea ete, que vieram enriquecer a pro- Dlemética da Jurisprudéncia e da Historia do Direito, exigindo, a0 mesmo tempo, a integracdo de todas essas perspectivas, para além de qualquer solugio nos estilos do antigo Enciclo- pedismo, Nem & demais observar que, paralelamente com 0 crescente interesse pelos estudos filosé6fico-jurfdicos, 0 que se afirma eada vez mais 6 a exigéncia de uma Ciénoia Juridica concreta, permanentemente ligada aos processos axiolégicos € histdricos, econémicos e sociais, o que se pode observar em miiltiplas diregdes, sob variadas formas e expresses, amiiide ‘empregadas pelos diversos autores, tais como “infra-estrutura econdmica”, “experiéncia juridica” ,“realidade do direito” ,"fa- to-normativo”, “ius vivens”, “direito como eonduta”, “direito como ordenamento”, “‘direito como fato, valor e norma”, “so- cialidade do direito”, “Jurisprudéncia dos interesses”, “Juris prudéneia dos valores” ete f Se 0 jurista, porém, se interessa cada vex mais pela Filosofia, a reefproca também é verdadeira, visto como os fildsofos do dircito abandonaram também os seus esquemas formais ¢ abstratos para tomarem contato cada vez mais vivo com a positividade do direito, aprendendo a dar valor ao par ticular, ao eontingente © ao empirico, tal como se desenrola € se dramatiza na vida dos advogados e dos juizes, no bojo, em suma, da experiéneia jurfdica, Neste sentido poderemos concordar com Recaséns Siches, quando contrapde a uma Filosofia Juridica académica — que pouco ou nenhuma influéneia exerceu sobre a Ciéneia do Direito — uma outra Filosofia Juridica, ndo-aoadémica, fortalecida sobretudo nos debates que marcaram a erise da interpretagdo do direito a que acima me referi ® Talvez seja preferivel dizer que a Filosofia do Direito © a Ciéncia do Direito coincidem ambas na volte ao objeto, 6. Segundo RECASENS, poder-se-iam considerar expressées ‘8a Filoso- fie Juridica ndo-académica, entre outta, a3 contribuigdes de BENTHAM, JHERING, WENDELL HOLMES, BENJAMIN CARDOZO, ROSCOE POUND, GENY, RIPERT, EHRLICH, KANTOROWICZ, PHILLIP HECK, MAX ROMELIN, MAX ASCOLL ¢ CARNELUTT! Gf. Nueva Filosofia de {a Interpretacion del Derecho, 1956, pig. 26). 8 ‘gue é uma das caracteristieas fundamentais do pensar de nos- 50 tempo: 0 formalismo conceitual da Begriffsjurisprudenz, assim como 0 formalismo @ priori dos neokantianos sofrem ambos a mesma critica, brotada da nova Gnoseologia orien- tada no sentido das objetividades (razio pela qual prefiro de- homind-la Ontognoseologia) e da nova Etiea que se identifica cada vez mais com o sett inevitavel contetido axiolégico. #0 que, no seu conjunto, resulta de uma Filosofia fundamental- mente concreta Ora, se n Filosofia do Direito 6, como penso, a propria Filosofia enquanto tem por objeto uma realidade de significado universal, como é 0 direito, forgoso 6 concluir que, ao procurar atingir as raizes do direito na realidade histérico-social, eon- cebendo-o como “realidade cultural”, voltamos a reeonquistar, paulatinamente, a correspondéncia que necessariamente deve existiv entre a Filosofia, a Filosofia do Direito e a Ciéneia Ju- fdiea: na procyra dessa unidade dialética esta talvez uma das voeagées de nosis, época, sendo esse 0 campo de responsabi- dade em que 0 destino do homem e do jurista se reencontram, correspondendo & universal aspiragado de voltar as “coisas mesmas”, Se é certo que as estruturas légicas da Dogmitica Juridica tradicional ndo correspondem mais as transformagbes operadas na sociedade atual, nem as exigéncias morais e tée- nicas do Estado do bem-estar social ou da Justica social — 7. Como acenta MILE BREHIER, com s sox preciso habitosl, to- dos os temas da Filosofia contemporinea encontram “a sua iinidade no estudo 0 homem, tomado nfo na evolueio geral da natureza e da hist6ria, mas nas suas relagdes concretas e stuais, corpo e alma, com o mundo que o circunda, ‘com © préximo, com a realidade transmundana do homem, no descobrindo 6s principios e valores seni na realizagio efetiva da cincia e na experi¢ncia a vida”... “8 nesse movimento enérgico rumo a0 concreto (trata-se mesmo do titolo de ums bela obra de JEAN WAHT) que so deve buscar a origem dla Filosofia contemporinea” (Les Thimes Actuels de la Philosophie, 1954, igs. 74 © 76) Podese dizer a mesms coisa quanto a origem da Filosofia do Dirsito hhodiema, encontrando-se igual aspiragio pelo concreto na Citncia Juridica tual. Sobre os pressupostos filoséficos dessa comprosnsio, v. MIGUEL REA- LE, Experiéneia e Cultura, cit SxpressGes com as quais se reclama um Estado de Direito con- cubldo ‘em func de uma eomunidade humana plural cap de ano ampo, solidéria —, também é verdade que, ao lado de salutar erise de ordem metodolégica, pde-se outro problems mio menos essencial: o da nova determinagao do significads de Ciéncia do Direito, para 0 destino do homem, 0 que s6 cord Possivel com 0 fermento ou o humus restaurador da Lebene. Uoelt, da vida comum e espontanea, a que se refere Husserl, on sua obra péstuma fundamental *, 4. E de decisiva importancia o fato de interessarem- 5c Os Juristas pelos aspectos filoséficos dos problemas que Ihe sao afetos na tela do direito positivo, razio assistinds a L. Caiani quando — ap6s assinalar a tendéncia “sob muitos as, Peetos filoséfica” da Jurisprudéncia itélica mais recente — V8 nesse fato “a conseqtiéncia da progressiva conquista, tam. bém do lado dos juristas, do conceito de experiéncia juridiea”, 0 tinico idéneo a fornecer o sentido da unidade profunda da Vida do direito © da “necessdria integragéo e interdependén. cia entre Filosofia do Direito, Historia Juridica e Jurispri. aéneia”» ‘Jé fot dito — ¢ a afirmagio 6 vélida se tomada em suas linhas dominantes — que a mentalidade do século XIX foi funddmentalmente analitica ou reducionista, sempre ten- iada a encontrar uma solucéo unilinear ou monocérdica para 0s problemas sociais e historicos, a0 passo que em nossa época Prevalece um sentido conereto de totalidade ou de integracao, ha acepgao plena destas palavras, superadas as pseudototali, zaG0es realizadas em funcio de um elemento ou fator desta. eado do contexto da realidade, Bj USSERL, Die Kriss der ewroptischen Wissenschaften und die Zrresndenale Phdenomenctoge, Wats, 1959. (Trad, W, de Eavico Filippi, 2° ed, Milfo, 1965) $k L CAIANI, Le Filosofia dei Giurist Nalieni, Pkdua, 1958, Sobre peagtlemn: da experiéacia jaridica como extrutura iidimensional, v. MIGUEL, Pale iat Die como Experiénia, cit, Flosota do Dirto, 8 od, Sho Paulo, 1978. 10 Moise . : Analisado 0’ fendmeno juridieo sob esse prisma, veri- fiea-se que a maioria dos juristas ainda se mantém fiel ao espi- tito da passada centiria, pois, em geral, o direito € para cles norma e nada mais do que norma, numa atitude clara, mente contraposta A de certos sociélogos do direito, que s6 yéem o jus em termos de efiedcia ou de efetividade, para ndo falar na posigdo daqueles jusflésofos que, infensos ‘aoa pro. Dlemas que cercam as atividades forenses, preferem pairar no undo dos valores idais, ou se quedam eontemplativns oe” te puros arquétipos ligicos, Quem assume, porém, uma posicéio tridimensionalis- ‘3, jd est 2 meio caminho andado da compreensio do direito om termos de “experiéncia conereta”, pois, até mesmo quando 6 citudioso se contenta com a articulacGo final dos pontos de vista do fil6sofo, do socitogo e do jurista, jé esta revelando salutar repuidio a quaisquer imagens parciais ou sctorizadas, fam 0 reconhecimento da insuficiéneia das perspectivas resul tantes da consideracao isolada do que ha de fatico, de axiols- 2 ico ou ideal, ow de normativo na vida do direito, Tal compreensio concreta da experiéneia juridica fi. F Garia, contudo, comprometida se se pretendesse situar 0 pro- hlema da tridimensionalidade apenas no ambito empirice da! Teoria Geral do Direito, como pretendo fazé-lo Werner Goldach midt, que inexplicavelmente distingue entre uma Filosofia Ju. 2-= ridica maior e outra menor, confundindo-se com esta a teoria tridimensional, que também cle adota, mas com uma concep- = S40 tardia de tridimensionalismo abstrato ou genérico Se, como adverte Recaséns Siches, 0 direito é essen: cialmente tridimensional, essa qualidade ndo pode existir sé Para 0 jurista, no plano de sua atividade cientifico-positiva, mas deve constituir antes um pressuposto de validade trans, cendental, condicionando, por conseguinte, todas as estrutures € modelos que compem a experiéneia do direito, Se assim nao fora, comegaria a existir, nos dominios mesmos da Filo. & S 10. ‘Sobre a improcedtncia dessa distingfo, v. MIGUEL REALE, 0 Dircito como Experiéncia, cit, Ensaio WV, § 1+. 1 {okia do Direito, um pernicioso divéreio entre filsofos ¢ junk tas, visto nada restar entre eles de objetivamente estrutural a tad de correlacionar a5 respectivas tarefas: 6, ao contrdvio, qagimutura axiol6gico-normativa da realidade juridiea que fay sett lim objeto de Filosofia e de Ciéneia: da primeira porque Se ut O8 valores como condigéo transcendental da experién, Beet telte: © da segunda porque indaga des valoracdes que historicamente se coneretizam em modelos juridicos, Nese contexto de idéias, vé-se que a Filosotia do Direito nfo pode se alienar dos problemas da Ciéncia do. Di Feito, mas, ao contrario, deve achogar-se a eles, convertendo-ne em seus problemas, sob outro empregada a palavra problema no algo posto como objeto de andlise, implicando a possibilidade de alternativas, A tomada de posigdo do filésofo nio 6 do jurista, nas Jimbas se exigem e se completam, Se uma visa a atingit 8 realidad Juridica em sua integral eoncrecio — o que im. Plica remontar até os pressupostos essenci soeeSunda propoe-se a compreender a experiéncia jurfdien tal Como Se Coneretiza nos modelos juridicos preseritivos e dog- ‘miticos que atualizam, no plano da condicionalidade histéri. «mos valores transendentais da Justiga , As possibilidades do jurista perante os fatos socinis 56 tém a Iuerar com esse Slongamento de perspectivas, niio s6 pelo conseqtiente apuro de sua sensibilidade, mas também por ser o enfoque axiol6. gico indispensdvel & captaco das “objetivas conexdes de sen. ido", que € 0 que, em ultima anlise, interessa ao juriste rete eieler Haridcos presrtivas sto squeles que se csteuturam como inearasio de fos © valores segundo normas postas em vitude de ua ne Trnnutante de escolka c de prescricao (ato deesdrio) que pode scr tanto de fageack tt $° ive, como resuliar dis oppSes costumeias, Ov de esipleroes ‘adadas na autonomia da vontade, ‘ais modsloe(egaly raisons vo 2 cata neeocia) distinguemae por sea sentido veloial © propecing, 8° contririo do sent setrospectivo das chamades “Fontes formas Tce ea hridicos deemiltcos 0.05 eaborados pela Ciéncia Dogmitica 40 Dircito como estruturas tebrco-comprensivas do signiicads deo sete 12 Guando estuda os fatos sociaia, Ja ¢ tempo de se destazer o Cauivoco de quantos atribuem carder filos6tico a qualquer Pesquisa que envolva a problemética do valor, senr atentacenn para a diferenca dos planos em que 0 filésefo © 0 cientiste eelocam os problemas da validade e da valoragio, com efeito, duas perspectivas do valor, uma al, outra positive ou empfrica: numa o valor é condigao transcendental da historia do direito, a qual é subs. tancialmento, um processo existencial de opcdes ¢ de realize. s6e8 no sentido do justo: sob outro Angulo, o valor se atwalinn Como valoragao efetiva, determinante de solueses pragmétioo. normativas, isto é, de sistemas de modelos destinados a disci, Plinar classes de comportamentos futuros, segundo as diversas circunstancias de lugar © de tempo. Mas se hd correlacio entre a Filosofia e a Ciéncia do Direito, nio € dito que o filésofo possa © deva pensar come Jurista e vieexersa, pois cada um deles tem 0 seu proprio Papel a represdntar, cabendo ao jurista interpretar e aplicar com rigor técnico‘os modelos jurfdicos postos pelo legislador, Pelos costumes ou pela jurisdi¢do, assim como conecber ¢ sf fematizar os modelos tedricos om dogméticos que aqueles mo. eles normativos implicam, no processo de sua vigéneia e de sua eficdeia. Ao filésofo do direito, a0 contrério, essa. tarefa ¢ estranha, por competir-Ihe indagar das razGes universais fun. dantes de todos os modelos atuais e possiveis e, taxbém, do Significado da aco do jurista no ato de interpretar @ de dar cfetiva aplicagéo as estruturas normativas que brotam da ex- periéneia, Juridieos © de suas condigses de vigtneia © de eficicia na sstemdtica do onde: hamento juridico. Sobre a teria dos modelos juridios, v. meu live O Dina, Gitte Esveriéncia, ct, Enstios VII © VIII Ligdes Preliminares de Dich, cit, Caps. XIE a XV. Ct com especial refertncia A Teoria Tridimencional do Diteitoy 0 belo Ios moder NO, RODRIGUES ARIAS BUSTAMANTE “Las cstructurts » {Rt modelos en el Derecho", imetto no Anuarlo, Faculdad de Dersahe tee versidad de los Andes, Cento de Investigaciones Jur ‘ucla, 1978, no 8, A Filosofia do Direito nao deve, em suma, ficar ci cunserita ao exame do problema do método da Jurisprudéncia, hem se contentar com a visio enciclopédica das disciplinas Juridicas, consoante era do gosto do positivismo do séeulo XIX; no pode tampoueo ser convertida em mera “teoria da iguagem do legislador”, conforme propugnam certos neo- positivistas, na sua desconsolada filosofia de puro rigorismo formal: 0 objeto de estudo do jusfilésofo é a experiéneia juri- Gica na integridade de sua estrutura féitico-axiolégico-norma- tiva, enquanto geradora de modelos e de significados juridicos. Por outro Iado, por fundar a sua ciéneia positiva a partir do momento da normatividade, nem por isso pode o jurista perder contato com a experiéncia, tanto com a espontiinea ou pré-ca- tegorial, como com a reflexa ou cient{fico-positiva, pois é a experiéneia 0 campo comum no qual se encontram os destina- tarios das regras de direito, os seus tebricos ¢ os seus ope- radores, Ora, como a experiéncia juridica 6 varidvel em seus pardmetros, de pais para pais, ainda que situados na mesma rea cultural; como as conjunturas hist6rieas ¢ os coeficientes Pessoais de estimativa so diversos perante as mesmas situa- ges de fato, comprecnde-se a multiplicidade das formas de tridimensionalismo juridico — como veremos no capitulo se- guinte — mas sdo todas expresses de um mesmo desideratum, Que consisté em inserir a Jurisprudéncia no fluxo da historia © da vida, sem perda dos valores de rigor técnico, de certeza © de seguranca exigidos por uma ciéneia que, tal como nos ensinam os mestres de todos os tempos, deve ser estvel mas no estdtica, deve ser certa sem se cristalizar em férmulas rigidas, ilusoriamente definitiva: VIGENCIA, EFICACIA & FUNDAMENTO 5. A necessdria complementariedade das pesquisas do filésofo, do soci6logo e do jurista revela-se, de mancira bem marcante, quando se estuda o problema da validade do diroito, questéo que, no dizer colorido de Max Ernst Mayer, cc i ' esvoaca, como um péssaro assustado, por todos os quadrantes do pensamento juridico. Para empregarmos uma expresso popular, densa de significado, a primeira impresso que nos da a lei é de algo feito “para valer”, isto é, de uma ordem ou comando emana. do de uma autoridade superior, Basta, porém, imaginar ma Pessoa na situacdo conercta de destinatdrio do chamado “co. mando legal” para pereeber-se quo complexo 6 problema da validade do direito. Hi, em primeiro lugar, uma pergunta quanto & obrigatoriedade da norma juridica ‘para todos, em Seral, ¢ para determinada pessoa em particular, o que se des. obra em uma série de outras perguntas sobre a competéncia 0 6rgao que elaborou o modelo juridico, a sua estrutura ¢ seu aleance, Além-desse plano de cardter formal, surge tim outro grupo de quest6es, quanto A conversio efetiva da regra de direito em momento de vida social, isto 6, no tocante ae eondicées do rebl Sumprimento dos preceitos por parte dos consociados; e, finalmente, hé uma terceira’ ordem de difi. culdades, que consiste na indagagio dos titulos étidos dos imperatives juridicos, na justica ou injustica do comporta- mento exigido, ou soja, de sua leyitimidade, Ris af, numa percepedo suméria e elementar, os trés fios com que é tecido o discurso da validade do direito, em ter- ‘mos de vigéncia ou de obrigatoriedade formal dos preceitos juri- icos; de efiodcia ou da efetiva Gorrespondéncia social ao seu Gontetido; ¢ de fundamento, ou dos valores capazes de legiti- ‘mé-los numa sociedade de homens livres. Enunciada desse modo » questo, parecem transpa- Tentes Os nexos que ligam entre si os trés problemas mumia cstrutura tridimensional, mag, por um complexo de motivos, ums de natureza histérica, outros dependentes das inclinagées intelectuais dos investigadores, nem sempre prevalece a com. ‘Breensiio unitéria dos fatores que compéem a realidade juri- ica. no raro orientam'se os espfritos. no sentido do. pri- mado ou da exclusividade de uma das perspectivas acima di:- 15 eriminadas, surgindo, assim, solugées unilaterais ou setori- Impée-se reconhecer que houve plausiveis razies his- tOrieas para que, no século passado, por exemplo, predomi- nasse a imagem do direito com base na certeza objetiva da lei # que as estruturas juridieas do Estado de Direito, modelado Sob o influxo do individualismo liberal dominante na cultura burguesa, cujos valores se impunham como expresso natural de toda uma época histériea, correspondiam, eonsoante crenga generalizada, as necessidades e tendéncias da sociedade oito- centista. Os estatutos constitucionais vigentes nos paises de maior densidade cultural, tanto na Europa como na América, bem como os cédigos e os sistemas juridicos privados, funda. dos nos prinefpios da Liberdade politica e da autonomia da vontade, pareciam ser a imagem fiel da realidade social a que se destinavam, muito embora nela jd estivessem fermentando 8 motivos que iriam determinar; na presente centiria, o ciclo de crises de estrutura em que ainda se debatem tanto o Di- reito como o Estado. Dominando entre os juristas a convicgéo de uma cor- respondéneia essencial entre a realidade sécio-econdmica © 08 modelos juridieos conségrados nas leis, era natural que o pro- blema da validade fosse posto em termos de vatidade formal ou de vigéncia, desdobrando-se no estudo dos requisitos da obri- Batoriedade dos preceitos, desde os reclamados para a consti- tuigde regular dos Orgfos legiferantes, até 0 processo reque- rido para a formulacdo de dispositivos que, gracas & certeza, objetiva de seus enunciados, representassem uma garantia aos direitos fundamentais dos cidadfos. Nem se pode dizer que fosse ilus6ria a correspondéncia entre a lei e as relagées sociais entdo disciplinadas. 0 culto & lei, com o eiumento apego A independéncia das fungoes legislativas e ao prinefpio da sepa- ragdo dos poderes; a reducdo do ato interpretative & mera explicitagao do significado imanente ao ato legislativo; a su- 12. Sobre as que denomino “concepp0és unilateras do Direi ‘aha Filosofia do Direto, cit, Caps, XXXUXXXII 16 Wordinacdo do juiz & suposta intengio do legislador; a atengiio qeieade 20 rigor formal dos textos, aliando-se a pradeee So jurista & arte dos flélogos, tudo revelava o statwe da ne matinall convicta da eficdcia © da justica de suas opedes non mativas. No Brasil, entic, como alhures, chegou a tuigio de 1891, e se projeta século XX a sobre 0 Cédigo Civil de jurisconsultos. .. Como se vé, a subordinacio do direito ao an, , reito ao Angulo da Listneia ndo nascia de um propésito astrato, come ie vezes sage clst®, inéorrendo-se no anacronismo de ulgarse ‘pas- © ‘erro foi considerarse imutdvel e titangivel um sistema juridico-politico que, como se sabe, estava prestes a de Direlto fundado ma justiga social, houve elara ercepcao, dalle de sae simistas, de fllsofos de sociSlogos, da neceasi, dalle de abandonar solugées esteriotipadas, incompativels om vuma socledade que parecia disposta a carrer o risco, ainda nin Ww Superado, de comprometer a liberdade individual em prol dos valores da igualdade. 4 claro que, nessa procura de novos caminhos, visan- do a atingir 0 direito concreto, ao qual jé me referi em paginas anteriores, o problema da efetividade ou da oficdcia assumiu posigdo de primeiro plano, passando os juristas a se preo- Cupar eom solucdes forjadas, ao calor da experiéncia so- cial, ainda que com o sacrificio dos valores da certeza e da Seguranga. Fol essa, alids, a trajetéria dramatica percorrida por Jhering, que, apés haver erguido a Jurisprudéneia Con- ceftual a cumes jamais atingidos, proclamou, corajosamente, precariedade de seus esquematismos, abrindo caminhos ner. vosos para a Jurisprudéneia dos Interesses », Mas a tritha da eficdcia no seria reta ¢ sem trope- Gos, mas antes perturbada pela tentacio dos desvios e dos descaminkos, que fizeram e ainda fazem esquecer aquela via mais segura que, partido da jé citada Jurisprudéncia dos Interesses, tende para a soluco mais compreensiva da Ju- risprudéncia dos Valores. 6. Digo que houve a tentagao dos descamithos por uas razdes fundamentais, Em primeiro lugar, houve juristas que, desenganados das solugdes de,ordem intelectiva, recor- Yeram as vias da intui¢éo emocional, esperando captar, num ato de identificacdo afetiva, o jus vivens, descendo até as fontes primordiais da juridicidade. Em alguns autores, a pre- dilego pelo direito esponténeo, ainda ndo ordenado em for- mulas intelectuais, significou o abandono do patriménio, mais que himilenar, de objetividade e de prudéncia que é 0 apa- nagio do Direito, como a mais antiga ¢ madura das ciéncias socials", Tal sedugdo pelo direito em estado nascente, na 13. CL LARENZ, Methodenlehre der Rechiswissenschoft, Berlim, 1960 Cap. TH, § 2. (Na tradugio castelbana de Enrique Gimberat Ordcig, Basce- Jona, 1966, pigs. 59 0 segs) 14. Sobre as virias formas de intuicionismo juridico, v. MIGUEL REA- LE, Fundamentos do Direito, 2* ed, Sko Paulo, 1972, pags. 23 © segs. 18 imediatidade incerta dos desejos © dos impulsos, significava como que tums forma de simbolisiao juridico, contraposto ao Pernasianismo de alguns corifeus da Hscola da Exegese, o que ‘Gio deve surpreender, pois a hist6ria das idéins juridicas, gomo expresso de uma das dimensées essenciais da vida hn. {iana, obedece ao ritmo da historia da arte e da literatura, tendo havido juristas romanticos e realistas, simbolistas ¢ neoeldssicos Him linha paralela, outra encruzithada se abriu aque- les que, deslumbrados com os progressos das ciéncias naturais, conceberam o plano de chegar & efetividade do direito através do método indutivo, nos moldes do que ocorria na esfera das Investigagies fisicas e biolégicas, No fundo, a questo se res. mia no programa ja enuneiado por Augusto Comte ao vatic!. ‘ar @ Substitule#o da “‘metafisiea dos fazedores de leis” pela “ciéncia positiva, dos descobridores de leis”. Foi ooh direcio seguida por todas as formas de soviologismo jurdiico, isto 6, pelos naturalistas ¢ realistes de direito, que euidaram e:sinda cuidam ser possivel v impres. gindivel formar juristas-sociOlogos, destinados & andlise do Fendmeno juridico segundo seus nexos de eausalidade on de funcionalidade, numa “pura deserigio dos dados. juridieos”, Gd instar do que corre na Sociologia. A essa luz, direito a6 Pode ser o dircito em sua oftedcia social, do qual as rogres juridieas seriam signos, como sinteses cxplicativas de uma slasse de resultados ciontificamente previsi Nem faltaram, € claro, solucdes intermédias justa- Pondo, paradoxalmente, o intuicionismo emocional as pesqui- Sas clentifico-positivas, assim eomo também nfo escassearam 15. Como exemplos de pesquisas sob esse Angulo, v. JULIEN BON- NECASE, Humarisme, Classciome, Romantisme dans la Vie du Drott, Patt, Jeu Selenee du Droit et Romantisme, Pais, 1928; LOUIS BOURGES, fe Romantisme Juridique, Paris, 1922. 16. Sobre @ “sociologismo juridico”, ef. minha’ Filosofia do Direto, Shs Gp. YOKE onde focalize especialmente a posislo de LEON DUGUTT, Sis ideas jt contiham implicho 0 superamento do empiismo sociolégice ne Sentido da tcidimensionalidade, 19

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