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Copyright © 2008, Henri Acelrad, Ceca Campello do A. Melo e Gustavo das Neves Rezera Direitoscedios para estaedico 4 ua da Estrela, 79~s¢ andar cer 20931021 ~Rio Ge Janeiro ~ Brasil ‘Teen: (2) 2504-gan ‘email edtoraggaramond.com.br teeter garamand.com be Preparacdo de orginaiserevistoCarmem Cacciaarro Projet rificoeeitoraao Estilo Garamond Anderson Leal (Capa André Castro, pati de desenko de Djavan Honoro,comunidade ‘de Curral Velho de Cima, Acaral, Cea, 2005 Reatica;doEiternitppunturnyeFase~Federago de Orios para Asistencia Social eEducacional Apoio Fundacio Helrch Bal; Fundagdo Ford crP-aasi. exPALOGAGKO-NA-FONTE SINDIGATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVEOS, Anw Acielrad, Henst (© que justia ambiental /Hensi Acselrad, Cecilia Campello do A. ‘Mello, Gustavo das Neves Bezerra. - Rio de Janeiro: Garamond, 2009. Gop. i, Incl bibliografia 1x 978-85-7617-159-2 Justia ambiental, 2. Desenvulvimentoeconbmlco Aspectos ambientais, 3 Sadde ambiental, 4, Movimentos soci, 1. Mell, ‘Cecilia Campellode A. 1 Bezera, Gustavo das Neves, Titulo. 09-c107 03647 cou:so 0109 60109 ove “Todor os dives reservados reprodugae io -autrizada desta publicar3, por qualquer meio, sea total ou parcial, constitu violas da Lei 9.61048. Introducdo Em 1g91, um memorando de circulagdo restrita aos qua- dros do Banco Mundial trazia a seguinte proposicao: Cé entre nés, o Banco Mundial nao deveria incen- tivar mais a migragio de induistrias poluentes para ‘paises menos desenvolvidos? Lawrence Summers, entio economista chefe do Banco e autor do referido documento, apresentava trés razdes para que os paises periféricos fossem o destino dos ramos industriais mais danosos ao meio ambiente: 1) 0 meio ambiente seria uma preocupagio “estética” tipica apenas dos bem de vida; 2) os mais pobres, em sta maioria, nao vivem mesmo o tempo necessério para softer 0s efeitos da poluicdo ambiental, Segundo cle, alguns paises da Africa ainda estariam subpolut- dos, Nesse sentido, lamentou que algumas atividades, poluidoras nao fossem diretamente transportaveis,tais como producao de energia e infra-estrutura em geral; 3) pela “I6gica” econdmica, pode-se considerar que as mortes em paises pobres tém um custo mais baixo do que nos paises ricos, pois seus moradores recebem saldrios mais baixos. a © Memorando Summers, como ficou conhecido, acabou sendo divulgado para além do ambito do Banco Mundial’ e teve uma repercussio negativa para a ins- tituigdo. Diante do mal-estar criado, o referido econo- mista explicou que se tratava apenas de uma espécie de exercicio para provocar a discussio? De qualquer forma, nao obstante a tentativa de se desmentir que o Banco Mundial tivesse intengdes ambientalmente perversas contra as nagdes pobres, Summers, conforme observou o escritor Eduardo Galeano, nao é uma espécie de “poeta surrealista, mas sim um autor da exitosa corrente do realismo capitalista”? Suas declaragdes admitem e justificam um quadro realmente existente de desigualdade em termos de protegio ambiental no planeta, Conforme indica 0 referido memorando do Banco Mundial, é para as regides pobres que se tém dirigido os empreendimentos econd- micos mais danosos em termos ambientais. Do mesmo modo, é nas éreas de maior privagao socieconémica e/ou habitadas por grupos sociais ¢ étnicos sem acesso as esferas decisdrias do Estado e do mercado que se cconcentram a falta de investimento em infra-estrutura de saneamento, a auséncia de politicas de controle dos 1 Vero artigo Let Them Eat Pollution, The Economist, 8 fv. 1992, 6, 2. -Amesma revista que publicou 0 memorando a revelia do autor, afirmou, no niimero sexuinte, que alogiceecontmica ali presente «ra “perfeita’. Hlogion o debate aberto pelo memorando lamen: tando apenas que o autor utilizasse uma linguagem um tanto sgrossera 3. GALEANO, . La Eoologia en ef marco dela impunidad. In: ns, etal, FcolegtaSolidaria Barelona:Fltoral Trotal Fundacidn Alfonso Comin, 996 depésitos de lixo téxico, a moradia de risco, a desertifi- cago, entre outros fatores, concorrendo para suas mas condigdes ambientais de vida e trabalho. Para designar esse fendmeno de imposigao des- proporcional dos riscos ambientais as populacdes menos dotadas de recursos financeiros, politicos e informacionais, tem sido consagrado o termo injustica ambiental, Como contraponto, cunhou-se a nogio de jjustica ambiental para denominar um quadro de vida futuro no qual essa dimensdo ambiental da injustiga social venha a ser superada. Essa nogao tem sido utili- zada, sobretudo, para constituir uma nova perspectiva a integraras lutas ambientais ¢ sociais. (0 presente livro visa fornecer didaticamente um pa- norama geral desse nexo inovador entre a questa social ‘ea questio ambiental, que, conforme discutiremos, esti na contramao do pensamento ecolgico mais consagra- do, Para tanto, trataremos dos principios que norteiam a atuagao das organizacoes e dos movimentos sociais que agem sob tal perspectiva, das principais estratégias de luta ¢ resistencia empregadas, do diagnéstico que se faz acerca das causas da injustiga ambiental, bem como da trajetéria de experiéncias concretas de luta. Por veres, sintetizamos 0 pensamento elaborado pelas diversas redes ¢ organizagoes que articulam a nogio de justica ambiental, Em outros casos, refletimos sobre as experiéncias concretas verificadas no Brasil, em parti- cular aquelas desenvolvidas por entidades associativas articuladas na Rede Brasileira de Justiga Ambiental.‘ 4A Rede Brasileia de Justiga Ambiental oi criada em 2001, por ‘seaside do Seminario Internacional Jutica Ambiental eCidadania, Espera-se que o presente volume contribua para um maior entendimento e para uma maior divulgacao da perspectiva da justica ambiental, que tem se mostrado crucial na experiéncia dos movimentos sociais envolvi dos na busca de alternativas aos modelos de desenvol- vimento excludentes, que concentram em poucas maos o poder sobre os recursos ambientais do pais. realizado em setembro de 2001 na cidade de Niteréi, ceunindo representagdes de diferentes movimentos sociais, oNGs, pesqui- sadores de diferentes regides do Brasil, além de um certo nlimero de pesquisadores e representantes do movimento de Justiga Ambiental dos eva, entre os quais Robert D. Bullard. Ver site www. justicambiental.org br. Movimentos por justica versus senso comum ambiental: a degradacao ambiental nao é “democratica” £.comum identificarmos genericamente a “humanida- de”, 0 “homem” ou “toda a sociedade” como vitimas da crescente degradacao ambiental planetiria, nio importando a maneira ou onde as pessoas vivem. Por intermédio das escolas, da Ty, dos discursos dos governos, das organizacbes nao governamentais, dos, érgios multilaterais, dos jornais e demais meios de disseminagao de valores, representagbes ¢ imagens sobre as relagies sociais entre os homens e 0 que se define como seu “ambiente natural”, aprende-se que a degradacao do meio ambiente é um dos grandes males que acometem as sociedades contemporiineas.. ‘As manchetes dos jornais trazem adverténcias sobre 0 “efeito estufa” ¢ “as mudancas climaticas globais”. Difunde-se a idéia de que estamos todos igualmente sujeitos aos efeitos nocivos de uma “crise ambiental”, Os riscos inerentes is praticas poluidoras e destrutivas que as técnicas produzem, mas nao controlam, pode- riam atingir qualquer ser humano, independentemente de origem, credo, cor ou classe. Assume-se que todos ‘somos vitimas em potencial porque vivemos no mesmo macro-ecossistema global - o planeta Terra Segundo essa representagao dominante do mundo e de seus males, a chamada “crise eool6gica” & enten- dida como global, generalizada, atingindo a todos de ‘maneira indistinta, Nessa concepsao, 0 meio ambiente € percebido como naturalmente escasso, uno homo- géneo, Os “seres humanos” - vistos igualmente como um todo indiferenciado ~ seriam os responsaveis pelo processo de destrui¢ao das formas naturais, do am- biente, da vida, No seio das proprias ciéncias humanas, corriqueira~ ‘mente se articula uma nogdo socialmente indiferenciada das populagdes afetadas: Aecotoxicidade afeta potencialmente a todas, produ- zindo uma contaminagio genérica, por substancias ‘quimicas que atingem indiretamente o meio ambiente por meio de areas de despejo de detrtos, esgotos € por outros canais, € 0 que afirma o socidlogo Anthony Giddens! Procuraremos mostrar que esse raciocinio ¢ simplista e escamoteia a forma como tais impactos estao dis- tribuidos tanto em termos de incidéncia quanto de intensidade. Isso porque € possivel constatar que sobre ‘os mais pobres ¢ 0s grupos étnicos desprovidos de poder recai, desproporcionalmente, a maior parte dos riscos ambientais socialmente induzidos, seja no processo de extragdo dos recursos naturais, seja na disposicao de residuos no ambiente, Sabe-se que a forma de se diagnosticar um problema 1 Gropews, em Para além da esquerda eda direita. Si Paulo: Unesp, 1996, p2s6 2 costuma condicionar a busca da sua solugdo. Assim sucede neste caso. A concepcao dominante do que ventha a ser a questo ambiental, pouco sensivel as suas dimensies sociol6gicas, concorreu para que o tema do “desperdicio” ou da “escasse2” de matéria e energia se apresentasse, mundialmente, como 0 mais importante no debate ecolégico, Simultaneamente, por essa pers- pectiva, a questo ambiental costuma ser vista como de ordem meramente técnica, alheia a qualquer discussio acerca dos fins pretendidos com a apropriacao extensiva ¢ intensiva do meio ambiente na escala em que hoje conhecemos. Tornou-se um pressuposto, notadamente partir da difusao do ideério neoliberal verificada nos anos 1990, que as decisées tomadas “pelo mercado” se realizariam sempre com o maximo de racionalidade, qual seja, com economia de meios, inclusive dos meios ‘materiais do ambiente. E com essa ligica que opera 0 ‘Memorando Summers comentado acima: ao destinar sistematicamente os danos ambientais aos paises, re~ ¢gides e grupos sociais mais pobres, o mercado - supe 0 seu autor - elevaria a eficiéncia global do sistema capitalista ¢ faria com que, em algum ponto no futuro, tecnologias mais limpas viessem a beneficiar também ‘0s mais pobres. £ preciso lembrar que esse esforco tedrico de se ‘compatibilizar a questao ambiental com o pensamento desenvolvimentista e economicista ocorre exatamente no periodo de consolidagao do pensamento neoliberal em escala global. Os ajustes estruturais foram impos- tos pelas instituigbes de Bretton-Woods em todas as economias periféricas do mundo capitalista, dissemi- nando os programas de estabilizagao macroeconémica, B liberalizagao financeira e comercial, desregulacio dos ‘mercados e privatizagao das empresas estatais. Nesse contexto, a discussao ambiental foi incorporada pela mesma “utopia” de um bem-estar alcancével a partir do livre jogo das forgas de mercado. Sob essa stica, quem melhor para combater os desperdicios ambientais se nao as préprias forgas de mercado, que estariam se- cularmente combatendo os desperdicios de recursos produtivos? 0 termo “modernizacao ecolégica” ficou conhe- cido por designar uma série de estratégias de cunho neoliberal para o enfrentamento do impasse ecologi- co sem considerar sua articula¢ao com a questio da desigualdade social. A estratégia da modernizagao ecoldgica é aquela que propée conciliar 0 crescimento econémico com a resolugao dos problemas ambientais, dando énfase a adaptacao tecnolégica,& celebragao da economia de mercado, 8 crenga na colaboracao e no consenso. Além de legitimar 0 livre-mercado como melhor instrumento para equacionar os problemas ambientais, esta concepgio procurou fazer do meio ambiente uma razao a mais para se implementar 0 programa de reformas liberais, A questao ambiental foi combinada de tal forma com a agenda do mercado que, das trés convengies internacionais criadas a partir da Conferéncia da on sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento, a Rio-92 —mudanga climstica, diversidade biologica e desertifi- ‘cagio -, somente as duas primeiras receberam maior atengao da comunidade internacional, por interessarem diretamente aos paises mais ricos. O tema da seca ¢ 4 da desertificagdo, que preocupa seriamente os paises menos desenvolvidos, foi deixado de lado. Essa combina¢ao entre uma concepgao socialmente homogénea da questdo ambiental e estratégias neoli- berais vem constituir 0 pensamento ecolégico domi- nante nos meios politicos, empresariais e nas agéncias multilaterais. Assim, de um modo geral, o debate ecoldgico deixa de interpelar o conteiido do modelo de desenvolvimento, naturalizando-se seus pressupostos atuais em seus trés Ambitos: acerca do que se produz, de como se produz e para quem se produz. ‘A concentracio dos beneficios do desenvolvimento nas maos de poucos, bem como a destinagao despro- porcional dos riscos ambientais para os mais pobres € para os grupos étnicos mais despossuidos, permanece ausente da pauta de discussio dos governos e das gran- des corporacies, O pensamento critico do movimento de justi¢a ambiental Contra o pensamento dominante, que considera “de~ mocratica” a distribuigdo dos riscos ambientais e que se atém ao tema da escassez e do desperdicio, consagrando o mercado como mecanismo por exceléncia para re- gularas questdes do meio ambiente, insurgiram-se os movimentos por justiga ambiental. Estes nao fizeram, porém, uma critica abstrata, Pelo contrério, uma nova definicio da questo ambiental, que incorporasse suas articulacées com as lutas por justiga social, foi uma necessidade sentida por movimentos populares de base, que se viram em situagdes concretas de enfrentamento 5 do que entenderam ser uma “protecéo ambiental desigual”. Na definigio do Movimento de Justica Ambiental dos Eva, justia ambiental: [Ea condigdo de existéncia social configuradal através do tratamento justo e do envolvimento significativo de todas as pessoas, independentemente de sua aga, cor ott renda no que diz respeito & elaboracio, desenvolvimento, implementagao e aplicagao de po- Iicas, leis e regulagdes ambientais. Por tratamento justo entenda-se que nenhum grupo de pessoas, incluindo-se ai grupos étnicos, raciais ou de classe, deva suportar uma parcela desproporcional das conseqiiéncias ambientais negativas resultantes da ‘operacao de empreendimentos industriais, comerciais ‘emunicipais, da execugao de politicas e programas federas, estaduais, ou municipais, bem como das conseqiiéncias resultantes da auséncia ou omissio destas politicas? A nogio de justiga ambiental implica, pois, o direito 2 um meio ambiente seguro, sadio e produtivo para todos, onde o “meio ambiente” é considerado em sua totalidade, incluindo suas dimensGes ecoldgicas, fisicas construidas, sociais, politicas, estéticas e econdmicas. Refere-se, assim, as condigdes em que tal direito pode ser livremente exercido, preservando, respeitando ¢ realizando plenamente as identidades individuais e de grupo, a dignidade e a autonomia das comunidades. A 2 BULLARD, .. Dumping in Dixie: Race, Class and Environmental (Quality. San Francisco/Oxford: Westview Press, 1994. 6 nogio de justiga ambiental afirma, por outro lado, 0 direito de todo trabalhador a um meio ambiente de trabalho sadio e seguro, sem que ele seja forcado a es- colher entre uma vida sob risco eo desemprego. Afirma também o direito dos moradores de estarem livres, em suas casas, dos perigos ambientais provenientes das agdes fisico-quimicas das atividades produtivas. Génese e desenvolvimento 0 Movimento de Justica Ambiental constituiu-se nos EUA nos anos 1980, a partir de uma articulagio criativa entre lutas de carster social, territorial, ambiental e de direitos civis. Jaa partir do final dos anos 1960, haviam sido redefinidos em termos “ambientais” os embates contra as condigées inadequadas de saneamento, de contaminago quimica de locais de moradia e trabalho ede disposigao indevida de lixo toxico e perigoso, Fora entdo acionada a nogiio de “eqiiidade geogratica’: [Refere-se] & configuracio espacial ¢ locacional de comunidades em sua proximidade a fontes de con- taminagao ambiental, instalagoes perigosas, usos do solo localmente indesejiveis, como depésitos de lixo toxico, incineradores, estagOes de tratamento de esgoto, refinarias etc? Nessa mesma época, certs andlises sobre a distribuigéo dos riscos ambientais haviam chegado a conclusao de 3 BULLAKD, xp. Environmental Justice: Strategies for Building Healthy and Sustainable Communities. Paper presented at the 1 WORLD SOCIAL FORUM, Porto Alegre, fev. 2002, 8. y que os impactos dos acidentes ambientais estao desi- gualmente distribuidos por raga e por renda:" areas de concentrago de minorias racais tém uma probabilidade desproporcionalmente maior de sofrer com riscos € acidentes ambientais. Esses estudos também demons- travam que ha uma atuagao do Estado que concorre para a aplicagao desigual das leis ambientais: Hum recorte racial na forma como o governo norte- americano limpa aterros de lixo téxico e pune os poluidores. Comunidades brancas véem uma ago ‘mais répida, melhores resultados e penalidades ais efetivas do que comunidades em que os negros, hispanicos e outras minorias vivem. Essa desigual protesio também ocorre independentemente da comunidade ser rica ou pobre? Nos anos 1970, sindicatos preocupados com a saiide ocupacional, grupos ambientalistas e organizacoes de minorias étnicas se articularam para elaborar, em suas respectivas pautas, o que entendiam por “questdes ambientais urbanas”, Alguns estudos jé apontavam a distribuigao espacialmente desigual da poluigao se- gundo a raca das populacdes mais expostas a ela, sem, 4 Olivro de Cole & Foster sobre o racismo ambiental eo nascimen- to do movimento por justia ambiental contém um abrangente apéndice onde std compilada ura bibliografia dos etudos sobre ‘osimpactos desproporcionais dos acidentes ambientais por raga ‘em menor medida, por renda, COLE, w. FOSTER, SR. From the Ground Up: Environmental Racism and the Rise of Environmental Justice Movement. New York and London: New York Univesity Press, 2001 p55 5 COLES FosTER, op. cil, ps7 8 contudo, conseguir mudar a agenda puiblicaa partir das cevidéncias reunidas. Em 1976-77, diversas negociacdes foram realizadas tentando montar coalizdes destinadas a fazer entrar na pauta das entidades ambientalistas tradicionais o combate & localizagio de lixo téxico e perigoso, que era predominante em dreas de concen- tragdo residencial de populacdo negra. A constituigao desse movimento se afirmou, porém, ‘com a experiéncia concreta de luta desenvolvida em Afton, no condado de Warren, na Carolina do Norte, em 1982. A partir de lutas de base contra iniqilidades ambientais em nivel local, similares 4 de Afton, 0 Movimento elevou a “justica ambiental” & codigo de questo central na luta pelos direitos civis. Ao mesmo tempo, ele induziu a incorporacao da desigualdade ambiental na agenda do movimento ambientalista tradicional. Como 0 conhecimento cientifico foi cor- rentemente evocado pelos que pretendiam reduzir as politicas ambientais & adogao de meras solugoes técnicas, © Movimento de Justica Ambiental estruturou suas es- tratégias de resisténcia recorrendo de forma inovadora produgo prépria de conhecimento. Lancou-se mao entdo de pesquisas multidisciplinares sobre as condigbes da desigualdade ambiental no pais. Um momento crucial dessa experiéncia foi a pesquisa realizada por Robert D. Bullard em 1987 a pedido da Comissio de justiga Racial da United Church of Christ, que mostrou que “a compo- sigdo racial de uma comunidade é a varidvel mais apta aexplicar a existéncia ou inexisténcia de depésitos de rejeitos perigosos de origem comercial em uma érea’® 6 LAVTURI, Me xiRnY, A. Finding Faimnessin America’s Cities? The » Evidenciou-se naquela ocasiio que a proporgao de resi- dentes pertencentes a minorias étnicas em comunidades que abrigam depésitos de residuos perigosos era igual 0 dobro da proporgdo de minorias nas comunidades desprovidas de tais instalagdes. O fator raga revelou- se mais fortemente correlacionado com a distribuigdo locacional dos rejeitos perigosos do que o préprio fator baixa renda, Portanto, embora os fatores raga e classe de renda tivessem se mostrado fortemente interligados, raga revelou-se, naquele contexto e circunstancia, um indicador mais potente da coincidéncia entre os locais ‘onde as pessoas vivem ¢ aqueles onde os residuos téxicos sio depositados (ver Mapa 1). Foia partir dessa pesquisa que o reverendo Benjamin Chavis cunhou a expressdo “racismo ambiental” para designar “a imposigéo desproporcional ~ intencional ou nio ~ de rejeitos perigosos as comunidades de cor”? Dente os fatores explicativos de tal fato, foram alinhadas a disponibilidade de terras baratas em comunidades de minorias e suas vizinhangas, a falta de oposigao da populacio local, por fraqueza organizativa e caréncia de recursos politicos ~ condigdes tipicas de comunidades de “minorias” -, a falta de mobilidade espacial dessas “minorias” em razdo da discriminagao residencial e, por fim, a sub-representagdo desses mesmos grupos nas agéncias governamentais responsiveis pelas decisdes de localizagao dos rejeitos. Ou seja, procurou-se tornar Search for Environmental Equity in Everyday Life In: Journal of Social Isues, v.50, 2.31994, 135, PINDERMUGHES, x. The lmpact of Race on Environmental Quality ‘An Empirical and Theoretical Discussion, Sociological Perspectives, ¥639,m.2,p. 2411996. MAPA. Distribuicio dos depésitos de lixo t6xico nos Bs, mostrando a coincidéncia entre a sua localizagio ‘eos locais de moradia de minorias étnicas. Fonte: BULLARD, R.D. Confronting Environmental Racism ~ Voices {rom the Grassroots, Boston: South Ena Press, 983... evidente que forcas de mercado e praticas discrimi- natérias das agéncias governamentais concorriam de forma articulada para a produgao das desigualdades ambientais. E.quea viabilizagao da atribuigao desigual dos riscos se encontra na relativa fraqueza politica dos grupos sociais residentes nas areas de destino das instalagées perigosas, comunidades ditas “carentes de conhecimento”, “sem preocupagdes ambientais” ou “féceis de manejar”, na expresso dos consultores detentores da ciéncia da resistencia das populacées & implantacao de fontes de risco® 8 Cerell Associates, Political Difficulties Facing Waste-to-Energy Conversion Plant Siting, ta, cA, 1984, apud picmino, c, Lajusticia a ‘Apartir de 1987, as organizagdes de base comecaram a discutir mais intensamente as ligagdes entre raca, pobreza e poluicao, e os pesquisadores expandiram seus estudos sobre as ligagdes entre problemas am- bientais e desigualdade social, procurando elaborar os strumentos de uma “avaliagao de eqitidade ambien- tal” que introduzisse varidveis sociais nos tradicionais estudos de avaliagao de impacto, Nesse novo tipo de avaliacao, a pesquisa participativa envolveria, como co-produtores do conhecimento, os préprios grupos sociais ambientalmente desfavorecidos, viabilizando uma integragao analitica apropriada entre os processos biofisicos e sociais. Postulava-se, assim, que aquilo que os trabalhadores, grupos étnicos e comunidades residenciais sabem sobre seus ambientes deve ser visto como parte do conhecimento relevante para a elaboragao no discriminatéria das politicas ambientais. Ocorreram, entao, mudangas no ambito do proprio Estado, Pressionado pelo Congressional Black Caucus, «em.1990, a Environmental Protection Agency do gover- no dos EWA criow um grupo de trabalho para estudar 0 risco ambiental em comunidades de baixa renda, Dois anos mais tarde, esse grupo concluiria que faltavam dados para uma discussao da relagao entre eqitidade e meio ambiente e reconhecia que os dados disponiveis apontayam tendéncias perturbadoras, sugerindo, por essa razo, uma participagao maior das comunidades de baixa renda e das minorias no processo decisério relativo &s politicas ambientais. ‘social la justicia ambiental en los Estados Unidos: la naturaleza ‘como comunidad. In: Ecologia Poltica, n° 17, p05, 199. 2 Em 1991, os seiscentos delegados presentes na I Cipula Nacional de Liderancas Ambientalistas de Povos de Cor aprovaram os “17 Prinefpios da Justiga Ambiental”, estabelecendo uma agenda nacional para redesenhara politica ambiental dos Eva a fim de incorporar a pauta das “minorias’, das comunidades amerindias, latinas, afro-americanas e asidtico-americanas, tentando mu- dar o eixo de gravidade da atividade ambientalista naquele pais? O Movimento de Justia Ambiental consolidou-se assim como uma rede multicultural e multirracial nacional, e em seguida internacional, articulando entidades de direitos civis, grupos comunitérios, or- ganizagbes de trabalhadores, igrejas e intelectuais no enfrentamento do “racismo ambiental”, visto como uma forma de racismo institucional. Buscou-se assim fundir direitos civis e preocupagdes ambientais em uma ‘mesma agenda, superando-se vinte anos de dissociagéo e suspeita entre ambientalistas e movimento negro. Efetivamente, o Movimento por Justica Ambiental ado- tou estratégias de luta histéricas dos movimentos pelos direitos civis, tais como protestos, passeatas, peticdes, lobby, relatérios, apuragao de fatos e audiéncias para instruir a comunidade e intensificar o debate puiblico sobre a questio. Os criticos do modelo industrialista energético- intensivo culpam os capitais que detém o controle da industria de combustiveis fdsseis e apontam que, quando ocorrem catastrofes climaticas, os pobres 9 BRADEN, A. Justice Environnemental et justice sociale ux Bats Unis. I: Ecolgie Politique, 1, e 1994 3 pagam o prego do consumismo dos ricos ~ ou, como no caso do furacao Katrina, que atingiu Nova Orleans nos EVA em 2005, pagaram os custos da concentracio dos recursos priblicos na invasao do Iraque."* Os afro: americanos constitu‘am 67% da popula¢ao de Nova Orleans e foram proporcionalmente mais vitimados pelo furacao e suas conseqiiéncias. As imagens dos corpos das vitimas demonstraram a cor dos que nao conseguiram escapar, levando a revista Newsweek de setembro de 2005 a publicar em sua capa uma foto das vitimas com os dizeres “Pobreza, raca ¢ Katrina — ligoes de uma vergonha nacional”. Eric Klinenberg jé mostrara, na seca de 1995 em Chicago, como os negros pobres mais idosos, socialmente isolados e desprovidos de recursos foram as vitimas fatais." No ambito da sociedade civil norte-americana, a cemergéncia do Movimento por Justiga Ambiental rea- lizou um duplo deslocamento: por um lado, promoveu uma aproximacao do movimento pelos direitos civis ‘com as questdes ambientais a partir da explicitagao de ‘que também nesse campo os nao-brancos eram penali- zados; por outro, despertou as entidades ambientalistas tradicionais para as lutas contra a desigualdade.” A 10 Noeaso do furacao Katrina € sabido que os planos de evacuagao ‘do deram aten¢io populacio “com baixa mobilidade” ~ fatores como raga e classe foram considerados dimensdes fundamentals da catistrof 11 rasen, » Katrina in Perspective: The Disaster Raises Key Questions About the Role of Government in American Society. In: Dissent, sumamer, 2005 12. Esteteria sido o caso, por exemplo, daentidade Farth Firsthl, que costumava atuar meramente no campo da defesa da fauna selva 4 reivindicagdo por justica ambiental ~ compreendida como o tratamento justo eo envolvimento pleno dos grupos sociais, independentemente de sua origem ou renda, nas decisdes sobre 0 acesso, a ocupacao e 0 uso dos recursos ambientais em seus territ6rios ~ alterou a configuragao de forgas envolvidas nas lutas ambien- tais a0 considerar o cardter indissocidvel de ambiente ¢ sociedade politizando a questio do racismo e das desigualdades ambientais. Principios e estratégias ‘A partir da década de 1980, nos Eva, uma série de lutas que articularam a questo ambiental com a da dsigualdade social foram capazes de dar f6lego a uma reflexio e a uma mobilizagio social mais abrangentes, ‘que extrapolavam os limites das experiéncias anteriores, localizadas ¢ especificas. Na verdade, aqueles militantes debase e/ou académicos que inicialmente levantaram a bandeira da *justica ambiental” diagnosticaram pro- blemas e estabeleceram principios eestratégias de luta que foram capazes de se fazer reconhecer e identificar por uma série de outras experiéncias mundo afora Muito além da problematica especifica das relagdes entre a alocagao de residuos téxicos ¢ das lutas pelos itos civis dos negros dos Eva, impulsionou-se uma reflexdo geral sobre as relagdes entre risco ambiental, pobreza e etnicidade. ‘gem, mas que, num dado momento, judou a barrar um projeto de ‘onstrugao de um incinerador no centro-sul de Los Angeles 5 Principios Mas, no que se constitui esse contetido capaz de unir experiéncias t4o diversas a ponto de engendrar uma rede nacional de lutas solidérias e que, conforme se veré mais adiante, mais tarde lograra se tornar inter- nacional? Fis, a seguir, os principios e estratégias mais gerais que tém orientado a constituicéo das redes de justiga ambiental. 1, Poluigdo téxica para ninguém “Poluigdo téxica para ninguém” tornou-se um dos prin- cipais lemas do Movimento, como forma de declarat sua diferenga diante dos embates ambientais que se guiam pela légica do chamado “individualismo possessivo”** ‘que sao indiferentes ao fato de se acarretar um deslo- camento espacial da poluigdo, “exportando a injustiga ambiental” para os bairros, cidades ou paises onde os trabalhadores estejam menos organizados. Para 0 Movimento, ao contrario, atribui-se & nogio de justiga ambiental uma luta de carater solidario, que busca colocar na pauta publica a dentincia do que seria uma verdadeira logica sociopolitica promotora da desigual- dade ambiental. Sua configuracao em redes nacion. vem justamente atender a essa demanda de se fechar 15, Otermo “individualismo possessivo” tem sua origem na obra de consttucionalistasetericos do Estado contemporineo, eéutilizado para designar acorrentecontratualista de meados do século:xv1t, ‘que teve como um de seus ideais a defesa ea garantia irestit, pelo Estado, das propriedades dos individuos (cf. MACPHERSOX, ©. Aeoria politica do individualismo possessive de Hobs até ‘Locke. Rio de Janeiro: Pare Terra 1979). 26 © cerco contra empreendimentos ambientalmente perversos, impedindo que qualquer tipo de populagio politicamente mais fraca sofra suas conseqiiéncias. ‘Adotando tal comportamento, os movimentos por justiga ambiental vém pondo em xeque as correntes sim- plistas da sociologia do meio ambiente, que reduziram 6s conflitos ambientais & disputa interlocal movida pela recusa generalizada de relagoes de proximidade com as fontes de danos ambientais — 0s movimentos wIMBy (em inglés: not in my backyard — “nao no meu quintal”) Ao contrario da dinamica individualista do Nimoy, aquelas lutas colocam em discussdo os prinefpios de justiga que orientam as decisdes locacionais dos males ambientais. Negando a hipdtese de que é generalizada 4 postura individualista que busca empurrar os males ambientais “para 0 quintal dos outros", o Movimento de Justiga Ambiental critica o critério “sempre no quintal dos pobres e negros”, politiza o debate sobre 0 enfrentamento da poluigio e propée “poluicio toxica para ninguém’, 2, Por um outro modelo de desenvolvimento Como conseqiiéncia légica do principio da “poluigio para ninguém’, 0 Movimento é levado a contestar 0 proprio modelo de desenvolvimento que orienta a dis- tribuigao espacial das atividades. Até aqui o modelo de desenvolvimento tido como ambientalmente perverso viria se mantendo porque configurou um padrao so- ciopolitico que sobrecarrega de maleticios & satide e ao bem-estar as populacdes destituidas de recursos financeiros ou politicos. 2 Os participes do Movimento acreditam que prote- gendo os despossuidos da concentraao dos riscos se estara criando resisténcia a degradacio ambiental em geral, posto que os impactos negativos nao poderio mais ser transferidos, como de praxe, para os mais pobres. A propensao de todos os atores sociais a iden- tificar e eliminar as fontes do dano ambiental tendera, conseqiientemente, a se intensificar. Acredita-se ser legitima a discussio ambiental ma- joritaria tendo por base a preocupagao com a economia de recursos ambientais — égua, solo fértil, florestas. Mas, ‘numa perspectiva de justiga e democracia, agrega-se a essa preocupagao um questionamento quanto aos fins pelos quais esses recursos esto sendo usados ~ sao eles usados para produzir o qué, para quem e na satisfagao de quais interesses? Para produzir tanques ou arados? Para servir & especulagao fundidria ou para produzir alimentos? Para dar prioridade & geracao de lucros para as grandes corporacOes ou para assegurar uma vida digna 4s maiorias? Eis ai o cerne da discusséo que se abre sobre a necessidade de um novo modelo de producao e consumo. 3. Por uma transigao justa Afirma-se a necessidade de se discutir e transformar © modelo de desenvolvimento dominante, mas consi- Gerando os passos graduais que se fazem necessitios. ‘Tratou-se assim de discutir a pauta da chamada “transi- ‘40 justa” de modo que. luta contra a poluicao desigual nao destrua o emprego dos trabalhadores das indistrias poluentes ou penalize as populagdes dos paises menos 8 industrializados para onde s transnacionais tenderiam a transferir suas “fabricas sujas”. Outra razdo para que se levante a bandeira da tran- sigio justa é por preconizarem uma alianga estratégica com os sindicatos. Considera-se que os trabalhadores organizados sto aliados fundamentais, dado que pos- sitem tum conhecimento privilegiado do que se passa no interior das unidades produtivas. Assim, eles seriam um ator decisivo ~ e, até agora, reconhecidamente pouco ‘mobilizado - para se obter mudangas substantivas nos padries tecnol6gicos e locacionais do modelo produtivo, combatendo seus impactos danosos na sade ambiental edo trabalhador Por sua ver, diversos sindicatos e centrais sindicais ttm aderido &s redes de justica ambiental. Eles mostram- se cada vez mais motivados pelas lutas ambientais, quando percebem que tais lutas podem favorecer 0 estabelecimento de novos tipos de aliancas entre atores sindicais e nio sindicais, ajudando inclusive as préprias entidades sindicais a se estruturarem em periodos re- cessivos, quando o desemprego ameaca particularmente sta capacidade de mobilizar os trabalhadores.* 4. Por politicas ambientais democraticamente institu(das ~ politizagdo versus crenga no mercado J&expusemos aqui que a perspectiva da modernizagao ecoldgica supde que a degradacao ambiental é uma 14 AGSELKAD, H, Justiga Ambiental ~ novasarticulagées entre meio ambiente e democracia,In:Thase/cur-xy/tweua-uFR}, Movimento Sindical e Defesa do Meio Ambiente - o debate internacional, série Sindicalismo e Justia Ambiental, v3, Rio de Janeiro, 2000, pra. 0 dinamica cega as desigualdades sociais, de onde se infere que bastaria economizar “matéria e energia” pela ativacao crescente de mercados para se promover o bem-estar socioambiental. O que se almeja, nesta perspectiva conservadora, é 0 encurtamento do espaco da politica ea extensio da esfera das relagies mercantis sobre o social. J4 08 movimentos por justica ambiental adotam a perspectiva diametralmente oposta, identificando que a auséncia de uma regulagao efetiva sobre os grandes agentes econémicos do risco ambiental é 0 que possibili- ta que estes procurem livremente as comunidades mais carentes como vitimas preferenciais de suas atividades danosas. Nao se almeja um fortalecimento das relagoes ‘mercantis, pois estas jd seriam onipotentes e onipresen- tes o suficiente para submeterem os territsrios dos pobres € tnicamente marginalizados a serem os receptadores por exceléncia dos empreendimentos que a sociedade em geral recusa ter como vizinhos. A universalizacao dos beneficios socioambientais via decisoes tomadas pelos agentes econdmicos mais “eficientes”, apregoada pelos idedlogos da modernizagao ecoldgica, seria uma falicia comprovada pela propria motivacao das lutas por justica ambiental que vém emergindo, Portanto, acredita-se que a injusti¢a ambiental cessa- ri apenas coma contengdo do livre-arbitrio dos agentes econdmicos com maior poder de causar impactos am- bientais, ou seja, pelo exercicio mesmo da politica, nos ‘marcos de uma democratiza¢ao permanente, 30 Estratégias A democratizagao dos processos decisérios implicaria o pleno envolvimento informado das comunidades € organizacées sociais de base nas decisdes acerca da alocagao de empreendimentos, sejam eles de infra- estrutura, produtivos ou de descarte de substincias, supondo-se sempre, portanto, a socializagao integral das consultas e das informagdes sobre 0s riscos que estes empreendimentos geram. 1. Produgdo de conhecimento préprio Como o conhecimento cientifico tem sido correntemen- te evocado pelos que pretendem reduzir as politicas ambientais & adocdo de meras solugdes técnicas, 0 Movimento de Justiga Ambiental estrutura suas estra- tégias de resisténcia recorrendo de forma inovadora a uma produgdo propria de conhecimento. Conforme vimos, na experiéncia norte-americana destacou-se a pesquisa socioespacial que mostrou que “a composicao racial de uma comunidade é a varidvel mais apta a explicar a existéncia ou inexisténcia de depésitos de rejeitos perigosos de origem comercial em uma rea”. Quando da discussio de impactos de empreendimento, igualmente se procura construir um quadro abran- gente, incorporando questoes de participagio publica, institucional e politica e incluindo a consideragio das dimensoes sociais, culturais, econdmicas e institucio- nais vivenciadas pelos grupos atingidos, assim como os efeitos dos empreendimentos nos modos de subjetivacao enna satide fisica e mental de individuos e grupos. A produgao de conhecimento para a chamada Avaliagio a cioambientais desiguais de qualquer atividade publica ou privada que altere de maneira indesejada a maneira como as pessoas moram, trabalham, relacionam-se ‘umas com as outras, elaboram sua expressao coletiva € seus modos préprios de subjetivacao. 2. Presséo pela aplicagao universal das leis Dentro da perspectiva da “poluigdo t6xica para nin- guém’, uma estratégia fundamental ¢ reivindicar a eqitidade na aplicagao da lei, argumento que concede legitimidade social as lutas do Movimento, Parte-se de uma percepcio de que 0 cumprimento desigual da legislacao tem sido uma condigao basica para a ocor- réncia da protecdo ambiental desigual. O dispositivo para a prote¢4o muitas vezes existe em lei, mas esta costuma ser desconsiderada pelos érgios licenciadores e fiscalizadores quando a populacao impactada é pobre lou etnicamente discriminada. ‘Tem-se como alvo 0 aparato estatal, cuja atuagio possui um padrio de permissividade e incentivo & alocacao dos riscos ambientais sobre os socialmente ‘ais fracos, seja nos paises ricos ou periféricos. 43. Pressdo pelo aperfeicoamento da legislagao de protecao ambiental Dependendo da localidade, das caracteristicas de sua legislagéo ou da natureza do conflito, a pressio pela instituigao de novas leis torna-se uma estratégia necesséria. A titulo de exemplo, podemos citar pelo menos dois casos de éxito nesse sentido: a conquista da exigencia de estudos de impacto para a instalagio 2 de incineradores no estado da California ¢ a lei que condicionou a implantagao de grandes projetos de monoculturas de eucalipto a elaboracio de planos de ‘zoneamento ecoldgico-econdmicos nos estados do Rio de Janeiro e do Espirito Santo, Ambas as inovacdes legislativas - embora, no caso brasileiro, desfeitas posteriormente pelos grandes interesses — foram con- seguidas a partir de muita mobilizagio, construgio de ‘espagos publicos de debate e canais de conversacao dos movimentos com parlamentares. 4. Presséio por novas racionalidades no exercicio do poder estatal Um dos principais desafios do Movimento tem sido, definitivamente,o de alterara “cultura” das entidades publicas responsaveis pela intervengao estatal sobre © meio ambiente, que se caracterizam por terem um padrao de intervencao tecnicista e a posteriori, pouco sensivel is variéveis sociais e culturais do gerenciamento do risco ambiental. Nos EU, jé hd algum tempo o Movimento atua pro- curando evidenciar as dimensdes socioculturais da pro- tecdo ambiental para as proprias agéncias reguladoras do Estado, Gragas & pressao, aos poucos vem se obtendo esses érgios a adogio do “principio de precaugio” como légica de atuagao, confrontando a antiga mentalidade legitimista de se conceder licengas tacitamente e com base em percepgdes de risco alheias aos moradores das circunvizinhaneas dos empreendimentos. Por vezes, as cobrancas pela introducao de vari- 4veis socioambientais no aparato estatal de regula: ago obtém éxitos no préprio campo da 3 institucionalidade. Conforme apresentamos no topico sobre génese do Movimento nos eva, a Environmental Protection Agency, pressionada pelo Congressional Black Caucus, criou um grupo de trabalho para estudar 0 risco ambiental em comunidades de baixa renda. Dois anos mais tarde, esse grupo concluiria que havia falta de dados para uma discussio da relacio entre eqilidade emeio ambiente e reconhecia que os dados disponiveis apontavam tendéncias perturbadoras, sugerindo, por essa razdo, uma participagdo maior das comunidades de baixa renda e das minorias no processo decisério relativo as politicas ambientais. 5. Introducao de procedimentos de Avaliagio de Egitidade Ambiental Como forma de desenvolvimento da estratégia descrita cima, o Movimento tem buscado elaborar alternativas de avaliacao de impacto ambiental, Os métodos tradi- cionais de avaliagio de atividades produtivas e projetos de desenvolvimento tém sido fortemente criticados por Separarem o meio ambiente de suas dimensdes socio- politicas e culturais. Eles produzem com freqiiéncia ‘uma separaca0 indevida entre os processos biofisicos €a diversidade de implicagoes que estes tém quando relativos a0 uso e significacdo préprios aos diferentes grupos sociais que compartilham 0 territério, Os diversos elementos do meio, vistos como biéticos ou abidticos, lenticos ou pedoldgicos etc., via de regra no sio associados & diversidade sociocultural dos que deles dependem, seja em termos de renda, raga, género ou etnia, Por isso, a Rede Brasileira de Justiga Ambiental Fy estabeleceu como um de seus objetivos principais 0 desenvolvimento de metodologias de “avaliagao de eqiiidade ambiental” como alternativas aos métodos, Lradicionais, como os E1as/timas (Estudo de Impacto “Ambiental/Relatério de Impacto Ambiental), Considerou- se que estes iltimos tém sido incapazes de retratar a injustiga ambiental contida em determinados projetos, servindo, implicitamente, a legitimacao de aces e im- pactos inaceitiveis, se consideradas apropriadamente as dimensdes socioculturais. Conseqiientemente, eles tém sido mais apropriados pelos interesses econdmicos ‘envolvidos nos projetos e na prépria elaboracao repetida de estudos de impacto, formalmente padronizados € socialmente vazios, produto do que se configurou como uuma espécie de “industria de E1as-RIMas”. 6, Agdo direta Da mesma forma que a maioria dos movimentos de contestagao de base popular, o Movimento de Justica Ambiental também recorre as agdes politicas do tipo “agai direta’. Os negros nos EU ja possuiam uma vasta experiéncia com acoes desse tipo desde as lutas pelos direitos civis que tiveram auge nos anos 1960. No Brasil, o Movimento Nacional de Atingidos por Barragem (man) também costuma adotar priticas dessa natureza, como ocupar canteiros de obras de barragens © os prédios das empresas empreendedoras. Asestratégias que estamos denominando aqui como de “agao direta” constituem principalmente uma for- ma de questionar os empreendimentos e de abrir um debate sobte a pertinéncia ou nao de que estes sejam realmente levados a cabo no territério, em conjunturas 3% nas quais as populacde consultadag se eS mPactadas sto pouco ou nada A Difusdo espacial do movimento ‘m condigées de desis i igualdade social e de : ; poder, be como deliberdadeinesttade movimertoparaes ca ain fraqueza dos instrumentos correntes de controle ambiental tende a favorecero aumento da desigualdade eer sancionando a transferéncia de atividades latorias para dreas onde a resisténci resisténcia social é A solidariedade Male interlocal, eventualmente i A soidredae , Imente internacio- tal jnstcada com forma de evar expr ga ede difcultar a mobil : lidade irrestrits capital que tende a abandonar fre de meine ven Zagi it I ‘aso ple digirs pars reas com men el organizagao e capacidade de resisté : om le resisténcia, As lutas. ste ambit conten asin, ms ater resisténcia organizada contra os efe de esi efeitos perversos da moblidae espacial do capital e dos ergs que os gran fs interes econdmicos empreendem para staurar diferentes padroes a socioambientais para ricas, normas mais frouxas em pai : sem paises e dre Por essa razao, ve er , vem se observand ae el lo uma dinamica deine nacionalizagao das bandeiras e hte {orm da justia ambientlo que elt o pec cada zzmais globalizado dos rocessos de sobre vezma ; posigio do ‘sso ambi treo ie Alguns numatentativa de delegtimario do Movimento, _atgumentam que ajustiga ambiental seria uma cause “importad” ou “copiada” de forma acitica Tal juizo considera, poem, dois aspectos importantes, 36 Em primeiro lugar, desconsidera o fato de que a injustiga ambiental 6 muitas vezes engendrada exata- ‘mente pela grande mobilidade que os empreendimentos ambientalmente perversos tém assumido, principal- mente a partir da década de 1970. Hoje, uma empresa “deslocalizada” de uma regio por alguma eventual pressdo social que tenha sofrido pode facilmente “se relocalizar” em outro ponto onde a legislagao e/ou o potencial de mobiliza¢ao politica sejam mais débeis. Verifica-se, correntemente, o fato de que as lutas por justiga ambiental nos diferentes paises tém se dado contra as mesmas empresas. A internacionalizagio do Movimento como forma de enfrentar a exportacio dos riscos 6, assim, uma conseqiéncia necessaria para esses atores que pensam aluta ambientalista na perspectiva de ganhos na esfera da justiga social. Em segundo lugar, tal juizo desconhece as signifi- cativas especificidades que os movimentos por justiga ambiental vo adquirir nos diferentes paises, do mes- ‘mo modo como a propria rede norte-americana de organizagées pela justiga ambiental conta com certas particularidades, como €0 caso, por exemplo, das lutas das comunidades de lingua espanhola. Neste mesmo capitulo, apresentaremos um t6pico dedicado ao caso especifico da rede brasileira, Além do Brasil, alguns ‘exemplos da constituigdo de redes nacionais solidas de Jutas contra a injustiga ambiental vem ocorrendo nas Filipinas e na Africa do Sul, neste ditimo caso com 0 Environmental Justice Networking Forum (Ex). ‘Uma das importantes mostras do processo gradativo de internacionalizacao do Movimento foi a realizagio de ‘um coléquio internacional em Johanesburgo, com mais a de trezentos participants de diversas nacionalidades, durante a Conferéncia Rio +10, em setembro de 2002, Pode-se citar também a realizacao dos encontros entre epresentantes de virios paises em diversas edicées do Forum Social Mundial, em debates especificos sobre as lutas por justica ambiental, Surgiram igualmente entidades ambientalistas com atuagao internacional cujas intervenes se norteiam essencialmente pela perspectiva da justica ambiental. Eo caso da organizacio Environmental Justice Foundation, baseada na Inglaterra, com forte atuacao na {ndiaeno Camboja. Vrifca-se também uma especializacao tema- {iano interior do debate: 6 caso do Férum de Justiga Climitica, realizado em Haia, Holanda, paralelamente 4 6a Conferéncia das Partes da Convencao Mundial sobre @ Mudanga Climiética, Férum de Justiga Climtica Hraitventidades da Africa do Sul, Nigéra, Nicaragua, Fl Salvador, Equador, Colombia, México e eva Na ocasiio, diagnosticou-se que as comunidades ‘mais pobres ediscriminadas sdo também aquelas mais vilimadas pelos processos de alterac3o do clima, Deum ‘modo geral, clas estdo mais expostas is emanagbes de gases das induistrias poluentes, com os microclimas dle onde vivem sendo afetados de forma muito mais intensa e acelerada do que a média global. Tanto pior quando se leva em conta as populacées indigenas ¢tra- dicionais em geral, pequenos agricultores e pescadores artesanais, para quem a alteragao do clima desestabiliza Os recursos naturais dos quais dependem diretamente Para sua reproducdo material e simbélica, Ao mesmo tempo, aqueles grupos sociais foram ‘dentificados como a vanguarda da luta mundial centra 38 dang matic, consierand que soos mesmos tjuemais seconfrontam, em suas commas de bse canta eee ae eel estufa, notadamente 5 mo transporte e refino eee a Sem divida nenhuma, um: eatris debate sobrea justia climatic conrapor sao senso comum eoldico num aspecto que écrrente ate derado um dos mais “democriticos” da degre apn ambit a saber do sguesimeno tal O mmavimento por justcacimtica procurou demo ae e ‘nao hé questio ambiental a ser resolvida ant mente a questao social. ( caso da rede brasileira de justiga ambiental: especificidades de um pats periferico' Representantes de algumas redes do Movimento de Justiga Ambiental dos a estiveram no Brasil em rrando difundir sua experiencia e esta Sos ma esc spss eeaporato da injustica ambiental”, Desenvolver oe saaors aie romeeram memes de ics r0 isadores, que promo : ia Brij das atividades da greve que ome desea is na Universidade. Participaram do oo Mavimentode sta Ambiental resiado no campus da Praia Vermelha da urn) ~ Universidade Federal do Rio de Janeiro ~ em junho de 1998, repr I i a colaboragio de Julianna Malerba 15 Este pico foi ego com a colabora » do Southeast Regional Economic Justice Network, do sien Organizing Commitee, do Southwest Public rs Union, do Environmental and Fi Justice Project, todos dos Eva, eda Callers Peopise Alliance, das Filipinas, ae oe nor Prmeiroesforgo de rletura da expeiénca portesmericana de justiga ambiental por entidades iras fora realizado por ocasiio d. 4 i roducao di uum material de discusséo publicado por arian : Publicado por iniciativa d as ase da representagao da Central Sindical curr Janeiro e de pesquisadores d rt volumes da série “Sindic Aner calismo e Justica Ambiental""* tiveram circulagao e imy eee 5 1pacto restrito, mas estimul: outros grupos da universidade, do mundo das oxone tlesindicalim a explora o yea deta debate o que organizacao do Seminario Inte Justi Ambiental ¢ Cidadania, eee i |, realizado em setembro de 20 a cidade de Niter6i, reunindo representagoes de di. lovimentos sociais, OnGs, diversas regises do Brasil alm de um cone oe asi, além de um certo mi im ae esoisadores € representantes do Movimento de. iental d i Fe arpntal dos ua, entre os quis o socilogn 3 eesti desse semindrio, foi criada a Rede Brasileira de ustiga Ambiental, que, aps os debates sdtarovuma dct expends abranginiadas para além da questio do rac na alocagao de lixo téxico ee Xo toxico que fundara a organizaga nascida no movimento negro dos ton enna 3% Rio de Janeiro, 2000, 64p. = eee 40 entao por injustica ambiental o mecanismo pelo qual sociedades desiguais, do ponto de vista econdmico € social, destinam @ maior carga dos danos ambientais do desenvolvimento as populagdes de baixa renda, as grupos raciais discriminados, aos povos étnicos, tradicionais, aos bairros operirios, as populagdes marginalizadas e vulneriveis, Por justica ambiental, ao contrario, designou-se 0 conjunto de principios e praticas que: ~ asseguram que nenhum grupo social, seja ele étnico, racial ou de classe, suporte uma parcela desproporcional das conseqiiéncias ambientais negativas de operagdes econdmicas, decisées de politicas e programas federais, estaduais, locais, assim como da auséncia ou omissao de tais politicas; ~ asseguram acesso justo ¢ eqilitativo, direto e indi- reto, aos recursos ambientais do pais; ~asseguram amplo acesso is informagées relevantes sobre 0 uso dos recursos ambientais, a destinagio de rejeitos e a localizacio de fontes de riscos ambientais, bem como processos democriticos e participativos na definigao de politicas, planos, programas e projetos que Ihes dizem respeito; ~ favorecem a constituicdo de sujeitos coletivos de direitos, movimentos sociais e organizacées populares para serem protagonistas na construgo de modelos alternativos de desenvolvimento que assegurem a democratizacio do acesso aos recursos ambientais ea sustentabilidade do seu uso. ‘A partir de uma ampla critica as op¢des que regeram ‘o modelo de desenvolvimento brasileiro implementado a partir dos anos 1990, buscou-se assinalar que: a) sio “a 65 trabalhadores e os grupos sociais marginalizados ede menor renda que esto mais sujeitos aos riscos decorrentes da proximidade de seus locais de moradia dos depésitos de lixo téxico, das plantas industriais poluentes, das encostas perigosas e dos esgotos a céu aberto, pela auséncia de saneamento em seus baitros; b) sao esses mesmos grupos que se véem privados do acesso aos recursos naturais de que dependem para viver ao serem expulsos de sens locais de moradia para a instalagao de grandes projetos hidrovisrios, agrope- cuarios ou de exploragdo madeireira ou mineral; c) 0s modos de produgao e as formas de organizacio social nao-capitalistas s4o pouco a pouco destruidos pelo mercado, por nao atenderem a dindmica lucrativa dos capitais, que vao se apropriando das éreas comunais e terras indigenas, aproveitando-se da anuéncia relativa do Estado e da baixa capacidade de mobilizagio das populagées que posstuem menores recursos financeiros politicos. Aolongo de sua existéncia, a Rede envolveu-se em um certo nimero de iniciativas coletivas e campanhas que permitiram articular seus membros. Em 2003, a mobi- lizagio de trabalhadores urbanos ligados a luta contra a contaminagio ambiental e ocupacional favoreceu a criagao de um grupo de trabalho que procurou respon- der aos desafios da aproximagio dos movimentos de trabalhadores do debate ambiental a partir do enfoque dda justiga ambiental, Esse grupo foi responsdvel por uma campanha contra a transferéncia de residuos téxicos de Sao Paulo - onde a legislagao para descarte é mais rigida - para a Bahia - ondea indiistria que produzira tais residuos pretendia se aproveitar de uma legislacéo a mais permissiva para incineré-los. Construiu-se, a partir dessa agao, uma forma de resisténcia integrada 4 deslo- calizagao de passivos e riscos ambientais ¢elaborou-se ‘um posicionamento coletivo que motivou outras ages contra a exportagao das injustigas ambientais. Em 2004, a Rede langou uma campanha, desta vez articulada com movimentos internacionais, questionan- doa Petrobras por sua intensao de iniciar a exploragio de petréleo no Parque Nacional Yasuni e no territério indigena Huaorani, no Equador. Considerando que no Brasil nao é permitida a exploracao de petroleo em terras indigenas e parques nacionais, as entidades da Rede denunciaram a adogao de um duplo padrao: im- pedida em seu pais de explorar dreas reconhecidamente frigeis, como sio os parques nacionais ¢ os territ6rios indigenas, a empresa se aproveitava de uma regulagao mais permissiva no Equador. Em 2006 houve uma mobilizagao contra atentativa dda Unido Européia (ve), através da Organizagao Mundial do Comeércio (omc), de obrigar o Brasil a importar pneus reformados, proibidos pela legislacao brasileira. A Unio Européia havia solicitado & Organizagao Mundial do Comércio a abertura de um painel arbitral contra a decisio do governo brasileiro de proibir a importagio de pneus reformados por razoes ambientais e de saide publica, Nesse mesmo ano, os europeus haviam sido proibidos, por uma diretiva interna da propria ur, de dispor seus pneus inserviveis nos aterros sanitarios da regido. Também deviam reduzir a queima dos pneus com o objetivo de prevenir elimitar a poluicio atmosférica, dado quea queima desse resfduo libera gases altamente téxicos e perigosos. Essas restrigdes fizeram com quea “a UE encontrasse na exportagio de seus residuos a solu: sao “ambientalmente aceitavel” para o destino de seus passivos. Os mesmos grupos da Rede que nao aceitaram ue o passivo t6xico que estava sobre seus “quintais” em Sio Paulo fossem para a Bahia se mobilizaram para ndo Permitir que a ur conseguisse, através da omc, obrigar © Brasil a abrir seu mercado & importagao de pneus usados ou reformados, Nesse caso, houve uma alianga com setores académicos da Fiocruz, que decidiram realizar uma reuniao de articulacdo regional entre os membros do grupo de trabalho da Rede, movimentos redes nacionais ¢ internacionais, para discutir aces contra a incinerago ~ um dos destinos dados no pais a esse residuo ~¢ se posicionar contra a postura da UF Nesse encontro, foi produzido um documento, enviado 0 Governo, que serviu de subsidio para a agao politica das organizagdes a frente da campanha. Tais agdes, reivindicando o fortalecimento da le- Bislagdo e das regulamentagoes, permitiram ao grupo de trabalho ocupar espacos em conselhos ¢ elaborar documentos destinados a influenciar as politicas pu blicas ~ como o relatério sobre a incinera¢ao no Brasil, produzido em uma oficina de trabalho do grupo em 2006 ~ ¢ denunciar o padrao e as praticas produtivas que expoem populagdes e trabalhadores & contaminacao. Exemplo disso foram as agdes de dendincia na midia, tepudiando a flexibilizagao da legislacao referente aos niveis de emissdo atmosférica e de descarte de 6leo pelas plataformas maritimas e as campanhas permanentes pelo banimento de substincias toxicas como o amianto eo merciiio, Outras campanhas de reivindicagao de direitos ¢ “4 publicizacao de demiincias de confites ambientais cs ram lugar parti da Rede Brasileira: ampanhas contra grandes empreendimentos, em especial contra barragens ‘emonoculturas; pelo banimento de substanciastoxicas; contra a violéncia no campo, onde grupos indigenas, quilombolas e populagdes que vivem do intial sto vtimas de agressbes que produzem desigualdade ambiental; de questionamento da ideologia do ce mento econdmico a qualquer custo, A paralisaga0 & transferéncias de residuos para a Bahia, a discassto licenga da Petrobras em Yasuni, a vitéria do aa 5 Organizagao Mundial do Comércio (omc) ieee alguns exemplos de sua af, Paallamente observ se no Brasil a multiplicagao do niimero de estui destinados a verificar a pertinéncia e a ofrecer ums base empirica as demincias da vigincia de desigualdade ambiental em nosso pais, como veremos a seguir. 4s

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