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UNIVERSIDADE FEDERAL RURAL DO RIO DE JANEIRO

INSTITUTO MULTIDISCIPLINAR
ANTROPOLOGIA E TURISMO
BACHARELADO EM TURISMO

FABRICIO FARIAS
JULIANA BATISTA

DIÁRIO DE DOIS TURISMÓLOGOS: UM OLHAR ANTROPOLÓGICO SOBRE O


BOULEVARD OLÍMPICO, MAIS RECENTE PONTO TURÍSTICO DA CIDADE DO
RIO DE JANEIRO

NOVA IGUAÇU,
2017
DIÁRIO: FABRÍCIO FARIAS

A primeira visita ao local de pesquisa feita por mim foi em 18 de novembro. Era um
sábado tipo de primavera, nem tão frio e nem tão quente, um dia perfeito para se realizar um
passeio ou até mesmo um trabalho.
Ao chegar no local percebe-se o contraste entre os edifícios de diferentes épocas
como o “AquaRio”, o mais novo atrativo da cidade e o “Moinho Fluminense”, prédio datado
de 1887, na qual foi a primeira fábrica de moagem de trigo no Brasil (MAGALHÃES, 2016).
Mostrando que há uma densa história marcada por diversas épocas na região.
As crianças se divertem no parquinho que estava completamente cheio. Muitos gritos
e sorrisos, contudo algumas choravam na hora de ir embora. Seguindo rumo a Praça Mauá,
encontrei diversos tipos de pessoas. Brasileiros, cariocas e vários estrangeiros. Pessoas com
vários estilos de roupas, predominando o estilo veraneio. Negro, branco, mulato, amarelo.
Crianças, idosos, jovens e adultos. Cabelos curtos, longos, coloridos, cacheados… Quantas
pessoas de vários estilos, raças e culturas. Então me questionei, porquê de haver tanto turista
assim se a temporada de turismo estava apenas começando.
Foi quando me deparei com um cruzeiro. Esse seria um dos motivos para que
houvesse tanto turista dessa forma. A movimentação intensa de pessoas não parava. No local,
bem de frente ao píer que o cruzeiro estava parado, tinha uma feira de artesanato (se é que
podemos chamá-la de artesanato, visto que muitas barraquinhas vendiam o industrianato).
Percebi que os produtos que estão mais a venda são os símbolos que a cidade exporta pro
turismo, como o Cristo Redentor e a Praia de Copacabana.
Além desse cruzeiro estava acontecendo um evento esportivo em dois galpões. Ali
foi possível identificar várias situações de comportamentos. A provocação ao adversário, o
respeito, a disputa, tristeza da derrota e a alegria da vitória. O apoio dos familiares e dos
amigos pros jogadores era nítido nas arquibancadas. Essas misturas de emoções fazia com
que os jogos ficassem mais animados, mais acirrados.
Voltado a caminhar pelo Boulevard percebi que a fotografia ganha um espaço
significativo para o turista/visitante. A disputa pela melhor fotografia fica nítido, quando
vários indivíduos pedem que sejam “tiradas” novas fotos nos mesmo locais. Era hora de
encerrar o primeiro dia de visita. Deixei a Praça Mauá quase junto com o pôr do sol.
Quinta feira, 30 de novembro, último dia do mês. Volto ao local de pesquisa, sendo
que dessa vez com minha parceira de trabalho, Juliana Batista. Iniciamos dessa vez próximo
ao “Cais do Valongo”, antigo cais que recebia os escravos e mercadorias na época Brasil
Colonial, na qual foi tombado pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a
Educação, Ciência e Cultura) como Patrimônio Histórico da Humanidade (G1, 2017). Nos
deparamos com dois edifícios modernos e muito grande, e seguimos rumo ao Boulevard.
Por se tratar de ser um dia de semana o lugar estava muito calmo e tranquilo. Era por
volta de duas horas da tarde e as pessoas que estavam caminhando aparentemente eram
trabalhadores, por estarem vestidos de uniformes, roupas mais formais e muitos de crachás na
qual provavelmente estariam em horário de intervalo. A movimentação de turista era muito
pequena, quase não havia. Seguimos em direção a Praça Mauá e encontramos um grupo
escolar cheio de crianças, aparentemente felizes por estarem passeando. Isso me remeteu aos
meus tempos de passeios escolares, os professores ficavam desesperados com tantas crianças.
Também estava acontecendo uma apresentação no quartel da marinha. Guardas
enfileirados, a banda tocando e a bandeira sendo hasteada. Supomos que alguma figura
representativa estava na cidade devido a um navio porta-aviões que está atracado no porto.
Fomos então conferir um evento que estava acontecendo no Museu do Amanhã,
sobre o lançamento do site dos parques naturais estaduais do Rio. Dentro do evento o grupo
era outro, interessado na exploração ambiental mas de forma consciente.
Por volta das quatro da tarde saímos do evento e sentamos num dos bancos da Praça
Mauá e observamos o movimento. Diferentemente do primeiro dia da visita, nesse dia havia
muito skatistas e ciclista andando pelo espaço. Os grupos se diferenciam não só pelo meio de
locomoção, mas por suas vestimentas que eram diferentes. Os skatistas tinham blusas mais
longas, calças jeans e boné. Já os ciclistas andavam de bermuda, capacete e blusa.
O silêncio do VLT (Veículo Leve sobre Trilhos) fazia contraste ao barulho das obras
que estavam sendo feitas para a manutenção. A conservação dos residentes foi percebida de
forma correta, pois eles jogavam o lixo na lixeira, diferente de alguns estrangeiros que
jogavam embalagem de cigarro ou copo de sorvete, no chão. Podemos perceber que aqui o
turista se sente mais livre pra fazer o que quer, esquecendo de conservar o local.
Os turistas mais uma vez usavam roupas que lembrava algum lugar da cidade ou do
Brasil, como um homem que passou com sua filha e ambos, ele com a blusa do Rio de Janeiro
e ela com a blusa da seleção brasileiro, usavam esses significados, talvez num sentido de
pertencimento ao lugar. A maioria dos turistas andavam em grupos de 4 a 6 pessoas, no geral
jovens. Outros aproveitavam o lugar para passear com a família. Havia, portanto, uma
diversidade cultural e de idiomas constantemente sendo feita no mesmo local. Para esses
turista nesse dia não havia a “feira de industrianato”, porém alguns ambulantes vendiam um
apito com o som das baterias das escolas de samba e havia um modelo de mestre e sala e
porta bandeira para se tirar uma fotografia, pagando R$2,00.
Por falar em fotografia pude confirmar que o lugar serve como paisagem fotográfica.
A busca pela foto perfeita no Museu do Amanhã, nos letreiros gigantes da cidade do Rio, a
Baía de Guanabara, o VLT e até o navio porta-aviões estava entrando no álbum de retratos
das pessoas.
Os bancos do espaço nunca ficam vazios. Constantemente alguém senta neles, muita
das vezes são pessoas sozinhas e começam a admirar o local. Passam horas assim como nós.
Alguns aproveitam para admirar comendo uma pipoca, um sorvete, churros ou bebendo
algum tipo de bebida. Assim encerramos mais um dia de visitação.
O Boulevard Olímpico é um lugar de passagem para todos. Como vimos, há diversos
grupos étnicos: turistas (estrangeiro ou nacional), residentes (da cidade ou da região
metropolitana), esportistas (skatistas, ciclistas, entre outros), trabalhadores (pedreiro,
administrador, vendedores...), casais…. que usam o lugar para fazer um passeio ou para se
distrair. É um lugar que serve como paisagem (mar, navios, museus, monumentos, grafites,..)
para se admirar ou fazer uma fotografia.
Diário de campo: Juliana Batista
Dia 1
No dia 30 de novembro, quinta-feira estive na Praça Mauá caminhando entre o
trecho do mural Etnias até o Museu do Amanhã, acompanhada do Fabrício, minha dupla de
pesquisa. O local não estava muito cheio como costuma ficar aos fins de semanas e feriados,
mas ainda assim era bem tranquilo de caminhar por lá. Nesse trecho do Boulevard, o que mais
observei foram vendedores ambulantes e pessoas que pareciam estar a trabalho. Eram 14h.
Importante ressaltar que nesse trecho estão a sede da Polícia Federal, a alfândega, o escritório
do Google e o desembarque do porto. No porto estava atracado o porta aviões americano USS
Wasp, que veio do Caribe onde estava auxiliando as vítimas dos furacões e estava a caminho
do Japão. No 1° Comando do Distrito Naval estava acontecendo uma cerimônia,
provavelmente para receber alguém de alta patente do porta-aviões americanos.
No letreiro “Rio eu te amo” em frente ao Museu do Amanhã, um grupo de crianças
de uma escola do município faziam uma algazarra para tirar foto em frente ao letreiro,
acompanhados de dois adultos que pareciam ser os professores. No Museu do Amanhã,
alguns visitantes pediam informações sobre como adquirir os ingressos para entrar no museu,
que não estava cheio, exceto pela fila para a entrada no evento do INEA de lançamento do
site de parques estaduais. Participamos do evento e logo após seguimos com nossas
observações. O movimento estava menor, a cerimônia da marinha havia acabado e nem sinal
do grupo da escola.
Demos a volta no museu e na beira da baía, alguns homens pescavam e alguns
meninos observavam, um rapaz gravava um vídeo para o que parecia uma campanha
beneficente, tendo o Museu do Amanhã e a Baía de Guanabara como paisagem de fundo.
Sentamos em um banco em frente à saída do porto para observar o movimento. A
tarde estava nublada, ventava bem e havia muito barulho: o gerador de uma barraca de food
truck, a buzina do VLT toda vez que passava, o barulho do caminhão e ferramentas dos
trabalhadores que faziam manutenção dos trilhos do VLT, buzina dos carros das avs.
Venezuela e Rio Branco, o barulho dos aviões devido a proximidade com o aeroporto Santos
Dumont.
Apesar de só ter o porta-aviões parado no porto, de lá de dentro saem grupos de
estrangeiros toda hora. Me questiono se vieram todos nesse navio. A maioria dos grupos é
composto por jovens que aparentam ter entre 18-23 anos. Alguns ambulantes, bem ao lado da
saída vendem apitos que emitem um som parecido com os utilizados em baterias de escola de
samba e placas com o nome do navio. Abordando alguns estrangeiros que passam.
Também haviam turistas brasileiros, dentre eles um grupo pequeno acompanhado
por uma guia. Outros compostos por famílias com criança.
Um casal sentou no banco ao lado para saborear o sorvete comprado no food truck
barulhento. Pareciam ter saído do trabalho.
Três jovens estrangeiros pareciam estar perdidos ou a espera de alguém. Uma das
jovens está ao celular o tempo todo, falando com alguém, enquanto os outros dois jovens
aguardam. Todos eles tinham celulares grandes da Apple e os utilizavam
despreocupadamente. Aliás, a maioria dos transeuntes tinha celulares em mão, tirando fotos,
fazendo selfies e vídeos. Diferente de outros pontos da cidade, ali temos uma sensação maior
de segurança, que é garantida pela presença de um carro da Polícia Militar e pelos agentes do
Centro Presente.
A praça e o Boulevard como um todo são bem limpos, mas ainda assim um grupo de
três jovens estrangeiros, que saiu de dentro do porto, um deles deixa uma embalagem de bala
cair no chão e não recolhe, continua caminhando como se nada houvesse acontecido. Um
rapaz e seu cachorrinho daqueles que parecem uma salsichinha, passeiam pela praça. O
cachorrinho corre saltitante próximo ao seu dono e de repente para pra fazer suas
necessidades fisiológicas. O dono, após o bichinho terminar, retira um papel do bolso e
recolhe a sujeira deixada pelo cãozinho e seguem o passeio. O bichinho chama atenção do
grupo que aparentemente estava perdido, que acabaram sentados ao meu lado, e consigo ouvir
de uma das meninas “ooown so cute”.
Também observei pessoas, crianças e adultos, passando de bicicleta, ao que pareciam
ser moradores do entorno, provavelmente nas cercanias do largo de São Francisco da Prainha,
logo do outro lado da rua. O que achei interessante, pois apesar de ter requalificado um
espaço urbano até então degradado e sem uso público/turístico, a área virou alvo de críticas
por conta da segregação social que havia causado aos moradores do entorno.
​Dia 2
Voltei à Praça Mauá no dia 09 de dezembro, por volta de 14:40. Dessa vez voltei
sozinha e fui de VLT. Desci na estação Parada dos Navios, na mesma altura em que havíamos
chegado na visita anterior. O local não estava tão cheio quanto eu esperava. Por se sábado,
achei que teria mais gente. Dessa vez resolvi caminhar em direção ao AquaRio, mas quanto
mais me aproximava do local, menos gente tinha. Só havia mesmo a fila para entrada no
atrativo. O que me levou a seguir nesta direção foi a curiosidade. Um som muito alto que
vibrava no ar. Pensei ser um avião ou talvez um navio que se aproximava para atracar.
Conforme me aproximava de um dos galpões, o Armazém Utopia, percebi que o som vinha lá
de dentro, porém não deu pra identificar o que era. As paredes desse armazém continham
belíssimos painéis com pinturas que remetem a cultura negra, o que me deixou muito feliz,
pois não existe referência nenhuma no Boulevard aos negros e sua história que são muito
fortes e presentes naquela região. De volta ao ponto onde tinha desembarcado, parei em frente
ao mural Etnias para observar o movimento. A maioria parava em frente ao mural para tirar
fotos: uma menina segurando uma letra que provavelmente era a inicial de seu nome, pousava
para uma câmera; um grupo de turistas se aglomera para tirar uma selfie no mural, enquanto a
van que os estava levando e um guia de turismo um tanto impaciente os aguardam; um casal
programando o timer da câmera para tirar sua foto juntos. De repente o VLT vem chegando, e
todos gritando uns com os outros para saírem da linha.
Em frente ao mural estava acontecendo uma feira, a Feira do Cais do Porto
Maravilha, que acontece todo segundo sábado de cada mês. Nas barracas estavam à venda
roupas, acessórios, lembrancinhas, comidas. Continuei seguindo em direção à Praça Mauá e
pelo caminho, já mais movimentado, famílias, amigos, casais caminhavam no Boulevard.
Alguns ambulantes transitavam com suas mercadorias. Alguns rapazes de skate filmando suas
performances nas escadarias de um dos armazéns: enquanto um executa os saltos, os outros
filmam com celulares. Passei pelos food trucks barulhentos da visita anterior, apesar dos
preços um tanto salgados, estavam mais cheios que na visita anterior. Chegando na Praça
Mauá outras duas feiras: uma em frente ao porto, a feira Sabores do Porto, onde eram
comercializadas apenas comidas e a FIM, Fim de Semana do Livro no Porto. Segui para o
Museu do Amanhã, onde comprei um ingresso para visitar parte da exposição. O que me
chamou atenção lá dentro foi uma turista (chilena pelo que entendi) que estava no painel ao
meu lado explicando o que era mostrado na tela para o seu filho que deveria ter entre 8-10
anos. O painel explicava a composição e os fenômenos físicos da Terra. Ele prestava atenção
e fazia perguntas à mãe ou concordava com o que ela dizia. Saindo do museu, dei a volta no
seu entorno. O dia estava parcialmente nublado e abafado. Dessa vez haviam mais pessoas no
entorno. Gente fotografando com o museu e sua estrela prateada ao fundo, um rapaz
oferecendo fotos tiradas e reveladas na hora por 10 reais, mais pessoas pescavam, inclusive
um senhor estava confortavelmente sentado em sua cadeira de praia, de frente para o mar
enquanto pescava.
Parei pra comer um pastel e tomar uma cerveja numa das barracas da feira Sabores
do Porto. Eram poucas barracas, umas 10 no máximo e os preços mais acessíveis que dos
food trucks. Uma oferecia quitutes do Pará e havia outra que oferecia quitutes tradicionais da
culinária baiana, como o acarajé. Desta última barraca, as vendedoras estavam vestidas com
turbantes coloridos e roupas brancas, remetendo a Bahia, porém o som ouvido na barraca era
um funk carioca.
O porto estava fechado. Não havia navio atracado e nem ambulantes vendendo
souvenirs típicos.
O meio de transporte mais comum nesse dia eram o skate. Toda hora passava alguém
de skate no Boulevard. Apesar do smartphone reinar absoluto, hoje haviam pessoas com
câmeras profissionais e semi profissionais registrando seus momentos e paisagem.
Após terminar o lanche, voltei a caminhar em direção ao mural Etnias, havia um
grupo que parecia ser de algum bloco tocando alguns ritmos conhecidos em cima da calçada
de um dos armazéns, parecia ser um ensaio. Apesar de ser um fim de semana, não encontrei
muitos turistas estrangeiros e a língua que mais ouvi foi o espanhol, apenas um pequeno
grupo ouvi conversar em inglês, durante a exposição no museu.
O movimento agora já era bem maior do que quando havia chegado, são quase de
17h.
Voltei para a feira do Cais do Porto, onde o bloco Escravos da Mauá, tradicional do
carnaval na região, fazia uma roda de samba e animava os presentes. No público a maioria
pessoas com mais de 30 anos, só vi duas pessoas que aparentavam ser estrangeiras no meio
dessas pessoas. Fiquei um pouco por lá e como já eram 18h, resolvi pegar o VLT e voltar pra
casa.
ETNOCENTRISMO, CULTURA E DIVERSIDADE NA ZONA PORTUÁRIA

A região da Praça Mauá na zona portuária do Rio de Janeiro era uma área degradada
e abandonada. Com a realização dos Megaeventos (Copa do Mundo de Futebol e Jogos
Olímpicos) toda essa região passou por um processo de requalificação espacial, onde entre as
grandes mudanças podemos destacar a derrubada do viaduto da Perimetral, a construção dos
museus de Arte do Rio e do Amanhã e a construção de um grande boulevard por onde passa o
Veículo Leve sobre Trilhos, o VLT.
Com isso também aumentou a especulação imobiliária e muitos críticos levantaram
questões a respeito da segregação social que esse grande empreendimento intensificou
(DAFLON, 2016. ALBINATI, 2017).
Realmente o resultado da obra deu uma nova cara a essa região, e novos usos e
significados. Quem caminha pelo Boulevard se sente seguro e se encanta com a
transformação de um local antes sujo e inóspito em um grande passeio com pinturas,
canteiros, armazéns reformados e segurança.
A segregação social não é vista e nem sentida.
Durante as obras em 2011, nas escavações foi (re)encontrado o antigo Cais do
Valongo, onde chegavam os negros escravizados vindo do continente africano no séc. XVIII.
O local havia sido enterrado nas grandes reformas ocorridas no início do séc XX, realizadas
pelo prefeito Pereira Passos (DAFLON, 2016). Com isso foi criado o Circuito Pequena
África, que além do cais, também abrange pontos como a Pedra do Sal e o Cemitério dos
Pretos Novos.
Essa contextualização é importante quando analisamos o que vemos no atual
Boulevard e o que essas imagens nos passam a respeito da cultura que se quis pôr em
evidência no local.
De acordo com uma entrevista ao site da EBC (2014), o presidente da Companhia de
Desenvolvimento Urbano da Região do Porto do Rio de Janeiro (Cdurp), Alberto Gomes
Silva diz que:
“O Porto do Rio é um lugar desde sempre inserido na economia global, que era o
principal porto, o comércio internacional do Brasil se fazia por ali. Ao mesmo
tempo é um lugar muito doméstico, onde os trabalhadores do porto conviviam,
faziam a sua roda de samba, foram inventando o samba, sincretismo religioso, modo
de comer, modo de vida, e mesmo a colônia portuguesa que morava ali, com o seu
modo de vida, e você ainda encontra isso lá. Então, o que o lugar tem não é uma
identidade; ele tem identidades”
Ainda no mesmo artigo, uma página do Facebook denuncia que moradores deixam o
local por conta do aumento dos preços em decorrência da especulação imobiliária.
Toda essa contextualização é importante para entendermos esse espaço, seu
significado e a relação das pessoas e manifestações que nele ocorrem.
Podemos dizer que na revitalização do Porto Maravilha houve uma atitude
etnocêntrica ao se escolher o que iria ser preservado e qual história seria contada. Segundo
Rocha (1988, p.5) ”etnocentrismo é uma visão do mundo onde o nosso próprio grupo é
tomado como centro de tudo e todos os outros são pensados e sentidos através dos nossos
valores, nossos modelos, nossas definições do que é a existência.” Ele ainda diz que: “O
etnocentrismo não é propriedade [...] de uma única sociedade, apesar de que, na nossa,
revestiu-se de um caráter ativista e colonizador com os mais diferentes empreendimentos de
conquista e destruição de outros povos.”(p.6). Sobre o Porto Maravilha podemos ter essa
afirmação na análise de Albinati (2017) que diz:
“A cultura comparece como elemento central nos projetos conduzidos sob o ideário
do empreendedorismo urbano, notadamente na produção de uma imagem da cidade
e de sua população que sirva simultaneamente para “vender” a cidade para seu
público externo (investidores, turistas etc.) e para gerar a adesão do público interno
– os cidadãos – aos projetos urbanos. Dessa forma, práticas culturais de diferentes
grupos sociais, lidas e reinterpretadas pelos grupos dominantes, são selecionadas,
pinçadas e coladas em função da produção de uma imagem-síntese da cidade e de
sua população, que, em geral, promove a celebração da diversidade cultural
escamoteando as diferenças e desigualdades que determinam a existência dos vários
modos de vida urbanos.”

Elementos da história e cultura negros foram inseridos posteriormente ao projeto de


revitalização, porém ao caminhar pelo Boulevard não há uma referência que remeta à essa
parte da história da região. O mural Etnias, que representa os povos dos cinco continentes,
podemos dizer que é a única obra em que aparece a lembrança do negro, mesmo assim
relacionado ao continente africano.
As pinturas do Armazém Utopia (citadas no diário de campo) são recentes, foram
pintadas em março deste ano (2017) tendo como inspiração as obras do famoso pintor Jean
Baptista Debret (PORTO MARAVILHA, 2017) .
Os novos museus estabelecidos na região não tem como foco as culturas do entorno
da zona portuária. O Museu do Amanhã ainda oferece algumas atividades educativas em
parceria com o Instituto Pretos Novos e atividades voltadas para os moradores do entorno
(MAR, 2017). Já o Museu do Amanhã, que tem em sua temática o meio ambiente, não conta
nada sobre a história local. Em seu site há uma linha do tempo sobre a história da Pequena
África, porém em visita ao museu não se encontrou nenhum espaço físico dedicado a contar
essa história.
Augé (2010) diz que as paisagens são produtos turísticos como outro qualquer
utilizados pelas agências. Ele também diz que as pessoas que se beneficiam com as atividades
turísticas são em sua maioria pertencentes aos países desenvolvidos. Isso pode explicar parte
do capital investido na zona portuária que é estrangeiro (consórcio VLT, Museu do Amanhã,
AQWA Corporate).

CONCLUSÃO

Visto que o Boulevard é um lugar de passagem é importante saber quais os tipos de


cultura circulam pelo local, porém, é essencial que seja resgatado a verdadeira história que o
local possuía, ou pelo menos, parte dela. A cultura afro foi de extrema importância para
aquela região, contudo, foi excluída com as diversas reformas que a região sofreu. E muito
desses visitantes que frequentam o espaço não sabem o que ocorria ali e desconhecem toda a
história, apagada por questões de interesses. É importante dizer, também, que antes, no tempo
dos escravos, a região tinha um clima de dor e sofrimento. Hoje o ambiente expressa um
clima de felicidade e alegria, devido a nova paisagem remodelada e diversos eventos que
ocupa o espaço. Por fim, os resultados colhidos com essa análise foi que grande parte do povo
que ali pertence, busca um tipo de lazer, um tipo de descontração, seja ela em contemplar a
paisagem ou um passeio com a família, mas seria enriquecedor ao visitante se pudesse
conhecer como um dia o local foi.
REFERÊNCIAS

ALBINATI, M. L. Cultura e Planejamento urbano no Porto do Rio — uma visão utilitária.


Observatório das Metrópoles​, Rio de Janeiro, jul. 2017. Disponível em: <
http://www.observatoriodasmetropoles.net/index.php?option=com_k2&view=item&id=2083:
cultura-e-planejamento-urbano-no-porto-do-rio-%E2%80%94-uma-vis%C3%A3o-utilit%C3
%A1ria&Itemid=181&lang=pt#> Acesso em: 10 de dezembro de 2017.

AUGÉ, Marc. O escândalo do turismo. In: ​Por uma antropologia da mobilidade​. São Paulo:
Edunesp/Edufal, 2010.

DAFLON, R. O Porto Maravilha é negro. ​Carta Capital​, Rio de Janeiro. 22 jul. 2016.
Disponível em:< https://www.cartacapital.com.br/sociedade/o-porto-maravilha-e-negro>.
Acesso em: 10 de dezembro de 2017.

EBC. Porto Maravilha vai dar potencial histórico e cultural ao turismo do Rio. Rio de Janeiro,
2014. Disponível em:<
http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2014-09/porto-maravilha-vai-dar-potencial-histor
ico-e-cultural-ao-turismo-do-rio>. Acesso em: 10 de dezembro de 2017.

G1. “​Cais do Valongo, no Rio, é declarado Patrimônio Histórico da Humanidade”. Rio de


Janeiro, 09 de jul. 2017. Disponivel em
<https://g1.globo.com/rio-de-janeiro/noticia/cais-do-valongo-no-rio-e-declarado-patrimonio-h
istorico-da-humanidade.ghtml>. Acesso em 02/12/2017.

MAGALHÃES, L. E. “Revitalização do Moinho Fluminense custará R$1 bilhão”​. Jornal O


Globo. ​Rio de Janeiro, 26 de jun. 2016. Disponivel em
<https://oglobo.globo.com/rio/revitalizacao-do-moinho-fluminense-custara-1-bilhao-1625190
3>. Acesso em 02/12/2017.

MAR​, MUSEU DE ARTE DO RIO. Vizinhos do MAR. Rio de Janeiro, 2017. Disponível
em:<http://www.museudeartedorio.org.br/pt-br/educacao/vizinhos-do-mar>. Acesso em: 10
de dezembro de 2017.

PORTO MARAVILHA​. Orla conde ganha formas de Debret em murais de grafite. Rio de
Janeiro, 2017. Disponível em:< http://www.portomaravilha.com.br/noticiasdetalhe/4655>.
Acesso em: 10 de dezembro de 2017.

ROCHA, Everardo. ​O que é etnocentrismo?​ São Paulo: Brasiliense, 1988.

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