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DOSSIER

PROBLEMAS SEXUAIS

As disfunções sexuais
femininas
CRISTINA PABLO*, CATARINA SOARES**

Helen Singer Kaplan5 salienta a au-


IENTRODUÇÃO
DITORIAIS
sência do desejo sexual na proposta
EPOR e apresenta um modelo alterna-

G
lobalmente, a comunida- tivo, na sua essência, trifásico DEO
de científica tem dedicado (Desejo, Excitação e Orgasmo).
uma menor atenção ao Ambos os modelos supracitados par-
estudo da sexualidade fe- tilham três características que exerce-
minina e privilegiado o conhecimento ram uma influência considerável na
dos aspectos da sexualidade masculi- prática da terapia sexual, nomeada-
na. Aliás, não só os responsáveis pela mente6:
pesquisa no campo científico – que be- 1. a atribuição à ansiedade do papel
neficiam do enorme apoio da indústria central na etiologia das disfunções
farmacêutica desde o lançamento do sexuais;
tão mundialmente famoso Viagra – co- 2. trata-se de modelos organizativos das
mo os próprios media (Leland, 2000 respostas sexuais periféricos que
cit.por Wincze e Carey, 2001)1 têm favo- ignoram aspectos psicológicos e
recido este crescente culto unilateral. 3. a unisexualidade dos modelos.
Mesmo assim, ao longo dos últimos 30 É provável que a maior complexidade
anos, no âmbito do contexto clínico, tem da resposta sexual feminina tenha con-
subsistido um esforço por se encontrar tribuído para o estudo assimétrico da
uma resposta terapêutica para as difi- sexualidade masculina; contudo, sa-
culdades sexuais das mulheres apesar lientamos que não obstante a mulher
da desproporcionalidade do «estado da ser durante um considerável período da
arte». sua vida consumidora em massa de
Em 1953, Alfred Kinsey publica a preparados hormonais (anovulatórios e
obra Sexual Behaviors in The Human terapêutica de substituição hormonal),
Female2 tornando-se numa referência proporcionando assim valiosas oportu-
obrigatória relativa à descrição porme- nidades de estudo, estas não foram ade-
norizada do repertório sexual feminino. quadamente aproveitadas.
*Psicóloga Clínica e Terapêuta Nas décadas de 60 e 70, William Mas- Foi durante a década passada que se
Sexual na Consulta de Sexologia
Clínica do Hospital Júlio de Matos ters e Virgínia Johnson estudam expe- observaram os maiores avanços e con-
*Mestranda em Terapias Cognitivo- rimentalmente a resposta sexual hu- tribuições inerentes à sexualidade femi-
-Comportamentais e Sistémicas na mana editando Human Sexual Respon- nina.1 Esperamos que os recentes de-
Universidade de Coimbra.
Assistente-Estagiária no Instituto se (1966)3 e Human Sexual Inadequacy senvolvimentos permitam que o «fenó-
Superior de Ciências da Saúde-Sul (1970)4. Revolucionam o conhecimento meno Viagra» tenha também um pode-
**Psicóloga Clínica e Terapêuta da época ao proporem um modelo roso impacto sobre a sexualidade
Sexual na Consulta de Sexologia
Clínica do Hospital Júlio de Matos quase unisexual da resposta sexual hu- feminina.6 Heiman refere que a investi-
**Doutoramento em Ciências mana – o modelo EPOR baseado em gação futura não deve prosseguir sem
Biomédicas pelo Instituto de quatro hipotéticas fases do ciclo da res- procurar avaliar e considerar a informa-
Ciências Biomédicas Abel Salazar.
Professora no Instituto Superior de posta sexual: Excitação, Plateau, Or- ção subjectiva da resposta sexual e da
Ciências da Saúde-Sul gasmo e Resolução. satisfação da mulher.7

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Organização Mundial de Saúde – ba-


AS DISFUNÇÕES SEXUAIS FEMININAS
EDITORIAIS seiam-se na conceptualização das dis-
funções sexuais tendo como alicerces os
As disfunções sexuais femininas - à ex- modelos propostos por Masters e John-
cepção do vaginismo e independente- son e Helen Kaplan. Simbolizam, deste
mente da fase do ciclo de resposta se- modo, a disfunção sexual enquanto
xual afectada -, eram denominadas pelo doença, o que nem sempre é verdade,
termo englobante «frigidez», até à déca- e apelam ao modelo médico esquecen-
da de 70.8 O cunho pejorativo associa- do que a sexualidade também tem uma
do a esta «categoria diagnóstica» e, con- leitura psicossomática.6 Contudo, ape-
sequentemente, à vivência da sua sar de um consenso na literatura rela-
sexualidade, alimentaram uma visão tivamente à limitação destes sistemas,
distorcida da mulher nos séculos pas- continuamos a recorrer a eles por varia-
sados. A revolução ocorrida com os tra- díssimas razões. Não obstante, será im-
balhos pioneiros de Masters e Johnson portante ter presente que eles «de modo
vieram possibilitar o reenquadramento algum reflectem a complexidade, a
da «patologia» sexual feminina. A inves- riqueza e a realidade das disfunções
tigação consequente e os modelos teóri- sexuais».6
cos posteriores permitiram criar uma A quarta edição revista do DSM
base sólida para a compreensão do fun- (DSM-IV-TR)10 concebe seis categorias
cionamento sexual adequado e patoló- de disfunção sexual feminina (Qua-
gico a partir do estabelecimento das fa- dro I): Desejo Sexual Hipoactivo e Aver-
ses do ciclo de resposta sexual humana: são Sexual (consideradas dentro das
Desejo, Excitação, Orgasmo e Resolu- Perturbações de Desejo Sexual), Pertur-
ção. A disfunção sexual ocorreria peran- bação da Excitação Sexual na Mulher,
te a perturbação num destes estádios Perturbação do Orgasmo na Mulher,
ou ainda por dor associada à relação Dispareunia e Vaginismo (ambas incluí-
sexual. das nas Perturbações por Dor Sexual).
Os critérios incluem a necessidade da
perturbação causar um acentuado mal-
CLASSIFICAÇÃO E DEFINIÇÃO
EDITORIAIS -estar ou dificuldade interpessoal e ex-
cluem a presença de outra perturbação
Os actuais sistemas de classificação – do Eixo I, estado físico geral ou efeitos
o Diagnostic and Statistical Manual of fisiológicos directos de uma substância
Mental Disorders (DSM) da Associação como causas exclusivas.
Americana de Psiquiatria e a Classifica- As disfunções são ainda classificadas
ção Internacional das Doenças (CID) da de acordo com duas dimensões:

QUADRO I

CATEGORIAS DAS DISFUNÇÕES SEXUAIS FEMININAS

Fase do ciclo de resposta sexual Disfunção Sexual Feminina


Desejo Desejo Sexual Hipoactivo
Aversão Sexual
Excitação Perturbação da Excitação Sexual na Mulher
Orgasmo Perturbação do Orgasmo na Mulher
Dor Dispareunia
Vaginismo

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i) Natureza do início da disfunção se- aversão pode ser específica (e.g. secre-
xual: ao longo da vida (primária) ou ções genitais, penetração vaginal) ou
adquirida (secundária); generalizada a todos os estímulos se-
ii) Contexto em que a disfunção sexual xuais como o beijar e o tocar.10 Têm sido
ocorre: generalizada (ocorre em to- descritos estados emocionais de an-
das as situações e parceiros) ou si- siedade, medo ou nojo perante a situa-
tuacionais (ocorre apenas em situa- ção de interacção sexual. O confronto
ções ou com parceiros específicos). com o estímulo pode desencadear reac-
Um terceiro subtipo é ainda utiliza- ções ligeiras a severas, proporcional a
do para especificar a etiologia associa- um comportamento fóbico, acompa-
da às disfunções sexuais: devido a nhado de manifestações fisiológicas co-
factores psicológicos (existência de fac- mo suores, náuseas, vómitos, diarreia
tores psicológicos relevantes na origem e palpitações.8
e manutenção da perturbação) ou devi-
do a factores combinados (além da pre- Perturbação da Excitação Sexual
sença de factores psicológicos conside- da Mulher
ra-se uma contribuição importante da Na fase de excitação sexual ocorrem
condição física geral ou a utilização de transformações na mulher cujo objec-
substâncias).10 tivo é a sua preparação para o coito. Fi-
siologicamente salientam-se os fenóme-
Desejo Sexual Hipoactivo nos de vasocongestão na pélvis, lubrifi-
Wincze e Carey definem «desejo» como cação vaginal e entumescimento da
«an interest in being sexual and in ha- genitália externa. As alterações cogni-
ving sexual relations by oneself or with tivo-afectivo (e.g. foco atencional nos es-
an appropiate (e.g. mutually consenting) tímulos eróticos, sensação subjectiva
partner» (p.13).1 Os autores referem que de excitação sexual) são mais subtis
perante um quadro oposto, podem ser mas parece que as mulheres tendem a
experienciados estados afectivos negati- estar mais atentas que os homens a es-
vos – desconforto, tristeza, desaponta- tas mudanças.1 Inversamente as mu-
mento, frustração, culpa, depressão ou lheres têm maior dificuldade em
embaraço – possivelmente resultantes atribuir sensações eróticas às suas mu-
da discrepância entre o sujeito e o par- danças fisiológicas.
ceiro ou da divergência entre o compor- Segundo o DSM-IV-TR10, a perturba-
tamento sexual e as expectativas trans- ção da excitação sexual da mulher defi-
mitidas sobre a «normalidade». ne-se como a «incapacidade persistente
A perturbação é caracterizada pela ou recorrente para atingir ou manter até
ausência ou diminuição do desejo de completar a actividade sexual, uma
actividade sexual e fantasias sexuais de adequada resposta de lubrificação-en-
forma persistente e recorrente. É neces- tumescimento da excitação sexual».
sário que seja o clínico a proceder à ava- Wincze e Carey referem que subjectiva-
liação do défice ou ausência de desejo mente existe uma dificuldade em en-
tendo em conta variáveis como a idade contrar prazer na actividade sexual e
e o contexto da pessoa no funcionamen- uma ausência de sentimentos eróticos.1
to sexual.10
Perturbação do Orgasmo na Mulher
Aversão Sexual O orgasmo é descrito por alguns auto-
A principal característica desta disfun- res8 como uma combinação da expe-
ção consiste na presença persistente ou riência subjectiva com alterações fisio-
recorrente de uma aversão ao contacto lógicas na vagina e área pélvica que re-
sexual genital e ao seu evitamento. A sulta numa sensação de bem-estar ge-

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ral. Leiblum e Rosen expõem algumas Dispareunia


das descrições subjectivas do orgasmo: A dispareunia consiste na ocorrência
«atingir um pico», «sentir uma tensão de uma dor genital persistente ou recor-
crescente que é libertada», «sensação de rente associada à actividade sexual na
perda do sentido temporal».11 Porém, a mulher (e no homem) não sendo provo-
ausência de uma única definição e o pa- cada exclusivamente por vaginismo ou
pel atribuído ao longo da história ao or- ausência de lubrificação.10 Esta dor po-
gasmo feminino associados à ausência de ser manifestada antes, durante ou
duma «prova visível» e irrefutável acer- após o coito.
ca da sua existência, como a ejaculação
no homem, tem gerado controvérsia, Vaginismo
mitos e crenças erradas. Assiste-se, O vaginismo é usualmente definido co-
deste modo, a preocupações sobre o or- mo um espasmo involuntário da mus-
gasmo sem coito, orgasmos vaginal e cli- culatura do terço externo da vagina.
toriano e orgasmos múltiplos. Segundo os critérios do DSM-IV-TR10,
Sabe-se, hoje em dia, que a mulher trata-se de uma contracção recorrente
tem a capacidade de sentir orgasmos ou persistente quando se tenta a pene-
sem que haja estimulação directa dos tração vaginal com o pénis, dedo, tam-
genitais – o que evidencia o papel do cé- pão ou espéculo; o mesmo espasmo po-
rebro enquanto estrutura sexual, es- de ocorrer perante a antecipação da in-
pecialmente na mulher. E Kaplan, cita- trodução vaginal. A contracção ocorre
da por Wincze e Carey1, refere que a pe- nos músculos perineais e elevador do
netração por si só pode não ser suficien- ânus e a sua intensidade pode variar de
temente intensa para produzir orgasmo ligeira, produzindo aperto e desconfor-
e que nestas mulheres talvez seja ne- to mas tolerando algum tipo de penetra-
cessário uma estimulação simultânea ção (e.g. tampão, dedo), a grave, im-
do clítoris. Por outro lado, naquelas mu- possibilitando a penetração.
lheres que experienciam orgasmo O diagnóstico necessita de confirma-
durante o coito, podem não o sentir em ção através da observação ginecológica.
todos os coitos. Aliás, a ausência de or- Não é incomum, deste modo, que
gasmo durante o coito não é uma dis- mulheres com vaginismo e uma reacção
função sexual; pode ser natural e nor- de medo extrema perante a penetração
mal.1 vivam a relação sexual sem a consu-
Deste modo, a Perturbação do Or- mação do coito durante anos, apesar de
gasmo na Mulher é definida como sentirem desejo, prazer e com frequên-
o atraso ou ausência de orgasmo, per- cia orgasmos na interacção vaginal.
sistente ou recorrente, a seguir a uma
fase de excitação adequada, sen-
PEREVALÊNCIA
DITORIAIS
do necessário recorrer ao juízo clínico
tendo por base a idade, experiência
sexual e adequação da estimulação Os dados relativos à prevalência das
sexual que recebe.10 Conquanto, se em disfunções sexuais em geral são escas-
algumas mulheres a perturbação nes- sos e mostram uma grande diversidade
ta fase é impeditiva da actividade sexual entre si consoante os estudos. As razões
e acompanhada por sentimentos de prendem-se com a utilização de dife-
desilusão e insatisfação que levam a rentes sistemas classificatórios, méto-
que o desejo sexual cesse, noutras mu- dos de avaliação e variáveis dos grupos
lheres anorgásticas o desejo, o aumen- populacionais em que incidem estes es-
to da excitação e satisfação sexual man- tudos.
tém-se.1 O estudo epidemiológico americano

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National Social and Health Life Survey12,


FACTORES ETIOLÓGICOS
EDITORIAIS
realizado por Laumann, Paik e Rosen
em 1999, estudou as disfunções se-
xuais em 1.749 mulheres com idade Factores Biológicos
compreendida entre os 18 e os 54 anos Os factores biológicos desempenham
nos Estados Unidos. Os dados indicam um papel preponderante na etiologia
que 22% das mulheres referem dimi- das perturbações de cariz sexual. Con-
nuição do desejo sexual e que esta alte- tudo, a presença de patologia médica
ração tende a decrescer com o aumen- não é condição obrigatória para a dis-
to da idade; 14% das mulheres apre- função sexual feminina.
sentam uma perturbação da excitação • DESEJO SEXUAL
sexual; 24% das mulheres reportam Qualquer condição médica que cause
queixas de anorgasmia; e, entre 10% a dor ou desconforto pode resultar indi-
15% das mulheres queixam-se de dor rectamente na redução do desejo se-
sexual mas os autores não distinguem xual enquanto a idade, o desequilíbrio
entre vaginismo e dispareunia. endocrinológico e alguns fármacos de-
sempenham um papel mais activo.
Contudo, e antes de mais, a mulher
QUADRO II está mensalmente sujeita às variações
EFEITO DAS HORMONAS SOBRE O DESEJO SEXUAL
hormonais devido ao ciclo menstrual,
(ADAPTADO DE HIRCH PARA LABORATÓRIOS LEPORI)13
pode engravidar e assiste ao cessar do
ciclo reprodutivo com a entrada na
Hormonas Efeito sobre o Desejo Sexual menopausa. O efeito da acção das hor-
Testosterona aumenta monas sobre o desejo é apresentado no
Prolactina inibitório Quadro II.
Estrogénios positivo Assim, algumas doenças endocrino-
Progesterona inibitório (?) lógicas como outros factores de ordem

QUADRO III

FACTORES ORGÂNICOS COM EFEITOS NEGATIVOS SOBRE O DESEJO SEXUAL


(ADAPTADO DE HIRCH PARA LABORATÓRIOS LEPORI)13

Doenças Endocrinológicas Fármacos


• Hiperprolactinémia iatrogénica ou por adenoma hipofisário • Benzodiazepinas
• Hipotestosteronémia (sobretudo na menopausa) • Antidepressivos (SSRIs, triciclicos)
• Hipotiroidismo • Medicamentos com efeito anti-androgénio
• Insuficiência da supra-renal • Medicamentos que aumentem a prolactina
Doenças Asténicas • Anti-hipertensores centrais
• Hepatite viral e crónica activa • Diuréticos com efeito sedativo e depressor
• Mononucleose infecciosa • A pílula ?
• Sida
• Alcoolismo
• Diabetes
• Tuberculose
• Tabagismo
• Insuficiência renal crónica
• Insuficiência cardíaca congestiva
• Parkinson

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orgânica podem actuar sobre a diminui- • FASE ORGÁSTICA


ção do desejo sexual (Quadro III). Os factores de ordem neurológica que
afectem as vias simpáticas e parassim-
• EXCITAÇÃO SEXUAL páticas podem estar implicados nas di-
Os processos fisiológicos envolvidos no ficuldades orgásticas femininas, espe-
fenómeno de excitação sexual podem cialmente se se tratarem de situações
ser perturbados por lesões nos sistemas crónicas. No Quadro V são expostas as
vascular, que originam diminuição da principais condições patológicas que
lubrificação vaginal, e neurológico, por afectam os centros medulares D11 a
exemplo défices secundários à diabetes L2, mediadores do funcionamento
ou esclerose múltipla. Das alterações orgástico. Também as alterações hor-
endocrinológicas, as hipoestrogenias monais ou uso de fármacos (existem
normativas (menopausa ou amamen- sobretudo inúmeros estudos que com-
tação), induzidas (ooforectomia) ou pa- provam o efeito negativo dos SSRIs), ál-
tológicas, por exemplo, podem aumen- cool e algumas drogas comprometem o
tar a secura vaginal e conduzir a um orgasmo.
quadro de dispareunia. O Quadro IV
apresenta estados orgânicos com um • DOR SEXUAL
impacto adverso na excitação sexual da Para Abarbanel (1978) citado por Winc-
mulher. ze e Carey1, na avaliação da etiologia da

QUADRO IV

SITUAÇÕES QUE AFECTAM NEGATIVAMENTE A FASE DE DESEJO SEXUAL NA MULHER (ARAÚJO E SOARES, 1987)14

Doenças Endócrinas Doenças que afectam o estado geral da pessoa


• Doença de Addison • Doenças malignas
• Síndroma de Cushing • Doenças renais
• Acromegalia • Doenças cardio-vasculares
• Diabetes Mellitus • Doenças hepáticas
• Doenças da tiróide • Doenças pulmonares
• Hipoestrogenias • Hemopatias
• Lesões hipotalâmicas

Lesões Neurológicas Fármacos


• Acidentes vasculares cerebrais • Anti-histamínicos
• Neoplasias cerebrais • Anti-colonérgicos
• Lesões do lóbulo temporal • Anti-hipertensores
• Esclerose múltipla • Anti-androgéneos
• Esclerose lateral amiotrófica • Anti-estrogéneos
• Neuropatias periféricas (alcoolismo, diabetes, etc.) • Atropina
• Tabes dorsalis • Psicotrópicos
• Miastenia grave • Progestativos
• Paraplegias traumáticas • Pílula
• Espinha bífida
• Paralisia cerebral Abuso de Substâncias Psicoactivas
• Doenças extra-piramidais • Álcool
(por exemplo, parkinsonismo) • Anfetaminas
• Simpaticectomia • Heroína

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QUADRO V

CONDIÇÕES PATOLÓGICAS QUE AFECTAM OS CENTROS MEDULARES D11 A L2 IMPLICADOS


NA FASE ORGÁSTICA DA MULHER (ARAÚJO E SOARES, 1987)14

Doenças Neurológicas Situações Traumáticas


• Esclerose múltipla • Paraplegia envolvendo lesão baixa da medula
• Esclerose lateral amiotrófica • Ruptura posterior da uretra
• Neuropatias
• Mielites Fármacos
• Tabes dorsalis • Hipnóticos
• Hérnia discal • Neurolépticos
• Diabetes • Ansiolíticos
• Antidepressivos
Intervenções Cirúrgicas • Estimulantes
• Simpaticectomia lombar ou torácico-lombar • Bloqueadores a-adrenérgicos
• Linfadenectomia retroperineal
• Cirurgia aorto-ilíaca
• Cirurgia pélvica radical

dispareunia devem-se considerar facto- estenose vaginal, tumores pélvicos,


res anatómicos, patológicos e iatrogéni- doença inflamatória pélvica, atrofia se-
cos. Os primeiros incluem situações nil da vagina, patologias neonatais, ca-
congénitas como malformações geni- rúnculo uretral (Tollison e Adams, 1979
tais que tornam o coito doloroso; esta- cit. por Wincze e Carey).1
dos de doença aguda ou crónica como
infecções do tracto urinário constituem Factores Psicossociais
os factores de ordem patológica; por fim, As contribuições psicológicas e do con-
os resultados de procedimentos médi- texto sócio-cultural na expressão sau-
cos como a episiotomia podem também dável da sexualidade e consequente dis-
gerar dor na relação sexual. função parecem ser elevadas. Aliás, a
Araújo e Soares14 distinguem entre existência exclusiva de factores psico-
dispareunia, ou seja, situações doloro- lógicos relevantes na origem e manu-
sas mas nas quais é possível o coito, e tenção da perturbação é incluída no sis-
apareunia, condição que torna o coito tema classificatório referido ao longo do
inexequível. As autoras apresentam presente artigo; a alternativa - devido a
uma lista de prováveis quadros etioló- factores combinados (presença de uma
gicos ginecológicos, como por exemplo, condição física geral ou o uso de subs-
uretrites, vulvites, vaginites que afec- tâncias) – implica sempre o compro-
tam ambas. misso de factores psicológicos.
No caso do vaginismo, têm sido refe- É consensual na literatura a existên-
ridos um vasto número de causas e pro- cia de determinados factores etiológicos
cessos biológicos, como por exemplo, comuns às disfunções sexuais femini-
vaginites, congestão pélvica, episioto- nas: a presença de estados emocionais
mia e histerectomia vaginal. Porém, negativos como a raiva, depressão, an-
para o seu diagnóstico devem ser excluí- siedade ou medo; factores individuais
das as seguintes situações: endome- como a baixa auto-estima, má imagem
triose, relaxação do ligamento de supor- corporal e ansiedade de desempenho;
te uterino, hímen rígido, hemorróidas, experiências prévias traumáticas, com

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dor ou de abuso sexual; factores edu- do numa amostra de 979 mulheres na


cacionais e culturais como contributos Inglaterra encontrou as dificuldades
na formação de crenças erróneas e maritais como as melhores preditoras
desinformação acerca da sexualidade, das dificuldades de excitação sexual
mensagens parentais negativas acerca (Dunn et al., 1999 cit. por Wincze e Ca-
de sexo e ortodoxia religiosa; aspectos rey).1
do relacionamento conjugal como o pa- Relativamente à disfunção orgásmi-
pel do parceiro e conflitos maritais. ca salienta-se a associação de determi-
No Quadro VI é apresentada uma nados factores sócio-demográficos tais
síntese dos determinantes psicossociais como a idade (jovens), estado civil (sol-
das disfunções sexuais femininas. teiras) e nível educacional (baixo). A dis-
No caso das perturbações do desejo tracção cognitiva durante a actividade
sexual a ausência de atracção sexual sexual e algumas características da per-
pelo parceiro é um factor psicológico sonalidade, como a necessidade de con-
importante. A literatura indica que al- trolar as situações (Fischer, 1973 cit.
gumas perturbações psiquiátricas po- por Leiblum e Rosen)11, serão também
dem estar também associadas à dimi- passíveis de produzir perturbação a ní-
nuição do desejo sexual: depressão, vel da experiência subjectiva do orgas-
perturbações da ansiedade, perturba- mo como as suas consequentes mani-
ção de stress pós-traumático, perturba- festações somáticas (e.g. diminuição
ções do comportamento alimentar e das contracções rítmicas da platafor-
doença mental severa como a esquizo- ma orgástica).
frenia.1 No que concerne à dispareunia, a se-
Os factores de ordem relacional como guinte citação de Masters e Johnson
a falta de estimulação adequada do par- (1970, cit. por Wincze e Carey) 1 é ilus-
ceiro e um padrão comunicacional po- trativa do peso dos factores psicosso-
bre podem interferir negativamente com ciais.
a excitação sexual. Um estudo realiza- «Mesmo após um exame pélvico ade-
quado é frequente o clínico não ter a cer-
teza se as queixas são devidas a pato-
QUADRO VI logia pélvica não diagnosticada, ou co-
DETERMINANTES PSICOSSOCIAIS DAS DISFUNÇÕES
mo acontece milhares de vezes, a mu-
SEXUAIS FEMININAS (PACHECO, 1987)15
lher sexualmente disfuncional está a
utilizar o sintoma dor como meio de se
Factores Individuais furtar completamente, ou pelo menos
• Auto-imagem reduzir substancialmente o número de
• Auto-estima indesejáveis interacções sexuais no
• Auto-eficácia casamento.» (pp. 266-267)
A existência de expectativas de dor
Experiências Prévias aprendidas parentalmente e factores
• Falta de informação sexual, ignorância e relacionais (desconfiança e comuni-
concepções erróneas cação inadequada), são sobremaneira
• Ortodoxia religiosa relevantes na etiologia desta disfunção.
• Relação pais-filhos e ambiente familiar O vaginismo, para além dos aspec-
• Experiência traumática tos etiológicos supracitados, tem sido
também conceptualizado com base no
Circunstâncias Actuais paradigma do condicionamento clássi-
• Interacção da unidade conjugal co. Desta forma, o coito (estímulo condi-
• Discórdia conjugal cionado) associado a uma sensação de
dor (estímulo incondicionado) gera a

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contracção da musculatura vaginal • Nível I ou Permissão: permite descul-


(resposta incondicionada). O processo pabilizar em relação a práticas ou com-
de aprendizagem implica que os estí- portamentos sexuais (e.g. masturbação)
mulos condicionados (pensamentos, que suscitam dúvidas em relação à nor-
situações de interacção sexual com o malidade, incluindo pensamentos e
parceiro) associados à penetração vagi- fantasias eróticas através da autoridade
nal conduzam a uma resposta reflexa científica do técnico de saúde.
de espasmo muscular (resposta condi- • Nível II ou Informação Limitada:
cionada). O comportamento de evita- quando o problema em causa é atribuí-
mento mantém este mecanismo por re- vel a mitos ou ignorância sobre deter-
forço negativo segundo as formulações minado aspecto do funcionamento se-
do condicionamento operante, ou seja, xual (e.g. configuração anatómica dos
impede a mulher de se envolver no coito orgãos sexuais, «normalidade» acerca
(evita o desconforto sentido) e alivia as- da frequência do coito), a informação
sim a ansiedade antecipatória. clara e concisa, circunscrita ao proble-
ma colocado fornecida pelo profissional
Tratamento tem um papel importante, quer na regu-
Do exposto é possível observar a rele- lação das emoções, quer na permissão
vância atribuída aos factores de ordem para aceitar o próprio corpo.
psicossocial na génese e manutenção • Nível III ou Sugestões Específicas:
da disfunção sexual feminina. Assim, sugerem-se técnicas de estimulação ou
conceptualizamos a intervenção psico- de mudança de comportamento com o
lógica como uma estratégia terapêutica objectivo de solucionar o problema em
a considerar na maioria dos casos. Si- causa (e.g. «pseudo-anorgasmia»). A in-
multaneamente, o tratamento médico e tervenção é mais exigente e requer um
farmacológico também pode revelar-se conhecimento sobre o funcionamento
de extrema importância pelo que, se a sexual (incluindo técnicas específicas)
situação clínica o exigir, uma terapia mais profundo.
combinada poderá ser a melhor opção Os três primeiros níveis implicam do
terapêutica. profissional de saúde: i) o sentir-se à
vontade com a sua própria sexualidade,
Intervenção Psicológica para assim discutir sem preconceitos
Proposto em 1974 por Jack Annon16, o questões do foro sexual; ii) o recurso a
modelo PLISSIT conceptualiza quatro uma linguagem clara, simples e concisa
níveis de aconselhamento sexual cuja que lhe permita comunicar com o
complexidade e grau de conhecimento doente; iii) conhecimentos básicos so-
necessários para a intervenção vai au- bre a resposta sexual humana, e qual
mentando de nível para nível. Privilegia a influência que o doente poderá exer-
o factor educacional para combater a cer sobre ela.
ignorância e os mitos sexuais e coloca • Nível IV ou Terapia Intensiva: consis-
a abordagem especializada num ulterior te na terapia sexual propriamente dita
plano, para as situações de disfunção e necessita de formação adequada e
sexual. Deste modo, permite que os pro- treino específico com supervisão. Seria
fissionais de saúde, consoante as suas a última linha de tratamento a ser apli-
habilitações, possam desempenhar um cada aos casos mais difíceis e longos de
papel activo no manejo das dificuldades padrões sexuais disfuncionais.
sexuais. A terapia sexual é baseada no mode-
Os quatro níveis são a Permissão, In- lo terapêutico proposto por Masters e
formação Limitada, Sugestões Especí- Johnson com algumas modificações,
ficas e Terapia Intensiva: sobretudo na maior ênfase dada aos as-

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DOSSIER
PROBLEMAS SEXUAIS

QUADRO VII

RESUMO DAS INTERVENÇÕES TERAPÊUTICAS NAS DISFUNÇÕES SEXUAIS FEMININAS (ARAÚJO E SOARES, 1987)14

Individual Com o casal


1. Restruturação cognitiva de pensamentos e rótulos 1. Diminuição das interacções negativas, aumento das
negativos e incidentes traumáticos. interacções positivas (situações não sexuais).
2. Manter registos diários dos pensamentos, imagens e 2. Aumentar contacto físico não-sexual.
fantasias sexuais. 3. Planear condições favoráveis à interacção sexual.
3. Atribuir conotações sexuais a um maior número de 4. Implementar interacções de foco sensorial e de coito
estímulos. não exigente.
4. Aumentar as fantasias sexuais, recorrendo a 5. Aumentar o repertório de comunicação sexual do casal.
material audiovisual, se necessário. 6. Utilizar sistema de iniciativa alternada.
5. Exercícios para melhorar auto-estima e auto-imagem. 7. Focar na importância da auto-protecção e da
6. Exercícios de auto-estimulação erótica. auto-afirmação.
7. Treinos de aptidões sociais e de auto--afirmação. 8. Focar na qualidade e não na quantidade das relações
sexuais.

pectos cognitivos associados às pertur- No que concerne à administração de


bações sexuais. Assim, a prescrição de fármacos, o recurso a ansiolíticos pa-
mudanças específicas de comporta- rece apropriado perante quadros an-
mento destinam-se a eliminar a an- siosos disfuncionais, alguns antide-
siedade de execução, a corrigir estilos pressivos (trazodone) exercem um efeito
de vida destrutivos e papéis sexuais ina- positivo sobre o desejo e a administra-
dequados (e.g. papel de espectador), a ção de preparados hormonais, como a
aumentar a comunicação e o repertório testosterona (desejo) e substâncias va-
sexual. Pretende-se, acima de tudo, a sodilatadoras (excitação e orgasmo), po-
promoção de atitudes sexuais positivas de ser benéfica. A terapia de substitui-
e a aprendizagem de aptidões sexuais ção hormonal em mulheres menopáusi-
cognitivas. cas também deve ser considerada. Para
O casal, particularmente, é o foco da um maior esclarecimento, sugerimos a
terapia; contudo, no caso de um indiví- leitura de Leiblum e Rosen.11
duo não possuir um companheiro ou Salientamos ainda a necessidade de,
parceiro fixo é exequível uma inter- em alguns casos, ser necessário recor-
venção individual. rer a intervenções cirúrgicas (e.g. hime-
O Quadro VII apresenta um resumo nectomia).
de algumas intervenções terapêuticas
nas disfuncionais femininas.
A relaxação pode ser considerada
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EDITORIAIS
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DOSSIER
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Endereço para correspondência:


Prof.a Catarina Soares
Av. da Liberdade, 129, 7ºA
1250-140 Lisboa

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