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PROBLEMAS SEXUAIS
As disfunções sexuais
femininas
CRISTINA PABLO*, CATARINA SOARES**
G
lobalmente, a comunida- tivo, na sua essência, trifásico DEO
de científica tem dedicado (Desejo, Excitação e Orgasmo).
uma menor atenção ao Ambos os modelos supracitados par-
estudo da sexualidade fe- tilham três características que exerce-
minina e privilegiado o conhecimento ram uma influência considerável na
dos aspectos da sexualidade masculi- prática da terapia sexual, nomeada-
na. Aliás, não só os responsáveis pela mente6:
pesquisa no campo científico – que be- 1. a atribuição à ansiedade do papel
neficiam do enorme apoio da indústria central na etiologia das disfunções
farmacêutica desde o lançamento do sexuais;
tão mundialmente famoso Viagra – co- 2. trata-se de modelos organizativos das
mo os próprios media (Leland, 2000 respostas sexuais periféricos que
cit.por Wincze e Carey, 2001)1 têm favo- ignoram aspectos psicológicos e
recido este crescente culto unilateral. 3. a unisexualidade dos modelos.
Mesmo assim, ao longo dos últimos 30 É provável que a maior complexidade
anos, no âmbito do contexto clínico, tem da resposta sexual feminina tenha con-
subsistido um esforço por se encontrar tribuído para o estudo assimétrico da
uma resposta terapêutica para as difi- sexualidade masculina; contudo, sa-
culdades sexuais das mulheres apesar lientamos que não obstante a mulher
da desproporcionalidade do «estado da ser durante um considerável período da
arte». sua vida consumidora em massa de
Em 1953, Alfred Kinsey publica a preparados hormonais (anovulatórios e
obra Sexual Behaviors in The Human terapêutica de substituição hormonal),
Female2 tornando-se numa referência proporcionando assim valiosas oportu-
obrigatória relativa à descrição porme- nidades de estudo, estas não foram ade-
norizada do repertório sexual feminino. quadamente aproveitadas.
*Psicóloga Clínica e Terapêuta Nas décadas de 60 e 70, William Mas- Foi durante a década passada que se
Sexual na Consulta de Sexologia
Clínica do Hospital Júlio de Matos ters e Virgínia Johnson estudam expe- observaram os maiores avanços e con-
*Mestranda em Terapias Cognitivo- rimentalmente a resposta sexual hu- tribuições inerentes à sexualidade femi-
-Comportamentais e Sistémicas na mana editando Human Sexual Respon- nina.1 Esperamos que os recentes de-
Universidade de Coimbra.
Assistente-Estagiária no Instituto se (1966)3 e Human Sexual Inadequacy senvolvimentos permitam que o «fenó-
Superior de Ciências da Saúde-Sul (1970)4. Revolucionam o conhecimento meno Viagra» tenha também um pode-
**Psicóloga Clínica e Terapêuta da época ao proporem um modelo roso impacto sobre a sexualidade
Sexual na Consulta de Sexologia
Clínica do Hospital Júlio de Matos quase unisexual da resposta sexual hu- feminina.6 Heiman refere que a investi-
**Doutoramento em Ciências mana – o modelo EPOR baseado em gação futura não deve prosseguir sem
Biomédicas pelo Instituto de quatro hipotéticas fases do ciclo da res- procurar avaliar e considerar a informa-
Ciências Biomédicas Abel Salazar.
Professora no Instituto Superior de posta sexual: Excitação, Plateau, Or- ção subjectiva da resposta sexual e da
Ciências da Saúde-Sul gasmo e Resolução. satisfação da mulher.7
QUADRO I
i) Natureza do início da disfunção se- aversão pode ser específica (e.g. secre-
xual: ao longo da vida (primária) ou ções genitais, penetração vaginal) ou
adquirida (secundária); generalizada a todos os estímulos se-
ii) Contexto em que a disfunção sexual xuais como o beijar e o tocar.10 Têm sido
ocorre: generalizada (ocorre em to- descritos estados emocionais de an-
das as situações e parceiros) ou si- siedade, medo ou nojo perante a situa-
tuacionais (ocorre apenas em situa- ção de interacção sexual. O confronto
ções ou com parceiros específicos). com o estímulo pode desencadear reac-
Um terceiro subtipo é ainda utiliza- ções ligeiras a severas, proporcional a
do para especificar a etiologia associa- um comportamento fóbico, acompa-
da às disfunções sexuais: devido a nhado de manifestações fisiológicas co-
factores psicológicos (existência de fac- mo suores, náuseas, vómitos, diarreia
tores psicológicos relevantes na origem e palpitações.8
e manutenção da perturbação) ou devi-
do a factores combinados (além da pre- Perturbação da Excitação Sexual
sença de factores psicológicos conside- da Mulher
ra-se uma contribuição importante da Na fase de excitação sexual ocorrem
condição física geral ou a utilização de transformações na mulher cujo objec-
substâncias).10 tivo é a sua preparação para o coito. Fi-
siologicamente salientam-se os fenóme-
Desejo Sexual Hipoactivo nos de vasocongestão na pélvis, lubrifi-
Wincze e Carey definem «desejo» como cação vaginal e entumescimento da
«an interest in being sexual and in ha- genitália externa. As alterações cogni-
ving sexual relations by oneself or with tivo-afectivo (e.g. foco atencional nos es-
an appropiate (e.g. mutually consenting) tímulos eróticos, sensação subjectiva
partner» (p.13).1 Os autores referem que de excitação sexual) são mais subtis
perante um quadro oposto, podem ser mas parece que as mulheres tendem a
experienciados estados afectivos negati- estar mais atentas que os homens a es-
vos – desconforto, tristeza, desaponta- tas mudanças.1 Inversamente as mu-
mento, frustração, culpa, depressão ou lheres têm maior dificuldade em
embaraço – possivelmente resultantes atribuir sensações eróticas às suas mu-
da discrepância entre o sujeito e o par- danças fisiológicas.
ceiro ou da divergência entre o compor- Segundo o DSM-IV-TR10, a perturba-
tamento sexual e as expectativas trans- ção da excitação sexual da mulher defi-
mitidas sobre a «normalidade». ne-se como a «incapacidade persistente
A perturbação é caracterizada pela ou recorrente para atingir ou manter até
ausência ou diminuição do desejo de completar a actividade sexual, uma
actividade sexual e fantasias sexuais de adequada resposta de lubrificação-en-
forma persistente e recorrente. É neces- tumescimento da excitação sexual».
sário que seja o clínico a proceder à ava- Wincze e Carey referem que subjectiva-
liação do défice ou ausência de desejo mente existe uma dificuldade em en-
tendo em conta variáveis como a idade contrar prazer na actividade sexual e
e o contexto da pessoa no funcionamen- uma ausência de sentimentos eróticos.1
to sexual.10
Perturbação do Orgasmo na Mulher
Aversão Sexual O orgasmo é descrito por alguns auto-
A principal característica desta disfun- res8 como uma combinação da expe-
ção consiste na presença persistente ou riência subjectiva com alterações fisio-
recorrente de uma aversão ao contacto lógicas na vagina e área pélvica que re-
sexual genital e ao seu evitamento. A sulta numa sensação de bem-estar ge-
QUADRO III
QUADRO IV
SITUAÇÕES QUE AFECTAM NEGATIVAMENTE A FASE DE DESEJO SEXUAL NA MULHER (ARAÚJO E SOARES, 1987)14
QUADRO V
QUADRO VII
RESUMO DAS INTERVENÇÕES TERAPÊUTICAS NAS DISFUNÇÕES SEXUAIS FEMININAS (ARAÚJO E SOARES, 1987)14