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Acidentes na
terceira via
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PONTO CRÍTICO: ACIDENTES NA TERCEIRA VIA
tipo de trabalho social (...)? O que a es- um caldo de cultura que faz dele um Setor, o Ethos é mais ligado à estratégia
querda tem a dizer sobre o chamado empresário medíocre, sem grandeza, empresarial, alinhada à busca de bene-
Terceiro Setor, um tipo de trabalho de sem perspectiva, sem sentido histórico. fício social. Mesmo com visões diferen-
utilidade pública, mas executado por Apesar do fato de ser elite, ele é incapaz tes, a criação dessas duas organizações
entidades privadas?” de realizar na política seus próprios in- pode ser vista como parte de um mes-
teresses. Sua miopia faz com que ele não mo processo: a inserção dos empresá-
Ação e reação. Segundo pesquisas, consiga aproveitar uma situação privile- rios no campo do social.
a maior parte dos centros voltados para giada para definir os rumos do país.
a pesquisa do Terceiro Setor no Brasil Mesmo que fosse para o mal. Ainda há Influenciando agendas. Porém,
vincula-se a escolas de Administração de muito a se desenvolver para que o Brasil cabe aqui a questão: qual o sentido de
Empresas. Daí pode-se deduzir que a tenha uma classe empresarial com esse dominar também esse campo? Muitos
lógica dominante no discurso do Terceiro sentido da democracia, do social, capaz críticos argumentam que as questões de
Setor no Brasil é a lógica dos negócios. de domesticar inclusive as próprias leis responsabilidade social dizem respeito a
Assim, o discurso do Terceiro Setor de mercado e as leis do capitalismo”. um conjunto de estratégias de marketing
é dominado por um grupo que partilha O texto apresenta um estereótipo do para melhorar a imagem das empresas.
visões muito claras sobre a atuação do empresário no início dos anos 1990, quan- Embora haja de fato um componen-
Estado, a predominância dos negócios e do se começou a discutir o Terceiro Setor te mercadológico importante nessa ação,
o papel do Terceiro Setor na sociedade. no Brasil. A necessidade de mudar essa há uma questão maior e de efeitos mais
E quem faz parte desse grupo? Quem imagem provocou, nas empresas, um mo- fortes sobre a sociedade. Trata-se de um
são esses empresários e executivos? vimento de valorização da ação social. movimento que procura garantir às em-
Um ponto de partida, decerto A filantropia empresarial passou a presas maior influência sobre a formu-
provocativo, é o texto O empresário e o es- ter maior destaque com a criação do Gife, lação de políticas públicas ou a defini-
pelho da sociedade, do sociólogo Herbert em 1995, que surgiu de um grupo de ção da agenda política da sociedade.
de Souza – o Betinho. Afirma o sociólogo: organizações ligadas a grandes empre- Jerome Himmelstein, analisando a
“O empresário brasileiro é criado em sas brasileiras de capital nacional e pri- filantropia empresarial norte-america-
vado. O objetivo do Gife é atu- na em Looking good and doing good:
ar no fortalecimento do Tercei- corporate philanthropy and corporate
ro Setor, no desenvolvimento de power (1997), demonstrou que empre-
políticas públicas e nas ações de sas que financiam determinadas cau-
seus associados. sas buscam, mais que um retorno de
Em 1998 foi criado o co- imagem, influenciar os debates sobre
nhecido Instituto Ethos, cuja determinados temas. O autor argumen-
finalidade é ajudar as empresas ta que, no caso da filantropia empresa-
a compreender e incorporar o rial, o poder não está na submissão aber-
conceito de responsabilidade so- ta de um grupo a outro. Trata-se de um
cial – ou seja, a permanente pre- tipo de poder mais sutil: uma presença
ocupação com a qualidade éti- nos múltiplos níveis da sociedade e um
ca das relações da empresa com lugar nas diversas conversações e ne-
seus diversos públicos. gociações que definem seus rumos.
Enquanto o Gife defende O mesmo ocorre no Brasil. As or-
a atuação mais direta das em- ganizações que atuam em iniciativas de
presas em projetos sociais, por filantropia empresarial procuram ga-
meio de entidades do Terceiro nhar corações e mentes, em especial dos
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