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O CLÁSSICO E O PÓS-MODERNO: ALGUMAS REFLEXÕES ACERCA DA AR-

QUIVOLOGIA A PARTIR DO PENSAMENTO DE HILARY JENKINSON E TERRY


COOK

Clarissa Moreira dos Santos Schmidt*

RESUMO

Na busca por respostas a problemas do contemporâneo, resultado de novas


formas de produção e utilização dos arquivos, a arquivologia reexamina os
fundamentos teóricos e práticos da disciplina. Frente a isso, as ideias de au-
tores clássicos são constantemente revisitadas e muitas vezes consideradas
ultrapassadas e custodiais por um lado e, por outro, pioneiras e de vanguar-
da. Nesta perspectiva, este artigo busca refletir acerca de elementos que jul-
gamos atribuir cientificidade ao campo dos arquivos encontrados no pensa-
mento do britânico Hilary Jenkinson e do canadense Terry Cook, além de
analisar como as abordagens de Jenkinson são apropriadas por Cook.

Palavras-chave: Arquivologia custodial. Arquivologia pós-moderna. Hilary


Jenkinson. Terry Cook.

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__________________________
* Professora do Departamento de Ciência da Informação da UFF. E-mail: clarissaschmidt@id.uff.br

Informação Arquivística, Rio de Janeiro, v. 3, n. 1, p. 42-59, jan./jun., 2014


Clarissa Moreira dos Santos Schmidt

1 INTRODUÇÃO teóricas e práticas para lidar com novas


formas de Fazer que se anunciavam.

N
o final dos anos de 1980, a
Nesse sentido, mesmo o século
Associação dos Arquivistas
XX representando para a arquivologia a
do Quebec/Canadá encontra-
fase de afirmação e consolidação em
va-se em uma crise sem precedentes.
termos de Saber, seus últimos anos fo-
Sofria consequências por não conseguir
ram marcados pelo desenvolvimento
lidar com as novas regras para o
tecnológico a ponto de os arquivistas
gerenciamento de documentos de órgãos
repensarem o Fazer e o Saber para a
públicos e as políticas para suas fases de
área, seu papel social e a própria profis-
vida, estabelecidas por meio da Lei de
são. Segundo o arquivista americano
Acesso aos Documentos Públicos e Pro-
Ridener (2009, p. 9), para quem a década
teção de Informações Pessoais em 1982
de 1980 representa o início de uma fase
e da Lei dos Arquivos em 1983.
de colapso para a arquivologia devido ao
Somavam-se também os problemas
novo mundo digital, as mudanças de
enfrentados após a inserção do
paradigmas vivenciadas pela área nesse
computador nas rotinas administrativas e
período acontecem a partir da crise na
as preocupações com a organização do
profissão, ou seja, crises que exigem
XII Congresso Internacional de
tentativas, por parte dos profissionais
Arquivos, que aconteceria na cidade de
que a exercem, em alterar os paradigmas
Montreal em 1992 (GARON, 2007). Na
dominantes para responder às perguntas
verdade, o que essa associação estava
concebidas frente à realidade que se
vivenciando era reflexo, também, de
apresenta. As dificuldades em se
novas demandas apresentadas à profis-
trabalhar com situações novas usando
são com a introdução da informática e de
velhas teorias promovem concepções
outros elementos sociais e tecnológicos
diferentes de um problema e suas
no cotidiano da sociedade, além da valo-
possíveis soluções.
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rização da informação como produto. A


Diretamente relacionado a isso,
crise, aqui exemplificada a partir da as-
Página

nos primeiros anos da década de 1990,


sociação dos canadenses, configurava-se
ao se questionar como a arquivologia
justamente por não considerarem ter, os
estava se comportando frente às novas
profissionais de arquivo, ferramentas

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realidades que se apresentavam, Luciana descobertos, revisitados, ampliados,


Duranti anuncia a necessidade de um adaptados ou até mesmo negados. Afi-
reexame para a área, afirmando que nal, muitos dos movimentos que emer-
gem atualmente no interior da arquivo-
a questão passa a ser se ele deve
logia militam para que os fundamentos
ser feito dentro do antigo esquema
explicativo ou dentro de um es- da área se desloquem do que consideram
quema novo. Certamente, algumas
observações feitas a partir da nova como abordagens tradicionais e custodi-
realidade colocaram em crise al-
guns dos pressupostos básicos ais – focadas nos documentos considera-
concernentes aos arquivos e arqui-
vistas. Entretanto, rejeitar todos es- dos históricos e em suporte físico, fun-
ses pressupostos nos levaria ao va-
damentalmente produzidos no âmbito
zio. (...) o conhecimento tradicio-
nal pode ser transformado pela in- governamental e cujo papel dos arquivis-
teração com as novas observações,
e suas aparentes contradições po- tas se restringe a tratar destes documen-
dem ser reconciliadas (DURANTI
1994, p. 50). tos somente quando da chegada ao ar-
quivo –, para perspectivas que se auto-
Desde então, a procura de respos- denominam pós-modernas e pós-
tas para as perguntas originadas no cam- custodiais – ênfase na informação e no
po dos arquivos agita sobremaneira a sua processo de produção documental: o
comunidade científica. Nunca tantas arquivista atuando antes de o documento
reflexões foram elaboradas no âmbito chegar ao arquivo, macroavaliação, do-
teórico como agora, tampouco divulga- cumento de arquivo imaterializado, den-
das, discutidas e postas à prova. Assim, tre outras perspectivas. Vale ressaltar
pode-se dizer que na arquivologia ainda que não estamos considerando a perma-
vive-se o contemporâneo como um tem- nência de dois paradigmas que se exclu-
po sujeito às mudanças sociais e tecno- em, mas sim demonstrando, ainda que de
lógicas que fazem a área questionar seu forma breve, a existência e disputa de
estatuto científico. diferentes abordagens no interior do
Tais questionamentos são fun- campo científico da arquivologia, muitas
damentais para a reflexão e desenvolvi- vezes banalizadas na oposição custodial
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mento da área, porém, o mais importante x pós-moderna1.


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e que não pode ficar à margem destes


enunciados é como seus princípios, teo- 1
Ainda que existam outras abordagens, tais
rias e funções estão inseridos nesta dis- como a da arquivística integrada e arquivologia
pós-custodial, por exemplo, neste trabalho vamos
cussão, como estão sendo pensados, re-

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Nesta perspectiva, esse artigo 2 ARQUIVOLOGIA CLÁSSICA E O


pretende analisar alguns elementos por PENSAMENTO DE HILARY JEN-
nós considerados tributários de cientifi- KINSON
cidade à arquivologia encontrados no
Ao definirmos a arquivologia
pensamento do arquivista britânico Hi-
Clássica, consideramos os esforços de
lary Jenkinson (1882-1961) e do arqui-
sua comunidade em consolidá-la como
vista canadense Terry Cook (1947-
área de saber em cujos pressupostos es-
2014). É importante ressaltar que não
tavam baseados principalmente nos prin-
temos por objetivo fazer uma revisão
cípios da proveniência e da ordem origi-
bibliográfica, tampouco biográfica des-
nal, bem como na ideia de organicidade.
tes pensadores, mas sim analisar como
As técnicas utilizadas no Fazer passam a
certos fundamentos da arquivologia
ser consideradas em perspectiva de co-
apresentados por estes autores dão signi-
nhecimento científico.
ficados teóricos à area em questão, além
Em termos teóricos, trata-se do
de refletir sobre como Cook reexamina
período da centralização dos arquivos,
alguns destes elementos apresentados
principalmente a partir dos arquivos
por Jenkinson.
franceses no Arquivo Nacional, da sua
A escolha em centralizar nossa
apresentação para os cidadãos como
discussão em ambos os autores justifica-
consequência da Revolução Francesa,
se por entendermos que as contribuições
bem como a ideia de arquivo como insti-
do arquivista britânico inauguraram no-
tuição e serviço, da publicação do Ma-
vos saberes para a arquivologia, ao passo
nual dos Holandeses (1898), da elabora-
que Terry Cook, pensador e grande de-
ção e disseminação de princípios, da
fensor de uma pós-modernidade para o
publicação de manuais como os de Hi-
campo dos arquivos, é um dos principais
lary Jenkinson (1922), Eugenio Casano-
críticos das ideias de Jenkinson, conside-
va (1928) e Adolf Brenneke (1953), e do
rando-as positivistas e de cunho custodi-
estabelecimento das primeiras escolas de
al.
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formação de viés técnico, dentre outras


questões. Era fundamental, naquele mo-
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analisar a arquivologia pós-moderna justamente mento, refletir sobre as diferenças entre


por Terry Cook ser importante teórico de tal
pensamento. o trabalho realizado em arquivos e bibli-
otecas, além de considerar o documento

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de arquivo em seu conjunto orgânico, Originalmente intitulado A Ma-


seu valor probatório 2 e garantia de direi- nual of Archive Administration Including
tos, além de potencial fonte para pesqui- the Problems of War Archives and Ar-
sa histórica, como o objeto a partir do chive Making, porém mais conhecido
qual se pensavam, de maneira prelimi- como Manual de Administração de
nar, os princípios da disciplina e algumas Arquivo, foi uma obra individual escrita
de suas funções, tendo por objetivo or- pelo britânico Hilary Jenkinson a partir
ganizar, preservar e disponibilizar do- de suas experiências profissionais junto
cumentos. ao Public Record Office e seus conheci-
Já numa perspectiva temporal, mentos sobre diplomática, paleografia e
podemos relacioná-la de fins do século tratamento com documentos medievais.
XVIII até meados do século XX. Impor- Concebida na Inglaterra no ano de 1922
tante ressaltar que essa classificação não e revista em 1937, essa publicação está
pretende ser determinante de uma con- inserida em um contexto reflexo da Re-
cepção linear da trajetória da arquivolo- volução Industrial e imediatamente pos-
gia, mas sim uma opção metodológica e terior ao final da Primeira Guerra Mun-
didática para abordar, a partir de contex- dial, fatos que modificaram considera-
tos e fenômenos específicos, a constitui- velmente as estruturas econômicas e
ção e desenvolvimento de uma área com sociais na Europa deste período.
vistas a compreender algumas diferenças No prefácio de seu manual (1922,
que se estabeleceram em relação a seu p. xi), Jenkinson justifica que a intenção
estatuto científico, o que neste artigo original da obra é falar sobre o tratamen-
será demonstrado a partir de reflexões to de arquivos de guerra, mas como não
oriundas do pensamento de Terry Cook e há publicação em língua inglesa sobre
Hilary Jenkinson. organização e tratamento de arquivos,
decidiu por não reduzir a obra apenas ao
objetivo inicial. Afirma que o conhecido
2
Quando relacionada a documento de arquivo, a
Manual dos Holandeses (1898) – tradu-
expressão “valor de prova” deve ser entendida
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como a evidência de uma transação, de uma zido para língua inglesa somente em
atividade, o cumprimento de deveres. “Qualidade
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pela qual os documentos de arquivo permitem 1940 – discorre mais sobre questões de
conhecer a origem, a estrutura, a competência arranjo e descrição e que vai sugerir no-
e/ou funcionamento da instituição que os produ-
ziu” (BELLOTTO; CAMARGO, 1996, p. 78). vos pontos de vista ao campo dos arqui-

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vos, sendo o principal a ideia de custódia lidades essenciais, apresenta quatro ca-
contínua. Atribui ainda a essa ideia de racterísticas que lhe são inerentes: im-
preservação na custódia oficial como sua parcialidade, autenticidade, naturalidade
principal contribuição para o que chama e interdependência.
de ciência dos arquivos. A imparcialidade está relacionada
Durante a introdução (1922, p. à razão de criação do documento e sua
2), Jenkinson aponta a história, tal como capacidade em refletir de maneira fiel as
disciplina concebida até então, como atividades de produção, ao passo que a
uma ciência bastante dependente dos autenticidade condiciona-se aos proce-
arquivos. Assim, parte para definir o que dimentos de custódia contínua para ga-
compreende como arquivos, sendo que a rantia do valor de prova de tal atividade
primeira dificuldade esbarra na questão de produção. A naturalidade também
da utilização de dois termos diferentes; está atrelada à criação do documento,
records e archives. Refere-se a ambos porém na perspectiva de resultado natu-
como sinônimos e justifica como sendo ral da atividade, e por fim a interdepen-
mais apropriado o uso de archives por dência, relacionada à participação e ao
ser o comumente usado por outras lín- papel do documento no conjunto de do-
guas. Isto posto, passa a considerar ar- cumentos de arquivos.
quivo como os documentos que forma- Outra abordagem deste autor bri-
ram parte de uma transação oficial e fo- tânico, bastante criticada principalmente
ram preservados para referência oficial, por arquivistas contemporâneos, é quan-
servindo de prova/evidência da transa- to às responsabilidades do arquivista.
ção. Argumenta que os arquivos não são Para ele há duas, as primárias e as se-
elaborados para interesse ou para a in- cundárias, sendo que em primeiro lugar
formação da posteridade, pois a qualida- está a de tomar todas as precauções pos-
de essencial do documento de arquivo é síveis para a manutenção e custódia dos
sua produção visando o caráter probató- seus arquivos, exercendo o papel de
rio de uma ação, diferente da atribuição exímio guardião da custódia contínua,
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de sentido dada ao documento pelo his- elemento ao qual atribui a salvaguarda


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toriador. Além de considerar como do- das qualidades essenciais. Em segundo


cumento de arquivo somente os que es- lugar, é fornecer o melhor de sua capaci-
tão em papel, ao refletir sobre suas qua- dade para as necessidades dos historia-

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dores e outros pesquisadores. Ressalta deveriam ser destruídos e que os arqui-


ainda que estas posições (primária e se- vos “do futuro” deveriam ser avaliados
cundária) não podem ser invertidas e que pela própria administração, devendo ser
cabe ao arquivista a conservação física e encaminhado para custódia dos arquivos
mental dos documentos que estão nos somente o que fosse importante de pre-
arquivos, independente do seu conteúdo. servar para o futuro.
Além de discutir deveres e res- Esse discurso sobre a avaliação
ponsabilidades para os arquivistas em proposto por Jenkinson é bastante deli-
seu manual, Jenkinson também estabele- cado. Ao pensarmos que os arquivos
ceu diferenças entre o que define como a também têm como função manter a me-
verdade arquivística e a verdade históri- mória e servir de testemunho, além de
ca, considerando esta como a verdade permitir ao cidadão o exercício da cida-
representada pelo conteúdo do documen- dania tendo acesso às informações regis-
to. Já por verdade arquivística entendia tradas resultantes das atividades jurídico-
como aquela relacionada ao contexto de administrativas governamentais, deixar
criação do documento, ou seja, aquela um documento ser avaliado por quem o
que permite a permanência da imparcia- produz pode favorecer a manutenção
lidade e da autenticidade. Para nós, essa apenas do que o discurso dominante quer
diferenciação proposta por Jenkinson é contar e da forma como quer contar. Por
significativa para considerarmos o esta- isso, ainda que compreendamos a ideia
belecimento de uma ciência para o cam- da avaliação de Jenkinson, pela necessi-
po dos arquivos, mesmo que o próprio dade em assegurar tanto a imparcialidade
autor não tenha enxergado desta maneira como o valor de prova do documento,
e afirmado como sua principal contribui- talvez essa seja uma questão em sua obra
ção a ideia de custódia contínua. a ser relativizada, ainda que analisada a
A obra de Jenkinson abordou partir de seu contexto de produção.
ainda problemáticas concernentes ao Ao afirmar que a avaliação deve-
aumento da produção de documentos ria ficar a cargo do produtor do docu-
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pós-fim da Primeira Guerra Mundial, mento e que a natureza da custódia é


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sendo que por isso seria necessário pas- fundamental para manter a autenticidade
sar a avaliá-los. Nesse sentido, acredita- e assim o caráter probatório dos docu-
va que os arquivos “do passado” não mentos de arquivo, o pensamento de

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Jenkinson tem sido definido atualmente de ao documento de arquivo. Definiu sua


como custodial. O canadense Terry Co- concepção de fundo como archive group
ok, considerado um dos principais teóri- e considerava tanto essa questão da cus-
cos contemporâneos e adepto da aborda- tódia como a do arranjo como teorias da
gem arquivística funcional pós-moderna, arquivologia. Segundo Ridener (2009, p.
é um grande crítico das ideias de Jenkin- 41), embora o manual de Jenkinson
son e do que considera como arquivística tenha muitas orientações práticas, sua
tradicional, ou seja, aquela que define os maior parte é dedicada às razões morais
documentos de arquivo como e teóricas para manter arquivos, podendo
ser considerado, de fato, pioneiro ao
acumulações naturais, orgânicas,
separar explicitamente a teoria da prática
inocentes, transparentes, que o ar-
quivista preserva de modo impar- e fazer recomendações relativas a uma
cial, neutro e objetivo. Essa é a te-
oria arquivística clássica. No mun- abordagem teórica para arquivos.
do anglófono, ela é representada
por Sir Hilary Jenkinson e seus As questões postas pelo arquivis-
muitos discípulos. Essas afirmati-
vas fundamentais da ciência arqui- ta britânico suscitaram e continuam sus-
vística tradicional, com suas dico-
citando debates fervorosos no campo dos
tomias resultantes, são falsas. Na
verdade, da maneira como foram arquivos, tais como o papel de guardião
articuladas, nunca foram comple-
tamente verdadeiras – mesmo no de documentos pelo arquivista, a não
caso dos arquivos públicos – den-
tro do contexto de seu próprio interferência deste profissional no pro-
tempo, e agora, no final do século
XX, são extremamente enganosas cesso de avaliação documental com vis-
(COOK, 1998, p. 132).
tas a manter a imparcialidade e o valor

Jenkinson escreveu seu manual de prova dos documentos, bem como sua

quase um quarto de século após a publi- definição de documento de arquivo en-

cação do Manual dos Holandeses, já se quanto subproduto natural de atividades

referindo à arquivologia como uma ciên- administrativas. Todavia, não devemos

cia, a archive science, e inserindo outros desconsiderar sua importância na trajetó-

elementos na discussão do Fazer e do ria da arquivologia, pois além de tê-la

Saber no campo dos arquivos. Imprimiu afirmado como saber na Inglaterra da


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na área a ideia do valor de prova do do- década de 1920, suas ideias permitiram
Página

cumento de arquivo, da imparcialidade de tal forma a ampliação dos debates

em sua criação e a ideia da custódia ofi- teóricos na área que ainda hoje são obje-

cial e contínua para garantir autenticida- to de análise, crítica e referência.

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centando que “as ideias realizadas a


3 TERRY COOK E A PERSPECTI- qualquer momento sobre os arquivos são
VA PÓS-MODERNA certamente reflexo das correntes da his-
tória intelectual” (COOK, 2001, p. 6).
Ao refletir sobre o papel da ar- Não desconsiderando as interferências
quivologia no contemporâneo, que de- do contexto no campo dos arquivos, mas
nomina como mundo pós-moderno, Co- seguindo a lógica de Cook, se a tendên-
ok (2001) coloca como obrigatório o cia intelectual dominante em nosso tem-
reexame do Fazer e do Saber pelos po é o pós-modernismo, necessariamente
membros de sua comunidade científica. os arquivos serão assim afetados e por
Justifica essa necessidade por acreditar isso os arquivistas devem se preocupar
que uma mudança de paradigmas está em reformular a arquivologia para essa
em curso e que não haverá recuo no no- nova realidade.
vo século. O discurso desse canadense Antes de mostrar suas ideias para
acontece em plena virada do século XX a arquivologia frente ao novo mundo que
para o XXI, onde as influências da tec- se apresenta, Cook (2001) põe-se a ex-
nologia no campo dos arquivos já são plicar sua concepção de ciência pós-
evidentes em seu país. moderna. Para ele, os pós-modernos co-
Quando se refere ao novo século, locam suas reflexões em campos contrá-
o mundo pós-moderno, o autor está cla- rios dos modernos, criticando o que jul-
ramente inserindo seu discurso no campo gam ser defendido por estes principal-
epistemológico, afirmando que querendo mente no que está relacionado à noção
ou não temos que aceitar estarmos vi- de verdade universal, de conhecimento
vendo no tempo da ciência pós-moderna objetivo com base nos princípios do ra-
e que essas ideias já estão imbuídas em cionalismo científico e de elevação do
muitas áreas do conhecimento, como a método científico como validador do
história, a antropologia, dentre outras. conhecimento produzido. Para o cana-
Baseia-se nas palavras de Terry Eastwo- dense, essas noções dos modernos de-
50

od para afirmar que “é preciso entender vem ser dispensadas como quimeras
Página

o ambiente político, econômico, social e (COOK, 2001). Avança em suas expli-


cultural de uma dada sociedade para cações de que o pós-moderno contesta a
compreender os seus arquivos”, acres- sabedoria convencional, tenta desnatura-

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lizar o que a sociedade assume como teorias, conceitos e métodos, por exem-
natural, racional, e visando relacionar plo, sejam revisitados, postos à prova,
essa concepção ao campo dos arquivos, reformulados, modificados, reafirmados
vale-se da abordagem de historiador de e adaptados. Porém, nesse sentido, al-
Jacques Le Goff para o qual “o docu- gumas reflexões encontradas no pensa-
mento não é matéria-prima objetiva, mento de Cook exigem análises mais
inocente, mas expressa o poder da socie- detidas. A noção de verdade universal,
dade do passado (ou da atual) sobre a de uma ciência absoluta e racional, são
memória e o futuro: documento é o que consequências contextuais de importan-
fica”. O que vale para cada documento tes momentos históricos pelos quais as
vale também, coletivamente, para os sociedades passaram e que lhes trouxe-
arquivos (COOK, 1998, p. 140). ram inúmeros avanços. Assim como o
Em nossa concepção, Cook en- mundo sofre transformações e é dinâmi-
tende o pós-modernismo como um ele- co, para utilizar elementos de caracteri-
mento natural do mundo contemporâneo zação do mundo contemporâneo utiliza-
em cujos preceitos a arquivologia deve dos por Cook, o pensamento científico
estar inserida, pois caso contrário estará também o é. O processo é ininterrupto e
fora do que é aceito como vanguarda o que foi construído não pode ser dis-
intelectual. Não temos dúvidas de que o pensado como quimeras. Afinal, parte-se
mundo está constantemente em trans- destas construções para pensar outras. A
formação, se reinventando, inovando, e arquivologia não começa no mundo con-
que o contexto e as formas de produção temporâneo e nem é melhor neste mun-
documental, bem como os próprios do- do: ela está inserida no processo de de-
cumentos, fazem parte destas transfor- senvolvimento que passou e passa. Além
mações. Entretanto, em um primeiro disso, ao apropriar-se das palavras de Le
momento, o que parece ser uma apologia Goff, Cook não contextualiza que a críti-
do canadense ao pós-modernismo nos ca do historiador foi construída para ser
instiga a pensar que há uma tendência contra a concepção positivista do docu-
51

pós-moderna e a arquivologia é obrigada mento como fonte de verdade histórica.


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a se inserir nisto. Aqui é importante uma ressalva.


É importante e fundamental para Considerando as diferenças conceituais e
o avanço do pensamento científico que teóricas entre as verdades histórica e

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arquivística, faz-se necessário esclarecer buinte para a área do que a ideia de cus-
que não estamos defendendo que essa tódia tal como o britânico havia propos-
verdade para os arquivos, a qual já apon- to. Porém, remetendo-nos ao que esse
tamos inclusive como importante fun- britânico define como verdade arquivís-
damentação teórica da arquivologia, de- tica – relacionada ao contexto de criação,
va se manter cristalizada na definição ou seja, à permanência da imparcialidade
jenkinsoniana promulgada no início da e da autenticidade – para nós essa verda-
década de 1920, pois, além de entender- de não é absoluta tampouco absoluta-
mos a construção do conhecimento cien- mente fiel ao que se propõe. Entretanto,
tífico como inserida na dinâmica social e à época de Jenkinson, a produção do
que está em constante processo de mu- conhecimento científico, bem como do
danças, é certo que muitas das premissas arquivístico, estava possivelmente inse-
elaboradas pelo arquivista britânico não rido em premissas positivistas e isso não
se sustentam após o progresso da tecno- invalida suas ideias. Localizar o discurso
logia documental3. ao tempo em que foi elaborado é funda-
Nessa linha de pensamento, ao mental para compreendê-lo e contextua-
conferirmos valor à ideia de verdade lizá-lo.
arquivística como fundamento, valemo- Sob essa mesma ótica, o fato é
nos inicialmente das discussões elabora- que as ideias de Cook corroboram hoje
das por Jenkinson de tal forma que che- para nossas argumentações que revisitam
gamos a considerá-la muito mais contri- essa concepção jenkinsoniana de verda-
de. Em novembro de 1997, Terry Cook
3
Na trajetória da arquivologia, muitos fatores esteve no Brasil, mais especificamente
vão se delineando e demandando novas refle-
xões. Um deles é pertinente ao desenvolvimento na cidade de São Paulo, para um seminá-
tecnológico e seu reflexo nos suportes nos quais
as informações estão sendo registradas e nas rio internacional sobre arquivos pessoais
maneiras em que os documentos estão sendo
elaborados, o que Favier define como tecnologia que foi organizado pela Fundação Getú-
documental. Outro fator que transforma os dados
da arquivística é, naturalmente, o progresso da lio Vargas (FGV) e pelo Instituto de Es-
tecnologia documental. Em um século, evoluiu- tudos Brasileiros (IEB). Decorrida sua
se da pena à esferográfica, do copista à máquina
52

de escrever elétrica e daí às máquinas multicopi- fala na sessão sobre o Fazer do arquivis-
adoras, à fotocópia e à xerografia. O documento
Página

único, antes regra, tornou-se exceção (FAVIER, ta, Heloísa Bellotto (1998) posteriormen-
1979, p. 6).
te produz um artigo comentando as idei-
as de Cook. Problematizando a viabili-

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dade de algumas propostas levantadas sociedade é prenúncio de novas exigên-


pelo canadense, discute e valoriza a se- cias impostas pela sociedade, como
guinte questão: transparência governamental e constru-
ção de memória coletiva, por exemplo,
Na perspectiva dos ditos “arquivos além de ser tarefa possível em termos de
totais” canadenses, o autor mostra
que novas perspectivas têm sido fazer inclusive devido às inovações tec-
adotadas dentro dos arquivos pú-
blicos, traduzindo-se no fato de es- nológicas e ao progresso tecnológico
tarem os arquivistas atentando
mais para a governança do que pa- documental.
ra o governo. Por governança se Outra reflexão também é possível
entende a trama, isto é, tudo o que
possa comprovar a interação entre a partir dessa ideia de governança levan-
cidadão e Estado, o impacto do Es-
tado na sociedade e as funções e tada por Cook. Entendemos que ela nos
atividades da sociedade em si
mesma; por governo, compreen- dá elementos para reafirmar a arquivolo-
dem se as estruturas sustentadoras
e a ação burocrática. A frase de
gia como produtora de conhecimento
Cook é significativa: “A tarefa ar- científico a partir do momento em que
quivística é preservar a evidência
documentada da governança da so- percebemos, por meio desse discurso de
ciedade, não apenas da atividade
governante dos governos” (BEL- Cook, o papel de produtor de saber que
LOTTO, 1998, p. 204).
recai sob o arquivista. De modo a estabe-

Não inserindo a discussão no lecer de maneira fiável as representações

âmbito classificatório ciência moderna x desta governança, terá de valer-se cada

pós-moderna, o fato é que essa visão vez mais de ferramentas teóricas e meto-

alcançada por Cook é reveladora de um dológicas que extrapolem a linearidade e

novo olhar sobre a verdade para a nossa a custódia contínua sugeridas para a ver-

área, e que está além da relação linear e dade arquivística por Jenkinson. Agora,

horizontal entre produtor, documento e o arquivista e as formas que adotou para

custódia para garantir a verdade arqui- assegurar a verdade arquivística também

vística como defendeu Jenkinson. Tam- participam do jogo do saber, pois

bém está além de uma relativização ou


de uma perspectiva na qual a ver-
subjetividade do que se espera alcançar
53

dade estaria depositada no arquivo,


pelo discurso da pós-modernidade, tam- esperando ser acessada ou “desco-
berta”, passa-se a afirmar que o ar-
Página

pouco se trata de um confronto declara- quivo constitui a verdade que


guarda, assim como aquela que
do contra os modernos. Os tempos hoje omite. Antes, mais importante do
que o arquivo eram as fontes nele
são outros e garantir essa governança da reunidas. Nos últimos anos, embo-

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ra esta leitura não esteja excluída, ativo próprio, agente na formação da


o questionamento com relação à
estrutura por meio da qual as fon- memória humana e organizacional.
tes são acumuladas e disponibili-
zadas ganhou visibilidade – o ar- Cook (1998) ainda estabelece que
quivo deixa de ser meio para a
consecução de um fim, ou seja, nem o autor nem o contexto podem ser
deixa de ser visto, apenas, como separados da análise documental, pois
repositório de informações, para se
tornar, também, objeto de pesquisa nada é neutro. Nada é imparcial. Nada é
(HEYMANN, 2010, p. 114).
objetivo. Tudo é moldado, apresentado,
Isto posto, relacionado à prática representado, reapresentado, simboliza-
profissional dos arquivistas, as mudanças do, significado, assinado, tem um propó-
de paradigmas apresentadas por Cook sito definido. Nenhum texto é um ino-
novamente são elaboradas em forma de cente mero subproduto da ação, como
crítica ao discurso de Jenkinson visto alegou Jenkinson, mas sim um produto
que, segundo o canadense, o profissional construído conscientemente, não existin-
contemporâneo, pós-moderno, deve afas- do uma narrativa de uma série ou cole-
tar-se da identificação de guardião passi- ção de registros, mas muitas narrativas,
vo de uma herança herdada para celebrar muitas histórias, servindo aos propósitos
o seu papel de agente ativo na constru- de muitos para muitos públicos, ao longo
ção da memória coletiva. Defende que a do tempo e do espaço. Ao reiterar essa
postura do arquivista não deve ser a de necessidade de mudança do documento
operar suas ferramentas teóricas e práti- de arquivo de produto passivo (subpro-
cas apenas a partir do documento quando duto) para agente ativo, Cook critica
da chegada ao arquivo, e sim analisar o especificamente as qualidades essenciais
contexto por trás do texto, pois entende definidas por Jenkinson para estes do-
que as relações de poder moldam o pa- cumentos, bem como a ideia do britânico
trimônio documental. A partir disso co- sobre estes serem subprodutos das ativi-
loca no centro de suas críticas o docu- dades.
mento de arquivo, atribuindo que não Também aponta outros termos
deve mais ser enxergado como algo está- em que a mudança de paradigmas deve
54

tico e físico e sim como um conceito acontecer. Além do documento de arqui-


Página

dinâmico e virtual, deixando de ser um vo e da prática profissional, refere-se ao


produto passivo das atividades humanas contexto de produção documental, afir-
ou administrativas para ser considerado mando que na condição pós-moderna ele

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deixa de ser estático em relações de hie- para as funções e os contextos em que


rarquia para assumir lugar dentro da essas séries são produzidas, saindo do
perspectiva de que os processos de traba- produto gravado para o processo de cria-
lho acontecem em rede e de maneiras ção de documentos. Exemplo é sua pro-
horizontais, o que entedemos ser uma posta para a avaliação, claramente crítica
reivindicação antiga – e não necessaria- às ideias de Schellenberg e para a qual
mente pós-moderna – por parte de al- atribui o nome de macroavaliação, o que
guns arquivistas, inclusive pelo arquivis- define como atividade “(...) funcional-
ta australiano Peter Scott (1966) em seu estrutural (...), enfatiza o valor arquivís-
sistema de séries. tico da posição, local ou funcionalidade
Ao aprofundar suas análises da criação de documentos, em lugar do
quanto à necessidade de mudanças no valor dos documentos por eles mesmos”
pensamento arquivístico, para nosso (COOK, 1998, p. 136).
alento, Cook não coloca como único Em nossa concepção, muitas das
fator determinante a condição social pós- propostas apresentadas pelo arquivista
moderna4, apontando transformações canadense são de grande pertinência e
significativas no que tange à concepção significativas para os desafios vivencia-
dos arquivos como instituição. Afora dos pela área. Todavia, julgamos não
isso, Cook (2001) faz outras sugestões serem as polarizações custodial x pós-
de mudanças para a área e algumas bas- moderna que trarão respostas aos percal-
tante focadas em revisitar os referenciais ços vivenciados pela arquivologia na
teóricos e as funções da disciplina, que contemporaneidade.
para ele devem fundamentalmente des-
locar-se da análise de séries documentais 4 CONSIDERAÇÕES FINAIS

4
Não há dúvidas de que este perí-
Há diferentes compreensões sobre a condição
social pós-moderna, bem como de ciência pós- odo que denominamos de arquivologia
moderna, e não caberá a nós tratá-las neste texto.
clássica foi bastante significativo para o
Contudo, devemos esclarecer que nossa a crítica
55

ao discurso pós-moderno de Cook se estabelece desenvolvimento da área. As ações de


frente a sua retórica reducionista que polariza a
centralização e acesso aos arquivos, ini-
Página

arquivologia entre as velhas teorias e aquelas que


devem ser criadas – as novas teorias –, por es- ciadas pela Revolução Francesa, até a
tarmos vivendo um novo mundo.
disseminação dos princípios da proveni-
ência e da ordem original por meio do

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Manual dos Holandeses abriram cami- clássicos e tradicionais, muitas vezes


nhos para que procedimentos anteriores revisitados e outras, negados, são de
realizados no Fazer dos arquivos fossem suma importância para pensarmos como
questionados, como por exemplo a clas- teorias e práticas se consolidaram e co-
sificação por assunto. Os clássicos inau- mo servem e serviram de referência para
guram uma nova ordem ao documento, outros manuais e para avanço da área.
da primazia do contexto frente ao conte- Ao considerarmos as diferentes aborda-
údo e a equivalência entre fatos e ativi- gens sistematizadas por meio destes ma-
dades, estabelecendo aí a essência do nuais, podemos percebê-las como espe-
documento de arquivo, isto é, seu valor cíficas às contingências jurídicas, admi-
probatório. Todavia, não podemos des- nistrativas e históricas de cada país ou
considerar que esses arquivistas estabe- região e que influenciam diretamente nas
leceram suas análises a partir do que demandas práticas de organização e dis-
consideravam como arquivo, ou seja, ponibilização dos documentos de arqui-
arquivo histórico, formado por fundos vo. Para Cook (1998, p. 133) “todos es-
fechados nos quais a custódia era proce- ses pioneiros da arquivística refletiram
dimento obrigatório para manutenção da em seus trabalhos as correntes intelectu-
autenticidade dos documentos de arqui- ais do século XIX e do início do século
vo. XX”.
Os princípios, conceitos e teorias Hilary Jenkinson pode ser consi-
da área foram sendo construídos pela derado um dos expoentes da arquivolo-
experiência profissional destes arquivis- gia clássica, principalmente por consoli-
tas com documentos públicos e que ti- dar, por meio de seu manual, o Fazer e o
nham por objetivo organizá-los e dispo- Saber dos arquivos sob o pilar do conhe-
nibilizá-los para a investigação histórica, cimento científico. Essa construção se
tanto que, ainda hoje, utilizamos termos deu pela disseminação de ideias advin-
e conceitos preconizados neste período, das de suas próprias experiências, ideias
como descrição, arranjo e inventário, essas que foram e são, sistematicamente,
56

quando nos referirmos aos documentos revisitadas pela área.


Página

históricos, atualmente definidos pela Mais de setenta anos após a pu-


comunidade da área como permanentes. blicação do manual de Jenkinson, Terry
Além disso, os manuais considerados Cook rediscute, como vimos, muitas

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ideias do autor britânico claramente com nos apresenta mais questionamentos do


objetivo de desconstruí-las a partir de que efetivamente respostas, sendo possí-
uma perspectiva que denomina como vel percebermos que ambos contribuem
pós-moderna. A proposta elaborada pelo para o desenvolvimento da arquivologia,
canadense é exemplo, junto com inúme- ainda que em tempos e contextos dife-
ras outras, de novas abordagens que se rentes.
apresentam para o campo dos arquivos
no presente.
Isto posto, as análises e reflexões
a partir do pensamento destes autores

THE CLASSIC AND THE POS-MODERN: SOME REFLECTIONS ABOUT THE


ARCHIVAL SCIENCE BASED ON THOUGHTS OF HILARY JENKINSON AND
TERRY COOK

ABSTRACT

Searching to answer contemporary problems that have resulted from new


ways of production and the use of files, the Archival Science re-examines
the theoretical fundamentals and practices of the study field. With that sce-
nario, the ideas of classic authors are constantly revisited and many times
considered old fashioned and custodial by one side and, by the other, pio-
neer and avant-garde. Following that perspective, this document aims to re-
flect about the elements that we believe provide scientificism to the Archiv-
al field found in the thoughts of the British Hilary Jenkinson and the Cana-
dian Terry Cook, and also to analyse how the approaches of Jenkinson are
appropriated by Cook.

Keywords: Custodial Archival Science. Postmodern Archival Science. Hil-


ary Jenkinson. Terry Cook.

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Trabalho recebido em: 31 mar. 2014 Trabalho aceito em: 13 fev. 2015

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