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ção de toda a comunidade e incluindo, para expansão, assim como em outros países como
além de instrumentos musicais, objectos de a Austrália, o Brasil, a China, o Canadá e o Ja-
uso quotidiano, como tachos e panelas de me- pão. O estudo da etnomusicologia é geralmente
tal ou objectos naturais com propriedades realizado a nível de pós-graduação (mestrado e
acústicas distintas, como *pinhas, seixos, *pe- doutoramento) em departamentos de música,
drinhas, etc. No âmbito das cavalhadas refere- ciências musicais ou antropologia. A investi-
-se ao conjunto instrumental constituído por gação etnomusicológica também decorre no
um número variável de instrumentos musicais âmbito de arquivos sonoros e audiovisuais,
que abre o desfile, antecedendo a procissão. museus etnográficos ou de música, bem como
Durante o séc. XIX, o estrondo foi progressiva- em diversos institutos de investigação. Em Por-
mente substituído por um conjunto-padrão de tugal, a etnomusicologia foi institucionalizada
membranofones e idiofones igual aos zés-pe- em 1980, no Departamento de Ciências Musi-
reiras. Em Vil de Moinhos o Conjunto Zés-Pe- cais da Faculdade de Ciências Sociais e Huma-
reiras Os Bombos de Vil de moinhos encarre- nas da *Universidade Nova de Lisboa (DCM-
ga-se da sua performação. -FCSH-UNL), primeiro no âmbito da licencia-
ROSA CLARA NEVES tura em Ciências Musicais, e, a partir de 1990,
constituindo uma área de especialização aos
ESTUDANTINA. VER Tuna. níveis de mestrado e doutoramento. A funda-
ção do Instituto de Etnomusicologia na FCSH-
ESTÚRDIA. VER Tuna. -UNL, em 1995, veio consolidar e expandir
a investigação etnomusicológica em Portugal.
ETNOMUSICOLOGIA. 1. Enquadramento geral. A moderna etnomusicologia configurou-se
2. Portugal. (i) Dos cancioneiros oitocentistas inicialmente a partir de diversas abordagens
às etnografias regionais e às primeiras tenta- ao estudo de práticas musicais extra-europeias
tivas de sistematização da música de matriz e de tradições musicais europeias de matriz ru-
rural no princípio do século XX. (ii) O Estado ral que se desenvolveram dentro e fora da aca-
Novo e a construção da nação através da demia. Na verdade, o interesse pelo conheci-
cultura popular. (iii) «Canção popular» e mento das culturas expressivas em espaços
militância cultural. (iv) Do levantamento dominados por poderes coloniais europeus re-
extensivo da música em contextos rurais monta aos primeiros contactos dos explorado-
aos estudos em torno de regiões ou géneros res, missionários e colonos portugueses, e.o,
poético-musicais e coreográficos no último com os povos dos continentes africano, ame-
quartel do século XX. (v) A institucionaliza- ricano e asiático (Castelo-Branco 1997). Do
ção da moderna etnomusicologia. mesmo modo, colonizadores e estudiosos de
1. Enquadramento geral. A etnomusicologia outros países europeus (missionários, antropó-
é uma disciplina científica que estuda a música logos, musicólogos, e.o.) também se dedica-
nas suas múltiplas dimensões, nomeadamente a ram ao estudo das práticas expressivas sobre-
social, a cultural, a política, a cognitiva e a es- tudo em África, no Médio Oriente e na Ásia.
tética, e.o. Caracteriza-se pela abordagem mul- Apesar do quadro colonial e da perspectiva
tidisciplinar, cruzando perspectivas teóricas e evolucionista que enformaram tais estudos
metodológicas da musicologia, da antropologia, a partir de finais do séc. XIX e durante as pri-
da sociologia, da história, da linguística, da psi- meiras décadas do séc. XX, os registos produzi-
cologia, da etnocoreologia e dos estudos cultu- dos (etnografias, transcrições musicais, grava-
rais. Integra, igualmente, como objecto de estu- ções sonoras, e.o.), despertaram interesse pela
do, outros modos expressivos ligados à música riqueza e diversidade das práticas expressivas
como a dança, a poesia e o teatro, e.o. Consti- fora da Europa. É no quadro colonial e num
tuindo a música como prisma privilegiado, a ambiente intelectual imbuído pelas ideias do
etnomusicologia aborda problemáticas cen- evolucionismo unilinear que um dos paradig-
trais nas ciências sociais e humanas, tais como mas de investigação que antecedeu a moderna
a globalização, a mediatização, a construção etnomusicologia foi desenvolvido em Berlim
de identidades, o nacionalismo, as diásporas, o ao longo das primeiras três décadas do séc. XX,
colonialismo e o pós-colonialismo, e.o. Abor- o da «musicologia comparada» (vergleichende
dando um leque diversificado de géneros e es- Musikwissenschaft). A disciplina foi institu-
tilos musicais nos contextos local, regional, cionalizada no princípio do século passado no
nacional ou global, indaga o modo como ideias Instituto de Psicologia da Universidade de
e valores sociais enformam a produção e o con- Berlim, no âmbito do qual foi fundado o se-
sumo musicais, e como a música configura pro- gundo arquivo sonoro mais antigo do mundo
cessos sociais e identidades. Desde a segunda (Berliner Phonogrammarchiv), em 1900, sen-
metade do séc. XX que a disciplina está plena- do que o primeiro havia sido fundado em
mente instituída nos sistemas universitários Viena em 1899 (Vienna Phonogrammarchiv).
europeu e norte-americano, onde continua em O principal objectivo da musicologia compa-
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de T. Braga. Intitulada Álbum de musicas na- 39; Vasconcelos, 1895), ao longo do séc. XX o
cionais portuguesas, reúne harmonizações Cancioneiro de Neves e Campos serviu como
para piano ou voz e piano de 12 canções e referência para estudiosos e como fonte de re-
danças, recolhidas nas regiões da Beira, Trás- pertório para diversos agrupamentos (*ran-
-os-Montes e Minho, além de canções de chos folclóricos, *orfeões, e.o.). Até à década
Coimbra e fados. No subtítulo da obra, J. A. de 80, para muitos estudiosos da música de
Ribas assinala o facto de ter realizado trabalho matriz rural a compilação de um cancioneiro
de terreno, indicando que as «cantigas» e «to- popular português foi um objectivo prioritário.
catas» foram «transcritas nas respectivas loca- Cancioneiros e etnografias regionais ou lo-
lidades». A boa recepção desta colectânea cais. A partir da última década de Oitocentos,
atesta-se, quer pelas duas edições publicadas observa-se um interesse na elaboração de et-
(1857 e 1960), quer pelo elogio tecido pelo nografias musicais ou gerais (algumas das
musicólogo E. Vieira no seu Dicionário bio- quais integram a música e outros aspectos da
gráfico de músicos portugueses (1900). Em cultura expressiva) e cancioneiros, focando
1872, uma década e meia após a publicação do uma região ou localidade, tendência que se ve-
Álbum, Adelino António das Neves e *Melo rifica até ao final do séc. XX, embora com me-
publicou uma colecção de «canções popu- nos intensidade no último quartel do século.
lares» constituída por transcrições musicais Levadas a cabo por eruditos locais (padres,
de melodias e de letras coligidas nas regiões professores, jornalistas, militares, regentes,
de Coimbra, Minho, Trás-os-Montes e Açores. e.o.), que privilegiavam o contacto directo com
Numa nota introdutória, o compilador estabe- as práticas expressivas locais, procurando do-
lece um paralelo entre as canções recolhidas e cumentar detentores de tradição idosos em lo-
o meio natural envolvente, aludindo deste mo- calidades isoladas, estas obras contribuíram
do à «pureza» e à «naturalidade» (leia-se auten- para o processo de construção da nação a par-
ticidade) das «canções populares» que integram tir da perspectiva das suas regiões. O trabalho
o volume. Na última década de Oitocentos, foi etnográfico a nível regional intensificou-se du-
editado o Cancioneiro de músicas populares rante o período do Estado Novo, tendo contri-
publicado por César das *Neves e Gualdino buído de modo significativo para o processo
*Campos, no Porto (1893, 1895 e 1898). de folclorização. Neste período, eruditos lo-
O Cancioneiro reúne 622 composições origi- cais fundaram e orientaram agrupamentos fol-
nais e transcrições de letras e melodias harmo- clóricos, seleccionaram repertórios, associa-
nizadas para piano e canto de diversos géneros ram géneros e estilos musicais a regiões,
musicais e coreográficos recolhidos no conti- contribuindo deste modo para a construção de
nente (sobretudo nas regiões da Beira Litoral, um cânone e para a tipificação de repertórios e
Douro Litoral e Alentejo), nos Açores, no Bra- estilos. É com o cancioneiro literário açoriano
sil e no então espaço colonial português (Cabo de T. Braga (1869) e o romanceiro algarvio do
Verde, Goa e São Tomé e Príncipe). Abrange arqueólogo Estácio da Veiga (1870) que o en-
canções e danças de matriz rural (recolhidas, foque regional teve a sua expressão inicial.
sobretudo, na segunda metade do séc. XIX, por A primeira obra a focar a música numa região
uma rede de mais de 40 colectores em Por- rural terá sido Canções populares da Beira
tugal, Brasil e no espaço colonial abrangido), (1896), de Pedro Fernandes *Tomás, uma co-
fado, outras canções urbanas portuguesas e es- lecção de melodias por ele recolhidas e har-
trangeiras, e géneros oriundos do espaço lusó- monizadas. Professor e jornalista, norteou-se
fono como o *mandó, a modinha e o lundum. pelo ideal da autenticidade, tendo referido a
César das Neves (compositor, professor, poeta influência que considerava negativa de géne-
e editor) efectuou algumas das recolhas e as ros urbanos como a *opereta e o fado e a ur-
harmonizações; G. Campos (jornalista) foi gência em salvaguardar o património rural
responsável pelas letras. O Cancioneiro de ameaçado. Cumpre igualmente referir revistas
Neves e Campos cruza dois objectivos: dispo- especializadas, algumas de enfoque regional,
nibilizar música para o entretenimento domés- muitas das quais publicavam transcrições de
tico dos meios aristocráticos e burgueses e letras e melodias, e descrições etnográficas:
reunir um conjunto alargado de repertório de A Tradição (1899-1904), *Arte Musical, Ilus-
música popular de Portugal e do então espaço tração Portuguesa, Revista Lusitana, e.o. Até
colonial, à semelhança do trabalho empreendi- à década de 30 destacam-se ainda três obras
do por etnógrafos e filólogos, contribuindo com enfoque regional: a) Cancioneirinho de
deste modo para a «construção da ideia de na- Fozcoa, de Edmundo Correia Lopes (1926),
ção, enquanto império» (Pestana 2008: 127). que indaga a origem da música popular, com-
Embora tenha sido criticado por alguns es- parando-a com a música erudita, procurando
tudiosos pela falta de rigor na escolha dos tre- ainda estabelecer uma área poética e musical
chos e na sua representação (Lopes-Graça e peninsular (Pestana 2008: 196). b) Etnografia
Borba 1996/1956-1958: 294; Oliveira 1982: da Beira (1926-1971), obra em 11 volumes de
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Jaime Lopes *Dias que, baseada num contacto logo, editor e personalidade multifacetada. Na
directo com as populações da Beira Baixa, re- secção dedicada à «música popular» da entra-
trata o quotidiano rural, a cultura material, as da sobre Portugal na Encyclopédie de la Musi-
crenças e a cultura expressiva, ilustrando a que et Dictionaire du Conservatoire de Albert
descrição etnográfica com desenhos, fotogra- Lavignac (1914-1934) descreve géneros e esti-
fias e transcrições harmonizadas. A actividade los musicais e coreográficos, bem como ins-
e impacte de J. L. Dias estenderam-se pelo pe- trumentos musicais utilizados no meio rural,
ríodo do Estado Novo. c) Folklore do conce- contextualizando-os histórica e culturalmente,
lho de Vinhais, do padre Firmino *Martins relacionando os patrimónios erudito e tradicio-
(1928, 1938), que se destaca pela extensa co- nal, e discutindo as origens e influências ex-
lecção de canções e romances editados pela ternas de alguns instrumentos e características
primeira vez. As primeiras tentativas de siste- descritas. Refere-se ainda à profusão de *ban-
matização da música de matriz rural. No iní- das filarmónicas nos meios rurais. Quanto aos
cio do séc. XX, surgiram as primeiras tentativas géneros urbanos, centra-se no fado e, refutan-
de sistematização da pesquisa e do conheci- do uma origem antiga do género, situa a sua
mento existente em torno da música de matriz prática a partir de 1840. (ii) O Estado Novo e
rural. Em 1902, o Conselho de Arte Musical a construção da nação através da cultura
do *Conservatório Nacional (CN), publicou popular. Durante o período do Estado Novo
no primeiro número da Revista do Conserva- (1933-1974) aumentou o número de colectores
tório Real de Lisboa uma circular apelando à e estudiosos da cultura popular, incluindo a
realização de recolhas (entendidas como trans- música: folcloristas e etnógrafos afectos ao
crições musicais) com o intuito de as publicar Estado Novo, servindo o seu projecto naciona-
na Revista do Conservatório (Lucci 1902: 15). lista; estudiosos que se opuseram ao regime
Assente no ideal da autenticidade, a circular totalitário; antropólogos e outros investigado-
fornece orientações aos colectores, entre as res de perfil académico (Leal 2000: 37), al-
quais registar a melodia e o maior número de guns dos quais receberam apoio do Estado ou
variantes de modo «fiel» (sem nenhuma alte- de autarquias sem se envolverem directamente
ração do colector); indicar a localidade, época, nos seus projectos. Foi também neste período
e.o. Apesar de não ter tido resposta, a circular que se realizaram os primeiros estudos da mú-
apontou, pela primeira vez, a necessidade de sica e dança de alguns dos povos nas então co-
registar a música de matriz rural de modo sis- lónias portuguesas, nomeadamente Angola,
temático. Mais de dez anos após a publicação Cabo Verde e Moçambique. Política cultural,
da circular, o crítico António *Arroio (1913), folclorização e prática etnográfica. A *políti-
num ensaio introdutório à colectânea de *can- ca cultural do Estado Novo instrumentalizou a
ções e romances [VER Romanceiro] de P. F. To- cultura expressiva para inculcar a sua ideolo-
más, apela à utilização de um «método verda- gia nacionalista. Concebida por António Ferro,
deiramente científico» na colecta da canção foi implementada por instituições do Estado
popular (Id.: 7). Aponta as deficiências da com destaque para o *Secretariado Nacional
transcrição musical como meio de registo, re- da Informação, Cultura Popular e Turismo
comendando antes o uso do fonógrafo (Id.: (SNI), a *Fundação Nacional para a Alegria
24), tendo referido que ele próprio havia efec- no Trabalho, as Casas do Povo e a Emissora
tuado gravações fonográficas de música em Nacional de Radiodifusão — ENR [VER Rá-
contextos rurais. Propõe ainda a primeira divi- dio]. A partir de meados da década de 30, um
são do continente em quatro «áreas musicais», conjunto de folcloristas e etnógrafos afectos
isto é, áreas geográficas onde se verificam tra- ao regime estado-novista desempenhou um
ços musicais comuns: «toda a parte alta do papel central no processo de folclorização pro-
país ao norte do Tejo», «as terras baixas que movido e regulado pelo Estado (Castelo-Bran-
compreendem parte do Douro e toda a Estre- co e Branco 2003). Alguns trabalharam a nível
madura», o Alentejo e o Algarve (Id.: 26-27). nacional, mas a maioria desenvolveu as suas
Influenciado pelas perspectivas evolucionista actividades numa localidade ou região, me-
e difusionista vigentes no período, argumenta diando entre populações rurais e instituições
que as diferenças estilísticas na canção popu- do Estado. Encetaram uma actividade múlti-
lar das regiões apontadas devem-se ao meio fí- pla: recolher, seleccionar, «corrigir», textuali-
sico e às condições climáticas (Id.: 29). Embora zar e efectuar registos sonoros de repertórios
a proposta de Arroio não tenha sido adoptada musicais e coreográficos tidos por «típicos»
por outros estudiosos, inaugurou a perspectiva de uma região; configurar o modo da sua exi-
regionalista que viria a dominar a abordagem bição, fundando e orientando grupos folclóri-
da música de matriz rural no país. A primeira cos, orfeões ou grupos corais para o efeito;
visão de conjunto da música e dos *instrumen- elaborar arranjos, composições musicais e mo-
tos musicais em contextos rurais do continente nografias a partir do material recolhido. Este
deve-se a Michel’Angelo Lambertini, musicó- trabalho contribuiu para a configuração de um
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cânone para o folclore que se cristalizou até ao No seu livro editado em português, documenta
final do século. O papel do folclorista Arman- e descreve algumas das características da
do *Leça foi fundamental neste processo nos «canção rústica» e apela à sua salvaguarda
âmbitos nacional e regional, sobretudo no Nor- através de três medidas: o registo escrito de
te e Centro do continente (Pestana no prelo). melodias, a formação de grupos nas aldeias
No seu primeiro livro (1922), reúne um con- com o intuito de preservar a tradição local e a
junto de ensaios e transcrições musicais da documentação fonográfica dos detentores de
música em contextos rurais em várias regiões tradição (Id.: 36). Tal como para outros folclo-
do país. Norteado pela ideologia nacionalista e ristas europeus do mesmo período, as origens
seus ideais de autenticidade, esboça a visão re- da «arte popular» constituíram uma das suas
gionalista do país que enformou o seu trabalho preocupações. Baseando-se no conceito de gu-
posterior, incluindo a sua segunda monografia sunkenes Kulturgut, propôs que o «povo não
(1947). A partir de meados da década de 30, cria: apenas reproduz» as práticas das «esferas
efectuou um levantamento da música em con- sociais mais elevadas» (Id.: 11), perspectiva
textos rurais de norte a sul do país. Criou ain- posteriormente refutada por F. Lopes-Graça
da arranjos e novas composições a partir da (1973/1953). Etnografias locais e regionais.
música recolhida, orientou ranchos folclóricos No período do Estado Novo, vários etnógrafos
(Id.), integrou júris de concursos e outras ini- e folcloristas dedicaram-se à documentação
ciativas que exibem patrimónios locais, com e ao estudo de repertórios locais de música e
destaque para o *Concurso A Aldeia mais dança. Muitos levaram a cabo igualmente pes-
Portuguesa de Portugal promovido pelo SNI, quisa noutros domínios a nível local como a
evento instrumental na institucionalização de história, a etnografia, a arqueologia, a lexi-
um modelo para a representação visual e sóni- cografia, a poesia e o teatro populares. Além
ca do país (Félix 2003). Leça integrou o júri de estudiosos, eram compositores, escritores e
nacional do concurso e ainda o júri da provín- regentes de bandas filarmónicas ou orfeões.
cia do Douro Litoral. No ano seguinte, no âm- A maioria exercia funções profissionais nas
bito da comemoração do duplo centenário, foi localidades onde desenvolvia a sua investiga-
encarregue, em colaboração com a ENR, de ção, tais como o sacerdócio, o ensino, a activi-
efectuar o registo sonoro de práticas musicais dade militar ou a administração autárquica.
rurais do continente. Levou a cabo o primeiro Destacam-se pelo seu contributo e impacte
levantamento extensivo da música em 82 loca- Abel *Viana (Alto Minho e Alentejo), Almeida
lidades rurais, em dez das então 11 províncias *Campos (Beira Alta), António Maria *Mouri-
do continente (Pestana, no prelo). Antes das nho (Terras de Miranda, Trás-os-Montes), An-
gravações de Leça, e além dos registos fono- tónio *Marvão (Alentejo), Azinhal *Abelho
gráficos referidos por A. Arroio, apenas o mu- (Alentejo), Carlos *Santos (Madeira), Gonça-
sicólogo alemão Kurt *Schindler havia efec- lo *Sampaio (Minho), Fernando Pires de *Li-
tuado gravações em Trás-os-Montes, em 1932, ma (Douro Litoral e Minho), Guilherme *Fel-
no âmbito de uma recolha mais extensiva le- gueiras (Estremadura e região Norte), J. L.
vada a cabo em Espanha. O papel de Leça foi Dias (Beira Baixa), Jaime Pinto *Pereira (Bei-
fundamental no estabelecimento do registo so- ra Alta), Joaquim *Roque (Alentejo), José
noro associado ao contacto com as populações Maria *Marques (região do Vouga), Manuel
como condição indispensável para o estudo Joaquim *Delgado (Alentejo), *Pombinho Jú-
das práticas locais; na construção de uma pers- nior (Alentejo). Interessados em «salvar» reper-
pectiva regionalista do património musical ru- tórios locais tidos por antigos, publicaram os
ral; e na configuração do processo de folclori- resultados da sua pesquisa em cancioneiros,
zação (Id.). Na década de 30, salienta-se ainda monografias e artigos em jornais e periódicos
o contributo do diplomata e folclorista inglês locais ou regionais. Alguns foram ainda cola-
Rodney *Gallop. Tendo permanecido em Por- boradores do periódico *Mensário das Casas
tugal, entre 1931 e 1933, contactou com práti- do Povo, um dos meios utilizados pelo Estado
cas musicais rurais (Alentejo, Beira Alta, Beira Novo para a doutrinação das populações rurais
Baixa, Estremadura, Minho e Trás-os-Montes), e para a intervenção no movimento folclórico.
com o fado e com a canção de Coimbra. Com Tidas como referência, sobretudo por agentes
base nesta vivência e nas transcrições musi- culturais locais e por entidades do Estado liga-
cais que efectuou in loco, publicou em inglês, dos ao movimento folclórico, algumas obras
na década de 30, uma dezena de artigos em re- produzidas por «eruditos locais» ou outros es-
vistas de musicologia e folclore, e dois livros, tudiosos foram reeditadas no final do século,
um dos quais traduzido para português e pu- integrando por vezes alguns textos inéditos
blicado em duas edições (1936; 1937/1960). (p.ex. Martins 1997, Marvão 1997, Pereira
As suas publicações constituíram até aos anos 1990, Roque 1990). Desde a última década do
80 uma das poucas referências em língua in- séc. XX, o trabalho de vários estudiosos da mú-
glesa sobre a música não erudita em Portugal. sica de matriz rural aos níveis local e nacional
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constituiu objecto de estudos levados a cabo gos dos Açores e da Madeira e em Angola.
por etnomusicólogos e antropólogos [VER iv]. Compositor e professor no CN, a ele se deve
As práticas etnográficas e documentais de igualmente a primeira tentativa de institucio-
Vergílio Pereira e Artur Santos. No período nalização da etnomusicologia em Portugal.
que se estende entre 1947 e 1963, destaca-se o Enquanto funcionário da Emissora Nacional,
trabalho desenvolvido por Vergílio *Pereira no fez o seu primeiro levantamento em zonas ru-
Norte do país. Regente de coros, professor e rais fronteiriças (1936-1943), tendo baseado
compositor, em 1947 integrou a Comissão de algumas das suas composições nas melodias
Etnografia e História da Província do Douro que recolheu. Em Angola, realizou levanta-
Litoral (órgão da Junta de Província do Dou- mentos nas regiões da Lunda e do Alto Zam-
ro Litoral, em actividade entre 1937 e 1959), beze (1949), com o apoio da Companhia de
que patrocinou o levantamento da música em Diamantes de Angola (Diamang). Efectuou
contextos rurais que o autor levou a cabo nos ainda registos sonoros na Beira Baixa e na Bei-
concelhos de Cinfães (1947), Resende (1948), ra Alta (1956) a convite da BBC. O levanta-
Arouca (1953-1955) e Santo Tirso (1958). Tra- mento mais extensivo que realizou foi nos Aço-
ta-se de uma recolha sistemática e extensiva, res (Terceira, 1952; São Miguel, 1952-1953 e
feita in loco, que resultou em cancioneiros 1959-1960; Santa Maria, 1955 e 1957-1958)
(1950, 1957 e 1959) e em outras publicações, com o patrocínio do Instituto Cultural de Ponta
assim como em registos sonoros efectuados Delgada, da Junta Geral do Distrito Autónomo
nos concelhos de Arouca e Santo Tirso (a par- de Angra do Heroísmo e do Instituto de Alta
tir de 1955). Documentou ainda práticas poli- Cultura. Parte dos registos sonoros efectuados
fónicas nas zonas fronteiriças do Gerês (1957) nos Açores e nas Beiras foram editados, tendo
e Miranda do Douro (1959). Crítico da abor- sido oferecidos a numerosas instituições espe-
dagem dos grupos folclóricos, interessou-se cializadas no estudo da *música tradicional
sobretudo pelo repertório que considerou «an- em vários continentes. Efectuou igualmente
tigo», «autêntico» e com «qualidade artística», levantamentos na Madeira (1959 e 1962-1963)
passível a arranjos e estilizações para agrupa- com o patrocínio da Junta Geral do Distrito
mentos corais, tendo privilegiado géneros po- Autónomo do Funchal. Modelou o seu traba-
lifónicos femininos (*cramóis, cantas, e.o.), lho no de B. Bartók, tendo sido muito exigente
canções de trabalho e repertório religioso no que respeita à qualidade das gravações
(Pestana 2008: 163-188). Entre 1961 e 1963, efectuadas. Apresentou palestras em vários
contando com o apoio da comissão de etno- países europeus, onde contactou com algumas
musicologia da *Fundação Calouste Gulben- das instituições mais relevantes da etnomusi-
kian (FCG), prosseguiu o registo sonoro, foto- cologia e do folclore da época, como o Inter-
gráfico e textual das práticas musicais rurais national Council for Folk Music e a English
no Douro Litoral, na Beira Baixa e na Beira Folk Song and Dance Society, contactando
Alta. O corpus coligido por Pereira nos conce- igualmente com algumas das suas mais desta-
lhos de Cinfães e Resende foi submetido a cadas figuras intelectuais como Jaap Kunst,
análise pelo folclorista e crítico R. Bonito, que Paul Collaer ou André Schaefner. Delineou o
comparou canções de embalar e cânticos de projecto do primeiro Centro de Estudos Etno-
natividade em Portugal e Espanha, propondo musicológicos no país, que chegou a ser criado
uma tipologia de temas para cada género, exa- em 1964, sem ter sido viabilizado financeira-
minando ainda as possíveis ligações entre as mente. Integrou a Comissão de Etnomusicolo-
cantas e os cramóis e o gymel e fabourdão me- gia da FCG (1960), que se destinava a avaliar
dievais (Id.). Com efeito, o levantamento ex- projectos de levantamento e investigação em
tensivo de Pereira e a análise comparativa de torno da música tradicional (Cruz 2001). Ape-
Bonito trouxeram uma abordagem sistemática sar da importância dos legados documentais
sem precedentes no panorama de investigação de V. Pereira e de A. Santos, e do carácter sis-
em torno da música rural em Portugal, tendo temático que imprimiram ao trabalho etnográ-
decorrido ao longo de um período prolongado fico, não alcançaram o devido reconhecimento
durante o qual Pereira contactou directamente público. Os registos sonoros de V. Pereira per-
com os detentores de tradição que estão identi- manecem inéditos e apenas uma parte dos re-
ficados e retratados nos seus cancioneiros. Os gistos de A. Santos foram editados. O discurso
registos que efectuou integraram um arquivo etnográfico de cariz académico e a aborda-
sonoro de âmbito provincial, constituindo uma gem da cultura expressiva nas obras de Jorge
iniciativa inédita no país (Id.). A criação de e Margot Dias, de Ernesto Veiga de Oliveira
uma linguagem musical erudita de cunho na- e de José Redinha. A partir de final da década
cionalista foi o principal objectivo que norteou de 40, o panorama de investigação em torno
o levantamento e os registos sonoros da músi- do património rural conta com a iniciativa de
ca rural levados a cabo por Artur *Santos, en- Jorge *Dias, que instituiu a antropologia portu-
tre 1939 e 1965, no continente, nos arquipéla- guesa de perfil académico, tendo contribuído
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M. Giacometti, editado ou musealizado, con- musicais de Porto Santo (Cauffriez 1980, 1985,
tribuiu para a valorização das práticas expres- 1989, 1997). (v) A institucionalização da
sivas rurais por parte de intelectuais e do Esta- moderna etnomusicologia. Salwa El-Shawan
do, tendo alcançado reconhecimento público Castelo-Branco foi responsável pela introdu-
em vida e após a sua morte. (iv) Do levanta- ção da moderna etnomusicologia no Departa-
mento extensivo da música em contextos mento de Ciências Musicais (DCM) da FCSH-
rurais aos estudos em torno de regiões e gé- -UNL, a partir de 1982. A sua acção pautou-se
neros poético-musicais e coreográficos no por três objectivos: ministrar um ensino actua-
último quartel do século XX. O levantamento lizado em termos teóricos e metodológicos de
extensivo da música em contextos rurais foi modo a formar uma nova geração de etnomu-
prosseguida por José Alberto *Sardinha, tendo sicólogos competentes e internacionalmente
efectuado registos sonoros em várias regiões competitivos; incentivar os jovens formandos
do país desde 1974, primeiro no âmbito do a levar a cabo investigação etnomusicológica
Grupo de Recolha e Divulgação de Música em Portugal e no espaço lusófono em torno de
Popular (grupo que em 1979 assumiu a desig- problemáticas actuais; encetar um diálogo cien-
nação de *Almanaque), e, desde 1983, a título tífico com uma rede alargada de instituições e
individual, coligindo mais de 500 horas de investigadores em Portugal e no estrangeiro de
gravações sonoras. Levou a cabo um levanta- modo a colocar Portugal no circuito internacio-
mento das tradições musicais da Estremadura, nal de produção científica no domínio da etno-
região até então negligenciada por colectores e musicologia. A organização de dois colóquios
estudiosos (Sardinha 2000). No último quartel internacionais pelo DCM em torno de temá-
do séc. XX, salientam-se igualmente estudos ticas actuais na etnomusicologia contribuiu
focando regiões ou géneros poético-musicais para colocar Portugal no circuito internacional
ou coreográficos. João Ranita *Nazaré, forma- de investigação etnomusicológica. O primeiro
do em Musicologia e Sociologia, abordou as teve lugar em 1986 em colaboração com o
práticas polifónicas masculinas no Baixo Alen- Conselho Internacional de Música Tradicional
tejo, tendo realizado trabalho de terreno entre (UNESCO), tendo focado os processos mu-
1966 e 1969. Apontando as mudanças em cur- sicais desencadeados pelos encontros históri-
so, analisa um corpus de mais de 100 *modas, cos entre Portugal e os povos de África, Brasil
dando especial atenção às suas características e Ásia desde o séc. XV (Castelo-Branco 1997).
musicais (tonalidade, estrutura, andamento, âm- O segundo foi organizado em 1994 com o
bito, e.o.) e prática performativa (Nazaré 1979, apoio do Departamento de Música Popular de
1984, 1986). José Manuel Bettencourt da *Câ- *Lisboa94, Capital Europeia da Cultura. Tra-
mara dedicou-se ao estudo da música erudita e ta-se do 1.o Encontro de Etnomusicólogos
tradicional dos Açores. Referindo as transfor- Ibero-Americanos dedicado ao estudo das
mações que observou, aborda o *romanceiro, Culturas Musicais Urbanas no Final do Sécu-
os géneros coreográficos (*chamarrita, *pezi- lo XX. A investigação levada a cabo em Por-
nho, *sapateia), os *cantares ao desafio, a mú- tugal no âmbito da moderna etnomusicologia
sica no contexto da *festa e as formas locais nas últimas duas décadas do séc. XX abrange
de religiosidade (*cânticos dos romeiros de vários domínios e processos musicais, da mú-
São Miguel) (Câmara 1980 e 1984). Salienta- sica das comunidades migrantes ao *pop-rock,
-se igualmente o contributo para o estudo do ao fado e à música tradicional. Foi levada a
romanceiro de duas estudiosas estrangeiras. cabo em Portugal, em vários PALOP, em co-
Joanne *Purcell, especialista norte americana munidades migrantes portuguesas no estran-
em literatura oral pan-ibérica, começou por es- geiro e em espaços de influência portuguesa.
tudar os detentores de tradição na comunidade Das actuais problemáticas focadas destacam-
açoriana e madeirense na Califórnia (1968), -se: o papel da cultura expressiva na constru-
tendo depois realizado um levantamento ex- ção de identidades; a relação entre música,
tensivo nos Açores, na Madeira, no Alto Alen- ideologia e poder; o impacte dos fluxos migra-
tejo, nas Beiras, no Minho e em Trás-os-Mon- tórios na cultura expressiva sobretudo nos es-
tes (1969) dos principais géneros de literatura paços lusófono, europeu e norte-americano; a
oral, muitos dos quais cantados, com especial história intelectual da disciplina e o contributo
destaque para o romanceiro (Purcell et al. das suas principais figuras. Os primeiros tra-
1976; Purcell, Rodríguez-García e Saramago balhos de investigação foram publicados na
1987). Anne Cauffriez, etnomusicóloga belga, década de 80, tendo, na maioria dos casos, re-
realizou várias estadias de terreno em Trás-os- sultado de projectos realizados no âmbito da
-Montes, Minho e na Madeira desde 1978. Fo- licenciatura em Ciências Musicais. Focam o
ca o romanceiro transmontano, contextualizan- papel social de um coro amador (Cardoso
do-o histórica, social e culturalmente, aborda a 1986), o *Hot Clube de Portugal enquanto ins-
*gaita-de-foles e seu repertório, as polifonias tituição sociomusical (Aresta e Gomes 1986),
femininas do Norte de Portugal e as práticas o rock em Lisboa (Giga e Gaio 1986), a músi-
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ca na publicidade (Cymbron e Cruz 1986), a género (Côrte-Real 2000). A mudança musi-
mudança musical (Carvalho e Oliveira 1987), cal e as tentativas de salvaguarda do patrimó-
a prática musical da comunidade judaica lis- nio musical português (Castelo-Branco 1992,
boeta (Borges e Miranda 1987), um grupo ur- 1992a), a música enquanto veículo de inculca-
bano de recriação (Correia e Neves 1987) e o ção de ideologias e o papel da política cultural
papel do grupo folclórico federado (Sardo na expressão musical constituíram igualmente
1988). Foi também publicado o primeiro estu- objecto de estudo (Castelo-Branco 1989, 1991,
do em língua inglesa dirigido à comunidade 1991a; Côrte-Real 1996, 2000). Em 1997, ini-
científica internacional em torno da investiga- ciou-se um projecto no INET com vista a pu-
ção etnomusicológica em Portugal desde o blicar um dicionário multimédia da cultura ex-
séc. XIX até à institucionalização da disciplina pressiva em Portugal no âmbito do qual foi
(Castelo-Branco e Toscano 1988), tendo sido levada a cabo investigação em torno da músi-
muitos dos protagonistas abordados neste arti- ca popular, do *pop-rock, do *hip-hop, do fa-
go, alvo de estudos posteriores mais aprofun- do, da música das comunidades migrantes, dos
dados, quer por antropólogos, quer por etno- media (*indústria fonográfica, *rádio, cinema,
musicólogos (Branco e Oliveira 1993 e 1994; *edição de música), e.o. Partindo deste e de
Castelo-Branco e Branco 2003; Cruz 2000; Pes- outros projectos do Instituto, estão em curso
tana 2008 e no prelo). Na década de 90, a inves- dissertações de doutoramento em torno do
tigação etnomusicológica expandiu-se, ganhan- pop-rock (António Tilly e Pedro Félix) e de
do nova dinâmica no âmbito do INET. Foram processos transnacionais na música de Cabo
focadas várias vertentes dos processos de fol- Verde (Rui Cidra), na música da comunidade
clorização e recriação da música de matriz ru- *hindu-gujurati em Lisboa e em Londres (Pe-
ral, tendo sido levado a cabo um projecto de dro Roxo). Refere-se também publicações em
investigação em torno desta problemática no língua estrangeira apresentando uma visão de
âmbito do Instituto, cujos resultados foram re- conjunto da música rural e urbana em Portugal,
flectidos em teses (Lima 2000; Pestana 2000) e, quer na forma de entradas em obras de referên-
posteriormente, publicados num livro coorde- cia especializadas, quer de um livro dirigido ao
nado por Castelo-Branco e Branco (2003). Par- grande público (Castelo-Branco 1997a, 1997b,
tindo de uma perspectiva multidisciplinar, o li- 2000, 2001). Quanto a fonogramas etnográfi-
vro, intitulado Vozes do povo: A folclorização cos, assinala-se a edição pela Smithsonian
em Portugal, aborda várias vertentes do pro- Folkways do CD Musical Traditions of Portu-
cesso de folclorização, a saber: políticas da gal (coordenado por S. Castelo-Branco), con-
cultura, eventos, constituição de patrimónios, tendo exemplos de géneros rurais e urbanos, e
associativismo, representação da tradição, pro- a colectânea de 12 CD acompanhados de
tagonistas, artefactualidade, lugares, *turismo booklets explicativos intitulada A Viagem dos
e diáspora. Foram também realizados outros Sons, coordenada por Susana Sardo (1998).
estudos em torno da folclorização fora do âm- Os trechos musicais foram compilados por es-
bito do projecto (Carvalho 1996, 1997 e 1999). pecialistas portugueses e estrangeiros, ilus-
Tal como na etnomusicologia a nível interna- trando alguns dos resultados musicais de pro-
cional no mesmo período, o papel da música na cessos transculturais que envolveram Portugal
construção de identidades foi uma das temáti- e vários povos com os quais estiveram em
cas centrais na investigação etnomusicológica contacto, a saber: Goa; Sri Lanka; Damão,
em Portugal nos anos 90. Foram realizados es- Diu, Cochim e Korali; Malaca; Sumatra; Ma-
tudos em torno desta temática com enfoque na cau; Timor; Moçambique; São Tomé; Cabo
comunidade goesa católica em Lisboa, em Goa Verde; Brasil. Fora do âmbito da etnomusico-
e na diáspora (Sardo 1995, 2004), na prática logia, desde o último quartel do século passa-
do *batuque numa comunidade cabo-verdiana do que a música em Portugal tem constituído
em Lisboa (Jorge Castro Ribeiro), no espaço objecto de estudo no âmbito da antropologia e
migratório português em Newark (Carvalho da sociologia. Desde final da década de 70, o
1990), no período pós-colonial em São Tomé antropólogo Joaquim Pais de *Brito constituiu
e Príncipe (Neves 1995) e em Maputo (Car- o fado como objecto de estudo, tendo estimu-
valho 1997a), nas práticas do *rap em Lisboa lado jovens a investigar o género, primeiro na
(Cidra 1999, 2002) e do *baldão no Baixo sua qualidade de docente no ISCTE (Brito
Alentejo (Barriga 2000). O fado também cons- 1983; Costa e Guerreiro 1984) e depois no
tituiu objecto de estudo, tendo sido realizada âmbito da exposição Fado: Vozes e Sombras,
investigação em torno do processo de retenção que comissariou por ocasião de Lisboa94 (Bri-
de modelos performativos do fado na comuni- to 1994). O catálogo editado com os estudos
dade portuguesa em Nova Iorque (Carvalho que resultaram da investigação em preparação
1990), da prática performativa do género em da exposição representa um ponto de viragem
Lisboa (Castelo-Branco 1994) e do impacte da no estudo académico do fado (AAVV 1994),
polı́tica cultural do Estado Novo na prática do abordando novas temáticas com base em tra-
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balho etnográfico. Outros assuntos abordados Nation Building and the Performance of Identity. Diss.
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