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O Papa Francisco sob fogo cruzado e com baixa popularidade no Chile

José Eustáquio Diniz Alves


Doutor em demografia e professor titular do mestrado e doutorado em População,
Território e Estatísticas Públicas da Escola Nacional de Ciências Estatísticas - ENCE/IBGE;
Apresenta seus pontos de vista em caráter pessoal. E-mail: jed_alves@yahoo.com.br

O Papa Francisco tem sido alvo de ataques ideológicos tanto dos setores mais conservadores da
Igreja Católica que pregam a moral tradicional da família, quanto das vítimas dos crimes de
pedofilia cometidas por parcelas do clero, assim como dos grupos LGBTQ e dos setores
progressistas, em especial, daqueles que defendem os direitos sexuais e reprodutivos, o
empoderamento feminino e a equidade de gênero. Outra fonte de atrito advém da aliança entre
o presidente Donald Trump e os cardeais conservadores dos Estados Unidos contra o lado mais
avançado do Pontífice Jorge Mario Bergoglio (como a defesa do meio ambiente feito na encíclica
Laudato Si’).

Mas sendo o primeiro Papa nascido na América Latina era de se esperar um apoio crescente da
população latino-americana ao Pontífice de origem argentina. Contudo, pesquisa divulgada pelo
Instituto Latinobarômetro, divulgada em 12 de janeiro de 2018, pouco antes da visita do Papa
ao Chile, mostrou que a avaliação do Pontífice, na pontuação de 0 a 10, caiu no continente de
7,2 pontos em 2013, para 6,8 pontos em 2017, conforme mostra o gráfico acima.

A média de 6,8 pontos na América Latina e Caribe (ALC), em 2017, apresenta grande
variabilidade entre as diversas nações (a pesquisa foi realizada em 18 países). As avaliações mais
altas foram apresentadas no Paraguai (8,3 pontos) e no Brasil (8,0 pontos). Acima da média da
ALC também se encontram Equador (7,5), Colômbia (7,5), Costa Rica (7,1), Panamá (7,0) e Peru
(6,9 pontos). Curiosamente, os argentinos deram a avaliação média de 6,8 pontos. O México –
que é um dos países mas católicos da região – deu avaliação de 6,5 pontos. Os demais países
avaliaram o Papa com nota abaixo de 6,5 pontos, conforme mostra o gráfico abaixo.

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Curiosamente o Chile, que recebeu o Papa Francisco entre os dias 15 e 18 de janeiro de 2018,
deu a pior avaliação, somente 5,3 pontos. O primeiro Papa latino-americano poderia se sentir
em casa em seu continente de origem e em um país vizinho da sua Argentina de nascença.
Porém, a visita do Papa ao Chile não foi um passeio tranquilo e agradável.

Antes mesmo da visita, já havia protestos contra os crimes de pedofilia do então sacerdote
Fernando Karadima, um dos religiosos mais importantes do país, que foi considerado culpado
de 75 casos de abusos a menores. Porém, os chilenos cobram medidas mais enérgicas não
somente contra Karadima, da paróquia El Bosque, como também contra sacerdotes e bispos
acusados de terem encoberto o caso.

A opinião pública do Chile também se incomoda com o fato de o Papa ter demonstrado simpatia
pela causa da Bolívia em sua reivindicação por um acesso ao mar, o que significa devolução do
território conquistado no século XIX. Há protestos também contra os altos gastos com a
segurança do Pontífice e pela declaração de feriado nos dias e nas cidades pelas quais irá passar
enquanto estiver no país. Houve ataques a diversas igrejas, dias antes da visita papal.

Segundo uma pesquisa do Instituto Cadem, apenas 23% dos entrevistados considera a visita do
Papa Francisco como "muito importante", enquanto 50% a considera "pouco ou nada
importante".

Há desconforto contra o Vaticano em decorrência da anterior visita do Papa João Paulo 2º ao


Chile, governado pelo general Augusto Pinochet, em 1987, e sua presença na sacada do Palácio
de La Moneda ao lado do ditador. Os setores esquerdistas acusam a Igreja Católica de ter
colaborado com o golpe militar de 1973 e os seus repressivos desdobramentos. Adicione a
rivalidade histórica entre a Argentina e o Chile. Ao mesmo tempo, o Papa Francisco não tem

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uma boa afinidade pessoal com o presidente eleito do Chile Sebastián Piñera, que tomará posse
em 11 de março.

Em um conflito histórico, a Igreja tem uma enorme dívida com os povos tradicionais. Os índios
Mapuche possuem uma enorme lista de reivindicações e protestos contra a Igreja Católica. Há
protestos das etnias indígenas que reivindicam parte dos territórios chileno e argentino para a
criação do Wallmapu, como é chamada a "nação mapuche".

Do ponto de vista comportamental, a própria presidenta Michelle Bachelet – que defendeu


medidas para descriminalizar o aborto, para legalizar o casamento entre pessoas do mesmo sexo
e para garantir maior empoderamento feminino e maior equidade de gênero – se incomoda
com as posições conservadoras da Santa Sé sobre estes temas comportamentais. O movimento
de mulheres considera que a hierarquia católica é uma das instituições mais misóginas do
mundo.

No seu primeiro compromisso oficial, no dia 16/01, o Papa Francisco disse que é “justo pedir
perdão” e que sente “dor e vergonha” diante do “dano irreparável” causado às crianças vítimas
de abusos sexuais por parte de padres chilenos.

Enquanto isto, na madrugada, pelo menos três igrejas foram atacadas com bombas caseiras e o
jornalista Juan Carlos Cruz, um dos que denunciaram há alguns anos os abusos cometidos pelo
padre Fernando Karadima em uma paróquia de Santiago, disse "Basta de perdões, é preciso mais
ação. Os bispos acobertadores continuam aí. São palavras vazias. Dor e vergonha é o que sentem
as vítimas".

Na manhã da terça-feira (16/01), o Papa Francisco celebrou sua primeira missa pública, com um
chamado para que os chilenos trabalhem pela reconciliação e a construção da paz. Diante de
400 mil fiéis que lotaram o parque O’Higgins, o líder da Igreja Católica, citando o poeta Pablo
Neruda, pediu a “extirpação da imobilidade, a sacudidela duma prostração negativa”.

Mas enquanto o Pontífice rezava pela paz, policiais reprimiram com violência manifestantes que
tentaram chegar ao parque O’Higgins e que participavam da “Marcha dos pobres”, reunindo
várias organizações sociais, que criticavam o gasto para o custeio da visita do Papa, além da falta
de ação para punir os clérigos envolvidos em abusos sexuais contra crianças. A presença do bispo
de Osorno, Juan Barros (acobertador dos escândalos sexuais), foi considerada uma provocação.
Enquanto passava a bordo do carro descoberto pelas ruas do Parque O’Higgins, o Papa foi
atingido na cabeça por um jornal jogado por alguém presente no meio da multidão.

Na quarta-feira, 17/01, o Papa Francisco celebrou uma missa multitudinária em Temuco, a


capital da Araucanía, região central do conflito da etnia mapuche. O Pontífice começou a missa
na língua mapuche, o que motivou muitos aplausos, enquanto um grupo de indígenas com suas
vestimentas tradicionais participava da missa. O pontífice lembrou que no aeródromo de
Maquehue, onde foi celebrada a missa, "tiveram lugar graves violações de direitos humanos".
No local, funcionou um centro de detenção e tortura durante os anos da ditadura de Augusto
Pinochet. Após a missa, o Papa se reuniu com alguns representantes do povo mapuche e
solicitou que terminassem com a violência, embora não tenha feito menção explícita à queima
de igrejas.

Porém, houve novos incêndios contra outras três igrejas católicas e uma evangélica. Além disso,
um outro grupo incendiou três helicópteros em uma empresa da região e outro grupo tentou
bloquear a estrada, ferindo um policial com um tiro em um confronto. Esses grupos exigem o

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retorno, aos indígenas, das terras que estão agora nas mãos do setor privado e que foram
apropriadas desde que esses povos foram dizimados no final do século XIX. Antes da chegada
dos conquistadores espanhóis no Chile, em 1541, os mapuches ocupavam essas terras do rio
Biobío até 500 quilômetros mais ao sul. No final do século XIX, campanhas de conquista e
extermínio no Chile e na Argentina levaram os mapuches a perder todas as suas terras. Só no
Chile estima-se a morte de 10.000, dos 190.000 que habitavam a região em 1881, quando o
Estado respondeu com crueldade a um levante mapuche e entregou as terras aos colonos
europeus, segundo reportagem do jornal El País.

Na quinta-feira, dia 18/01, o Papa celebrou sua 3ª missa no Chile, na Playa Lobitos, na cidade de
Iquique, no norte do Chile, última etapa de sua visita ao país. Parecia tudo tranquilo (afora um
leve acidente com uma policial que caiu do cavalo) quando um jornalista perguntou sobre a
polêmica gerada pela presença em todos os eventos, também em Iquique, do bispo de Osorno,
Juan Barros. E o Papa Francisco, com seriedade, disse: “No dia que me trouxerem uma prova
contra o bispo Barros, então eu falarei. Não há uma única prova contra ele. É tudo calúnia. Está
claro?”

Evidentemente, toda essa polêmica obscurece a mensagem que o Papa quis dar no primeiro dia
sobre a “vergonha” que sentia pelos abusos que destruíram a imagem da Igreja chilena e
esvaziaram não só as igrejas, mas também esvaziou a presença do público nos dois principais
eventos realizados, indicando, sem dúvidas, as dificuldades que a Igreja Católica enfrenta no
país.

Desta forma, a visita do Papa Francisco ao Chile não foi nada tranquila, pois ele teve que lidar
com a polêmica sobre os abusos sexuais, com as reivindicações dos povos mapuche e com a
perda de influência da igreja católica que perde fiéis em ritmo acelerado e inédito.

Segundo estimativas do Instituto Latinobarômetro, os católicos representavam 80% da


população da ALC em 1995, caindo para 70% em meados da década passada e atingindo o nível
mais baixo, de 59%, em 2017. Oito países estavam acima da média e dez países abaixo da média.
O Chile vinha apresentando uma leve tendência de queda da presença católica na população
total até 2009, mas a perda de fiéis se acelerou muito depois de 2011, após o caso Karadima.
No Chile, entre 1995 e 2009 a presença católica caiu de 74% para 65% da população e atingiu
um nível bastante baixo, de 45% em 2017.

Vê-se que os desafios à Igreja Católica do Chile é grandioso. O Papa Francisco tem um bom
discurso em favor do meio ambiente, dos pobres e dos imigrantes. Mas a doutrina geral da Igreja
Católica não tem dado conta da complexidade e da diversidade do mundo atual.

Na América Latina, o catolicismo enfrenta a sua maior crise em 500 anos. O exemplo chileno
expõe a rapidez da transição religiosa e a perda de fiéis católicos para os evangélicos e para os
autodeclarados sem religião. O Chile é o país de melhor desempenho nos indicadores
econômicos e sociais da ALC. Portanto, é significativo a crise religiosa que não poupa nem
mesmo o líder máximo da Igreja Católica e a pessoa que tem simbolizado a esperança de
renovação das estruturas pouco democráticas, além da renovação da mensagem missionária.

Referências:
ALVES, JED. A transição religiosa na América Latina e no Brasil, Ecodebate, RJ, 31/05/2017
https://www.ecodebate.com.br/2017/05/31/transicao-religiosa-na-america-latina-e-no-brasil-
artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/

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ALVES, JED. O panorama das mudanças religiosas na América Latina, Ecodebate, RJ, 14/06/2017
https://www.ecodebate.com.br/2017/06/14/o-panorama-das-mudancas-religiosas-na-
america-latina-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
ALVES, JED. Secularização e pluralidade na América Latina, Ecodebate, RJ, 20/09/2017
https://www.ecodebate.com.br/2017/09/20/secularizacao-e-pluralidade-na-america-latina-
artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/
LATINOBAROMETRO. El Papa Francisco y la Religión en Chile y América Latina - Latinobarometro
1995-2017 http://www.latinobarometro.org/latNewsShow.jsp

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