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Revista

do Professor de Educação Infantil

Práticas para a igualdade


racial na escola
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Entrevista Reportagem Relato
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Maria Malta Campos e Parceria Escola e Família Escola da Ponte:


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Maria Lúcia Machado a cidadania na prática


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expediente
Presidente da República
Luis Inácio Lula da Silva

Ministro da Educação
Fernando Haddad

Secretário Executivo
José Henrique Paim Fernandes

Secretário de Educação Básica


Francisco das Chagas Fernandes

Diretora de Políticas de Educação Infantil e Ensino


Fundamental
Jeanete Beauchamp

Coordenadora Geral de Educação Infantil


Karina Rizek Lopes

Consultora Editorial
Vitória Líbia Barreto de Faria

Jornalista Responsável
Adriana Maricato - MTB 024546/SP

Editor
Alex Criado

Reportagem
Flávio Carrança, Iracema Nascimento, Joana Brandão, João
Vargas, Renata Carraro, Vanusa Menegazzi

Direção de Arte
Projects Brasil Multimídia

Projeto Gráfico, Criação e Diagramação


Projects Brasil Multimídia

Ilustrações do “Professor faz Literatura”


Projects Brasil Multimídia

Fotografias
Beto Batinga, Eliézer Bueno, Jarbas Oliveira, Tatiana Cardeal

Revisão
Projects Brasil Multimídia

Foto da Capa:
Centro de Educação Infantil São José Eduardo Jallad,
Campo Grande-MS

Endereço para correspondência:


Ministério da Educação - Coordenação Geral de Educação
Infantil – DPEIEF/SEB
Esplanada dos Ministérios, Bloco L - Edifício Sede, 6o andar
Sala 623
70047-900 Brasília – DF. Tel: (61) 21048645
e-mail: coedi-sef@mec.gov.br

Tiragem desta edição: 200 mil exemplares


Publicação financiada pelo Projeto Unesco 914 BRA 1095
Dezembro de 2006.

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sumário

3
sumário 18 31

2 Carta ao Professor

3 Entrevista

7 Caleidoscópio

16 Professor Faz Literatura

18 Matéria de Capa

25 Artigo

28 Relato

31 Reportagem

35 Resenhas

38 Notas

39 Diálogo

41 Arte
carta ao professor

Prezada professora, prezado professor,

O ano de 2006 está sendo marcado por uma mudança estruturante na Educação Básica
brasileira. Ela altera principalmente a organização tanto da Educação Infantil quanto do
Ensino Fundamental, com a inclusão das crianças de 6 anos no primeiro ano desta etapa de
ensino, que passa a ter 9 anos de duração.
Embora desde 2003 o Ministério da Educação venha apoiando os sistemas de ensino no
que diz respeito a esta ampliação e muitos estados e municípios já a tenham realizado,
somente em 6 de fevereiro deste ano foi homologada, pelo Presidente da República, a Lei nº
11.274 que altera artigos da LDB (Lei nº 9394 de 1996), ampliando definitivamente o Ensino
Fundamental de 8 para 9 anos. Vale lembrar que esta já era uma possibilidade colocada na
LDB e também no Plano Nacional de Educação – PNE (2001).
A edição nº 42 da Revista Criança aborda este assunto na sessão Caleidoscópio, trazendo
três reflexões sobre o tema. Com isso, queremos incluir você, professora/professor, neste
debate. Sobretudo, pela necessidade de estarmos atentos à forma como cada sistema de
ensino (e o seu em particular) irá conduzir e regulamentar estas duas etapas iniciais da
Educação Básica, uma vez que a lei estabelece um prazo de 5 anos para a adequação dos
sistemas.
Merece especial atenção o cumprimento das normas e diretrizes elaboradas pelo Conselho
Nacional de Educação, que devem sempre ser obedecidas pelos conselhos estaduais e
municipais. Com destaque especial, chamamos a atenção para duas delas: a que orienta
sobre a idade de ingresso no Ensino Fundamental e a reorganização das Diretrizes
Curriculares Nacionais.
Em relação à primeira, é preciso estar atento para que crianças com menos de 6 anos não
sejam matriculadas no Ensino Fundamental. Para tanto, é necessário que todos se envolvam
com esta questão. Em relação à segunda, é fundamental toda atenção e discussão, uma vez
que atinge diretamente o trabalho da professora e do professor em sala de atividades com
as crianças. Contamos com todos os educadores, especialmente aqueles envolvidos com a
Educação Infantil, para ajudarmos neste acolhimento necessário às crianças de 6 anos que
ingressam no Ensino Fundamental.
Trazemos também como matéria de capa o tema “Educação anti-racista”. Com ele iniciamos
uma série de reportagens que tratam da inclusão educacional na primeira etapa da Educação
Básica. Relatos de professoras e professores, e de especialistas, assim como algumas
experiências que abordam a questão. Além de promoverem a reflexão em torno de aspecto
tão debatido atualmente na área da educação, trazem exemplos e podem colaborar com a sua
prática junto às crianças da Educação Infantil. Após o debate sobre o racismo, pretendemos
abordar a Educação Infantil indígena, a inclusão das crianças com necessidades especiais,
entre outras temáticas que você, inclusive, poderá nos sugerir.
Boa leitura!

2 revista criança
entrevista

Maria Malta Campos e Maria Lúcia Machado

Qualidade na Educação Infantil


um processo aberto, um conceito em construção

Iracema Nascimento | São Paulo/SP

Depois de um processo de financiamento; no prazo que a Maria Lúcia – O PNE, que é


quase dois anos de intenso LDB (Lei de Diretrizes e Bases uma lei, determina que o MEC
debate com especialistas, da Educação Nacional, 1996) defina parâmetros de quali-
gestores, professores e movi- e o PNE (Plano Nacional de dade para a Educação Infan-
mentos sociais, o MEC anun- Educação, 2001) determina- til no país. Isso é um avanço
cia o lançamento dos Parâ- ram para que as instituições – países mais desenvolvidos
metros de Qualidade para a de Educação Infantil fossem também estabelecem esse
Educação Infantil. A processo de qualifi-

Foto: Tatiana Cardeal


Revista Criança con- cação permanente da
versou com as pro- Educação Infantil não
fessoras Maria Malta apenas para as uni-
Campos e Maria Lúcia dades escolares, mas
Machado, pesquisa- para os sistemas de
doras da Fundação ensino. Estamos fa-
Carlos Chagas, de lando das secretarias,
São Paulo, e consul- dos técnicos, dos
toras na elaboração conselhos, de todas
dos Parâmetros, que as instâncias envolvi-
nos contaram como o das na educação e no
Maria Lúcia e Maria Malta
documento foi conce- cuidado da criança de
bido, sua relação com as 0 a 6 anos.
políticas públicas de Educa- transferidas para a área edu-
ção Infantil e o que elas espe- cacional; no prazo para que Qual o papel da União, dos
ram que seja feito dele. os professores de Educação estados e dos municípios na
Infantil tivessem no mínimo garantia da qualidade pre-
A quem se dirige o docu- formação em magistério e de- conizada pelos Parâmetros?
mento do qual vocês parti- sejavelmente nível superior. Os E das instituições de Educa-
ciparam como consultoras? Parâmetros, então, têm essa ção Infantil?
Com que finalidade foi ela- intenção de orientar, não de
borado? criar novas leis, mas resumir Maria Lúcia – Existem de-
e organizar o que já existe, de terminações legais e também
Maria Malta – Na década de forma que os executores da o compromisso de coopera-
1990, ocorreram várias modi- política educacional, principal- ção recíproca. Os municípios
ficações no sistema educa- mente os governos municipais são as instâncias mais envol-
cional que incidiram na Edu- e as próprias instituições, te- vidas com o cotidiano das ins-
cação Infantil. No sistema de nham diretrizes mais claras. tituições, mesmo aqueles que

revista criança 3
entrevista

optam pelo sistema estadual se aborda as questões das discussão desse documento
em lugar do seu próprio siste- creches, o tempo integral, o que levou cerca de dois anos.
ma. No plano nacional, o MEC cuidar e o educar. Isso mostra Tivemos várias versões pre-
tem a tarefa de fazer a coisa que a transição das creches liminares que foram discuti-
acontecer de maneira demo- da área de bem-estar social das em seminários regionais
crática e equivalente em todos para a Educação ainda não se promovidos pelo MEC, pela
os estados. Os estados, por completou. Mesmo que a uni- Internet, com especialistas
sua vez, têm a responsabili- dade escolar já tenha mudado da área, mais um seminário
dade de manter seus próprios de secretaria, as pessoas que nacional, com várias possibili-
sistemas de ensino mantendo cuidam dos setores técnicos dades de debate. Por sua vez,
ou não a rede de Educação In- continuam com a mesma ca- os fóruns de Educação Infantil
fantil. Mesmo que a União têm tido enorme partici-
e os estados não tenham pação no aprofundamen-
nenhuma unidade escolar, “Os Parâmetros, então, to conceitual e na mobi-
eles têm a responsabilida- lização política. Espero
de de compartilhar e de
têm essa intenção de que, com a disseminação
comparecer com insumos orientar, não de criar do documento, ele possa
financeiros e com a for-
mação de professores e
novas leis, mas resumir ser debatido nas universi-
dades e pelos movimen-
de todos os profissionais. e organizar o que já tos sociais.

Maria Malta – Com o


existe...” Qual a diferença entre
incentivo oficial para que parâmetros e indicado-
os municípios se encarre- res de qualidade?
gassem da Educação Infantil, beça de antes. Nesse senti-
houve uma retirada abrupta do, esse documento e todas Maria Lúcia – A definição de
dos estados, que fecharam as ações que se seguirão a parâmetros antecede a de indi-
vagas e, muitas vezes, acaba- ele têm o papel de consolidar cadores. Os indicadores se tra-
ram com os setores técnicos uma transição que ainda está duzem em elementos concre-
responsáveis pela área. As- se dando. tos que podem ser medidos. Ao
sim, começaram a se omitir de se falar de formação como um
uma obrigação que continua O documento dos Parâme- parâmetro de qualidade, por
sendo dos estados: a forma- tros resgata uma trajetória exemplo, pensa-se na forma-
ção do professor. de múltiplos protagonistas, ção regular dos profissionais
Essa responsabilidade tem com avanços e desafios. como algo a ser considerado e
sido assumida de maneira Qual o papel da sociedade exigido. O indicador para isso
precária por boa parte dos nos avanços alcançados? seria formação em nível médio,
estados, como em programas modalidade normal – quantos
de educação a distância de Maria Lúcia – A participa- profissionais possuem essa
formação de professores em ção da sociedade é crucial. formação, quantos possuem
nível superior, em que só se Quando fomos convidadas nível superior, quantos sequer
inclui conteúdos da Educação pelo MEC para participar des- possuem Ensino Fundamental
Infantil quando as professoras se projeto, havia uma preocu- completo?
de creche e pré-escola ma- pação de ambas as partes em
triculadas pedem. E quando ampliar a discussão e as defi- Considerando a dimensão
isso é feito, volta-se apenas nições dos parâmetros. Então geográfica e a diversidade
para pré-escola, raramente combinamos um processo de cultural brasileira, é possível

4 revista criança
entrevista

pensar em alguma forma de


monitoramento em relação
à qualidade do atendimento
nas instituições de Educa-
ção Infantil?

Maria Lúcia – A definição


dos indicadores é que per-
mitirá um monitoramento de
forma quantificável, de modo

Foto: Tatiana Cardeal


que o MEC possa estabele-
cer comparações e níveis de
melhor ou pior qualidade e es-
tabelecer uma política perma-
nente de melhoria dessa qua-
Maria Lúcia Machado
lidade. Minha expectativa é de
que esse documento venha Quando professores europeus mite uma resposta genérica;
contribuir para instalar formal- visitam nossas unidades, podemos pensar em respos-
mente no sistema educacional acham um absurdo, pois uma tas para certas situações em
a discussão sobre a qualidade creche com 60 crianças em certos contextos. Ainda há o
da Educação Infantil no Brasil seus países já é considerada impasse quanto ao acesso e
inteiro. E que permita ao MEC enorme. Esses prédios gran- à qualidade – é melhor ofe-
cumprir a segunda etapa, que diosos com arquitetura ma- recer um padrão melhor para
é a definição dos indicadores, jestosa são lindos para uma as crianças que já estão na
por meio de um debate a pú- escola de Ensino Médio, mas rede ou é melhor atender mais
blico. Só assim será possível a criança de 0 a 6 precisa de crianças com um padrão não
instalar uma política de me- aconchego, num lugar onde tão alto? São sempre esco-
lhoria da qualidade do aten- se sinta acolhida, onde seja lhas difíceis. Mas o que gos-
dimento de um jeito mais per- chamada pelo nome. taríamos é que não se permi-
manente, que não dependa do tissem situações abaixo de
governo no poder, mas como Em termos de investimen- um certo mínimo, situações
uma rotina do MEC. to público, em que aspectos degradantes que trazem pre-
vocês recomendariam prio- juízos para as crianças. No
Qual a relação dessa qua- ridade? entanto, é preciso lembrar,
lidade com a destinação de também, que existem experi-
recursos financeiros para a Maria Malta – A pergunta a ências de diversos municípios
Educação Infantil? ser feita é: “esse atendimento que conseguiram um patamar
tem significado um benefício bom de atendimento, que já
Maria Malta – Nem sempre para as crianças?”. Há situa- melhoraram muito o padrão.
melhor qualidade representa ções em que o atendimento
maior custo. Um exemplo é deixa muito a desejar, mas Maria Lúcia – Minha espe-
a tendência de algumas pre- sabemos que é melhor aqui- rança é de que o documen-
feituras de montar unidades lo do que nada. Em outros to venha a ajudar o gestor a
enormes para centenas de casos, temos dúvida quan- entender o que é preciso ter
crianças. Nem o Piaget em to à resposta. Então, há uma numa creche ou numa pré-es-
pessoa conseguiria ser diretor diversidade muito grande de cola. Para construir um hospi-
de um lugar desses! (risos). condições que não nos per- tal, o gestor sabe que precisa

revista criança 5
entrevista

de médicos, enfermeiros, sa-

Foto: Tatiana Cardeal


las de cirurgia, instrumentos
e dinheiro para mantê-lo. E
ninguém questiona se dá para
fazer o hospital sem médico.
Na hora de fazer uma creche
também não se pode questio-
nar se precisa de um profes-
sor qualificado ou mobiliário
adequado. Isso não pode ser
questionável, tem de fazer
parte do pacote e ponto. En-
tão, o documento vai ajudar
porque não define padrões
mínimos, mas padrões neces-
sários, bons. O poder público
também não pode abdicar de
seu papel de supervisão e pu- Maria Malta Campos
nição. Junto com o Ministério
Público, pode inclusive fechar por autorizar o funcionamento de crianças com necessida-
os lugares que não têm condi- e de supervisionar continua- des especiais e a presença
ções de funcionar. Ao mesmo mente, seja público, privado masculina, figura praticamen-
tempo, tem elementos para ou misto. E quem sai da linha te desconhecida das nossas
premiar, beneficiar e promover ou daquele mínimo definido, creches e pré-escolas. Vários
a qualidade. sofre penalidades. Quando se países já conseguiram superar
estabelecem critérios de qua- esse tipo de problema e as so-
Como a questão da Quali- lidade, alguns são mais fáceis luções são muito simples. Por
dade na Educação Infantil é e outros mais difíceis de medir. exemplo, quando se faz uma
tratada em outros países? Para isso ser viável, do ponto- seleção, que não se excluam
de-vista de um órgão que fis- os homens! Existe demanda
Maria Malta – Na maioria caliza e supervisiona, é preciso de homem nas creches, mas
dos países desenvolvidos os alguns padrões ou indicadores, quem faz a seleção pensa que
parâmetros são levados muito como já mencionamos. O que homem não serve para cuidar
a sério, existem regras muito entra, então, é formação do de criança. Mesmo já tendo
mais rígidas. Se uma determi- educador, número de crianças avançado bastante na produ-
nada instituição não cumpre por adulto, condições da infra- ção científica e em pesquisas
as regras, por exemplo em re- estrutura e de material dispo- sobre a questão de gênero,
lação ao número de crianças nível, a comunicação com as ainda se fazem filas de meni-
por adulto, formação desses famílias e o currículo ou a pro- nas e meninos nas creches.
adultos, condições de higiene, posta pedagógica. Ainda estamos começando a
presença de material didático, enfrentar as questões raciais.
de brinquedos, supervisão de Maria Lúcia – Algumas Como pensar a Educação In-
saúde, etc., ela é fechada e os questões são tratadas com fantil para as crianças indíge-
responsáveis são punidos. Em mais naturalidade fora do nas? Como pensar uma Edu-
alguns países, a autoridade é Brasil, como as questões ra- cação Infantil que trabalhe as
do Estado, que é responsável ciais, de gênero, de inclusão questões raciais?

6 revista criança
Recentes mudanças na legislação determinam o aumento do tempo de

CALEIDOSCÓPIO
permanência da criança na escola, com a ampliação do Ensino Fundamental de 8
para 9 anos e o ingresso dos meninos e meninas brasileiros aos 6 anos de idade.
Nesse contexto, é preciso repensar tanto o próprio Ensino Fundamental quanto a
Educação Infantil, no que se refere a tempos, espaços, conteúdos, metodologias
de trabalho, formação de professores, entre tantas outras questões.
O Caleidoscópio dessa edição traz o olhar da Educação Infantil, com a
abordagem das professoras Karina Lopes e Roseana Mendes. Em seguida,
com o foco no Ensino Fundamental, as professoras Sandra Pagel e Aricélia do
Nascimento. Por último, artigo de Elvira de Souza Lima, estudiosa da criança
dessa faixa etária e profunda conhecedora da escola.

revista criança 7
caleidoscópio

Desafios de um novo tempo


Karina Rizek Lopes*
Roseana Pereira Mendes*

A inclusão da criança de 6 uma ação educativa com qua- jamento do trabalho pedagó-
anos no Ensino Fundamen- lidade social para todas as gico considere as diferentes
tal de 9 anos coloca novos e crianças que ingressam no dimensões do tempo. Assim,
grandes desafios para a área Ensino Fundamental. elas terão a oportunidade de
da educação. Antes de tudo, Neste contexto, vale apon- falar, de ouvir e ser ouvidas,
é preciso reafirmar que esta tar alguns aspectos, que entre de ter contato com os conhe-
é uma questão que deve ser, outros, são fundamentais para cimentos científicos, de se ali-
prioritariamente, tratada no as discussões e os debates. mentar, de utilizar os diferen-
campo do direito. Direito das Em primeiro lugar, é preciso tes espaços da instituição e
crianças a uma educação que esclarecer que a inclusão da da comunidade, de descansar,
promova a sua formação hu- criança de 6 anos no Ensino de brincar e de se expressar
mana, reconhecendo-as com Fundamental não significa an- por meio das diferentes lin-
sujeitos culturais e seres em tecipar o modelo educacional guagens, tais como a verbal, a
desenvolvimento. que ora se coloca para este escrita, a musical e a corporal,
Portanto, a ampliação do En- nível de ensino. É necessário entre outras.
sino Fundamental para 9 anos considerar quem é esta crian- Da mesma forma, os espa-
de duração atende aos direi- ça, quais são as suas formas ços e os materiais devem ser
tos da criança, no que se re- de aprender, como se dá sua utilizados e organizados de
fere ao tempo destinado à sua inserção na cultura, a impor- maneira bastante flexível, de-
formação. Mas é necessário tância das interações para o safiando as crianças e favore-
garantir que a implementação seu desenvolvimento e apren- cendo o desenvolvimento de
deste atendimento promova dizagem e, sobretudo, o va- trabalhos diversificados, que
de fato a melhoria do trabalho lor do brincar como a forma possibilitem os movimentos, a
pedagógico voltado para esta primordial da criança ser e de construção da identidade e da
faixa etária. estar no mundo. autonomia, os diferentes tipos
Neste sentido, é importan- Um outro ponto importante de interações e as variadas
te destacar o papel do poder refere-se ao redimensiona- formas de manifestação da
público como promotor de mento da organização dos cultura.
debates e mobilizações nos tempos, dos espaços e dos Diante de tudo isto, um ter-
sistemas de ensino. Com a materiais. É preciso torná-los ceiro aspecto que se apresenta
participação de todos os ato- adequados ao desenvolvimen- diz respeito à (re)significação
res sociais envolvidos, devem to de um trabalho pedagógico da prática pedagógica. O fazer
ser elaboradas diretrizes, me- que considere as singularida- pedagógico envolve as dife-
tas e objetivos, em consonân- des das crianças de 6 anos, o rentes áreas do conhecimento
cia com a legislação vigente e modo como se expressam e e, em especial, as artes, a cor-
com os documentos oficiais as suas especificidades. poreidade e o aspecto lúdico,
orientadores. E, assim, serão A formação das crianças imprescindíveis na infância.
estabelecidas as bases para de 6 anos exige que o plane- Os professores desempe-

* Karina Rizek Lopes é coordenadora geral da Coordenação de Educação Infantil do DPEIEF/SEB do MEC.
* Roseana Pereira Mendes é assessora pedagógica da Coordenação de Educação Infantil do DPEIEF/SEB do MEC.

8 revista criança
caleidoscópio

nham um papel fundamental ta forma, a sistematização da ção Infantil que passa a aten-
como mediadores das apren- Proposta Pedagógica envol- der crianças com até 6 anos.1
dizagens das crianças. Neste ve definir concepções, me- Desta forma, os sistemas de
sentido, a reflexão teórica so- tas, objetivos, organização de ensino garantem maior apro-
bre a prática, em momentos tempos e espaços, materiais e ximação entre a Educação In-
de formação continuada e em formas de avaliação, entre ou- fantil e o Ensino Fundamental,
serviço, constitui-se em maté- tros aspectos relevantes para caracterizando uma continui-
ria prima para o aprimoramen- o desenvolvimento do trabalho dade e não uma ruptura.
to e qualificação da atuação educacional. Uma outra questão impor-
profissional, como um direito tante é o fato de que os sis-
deste professor. Educação Infantil e Ensino temas de ensino poderão am-
Por último, destacamos a im- Fundamental: uma articula- pliar seu atendimento na Edu-
portância da reelaboração da ção necessária cação Infantil, principalmente
Proposta Pedagógica da insti- o relativo às crianças de 4 e
tuição, na perspectiva do En- As grandes mudanças em 5 anos, utilizando os espaços
sino Fundamental de 9 anos. todo sistema de Educação antes destinados às crianças
Os aspectos acima descritos, Básica no Brasil que se inicia- de 6 anos para ampliação das
bem como outros que são ram a partir da aprovação da vagas e, portanto do acesso
necessários a um atendimen- lei que amplia o Ensino Fun- às crianças menores.
to educacional de qualidade, damental (Lei nº 11.274, de 6 Finalmente, espera-se que
devem estar assegurados por de fevereiro de 2006), também esses desafios sejam elemen-
meio de debates democráti- trazem conseqüências para tos mobilizadores para o deba-
cos, propostos pela instituição, a Educação Infantil. Pode-se te para que se assegure cada
envolvendo a comunidade, destacar a cooperação mútua vez mais uma educação com
as crianças, os professores, a entre os professores da Edu- qualidade social para todas as
coordenação pedagógica, os cação Infantil e os do Ensino crianças e sob a responsabi-
gestores e os funcionários da Fundamental, bem como a lidade de todos: União, esta-
instituição e as famílias. Des- nova organização da Educa- dos e municípios.

1
Sobre o assunto, consultar Parecer CNE/CEB nº 6/2005 de 8 de junho de 2005 e Resolução CNE/CEB nº 3, de 3 de agosto de 2005, no endereço do
Conselho Nacional de Educação na internet: http://portal.mec.gov.br/cne

revista criança 9
caleidoscópio

A Criança de 6 Anos no Ensino


Obrigatório: Um Avanço Social1
Sandra Denise Pagel*
Aricélia Ribeiro do Nascimento*

Percebe-se, cada vez mais, gatório de nove anos de dura- Avaliação da Educação Bá-
a urgência de as instâncias ção, a iniciar-se aos seis anos sica (Saeb) 2003 aponta que
educacionais, em todos os ní- de idade. Essa obrigatorieda- crianças com histórico de ex-
veis da gestão pública, reafir- de tornou-se meta do Plano periência na Educação Infantil
marem o compromisso com a Nacional de Educação (Lei nº obtiveram cerca de 20 pontos
construção de uma escola in- 10.172 de 2001). Finalmente, a mais nos resultados de pro-
clusiva, cidadã, solidária e de em 6 de fevereiro de 2006, a ficiência em leitura.
qualidade social para todas as Lei nº 11.274 instituiu o Ensino A implantação de uma po-
crianças, adolescentes e jo- Fundamental de nove anos de lítica de ampliação do Ensi-
vens brasileiros. duração, com a inclusão das no Fundamental de oito para
Para tanto, faz-se necessário crianças de 6 anos. nove anos, portanto, exige
implementar políticas induto- A inclusão da criança de 6 tratamento político, adminis-
ras de transformações signifi- anos no Ensino Fundamental trativo e pedagógico, uma
cativas na estrutura da escola; encontra respaldo em pesqui- vez que o objetivo de ampliar
na reorganização dos tempos sas do IBGE (Censo Demográ- o período obrigatório é asse-
e dos espaços escolares; nas fico 2000) que mostram que gurar a todas as crianças um
formas de ensinar, aprender, 81,7% das crianças de 6 anos tempo mais longo de convívio
avaliar, organizar e desenvol- estão na escola, sendo que escolar com maiores oportu-
ver o currículo; nas carreiras 38,9% freqüentam a Educa- nidades de aprendizagem.
profissionais e na formação ção Infantil, 13,6% pertencem Ressalte-se que a aprendi-
inicial e continuada dos pro- às classes de alfabetização e zagem não depende apenas
fissionais da docência. 29,6% estão no Ensino Fun- do aumento do tempo de per-
É nessa perspectiva de damental. Apóia-se também manência na escola, mas tam-
mudança qualitativa do ensi- nos estudos que demonstram bém do emprego mais eficaz
no–aprendizagem que viven- que, quando as crianças in- desse tempo. A associação
ciamos, neste momento, a en- gressam na instituição esco- de ambos pode contribuir sig-
trada da criança de 6 anos no lar, antes dos 7 anos de idade, nificativamente para que os
Ensino Fundamental. apresentam, em sua maioria, estudantes aprendam mais e
A legislação educacional resultados superiores em re- de maneira mais prazerosa.
brasileira, especialmente a lação àquelas que ingressam Para a legitimidade e a efe-
partir da LDB (Lei nº 9.394, de somente aos 7 anos. tividade dessa política educa-
20 de dezembro de 1996), já Um exemplo desses estu- cional, são necessárias ações
sinalizara para um ensino obri- dos: o Sistema Nacional de formativas da opinião pública,

* Sandra Denise Pagel é Coordenadora geral do Ensino Fundamental/DPEIEF/SEB do MEC.


*Aricélia Ribeiro do Nascimento é assessora pedagógica da Coordenação Geral do Ensino Fundamental/DPEIEF/SEB do MEC.

1
Artigo escrito a partir dos documentos: Ensino Fundamental de Nove Anos: Orientações Gerais; e Ensino Fundamental de Nove Anos: orientações para a
inclusão da criança de seis anos de idade, produzidos pela Coordenação Geral do Ensino Fundamental/DPEIEF/SEB do MEC.

10 revista criança
caleidoscópio

condições pedagógicas, ad- meiro ano/primeira série do respeito às suas característi-


ministrativas, financeiras, ma- Ensino Fundamental de oito cas etárias, sociais, psicológi-
teriais e de recursos humanos, anos. Não se trata de realizar cas, e cognitivas.
bem como acompanhamento somente uma adequação dos Por essa razão, na perspec-
e avaliação, em todos os ní- conteúdos da primeira série tiva de subsidiar os sistemas
veis da gestão educacional. do Ensino Fundamental de de ensino e de fortalecer um
Assim, com a ampliação do oito anos. Faz-se necessário processo de debate com pro-
Ensino Fundamental, é preci- elaborar uma nova propos- fessores e gestores sobre a
so que haja a reelaboração da ta curricular, coerente com infância na Educação Básica,
Proposta Pedagógica das Se- as especificidades não só o Ministério da Educação, por
cretarias de Educação e dos da criança de 6 anos, como meio da Coordenação Geral do
Projetos Pedagógicos das es- também com as das demais Ensino Fundamental (COEF),
colas. Esse processo deve ser crianças de 7, 8, 9 e 10 anos elaborou o documento intitu-
encaminhado de forma crite- de idade, bem como com as lado “Ensino Fundamental de
riosa, com base em estudos dos adolescentes de 11 a 14 nove anos: orientações para
e debates no âmbito de cada anos, que constituem os anos a inclusão de crianças de seis
sistema de ensino. O objetivo finais dessa etapa de ensino. anos de idade”.
é assegurar às crianças de 6 Visto que a ampliação do En- O foco deste documento é
anos o pleno desenvolvimento sino Fundamental para nove o desenvolvimento e a apren-
nos aspectos físico, psicológi- anos requer novas diretrizes dizagem das crianças de 6
co, intelectual, social e cogni- pedagógicas e conseqüente- anos ingressantes no Ensino
tivo. mente nova matriz curricular, Fundamental de nove anos,
O primeiro ano do Ensino essa matéria encontra-se em sem perder de vista a abran-
Fundamental de nove anos discussão no Conselho Nacio- gência da infância de 6 a 10
não se restringe à alfabetiza- nal de Educação (CNE), para anos nessa etapa de ensino.
ção. Mesmo sendo este pri- que sejam elaboradas novas Esse documento será acom-
meiro ano uma possibilidade Diretrizes Curriculares Nacio- panhado de jogos coletivos,
para qualificar o ensino e a nais para o Ensino Fundamen- acervo do Programa Nacional
aprendizagem da alfabetiza- tal e também novas Diretrizes de Biblioteca Escolar/PNBE e
ção e do letramento, não se Curriculares Nacionais para a o DVD com uma série denomi-
deve reduzir esse processo a Educação Infantil. Portanto, nada Letra Viva, com 10 pro-
tais aprendizagens, limitando todos nós - professores, ges- gramas sobre alfabetização e
o desenvolvimento das crian- tores e demais profissionais letramento na infância e tam-
ças dessa faixa etária à exclu- de apoio à docência - temos bém com a série O Mundo de
sividade da alfabetização. Por neste momento uma complexa Letras.
isso, é importante que o traba- e urgente tarefa: a de partici- Finalmente, é importante
lho pedagógico implementado parmos da elaboração dessas destacar que a tarefa de incluir
assegure o desenvolvimento Diretrizes junto ao CNE. as crianças de 6 anos no En-
das diversas expressões e de O ingresso da criança de 6 sino Fundamental é extrema-
todas as áreas do conheci- anos no Ensino Fundamen- mente complexa para todos
mento. tal não pode constituir uma nós — professores, gestores e
É importante lembrar que o medida meramente adminis- demais profissionais da edu-
conteúdo do primeiro ano do trativa. É preciso atenção ao cação —, mas temos certeza,
Ensino Fundamental de nove processo de desenvolvimento também, que esta é uma ação
anos não deve ser o conteú- e aprendizagem das crianças, democratizante da educação
do que era trabalhado no pri- o que implica conhecimento e pública brasileira.

revista criança 11
caleidoscópio

A Criança de 6 anos no Ensino Fundamental


Elvira Souza Lima*

Principalmente após a a história, as neurociências e Quem é esta criança?


Segunda Grande Guerra, tor- as artes.
nou-se uma tendência univer- A infância é um período de A criança que completou 6
sal estender a obrigatoriedade desenvolvimento cultural do anos está no seu sétimo ano
do período de escolarização ser humano, cuja importân- de vida. Este período é fun-
do Ensino Fundamental para cia vai ficando cada vez mais damental no seu desenvolvi-
nove anos. Hoje é uma reali- clara e precisa à medida que mento cultural e é marcado
dade na maior parte dos paí- avançam os conhecimentos por mudanças biológicas im-
ses. Igualmente, a matrícula sobre o desenvolvimento do portantes. A criança apropria-
obrigatória da criança com cérebro. As descobertas nes- se, nesta época, das formas
6 anos completos no Ensi- ta área já são tão importantes humanas de comunicação,
no Fundamental é bastante que chegam a afetar a nature- desenvolve o vocabulário, ex-
comum na educação mundial. za de currículos da Educação perimenta o espaço de várias
Sabemos que o aumento da Infantil em alguns países. É o maneiras, desenvolve o pen-
escolaridade das crianças é caso, por exemplo, da França, samento espacial.
uma necessidade da organi- que introduziu um currículo A criança de 6 anos está
zação contemporânea da vida para a infância apoiado em em processo de desenvolvi-
urbana. Neste sentido, o Bra- pilares diferenciados dos que mento da função simbólica.
sil chega tardiamente a esta nortearam a educação da in- Neste período, as atividades
obrigatoriedade. fância durante a maior parte que envolvam símbolos e
A maior parte dos argumen- do século XX. significados são muito impor-
tos a favor e contra esta inclu- Neste novo currículo, as tantes, como desenhar, brin-
são discute a questão a partir práticas culturais da infância car de faz de conta, praticar
da perspectiva das aprendi- ganham relevo e o tempo é jogos infantis que envolvam
zagens escolares e do desen- distribuído de forma que ativi- personagens e ações imitati-
volvimento da criança centra- dades que envolvam música e vas, cantar, dançar, ouvir his-
lizados mais na capacidade movimento sejam equiparadas tórias, poesias e narrativas
cognitiva. É necessário, po- em importância às atividades da cultura local. É muito im-
rém, ampliar a discussão: no mais especificamente volta- portante a vivência das prá-
século XX a infância foi muito das à apropriação da leitura e ticas culturais de sua comu-
discutida a partir da psicolo- da escrita. Busca-se, assim, nidade e região, pois a elas
gia e da psicanálise. Porém, uma escolarização que vise à estão ligadas a percepção de
ela é também objeto de estu- formação da criança enquan- si mesma como membro de
do de outras áreas de conhe- to ser de cultura em desenvol- um grupo e à formação da
cimento, como a antropologia, vimento. identidade.

* Elvira Souza Lima é antropóloga e psicóloga. É consultora internacional em Educação e pesquisadora associada à Universidade de Salamanca, na Espanha.

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caleidoscópio

No domínio do desenvolvi- mória infantil. Histórias, obras palavra como um todo é iden-
mento cerebral, temos mo- de arte, desenhos, músicas, tificada e reconhecida na me-
dificações significativas nas dramatizações, instrumentos mória pelo seu significado;
estruturas do cérebro ligadas musicais, brincadeiras e fes- e a via fonológica-ortográfi-
à atenção. Paulatinamente, a tas populares, contato com ca, em que o leitor percorre a
criança neste período vai se a natureza, oferecem muitas palavra fonema por fonema,
tornando mais apta a seguir possibilidades para este enri- constituindo os morfemas até
instruções para a realização quecimento da imaginação. chegar à palavra toda. É ne-
de tarefas complexas, como cessário, igualmente, cons-
as exigidas no processo de Apropriação da leitura e es- truir o significado, pois é pos-
escolarização e a prever con- crita aos 6 anos sível ler pela via fonológica e
seqüências de suas decisões não construir significado al-
e das ações que realiza. Po- Escrever e ler são atividades gum. Por exemplo, a senten-
rém, estas são coisas que distintas, relacionadas entre ça A fleva minura damber fla-
acontecem ao longo de um si, mas com especificidades. rote pode ser lida por um lei-
tempo e a criança de 6 anos Quem aprende a ler uma lín- tor fluente, mas como as “pa-
não está totalmente aparelha- gua não aprende automati- lavras” não são parte do léxi-
da para realizar determinadas camente a escrevê-la. Assim, co do português (ou seja, não
atividades que são exigidas todo processo de alfabetiza- significam nada) ele não cons-
pelo Ensino Fundamental só ção deve incluir atividades tituirá significado.
porque completou 6 anos de para a apropriação da leitura Em seu processo de desen-
idade. e atividades para o desenvol- volvimento, a criança realiza
A memória infantil neste pe- vimento da escrita. várias aquisições que estão
ríodo está muito ligada à per- Há duas vias possíveis de relacionadas à apropriação
cepção. Portanto as ações entrada para a leitura no cé- da leitura e da escrita, mas
pedagógicas precisam estar rebro: a semântica, na qual a que, na verdade, antecedem
adequadas a esta condição
do desenvolvimento infantil.
As atividades próprias deste
período devem ser utilizadas
no planejamento pedagógico
como suporte para a memó-
ria. Por exemplo, usar o de-
senho como registro do que a
criança observa, do que viven-
cia. Recorrer ao movimento é
igualmente importante.
Como este é um período im-
portante do desenvolvimento
da imaginação, cabe à escola
oferecer situações que am-
pliem o acervo de imagens e
narrativas presentes na me-

revista criança 13
caleidoscópio

o ato de escrever so. Escutar o adul-


no papel propria- to lendo é um dos
mente dito. Muitas passos iniciais para
destas aquisições a criança se tornar
são da alçada da leitora.
Educação Infantil Passa-se, assim,
e, também, da vi- à criança a mensa-
vência escolar aos gem de que para ler
6 anos. há vários procedi-
O ensino da leitu- mentos que podem
ra envolve a apro- ser utilizados. Isto é
priação do sistema particularmente im-
da escrita e a for- portante, pois em
mação de compor- seu processo para
tamentos de lei- se tornar leitora,
tura. Formar uma ela vai se deparar
pessoa leitora tem com palavras, sen-
como base a co- tenças e textos que
municação huma- não serão imedia-
na, implica a par- tamente compre-
tilha das idéias, informações, função é um eixo central da endidos. Nestes casos, mes-
emoções e sentimentos. Tudo escolarização aos 6 anos de mo quem já sabe ler há muito
isso possibilitado pelo uso de idade. tempo, poderá ler em voz alta,
um sistema simbólico – a es- O tempo na leitura é orga- mobilizando a memória audi-
crita. Entender esta dinâmica nizado pelo ritmo, duração e tiva com o que ele já tem na
de comunicação humana por pausa. Para desenvolver es- memória (léxico), o que o aju-
meio da leitura é importante, tas características na criança, dará a identificar as palavras
pois não se trata somente de é preciso que ela se familiarize em seu acervo léxico.
aprender a ler, mas de desen- às seguintes formas de leitura: Muitas das coisas que a
volver uma forma de comuni- leitura ritmada, leitura ritmada criança precisa desenvolver
cação humana. com rima e leitura modulada. para aprender a ler e a escre-
Geralmente, encara-se a lei- Estas formas de leitura são ver, para se apropriar dos co-
tura apenas como uma apren- encontradas em poesia, cor- nhecimentos da matemática,
dizagem escolar envolvendo del, letras de música (leitura das ciências, da história e dos
competências cognitivas, dei- ritmada); poesia, parlendas, outros conteúdos escolares
xando-se de lado a dimensão canções infantis com rimas são resultantes das práticas
simbólica que é, de fato, o que (leitura ritmada com rimas) de infância. Assim, a criança
a constitui como atividade hu- e, finalmente, diversos tipos “cria” condições de aprendi-
mana. A leitura e a escrita são de narrativa (leitura com mo- zagem dos conhecimentos
manifestações da capacidade dulação). Desenvolver a sen- escolares por meio das brin-
humana de simbolizar. São, sibilidade à rima é uma das cadeiras, da prática cotidiana
portanto, frutos da função condições para a leitura, ouvir com a música, das atividades
simbólica. Desenvolver esta rimas faz parte deste proces- gráficas e de modelagem. Por

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caleidoscópio
caleidoscópio

isso é importante que essas Infantil em décadas de Este é o momento propício


atividades continuem sendo trabalho com a criança para se pensar a educação
desenvolvidas pelas crianças desta idade deve agora ser como uma prática humana
neste sétimo ano de vida. aproveitada pelo Ensino voltada para a infância, incor-
Mais de mil municípios bra- Fundamental. Desta forma, porando os conhecimentos
sileiros já estenderam a esco- a educação escolar da produzidos sobre a criança
laridade da criança em seu sé- criança de 6 anos envolve o nas últimas décadas.
timo ano de vida, ou seja, com conhecimento pedagógico
6 anos completos até fevereiro tanto dos professores de Bibliografia:
do ano letivo. Sabemos pela Educação Infantil quanto dos LIMA, Elvira Souza. Como a
experiência de muitos destes professores dos primeiros criança pequena se desenvol-
municípios que a inclusão dos anos do Ensino Fundamental. ve. São Paulo: Editora Sobra-
6 anos coloca a necessidade Modelos novos de formação dinho 107, 2001.
de criar uma pedagogia espe- continuada de professor LIMA, Elvira Souza. A crian-
cífica para esta faixa etária. também são necessários ça pequena e suas linguagens.
Com certeza, a experiência para se criar uma pedagogia São Paulo: Editora Sobradinho
acumulada pela Educação adequada à infância. 107, 2002.

revista criança 15
professor faz literatura

Chapeuzinho Vermelho
(adaptação para teatro infantil)

Raimunda da Silva Pires*

MÃE – Filha, leve esses doces para a festa da vovó!


LOBO – (explorando) – Doces! Festa! – mas nem me convidaram! Que discriminação!
Chapeuzinho caminha. O lobo a segue se escondendo. Aparece o caçador.
MENINOS – (cantando) – Senhor caçador, preste muita atenção, não vá se enganar quando o
lobo pular.
O caçador dá tiros para cima e cai desengonçado.
MENINOS – (cantando) – Senhor caçador, o senhor se enganou, não prestou atenção quando o
lobo pulou!
Aparece o lobo no meio das crianças.
LOBO – Eu ouvi, vocês ouviram? Ai! Estão atrás de mim!
(olha para trás, roda o rabo) – Quem será? (sai depressa).
O caçador aparece no meio das crianças.
MENINOS – (cantando) – Moreno alto, bonito e sensual.
O caçador corre na direção do lobo e ambos dão voltas ao
redor das crianças. Em seguida, saem de cena.
Na casa da vovó chega o caçador ofegante.
CAÇADOR – Vovó, tem um lobo vindo para cá.
A vovó cai dura de pernas para o ar. O caçador acorda a vovó e a leva
embora.
LOBO – (entrando em cena) – Festa! Que festa mais micha! (roda o
rabo). – Não se fazem mais festas como antigamente! Cadê a aniver-
sariante? Cadê a fofó? (pergunta às crianças). – No guarda roupa?
(olha). – Não, ...mas o que é isso? (mostra um sutiã).
A platéia responde e ele diz: – Não é isso, não! ... é o coador duplo da
vovó, aqui côa chá e aqui côa café. Inteligente, não! (Em seguida
pega uma calcinha), – O que é isso?
A platéia responde, e ele diz:
– Não é! Isso aqui é o modelo mais recente de um chapéu de
lobo, uma orelha de cá e outra de lá. Coloca a calcinha na ca-
beça (e andando) – Bom! Não tem ninguém, mas não vou perder
a viagem, vou fazer minha festa!

* Raimunda da Silva Pires é professora do Centro Infantil da 416 – Santa Maria – Brasília/DF.

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professor faz literatura

Coloca a música e começa a dançar. Aparece Chapeuzinho.


CHAPEUZINHO – Quem é você?
LOBO – A irmã gêmea de sua fofó (ri entre os dentes).
CHAPEUZINHO – Gêmea? Hum... Gêmea não é igual?
LOBO – Você me acha tão diferente assim?
CHAPEUZINHO – Acho.
LOBO – Por quê?
CHAPEUZINHO – Por causa desses
olhos tão grandes...
LOBO – São pra te enxergar.
CHAPEUZINHO – E essas orelhas tão
grandes?
LOBO – Pra melhor te ouvir.
CHAPEUZINHO – E esse nariz tão grande?
LOBO – Pra melhor te cheirar.
CHAPEUZINHO – E essa boca tão grande?
LOBO – Pra falar caju (fechando a boca ao má-
ximo).
CHAPEUZINHO – Você veio pra festa?
LOBO – Vim. Vamos dançar?
Dançam. Chega a vovó e o caçador dando tiros.
O Lobo e a Chapeuzinho se escondem atrás da
mesa, o Lobo levanta a bandeira branca (um pe-
daço de madeira com a calcinha da vovó).
LOBO – Eu quero falar! Deixa eu falar!
CAÇADOR – Você é um lobo malvado!
LOBO – Isso é história! Fizeram minha fama,
eu sou um lobo bonzinho e ve-ge-ta-ri-a-no!
CAÇADOR – Não acredito!
LOBO – Acredite!
CAÇADOR – Não acredito!
LOBO – Acredite!
CAÇADOR – Então me abraça! (o Lobo abraça). – Então me beija (o Lobo beija).
CHAPEUZINHO – (aproxima-se do Lobo e do caçador) – É hora de festa! É aniversário da vovó!
Vamos cantar.

Todos cantam parabéns!!!

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matéria de capa

É possível trabalhar a inclusão re


Flávio Carrança | São Paulo/SP

Para construir uma Educação Infantil mais igualitária, em primeiro lugar, é necessário
não negar o preconceito. O silêncio é o primeiro estímulo para a manutenção das
desigualdades. Encarar desigualdade, discriminação, preconceito é dar o primeiro
passo para sua superação.
(Fúlvia Rosemberg)

“Você não vai brincar comigo cio em que ele ocorre, já que, esta perspectiva como um va-
por que vai pretejar meus brin- de um modo geral, o brasileiro lor humano fundamental”.
quedos”, diz uma criança bran- se considera não racista e acha Fúlvia Rosemberg adverte que
ca para uma coleguinha negra que o país é uma democracia não se pode pensar que a alte-
em uma escola de Educação In- racial. Para a psicóloga pes- ração das relações raciais no
fantil de Campo Grande, Mato quisadora Fúlvia Rosemberg, Brasil vai passar exclusivamen-
Grosso do Sul. A professora as- da Fundação Carlos Chagas, te pelo aprendizado de práticas
siste à cena e não sabe o que é precária a discussão sobre democráticas nas relações inter-
fazer. Esse episódio relatado relações raciais em todos os pessoais. Ela diz que existe uma
por Nilda da Silva Pereira, bol- níveis de ensino do país. Ela tendência na educação de achar
sista da Fundação Ford no cur- afirma que o silêncio sobre que basta educar para a demo-
so de mestrado em educação o tema é mais acentuado na cracia. E afirma que, “apesar de
da PUC de São Paulo, é exem- Educação Infantil. Segundo a importante, isso não é suficien-
plar. Ele coloca em evidência pesquisadora, além de falta- te, lembrando que uma criança
duas questões relevantes para rem pesquisas sobre o assun- branca de classe média não en-
se pensar o tratamento do ra- to, existe na nossa sociedade contra na sua vida crianças ne-
cismo na educação infantil bra- uma visão de que a criança gras em igualdade de condições
sileira. A primeira é o reconheci- pequena é um ser puro, sem com ela. A forma habitual de rela-
mento do fato de que crianças, maldade, sem problemas, que ção que ela vai ter com pessoas
desde muito cedo, manifestam deve ser poupado de temas negras é em situação de subal-
preconceito racial. A segunda é como morte, sexualidade, ternidade dos negros. Teria que
a falta de preparo dos profissio- amor e racismo. “Eu sou par- haver uma rede de creches que
nais de Educação Infantil para tidária – diz Fulvia – de que acolhesse a diversidade, que eu
lidar com o problema. Embora expressões do racismo sejam pudesse encontrar na creche do
a situação seja complexa, exis- combatidas, de uma educa- meu bairro a criança branca e a
tem no país muitas experiências ção que acolha a diversidade criança negra. E não encontro,
que apontam caminhos para de aparência e de cultura. A por que o Brasil tem uma segre-
uma educação anti-racista. gente deve estimular proces- gação racial/espacial informal”.
Uma característica do racis- sos educacionais que levem Muitos profissionais de edu-
mo brasileiro é o relativo silên- as crianças a considerarem cação acham que crianças pe-

18 revista criança
matéria de capa

conhecendo a diversidade racial


quenas não têm ainda um co- que, nas horas de atividades, sala de aula. Ela já entende que
nhecimento sobre as diferenças nas festas, é possível perceber a prática discriminatória é um
e que por isso não exercem a a discriminação. Segundo ela, a dado negativo e prefere ocultar
discriminação e o tratamento criança da educação infantil , às isso dos adultos. No parque,
diferenciado. Eliane Cavalleiro, vezes dentro de casa, outras no no pátio, onde os professores
coordenadora geral de diversi- contato com a sociedade, em não estão, as crianças negras
dade e inclusão educacional na igrejas, clubes ou pelos meios são ofendidas racialmente e até
Secretaria de Educação Conti- de comunicação, interage com mesmo impedidas de participar
nuada, Alfabetização e Diver- idéias racistas e acaba reprodu- de brincadeiras e de tarefas. “Na
sidade do MEC, diz que só a zindo isso nas suas relações in- medida em que a criança negra
partir da pesquisa, do conheci- terpessoais no espaço escolar. é ofendida – explica Eliane – ela
mento sobre como as crianças Nem sempre a criança discri- não tem ainda elementos para
se relacionam no espaço da mina na presença dos profissio- contrapor a essa acusação e
sala de aula, no espaço do par- nais de educação, ou seja, na acaba não levando esse fato

Foto: Eliézer Bueno

Protagonistas, como Chapeuzinho Vermelho, são representados também por crianças negras em Campo Grande/MS

revista criança 19
matéria de capa

ao conhecimento dos profis- que a criança tem. Ela constrói

Foto: Beto Batinga


sionais, já que não percebe ali percepções de diferença sobre
na escola nenhum movimen- várias coisas, sobre sexo, sobre
to contrário ao racismo. Isso tamanho e sobre cor. Faz parte
impede que ela apresente sua do crescimento dela.”
experiência de dor e sofrimento É claro que, quanto menor a
no cotidiano escolar. Esse silen- criança, mais refinadas preci-
ciamento – acrescenta – pode sam ser as estratégias de abor-
gerar também um processo de dagem do tema. Ninguém vai
muita raiva, capaz de explodir fazer uma palestra para crian-
em violência.” ças dessa idade. É preciso tra-
Algumas professoras ou pro- balhar de acordo com o grau
fessores têm medo de tocar no Menina faz apresentação de desenvolvimento delas. “Um
do Projeto Agogô, em Salvador/BA
tema do racismo por achar que princípio que a gente tem usado
com isso podem estimular uma sas mostrando que, desde mui- bastante – conta a professora
visão negativa da população to cedo, as crianças gostam ou Lucimar – é que essa é a faixa
negra. “A gente às vezes tem não gostam, rejeitam ou não as etária da construção de concei-
uma idéia meio idílica da crian- pessoas, usando a cor como re- tos, construção de identidade.
ça nessa faixa etária”, diz a pro- ferência. “O professor – afirma Por isso, o professor tem que
fessora e doutoranda em edu- Lucimar – não precisa ter medo oferecer inúmeros referenciais
cação pela USP, Lucimar Rosa porque ele não está inventan- para a criança, com um princí-
Dias. Segundo ela, há pesqui- do a percepção da diferença pio fundamental: a diferença é

Creche resgata auto-estima tudos e discussões, envolvendo


professoras e comunidade, a
de comunidade quilombola proposta pedagógica direcionou
os trabalhos para a construção
Joana Brandão| Salvador/BA de uma identidade étnica
Em 2005, a inserção de pro-
Na creche Vovô Zezinho, para a exclusão. Daí, as profes- jetos pedagógicos para ensinar
localizada na Comunidade soras e coordenadoras da cre- cultura africana e indígena am-
Arenoso, na periferia de Sal- che terem priorizado a questão pliou o auto-conhecimento das
vador, a grande maioria das racial e a valorização da auto- crianças. “Começamos a tra-
crianças é negra. A comuni- estima dessas crianças. balhar com espelhos nas salas
dade é remanescente de um O primeiro desafio foi gerar co- de aula para elas se verem, en-
Quilombo e foi formada em nhecimento pedagógico e bus- xergarem quem eram, reconhe-
1989, quando chegaram os car informações sobre o tema. cerem a que raça pertenciam”,
primeiros moradores, expul- “A gente não teve formação nem conta a professora Cristiane
sos de um bairro de classe no magistério nem na universi- Giffoni. “Porque os estereótipos
média. Mesmo vivendo em dade para trabalhar com raça, todos que circulam em relação
uma cidade considerada a com relações raciais”, diz Marta ao negro, elas ouvem na rua e
mais negra do Brasil, a reali- Alencar, vice-diretora da creche. a escola precisa trabalhar isso”,
dade dessas crianças aponta Em 2004, depois de leituras, es- completa a professora.

20 revista criança
matéria de capa

um fator positivo, ser diferente fundamente-se teoricamente, fazer de conta que não assistiu
é bom. É bom para todo mun- mas acrescenta que não existe à cena, varrer para baixo do ta-
do que as pessoas sejam dife- uma receita pronta. “Uma histó- pete. É preciso se informar e se
rentes umas das outras e nessa ria simples como a do Patinho preparar para discutir, porque o
diferença obviamente há uma Feio, que é excluído por que é brasileiro é muito despreparado
questão de cor, mais do que de diferente, dá pra você traba- no que diz respeito ao tema das
raça, porque as crianças vão lhar a questão racial. Quando relações raciais”.
identificar o outro porque é pre- a criança falou que a outra não Foi exatamente isso que fez a
to ou porque é branco.” podia brincar com ela porque ia professora e estudante de peda-
É claro que não basta a pro- ‘pretejar’ seus brinquedos”. Se gogia Mariza de Jesus, monitora
fessora ou professor estarem a professora pegasse a história da CEMEI Margarida Maria Al-
convencidos da necessidade do Patinho Feio, parasse tudo ves, em Campinas, São Paulo.
de trabalhar com o tema do e planejasse uma aula, já teria Mariza teve a oportunidade de
racismo. Como acontece com uma boa eficácia”. fazer cursos de capacitação de
português ou matemática, para Fúlvia Rosemberg também educadores para o tratamento
poder ensinar, é preciso apren- enfatiza a necessidade de se da questão racial realizados
der sobre a questão racial. Nil- preparar os educadores para pela ONG CEERT, Centro de Es-
da da Silva Pereira, que coorde- lidar com o tema da hostilida- tudos das Relações de Trabalho
nou o projeto ‘Educação para de racial. “Quando uma crian- e Desigualdades. Depois, com-
a diversidade’ da CEI Zé Edu, ça chama outra de ‘chocolate’, prou livros sobre o tema, estu-
em Campo Grande (veja Box), ‘fuscão preto’ ou qualquer ou- dou e se dispôs a compartilhar
recomenda que o educador tro termo da moda, não se pode com as colegas o conhecimen-

A arte é um instrumento co- biente?” lembra Rita Santos, nado destaque no trato da
mum nos projetos da creche. professora que recebeu o prê- questão racial na Educação
Em 2005, o projeto Griô: Con- mio municipal Rômulo Galvão Infantil. E caminha na cons-
tador de Histórias trabalhou te- pelo projeto Griô. trução da dignidade e da
mas como o nascimento da Ter- Com esses projetos, a cre- esperança de centenas de
ra, o respeito à ancestralidade che Vovô Zezinho tem se tor- crianças.
e a estética na perspectiva das
tradições africanas; abordou as
Foto: Beto Batinga

relações raciais na literatura,


em estórias como As tranças
de Bintou, de Sylviane Diouf.
No projeto Agogô – no ritmo da
alegria, as crianças aprendem
a valorizar a música e a dança
através do samba de roda, da
capoeira e do congado. “Se
nós estamos em uma comuni-
dade remanescente de quilom-
bo como não fazer com que as
crianças se vejam no seu am- Crianças valorizam sua cultura e elevam auto-estima pela arte

revista criança 21
matéria de capa

Escola trata diferenças com bonecos e animais


Vanusa Menegazzi | Campo Grande/MS

Henrique, Clara, Rafael, A interação com esses brin- terna geralmente vem em forma
Juliana, Guilherme e Emília quedos começa desde o ber- de crítica: “que boneca feia!”.
têm algo em comum. São çário, assim como os primeiros A resposta chega prontamente
bonecos de pano que nasce- contatos com o álbum de et- com a mesma indignação: “ela
ram de um projeto construí- nias, filmes e livros que tratam é gente do mesmo jeito que
do com muito carinho pelas de personagens considerados eu!”. Ou então: “Ela é preta!”
educadoras do Centro de “diferentes”. Nesse processo, – “Não é preta, não. É negra!”
Educação Infantil José Edu- sempre é destacada a impor- Tábata tem 5 anos e ficou re-
ardo Martins Jallad – o CEI tância das raças, sob o ponto voltada quando levou o boneco
ZEDU – em Campo Grande, de vista histórico, social e prin- para casa e um parente lhe per-
Mato Grosso do Sul. cipalmente humano. guntou “onde iria passear com
O objetivo da instituição, O Projeto “Uma visita no final aquele macaco?”. Ao contar
que atende 320 crianças de semana” faz parte da pro- a experiência aos colegas se
com idade entre 4 meses e posta de trabalho do Centro. emocionou defendendo o ami-
6 anos, filhas de servidores Ele consiste em levar um bo- go Henrique. Da mesma forma,
públicos estaduais, é con- neco ou boneca de pano para O boneco Guilherme, que usa
tribuir para a formação de casa nos fins de semana. Os prótese para ajudar “a firmar
cidadãos sem preconceitos. alunos respeitam o sorteio para um dos pés”, é tratado de for-
Por isso, os bonecos Henri- definir quem serão o menino e ma cuidadosa e solidária pelos
que, Juliana e Guilherme são a menina contemplados com a alunos, assim como todas as
negros, Emília está acima do visita especial. crianças com necessidades es-
peso e Clara e Rafael usam Segundo relato das próprias peciais que estudam no CEI.
óculos. crianças, a primeira reação ex- Segundo a coordenadora pe-

to adquirido. Apaixonada por Um tema discutido foi o da vi- da auto-estima. Mariza conta
bonecas negras, tomou a inicia- sibilidade da criança negra, que que uma coisa que a incomo-
tiva de comprar algumas e levar não aparece nos cartazes, re- dava no convívio cotidiano com
para sala de aula. As crianças vistas. Mariza conta que no Dia o grande número de crianças
adoraram, mais bonecas foram dos Pais é hábito pedir que as negras da escola em que traba-
compradas pela direção da es- crianças recortem fotos de um lha era a questão do cabelo. “O
cola e as famílias ajudaram na pai parecido com seu. A falta cabelo crespo é considerado
produção de bonecas artesa- de material adequado fazia com mais difícil de lidar. Como te-
nais. “Incentivamos as crianças que crianças negras acabas- mos período integral, as crian-
a beijar e abraçar as bonecas sem recortando fotos de bran- ças dormem e quando acordam
e depois fazer o mesmo com o cos para simbolizar seus pais. A têm que fazer a higiene, pentear
colega do lado”. A partir daí, foi compra de revistas que trazem o cabelo. Mas a gente via que a
possível fazer um trabalho de negros bem vestidos possibili- maioria dos profissionais bran-
valorização da diversidade na tou que as crianças encontras- cos não conseguia lidar com
sala, que acabou se tornando sem imagens adequadas e con- isso e a criança negra acabava
um projeto para toda a escola. tribuiu também para o aumento ficando descabelada.” Ela dis-

22 revista criança
matéria de capa

negros... Para se entender


Foto: Eliézer Bueno

a igualdade ou as diferen-
ças, a metodologia é sim-
ples: três envelopes exa-
tamente iguais lacrados,
contendo rosas de cores
diferentes dentro deles. As
crianças apalpam e sentem
o cheiro, abrem o envelope
e constatam que mesmo
sendo vermelha, champag-
ne e branca, na essência as
rosas são iguais, pois pre-
cisam de terra, água e sol
para sobreviverem. O mes-
mo acontece com o casal
Arroz e feijão, cães de cores diferentes, recebem igual carinho das crianças de cães poodle “arroz e fei-
jão”. São da mesma raça,
dagógica Ana Paula Naglis, esse cuta isso em casa e não aceita mas diferentes na cor.
trabalho tem que ser assumido a própria etnia. Daí nosso tra- Portanto, assim como os
também pelas famílias, através balho é bem mais complexo”, pintinhos (carijó, preto e
de uma mudança de postura. conclui. amarelo), os coelhos (bran-
Ana citou o exemplo de um alu- No CEI ZEDU, a Branca de co, cinza, preto), as pes-
no negro que sempre diz que é Neve pode ser gorda, a bruxa soas também apresentam
branco e só está “daquela cor” má não usa roupa preta e sim diferenças e semelhanças.
por que tem tomado muito sol. amarela ou rosa choque, uma Todas precisam de respeito,
“Com certeza essa criança es- fada ou um príncipe podem ser amor e carinho.

cutiu a questão com as colegas, brancas. Ela sugere que se faça O trabalho com a auto estima é
que concordaram em resolver o álbuns das etnias das pessoas feito também ao se discutir com
problema. Logo surgiram idéias: diferentes, oferecendo às crian- a criança branca por que ela não
pedir aos pais um creme de- ças revistas com fotos de pes- gosta de criança negra. Não dá
sembaraçador, fazer cachinhos, soas que não sejam só brancas. para fazer um trabalho isolado”.
prender cabelos. “As crianças Lucimar Rosa Dias observa que Ela acrescenta que um bom pro-
passaram a ir para o refeitório a auto-estima da criança negra jeto vai sempre envolver a família
arrumadinhas, recebiam elogios não pode ser trabalhada disso- e a comunidade, porque apesar
e isso melhorou a auto-estima ciada das outras crianças. “A de já se poder falar mais aberta-
delas”, conta a monitora. criança negra só é considerada mente desse tema no Brasil, ele
Nilda da Silva Pereira reco- ‘feia’ por algumas pessoas por sempre causa polêmica.
menda que sejam levadas para que há outra que é considerada Lucimar sugere que o profes-
a sala de aula bonecas de di- bonita. É sempre o contraponto sor comece o trabalho fazendo
ferentes raças, uma vez que o que vai construir uma idéia de pequenas coisas e vá amplian-
normal é que as crianças brin- positividade em relação aos di- do na medida em que for tendo
quem apenas com bonecas ferentes grupos étnico/raciais. segurança. “O que eu chamo de

revista criança 23
matéria de capa

zes Curriculares Para o Ensino


Foto: Eliézer Bueno

de História e Cultura Afro-bra-


sileira e Africana nas Escolas,
material construído pelo Con-
selho Nacional de Educação e
que o MEC está encaminhando
a todas escolas brasileiras. Um
dos poucos livros sobre o tema
do racismo na pré-escola publi-
cados no Brasil foi escrito por
Eliane Cavalleiro e chama-se
“Do silêncio do lar ao silêncio
escolar”, da Editora Contexto.
Brincadeira com bonecas negras educa para o respeito às diferenças
Lucimar Dias, que em sua tese
coisas pequenas é, por exem- importantes para serem feitas de doutorado estuda os cursos
plo, incluir no seu dia-a-dia li- que só dependem do educador de preparação de professores
teratura com personagens ne- e não dos pais, do diretor ou de para o trabalho com a questão
gros ou indígenas, com figuras uma política maior. racial, informa que eles existem
positivas desses grupos. É uma no Brasil inteiro, promovidos
coisa fácil, que não vai exigir Serviço por ONGs, universidades, se-
que o diretor concorde, que o Quem quiser implementar cretarias de educação. Merece
pai queira”. Vale lembrar ainda uma educação anti-racista em destaque o Prêmio Educar Para
que os profissionais de educa- uma pré escola tem muitas pos- a Igualdade Racial, realizado
ção sempre elaboram listas de sibilidades de conseguir ajuda. pelo CEERT, que seleciona e
material para serem trazidos Dicas úteis podem ser obtidas divulga experiências de promo-
pelos pais e que podem solici- no site www.unidadenadiversi- ção da igualdade étnico/racial
tar livros e revistas que tenham dade.org.br, da UNICEF (Fundo no ambiente escolar desenvol-
personagens negros ou índios. das Nações Unidas para a In- vidas em todo o país, inclusive
Na impossibilidade disso, per- fância). Existem ainda as Diretri- na pré-escola.
sonagens brancos podem ser
pintados ou pode-se produzir o
material necessário com os re-
cursos existentes. Mariza de Je-
sus chama a atenção para o fato
de que muitas vezes o educador
não coloca a criança negra em
papéis de rei, fada ou rainha
numa peça teatral, em evidente
prejuízo da auto estima dela. E
Foto: Eliézer Bueno

Lucimar lembra que o professor


ou professora muitas vezes dire-
ciona carinho, tocando mais as
crianças brancas que as negras,
o que confirma que há coisas Todas as crianças devem receber o mesmo cuidado e carinho

24 revista criança
artigo

Planejar para aprender. Aprender para


planejar
Beatriz Ferraz*

Frente ao desafio de escre- sidade de pensar como o Listar em uma folha os peixes
ver um artigo sobre o plane- projeto deveria ser realizado. sugeridos pelas crianças e,
jamento na Educação Infan- Então sentei e escrevi um se for o caso, fazer uma vota-
til, me vi inquieta buscando planejamento: ção para escolhermos alguns.
uma forma de introduzir este Nome da atividade: Quais Perguntar a elas o que gos-
tema de maneira agradável os peixes que queremos es- tariam de saber sobre estes
e com a devida valorização tudar. animais. E, por fim, perguntar
que merece. Contexto da atividade: às crianças onde poderíamos
Poderia iniciar escrevendo Conversa para iniciar um es- encontrar informações para
sobre a importância do pla- tudo com as crianças sobre responder as perguntas.
nejamento na ação do edu- alguns peixes. Estava muito satisfeita com
cador, mas achei que não Objetivo da atividade (o o meu planejamento! A minha
seria uma boa alternativa já que quero que as crianças surpresa foi quando inicia-
que esta é uma afirmação aprendam): mos o projeto e as coisas não
tão conhecida. Por onde co- - Escolher os peixes que saíram como o esperado!
meçar? Começo, então, por gostariam de estudar; Quando mostrei os livros
um registro de uma educa- - Levantar algumas pergun- para elas e perguntei quais
dora que relata a contribui- tas que gostariam de ver peixes elas queriam estudar,
ção que a prática de planejar respondidas sobre os pei- apontavam aleatoriamente
trouxe para a sua ação edu- xes escolhidos; as imagens de peixes dos
cativa junto às crianças. - Indicar alguns materiais livros. Sendo assim, iam vi-
“Trabalho com uma turma que poderíamos usar para rando as páginas e dizendo
de crianças de 4 anos e buscar informações. que queriam saber sobre to-
pretendia realizar com elas Conteúdo da atividade (o dos eles! Além disso, quan-
um estudo sobre peixes. que preciso ensinar): do perguntei o que queriam
O exercício de planejar a - Elaboração de perguntas; saber, me disseram coisas
atividade que desperta- - Fontes de informação; como “Quantos olhos eles
ria nas crianças o interesse - Nome de alguns peixes. têm? Ele tem boca?...”. E
pelo tema foi de fundamen- Encaminhamento da ati- ainda para finalizar, quando
tal importância para que eu vidade (como desenvolver a perguntei sobre onde en-
pudesse rever tudo o que atividade com as crianças): contro as informações, me
estava imaginando fazer. A Levar para a roda alguns li- disseram que poderia ser
primeira atividade represen- vros com imagens de peixes. nestes livros mesmo que eu
taria o grande disparador Perguntar às crianças quais havia levado.
para o trabalho que faríamos. peixes conhecem e, desses, Fiquei super frustrada!
Senti uma profunda neces- quais gostariam de estudar. Senti que as crianças não

* Beatriz Ferraz é psicóloga e doutoranda em Educação pela PUC-SP. Coordena Projetos de formação continuada em Educação Infantil junto a diversas prefei-
turas e dirige a Escola de Educadores.

revista criança 25
artigo

se envolveram, que não se de informações em dife- eles. As crianças adoraram


comprometeram com a mi- rentes fontes era impor- e ficaram completamente
nha proposta e que estavam tante que elas pudessem envolvidas com as imagens
respondendo às minhas per- primeiro saber algo sobre e as informações que rece-
guntas sem muita considera- os peixes e a partir des- beram. Quando terminamos
ção, esperando que aquela te conhecimento pode- de assistir, tinham muita cla-
atividade acabasse logo e riam levantar suposições reza dos peixes que queriam
que pudessem ir brincar. ou mesmo comparações pesquisar e tinham pergun-
Depois de muito lamentar, entre as informações que tas muito interessantes, que
tomei uma decisão: voltar ao tinham gerado o interesse puderam conceber a partir
meu planejamento e pensar por novos conhecimen- daquilo que viram e ouviram.
o que tinha de errado para tos. As perguntas que as Perguntaram coisas como:
produzir tal desastre! crianças fizeram podiam “Porque o peixe espada tem
Foi justamente nesta reto- ser respondidas com uma este nome?”; “Quantas per-
mada que me dei conta de simples observação das nas tem o polvo?”, “Por que
algumas coisas: imagens dos livros e este tem peixe que come peixe?
1. Se pretendia fazer Os peixes ficam grávi-
uma atividade que dos?” Agora sim, tínha-
despertasse o interes- “Também aprendemos mos perguntas que pre-
se, era importante que que o planejamento cisavam de uma pesquisa
o foco dela estivesse para serem respondidas.
favorece a reflexão
em uma motivação. Fiquei muito contente
Sendo assim, não po- sobre a prática com o novo rumo que
deria ter como obje- educativa...” tomou meu trabalho com
tivo que as crianças as crianças. Sei que foi
aceitassem pronta- graças ao planejamento
mente a minha proposta e era um equívoco meu de feito e depois reelaborado
a partir daí respondessem não considerar que eu que pude aprender coisas
a todas as minhas soli- precisava ajudá-las a for- tão importantes sobre a re-
citações. Pude perceber mular questões e, para lação ensino-aprendizagem
que no planejamento não isso, precisaria fazer algu- e principalmente, sobre as
estava considerando as ma atividade que as aju- boas ações do educador que
características do pensa- dassem nesta tarefa. favorecem aprendizagens
mento infantil e, portan- Com estas constatações significativas às crianças!”
to, não havia conseguido fui buscar ajuda das minhas A reflexão desta educadora
fazer uma boa condução colegas de trabalho e de mi- sobre o uso do planejamen-
da atividade de modo que nha diretora para pensar em to como um instrumento que
ficassem interessadas na outra atividade que pudesse nos ajuda a adequar melhor
minha proposta. gerar melhores resultados. A nossas ações e com isto pro-
2. Também pude me dar partir das sugestões que re- piciar uma aprendizagem de
conta de que para que as cebi, passei um vídeo que qualidade às crianças nos traz
crianças pudessem for- falava sobre o fundo do mar muitas informações sobre o
mular boas perguntas que apresentando alguns peixes quê significa planejar, para
justificassem uma busca e algumas informações sobre que planejar e como planejar.

26 revista criança
artigo

A primeira questão que po- 2. Ao realizar o exercício de quar suas ações e alcançar
demos aprender com ela é pensar sobre as estraté- os objetivos propostos. Sen-
que o planejamento precisa gias e os conteúdos de do assim, ao conceber um
fazer sentido para o profes- ensino, o professor preci- planejamento é importante
sor, pois ele é um instrumen- sa pensar sobre quem é destacar:
to que visa ajudar e facilitar a criança com a qual tra- 1. O que eu quero com esta
a sua prática. Ao planejar, balha, quais são as suas atividade.
antecipamos uma série de necessidades, seus inte- 2. O que eu quero que as
acontecimentos que podem resses, suas motivações. crianças aprendam com
ocorrer na ação e nos prepa- A partir desta reflexão terá esta atividade.
ramos para lidar com eles, di- maior clareza em seu pla- 3. O que eu preciso ensi-
minuindo assim a quantidade nejamento para decidir o nar para que as crianças
de imprevistos e tornando as encaminhamento da ativi- aprendam.
nossas ações mais precisas dade. 4. Como eu devo desenvol-
e de melhor qualidade. 3. Ao considerar como irá ver a atividade (incluindo
Também aprendemos que conduzir uma atividade antecipar ações e falas,
o planejamento favorece e quais os conhecimen- os materiais que preten-
a reflexão sobre a prática tos que pretende ensinar, do utilizar e a organização
educativa e, dessa forma, exercício propiciado pelo do espaço), para que as
funciona também como um planejamento, o professor crianças construam os sa-
instrumento de aprendiza- também tem que compre- beres propostos.
gem. Quando planejamos, ender como se ensinam Todos os itens que fazem
tomamos uma série de de- os diferentes conteúdos. parte do planejamento de-
cisões e fazemos uma série Para cada um deles, ou vem ter coerência entre si.
de relações entre conheci- para cada bloco deles, há Ou seja, depois de planejar,
mentos teóricos/científicos estratégias que se ade- posso voltar ao que escrevi
e conhecimentos práticos de quam melhor. Com isto, e questionar: Com isto que
nossa experiência pessoal e aprende mais sobre como direi às crianças estou aju-
profissional. Vejamos alguns ensinar, pois pode genera- dando elas a aprenderem
exemplos: lizar o que aprende com a aquilo que espero? Toman-
A frase inicial do item 1 atividade planejada para do o exemplo da educadora
deve ser mantida pois ela outras situações que vi- acima, se quero que as crian-
explicita bem a idéia que a vencia diariamente na ins- ças formulem boas questões
autora quer marcar. tituição. para iniciar uma pesquisa,
1. A partir do plano curricular Por fim, podemos também será que a melhor alternativa
da instituição, que ajuda o aprender com o exemplo é começar pelas perguntas?
professor a guiar sua prá- desta educadora sobre como Com tantas possibilidades
tica com as crianças, ele analisamos e como aprende- de reflexão, de construção
escolhe, durante o plane- mos com o planejamento. de conhecimento sobre a
jamento, quais as melho- Quando o professor escolhe prática, não há como negar a
res estratégias para colo- uma atividade para realizar importância do planejamen-
car em ação cada um dos com as crianças tem que ter to na atuação do professor
conteúdos que pretende clareza de suas intenções de Educação Infantil. Não é
ensinar. com ela para que possa ade- mesmo?

revista criança 27
relato

Escola da Ponte: a cidadania na prática1


Cláudia Santa Rosa*

Da idéia de Escola à idéia outro. A estrutura, aquém das que orienta para a construção
de Projeto necessidades, e uma certa li- de um jeito próprio de fazer, de
mitação de recursos didáticos, resolver os problemas, de en-
Não fosse a especificidade em muito se assemelham à contrar as soluções. A escola
do seu projeto político-pe- realidade das escolas brasilei- que não tem projeto ou que
dagógico (PPP), iniciado em ras. A equipe é composta por tem, mas não o defende dos
1976, certamente a Escola da 49 profissionais, entre profes- processos burocráticos, não
Ponte não teria a visibilidade sores/as, auxiliares educati- é senhora de si, pois curva-se
que tem hoje. Tampouco re- vas, funcionárias da secretaria aos modelos padronizados,
ceberia mais de mil visitantes e do refeitório. em detrimento dos interesses
por ano, incluindo centenas de Durante os seis meses em da sua comunidade.
educadores brasileiros, dese- que acompanhei o cotidiano A Ponte se tornou o que é e
josos de conhecer as práticas da Ponte, ouvi tanto por parte se refaz a cada dia, transgre-
pedagógicas construídas ao dos profissionais quanto das dindo o estabelecido oficial-
longo desses 30 anos e que famílias referências à palavra mente, em prol de um projeto
a tornam singular. E, portanto, projeto em substituição à es- de formação de cidadãos, de
uma referência na educação cola. Referiam-se ao PPP Fa- modo a torná-la autora da sua
escolar de crianças e adoles- zer a Ponte. Dizem “este pro- própria história. Isso a fez con-
centes. jeto é assim”, “identificação quistar, em fevereiro de 2004,
A Escola da Ponte está loca- com este projeto”. Aos poucos o direito de ser a primeira es-
lizada em Vila das Aves, uma fui entendendo que a palavra cola de Portugal, sem deixar
cidade com aproximadamen- projeto, no contexto daquela de ser pública, a assinar um
te 10 mil habitantes a 30 km escola, representa o conjun- contrato de autonomia com o
da Cidade do Porto, norte de to de princípios, orientações Ministério da Educação. Com
Portugal. É uma instituição da e práticas que romperam, em o Contrato de Autonomia fo-
rede pública estatal, edificada todos os sentidos, com o pa- ram ampliadas as possibilida-
em 1932. Hoje, porém, pouca radigma da escola tradicional. des de cada vez mais fortale-
coisa lembra a sua origem, São as práticas que tornam a cer o Projeto. Exemplo disto
tanto no que diz respeito às Escola da Ponte diferente das é o fato de ter passado a es-
instalações físicas, quanto no demais. tabelecer critérios, selecionar
que se refere ao trabalho pe- Costumo utilizar a metáfora todos os seus profissionais,
dagógico ali desenvolvido. do DNA, para ressaltar a im- assim como avaliá-los ao final
A escola atende atualmente portância de uma escola ter de cada ano letivo e dispensar
cerca de 220 alunos, do 1º ao PPP e vivenciá-lo. Ou seja, o aqueles cujas práticas forem
9º ano, em dois prédios, dis- projeto é o DNA da escola. É contraditórias aos princípios
tantes 15 quilômetros um do ele que imprime uma marca, do projeto.

1
Este texto é resultado da pesquisa realizada pela autora na Escola da Ponte, durante o estágio de doutoramento em educação na Universidade do Porto (Por-
tugal), com o apoio da Coordenação de Pessoal de Nível Superior - CAPES.
* Cláudia Santa Rosa é professora da rede estadual de ensino do Rio Grande do Norte e doutoranda em Educação pela Universidade Federal do Rio Grande do
Norte. É sócia-fundadora da ONG Instituto de Desenvolvimento da Educação (IDE).

28 revista criança
relato

Princípios do projeto Fazer Na Ponte, as crianças e ado- seu planejamento do dia, logo
a Ponte lescentes são agrupadas em que entra na escola, às 8h30.
A experiência político-peda- três núcleos: Iniciação, Con- Aquelas que estão no espaço
gógica realizada na Escola da solidação e Aprofundamento. do primeiro ano fazem o plano
Ponte parece ser um exemplo Elas transitam de um núcleo da quinzena de forma coletiva
vivo de que é possível ser di- para outro de acordo com o e no dia-a-dia as atividades
ferente, ter identidade, resul- próprio desenvolvimento, que acontecem de acordo com os
tado de um projeto assumido é avaliado pelos professores, diferentes ritmos.
por toda comunidade escolar. sem que estejam aprisionados As crianças do primeiro
Valores como a autonomia, à lógica do ano ou da série. ano, desde cedo, participam
solidariedade, responsabili- Como neste artigo interessa de todas as atividades e ór-
dade e democracia são as- apenas o primeiro, deixo de gãos que envolvem a dinâmi-
sumidos no projeto e movem apresentar informações con- ca de organização democrá-
as escolhas e as ações dos cernentes aos dois últimos tica e cooperativa da Esco-
profissionais, dos estudantes núcleos. la. Um bom exemplo é o mo-
e dos seus responsáveis. mento de eleição para Mesa
O reconhecimento de que A educação inicial da Assembléia. Logo no iní-
cada estudante é único es- No ano letivo 2006/2007 o cio do ano letivo, são forma-
tabelece a necessidade da Núcleo de Iniciação compre- das listas/chapas compos-
gestão do currículo ser feita ende 80 crianças. Cerca de tas, obrigatoriamente, por in-
de maneira individualizada, de 25 delas trabalham num es- tegrantes de todas as idades
acordo com o percurso esco- paço específico, pois têm por e núcleos, assim como são
lar de cada um, mas tendo em volta de 6 anos e estão no 1º bem divididas entre meninos
vista o conjunto de atitudes ano. As 55 restantes traba- e meninas.
e competências que se es- lham num espaço com dois A chapa vencedora garante
pera sejam desenvolvidas. O ambientes. Entre eles não há a presidência da mesa, mas
currículo da Escola da Ponte paredes e o acesso é livre todas elas, proporcionalmente
é fundamentado no currícu- de um para o outro. Ali estão ao número de votos, são repre-
lo oficial, aquele que é válido crianças do 2º ao 5º ano, mas sentadas, assumindo outros
para todas as escolas portu- há casos de algumas do 3º ou postos, sempre com respon-
guesas, e organiza-se em cin- 4º ano que já passaram para o sabilidades bem definidas.
co dimensões: lingüística, ló- Núcleo de Consolidação, pelo A Assembléia acontece to-
gico-matemática, naturalista, fato de terem desenvolvido o das às sextas-feiras, com
identitária e artística. quadro de competências e ati- duração de uma hora, e dela
A educação das atitudes, tudes pré-estabelecidas para tomam parte todos os estu-
na prática, é posta no mesmo a iniciação. dantes. A pauta é discutida
pé de igualdade dos conteú- Tanto no Núcleo de Iniciação nos diferentes espaços. Entre
dos disciplinares. Tal processo quanto nos outros, as crianças os pequeninos, há sempre a
inicia-se desde cedo, com as trabalham conforme um plano intervenção dos professores,
crianças a partir dos 5 anos e quinzenal organizado indivi- no sentido de orientá-los a
10 meses, algumas delas oriun- dualmente, contando com a questionarem aquilo que não
das da Educação Infantil, o que, orientação dos professores. entendem. Aliás, a compre-
provavelmente, justifica o êxito De acordo com a planifica- ensão do porquê das coisas é
do projeto ali desenvolvido. ção quinzenal cada uma faz o questão primordial, tanto para

revista criança 29
relato

os professores quanto para as


crianças.
A Escola da Ponte também
trabalha com grupos de res-
ponsabilidade, cada um de-
les coordenado por dois pro-
fessores. São esses grupos
que garantem a gestão coo-
perativa da Escola. Há gru-
pos responsáveis pelo jornal,
pela organização do recreio,
pelo refeitório, pela música A Educação Infantil nossa. Entretanto, o Projeto
nos espaços, entre outros. O próximo desafio da Escola Fazer a Ponte não é fruto de
Nesses grupos misturam-se da Ponte é reunir as condições uma “ordem natural”, mas sim
crianças de diferentes ida- físicas e adequação do proje- resultado de um ideal de edu-
des e núcleos, pois elas se to para ampliá-lo, de modo a cação, que pode ser vivido
inscrevem conforme os seus incluir a Educação Infantil no em outros lugares, desde que
interesses. Núcleo de Iniciação. Há um respeitadas as características
A formação do cidadão, entendimento de que mais do específicas de cada cultura. A
compromisso do projeto, que qualquer outra, essa eta- Escola da Ponte não é perfei-
faz com que desde cedo as pa deve ser tratada com a de- ta e tampouco deve ser com-
crianças apreendam a traba- licadeza e o respeito que care- preendida numa perspectiva
lhar sem algazarra. A música ce o desenvolvimento infantil, romântica ou mitificada, mas
ambiente ajuda a equilibrar o razão pela qual somente no o fato é que, a despeito do
volume da voz. Por vezes uma limiar dos 30 anos do Fazer a muito que ainda está por ser
criança inscreve-se para falar Ponte, parece que se concre- feito ou revisto, lá se construiu
e diz: “Não estou a ouvir a mú- tizará o projeto do infantário, um novo paradigma de esco-
sica”. Assim como no início como se diz em Portugal. la. Na Ponte, até mesmo nós,
do ano é recorrente a orienta- De fato, se a formação das pesquisadores, acabamos nos
ção dos professores: “Se que- crianças for iniciada já na Edu- (re)educando e aprendendo a
res falar, colocas o dedo no ar cação Infantil, os resultados ser mais cidadãos.
[para cima]”. Na Ponte não se deverão se refletir em apren-
ouve pedido de silêncio, tam- dizagens mais consolidadas. Referências
pouco correria na entrada ou É certo que haverá uma con- CANÁRIO, Rui; MATOS, Filo-
na saída dos espaços. Ao le- tinuidade da linha pedagógica mena; TRINDADE, Rui (orgs.).
vantar-se, não se deixa a ca- e o projeto será levado a cabo Escola da Ponte: defender a
deira desencaixada da mesa e por profissionais especialistas escola pública. Lisboa: Profe-
os professores procuram não na educação de infância, o dições, 2004.
conversar uns com os outros, que infelizmente nem sempre ESCOLA DE PONTE. Projecto
para evitar contagiar as crian- ocorre, no Brasil. Fazer a Ponte: Princípios
ças. Eles circulam pelas me- Alguns poderão dizer que Fundadores. Portugal: Escola
sas, com crianças agrupadas o que acontece na Ponte é da Ponte, s/d. http://www.eb1-
em quatro ou cinco, atendem coisa da Europa, de uma ou- ponte-n1.rcts.pt/documen/
cada uma. tra cultura muito diferente da projecto.pdf

30 revista criança
reportagem

A necessária parceria entre a escola


e a família
Renata Carraro | São Paulo/SP1

A qualidade da Educação Infantil depende, cada vez mais,


da parceria entre a escola e a família. Abrir canais de
comunicação, respeitar e acolher os saberes dos pais e
ajudar-se mutuamente. Eis algumas ações em que as únicas
beneficiadas são as nossas crianças pequenas.

É preciso uma aldeia inteira vidado para discutir o projeto


para educar uma criança, diz pedagógico da escola já é bem
um provérbio africano. A intui- mais interessante”. Sentindo-

Foto: Jarbas Oliveira


ção dos povos sábios há muito se valorizado em seus saberes,
tempo já lidava de maneira bem os pais acabam se envolvendo
realista com uma questão que com a vida escolar do filho com
hoje ocupa importante lugar muito mais intensidade.
Glaudiana de Souza Aragão,
no cenário das discussões re- Outra educadora que de-
21 anos, fez oito exames pré-natal
lativas à educação no Brasil: a fende esse tipo de interação durante a gravidez
parceria da Instituição de Edu- é Edna Rodrigues Arthuso, de
cação Infantil (IEI) com a família Belo Horizonte/MG: “Se a es- Edna integra, há mais de dez
na formação da criança de 0 a cola cria espaços para a parti- anos, o Movimento da Luta
5 anos. cipação dos pais, favorece uma Pró-Creches (MLPC), criado
Jeanete Beauchamp, direto- relação de confiança dos filhos em 1979 com a intenção de ar-
ra do Departamento de Políti- com a escola, que vai se refle- ticular, fortalecer e incentivar o
cas de Educação Infantil e do tir no desenvolvimento, físico, surgimento de novas creches,
Ensino Fundamental/SEB do intelectual e emocional das o Movimento atende hoje mais
MEC, acredita que abrir canais crianças”. Para ela, os pais ou de 30 mil meninas e meninos.
de participação da comunida- responsáveis devem conhecer Como Jeanete, Edna também
de é uma forma de melhorar a e monitorar a proposta peda- defende que “a escola deve ser
qualidade social da Educação. gógica, saber como seus filhos um espaço que acolhe a cultu-
Mas é preciso qualificar esse são atendidos, conhecer a roti- ra e os saberes dos pais”. Para
diálogo. Ser chamado apenas na da instituição e acompanhar ela, a participação da família é
para saber sobre o comporta- as atividades desenvolvidas. a estratégia para se respeitar
mento do filho, por exemplo, Mas ela alerta: é preciso consi- os modos de agir da criança,
não aproxima pais e mães da derar as dificuldades dos pais transmitindo seus valores, cos-
escola. “É preciso atribuir sig- em participarem, como falta de tumes e tradições.
nificados a essa participação”, tempo, porque trabalham o dia Para garantir essa troca
alerta a educadora. “Ser con- todo. com as famílias, o MLPC

1
Colaborou Cristina Guimarães, de Belo Horizonte/MG e João Vargas, de Fortaleza/CE

revista criança 31
reportagem

definiu alguns instrumentos processos de aprendizagem, conta com saneamento básico,


que favorecem o trabalho. Na interações e desenvolvimento então ela nem tem banheiro em
ficha social, por exemplo, são de características específicas. casa nem sabe usá-lo”. A partir
anotados dados sócio-fami- As famílias, é claro, colabo- daí, o professor deve ensinar à
liares da criança, como rotina ram para a construção desses criança o uso do sanitário.
da casa, saúde, alimentação, documentos, e quando sai da Além da participação dos
preferências de brincadeiras e escola, a criança leva consigo o pais nos conselhos escolares,
músicas. Já o portifólio é um material. Edna defende a necessidade
instrumento que leva em con- Para Vitória Faria, consultora de criação de espaços infor-
ta a experiência educacional do MEC, a escola precisa se re- mais de participação deles na
da criança, com registro das lacionar com a família porque os escola. “Pode haver um pai que
conquistas e descobertas. Ele pais são os primeiros educado- é contador de histórias, ou que
acumula a produção da criança res das crianças: “eles podem conhece uma brincadeira espe-
durante todo o ano e deve ser dar informações sobre suas cífica de uma região; ele pode
mostrado nas reuniões de pais, condições de vida, cultura, ati- participar de momentos na sala
assim eles acompanham o tudes, valores, hábitos, formas de aula trazendo seu conheci-
desenvolvimento dos filhos de de lazer”. Ela cita como exem- mento”.
forma consistente. Finalmente, plo o fato de não saberem usar
no relatório de avaliação de o banheiro: “O professor tem História difícil
desenvolvimento da criança, que compreender que essa é Mas para que a relação entre
os professores registram os uma prática da família, que não escola e família ganhe qualida-

Programa é sucesso no semi-árido


cearense
João Vargas | Irauçuba/CE

O Programa Família Brasilei- Localizado no coração do A diretora do Centro – que tem


ra Fortalecida pela Educação semi-árido cearense, a 150 qui- 426 alunos, Maruska Ramos de
Infantil (FBFEI), no Ceará, en- lômetros ao norte de Fortaleza, Araújo, conta que hoje há uma in-
volve 13 mil agentes de saúde, 22 mil habitantes, Irauçuba é tegração maior entre as famílias e
sendo 11 mil no interior e 2 mil considerado um dos municípios as escolas. Mensalmente, cinco
em Fortaleza. É o único esta- mais secos da região. Irauçuba equipes de reeditores, formadas
do brasileiro em que cada um tem hoje 1.003 famílias aten- por agentes de saúde, membros
dos agentes tem um kit exlusi- didas pelo FBFEI, envolvendo da pastoral da igreja, educadores
vamente seu para o trabalho, 1.600 crianças em 53 escolas infantis e assistentes sociais, vi-
numa parceria entre o Unicef, municipais e no Centro de Refe- sitam as escolas e fazem pales-
Governo do Ceará e Governo rência da Educação Infantil, que tras para os pais. “Agora nós es-
Federal. funciona na sede do município. tamos falando a mesma língua”,

32 revista criança
reportagem

de, é preciso também investir lista”, explica Karina Rizek berçarista, uma funcionária de
na formação de professores Lopes, coordenadora geral de creche bastava ser mãe”, ex-
e outras profissionais da Edu- Educação Infantil do Ministé- plica Karina, apontando uma
cação Infantil/DPEIEF/SEB, rio de Educação (MEC). “Hoje defasagem de formação inicial
processo que vem sendo cons- em dia o acesso às creches e e continuada que vem sendo
truído arduamente. Olhando pré-escolas não é mais visto sanada ao longo dos últimos
um pouco para a evolução das como um direito apenas das dez anos.
leis voltadas para a educação mães, e sim como um direito Para Karina, fazer com que
no Brasil, é fácil entender esse da criança”. as pessoas que trabalham na
difícil caminho. A Lei de Diretrizes e Bases creche superem o papel que
Só a partir de 1988, as da Educação Nacional, pro- ocuparam por um tempo – de
creches começaram a sair mulgada em 1996, tratou de médicos, de assistentes so-
do território da assistência consagrar esse direito. O pro- ciais, de psicólogos – é funda-
social, migrando para o capí- blema é que, na prática, nesse mental para estabelecer uma
tulo da Educação na Consti- processo, a Educação acabou parceria de verdade com as
tuição Federal. “No início, as herdando as creches da assis- famílias. “O papel da escola
creches eram tidas apenas tência social, com um pesso- é ensinar a fazer, e não fazer
como um lugar para as mães al que, em grande parte, ainda no lugar do pai. Não é dar o
deixarem os filhos enquan- não era qualificado para fazer peixe, mas sim ensinar a pes-
to iam trabalhar, numa visão o que precisava ser feito. “Du- car”, defende a coordenadora
essencialmente assistencia- rante um tempo, para ser uma do MEC.

observa Maruska. diariamente escolas e casas e que os adultos estão partici-


Segundo Izabel Braga Lopes, de famílias para fazer palestras pando do curso de alfabetiza-
coordenadora de Educação In- sobre a importância das crian- ção. “Outro dia me emocionei
fantil de Irauçuba e também do ças freqüentarem as escolas, quando pedi para três mães
Programa, 88% das crianças de mas também para falar sobre o assinarem as fichas de freqü-
zero a seis anos de idade estão Peti (Programa de Erradicação ência com suas impressões di-
matriculadas e freqüentam regu- do Trabalho Infantil), o pré-na- gitais e elas disseram que ago-
larmente as escolas municipais. tal, a alfabetização de adultos e ra já sabem escrever e não pre-
Cada sala de aula tem de 25 a temas específicos para jovens cisam mais ‘carimbar’ o dedo”,
30 alunos, no máximo, com duas e adolescentes a partir dos 12 conta Iva.
professoras. anos de idade, além de pesar
Foto: Jarbas Oliveira

A cerca de 10 quilômetros da e medir crianças e de orientar


sede do município, à margem da com noções básicas de higie-
BR-222, na localidade Fazenda ne e saúde. Iva diz que já se
Coité, vive e trabalha a agente pode notar que há um nível de
comunitária de saúde Iva Maria conscientização muito maior
Gonçalves Duarte. Casada, mãe das mulheres para fazerem o
Iva ensina às mães cuidados
de três filhos, Iva percorre a pé pré-natal o mais cedo possível, necessários para as crianças.

revista criança 33
reportagem

Como podemos nos ajudar? a questão do bem e do mal, os 6 anos de idade.


Cisele Ortiz é coordenadora no caso das bruxas –, sobre o No kit, cada tema começa
de projetos do Instituto Avisa funcionamento do imaginário com uma pergunta para a fa-
Lá, organização não-gover- de suas crianças, talvez os pais mília. Nunca começa informan-
namental que trabalha com a tivessem um comportamento do nada. Pelo contrário: é uma
formação continuada de profis- mais compreensivo em relação integração em que primeiro se
sionais da Educação. Para ela, à escola. ouve o que as famílias sabem,
a parceria entre escola e família Vitória Faria alerta que a par- e a partir do seu conhecimento
precisa passar do discurso para ceria entre escolas e famílias é que se trava a conversa. “O
a prática escolar. deve estar pautada pelo direito material permite que se fortale-
A escola precisaria mudar o à educação, e não como um çam as competências da famí-
jeito como olha a comunida- favor: “A escola é um bem da lia, porque a gente acredita que
de, ampliar seu olhar, ser mais comunidade”. A abertura no fim qualificada ela já está”, explica
acolhedora. Os pais, por sua de semana, onde a escola pas- Halim Girade, médico da Uni-
vez, precisariam se esforçar sa de espaço ocioso a espaço cef e um dos coordenadores do
mais para participar dos conse- de cultura e lazer, segundo Vi- Programa.
lhos escolares, ou mesmo para tória, pressupõe uma proximi- Em 2004, foi aprovado um
acompanhar mais de perto o dade com a comunidade. Para projeto-piloto que envolveu os
processo de aprendizagem dos ela, escola tem que ser parceira estados do Piauí, Pará, Ceará
filhos. Para isso, os projetos da família de fato, e não sim- e a cidade de Manaus. Foram
precisariam ter etapas incluso- plesmente envolver os pais em distribuídos 2.300 kits em 48
ras da família. mutirões, e outras atividades municípios, 1.744 instituições
Como existe uma diversida- onde eles são usados como de Educação Infantil. Dessa
de cultural enorme em nosso mão-de-obra gratuita. forma, cerca de 90 mil crianças
país, muitos aspectos de ou- foram atendidas. Agora é hora
tras culturas são vistos de ma- Família fortalecida de expandir. O MEC já começou
neira preconceituosa, e vice- O foco do Programa Famí- a qualificar os professores no
versa, ou seja, a família muitas lia Brasileira Fortalecida, uma Piauí, Ceará, Bahia, Goiás, Ser-
vezes encara de forma também parceria entre o Fundo das gipe, Roraima, Alagoas e Ama-
preconceituosa o que a escola Nações Unidas para a Infância zonas.
faz. (UNICEF), o Governo Federal e Em cada estado, tutores do
Um exemplo? Cisele conta 28 organizações não-governa- Programa Proinfantil qualificam
que nas escolas que o Instituto mentais, é promover a infância professores de creches e pré-
acompanha, por mais de uma ajudando a fortalecer a família. escolas. Esses, por sua vez,
vez houve problemas na hora O MEC participou do Progra- trabalham diretamente com as
de contar histórias de bruxas. ma desde o primeiro momento, famílias das crianças. “Fortale-
“Algumas famílias não querem da concepção do material à sua cida, a família começa a se li-
que as crianças as ouçam por construção. Foi produzido então bertar de muitas dependências
questões religiosas”, explica. A um kit, contendo cinco álbuns que tem de governos, ONGs,
educadora acredita que se ti- muito coloridos com desenhos municípios. Começa a sentir
vessem sido informados a priori significativos e uma linguagem que é dona dos seus próprios
sobre os livros a serem traba- bem simples, que explicam os atos e pode demandar políti-
lhados, sobre a importância dos cuidados necessários para as cas públicas em função disso”,
temas a serem tratados – como crianças desde a gravidez até acredita o médico.

34 revista criança
resenhas

Palavras são pássaros


Autora: Ângela Leite de Souza
Ilustradora: Pipida
Editora: Scipione
Gênero: Haicai (poemas)

Vitória Faria*

A poetisa paranaense He- impressão sobre a natureza. ta fase do desenvolvimento


lena Kolody, em seu poema Origami é a arte japonesa de humano que, por meio das
Pássaros Libertos, já dizia fazer dobraduras. interações com múltiplas lin-
que “Palavras são pássaros, Por ser uma obra de arte guagens, as crianças apren-
Voaram! Não nos pertencem que fala de outras obras de dem a apreciar o belo e a ver
mais”. Assim, esperamos que arte, é um livro para crian- a arte como parte essencial
as palavras de Ângela Leite, ças, adolescentes e adultos de sua vida.
levadas pelos pássaros de e, sobretudo, para os profes- Nessa fase, em que a
Pipida, voem e cheguem até sores, uma vez que os leva a maioria das crianças ainda
às professoras de Educação ampliar seus conhecimentos não lê convencionalmente,
Infantil e, por intermédio de- sobre algumas produções é importante lembrar que a
las, também às crianças de 0 culturais que fazem parte do professora deverá ler para
até 6 anos. patrimônio da humanidade. a classe como um todo ou
O livro na realidade traz Dessa maneira, além do para pequenos grupos, ex-
palavras que são pássaros e prazer, da fruição, da educa- plorando cada um dos poe-
pássaros que se fazem pa- ção estética que o livro, por mas e das ilustrações. Como
lavras, remetendo o leitor à sua intertextualidade, pro- é possível perceber, o texto
arte universal pela combina- porciona, é também um ver- por ele mesmo já possibilita
ção sensível de duas expres- dadeiro catálogo que oferece ricos desdobramentos para
sões artísticas: o haicai e o um roteiro de produções cul- a realização de projetos ou
origami. Haicais são peque- turais às quais as crianças, atividades significativas.
nos poemas, constituídos desde muito cedo, devem
em geral de três versos. Esse ter acesso.
tipo de texto, na tradição Neste sentido, é que a obra
japonesa resume poetica- é muito adequada para a *Vitória Faria é consultora editorial da
mente um conceito ou uma Educação Infantil, pois é nes- Revista Criança.

revista criança 35
resenhas

Brincar(es)
Organizadores: Alysson Carvalho, Fátima Salles, Marília
Guimarães e José Alfredo Debortoli.
Editora: UFMG

Adriana Torres Máximo Monteiro*

Que conceito é esse? É um de Debates, promovido pelo sujeitos que dele participam.
substantivo ou verbo? Está no Fórum UFMG da Educação Percorre diferentes contextos,
singular ou plural? Que signi- Infantil. O livro está organizado como o Centro de Educação
ficado tem para um grupo de em duas partes complementa- Infantil da UFMG, creches
psicólogos, artistas, terapeu- res. A primeira trata das Pers- situadas na região metropo-
tas ocupacionais, odontólo- pectivas Teóricas oriundas de litana de Belo Horizonte, a
gas, professores, pedagogos diferentes áreas do conheci- Escola Fundamental do Cen-
e crianças? mento, como a Pedagogia, tro Pedagógico da UFMG, a
Já no início da leitura do li- Educação Física, Psicologia, Brinquedoteca da Unidade de
vro Brincar(es), o leitor passa Arte, Terapia Ocupacional e Internação Pediátrica do Hos-
a compreender a sutileza do Odontologia, que buscam ex- pital das Clínicas da UFMG.
título. Em sua apresentação, plicitar e promover o avanço Compartilha de processos
os organizadores deixam cla- em torno do conceito de brin- de formação de educadores.
ro que estabelecem um diá- car. A segunda parte, denomi- Aprende também a estimular
logo entre diferentes áreas do nada O Brincar em Diferentes a prática musical em todas as
conhecimento com o intuito Contextos de Atendimento à crianças.
de fomentar uma troca de en- Criança, é composta de um Enfim, esse livro amplia e
tendimentos, procedimentos conjunto de práticas que “têm fortalece o debate sobre o
e metodologias. Ao avançar o brincar como eixo de ação tema, por meio de uma cuida-
no texto, o leitor encontra re- junto a crianças de zero a seis dosa abordagem que valoriza
flexões e práticas vividas por anos”. o ato singular de brincar e a
pessoas que significam e ex- Assim, o leitor compartilha pluralidade substantiva de sua
perienciam diferentes formas de um universo onde o brincar vivência, os brincares.
de brincar. é compreendido como um di-
Essa publicação é decorren- reito da criança, como possi-
te de um processo de discus- bilidade de produção e repro- *Adriana Torres Máximo Monteiro é
mestre em Educação pela UFMG, pro-
são e reflexão ocorrido nos dução da cultura da infância,
fessora da PUC-Minas e coordenadora
anos 2003 e 2004. São traba- como uma rica fonte de cres- do Instituto Superior de Educação Ba-
lhos que compuseram o Ciclo cimento e aprendizagem dos lão Vermelho.

36 revista criança
resenhas

As Boas Mulheres da China – Vozes Ocultas


Autora: Xue Xinran
Tradução do Inglês: Manuel Paulo Ferreira
Editora: Companhia das Letras
Gênero: Livro-reportagem

Sandra Denise Pagel *

Nesta obra, a jornalista Xin- de vida comoventes, emo- as vidas de todas nós, mulhe-
ran apresenta histórias verí- cionantes, repugnantes, que res, como companheiras, pro-
dicas de mulheres chinesas revelam provações, medos, fissionais, mães e militantes.
de diferentes idades e con- esperanças, resistências. São Nos faz pensar na necessida-
dições sociais, entrevistadas todas mulheres de alguma for- de de inventar e reinventar a
entre 1989 e 1997. Os relatos ma violentadas, em nome da nossa capacidade de resis-
revelam o peso das antigas “reeducação” promovida pela tência. Resistência em defe-
tradições e a asfixia de déca- Revolução Cultural chinesa. sa dos direitos humanos, dos
das de totalitarismo político e A autora apresenta também a sonhos, das utopias e de uma
repressão sexual vivenciados sua própria história, marcada sociedade justa e igualitária.
na China. pelo desamparo e pela discri- Vale a pena ler!
Nas histórias escolhidas minação.
* Sandra Denise Pagel é Coordenadora
predomina a memória da O livro, mesmo desvelan-
Geral do Ensino Fundamental/DPEIEF
opressão, do abandono e da do experiências vividas pelas da Secretaria de Educação Básica do
violência. São experiências chinesas, nos faz refletir sobre MEC.

revista criança 37
notas

Integração de creches Prêmio Professores do Brasil


A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB/1996)
2007
determina que as creches e pré-escolas, tanto pri-
A edição 2007 do Prêmio Professores do Brasil
vadas quanto públicas, devem integrar os sistemas
foi lançada em novembro último e está com inscri-
municipais de ensino. Com o objetivo de viabilizar a
ções abertas. Em 2006 não houve prêmio, pois sua
integração das que recebem financiamento do Fun-
divulgação foi proibida durante o período eleitoral.
do Nacional de Assistência Social (FNAS), os mi-
O Professores do Brasil reconhece o mérito dos
nistérios da Educação (MEC), do Desenvolvimento
profissionais de creches, pré-escolas e anos iniciais
Social (MDS) e do Planejamento (MP) fizeram cam-
do Ensino Fundamental que desenvolvem experiên-
panhas nos anos de 2005 e 2006 para que todas
cias pedagógicas relevantes e bem-sucedidas com
as creches e pré-escolas fossem cadastradas no
crianças de 0 a 10 anos de idade. Serão premiados
Censo Escolar (INEP/MEC). As creches e pré-esco-
os 20 melhores trabalhos, sendo 10 para cada seg-
las que ainda não se cadastraram devem procurar
mento (Educação Infantil e Ensino Fundamental).
os coordenadores estaduais do Censo Escolar, na
A organização e premiação serão feitas em par-
respectiva Secretaria Estadual de Educação.
ceria com a Fundação Bunge, a Fundação Orsa, a
União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educa-
ção (Undime) e o Conselho de Secretários Estaduais
de Educação (Consed). Inscrições abertas de 1º de
março a 30 de junho de 2007. Mais informações:
0800 61 61 61

Lançamento da Revista
Pró-Letramento LeituraS
O Pró-Letramento, programa de formação conti-
O MEC lançou a Revista LeituraS, que será distri-
nuada para professores de 1a a 4a séries para rever-
buída gratuitamente para as escolas de Ensino Fun-
ter os baixos índices de aproveitamento em Língua
damental. Dirigida aos professores e com tiragem
Portuguesa e de Matemática no Ensino Fundamen-
de 200 mil exemplares, LeituraS é mais uma ação
tal, já está presente em municípios dos estados
do Programa Nacional de Formação de Leitores, in-
do Rio Grande do Norte, Ceará, Maranhão, Bahia,
formando sobre livros (literatura, didáticos e outros)
Piauí, Santa Catarina, Pernambuco e Sergipe. O
e sugerindo atividades com os alunos.
programa pretende atingir cerca de 400 mil profes-
A Revista traz ensaios de especialistas e textos de
sores até 2007, com cursos de um semestre que
professores. Na primeira edição, divulga a experiên-
enriquecerão o trabalho dos professores nas duas
cia da cidade de Iepê, que obteve bons resultados
disciplinas.
no Prova Brasil, decorrente de ações de leitura nas
Universidades da Rede de Formação Continuada
suas escolas públicas. Também traz os depoimen-
de Professores da Educação Básica (Rede/SEB/
tos do escritor Ricardo Azevedo e do geógrafo Aziz
MEC) produziram fascículos e programas de vídeo
Ab’Sáber sobre leitura, e um artigo sobre fotogra-
nas áreas de Linguagem/Leitura e Matemática. O
fia. Para dinamizar o uso dos livros do Programa
investimento é de R$ 80 milhões. O MEC faz a for-
Nacional Biblioteca da Escola (PNBE), os artigos e
mação de tutores e distribui o material didático; os
sugestões de atividades trazem resenhas de obras
estados, então, fazem a formação dos professores
que compõem os acervos distribuídos às escolas
de suas redes.
públicas.

38 revista criança
diálogo

Diálogo com as cartas


recebidas

Tive a oportunidade de desenvolver um pro- Mônica,


jeto, durante o qual, apesar das condições Para nós, são muito significativos retornos
sociais do bairro e da falta de recursos, pude como o seu em relação à importância da Revis-
atingir níveis muito bons de entendimento ta para o desenvolvimento do trabalho pedagó-
por parte dos alunos. Na escola, tive todo gico dos professores.
o apoio da direção, dos funcionários e dos
pais. Isso foi importante, pois tratava-se de A Revista Criança do professor de Educação
um projeto que precisava ser absorvido por Infantil muito tem contribuído no fazer pedagó-
todos. Gostaria de publicar o projeto “Eu e a gico das atividades que realizo.
Água” nesta revista tão conceituada. Até o ano passado desempenhei a função de
coordenador pedagógico das escolas infantis
Elizângela Rabelo da rede municipal de ensino. Atualmente sou
Balneário Gaivota (RS) educador da rede estadual, trabalhando com
a 1ª série do Ensino Fundamental em um as-
Elizângela, sentamento. Feliz em poder contribuir com o
Parabéns pela qualidade do projeto desen- espaço Professor faz Literatura, agradeço.
volvido. Infelizmente o nosso limite de espa-
ço para publicação de experiências não nos Heber Laudelino Ar de Har

permite divulgá-lo na íntegra. De qualquer Santana do Livramento (RS)

forma, gostaríamos de destacar a qualida-


de do trabalho realizado, a importância da Sou secretário do Colégio Amilton Ferreira.
temática e, sobretudo, o envolvimento das Aqui, a nossa meta é dar respeito, carinho e,
crianças em todas as suas etapas. acima de tudo, educação para as nossas crian-
ças.
Sou funcionária pública municipal de São Gostaria que publicassem a minha poesia “A
Paulo e trabalho com Educação Infantil Família na escola”.
como ADI, desde 1990. Sou leitora da Re-
vista Criança, especialmente indicada para Maurício Souza

professores da Educação Infantil. E, atra- Inhuma (PI)

vés desta carta, venho parabenizá-los pelas


matérias que vêm ao encontro do trabalho Uma seção interessante, por meio da qual
que estamos realizando. Ao lê-la consigo me muitos talentos serão descobertos. É para dar
analisar e ver que estou trilhando caminhos minha pequena e humilde contribuição, estou
corretos. enviando a poesia “Minha Mensagem”.

Mônica Teodoro de Oliveira Maria Bernadete Mariano

Rio Grande da Serra (SP) Creche Vila Bandeirante – Terezina (PI)

revista criança 39
diálogo

A Revista Criança muito vem acrescentando esse livro trabalhei as diferenças individuais
a nós professores e particularmente a mim, e o preconceito. Ficaria muito feliz se o mes-
que sou coordenadora de uma escola muni- mo fosse publicado. Aguardo aflita por uma
cipal. Os conteúdos abordados são claros, resposta.
precisos e de grande apoio nas horas de es-
tudo dos professores. Espero poder partici- Meyre Luciana Belo de Almeida
par deste trabalho, mesmo que indiretamen-
te, enviando-lhes alguns poemas de minha Mônica, Heber, Maurício, Eveline, Eurídice,
autoria. Meyre,
Ao ler as cartas enviadas por vocês e por
Eveline Soares Correia Malvezzi outros leitores, ficamos satisfeitos por saber
Nova Londrina (PR) que as matérias selecionadas para publi-
cação na Revista Criança têm sido úteis ao
Ficarei muito feliz se o texto “Marlene, a trabalho pedagógico que desenvolvem. Ou-
professora heroína” for publicado. O texto é tro motivo de nossa satisfação é a constata-
sobre uma colega de trabalho que, além de ção de que muitos de nossos professores,
ser uma grande professora, tem cinco filhos, além de bons leitores, são também autores
sendo que os três últimos são trigêmeos. de textos literários. Mesmo reconhecendo a
qualidade de muitas matérias enviadas nos
Eurídice Pontes Barbosa vemos impossibilitados de divulgá-las tan-
Centro de Educação Infantil Menino Jesus – Munhoz de to pelos limites de espaço para publicação,
Mello (PR) quanto pelas características de nossa linha
editorial.
Sou pedagoga e professora da Educação In- Continuem produzindo literatura e nos es-
fantil. Escrevi um livro no qual conto a histó- crevendo sobre suas experiências.
ria de um gato diferente: “O gato lilás”. Com

40 revista criança
arte

Diego Velázquez (1599/1660)


Vitoria Faria*

As meninas
1656 – Óleo sobre tela

Diego Rodríguez de Silva pelos contrastes entre a e o rei e rainha refletidos no


Velázquez nasceu em Sevilha luminosidade que envolve as espelho.
e foi o principal artista da cor- figuras e o fundo escuro que lhe Essa obra, marco do barroco
te de Felipe IV. É considerado serve de cenário. Nesta tela, espanhol, já foi analisada por
o mais representativo pintor originalmente denominada A críticos e historiadores de todo
espanhol e um dos maiores família, Velázquez registra um o mundo. Convidamos você
artistas da pintura universal de momento da história de seu também, professora, a fazer
todos os tempos. Morreu em país, retratando a princesa uma leitura desse quadro, tendo
Madrid, aos 61 anos. Margarida Maria com 5 anos em vista a concepção de criança
O quadro As meninas é de idade, cercada de outras que se encontra nele. Observe
sua obra prima, quer pela meninas e de suas criadas, a fisionomia das meninas,
suntuosidade e riqueza uma delas anã. Na tela os trajes e o significado da
de detalhes, quer pela podem ser vistos também o presença dos reis no espelho e
harmonia das cores, quer próprio pintor, auto-retratado, do pintor auto-retratado.

* Consultora editorial da Revista Criança


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