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Dedico a todos os comunistas

revolucionários que tombaram


lutando por uma sociedade justa e
igualitária.

In memorian:

Alcides Cordeiro Becker


Ivone Regina da Silva
João Inácio da Silva
Maria José Indrigo Batista
Wilson Ribeiro
Sumário

RESUMO ...................................................................................................................................... 4
ABSTRACT .................................................................................................................................. 4
AGRADECIMENTOS.................................................................................................................. 6
INTRODUÇÃO ............................................................................................................................ 8
Capítulo 1: Nestor Vera, os comunistas e o movimento camponês ........................................ 26
Capítulo 2: O camponês comunista entre o pensar para agir ................................................ 54
Considerações finais ................................................................................................................... 71
BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................................ 74
RESUMO

O presente trabalho consiste em apresentar a participação e contribuição dos


comunistas para a organização do movimento camponês brasileiro. Para isso iremos
utilizar a trajetória política do comunista camponês Nestor Vera (1915-1975), oriundo
do campesinato que participou ativamente na construção de Ligas Camponesas e
sindicatos rurais por todo o interior paulista. Compreendendo a participação de Nestor
Vera no movimento camponês poderemos realizar uma contribuição para analisar o
desenvolvimento da atuação política dessa classe social brasileira, desde a fundação das
primeiras formas de organização com as Ligas camponesas até mesmo as entidades de
âmbito nacional como ULTAB (União de Lavradores e Trabalhadores agrícolas do
Brasil) e a CONTAG (Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura) que
tiveram forte participação comunista em suas instituições, principalmente nosso
camponês comunista Nestor. A partir da narrativa de sua trajetória política iremos
também analisar o pensamento de Nestor Vera em relação à organização do
campesinato, como essa classe social seria importante no processo revolucionário
brasileiro. Com isso pode-se analisar como o camponês era tratado na perspectiva dos
comunistas, os debates internos do PCB em torno dessa temática.

Palavras-chave: Campesinato; Comunistas; Organização; Revolução Brasileira.

ABSTRACT

This monograph’s goal is to present the participation and contribution of the


Communists for the organization of the Brazilian Peasant Movement. In order to
achieve this goal, we are going to use the political career of the communist peasant
Nestor Vera (1915-1975), coming from the peasantry who actively participated in the
organization of rural unions and Peasant Leagues throughout São Paulo city’s
countryside. By understanding the participation of Nestor Vera in the Peasant
Movement, we will be able to analyze the development of this Brazilian social group’s
political action, since the foundation of the earliest forms of organization, such as the
Peasant Leagues and even nationwide entities such as ULTAB (Union of Farmers and
Agricultural Workers of Brazil) and CONTAG (National Confederation of Agricultural
Workers) which had a strong communist participation in its foundation, especially the
peasant communist Nestor. Based in his political career’s narrative, we will also analyze
Nestor Vera’s mindset in relation to the organization of the peasantry and how this
social class was important in the Brazilian revolutionary process. With this in mind, it is
possible to analyze how the peasant was treated, from the Communists’s perspective
and the internal debates of the PCB on this topic.

Keywords: peasantry; communists; organization; Brazilian revolution


AGRADECIMENTOS

Realizar agradecimentos depois de várias lutas é tarefa complicada pelo medo de


deixar de agradecer alguém, mas agradeço a todas aquelas pessoas que um dia me
ajudou de tantas formas, inclusive aqueles que pagaram o ônibus quando não tive o
dinheiro para pagar a passagem e que por conta do capitalismo selvagem não poderia
chegar à faculdade se não fosse à ajuda dos ilustres desconhecidos dos coletivos
paulistanos.

O principal agradecimento vai para meus amados criadores, minha mãe


batalhadora Maria Aparecida Becker da Silva e meu guerreiro pai João Gumercindo da
Silva, que me deram a vida, a estrutura, os principais ensinamentos da vida, de lutar
pelo que se quer, de se entregarem na luta cotidiana para dar um bom ensino e melhores
condições de vida para seu filho mesmo que para isso tenham que entregar o último
sopro de vida. Agradeço do fundo do coração a esses dois trabalhadores que durante
anos me ensinaram a ter dignidade e de todos os momentos felizes que me deram, pelas
lágrimas que tivemos pelos momentos difíceis que no fundo contribuiu nos
ensinamentos da vida. Minha gente não é fácil criar um filho sendo proletário em uma
pequena cidade do interior paulista!

Agradeço meus avôs pelo amor e os ensinamentos, vô João e vô Alcides que


saudades vocês deixaram, obrigado pelas risadas que demos. Vó Dita e Vô Zilda,
minhas guerreiras! Obrigado por todo o amor e carinho que recebo das senhoras que é
fundamental para aguentar nos dias de escuridão. Agradeço toda a minha família,
todos que me ensinaram o que é lutar a vida cotidiana, tios, tias, primos e primas,
família do interior e família de São Paulo que me ajudaram nos momentos mais
complicados, não estou falando o nome de um por um para não falhar e deixar alguém
de fora, meu mai sincero OBRIGADO!

Agradeço também a mulher que esteve ao meu lado nesses últimos anos me
ensinando a amar, a viver e a sonhar. Sem Janaína Lopes tudo teria sido mais árduo e
não sei se conseguiria continuar. Muito obrigado pelos ensinamentos, a alegria, o amor
e carinho, mas principalmente pelo seu sorriso que me proporciona ânimo para
continuar lutando.
Tenho que agradecer também aos meus amigos que tiveram do meu lado para
darmos juntos muitas risadas, falar mau da vida, afogar as mágoas e tristezas, jogar tudo
para o alto, criticar a sociedade, falar palavrões, rir dos erros e furadas. Amigos de Salto
Grande que desde a infância estão comigo ajudando no que precisar que são irmãos que
nunca vou esquecer. Agradeço aqueles aos amigos que conheci em São Paulo, pessoas
fabulosas que vou guardar no fundo do coração e da memória, pessoas que foram
fundamentais para meu desenvolvimento intelectual e da vida. Não vou falar o nome de
cada um para não cometer o erro de deixar alguém de fora, mas meu mais sincero
OBRIGADO!

Aos camaradas de luta do PCML que me ajudaram a compreender o marxismo,


em ver como é necessário continuar lutando pela Revolução e nunca desistir de nossas
convicções, não só nas questões da militância quanto da amizade que criamos.

Agradeço também ao prof. Clifford A. Welch pelas orientações e discussões que


foram imprescindíveis para concretização desse projeto, além da amizade. E ao prof.
Maximiliano Mac Menz pelas conversas, perturbações e amizade que também
contribuíram para a finalização de meu trabalho. Agradeço também ao prof. Janes Jorge
pelas conversas, orientações e ajuda.

E por fim, a Nestor Vera que dedicou a sua vida pelos trabalhadores do Brasil
principalmente aos camponeses, que lutou a vida toda pela Revolução e a construção de
uma sociedade justa e igualitária para todos os trabalhadores. Nestor que é o foco desse
trabalho, se não tivesse se levantado contra a opressão esse trabalho não teria existido.
Agradeço a todos os comunistas revolucionários que dedicaram à vida e tombaram pelo
Socialismo. Hasta la Victoria!
INTRODUÇÃO

“O conhecimento da história do proletariado


começa com o conhecimento do presente, com o
conhecimento da sua própria situação social, com a
revelação de sua necessidade (o sentido de gênese).”
(Georg Lukács)

A escrita da História é espaço de disputas de interpretações e narrativas, que visa


criticar, analisar e refletir sobre um novo tipo de sociedade ou sobre o processo de seu
estabelecimento. Para o historiador dos Annales e combatente Marc Bloch, os
historiadores escrevem a partir dos anseios de seu tempo, dessa forma a conjuntura
política e social influencia em seu trabalho intelectual, seja na sua ligação com o status
quo, seja pela vontade de transformação.

Como já escrevia Florestan Fernandes que “não existe neutralidade possível: o


intelectual deve optar entre o compromisso com os exploradores ou com os
explorados”1. Assim, o momento histórico pelo qual passa o Brasil influencia este
pesquisador em seu trabalho, e é dever dos/as historiadores e de todos/as pesquisadores
tomarem partido. Este aprendiz de historiador se compromete com a segunda opção
exposta por Florestan Fernandes.

O modo que a conjuntura brasileira tem se desenrolado traz a tona a célebre


frase do revolucionário Karl Marx para refletirmos:

Hegel comenta que todos os grandes fatos e todos os grandes personagens da história
mundial são encenados, por assim dizer, duas vezes. Ele se esqueceu de acrescentar: a
primeira vez como tragédia, a segunda como farsa.2

Os ecos do passado trágico ressoam na memória coletiva devido ao processo


histórico farsesco que ocorreu a partir do Golpe de Estado de 2016. Neste ano no campo
político apresentou-se um palco dos horrores de uma farsa que foi processo que retirou a

1
FERNANDES, Florestan. Em busca do socialismo: últimos escritos e outros textos. São Paulo:
Xamã, 1995. p. 29
2
MARX, Karl. O 18 Brumário de Luís Bonaparte. São Paulo: Boitempo, 2011. p. 23.
presidenta Dilma Rousseff do governo para colocar as forças mais reacionárias e
corruptas do país. Se em 1964 o golpe militar foi fruto das disputas da Guerra Fria, o de
2016 foi a busca do império e seus seguidores tupiniquins em tentar superar a crise do
capital que assola o mundo capitalista.

Dentre as medidas neoliberais está a retirada dos direitos da classe trabalhadora


que foram conquistados com muito esforço e luta, assim ocorre a disputa pelas
narrativas históricas em volta desse processo. O Congresso Nacional aprovou o
desmonte da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) com o discurso de
modernização do trabalho, do mesmo modo o acordado se sobrepõe ao legislado, prática
recorrente do início do século XX. Há também projetos de lei do agronegócio que visam
o trabalho ininterrupto no campo, além do não pagamento de salário em pecúnia, mas
com alimentação e moradia, prática do colonato ou das relações trabalhistas que os
camponeses lutaram contra por toda primeira metade do século passado.

Essas ações são reflexos das dinâmicas das lutas de classes, motor da História
descrita por Marx e Engels.3 Por toda uma geração de historiadores essas dinâmicas
sociais foram negadas, em relação ao mundo rural as contradições entre capitalismo
agrário e campesinato foram também refutadas ao longo dos anos 1990. O pesquisador
Ricardo Abramovay afirma não haver separações entre grande capital e agricultura
familiar, deste modo ambos fazem parte de um mesmo mundo rural harmônico.4 Os
últimos acontecimentos e a História provam o contrário.

Sendo assim, este trabalho busca analisar e criticar a atual narrativa hegemônica
nas ciências que tentam pasteurizar os conflitos sociais no campo. Esta narrativa faz
parte de uma longa luta em torno da política agrária do Brasil, algo que foi
especialmente intensivo a partir do final da II Guerra Mundial. Foi neste período que se
formou no país um movimento camponês que permanece vivo até hoje, apresentando
visões alternativas de um campo menos monopolizado pelo capital.

Neste enfrentamento, de visões e políticas concretas, o Partido Comunista do


Brasil (PCB) fez uma contribuição que os donos do agronegócio não gostam de
reconhecer, apesar de ter sido uma participação geralmente a favor do desenvolvimento

3
MARX, Karl; ENGELS, Friedrich. Manifesto do Partido Comunista. São Paulo: Cooperativa Inverta,
2010.
4
ABRAMOVAY, Ricardo. Paradigmas do capitalismo agrário em questão. São Paulo, Hucitec, 1992.

9
do capitalismo no campo. Um dos protagonistas mais presentes durante as três décadas
iniciais deste movimento foi o camponês Nestor Vera, militante destacado do PCB para
atuar no meio rural até seu assassinato em 1975 pela ditadura civil-militar. Entre 1946 e
1975, Vera foi presidente de uma liga camponesa, membro do Comitê Estadual do
PCB, dirigente do jornal Terra Livre, secretário da ULTAB, organizador do Congresso
de Belo Horizonte (1961), fundador e tesoureiro da CONTAG, representante do Brasil
em congressos internacionais do campesinato. Com o presente trabalho, pretendemos
problematizar a narrativa atual da hegemonia do agronegócio com um estudo da
trajetória política de Vera, até agora pouca reconhecida na historiografia brasileira.

A problemática do estudo busca compreender a contribuição de um movimento


de resistência a partir do campo à formação do capitalismo agrário brasileiro através da
trajetória de Nestor Vera. A centralidade de sua atuação no período pode ajudar
entender melhor as consequências da interação entre os protagonistas da modernização
do sistema de produção capitalista no campo e o aparecimento de seu antagonismo na
expressão da resistência camponesa. O historiador Willian H. Sewell questiona a
produção historiográfica recente que centra seus estudos apenas na linguística e perdeu
a concretude das ações humanas, assim acredita que seja necessário uma reformulação
da História Social que possa entender o desenvolvimento dos modos de produção.5
Nosso intuito é contribuir para a História Social com um estudo que consiga entender
parte do desenvolvimento do modo de produção capitalista no campo a partir de uma
experiência concreta de resistência.

Nestor Vera nasceu em Ribeirão Preto (SP), em 19 de maio de 1915, filho dos
imigrantes espanhóis Manoel Vera e Pilar Velásques. Teve como primeiro local de
atuação política a cidade de Santo Anastácio (SP), situada no Pontal do Paranapanema,
região de forte disputa pela terra. A ida da família Vera para o oeste paulista é marcada
pelo processo de migrações internas no estado de São Paulo, devido a abertura de novas
terras para o cultivo e povoamento. 6

O período de 1946 até 1975, são anos de forte participação comunista no âmbito
rural. Subdividindo em três períodos menores, o projeto pretende analisar a dialética

5
SEWELL, Willian H. Por una reformulación de lo social. Ayer. n. 62, 2006.
6
WELCH, Clifford. “Os com-terra e os sem-terra de São Paulo”. In: FERNANDES, Bernardo;
MEDEIROS, Leonilde Servolo de; PAULILO, Maria Ignez. Lutas camponesas contemporâneas:
condições, dilemas, e conquistas. Vol. 1. São Paulo: Editora Unesp, Brasília: Núcleo de Estudos
Agrários e Desenvolvimento Rural, 2009.

10
entre a ação sociopolítica de Vera, o desenvolvimento de seu pensamento e da política
agrária do PCB. Continuidades podem ser identificadas como entre 1946 a 1954
demarcado pela luta em torno das Ligas Camponesas e o estabelecimento da União de
Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil (ULTAB). Vera estabeleceu sua
liderança no setor do campo do PCB nesse período. Com sua sede e um jornal próprio, a
atuação da ULTAB no campo deu início a um segundo período de 1954 até 1964, que
teve a presença de Vera como um de seus organizadores, formadores e oficiais chave.
Junto aos camponeses, Nestor realizava a luta em defesa da reforma agrária e direitos
trabalhistas abertamente até o final de 1963, quando suas atividades foram transferidas
para a Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), talvez o
maior conquista do movimento camponês até então. Logo, veio o golpe civil-militar que
forçou Vera e outros comunistas para a clandestinidade de novo. Em 1964, fecha-se o
subperíodo da frente popular (ULTAB) e abre o último subperíodo, que dura – no caso
de Vera - até sua execução em 1975. Nestor Vera viu o movimento camponês se
desfalecer, ser colocado na clandestinidade, dos enfrentamentos e rachas dentro do
partido, surgimento de outras formas políticas de organização e luta armada, passou
para uma luta democrática reforçada pelos sucessos eleitorais em 1974, até seu
assassinato em abril de 1975.

Nesse último subperíodo teremos a chance de investigar a participação dos


comunistas no campo imersos na luta contra a ditadura algo que até o presente tem sido
pouco investigado pela historiografia. Um dos programas da ditadura civil-militar foi a
industrialização da agricultura, em 1967, com o pseudônimo de Jacinto Xavier, Nestor
participou como membro da delegação brasileira na V Conferência Mundial dos
Sindicatos dos Trabalhadores da Agricultura, das Florestas e das Plantações, na
Alemanha Oriental, encontro organizado e financiado pela URSS, nessa conferência faz
denúncias sobre a tortura e a perseguição contra os trabalhadores do campo.7 Cabe
ressaltar que Vera em seu discurso explica o avanço do capital ligado ao latifundiário
em diversas partes do país, principalmente no estado de São Paulo, que gera por
consequência a expropriação das terras dos camponeses, descreve que mesmo dentro da
CONTAG que sofreu intervenção direta dos militares a luta dos trabalhadores continua
intensivamente passando por cima das orientações dos “pelegos”.

7
WELCH, Clifford A. A semente foi plantada, as raízes paulistas do movimento sindical camponês
no Brasil, 1924-1964. São Paulo: Expressão Popular, 2010.

11
O ano passado [1967] os plantadores de amendoim do Estado de São Paulo
realizaram uma grande concentração na cidade de Tupã, de protesto contra a exploração
das companhias americanas Anderson Clayton e outras, e exigindo do governo
melhores preços para seu produto. O mesmo fizeram os plantadores de algodão do
Estados do Paraná, Mato Grosso, parte de Minas Gerais e de São Paulo, que realizaram
uma concentração na cidade de Mirandópolis, com a presença de cerca de 15 mil
pessoas, entre pequeno, médios e até grandes produtores contra os grandes
compradores. Tal foi a situação, que o representante de Castelo Branco não conseguiu
usar a palavra.8

Essa passagem nos indaga pensar em como foi a atuação de Nestor Vera na
organização dos trabalhadores do campo mesmo estando na clandestinidade. Será que
Vera e seu grupo de comunistas destacados para o campo lutaram em 1968 para retomar
a direção da CONTAG, então presidida por José Rotta? Essas são algumas questões que
o projeto buscará responder a partir das evidências encontradas no trabalho de pesquisa.

A escolha da periodização do projeto visa apresentar as contradições entre o


vivido e o concebido - utilizando termos de Henri Lefebvre- dos comunistas e de suas
relações com o movimento camponês que se desenvolvia.9 Os anos que entremeiam
1946 e 1975 marcaram o desenvolvimento das ligas camponesas, associações rurais,
sindicatos, federações e a confederação dos trabalhadores rurais, além de mudanças
importantes nas diretrizes do PCB10. São as contradições entre o vivido e o concebido
de Nestor Vera que nos proporciona elementos para analisar a ligação entre camponeses
e comunistas, e dessa forma parte de sua projeção na política nacional.

O fim dos regimes autoritários da Europa com o final da II Guerra Mundial


refletiu no Brasil na queda de Getúlio Vargas, em outubro de 1945. Com isso foram
realizadas as primeiras eleições amplas com a vitória do General Eurico Gaspar Dutra,
que por um determinado momento recebeu apoio do PCB. O Partidão conseguiu eleger,
devido ao seu amplo prestígio no pós-guerra e com apoio popular, uma pequena
bancada na Constituinte de 1946, no entanto, sua legalidade durou pouco. Em maio de
1947, o judiciário do governo Dutra cassou a legalidade do PCB o que levou a uma
mudança à esquerda nas diretrizes do partido.

8
XAVIER, Jacinto (pseud. Nestor Vera). A situação do movimento camponês no Brasil, suas lutas e sua
organização. Coleção Nestor Vera, Fundo IAP, acervo ASMOB, CEDEM/UNESP. p. 12-13.
9
LEFEBVRE, Henri. La Presencia y la Ausencia: Contribuición a la Teoria de las Representaciones.
México: Fondo de Cultura Económica, 2006.
10
Cf. PRESTES, Anita Leocádia. A que herança os comunistas devem esquecer. Revista Oitenta, s/n,
nov. 1980. SEGATTO, José Antonio. Reforma ou Revolução. As vicissitudes políticas do PCB (1954-
1964). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1995.

12
O curto período de legalidade do Partido Comunista encontramos a primeira
atuação como liderança camponesa de Nestor Vera na Liga Camponesa de Santo
Anastácio (SP) organizada por posseiros em luta junto aos comunistas. A Liga de Santo
Anastácio formou-se no contexto das primeiras eleições democráticas que elegeu o
General Eurico Dutra, presidente em 1946, no entanto, como aponta Pedro Estevam
Pomar esse governo foi mais centralizador, sem a pretensão de ser uma democracia
participativa e cassando direitos dos trabalhadores.11

Segundo Clifford Welch,

A Liga Camponesa estabeleceu-se em Santo Anastácio em abril de 1946, em resposta ao


crescimento expressivo das reclamações de trabalhadores rurais do lugar. Com a liga, o
PCB pretendia agrupar todos os pobres e médios ‘trabalhadores da terra’, uma
diversidade de relações de trabalho, em uma categoria só. (...) Os participantes
‘elegeram democraticamente’ a comissão diretora da liga, tendo Nestor Veras na
presidência e outros 11 representantes e substitutos nomeados na oportunidade. 12

A luta dos arrendatários, meeiros, sitiantes e terceiros era em busca de melhorias


nas suas condições de vida e trabalho, portanto as reivindicações eram sobre “a questão
do preço do arrendamento das terras, a manutenção da estrada, a criação de escolas e
clínicas médicas.”13 O prontuário do DEOPS sobre Nestor Vera aponta uma entrevista
sua no jornal Notícias de Hoje que a Liga de Santo Anastácio era uma organização
nova, porém

vinha ao encontro dos desejos de todos os trabalhadores do campo da localidade em que


reside; suas justas reivindicações em torno dos problemas mais sentidos do nosso
camponês fortaleciam sua estrutura, devendo ser este motivo principal que levou a
polícia e demais autoridades a determinar seu fechamento. 14

A medida de colocar os comunistas na ilegalidade é posta pelo governo de Dutra


para barrar o prestígio e apoio massivo que o PCB angariou no pós-1945. Welch
descreve que no campo a principal organização que buscava colocar os camponeses
como força política era a dos comunistas,

11
POMAR, Pedro Estevam da R. A democracia intolerante: Dutra, Adhemar e a repressão do
Partido Comunista (1946-1950). São Paulo: Arquivo do Estado, Imprensa Oficial do Estado, 2002.A
democracia intolerante, 2002.
12
WELCH, Os com e os sem terra, 2009, p. 144.
13
WELCH, Os com e os sem terra, 2009.
14
Processo do inquérito policial de Santo Anastácio. Prontuário 82.320 – Nestor Vera – Fundo DEOPS,
AESP.

13
o PCB havia ajudado a dar forma a uma diversidade de reivindicações e exigências dos
lavradores e trabalhadores agrícolas. [...] O partido havia unido militantes de todo o
país, e facilitado a criação de organizações camponesas. Com suas ações e debates, o
PCB havia ajudado a semente do movimento camponês a nascer e a árvore a crescer,
mais do que qualquer outra entidade no Brasil. 15

Com o retorno à clandestinidade os comunistas voltaram suas posições políticas


mais a esquerda com o Manifesto de janeiro de 1948 que havia uma postura de
enfrentamento contra o governo Dutra. Proclamava a organização armada de luta contra
o capitalismo. No campo isso refletiu no apoio de lutas camponesas aparentemente
avulsas, tendo como destaque o enfrentamento direto no norte do Paraná, caso da
Guerra de Porecatu (1949-1951), e em Goiás, caso dos povoados de Formoso e
Trombas (1950 a 1964) e outros levantes que ocorreram em todo canto do país.

Com a repressão da maioria destes levantes, bem como outros fatores, o PCB
começou a se afastar das estratégias mais bélicas para adotar posições mais gradualistas
ou reformistas. Traçou como objetivo a sindicalização dos trabalhadores do campo,
mesmo que a legislação trabalhista não previsse esse direito para a área rural.16

Em 1950, o PCB lançou o Manifesto de Agosto de 1950, denominado de Prestes


Aponta aos Brasileiros o caminho da libertação, reforçando a ideia de enfrentamento
direto contra o governo e o capital, conclamando uma frente de libertação nacional para
desenvolvimento de uma política nacional-democrática, com direcionamento de ir
contra o imperialismo e o latifúndio que mantinham o Brasil no atraso econômico. Para
o campo a linha diretiva era “pela entrega da terra a quem a trabalha” conclamando o
fim do latifúndio para o fim do sentido semi-colonial e semifeudal do Brasil.

Ainda dentro da perspectiva do Manifesto de Agosto de 1950, Nestor Vera teve


uma participação importante na organização dos camponeses na luta da Fazenda
Gariroba em Américo de Campo, na região de São José do Rio Preto, a luta dos
arrendatários teve a participação de cerca de 400 pessoas. Lutavam contra o aumento da
plantação de capim na região e a invasão de grileiros em suas terras, dessa forma, em
seu programa de reivindicações exigiam a baixa do arrendamento, não plantio de capim
e contra os despejos realizados pelo latifúndio da região contra os camponeses.

15
WELCH, A semente foi plantada, 2010, p. 291.
16
WELCH, A semente foi plantada, 2010.

14
Cabe ressaltar nessa experiência de Nestor Vera na fazenda Gariroba, atuação do
Partido Comunista em duas diferentes dinâmicas, se por um lado entre 1954-1964 teve
toda uma preocupação em difundir a sindicalização rural levando a cabo seu projeto de
garantir os direitos trabalhistas dos camponeses, por outro lado como afirma Paulo
Cunha teve toda uma luta paralela de enfrentamento direito ao capital e ao latifúndio.
Lutas como as ocorridas em Porecatu, norte do Paraná, Tupã (SP) em 1949,
Fernandópolis (SP) que teve as mulheres uma fundamental importância para assegurar a
luta insurrecional local, em 1949, Fazenda Gariroba em Américo de Campos (1950),
entre outras ocorridas no âmbito rural entre 1950-1964. Porém, tanto a historiografia
quanto nas memórias dos comunistas são deixadas de lado, não constando como
momentos de insurreição para a Revolução brasileira.

Paralelamente à sindicalização rural, clandestinamente estava em curso o projeto


estratégico da revolução via luta armada – ou seja, a implementação de áreas liberadas -,
proposta insurrecional que nunca deixou de estar no horizonte do Partido. Vários desses
esforços insurrecionais são quase que completamente ignorados pelos pesquisadores
acadêmicos e são muitos estudos de caso demandando pesquisas; sem falar que o
processo de intervenção armada no campo se desenvolvia com táticas bem curiosas. 17

Apresentamos alguns apontamentos das mudanças na política do PCB e na


forma que era empregada por Vera no campo, em determinado momento como em 1951
na fazenda Gariroba, e algumas reações e consequências a partir dos fazendeiros, a
política agrária e o desenvolvimento do capitalismo no campo. No período seguinte fica
mais claro a interação entre o movimento camponês e o modo de produção com a
atuação de Vera mais focada nos direitos trabalhistas e na formação da ULTAB e
CONTAG.

A ditadura civil-militar de 1964 marca o momento do esfacelamento do


movimento camponês, as principais lideranças vão para clandestinidade, são exiladas ou
mortas nos porões da ditadura. Vera foi destacado pelo Partido para atuar no Estado de
Minas Gerais. Passou a estar diretamente ligado a juventude angariando votos para o
MDB, segundo um dos estudantes que esteve com ele. O então estudante José Francisco
Néres, explicou que Nestor estava muito empenhado para conseguir uma ampla votação
no Estado para um candidato do MDB a deputado estadual.18

17
CUNHA, Paulo. Aconteceu longe demais. São Paulo: Editora Unesp, 2007. p. 81.
18
Processo CENIMAR - 18.097. Pasta 097. Fundo DEOPS – Arquivo Público Mineiro. 1976.

15
No processo crime de Néres e outros estudantes no qual Nestor organizava entre
1972 e 1975, demonstra como incentivou eles a “uma ação mais efetiva, tal como
pixamentos, panfletagem etc.”19 Nessa passagem encontramos uma perspectiva de
alcançar uma maior divulgação da oposição para chegar até as massas, pois pixações e
panfletagem poderiam ter um grande alcance na região que foi realizada.

As eleições de 1974 proporcionam uma significativa vitória para o MDB, pois


foram eleitos 16 senadores em oposição aos 6 do partido da ditadura (ARENA), 160
deputados mdbistas contra os 204 do outro partido.20 Esse avanço gerou um total
descontentamento da ditadura que já alinhava sua “abertura lenta, gradual e segura”
proposta pelo general Geisel. As informações eram que o MDB havia em suas fileiras
vários militantes do PC. Nesse momento houve uma mudança da atuação repressora que
depois exterminar os grupos de resistência armada passava a ser totalmente focada em
destruir de vez os comunistas.

A abertura deveria ser para todos, exceto para os que não afinassem ideologicamente
com a ideologia liberal conservadora a embasar o projeto de abertura proposto
(imposto) pelo regime. A exceção atingia em cheio os comunistas, sobretudo o PCB,
além de inimigos imperdoáveis de outrora, entre os quais se destacava Brizola.21

Bandera escreve que para a ditadura o PCB não poderia sobreviver ao processo
de abertura política, já que os principais quadros de oposição ideológica deveriam ser
eliminados do cenário político para garantir a meta de destruir a dinâmica política que
antecedesse o golpe. Dessa maneira, a “caçada” ao PCB intensificou-se entre 1974 e
1975, eliminando fisicamente os militantes do Partidão. Praticamente todo o Comitê
Central que estava em solo nacional foi assassinado de forma brutal, Nestor Vera que
era um quadro antigo do PCB e membro do CC estava na lista para desaparecimento.
De fato, em abril de 1975 Nestor Vera foi visto pela última vez em frente a farmácia,
em Belo Horizonte onde foi detido. Desde então, figurou como um dos desaparecidos
políticos até 2012, quando seu próprio assassino, o agente do DOPS Claúdio Guerra,
confessou ter assassinado Nestor logo depois de ser preso e torturado.

19
Processo crime pela Auditória da 4ª Circunscrição Judiciária militar, processo nº 18/76. – Projeto Brasil
Nunca mais.
20
FICO, Carlos. Além do golpe. Versões e controvérsias sobre 1964 e a ditadura. Rio de Janeiro:
Record, 2004. p. 216.
21
BANDERA, Vinicius. A ditadura caçao PCB: um recorte do período autoritário pós:64. Cadernos
CEDEM/Unesp. São Paulo, v. 3, 2003. p. 66.

16
Diferentemente da tradicional História Agrária, tendo por objetos de estudos
sobre a história da agricultura, suas técnicas e ciências, apropriação do solo, trabalho do
homem na terra e compreender os aspectos econômicos do mundo rural,22 o estudo
procura enfatizar a História Social do Campo. A História Agrária fez grandes
contribuições para compreender o setor agrícola e sua contribuição para o
abastecimento da população bem como a geração de capital, mas essa tendência
historiográfica acaba deixando de lado a experiência dos trabalhadores e trabalhadoras
do campo. Dessa forma, nossa proposta visa esclarecer alguns pontos da formação do
movimento camponês, analisando as vivências políticas e sociais que resistiram ao
processo “modernizador” e lutaram para não serem expulsos de seu mundo.

Benito Schmidt analisou que a partir dos anos de 1990 a historiografia brasileira
começou apresentar biografias de membros do operariado, os militantes de base
passaram a serem estudados in loco, as generalizações das estruturas não bastam para
explicar a classe social. Inspirados no trabalho de E.P. Thompson, “que mostrou a
importância das ações individuais no ‘fazer-se’ da classe, entendendo como um ‘(...)
processo ativo, que se deve tanto à ação humana como os condicionamentos’”23, a
historiografia sobre a classe trabalhadora começou a escrever sobre seus militantes.
Assim surgem memórias, biografias e estudos do pensamento desses lutadores.24

Há uma necessidade de continuarmos a fazer tais narrativas, mesmo com vários


trabalhos sobre os trabalhadores rurais ainda há muito a ser estudado e muito ainda na
escuridão do passado. Nosso propósito é realizar mais uma contribuição em análise de
uma trajetória política de um líder de origem camponesa, demonstrando como o
campesinato no século XX teve uma centralidade importante em debates intelectuais e
na política nacional.

Com o desenvolvimento do capitalismo agrário as histórias dos que produziam e


sobreviviam da terra foram obscurecidas pelo ideário do progresso e modernização do
agronegócio. Os ruralistas com seu poder econômico destacaram nomes para a História
como os modernizadores do campo, há exemplo José Luis Cutrale do Sucrocritico
22
LINHARES, Maria Yedda. História Agrária. In. FLAMARION, Ciro. VAINFAS, Ronaldo. Domínios
da História. Ensaios de Teoria e Metodologia. Rio de Janeiro: Elsevier, 1997. p. 165–184.
23
SCHMIDT, Benito Bisso. “A parte dos homens”: Biografia, autobiografia e História do movimento
operário. XXIV Encontro anual da ANPOCS. GT Biografia e Memória Social, seção: Militância e
trajetórias na política brasileira. Petrópolis, outubro de 2000. p. 37.
24
Cf. WELCH, Clifford A; GERALDO, Sebastião. Lutas camponesas no interior paulista – Memórias
de Irineu Luis de Moraes. São Paulo: Paz e Terra, 1992.

17
Cutrale Ltda ou Jorge Wolney Atalla, porém nas áreas que eles “criaram seus impérios”
por muitas vezes famílias residiam e foram expropriadas de suas terras.

A socióloga Maria Aparecida de Moraes Silva, em Errantes do Fim do Século,


estudou o processo de proletarização dos trabalhadores do campo na região de Ribeirão
Preto na passagem dos anos de 1960/1970 para os anos de 1980. Suas análises têm por
ponto de saída a expropriação de terras no Vale do Jequitinhonha, em Minas Gerais,
pela tomada violenta tanto física quanto econômica por grandes empresas. As pessoas
que perdiam essas terras acabaram por se tornar os “bóias-frias” das fazendas e usinas
de cana-de-açúcar da região.25

Considerando que nesse processo de êxodo rural iniciado no pós-guerra não foi
marcado apenas pela expropriação de terras dos camponeses, mas também pela
resistência de tais agentes históricos, dessa forma, nossa proposta contribuirá na
compreensão das lutas camponesas a partir da trajetória de um militante que esteve
diretamente ligado à formação, desenvolvimento e consolidação de diferentes
agrupamentos pelos direitos trabalhistas e pela posse das terras.

A socióloga Leila Stein de Menezes escreveu como a participação ativa dos


camponeses nos anos de 1950 foi intensa,

Nos anos 50 o campo foi palco de uma efervescência política, cujas características eram
inéditas na história do Brasil. Não que o campesinato nunca tivesse, antes e em
conjunturas especiais, rompido as relações de dominação (...). O que ocorreu é que, nos
anos 50 e início dos anos 60, esse processo de quebra nas relações de dominação e
dependência pessoal assumiu proporções significativas que os antagonismos de classe,
(...) explicitaram-se, resultando num intenso processo de luta de classes. 26

Estudar a militância de Vera é contribuir também para a história de um grupo de


pessoas importantes que participaram ativamente no cenário sócio-político brasileiro do
século XX, os comunistas tendo por organização o Partido Comunista Brasileiro. A
história política do PCB é marcada por variações em suas diretrizes e abordagens
teóricas/práticas sobre a realidade brasileira se programando para uma Revolução, as
variações políticas tiveram marcas profundas na maneira que se deu a organização de
camponeses e operários.27 Dessa forma, apresentamos a importância de compreender

25
SILVA, Maria Aparecida de Moraes. Errantes do fim do século. São Paulo: Editora Unesp, 1999.
26
STEIN, Leila Menezes. Trabalhismo, círculos operários e política - a formação do sindicato dos
trabalhadores agrícolas no Brasil (1954-1964). São Paulo: FAPESP/ Annablume, 2008. p. 27.
27
Cf. SEGATTO, ob. cit.; GORENDER, Jacob. O combate nas trevas. A esquerda brasileira nas
ilusões perdidas à luta armada. São Paulo: Ática, 1987. VINHAS, Moisés. O partidão. São Paulo: Ed.

18
melhor como era a relação dos comunistas brasileiros com o meio rural, haja visto que
mais da metade da população morava no campo até meados dos anos de 1960.28

A pesquisa tem por objetivo apresentar que a luta pela terra não aconteceu
apenas nos anos de 1960 e nem que começou nos anos 1980 com a fundação do MST .
O projeto proporciona a possibilidade de encontrar evidências históricas materiais para
disputar interpretações comuns de que atuação do PCB não é importante para entender a
História Social do Campo. O sociólogo José de Souza Martins, entre outros, elaborou o
argumento de que a ação do partido simplesmente atrasou o processo de organização
camponesa devido seu caráter de tutor do movimento. No entanto, Martins não leva em
consideração a historicidade da relação orgânica entre comunistas e camponeses,
demonstrada na vida de Nestor Vera. Ele, como outros, destaca as Ligas Camponesas
do Nordeste, organizadas a partir de 1956, como fonte do movimento camponês
autêntico no Brasil.29

A centralidade dada às Ligas de Francisco Julião é refutada pelo historiador


Clifford Welch,

as organizações mais responsáveis pelas conquistas do movimento fora, em primeiro


lugar, o PCB (até mudar de nome em 1960, Partido Comunista do Brasil) e a Igreja
Católica. Entre 1945 e 1947, o PCB já tinha estabelecido uma rede de centenas de Ligas
Camponesas em muitos estados do Brasil. De fato, como o próprio Julião escreveu em
1962, a organização dele ganhou o nome de Ligas Camponesas quando os latifundiários
do Estado de Pernambuco tentaram usar o termo para atacar o grupo dele como
comunista. Antes disso, o PCB já tinha organizado em 1954 e 1961 dois congressos
camponeses nacionais que mobilizaram mais delegados camponeses de todo o Brasil
que o MST de Stédile conseguiu mobilizar em seus encontros de fundação do MST em
1984 e 1985.30

Outro fator levantado por Martins e debatido por Welch,31 era a afirmação de
que apenas nos anos de 1950 as palavras “camponês” e “campesinato” apareceram no
cenário político, sendo assim demonstra que o campesinato se encontrava, até então,
fora do pacto político32. Segundo Welch, o termo “camponês” apareceu pela primeira

Hucitec, 1982. FALEIROS, Maria Isabel. Percursos e percalços do P.C.B no campo (1922-1964). Tese
de Doutorado, História. FFLCH-USP, São Paulo, 1989.
28
WELCH, Cliff, A História Social do Campo e os mundos do Trabalho. XX Encontro Regional de
História. ANPUH – Franca, São Paulo. 6 a 10 de setembro, 2010.
29
Cf. MARTINS, José de Souza. Os camponeses e a política no Brasil. Petrópolis: Vôzes, 1981;
AZEVEDO, Fernando Antonio. As ligas camponesas. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1982.
30
WELCH, A História Social do Campo, 2010(a).
31
WELCH, A História social do campo, 2010, p 9-11.
32
MARTINS, Os camponeses e a política, 1981, p. 25.

19
vez na esquerda utilizado pelos comunistas em 1927 com o Bloco Operário-Camponês
que entrou na disputa eleitoral daquele período.33

Por isso, nossa iniciativa aparece como uma contribuição ao debate da


importância da atuação dos comunistas na conquista dos direitos dos camponeses e
trabalhadores do campo, conforme Medeiros

Nos anos 50/60, a constituição de uma linguagem de classe identificando os


trabalhadores do campo no cenário político, dando-lhes visibilidade social, trazendo a
público um discurso sobre direitos e sobre a necessidade de reordenar seu lugar na
sociedade é ininteligível fora da ação do PCB, organização que, desde cedo, se propôs a
atuar como mediação nos conflitos agrários. 34

Por esse motivo, nossa pesquisa tem por princípio demonstrar que a luta dos
camponeses se desenvolveu ao longo da história brasileira com forte ênfase na
contribuição dos comunistas para sua constituição, traçando historicamente o desenrolar
das lutas no campo utilizando os escritos e ações de Nestor Vera, e ressaltando o
objetivo de fazer uma Revolução a partir de uma visão antilatifundiária e
antimonopolista, que viu o desenvolvimento do campo a partir do fortalecimento dos
pequenos produtores familiares e a formação de um proletariado rural sindicalizado
como passos importantes no estabelecimento do capitalismo agrário como passo
necessário para alcançar a Revolução brasileira socialista.

Uma das principais obras historiográficas referenciada em nossa metodologia é


A formação da Classe Operária inglesa de E.P. Thompson. A ideia do “fazer-se” é a
base fundamental para realização de nosso trabalho,“fazer-se, porque é um estudo sobre
um processo ativo, que se deve tanto à ação humana como aos condicionamentos. A
classe operária não surgiu tal como o sol numa hora determinada. Ela estava presente
ao seu próprio fazer-se.”35 Pretendemos fazer uma História que narra a construção do
movimento camponês brasileiro em seu “fazer-se”, para tanto fazemos um enfoque no
pensamento e trajetória do líder camponês Nestor Vera.

33
WELCH, A História social do campo, 2010, p.9. Vide KAREPOVS, Dainis. A classe operária vai ao
parlamento. O Bloco Operário e Camponês do Brasil (1924-1930). São Paulo: Alameda Editorial.
2006.
34
MEDEIROS, Leonilde S de. “Lavradores, trabalhadores agrícolas, camponeses”: os comunistas e
a constituição de classes no campo. Tese de Doutorado, Ciências Sociais. Campinas: Universidade
Estadual de Campinas, 1995. p. 13.
35
THOMPSON, Edward Palmer. A formação da classe operária inglesa. São Paulo: Paz e Terra, 2004.
p. 9.

20
Thompson trabalha com a ideia que a classe é formada pela atuação de seus
membros, o compartilhamento de costumes e ações sócio-políticas iguais. A ideia da
experiência é ponto central da teoria thompsiana, acreditando que o “ser social” é
formado pela experiência das pessoas, no caso os operários, que por consequência
determina a concretização da classe. Esse pensamento de Thompson é inovador dentro
do marxismo, pois parte da empiria e materialismo histórico diferente de outras
formulações marxistas que acreditam que a classe social é simplesmente criada pela
estrutura.36

Da mesma forma que Thompson resgatou os pequenos operários importantes


para a formação da classe operária, queremos resgatar o pensamento e atuação de um
camponês na formação da luta do campesinato brasileiro. A relação de estudar os de
baixo em seu processo de formação como classe é o centro do pensamento thompsiano,
fazendo um diálogo entre experiência e estrutura, criticando o mecanicismo que surgiu
dentro do marxismo deturpando-o. “Estou tentando resgatar o pobre tecelão de malhas,
o meeiro luddita, o tecelão do ‘obsoleto’ tear manual, o artesão ‘utópico’ e mesmo o
iludido seguidor de Joanna Southcott, dos imensos ares superiores da condescendência
da posteridade.” 37

A metodologia proposta para nossa dissertação é de estabelecer uma discussão


em torno do pensamento sobre o campesinato como agente revolucionário proposto por
Nestor Vera à luz de sua prática narrando sua trajetória. Propondo um diálogo entre o
micro e o macro, olhar para um microscópio para ver como o macro foi se formando, ou
seja, estudar o pensamento de Nestor Vera para analisar a formação da organização da
luta dos camponeses.

A pretensão metodológica que nos amparamos e propomos é de fazer o diálogo


de olhar para o micro preenchendo as “lacunas” do macro, percebendo as influências
que as estruturas implicam nos sujeitos. Como coloca Peter Burke, isso pode ajudar os
historiadores em sua difícil tarefa de revelar o relacionamento entre os acontecimentos e
as estruturas e apresentar pontos de vista múltiplos. Desenvolvimentos desse tipo, se

36
THOMPSON, A formação da classe operária, 2004.
37
THOMPSON, A formação da classe, 2004, p. 13.

21
continuarem, podem reivindicar ser vistos, não apenas como mero ‘renascimento’ da
narrativa, como denominou Stone, mas como uma forma de regeneração. 38

O que chamamos de micro não se encaixa no sentido metodológico da micro-


história italiana, com o famoso “Queijo e os vermes” de Carlo Ginzburg. Os
microcosmos que o autor italiano se fixa ao estudar o camponês Menocchio, não é
apenas um recorte que se encerra em si, porém sua intenção é de apresentar nuances do
macro que ocorrem no micro. O recorte metodológico de Ginzburg busca o que é fora
do “normal”, assim seu biografado não é representativo de um estrato social mais amplo
como escreve, “não podemos considerá-lo um camponês 'típico' (no sentido de 'médio',
'estatisticamente mais frequente') do seu tempo”39, é na singularidade a importância de
Menocchio, pois o singular tem seu limite e é assim que o historiador trabalha as
questões culturais.

Nossa metodologia toma uma forma de usar uma trajetória para analisar
diretamente as questões estruturais, ou seja, compreender as relações sociais que se dão
na formação da estrutura (capitalismo agrário) e as classes sociais (campesinato), Nestor
Vera é o ponto de intersecção representativo da forma de resistência camponesa. Nossa
documentação pode trazer o modo que os camponeses se organizaram autonomamente,
mas também – e principalmente – sob influência dos comunistas, dessa forma o
contexto que o líder camponês estava inserido interfere nas suas ações e pensamento.
Por esse motivo dividimos em três períodos para melhor compreender junto as fontes
como as mudanças e continuidades ocorreram.

A metodologia pode ser comparada com a usada por Clifford Welch, em “O


atentado: tentando encontrar a história nos relatos de um assassinato que não houve”,
que conta alguns momentos da vida do líder camponês Jofrê Corrêa Netto, mais
precisamente a tentativa de assassinato que sofreu em 1959.40 A partir de um minucioso
trabalho com as fontes de diversas origens, como reportagens, história oral, relatórios
policiais mostrando como cada qual havia uma representação do ocorrido, assim leva a

38
BURKE, Peter. A história dos acontecimentos e o renascimento da narrativa. In. .A
escrita da História: Novas perspectivas. São Paulo: Editora Unesp, 1992.
39
GINZBURG, Carlo. O queijo e os vermes. O cotidiano e as idéias de um moleiro perseguido pela
Inquisição. São Paulo: Companhia das Letras, 2006.
40
WELCH, Clifford Andrew. O atentado: tentando encontrar a história nos relatos de um assassinato que
não houve. Projeto História (PUC-SP). n. 35, dez, 2007.

22
diversas memórias de um fato, algo que infelizmente em nossa pesquisa não dispomos
dessa amplitude de fontes, mas é uma referência metodológica.

Welch propicia conhecermos algo além do atentado contra Jofrê, mas as relações
sociais no mundo rural, como era a repressão estatal e do latifundiário, assim como
indagar a memória criada sobre o estado de São Paulo de não haver conflitos rurais e ser
conhecido apenas pelo seu aspecto industrial. Esse trabalho, assim como outros,
também importância fundamental para a realização de nossa pesquisa, pois demonstra
como se desenvolveu a luta camponesa em São Paulo, e como as lideranças camponesas
iam se formando sob a orientação do PCB.

Jofrê Corrêa é uma liderança bem estudada pela historiografia, tanto pela
construção de sua figura como “camponês autêntico”, como explica Welch, o que é
questionado pelo historiador ao entrecruzar as fontes. Essa liderança “autêntica” nos
traz alguns indagamentos, por que Jofrê teve toda destaque pela mídia e posteriormente
pela historiografia, mas Nestor Vera que teve uma História semelhante não é
relembrado? São pouquíssimos os trabalho que trazem a importância de Nestor como
líder camponês, podemos citar Leôncio Martins Rodrigues que intitula a autenticidade
da liderança camponesa.41

Benito Bisso Schmidt é um dos principais pesquisadores sobre trajetórias e


biografias, a importância da biografia na História e suas contribuições, assim como os
debates em relação a esse modo de fazer histórico. Para compreensão da biografia
histórica o autor se ampara na ideia de regimes de historicidade, realizado por François
Hartog, no qual apresenta como a biografia fora escrita ao longo dos anos. Ao tratar das
novas biografias, Schmidt começa com uma provocação se há mesmo algo de novo nas
biografias ou será a mesma forma? Acredita na renovação, principalmente por serem
usadas a ideia de história-problema com interesse biográfico, é nesse sentido que
encaixamos nossa metodologia que parte de um problema que entender a formação da
luta camponesa no Brasil, mas para tal utilizamos a trajetória de um camponês.

Contra a crítica de que as biografias são algo elitistas, o autor apoiado em Le


Goff escreve a dificuldade de apresentar os de baixo antes do século XIV na Europa.

41
RODRIGUES, Leôncio Martins. O PCB: os dirigentes e a organização. In. FAUSTO, Boris. História
geral da civilização brasileira. Tomo III, v. 3. O Brasil republicano. Sociedade e política (1930-
1964). São Paulo: Difel, 1986.

23
Contesta essa afirmativa mostrando como a micro-história vêm modificando essa
perspectiva e como no Brasil historiadores vem escrevendo sobre operários e
movimento operário, escravos e ex-escravos, além de camponeses.

Nossa intenção é se posicionar contra essa ideia de que apenas os grandes


nomes devem ser biografados, a importância histórica de Nestor Vera auxilia
compreender o modo de vida de uma parcela que se empenhou na luta por direitos no
país. O alargamento do biografado aparece a questão da representatividade, com uma
resposta forte, Schimidt escreve: “O estranho é que tais questionamentos normalmente
só são feitos aos “pequenos personagens”, como se a atuação de um “grande homem”
justificasse por si só a realização de sua biografia (essa sim uma perspectiva
elitista!)”42

A partir dessa leitura podemos ver como a biografia histórica contribui para a
realização da história social, como uma maneira de resgatar a história de diversos
agentes sociais. Por anos a fio, a biografia é algo que desperta interesse do leitor, assim
o historiador pode não apenas escrever uma biografia centralizando na história de vida,
mas que possa compreender as dinâmicas sociais.

O primeiro capítulo consiste em apresentar a trajetória política de Nestor Vera,


além de fazer uma contextualização do desenvolvimento das contribuições dos
comunistas para o movimento dos trabalhadores no campo. Nesse momento iremos
fazer um diálogo entre o micro, vivências do militante, com o macro, o
desenvolvimento da luta camponesa no Brasil. Dessa forma, pretendemos fazer um
panorama de como os comunistas contribuíram para o processo de formação de um
movimento camponês. Nossa pretensão metodológica que nos amparamos e propomos é
de fazer o diálogo de olhar para o micro preenchendo as “lacunas” do macro,
percebendo as influências que as estruturas implicam nos sujeitos. Fazer uma narrativa
sobre a atuação política de Nestor Vera pode contribuir para a História Social brasileira
preenchendo “lacunas” principalmente no que tange o mundo rural.

No segundo capítulo iremos trabalhar exclusivamente com o pensamento de


Nestor, a pretensão é trabalhar com dois enfoques principais de seu pensamento, entre
1946 a 1967, que é a centralidade do campesinato para a Revolução e a política de

42
SCHMIDT, Benito. Biografia e regimes de historicidade. Métis: história e cultura, v. 2. n. 3, 2003. p.
67.

24
aliança entre camponeses e operários. Para isso iremos fazer um panorama geral de seus
escritos, com a função de apresentar como um comunista no século XX contribuiu
ativamente na construção de um movimento social, mas não apenas organizou como
também refletiu sobre como fazer. Queremos refletir sobre o movimento de práxis de
Nestor, por isso é necessário aprendermos como eram os debates dentro do próprio PCB
no qual militava e quais eram seus interlocutores que também possuíam suas próprias
teses em relação ao campesinato.

25
Capítulo 1

Nestor Vera, os comunistas e o movimento camponês

“A história (...) é composta de episódios e, se não podemos


adentrá-los, não podemos adentrar a história.” (E.P.
Thompson)

“Ser radical é tomar as coisas pela raiz. Mas, para o homem, a


raiz é o próprio homem.” (Karl Marx)

Nestor Vera nasceu em Ribeirão Preto (SP), em 19 de maio de 1915, filho de


Manoel Vera e Pilar Velásques. Segundo seu sobrinho Omene Vera, Nestor é o terceiro
filho de uma família de 10 pessoas.43 logo no início dos anos de 1930 a família foi para
a região da Alta Sorocabana trabalhar nas fazendas de café. Desde o começo de sua vida
a biografia de Nestor Vera esteve ligada a História do campesinato, sua mudança de
cidade podemos ligar com as migrações internas no Estado de São Paulo com o avanço
do capitalismo agrário para o oeste. 44

O oeste paulista era uma região fronteiriça de desenvolvimento agrário, na qual


latifundiários grilaram ao longo dos anos de 1930 e 1940 diversas propriedades.
Segundo o historiador Cliff Welch, o oeste paulista foi uma região bastante disputada
por camponeses e fazendeiros no período, haja visto que era um local pouco habitado
com terras devolutas em abundância, o que gerou interesses de várias pessoas,
principalmente com a política varguista de povoamento do oeste.45 Assim sendo, a
família de Nestor era uma dentre centenas que migram no Estado para conseguir
melhores condições de vida, isso que a produção cafeeira paulista demandava muita
força de trabalho. Mais típica ainda, sua família seguiu a expansão das estradas de ferro
para o oeste, se estabelecendo cerca de Santo Anastácio.

Por muito tempo, Santo Anastácio tinha sido um importante povoado no Pontal do
Paranapanema. Um ribeirão no lugar ganhou o nome do santo em maio de 1769 quando
uma tropa portuguesa morrendo de sede encontrou-o e a vila gradualmente fincou raízes

43
Entrevista concedida ao autor em São Gabriel d’Oeste (MS), em junho de 2013.
44
WELCH, Clifford. “Os com-terra e os sem-terra de São Paulo”. In: FERNANDES, Bernardo; MEDEIROS,
Leonilde Servolo de; PAULILO, Maria Ignez. Lutas camponesas contemporâneas: condições, dilemas, e
conquistas. Vol. 1. São Paulo: Editora Unesp, Brasília: Núcleo de Estudos Agrários e Desenvolvimento
Rural, 2009.
45
Idem.

26
ali. Em 1925, ela tornou-se a segunda municipalidade incorporada da região. À medida
que a estrada de ferro Sorocabana era construída até o rio Paraná, Santo Anastácio
tornou-se base da construção do trilho, levando espanhóis e italianos a mudar-se para a
região. 46

Juntando um certo dinheiro com seu trabalho Manoel Vera comprou um


pequeno sítio nos arredores da cidade de Santo Anastácio, o qual retirava o sustento da
família com a ajuda do trabalho da mulher e dos filhos. Nosso lutador social trabalhou
também no meio rural da região e segundo seu prontuário no Deops-SP como
ferroviário da Estrada de ferro Sorocabana47. Contudo, ele se destacou pela criatividade
e diversidade de suas atividades. Segundo seu sobrinho, Nestor gostava muito de
música, sendo que trabalhou algum tempo como professor desta arte e até na confecção
de instrumentos. 48

49
Temos indícios que Vera entrou para o Partido Comunista do Brasil (PCB)
em 1947, segundo uma carta não acabada feita pelo seu irmão José Vera que contava de
50
forma muito breve como foi à vida de Nestor. Infelizmente, ainda não conseguimos
documentos suficientes que possam corroborar com a informação de José Vera.

Nestor Vera foi eleito vereador pelo PTN na cidade de Santo Anastácio, em
1947. Não se candidatou com a sigla do PCB devido à cassação do registro eleitoral do
51
partido, para continuar mesmo que na ilegalidade os “candidatos de Prestes” , contra
essa atitude ocorreram manifestações em algumas regiões do país como são registradas
pelo jornal Novos Rumos, porém como não havia uma força direcionada para chamar

46
WELCH, Clifford Andrew. A semente foi plantada, as raízes paulistas do movimento sindical
camponês no Brasil, 1924-1964. São Paulo: Expressão Popular, 2010. p.210.
47
Prontuário. 82320 – Nestor Vera, DEOPS-SP. AESP.
48
Entrevista Omene Vera Martins.
49
Até o ano de 1961 o PCB chamava-se Partido Comunista do Brasil, mas por um determinação do
Tribunal Superior Eleitoral passou a ser intitular Partido Comunista Brasileiro para ser consideração um
partido internacional em solo nacional. Cf. SEGATTO, José Antonio. Reforma ou Revolução. As
vicissitudes políticas do PCB (1954-1964). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1995; GORENDER, Jacob.
O combate nas trevas. A esquerda brasileira nas ilusões perdidas à luta armada. 2 ed. São Paulo: Ática,
1987.
50
Documento disponibilizado por seu sobrinho Omene Vera Martins.
51
Alcunha dada aos candidatos do PCB nas eleições de 1947, tanto a repressão os intitulava assim como
pode ser visto no prontuários do DEOPS, como os próprios comunistas usavam essa expressão como é
apresentado em seu panfletos e jornais Novos Rumos, Voz Operária e Notícias Hoje (todos ligados ao
Partidão)

27
toda a massa em defesa do Partido, pois até mesmo Prestes pensava que a ilegalidade
não iria acontecer.52

A medida de colocar os comunistas na ilegalidade é posta pelo governo do


General Eurico Gaspar Dutra para barrar o prestigio e apoio massivo que o PCB
angariou no pós-1945. Welch descreve que no campo a principal organização que
buscava colocar os camponeses como força política era a dos comunistas,

Durante os anos de 1950, o PCB havia ajudado a dar forma a uma diversidade de
reivindicações e exigências dos lavradores e trabalhadores agrícolas. Como escreve
Medeiros, ‘é ininteligível fora da ação do PCB’ o conflito agrário da época. O partido
havia unido militantes de todo o país, e facilitado a criação de organizações
camponesas. Com suas ações e debates, o PCB havia ajudado a semente do movimento
camponês a nascer e a árvore a crescer, mais do que qualquer outra entidade no Brasil.
53

A primeira atuação que temos data da participação ativa como liderança


camponesa de Nestor Vera é a Liga Camponesa de Santo Anastácio (SP) organizada por
posseiros em luta junto aos comunistas, datada de 1946. A Liga Camponesa de Santo
Anastácio foi como instrumento de organização política do PCB organizada em um
contexto das primeiras eleições democráticas de amplo alcance. Cabe uma ressalva com
a informação de José Vera, sobre Nestor ter entrado para o Partido em 1947, pois
aqueles que fundaram a Liga já eram participantes de células do PCB na região.
Evidentemente, a liga foi organizada em sistema democrático e assim com mandato de
servir os interesses de seus sócios, camponeses pobres na sua grande maioria reflexo de
sua conjuntura. Segundo Welch,

A Liga Camponesa estabeleceu-se em Santo Anastácio em abril de 1946, em resposta


ao crescimento expressivo das reclamações de trabalhadores rurais do lugar. Com a liga,
o PCB pretendia agrupar todos os pobres e médios ‘trabalhadores da terra’, uma
diversidade de relações de trabalho, em uma categoria só. (...) Os participantes
‘elegeram democraticamente’ a comissão diretora da liga, tendo Nestor Veras na
presidência e outros 11 representantes e substitutos nomeados na oportunidade. 54

A luta dos arrendatários, meeiros, sitiantes e terceiros foi em busca de melhorias


nas suas condições de vida e trabalho, portanto as reivindicações eram sobre “a questão
do preço do arrendamento das terras, a manutenção da estrada, a criação de escolas e
clínicas médicas.” 55 O prontuário do DEOPS sobre Nestor Vera aponta uma entrevista

52
POMAR, Pedro Estevam da R. A democracia intolerante: Dutra, Adhemar e a repressão do Partido
Comunista (1946-1950). São Paulo: Arquivo do Estado, Imprensa Oficial do Estado, 2002.
53
WELCH, Ob. cit., 2010, p. 291.
54
WELCH, ob. cit., 2009, p. 144.
55
Idem.

28
sua no jornal Notícias de Hoje que a Liga de Santo Anastácio era uma organização
nova, porém “vinha ao encontro dos desejos de todos os trabalhadores do campo da
localidade em que reside; suas justas reivindicações em torno dos problemas mais
sentidos do nosso camponês fortaleciam sua estrutura, devendo ser este motivo
principal que levou a polícia e demais autoridades a determinar seu fechamento.” 56

O fechamento da Liga ocorreu antes de crescer abertamente as hostilidades do


mundo bi-polar provocadas pelos Estados Unidos da América no contexto do que viria a
ser conhecido como a Guerra Fria. No memento de formação desta liga e de centenas
mais nos diversos estados do Brasil, o PCB gozou de uma liberdade de atuação sem
precedentes em sua história de mais de duas décadas. Mesmo sem ser de sufrágio
universal as eleições de 1946, foram eleitos no país vários representantes do PCB que
participaram até na Assembleia Constituinte que preparou a Constituição de 1946. No
entanto, também foi eleito General Eurico Dutra, que se provou ser chefe de um
governo centralizador, equivalente a ditadura de Vargas. Sua preocupação com a
popularidade do PCB o provocou a cassar direitos dos trabalhadores e de ignorar
qualquer pretensão de ser uma democracia participativa. Como aponta Pedro Estevam
Pomar em sua obra A democracia intolerante.

Após eleger Dutra, as forças liberais sujeitaram o instituto d voto à interdição de


candidaturas e à cassação de mandatos, e truncaram as salvaguardas do “estado de
direito” pela ação de efetivos policiais e militares. O PCB, expressão organizada ou
braço político da classe trabalhadora urbana, viria a ser o alvo por excelência desse
regime semiditatorial, em razão da dupla natureza do partido: nacionalista e classista. 57

A luta em Santo Anastácio antecipou a repressão no contexto de avanço do


anticomunismo no Brasil. Naquela localidade na fronteira do avanço do capitalismo
agrário no Brasil, apoio massivo dos camponeses da região para a liga dos comunistas
logo atraiu agressão da oligarquia, dessa forma como apontado no jornal Voz Operária
2 anos após o fechamento da liga, camponeses de algumas cidades do interior como
Lutecia, Assis, Água do Tupi, Palmital, Presidente Bernardes e Rancharia fizeram um
abaixo assinado contra a perseguição e o pedido de comparecimento dos líderes da Liga
ao juizado de Santo Anastácio. 58

Como consta no Inquérito Policial dentro do prontuário do DEOPS sobre Nestor


Vera, a luta continuou e os trabalhadores tentaram se rearticular em 1949 sob o nome de
56
Prontuário 82320 – Nestor Vera, DEOPS-SP. AESP.
57
POMAR, democracia intolerante, p. 171.
58
“Milhares de camponeses protestam contra o processo.” Voz Operária, 12 de maio de 1951, p. 10.

29
União dos camponeses da Alta Sorocabana59, em uma reunião organizada pelos antigos
membros da liga, porém não concretizada pela invasão da força repressora do Estado na
forma da polícia local. O enfrentamento entre comunistas e camponeses de um lado do
outro a força pública e capangas/grileiros levou a morte de um camponês e um policial,
sendo dessa forma os líderes acusados de assassinato do policial.

Analisando os ocorridos contra a organização do campesinato encontramos uma


contradição no exaltado período democrático pós-Estado Novo, ocorria à organização
de partidos políticos para representação da sociedade civil ou mesmo sindicatos para os
trabalhadores urbanos são organizados, mas ocorria o impedimento da livre organização
no âmbito rural, principalmente realizado pelos fazendeiros com apoio do Estado.

Pomar destaca que as liberdades democráticas não eram bem livres, sendo o
movimento dos trabalhadores cerceado em vários momentos, a democracia ocorrida
estava sendo fundamentada ainda pelo controle de uma elite sobre as demais camadas
da sociedade.

O conteúdo profundamente antipopular e os estreitos limites da democracia liberal, na


economia e na política, mostraram-se de corpo inteiro no período Dutra. Nele, o
instituto democrático do voto coexistiu com um poder coercitivo desenfreado dos
aparelhos repressivos do Estado, só ‘regulado’ pela legislação outorgada pelo próprio
governo, como o Decreto-lei nº. 9.070, que Dutra editou em março de 1946 a pedido
da burguesia industrial, com a finalidade de proibir as greves e punir os trabalhadores
desobedientes. 60

Com os direitos do Partido Comunista cassados os comunistas voltaram suas


posições políticas mais a esquerda com o Manifesto de Janeiro de 1948 que havia uma
postura de enfrentamento com o governo de Dutra. Proclamava a organização armada
de luta contra o capitalismo, no campo isso refletiu na formação das lutas da ligas
camponesas, tendo como destaque de enfrentamento direto no norte do Paraná, caso de
Porecatu (1949-1951) e Trombas e Formoso, em Goiás, (1950 a 1964) outros levantes
também ocorreram por todo o país.

A duplicidade contida no Manifesto de Agosto, mas já apontada no janeiro de 48, se


expressa na atuação do Partido no campo neste período que encaminha desde
reclamações judiciais e tentativas de obtenção de cartas sindicais e criação de
associações de caráter civil até greves e manifestações de força (...). A “solução
revolucionária” está explícita na condução de dois importantes conflitos rurais que

59
Prontuário 82.320 - Nestor Vera. DEOPS-SP, AESP.
60
POMAR, ob. cit. p. 21.

30
envolvem outras categorias econômicas que não os assalariados, “a luta pelo arrendo”
a “guerrilha de Porecatu” no norte do Paraná. 61

Nestor foi um comunista destacado na defesa dos camponeses do interior


paulista. Ao ser incriminado na luta de Santo Anastácio, seu mandato como vereador foi
cassado, mesmo assim recebeu forte apoio de comunistas e camponeses de várias
regiões do Estado de São Paulo. Em uma reação as medidas autoritárias contra a
ilegalidade do PCB e a cassação dos mandatos, camponeses e sindicatos organizaram
um encontro paulista de apoio aos comunistas, chamado de II Congresso de Câmaras
Municipais reunidos em Ribeirão Preto, em 1949, sendo que na carta final do encontro
Nestor Vera foi um dos homenageados pelo seu fervor na luta pelo campesinato.

Cumprindo o nosso dever de Vereadores de Prestes, eleitos pelos trabalhadores das


cidades e do campo, nosso dever é estar à frente das lutas do nosso povo. Os exemplos
de Nestor Vera, de Valentina Loyola, de Ofélia Botelho, de Mário Longo, de
Christovam de Haro e outros vereadores de Prestes que têm estado à frente das lutas dos
trabalhadores, vivendo intimamente no seio das massas, são a afirmação de que jamais
deixaremos cair a bandeira desfraldada por Prestes.62

Sua luta continuou firme dentro do Partido, fortemente com a questão


camponesa, Vera participou ativamente dentro do jornal Terra Livre órgão jornalístico
do PCB direcionado para o campo. Esse jornal foi o principal meio de comunicação
para a organização dos camponeses, sendo porta-voz da ULTAB (União dos Lavradores
e Trabalhadores Agrícolas do Brasil) de 1954, mais a frente detalharemos a organização
dessa instituição.

O PCB traçou como objetivo a sindicalização dos trabalhadores do campo,


63
mesmo que a legislação trabalhista não previsse esse direito para a área rural. As
associações e ligas camponesas foram amplamente difundidas pelo partido em todo o
país, no Nordeste tivemos a brava atuação de Gregório Bezerra, Pedro Reneaux e outros
que fundaram as Ligas Camponesas – que posteriormente foram ligadas ao nome do
deputado Francisco Julião – que tiveram ampla difusão nacional na segunda metade dos
anos 1950 até 1964, na qual os comunistas nordestinos tiveram forte influência para sua
concretização. 64

61
FALEIROS, Maria Isabel. Percursos e percalços do P.C.B no campo (1922-1964). Tese de Doutorado,
História. FFLCH-USP, São Paulo, 1989. p. 50.
62
“Os vereadores de Prestes, do II Congresso de Câmaras municipais reunido em Ribeirão Preto, dirigem-
se ao povo.” In. POMAR, ob. cit., 2002, p. 207. Grifos nossos, ênfase do texto.
63
WELCH, A Semente,
64
Cf. OLIVEIRA, Ariovaldo Umbelino. Modo de produção capitalista, agricultura e reforma agrária. São
Paulo: FFLCH, 2007. Pp. 104-110.

31
Sobre a questão da sindicalização rural como principal meio de organização
camponesa, uma entrevista com Lyndolpho Silva, chefe do setor do campo do PCB no
período, é útil:

um testemunho ex-post: “Nossa posição sectária e esquerdista contribuía para os


ataques da reação. A nossa linha política naquele período nos levava a ver os sindicatos
rurais mais como um instrumento de agitação para a luta armada, dentro da tese errônea
da revolução a curto prazo. a preocupação principal, logo que surgia um sindicato, não
era conseguir o seu registro nem lutar pela sua consolidação e educação das massas de
assalariados, por suas reivindicações mínimas, imediatas ou parciais, de acordo com seu
nível de consciência. Ao contrário, era marchar para exigências muito elevadas, para
lutas violentas, armadas, inclusive, se fosse o caso, arrancar greve sem que a massa
estivesse preparada, etc., o que nos levava a cometer aventuras sem conta que só
causavam prejuízo. 65

A participação de Nestor Vera estava nesse sentido de formar ligas camponesas,


em um artigo no Terra Livre chama aos trabalhadores a luta intensivamente contra os
latifundiários em uma luta direta de enfrentamento, principalmente no momento da
66
colheita. Nestor tem em seu discurso na necessidade da atuação em conjunto para
conseguir seus direitos trabalhistas, forçar o patronato latifundiário a ceder os direitos
uma perspectiva que acaba entrando em contradição com a citação acima. Em contraste
67
com Vera, Silva afirmou anos depois dos fatos o interesse dos militantes no campo
não estava voltado para questões trabalhistas.

Em 1950, o PCB lançou o Manifesto de Agosto de 1950, denominado de Prestes


Aponta aos Brasileiros o caminho da libertação, reforçando a ideia de enfrentamento
direto contra o governo e o capital, conclamando uma frente de libertação nacional para
desenvolvimento de uma política nacional-democrática, com direcionamento de ir
contra o imperialismo e o latifúndio que mantinham o Brasil no atraso econômico. Para
o campo a linha diretiva era “pela entrega da terra a quem a trabalha” conclamando o
fim do latifúndio para o fim do sentido semi-colonial e semi-feudal do Brasil.

Nesse sentido o programa do Manifesto de 1950 previa,

confiscação das grandes propriedades latifundiárias com todos os bens móveis e


imóveis nelas existentes, sem indenização e imediata entrega gratuita da terra,
máquinas, ferramentas, animais, veículos etc., aos camponeses sem terra ou possuidores
de pouca terra e a todos os demais trabalhadores agrícolas que queiram se dedicar à
agricultura. Abolição de todas as formas semifeudais de exploração da terra, abolição da

65
COSTA, Flávio de Carvalho; SANTOS, Raimundo. Os camponeses e a política pré-64. Estudos Sociedade
e Agricultura, nº 8, abr., 1997. Rio de Janeiro: UFRRJ/CPDA.
66
VERA, Nestor. “Intensificar a luta na colheita.”
67
Destacado militante comunista no meio rural, o qual compartilhou com Nestor Vera vários anos de
parceria na luta na ULTAB e CONTAG, além de participarem juntos do Comitê Central do PCB.

32
‘meia’, da ‘terça’ etc., abolição do vale e obrigação de pagamento em dinheiro a todos
os trabalhadores. Imediata anulação de todas as dividas dos camponeses para com o
Estado, bancos, fazendeiros, comerciantes e usurários. 68

Essa guinada para a esquerda é exclusivamente no palavreado do PCB, mas de


fato a volta do populismo de Vargas com apoio da população na década de 1950 não
garantem total apoio a tática do partido. No campo sim encontramos o continuo
enfrentamento direto com o latifúndio, no entanto, a pauta necessariamente era em sua
maioria por questões mais econômicas e trabalhistas, a cerne da luta pela terra e pela
reforma agrária ainda estava começando a se firmar. 69

Como crítica as medidas do Partido com a continuidade de direcionamentos do


Manifesto de 1948 e de 1950, a historiadora Anita Leocádia Prestes analisa as posições
do PCB de uma maneira a demonstrar como a guinada para a esquerda estava na prática
de forma esquerdista e de “direita”,

A estratégia de direita permanecia com todas suas consequências desastrosas, dentre as


quais a mais importante consistia exatamente na incapacidade de formular uma
orientação tática que correspondesse à real correlação de forças sociais e políticas e
permitisse o avanço rumo a objetivos políticos corretos, que só poderiam ser
decorrência de uma justa análise das particularidades do capitalismo dependente que se
desenvolvia no Brasil.70

O que faz sentido e corrobora com Lyndolpho Silva ao tratar que o Partido
buscava uma saída para a Revolução e tinha como objetivo imediato a organização dos
trabalhadores para apoiar uma revolução democrático-burguesa em solo brasileiro, mas
no campo as questões imediatas trabalhistas eram o principal apelo dos camponeses.
Nos artigos que Nestor Vera escreveu no Terra Livre, Voz Operária e Novos Rumos
demonstra como o campesinato buscava sanar a opressão do latifúndio nas questões
trabalhistas, mesmo que Nestor tenha como principio apontar o quão é importante o
campesinato para a Revolução brasileira. 71

Ainda dentro da perspectiva do Manifesto de Agosto de 1950, o camponês


comunista teve uma participação importante na organização dos camponeses na luta da
Fazenda Gariroba em América de Campo, na região de São José do Rio Preto, a luta dos

68
CARONE, Egard (org.) O PCB (1943-1964). São Paulo: Ática, 1982. p. 104
69
COSTA e SANTOS, ob. cit.
70
PRESTES, Anita Leocádia. A que herança os comunistas devem esquecer. Revista Oitenta, s/n, nov.
1980.
71
VERA, Nestor. “Intensificar as lutas na época das colheitas”. Voz Operária, 20-05-1950 p.9;
“Experiências na luta na fazenda Gariroba”. Voz Operária, 15-07-1950, p. 9.

33
arrendatários teve a participação de cerca de 400 pessoas. Lutavam contra o aumento da
plantação de capim na região e a invasão de grileiros em suas terras, dessa forma, em
seu programa de reivindicações exigiam a baixa do arrendamento, não plantio de capim
e contra os despejos realizados pelo latifúndio da região contra os camponeses.

Segundo as memórias de Egard de Almeida Martins, em Clandestino: memórias


políticas de Edgard de Almeida Martins, Nestor Vera recebeu a tarefa do PCB de ir
para a fazenda Gariroba com a finalidade de organizar a luta do local, ou seja, foi um
militante destacado especialmente para intervir no conflito. De principio a
movimentação começou como uma iniciativa local dos atingidos que tendo apoio dos
comunistas da cidade, devido à proporção que o conflito começou a ter o Partido decide
intervir mais diretamente com um destacado militante.

A questão do plantio do capim na região de São José do Rio Preto começou a ser
frequente com o desenvolvimento da economia pecuária no Estado de São Paulo, sendo
que o capim seria o alimento para o gado deixando de lado outro tipo de plantação nas
72
terras. Mesmo o latifúndio sendo uma forma retrograda dentro do capitalismo
brasileiro, ele se adaptou e deu forma compatível para seu desenvolvimento no campo,
dessa forma, as contradições entre os interesses de classes antagônicas gerou
enfrentamentos como estamos apresentando. O interesse dos arrendatários da região era
poderem cultivar em suas terras um tipo de agricultura para sua subsistência, por outro
lado os latifundiários visavam lucros com a pecuária.

Segundo o sociólogo Paulo Cunha,

o processo de expansão capitalista característico do modelo de desenvolvimento


iniciado a partir da década de 50 trouxe à luz contradições de um cenário que, no
campo, apontava para uma situação de miséria face às condições de trabalhos existentes
e também à concentração fundiária que se constituía em um dos pilares inalterado do
sistema político brasileiro. 73

Vera levanta palavras de ordem contra o governo federal de Dutra e estadual de


Adhemar de Barros, esses governantes são chamados de aliados do imperialismo.74 Na

72
Ao longo dos anos de 1950 e 60 tiveram várias revoltas camponesas na região contra o plantio do
capim, uma que teve maior destaque foi a Guerra do Capim em Santa Fé do Sul, na qual os camponeses
lutaram contra o latifundiário Zico Diniz com a liderança de Jôfre Correa Neto. Cf. CHAIA, Vera Lúcia. Os
conflitos de arrendatários de Santa Fé do Sul – SP, 1959-1969. Dissertação de Mestrado. São Paulo:
FFLCH-USP, 1981; WELCH, ob. cit., 2010.
73
CUNHA, Paulo Ribeiro da. Redescobrindo a História: a República de Formoso e Trombas. Cadernos
AEL, n. 07, Campinas, 1997.
74
VERA, Nestor. “Experiências da fazenda gariroba”.

34
dinâmica da Guerra Fria, os comunistas há todo momento denunciavam o entreguismo
do governo brasileiro para o capital estrangeiro, sendo que a economia brasileira estava
toda voltada para as negociações com os Estados Unidos.

Cabe ressaltar nessa experiência de Nestor Vera na fazenda Gariroba, atuação do


Partido Comunista em duas diferentes dinâmicas, se por um lado entre 1950-1964 teve
toda uma preocupação em difundir a sindicalização rural levando a cabo seu projeto de
garantir os direitos trabalhistas dos camponeses, por outro lado como vai afirmar o
sociólogo Paulo Cunha teve toda uma luta paralela de enfrentamento direito ao capital e
ao latifúndio. Lutas como as ocorridas em Porecatu (1949-1951), norte do Paraná, Tupã
(SP) em 1949, Fernandópolis (SP) que teve as mulheres uma fundamental importância
para assegurar a luta insurrecional local, em 1949, Fazenda Gariroba em Américo de
Campos (1950), já apresentada entre outras ocorridas no âmbito rural entre 1950-1964
não são destacadas mais na memória dos comunistas deixadas de lado como momentos
de insurreição para a Revolução brasileira.

Paralelamente à sindicalização rural, clandestinamente estava em curso o projeto


estratégico da revolução via luta armada – ou seja, a implementação de áreas liberadas -,
proposta insurrecional que nunca deixou de estar no horizonte do Partido. Vários desses
esforços insurrecionais são quase que completamente ignorados pelos pesquisadores
acadêmicos e são muitos estudos de caso demandando pesquisas; sem falar que o
processo de intervenção armada no campo se desenvolvia com táticas bem curiosas. 75

Os comunistas assim tiveram forte influencia na consolidação das lutas dos


trabalhadores rurais no Brasil, o que gerou nos grupos anticomunistas grande
inquietação sendo a Igreja Católica outra proeminente força política que disputava a
liderança dos camponeses, principalmente no Nordeste. Temos também no Nordeste
brasileiro a fundação das Ligas camponesas, consolidada na segunda metade da década
de 1950, com um discurso inflamado de Francisco Julião de uma reforma agrária
radical, dessa forma, a igreja buscava junto de outros grupos a reforma agrária que não
levasse os camponeses a partilharem as ideias do PCB e das Ligas. 76

O cenário político dos anos de 1950 traz de volta Getúlio Vargas e seu
populismo, voltado também para as massas camponesas algo que havia sido deixado de
lado nos quinze anos de sua ditadura, um discurso que colocaria a questão camponesa
em pauta. Político sagaz Vargas vendo a forte organização que estava ocorrendo no

75
CUNHA, Paulo R. da. Aconteceu longe demais. São Paulo: Editora Unesp, 2007. p. 81.
76
WELCH, ob. cit., 2010. p. 296

35
campo, havendo uma resistência e um clamor pela reforma agrária e os direitos
trabalhistas começa a ceder direitos aos trabalhadores do campo.

Durante 1952, Vargas falou sobre a necessidade de melhorar a situação dos


trabalhadores rurais. Em janeiro, a CNPA – Comissão Nacional de Política Agrária,
criada em julho de 1951 pelo Decreto-Lei número 29.803 – começou a estudar e
compor soluções legislativas para os problemas da agricultura brasileira. Vargas
também ordenou que a Comissão Nacional da Previdência Social propusesse uma
legislação que incluísse os trabalhadores rurais no sistema de benefícios do seguro
social.

[...] Até o ano chave de 1953, Vargas limitou as ações de reforma agrária à manipulação
de impostos e tarifas, tirando os lucros das exportações de café com a taxa de câmbio. 77

O Ministro do Trabalho varguista João Goulart ao ser nomeado buscou


institucionalizar o discurso do presidente em relação aos direitos trabalhistas para o
campo, as considerações de Goulart geraram descontentamento nos fazendeiros
aumentando ainda mais a crise política que Vargas passava devido às concessões que
fazia a classe trabalhadora para manter seu populismo, além é claro da crise econômica
que o país sofria.78

Clifford Welch define que os camponeses vendo a formação dos sindicatos mais
a precariedade que as pessoas viviam os levaram a crer que na organização poderiam
mudar de vida,

o poder em potencial dos sindicatos, junto com condições de vida e de trabalho


decadentes, inspirou alguns camponeses a darem o salto do estágio de resignação quieta
e busca migratória infindável por um destino melhor à ação conjunta com seus
companheiros de trabalho. O próprio direito de formar um sindicato para levar adiante
interesses coletivos, ouvidos no rádio, discutidos por aqueles alfabetizados que podiam
ler os jornais e ocasionalmente debatidos por políticos parecia bom para Natal Siveiro...
79

No fundo Nestor Vera, no Cedem/Unesp, encontramos uma documentação que


demonstra como participava ativamente dentro do Terra Livre, além de contribuir com
análises sobre os acontecimentos do campo no jornais Voz Operária e Novos Rumos, ao
longo dos anos de 1950 e 1960 Nestor escreveu vários artigos da exploração dos
fazendeiros e da situação econômica no mundo rural, a exemplo os escritos no Voz
Operária “Intensificar as lutas na época das colheitas” de maio de 1950,
“Experiências na luta na fazenda Gariroba” de julho de 1950 ou no Novos Rumos
posteriormente “Terra para os trabalhadores das usinas” de 1959, muito mais tarde,

77
Idem, p. 216.
78
Ibdem, p. 222-225.
79
WELCH, ob. cit., 2010, p. 223.

36
“O papel dos camponeses na Revolução” (1960), apresentamos agora apenas alguns
escritos importantes da escrita de Vera.

Na segunda metade dos anos 1950, Nestor denunciava o capitalismo, o


latifúndio e todas as mazelas que o campesinato passava chamando a todos a se
organizarem. Suas palavras continuam com a perspectiva de luta contra o imperialismo
e o sistema semi-feudal oriundo, segundo seu pensamento, do latifúndio que
atravancava o desenvolvimento do país.

Essa maneira de pensar o Brasil era proveniente das teses do Partidão que tinha
por principio a ideia de Revolução por etapas, sendo que o país tinha primeiro que
passar pela etapa democrático-burguesa para desenvolver um capitalismo nacional que
pudesse elevar as contradições internas e posteriormente os trabalhadores poderem fazer
a Revolução Socialista.80

Para avançar sua influência sobre os camponeses os comunistas buscaram


organizar a Conferência Nacional dos Trabalhadores Agrícolas, sendo que Nestor Vera
como consta em seu prontuário deve forte atuação no interior paulista convocando os
camponeses para a realização do evento. O contexto da realização da primeira
conferência nacional foi à pressão da direita golpista contra Vargas e o próprio suicídio
do então presidente. Welch caracteriza a atuação dos comunistas utilizando o jornal
Terra Livre como um meio de aglutinar os camponeses para a reunião nacional,

o Terra Livre colocou os camponeses no centro da resistência, tão capazes como os


operários de entender a situação real, identificar os golpistas e oportunistas e apontar a
via revolucionária como único jeito de garantir um governo popular. Assim, no primeiro
momento, o partido aproveitou o suicídio de Vargas, sem tomar uma posição pró ou
contra Getúlio para avançar a mobilização em torno da CNTA. 81

O saldo da conferência não teve o sucesso que o Partido esperava, dos 700
delegados planejados apenas 303 compareceram e nem todos os estados estavam sendo
representados, como algo positivo foi o apoio e dedicação de trabalhadores e sindicatos
urbanos em parceria para a realização do encontro. Porém a mobilização não parou e
quase um ano depois em 1954, no dia 21 de setembro, na II Conferência Nacional dos
Trabalhadores Agrícolas e Camponeses, realizada no parque do Ibirapuera em São
Paulo, a União dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do Brasil foi fundada,
primeira instituição de representação das massas camponeses com amplitude nacional.
80
VINHAS, Moisés. O Partidão: A luta por um partido de massas, 1922-1974. São Paulo: Hucitec, 1982.
81
WELCH, ob. cit., p. 246.

37
A primeira direção da ULTAB era composta principalmente por membros
comunistas, Geraldo Tibúrcio como Presidente, tendo José Alves Portela como
secretário geral, Lyndolpho Silva foi primeiro secretário, Sebastião Dinart primeiro
tesoureiro. O sociólogo Paulo Ribeiro da Cunha, em 1991 fez uma entrevista com o
líder da ULTAB Lyndolpho Silva que explicou um pouco de como se deu a formação
da direção da entidade,

é critério do Partido, naturalmente, critério natural, quer dizer, de colocar na frente da


Ultab, na frente do trabalho da Ultab... pessoas na direção, aqueles companheiros que
tiveram um certo destaque, mas não só destaque, vamos dizer assim publicamente, mas
desenvolveram algum trabalho com alguma eficiência em algum lugar onde atuavam.
Então, pra você ver o seguinte: quem constituiu a executiva da Ultab, propriamente dito,
que veio para cá, foi o Tibúrcio, eu e o José Portela... Tibúrcio lá de Góias, que
participou da campanha... da luta... que, se não me falha a memória, foi a luta de
Formoso... veio o Portela que era arrendatário aqui na Alta Sorocabana, companheiro de
toda época de colheita e venda de algodão, tinha luta séria ali na região... alguém da luta
de luta de posseiros, nas quais ele participou... e eu, que na verdade estava começando
um trabalho na organização dos trabalhadores do campo, na área, sobretudo de
posseiros, no estado Rio de Janeiro. Então, esses não é a toa, entendeu? Que foram esses
os companheiros que integraram aqui a direção executiva... do trabalho do dia-a-dia. Da
Ultab.82

Nestor Vera participaria também da direção da ULTAB nas gestões dos anos de
1960 até a fundação da CONTAG em 1963. Sua participação estava em apoiar a
constituição de sindicatos rurais pressionando o governo para a realização da reforma
agrária e pela concessão dos direitos trabalhistas que a CLT de 1943 já previa para os
trabalhadores urbanos. Paulo Cunha escreve que as posições da entidade tinha um
programa de atuação baseado nas diretrizes do Partidão, baseados principalmente nas
diretrizes que estavam sendo tomadas no IV Congresso do PCB que ocorreu no mesmo
ano de fundação da ULTAB, mas que tinha como seguimento o pensamento das
posições de anos anteriores.

O professor Cliff Welch explica claramente como foram organizadas as


diretrizes da II CNTA que fundou a primeira entidade camponesa de âmbito nacional

Em pelo menos cinco aspectos, a conferência e sua carta final refletiam a doutrina do
PCB. Um era a ênfase colocada na unificação entre os trabalhadores urbanos e rurais.
Para o comunismo, isso era tão antigo quanto a foice e o martelo; para o PCB, tinha
antecedentes no BOC do final da década de 1920. A natureza feudal do sistema de
produção agrário do Brasil era um segundo tema comum do PCB, e imposto à
conferência por eles. Seguindo essa suposição, vinham outras duas posturas do PCB:
uma crítica aos ‘imperialistas’ e ‘latifundiários’ gananciosos que controlavam muito
mais terra do que precisavam e a exigência do fim de ‘todas as formas de exploração

82
CUNHA, ob. cit., 2007, p. 80.

38
semifeudal como a parceria’, com esta terra sendo distribuída “àqueles que trabalham
nela” 83

Nesse momento de 1954 da fundação da ULTAB, o PCB teve a realização de


seu IV Congresso Nacional no qual teve por finalidade reafirmar posições que já
estavam tomando, a duplicidade é marca do Partidão, se por um lado em seus
documentos eles pregão a insurreição por outro lado em sua atuação eram mais
reformistas. As diretrizes do PCB em seu IV Congresso tinham por programa explicar
que a Revolução e a luta eram contra o imperialismo no país eliminando sua base
econômica e social fundamentada no latifúndio.

O Programa do Partido reflete esta realidade e levanta a necessidade do confisco da


terra dos latifundiários e seu entrega gratuita aos camponeses em terra ou possuidores
de pouca terra e a todos que nelas queiram trabalhar, assim como a abolição de todas as
formas semifeudais de exploração. 84

Em relação ao IV Congresso, Nestor Vera teve grande admiração e apoiou as


atitudes do Partido em relação ao campo, “o projeto do Programa do PCB faz
caracterização real e clara da situação de miséria, de empobrecimento e de opressão
85
que se encontram as grandes massas camponesas em nosso país.” Em um artigo
publicado no jornal Voz Operária, No programa do PCB está a salvação dos
camponeses, Nestor enalteceu o programa de 1954 do PCB como referencia importante
para a luta do campesinato. Faz uma analise sobre como esta a situação do latifúndio no
Brasil, levando em consideração o progresso do capitalismo no campo que gerou uma
maior concentração de terras em mãos da burguesia rural.

Devemos ressaltar que seu artigo foi publicado 9 meses, o que significa que ser
publicado na Voz Operaria, que era órgão central do PCB, possui uma perspectiva
aceita pelo comitê Central. Ataca o discurso varguista de reforma agrária afirmando que
este por fazer parte da elite que comanda o Brasil tendo apoio dos latifundiários nunca
iria atuar pró campesinato principalmente por sua condição de classe burguesa. Em
suas palavras, “o projeto de Programa do PCB é a bússola das forças do progresso.
Com este documento trilharão pelo caminho certo e mais rápido. Destruirão as cadeias
do atraso e liquidarão o atual regime caduco, fazendo florescer nova vida em nosso

83
WELCH, ob. cit., 2010, p. 250.
84
IV Congresso do PCB (dezembro de 1954 a fevereiro de 1955). In. CARONE, Edgard. O PCB (1943-
1964). Vol.2. São Paulo: Difel, 1982. p. 81.
85
VERA, Nestor. “No programa do PCB está a salvação dos camponeses.” Voz Operária. 20-03-1954. p.
9.

39
86
país.” Sua passagem declara como era a intenção do Partido em continuar com uma
luta de libertação nacional para o desenvolvimento de uma etapa da revolução
democrático-burguesa. 87

A ULTAB, dentro das diretrizes do IV Congresso do Partido houve um gradual


aumento em referencia a questão da reforma agrária. Demonstra-se que para Nestor
Vera a reforma agrária deveria ser uma entrega imediata das terras de latifúndios para os
trabalhadores sem-terra ou pequenos camponeses, como é visto em um de seus artigos
no jornal Voz Operária dialogando com outros comunistas que acreditavam que os
camponeses possuíam um movimento atrasado e com isso não poderiam ser aliados no
momento revolucionário. Nestor queria demonstrar a necessidade da aliança entre
camponeses e operários para a conquista da reforma agrária e o fim do latifúndio que
atravancava, em sua visão, o desenvolvimento econômico brasileiro.

Lutamos no campo por uma reforma agrária que liquide com o monopólio da terra, pela
confiscação da terra dos latifundiários e sua distribuição aos camponeses sem terra ou
com pouca terra e a todas as pessoas que nela queiram trabalhar, e a entrega de títulos
legais de suas propriedades. 88

Leonilde de Medeiros faz uma leitura que da reforma agrária proposta pelo PC a
partir dos direcionamentos feitos no IV Congresso, e nos Congressos camponeses de
1953 e 1954,

a partir dessas duas conferências, a reforma agrária passou a ganhar progressiva


centralidade como elemento articulador das diferentes lutas que se travaram no campo,
ao mesmo tempo em que se procurava fazer, mais intensamente, a socialização dos
significados de que ela era portadora. Ela também começou a aparecer mais
organicamente articulada com as linhas políticas gerais do PCB, principalmente a partir
do IV Congresso do partido, que ocorreu em 1954. 89

Como mostra o jornal Terra Livre de setembro de 1960, Nestor começou a


participar da liderança da ULTAB nas gestões de 1960-1961, e nas posteriores até o
golpe de 64, mesmo participando da CONTAG. O camponês comunista foi 1º secretário
da entidade, sendo um articulador de base estando em diversas localidades do Estado de
São Paulo, Paraná e Minas Gerais. Nesse período de sua vida, já contava com prestigio
dentro do PCB, como demonstra documentos das reuniões dentro do Comitê Estadual

86
Idem.
87
VINHAS, ob. cit.
88
VERA, Nestor. O Programa do PCB e a reforma agrária. Voz Operária, 25 de maio de 1957, p.8.
89
MEDEIROS, Leonilde S de. Lavradores, trabalhadores agrícolas, camponeses: os comunistas e a
constituição de classes no campo. Tese de Doutorado, Ciências Sociais. Campinas: Universidade
Estadual de Campinas, 1995. p. 105.

40
de São Paulo, que atualmente estão organizados no arquivo do CEDEM/UNESP
coleção ASMOB.

Com a realização do XX Congresso do PCUS, em 1956, com a denúncia de


Kruschev ao culto a personalidade de Stálin e seus crimes, houve todo um abalo nas
estruturas dos partidos comunistas em todo o mundo. No Brasil, dentro do PC já estava
ocorrendo a alguns anos disputas internas e questionamentos pelo mandonismo que foi
característica herdada da entrada dos tenentes da década de 1930. Dessa forma, em
março de 1958 o Partidão lança um novo documento fazendo autocrítica de suas
posições, a “Declaração de Março de 1958” clamava o Partido a tomar posições de
massa.

A historiadora Anita Leocádia Prestes faz uma veemente critica a essa ideia que
o PCB adotaria o caráter de massas,

não seria correto afirmar que com a “Declaração de Março”, o “PCB iniciou sua longa
caminhada em direção a ampla política de massas”, pois, em primeiro lugar, se estaria
negando todo o passado de lutas do PCB, negando páginas da sua história, como a
formação de uma ampla frente única em 1935 – a Aliança Nacional Libertadora – e, em
segundo lugar, seria exagerar os êxitos reais que o Partido obteve no período pós-58,
esquecendo a grave derrota de 1964 – testemunho de que sua ligação com as massas era
na verdade débil. Debilidade esta que provinha de anos de erros acumulados, de uma
visão estratégica da revolução falsa e de direita, de orientações táticas imediatistas e
desligadas de uma visão política geral. 90

Com a perspectiva de aumento dos sindicatos para a formalização da política de


massas, fazer com que o Partido pudesse adentrar na política ampla das massas
camponesas. Um dos principais articulador da tese de formação de sindicatos rurais foi
Alberto Passos Guimarães, que segundo Raimundo Santos, “publicista que não só
oferece fundamento à reorientação do PCB anunciada na Declaração de Março de
1958, como propicia referência à nova tática pecebista de “criar sindicatos para
mobilizar as massas camponesas”. 91

A Declaração não avança no sentido da análise da sociedade brasileira,


insistindo ainda no caráter semi-feudal das relações sociais no campo e na necessidade
de desenvolver o capitalismo nacional, algo que nos anos 1980 Luiz Carlos Prestes em
92
“Carta aos Comunistas” vai mostrar como o Partido estava errado na leitura da semi-

90
PRESTES, ob. cit., p. 217
91
SANTOS, Raimundo. Política e Agrarismo no Brasil. Estudos Sociedade e Agricultura, vol. 17, n. 1, abr.
2009. p. 122
92
PRESTES, Luiz Carlos. Carta aos comunistas. s/l. s/d.

41
feudalidade do país, mesmo sendo um capitalismo tardio já se encontrava muito bem
consolidado no Brasil.

Os camponeses constituem a massa mais numerosa da Nação e representam uma força


cuja mobilização é indispensável ao desenvolvimento conseqüente das lutas do povo
brasileiro. O movimento camponês se encontra, entretanto, bastante atrasado, sendo
baixíssimo o seu nível de organização. Para impulsionar o movimento camponês é
preciso partir do seu nível atual, tomando por base as reivindicações mais imediatas e
viáveis (...). Também no campo, a atuação através de formas legais de luta e de
organização é aquela que permite alcançar êxitos para as massas. Assim é que tem
progredido, além das associações rurais e cooperativas, a organização dos assalariados e
semi-assalariados em sindicatos, que já obtiveram vitórias em contendas com
fazendeiros. 93

Esse posicionamento tomado dentro do Partido não está levando em


consideração as vitórias na conquista de terras em Porecatu, Trombas e Formoso ou
mesmo nas questões organizativas frente aos camponeses nas lutas com as Ligas
camponesas até mesmo com a ULTAB, conciliando com outras organizações o PCB
teve uma efetiva vitória no campo fazendo com que no cenário político e social
brasileiro o campesinato fosse visto como agente social atuante.

Em um depoimento Nego Carreiro, camponês da luta de Trombas e Formoso,


deu para a Janaína Amado, mostra a importância das lutas camponesas para quem se
rebelou contra a opressão que sofriam, nas palavras de Nego até então não era visto
como pessoa, sendo a participação no movimento que lhe trouxe o sentimento de ver
visto de outra forma.

- ‘Alimpou’, assim como?


- Alimpou, mostrou pr’aquele povo ruim de lá que eu não era o que eles achava que eu
era. Eu penso que eu respondi a eles. Mostrei que eu era alguém. Eu mostrei que era
uma pessoa. 94

Foi com a participação dos comunistas que o camponês pobre passou a ser visto
como gente!

O Manifesto de Março de 1958 proporcionou uma crise interna dentro do PCB,


sendo que militantes surgiram criticas de diversas correntes, aqueles que afirmavam a
perda do internacionalismo proletário e o marxismo-leninismo por parte do Partido,
como aqueles que questionavam a falta de democracia interna. Dessa disputa interna
logo seriam os rachas, um grupo que contava com João Amazonas Maurício Grabois

93
“Declaração sobre a política do Partido Comunista Brasileiro”. In. SANTOS, Raimundo. Agraristas
políticos brasileiros. Brasília: Fundação Astrojildo Pereira, 2007. p. 188-189.
94
AMADO, Janaína. Eu quero ser pessoa. Revolta camponesa e política no Brasil. (Mímeog), s/d. p. 50.

42
entre outros formariam em 1962 o PCdoB (Partido Comunista do Brasil), outros na
época da ditadura queria seguir a luta foquista inspirados na Revolução Cubana de
1959, como foi à ala de Marighella que partiram para a luta armada.95

Devido às divergências ocorridas dentro do PCB, a I Conferência da ULTAB


que seria em 1956 só pode ser realizada em 1959, como analisa Maria Izabel Faleiros, o
resultado dessa conferência foi de ratificar as posições do Partido no Manifesto de
Março, assim a leitura sobre o país centrava

é na ótica do desenvolvimento nacional, particularmente do desenvolvimento industrial,


que a necessidade da intervenção na questão agrária é colocada. Na medida em que as
funções de fornecimento de alimentos e matérias primas bem como a de constituição de
um mercado interno não estariam sendo cumpridas se impunha a reconstrução da
agricultura em novas bases, democratizando a estrutura fundiária e ‘transformando em
proprietários de uma gleba os milhões de camponeses sem terra. 96

A I Conferência teve como encaminhamento fazer uma II conferência, mas


passou a ser o I Congresso Nacional dos Lavradores e Trabalhadores Agrícolas do
Brasil, realizada em Belo Horizonte no ano de 1961. Nesse Congresso estavam
presentes representadas diversas forças do meio rural como as Ligas Camponesas do
nordeste, o MASTER (Movimento dos Agricultores Sem-Terra) do Rio Grande do Sul
tendo a liderança de Leonel Brizola, movimentos estudantis e grupos da Igreja Católica.
Pela primeira vez um presidente esteve presente em um congresso camponês, então
presidente João Goulart, o primeiro-ministro Tancredo Neves e o governador de Minas
Gerais Magalhães Pinto.

O Congresso foi marcado pela disputa dos comunistas - hegemônicos na


ULTAB e movimento camponês - e as Ligas Camponesas que contavam na mesa com o
deputado Francisco Julião. As Ligas tinham como deve o emblema “reforma agrária na
lei ou na marra”, com uma entrega imediata e avanço das lutas pela reforma agrária
radical sem levar em consideração as questões trabalhistas, na outra ponta da disputa
estavam os comunistas que afirmavam a necessidade da reforma agrária ampla e radical,
mas sem deixar de lado os pequenos ganhos trabalhistas.

No seu último discurso, o qual era o encerramento do Congresso o líder


comunista camponês, afirmou:

95
Cf: SALES, Jean Rodrigues. As esquerdas brasileiras e a revolução cubana. São Paulo: Editora Perseu
Abramo, 2007; Daniel Aarão reis. A revolução faltou ao encontro: os comunistas no Brasil. São Paulo:
Brasiliense, 1991.
96
FALEIROS, ob. cit., p. 225.

43
A reforma agrária pela qual lutamos neste Congresso e prosseguiremos lutando nas
regiões onde vivemos e trabalhamos, tem por objetivos essenciais a completa
erradicação do monopólio da propriedade e do uso da terra, exercido pelos latifundiários
e o acesso mais fácil e imediato possível pelos que verdadeiramente desejam e
necessitam trabalhá-la, tornando-a altamente produtiva e rendosa.
(...)
Por isso mesmo julgamos necessário lutar em desfalecimento pela conquista de todas as
medidas parciais, por menores que sejam, no sentido não só de através delas irmos
abrindo caminho para a conquista da reforma agrária completa e radical que almejamos,
como também, para ir melhorando as terríveis condições de vida e de trabalho a que
estão submetidas presentemente as grandes massas trabalhadoras. 97

Após o Congresso de Belo Horizonte, Nestor que fazia parte da Direção


Executiva do PCB em São Paulo, trabalha junto a ULTAB na consolidação de
sindicatos rurais por todo o estado paulista, além de participar de eventos em Minas
Gerais como consta um relatório que o DEOPS produziu ao manter a vigilância sobre
suas atividades.98 O Terra Livre apresenta matérias da fundação de associações rurais e
sindicatos que tiveram a presença de Nestor no mínimo na cerimônia de abertura em
Garça99, Pontal100 e Palmital.101 Muitos destas formações tiveram a meta de estabelecer
a representatividade de um delegado comunista no congresso.
Ao mesmo tempo que o campesinato brasileiro avança em suas perspectivas
organizativas o Brasil passa por polarização de projetos políticos, após a renúncia do
presidente Jânio Quadros em 1961 é tentado um golpe de Estado para não assumir o
vice-presidente João Goulart, tido como esquerdista pelos opositores Goulart só
consegue assumir a cadeira presidencial depois de uma intensa luta travada na
Campanha da Legalidade impulsionada pelo então governador do Rio Grande do Sul
Leonel Brizola. 102
Assumiu após um acordo com os golpistas que exigiam o parlamentarismo
ficando com o posto de primeiro-ministro o Sr. Tancredo Neves, algo que depois de um

97
Discurso de Nestor Vera retirado de “Nestor Vera: “Mobilizar, esclarecer e organizar as massas
camponesas”. Terra Livre, ano XII nº 105 novembro de 1961.
98
Documento: “Informações prestadas pelo agente nº 1896, de 20/11/1963”. Fundo DEOPS, Pasta 099.
Arquivo Público Mineiro.
99
“Fundação da Associação dos Trabalhadores Rurais de Garça.” Terra Livre. Ano XI - Nº96, Nov. 1960.
p. 2.
100
“Criada a Associação dos Trabalhadores em Usinas de Açúcar”. Terra Livre. Ano XII - Nº100, jun.
1961. p. 4.
101
“Tomou posse a Diretoria da Associação dos Trabalhadores Agrícolas de Palmital.” Terra Livre. Ano
XII - Nº 107, jan. 1962. p. 6
102
Cf. BANDEIRA, Moniz. O governo de João Goulart, as lutas sociais no Brasil 1961-1964. Rio de
Janeiro: Civilização Brasileira, 1983.; TAVARES, Flávio. 1961 – O golpe derrotado. Porto Alegre: LP & M,
2012.

44
plebiscito em 1963 foi a baixo, o governo Goulart começava a ter prestigio popular.103
O então presidente Jango já tinha sido Ministro do Trabalho de Vargas, no qual tomava
posições progressistas para a classe trabalhadora, tanto que aumentou quase o dobro do
salário mínimo que levou uma forte reação dos patrões pedindo a destituição do cargo.
O Brasil passava por uma crise econômica e política grave, mesmo que Goulart
estivesse contando com o apoio de parcela da sociedade ainda havia os oposicionistas e
o governo estadunidense tramando um golpe para derrubá-lo. O governo de Jango
tomava medidas nacionalistas como a autonomia em sua política externa, contra a
intervenção dos EUA contra Cuba defendida por San Tiago Dantas em reunião da OEA,
além de defender as atitudes de nacionalização e desapropriação de empresas
estrangeiras concessionárias, como fez Leonel Brizola com a Companhia Telefônica
Nacional subsidiaria da ITT (International Telephone & Telegraph) e subsidiaria
American & Foreign Power (Bond & Share). 104
Com suas reformas de base para modernização do país Goulart respondia os
camponeses os seus anseios de fazer a Reforma Agrária no país, além da reforma
tributária e política, havia todo um pacote de reformas para que o país desenvolvesse
uma autonomia econômica e progressista. No 1º de maio de 1962, o presidente Goulart
faz um discurso que pela primeira vez um mandatário conclama uma reforma agrária
radical, “pela primeira vez, Goulart comprometia seu governo publicamente com a
implementação de uma reforma agrária radical, inclusive a revisão da Constituição,
para eliminar o requerimento de pagamento em dinheiro pela terra desapropriada.” 105

O ano de 1963 é marco da disputa pelo avanço das reformas de base, tendo o
PCB e a ala nacionalista revolucionária106 encampando apoio ao governo para que
avançasse em suas propostas. Porém, do outro lado da mesa o golpistas já preparavam a
destituição de Goulart e um não apoio no Congresso Nacional as suas medidas, o
governo de Kennedy investiu forte orçamento via ISEB e IBAD contra Jango. 107

Enquanto isso o governo aprova o Estatuto do Trabalhador Rural (ETR) que lhe
concede o direito a sindicalização rural, contra a exploração abusiva, salário mínimo,
fixação na terra e descanso semanal, etc.
103
FERREIRA, Jorge. A democracia no Brasil (1945-1964). São Paulo: Editora Atual, 2006.
104
BANDEIRA, ob. cit., p. 44-53.
105
WELCH, ob. cit, 2010, p. 332.
106
Assim eram chamados os grupos de nacionalistas ligados ao ideário de esquerda, a exemplo Leonel
Brizola e o governador do Ceará Miguel Arraes.
107
BANDEIRA, ob. cit.

45
Em fevereiro, a nova maioria populista na Câmara dos Deputados aprovou o Estatuto do
Trabalhador Rural – ETR e, em 2 de março, João Goulart assinou a lei. Quando a lei
entrou em vigor, no dia 18 de junho, o ETR simbolizava o coroamento de mais de duas
décadas de debate entre as elites, disputas legislativas, e manifestações dos camponeses,
em defesa da formalização dos direitos camponeses. Fruto de muitos ramos, o estatuto
de base continuou em vigor até o fim do século, dando forma às vidas dos trabalhadores
rurais e fazendo com que o Brasil fosse o país com o maior movimento sindical de
trabalhadores rurais do Ocidente. 108

O ETR foi um ganho para os trabalhadores rurais, no entanto, ainda não garantia
a posse da terra e nem a sua fixação na mesma, além de ser dúbia em alguns aspectos,
principalmente com relação ao tipo de trabalhador que se tem no campo. Caio Prado Jr.,
historiador e comunista, escreveu em artigo da Revista Brasiliense que o ETR era de
suma importância, “se efetivamente aplicada com o devido rigor, promoverá por certo
109
uma das maiores transformações econômicas e sociais já presenciadas neste país.”
Porém, o próprio Caio Prado retrata que o ETR é de cunho mais universal, relegando as
especificidades locais o que levaria os fazendeiros a burlar a lei em seu proveito contra
o direito dos trabalhadores.

As relações de trabalho no campo variam consideravelmente no tempo e no espaço, em


contraste com o que se dá na indústria e no comércio. E tal variabilidade precisa
naturalmente ser levada em conta pela lei, o que absolutamente não reflete, e em que
portanto não se prevêem de maneira adequada as inúmeras situações que se apresentam
e podem eventualmente apresentar-se. Sob esse aspecto, o Estatuto promulgado
evidencia a imaturidade do assunto e a falta de um estudo e uma discussão atentos dele.
110

Apesar de suas limitações o ETR abriu espaço para a constituição da CONTAG


(Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura), instituição de caráter
nacional que seguia a legalidade da luta que o estatuto lhes proporcionava. A CONTAG
era constituída por centenas de sindicatos rurais e milhares de camponeses de todo o
país, sendo que quase todos os Estados foram representados na sua fundação, ocorrida
em janeiro de 1964 na sede do Sindicato dos Bancários da Guanabara.

A manchete do Terra Livre de janeiro de 1964 era “CONTAG: Poderoso


instrumento de luta nas mãos dos trabalhadores do campo”111, na foto da principal mesa
estava composta pelas forças que lhe deu vida, Lyndolpho Silva e Nestor Vera da
ULTAB, Padre Lage representando a ala progressista da Igreja Católica, além da Ação
Popular, grupo de esquerda que derivado da Igreja Católica. Após acordo entre AP e
108
WELCH, ob. cit., 2010, p. 360.
109
PRADO JR, Caio Prado. O Estatuto do Trabalhador Rural. In. . A questão agrária no Brasil.
São Paulo: Editora Brasiliense, 1979. p. 143.
110
Idem, p. 144.
111
Terra Livre, jan. 1964, Ano XIV – nº 130, p. 1.

46
comunistas, com apoio já advindo da ULTAB o PCB consegue ganhar a direção da
CONTAG tendo postos estratégicos, Lyndolpho Silva como presidente e Nestor Vera 1º
tesoureiro.112

“A maioria dos camponeses representados, então, fizeram parte do campesinato


que o partido buscou mobilizar para enfrentar o latifúndio. Para Silva, a Contag
nasceu gigantesca, representando ‘cerca de oitocentos sindicatos e aproximadamente 1
milhão de associados’.” 113 Com grande porte a CONTAG vai ser instrumento de apoio
ao governo Goulart que passou em 1964 avançar com seu discurso das reformas de
base, levando a cabo a proposta de reforma agrária radical, no famigerado Comício da
Central do Brasil em 13 de março de 1964, Jango radicaliza seu discurso clamando por
reforma agrária, legalização do Partido Comunista e o voto dos analfabetos.

Ao seu lado estava Lyndolpho Silva, presidente da CONTAG, e Luís Tenório de


Lima, também líder camponês do PCB, o presidente do Brasil clamava por “Reforma
agrária, como consagrado na Constituição, com o pagamento prévio e a dinheiro, é
negócio agrário, que interessa apenas ao latifundiário, radicalmente oposto aos
interesses do povo brasileiro. (...) Sem reforma constitucional, trabalhadores, não há
reforma agrária autêntica.” 114

No mesmo mês Nestor Vera, em Governador Valadares (MG), representando a


CONTAG esteve inserido em um conflito onde os camponeses reivindicavam terras da
Fazenda do Ministério. Em seu discurso aos trabalhadores rurais, Nestor reivindicava a
reforma agrária radical, assim como estava exposto no congresso de fundação da
CONTAG.

Eles querem terra imediatamente. Tem que ser já, porque a maioria deles está
desempregada e a época do plantio já esta chegando ao fim. Por isso os companheiros
de Governador Valadares já não podem esperar nem se conformar com palavras bonitas
do governo nem dos políticos influentes. Se o governo demorar na entrega das terras da
Fazenda do Ministério, eles terrão mesmo que ocupar, de qualquer maneira. Já numa
assembléia que realizamos na sede do Sindicato, com mais de 200 camponeses
dirigentes, ficou decidido que entrariam nos últimos entendimentos com a SUPRA, a
fim de resolverem a situação, não sendo muito o tempo que podem esperar. 115

112
WELCH, ob. cit. 2010, p. 389. ; “CONTAG: Poderoso instrumento de luta nas mãos dos trabalhadores
do campo”. Terra Livre, jan. 1964, Ano XIV – nº 130, p. 1.; Ficha de Nestor Veras no DEOPS/MG, pasta
057, Fundo DEOPS, Arquivo Público Mineiro.
113
Welch ob. cit., 2010, p. 389.
114
Fragmento de discurso de João Goulart retirado de WELCH, ob. cit. 2010, p. 401.
115
CONTAG e movimento operário exigem: Entrega imediata de terra aos camponeses. Terra Livre. Mar.
1964, Ano XIV – nº 132, p. 2.

47
Mesmo nessa perspectiva de enfrentamento que Nestor estava angariando em
Governador Valadares, o PCB traçava um discurso radical e contraditório com o
governo de Goulart, deixando para ele como critica Paulo Cunha, os caminhos para a
transformação do Brasil, sem fazer uma leitura séria da realidade que gera uma
complexa influência nos seus militantes, portanto em suas direções práticas

Um aspecto relevante é o fato de o PCB atuar em uma linha política contraditória de


conciliação e ao mesmo tempo de excessiva e conflituosa prudência, procurando
viabilizar sua legalização e estando o conjunto do partido receptivo a essa promessa.
Alguns críticos e estudiosos apontam para o fato de que ao se colocar taticamente nessa
linha de ação, o PCB não procurou fazer uso de seu potencial de mobilização,
especialmente, por parte do Comitê Central, e entregou a condução do processo de
reformas e até revolucionário a João Goulart, não percebendo que era um presidente
burguês esvaziado de apoio de setores significativos de sua própria classe. 116

Enquanto, PCB e João Goulart contavam com o apoio dos trabalhadores para as
reformas de base, uma rede conspiratória tomava o país. Militares, empresários,
latifundiários, deputados da oposição e o governo dos Estados Unidos concretizavam
uma parceria para findar os anos democráticos no Brasil, um duro golpe é dado no
presidente Jango, que para camponeses e trabalhadores urbanos foi mais forte por
interromper seus avanços políticos na construção da democracia brasileira. Os anos de
chumbo, da intensificação da opressão e da perseguição surgem no 1º de abril de 1964
pelas mãos de civis e militares na derrubada de João Goulart.

Com a armada estadunidense se posicionando no litoral brasileiro em direção a


Santos com todo um aparato militar de contenção de massas, o general Olimpio Mourão
do III Exército saiu com suas tropas de Juiz de Fora (MG) em direção ao Rio de Janeiro,
não houve reação por parte de João Goulart, nem das Ligas, nem dos trabalhadores
organizados na CGT, UNE ou mesmo PCB, sem muita resistência os golpistas tomam o
país.

Não se tratava apenas de um movimento estritamente militar, mas sim de uma ampla
coalizão civil-militar com apoio de forças estrangeiras, conforme confidenciou ao
político Waldir Pires, no exílio, de acordo com o que apuramos no livro de Dênis de
Moraes. Nesse momento, ele não tinha alternativas. Segundo sua avaliação, a resistência
jogaria o país em uma guerra civil de consequências imprevisíveis. Leonel Brizola,
caindo na clandestinidade, ainda teve esperanças de organizar a resistência. 117

Logo na primeira semana do golpe de 64 as liberdades democráticas são


cassadas se tem uma lista de pessoas a serem caçadas, encabeçada por Luiz Carlos
Prestes, líder maior dos comunistas brasileiros, Leonel Brizola, Miguel Arraes,
116
Cunha, aconteceu, p. 109.
117
FERREIRA, ob. cit. p. 121.

48
Lydolpho Silva, Carlos Marighella, Nestor Vera, Zuleika Alemberck, entre outros
comunistas e progressistas. Com isso começava os exílios políticos, a perseguição mais
intensa desde o segundo dia do golpe com militares ateando fogo na sede da UNE e
espancando estudantes. O comunista camponês do Nordeste Gregório Bezerra preso no
dia seguinte ao golpe e arrastado pelas ruas de Recife, um senhor de 64 anos arrastado e
espancado por militares. A ditadura fria e cruel desde o começo. 118

Os comunistas que não foram exilados tiveram foram postos em clandestinidade,


esse é o caso de Nestor Vera, constando na primeira lista do AI-1 que cassava os
119
direitos civis e convocado a comparecer na Auditória da Segunda Região militar.
Nestor foi perseguido e intimado a comparecer diversas vezes para prestar
esclarecimentos no II e III Exército, dessa forma teve de se esconder, segundo seu
sobrinho Omene Vera Martins, ele fica algum tempo no exterior entrando e saindo do
país.

No ano de 1965, é expedido o mandado de prisão de Nestor Vera120 a partir daí


intensifica sua perseguição, no entanto, a repressão no consegue de fato saber por onde
andava Nestor e sobre sua família, algo que até para nós esta sendo difícil de saber
como foram os primeiros anos dele na clandestinidade dentro da ditadura. Considerado
um perigoso agitador social. Nesse mesmo ano o PCB consegue fazer sua primeira
reunião do Comitê Central depois do golpe para tirar as diretrizes de atuação.

Moisés Vinhas, então membro do CC do PCB, explica como foi à leitura


programática do Partido perante a ditadura,

Os comunistas passam então a estimular a movimentação e organização das forças


oposicionistas em todo o país. Adotam um programa-mínimo de resistência ao processo
de fascistização, centrando-o na luta pelas liberdades democráticas, contra o arrocho
salarial e contra a desnacionalização da economia brasileira. Reivindicam anistia,
restabelecimento do habeas-corpus e realização de eleições limpas e honestas.
Consideram que somente acumulando forças, mobilizando massas e construindo uma
ampla frente democrática é possível derrotar o regime. 121

O que não agrada uma parte dos comunistas, principalmente aqueles ligados a
Carlos Marighella que inspirados na Revolução Cubana procuram uma resistência
armada. Marighella teve forte influência em parte dos comunistas do PCB, formasse
118
Cf. CARNEIRO, Ana; CICOCCARI, Marta. Retrato da repressão política no campo Brasil 1962-1985.
Camponeses torturados, mortos e desaparecidos. Brasília: MDA, 2011..
119
Cópia de Mandado de Intimação. Pasta 065. Fundo DEOPS – Arquivo Público Mineiro.
120
Dossiê sobre Nestor Vera, 2ª Auditória da 2ª Região militar – consta no Projeto Brasil Nunca Mais.
121
VINHAS, ob. cit. 237-238.

49
assim a ala Marighella na qual o Partido começa a barrar seu avanço como força
política.

Marighella é afastado da Comissão Executiva do PCB, mas pelo auxilio de


outros comunistas consegue manter-se na Direção Estadual de São Paulo. Interessante a
informação de Moisés Vinhas quanto à reunião que leva Marighella para o Comitê
Estadual, contando com o apoio de Joaquim Câmara Ferreira, Nestor Vera e Lyndolpho
Silva, Antonio Chamorro. Isso, pois, Nestor mantinha um direcionamento de
enfrentamento direto com o capital e o Estado, algo que o PCB não tinha por diretriz e
que o próprio Nestor Vera não iria aplicar como veremos mais a frente.

Depois de um total alinhamento com Cuba, Marighella vai para um congresso da


OLAS (Organização Latinoamericana de Solidariedade), na ilha caribenha
revolucionária. Ao voltar ao Brasil é expulso do PC por desobediência, pois não tinha
autorização para participar do congresso. O PCB, inspirado na via pacifica da URSS
para chegada ao socialismo, preferiu então derrubar os militares com resistência por
dentro, tanto que começaria a infiltrar militantes no grupo de oposição consentida o
Movimento Democrático Brasileiro (MDB) formado em 1966 quando instalou-se o
bipartidarismo no país. 122

O duro golpe de 1964, como descreve Cliff Welch, decepou a árvore da


organização camponesa que já estava dando frutos, “todos os funcionários da Contag
foram julgados subversivos, e 23 das 33 federações estaduais foram julgadas
123
‘fantasmas’ e apagadas do registro do Ministério do Trabalho.” Em pouco tempo
houve a total desmantelação do movimento camponês que ressurgiria com total força
apenas nos anos de 1980. A vitoriosa experiência em Trombas e Formoso foi destruída
a base de invasões dos militares que levou a tortura e morte de antigos militantes da
região, como é o caso do líder José Porfírio de Souza (Zé Porfírio) que foi morte e
desaparecido, consta que foram torturados: Geraldo Tibúrcio, Nélson Pereira, José
Ribeiro entre outros. 124

Em 1967, com o pseudônimo de Jacinto Xavier, Nestor participou como


membro da delegação brasileira na V Conferência Mundial dos Sindicatos dos

122
MOTTA, Rodrigo Patto de Sá. O MDB e as esquerdas. In.: FERREIRA, Jorge; REIS, Daniel Aarão.
Revolução e Democracia (Esquerdas no Brasil). São Paulo: Civilização Brasileira, 2007.
123
WELCH, ob. cit., 2010, p. 412.
124
CARNEIRO; CICOCCARI, ob. cit., p. 236-250.

50
Trabalhadores da Agricultura, das Florestas e das Plantações, na Alemanha Oriental,
encontro organizado e financiado pela URSS. Em seu discurso Nestor explicou o
desenvolvimento do movimento camponês no pós-guerra, desde a formação das ligas
camponesas até a CONTAG, para ele foi fundamental a participação do PCB nas
conquistas nesse campo. Denúncia o complô contra o governo de Jango e posterior
golpe de Estado, também o desfacelamento do movimento por parte da repressão
militar, denuncia as torturas, mortes e perseguições além de chamar os trabalhadores do
campo para ressurgir contra o governo pelas liberdades democráticas.

O VI Congresso do Partido Comunista Brasileiro, ocorreu também em 1967, o


qual segundo consta a informação de Moisés Vinhas125 e no dossiê feito pela repressão,
Nestor Vera passa a ser membro do Comitê Central, além dele outros que tinham
posições de entender o camponês como principal agente revolucionário para a
Revolução brasileira vão para o CC, como Lyndolpho Silva, Elson Costa, Heros
Trench. Mesmo assim, a posição das teses do Partido é reafirmada, fazer a oposição
legal como forma de resistência, a luta armada escolhida por Marighella na ALN
(Aliança Libertadora Nacional) é condenada como esquerdismo.

O MDB se ajustava bem à estratégia estabelecida pelo PCB para enfrentar o regime
militar. Na sua avaliação, era necessário construir uma frente democrática para tornar
possível a derrota da ditadura, envolvendo todos os setores da oposição. Assim, o MDB
foi encarado como o espaço privilegiado para o estabelecimento da almejada frente
democrática. O PCB manteve sua estrutura clandestina em funcionamento, mas orientou
a maior parte de seus militantes para a atividade legal dentro do MDB, partido a que
deveriam filiar-se e ajudar a construir. 126

É nessa perspectiva de tentar fazer a frente democrática que Vera passou a atuar,
destacado pelo Partido para o Estado de Minas Gerais. Passou a estar diretamente ligado
a juventude angariando votos para o MDB, segundo José Francisco Néres, Nestor
estava muito empenhado para conseguir uma ampla votação no Estado para o candidato
a deputado estadual do MDB, porém infelizmente não tivemos acesso ao nome do
candidato. 127

No processo crime que sofreu Néres e outros estudantes no qual Nestor


organizava entre 1972 e 1975, demonstra como incentivou eles a “uma ação mais

125
VINHAS, ob. cit.
126
MOTTA, ob. cit. p. 291.
127
Processo CENIMAR - 18.097. Pasta 097. Fundo DEOPS – Arquivo Público Mineiro.

51
128
efetiva, tal como pixamentos, panfletagem etc.” Nessa passagem encontramos uma
perspectiva de alcançar uma maior divulgação da oposição para chegar até as massas,
pois pichações e panfletagem podem tem um grande alcance na região que é realizada.

As eleições de 1974 proporcionam uma significativa vitória para o MDB, pois


foram eleitos 16 senadores para o movimento democrático em oposição 6 da Arena,
129
(partido da ditadura), 160 deputados contra os 204 da situação. Esse avanço gerou
um total descontentamento da ditadura que já alinhava sua “abertura lenta, gradual e
segura” proposta pelo general Geisel, as informações que o MDB havia em suas fileiras
vários militantes do PC fez com que depois de exterminar os grupos de resistência
armada à repressão passou a ser totalmente focada em destruir de vez os comunistas.

A abertura deveria ser para todos, exceto para os que não afinassem ideologicamente
com a ideologia liberal conservadora a embasar o projeto de abertura proposto
(imposto) pelo regime. A exceção atingia em cheio os comunistas, sobretudo o PCB,
além de inimigos imperdoáveis de outrora, entre os quais se destacava Brizola. 130

Bandera descreve que no processo de abertura política o PCB não poderia passar, os
principais quadros de oposição ideológica deveriam ser eliminados do cenário político. Dessa
maneira, a “caça as bruxas” ao PCB intensificou-se entre 1974 e 1975, a Operação Radar é
direcionada a eliminar fisicamente os militantes do Partidão. Praticamente quase todo o Comitê
Central foi assassinado de forma brutal, Nestor Vera que era um quadro do Partido e membro do
CC estava na lista para desaparecer.

Foi com a operação Radar iniciada em 1975 que parte do Comitê Central foi presa. E o
caso do Hiram de Lima Pereira, interrogado em Itapévis, e de Luiz Inácio Maranhão
Filho, preso em São Paulo morreu com a injeção para matar cavalo. João Massena Melo
é outro. Também está no rio e morreu com a injeção para matar cavalo. Orlando Bonfim
Júnior, da cúpula do PCB, está no rio de Avaré. Outro que está no rio é Elson Costa,
assassinado em 1975. Ele era encarregado da seção de agitação e propaganda do
partido. Na casa de Itapevi, foi interrogado durante vinte dias e submetido a todo o tipo
de tortura e barbaridade. Seu corpo foi queimado. Banharam-no com álcool e tocaram
fogo depois. Elson ainda recebeu injeção para matar cavalo. O corpo de Itair José
Veloso também foi jogado na ponte (...) Jaime Amorim de Miranda, também foi preso
na Operação Radar foi morto. O último corpo que sei ter sido jogado da ponte é o de
José Montenegro de Lima. (EXPEDITO, 1992) 131

128
Processo crime pela Auditória da 4ª Circunscrição Judiciária militar, processo nº 18/76. – Projeto
Brasil Nunca mais.
129
FICO, Carlos. Além do golpe. Versões e controvérsias sobre 1964 e a ditadura. Rio de Janeiro:
Record, 2004. p. 216.
130
BANDERA. Vinicius. A ditadura caça o PCB: um recorte do período autoritário pós-64. s/l, s/d. p. 66
131
Sargento Marival Dias Chaves do Couto apud VIEIRA, Jacy Guilherme. O confronto de duas
tendências dentro da hierarquia militar e a última reserva de caça da repressão: o Partido Comunista
Brasileiro – PCB. s/l, s/d. p. 42.

52
Enquanto, atuava na organização da oposição democrática em Belo Horizonte
Nestor após uma reunião, em 1975, foi preso em frente a uma farmácia, José Francisco
Néres é a única testemunha de sua prisão. Segundo atual inquérito sobre seu
desaparecimento realizado pelo Ministério Público Federal, Nestor Vera foi preso na
cooperação de duas operações militares, a Operação Radar de caráter nacional e
Operação Orquestra, realizada no Estado de Minas Gerais. Segundo Nilmário Miranda,
em seu depoimento para a Comissão da Verdade de Minas Gerais, Nestor foi levado
para a seção da polícia civil do departamento de Furtos e Roubos, nos cárceres da
repressão passou pelas piores torturas físicas, ressaltamos que o camponês comunista
contava com 60 anos de idade quando passou pelas barbaridades do Estado brasileiro.

O ex-delegado de policia o Sr. Cláudio Guerra, em suas memórias publicadas


pelo nome de “Memórias de uma guerra suja”, de 2012, assume a autoria de mais de
100 assassinatos em nome da ditadura civil-militar brasileira, dentre os quais consta o
líder camponês Nestor Vera. No relato de Guerra, descreveu que encontrou Nestor em
um estado deplorável de saúde com fraturas expostas e quase inconsciente, seu trabalho
era por fim de vez na vida do comunista, de uma maneira sádica e cruel explica que deu
132
um “tiro de misericórdia” para “ajudar” Nestor que agonizava. Seu corpo enterrado
em um latifúndio de um apoiador do regime de lesa humanidade brasileiro, depositado
em pedaço de terra que lutou a vida toda para ser dividido, terra que sonhou ser o local
que sairia o fruto da construção de uma nova sociedade.

Nestor Vera é um entre 1.196 camponeses mortos pela ditadura civil-militar133,


alguém que dedicou a vida pelo socialismo, dedicou seus sonhos a reforma agrária
radical e o reconhecimento político-social do campesinato brasileiro. Atualmente
seguem as mesmas lutas iniciadas por Nestor, a semente que plantou está perpetuada na
terra o ideal de transformação social radical permanece nos embates cotidianos de
milhares de camponeses brasileiros e latinoamericanos.

132
GUERRA, Claudio. Depoimento. MEIDEIROS, Rogério; NETTO, Marcelo. Memórias de uma guerra
suja. Rio de Janeiro: TopBooks, 2012. p. 305.
133
Relatório da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos da Secretária de Direitos Humanos,
2012.

53
Capítulo 2:

O camponês comunista entre o pensar para agir

“A arma mais poderosa do trabalhador é sua organização e


unidade. (...) É fácil aos fazendeiros manter como escravos e
explorar a seu bel prazer os trabalhadores divididos.
Organizados, a coisa muda.”” (Nestor Vera)

A tradição marxista, tanto teórica quanto organizativa, possui a característica de


interpretação de sua realidade para intervenção. Karl Marx na 11ª Teses sobre
Feuerbach na celebre frase “Os filósofos apenas interpretam o mundo de diferentes
maneiras; o que importa é transformá-lo” 134 inicia uma nova prática filosófica, saindo
da contemplação idealista para práxis o que proporciona uma virada na concepção
filosófica e política daqueles que buscam a transformação de sua realidade.

Segundo o filosofo híspano-mexicano Adolfo Sánches Vázquez, que estuda a


formação da práxis na filosofia moderna e contemporânea de Hegel à Lênin, conclui o
que seria esse movimento dialético marxista,

Com Marx, o problema da práxis como atividade humana transformadora da natureza e


da sociedade passa para o primeiro plano. A filosofia se torna consciência, fundamento
teórico e seu instrumento.
A relação teoria e práxis é para Marx teórica e prática; prática, na medida que a teoria,
como guia da ação, molda a atividade do homem, particularmente a atividade
revolucionária; teórica, na medida em que esta relação é consciente. 135

Partindo dessa perspectiva o movimento comunista brasileiro, quanto o


internacional, buscou interpretar sua realidade concreta para fazer a sua Revolução.
Dessa forma desde sua fundação em 1922, o PCB tentou interpretar a realidade
brasileira muito influenciado pelas teses da III Internacional comunista e URSS136, ao
longo de suas lutas até seu fim na década de 1990.
A partir de uma reflexão histórica tentaremos traçar a contribuição teórica
referente ao movimento camponês de Nestor Vera, comunista atuante até seu
assassinato na ditadura civil-militar brasileira, em 1975, influenciado pelo pensamento
134
MARX, Karl. Teses sobre Feuerbach. In. ; ENGELS, Friedrich. A ideologia Alemã. São Paulo:
Boitempo, 2007. p. 535.
135
VÁZQUEZ, Adolfo Sánchez. A filosofia da práxis. Buenos Aires: CLACSO, São Paulo: Expressão
Popular, 2011. p. 111
136
KONDER, Leandro. A derrota da dialética. São Paulo: Expressão Popular, 2009.

54
marxista de práxis. Encontramos nele um diferencial dentro do PCB por ser um
militante da direção oriundo do campesinato, um processo dialético, prático/teórico, da
organização. Mas principalmente por afirmar a centralidade do camponês para a
Revolução algo não corrente dentro do PCB.

Seguindo a máxima criada por Lênin “sem teoria revolucionária não há


movimento revolucionário”, Nestor Vera procurou ao longo de sua vida participar
ativamente na organização dos camponeses contribuindo também com uma análise
reflexiva de sua ação para encontrar os melhores caminhos que os comunistas deveriam
atuar perante o mundo rural.

Nestor Vera contribui constantemente na literatura comunista nos jornais do


PCB Novos Rumos, Voz Operária e Terra Livre, além de artigos na década de 1960 na
Revista Brasiliense, fundada pelo historiador Caio Prado Jr. O dirigente camponês
apresenta um claro entendimento da literatura marxista evidente em seus escritos com
referencias principais a Marx e Lênin, mas podemos encontrar ponderações sobre Mao
Tsé-Tung e o dirigente da III Internacional Josef Dimitrof.

A luta interna de Nestor Vera no Partido Comunista do Brasil (PCB) era de


mostrar o quanto a importância do campesinato como aliado para as etapas da
Revolução Brasileira. Alguém que esteve ativamente ligado na formação de ligas
camponesas no interior paulista havia uma concepção que a “questão central da
137
revolução” era o campesinato, aliado principal do proletariado da luta contra o
imperialismo e o latifúndio.

Suas primeiras intervenções teóricas podemos afirmar que são mais panfletárias
do que com um embasamento acadêmico e marxista mais aprimorado, atenta apenas por
chamar aos camponeses a se organizarem em lutas imediatas contra os fazendeiros.
Conclama aos trabalhadores do campo a aproveitarem as colheitas para pressionar o
latifundiário, pois é nesse momento que possuem uma força política mais forte por
conta da necessidade de colher a produção antes que estrague. 138

Essas abordagens entram em um escopo inicial que os comunistas tiveram no


campo, conclamavam um enfrentamento direto com o latifúndio e o governo

137
VERA, Nestor. “O papel dos camponeses na revolução”. Novos Rumos, 3 a 6 de junho de 1960, p. 3
138
VERA , Nestor. “Intensificar as lutas na época das colheitas”. Voz Operária, 20-05-1950 p.9

55
principalmente entre 1948 e 1954 direcionados pela “Declaração de janeiro de 1948” e
o “Manifesto de Agosto de 1950”. Com as diretrizes dos manifestos chamavam os
trabalhadores urbanos e rurais a travarem uma luta direta contra o governo de Dutra e
posteriormente Getúlio Vargas tratando-os como traidores da nação, e para findar o
latifúndio que era o principal aliado do imperialismo.

Compartilhando da perspectiva do Partidão, Nestor Vera expressou maior ênfase


na batalha direta contra o latifúndio, sendo as Ligas camponesas e o associativismo rural
as maneiras que essa classe social deveria organizar-se. A concepção de Vera encaixa-
se na critica que Raimundo Santos e Flavio Costa realizam a política camponesa do
PCB nos anos de 1950 chamando de uma vertente agrarista de atuação, segundo os
autores o Partido não tinha uma visão clara da realidade e uma duplicidade em suas
ações, em seus documentos pregavam o enfrentamento direto, mas na prática ficavam
lutando por direitos trabalhistas e a legalidade dos sindicatos rurais. 139

O agrarismo no PCB consistiu na transposição de uma identidade camponesa


para formulação de lutas oriundas de um pensamento a partir da Revolução Russa,
consistindo em uma ideia leninista de aliança operário camponesa para tomada do
poder. No PCB a primeira versão desse pensamento é o BOC (Bloco Operário-
Camponês) de 1927, mas com a clandestinidade do Partido Comunista não durou muito
tempo, além da falta de amadurecimento político sobre uma leitura apropriada sobre a
realidade brasileira.

A partir da segunda metade dos anos 50, Nestor que passou a fazer parte do
Comitê Estadual do PCB em São Paulo, publicou artigos sobre a luta na Fazenda
Gariroba, sobre o arranca-capim de Santa Fé do Sul, análises sobre a Revolução Russa
de 1917, entre outros, principalmente nos jornais Novos Rumos e Voz Operária, sua luta
interna é contra a concepção que o proletariado deveria se unir a burguesia nacional
para a realização da revolução democrático-burguesa, para Nestor o principal aliado era
o campesinato e depois uma possível aliança com a burguesia progressista.

Em “Um problema fundamental do programa: a questão do poder”, de 1954,


Nestor Vera coloca a importância da união operário-camponesa para libertação
nacional, a luta deveria possuir o caráter anti-feudal e antiimperialista contra Vargas. O

139
COSTA, Flávio de Carvalho; SANTOS, Raimundo. Os camponeses e a política pré-64. Estudos
Sociedade e Agricultura, nº 8, abr., 1997. Rio de Janeiro: UFRRJ/CPDA.

56
Programa do PCB é de uma articulação de classes para a tomada do poder, instaurando
um governo com operários, camponeses, pequena burguesia e burguesia nacional para
acabar com negócios com o imperialismo dos EUA.

Mostrando que a aliança dos operários e camponeses é possível e necessária, que sem a
aliança dos operários e camponeses a revolução não pode ser vitoriosa, o Programa
apresenta uma das teses centrais do marxismo-leninismo, (...). A aliança operário-
camponesa é a base da frente única antifeudal e antiimperialista, cuja a tarefa principal é
a derrubada do governo de Vargas, sua substituição pelo governo democrático de
libertação nacional. 140

As palavras de Vera vão ao encontro com o programa do IV Congresso do PCB,


de 1954, ano também de fundação da ULTAB. Suas diretrizes foram apenas maneiras
de reafirmar suas teses de revolução anti-feudal e antiimperialista para construção de
um governo democrático-burguês. Em relação ao campesinato, postulavam a criação de
associações rurais, ainda há um pensamento leninista de união entre camponeses e
operários contra o imperialismo e o latifúndio, por essa decisão Nestor se coloca
prontamente em favor das resoluções pecebistas.

Sobre a centralidade ou não do campesinato para a Revolução é algo que tem


uma grande tradição e debates na esquerda. Dentro do PCB, os acontecimentos levaram
ao aumento da discussão sobre a questão camponesa, por muito anos seguiram o
direcionamento da III Internacional Comunista tentando colocar em prática no país o
modelo russo.141 Não faziam de fato uma interpretação realista da sociedade agrária
brasileira, de uma maneira mecanicista tentaram encontrar um feudalismo no país que
fosse base para afirmar sua visão etapista da História.

A visão que o campesinato era um agente social contra a opressão começou com
Karl Marx no início de seus artigos na Gazeta Renana, quando ainda era apenas um
filosofo-jurista se indignou com os pesares que os camponeses pobres da Alemanha do
século XIX sofriam com o desenvolvimento do capitalismo no país, consequentemente
o avanço da burguesia e os antagonismos de classe. Marx se compadeceu em relação
aquelas pessoas, como escreve Andras Hegedüs, denunciando na Gazeta Renana a
exploração que os latifundiários faziam em relação aos camponeses. 142

140
VERA, Nestor. “Um problema fundamental do programa: a questão do poder.” Voz Operária, 26-06-
1954, p. 6.
141
CUNHA, Paulo R. da. Aconteceu longe demais. São Paulo: Editora Unesp, 2007.
142
HEGEDÜS, Andras. A questão agrária. In. HOBSBAWM, Eric. História do marxismo IV: O marxismo na
época da Segunda Internacional. Rio de Janeiro: Paz & Terra, 1984.

57
A sua celebre obra “Critica a filosofia do direito de Hegel” foi reflexo da
questão jurídica em torno das terras comuns na Alemanha, locais que os camponeses
podiam retirar lenha para se aquecer, mas devido o processo de cercamento das terras e
da propriedade privada essa pessoas não podiam mais utilizar esses espaços que lhe
provinha o fundamental para sobrevivência contra o frio que era a lenha para
aquecerem-se. A perspectiva de Marx começou a mudar em relação ao campesinato
depois das revoluções de 1848 e na contra-revolução francesa, na qual vários
camponeses apoiaram o golpe de Luis Bonaparte na França em detrimento aos avanços
do proletariado. A crítica de Marx, igualando os camponeses a “saco de batatas”,
influenciou uma negativa visão sobre a realização de um movimento camponês que
pudesse ser aliado para a chegada ao comunismo. 143

Por muitos anos o campesinato era tido como atrasados e conservadores ao


extremo, a tradição marxista se referenciou na obra “O 18 Brumário de Bonaparte” de
Marx, mas não se atentaram na passagem que o próprio autor escreve que suas análises
são sobre sim um camponês atrasado e conservador, mas deixa claro que existem
aqueles que lutam contra a opressão e podem ser aliados do proletariado para a
Revolução.

É preciso que fique bem claro. A dinastia de Bonaparte representa não o camponês
revolucionário, mas o conservador; não o camponês que luta para escapar às condições
de sua existência social, a pequena propriedade, mas antes o camponês que quer
consolidar sua propriedade; não a população rural que, ligada à das cidades, quer
derrubar a velha ordem de coisas por meio de seus próprios esforços, mas pelo
contrário, aqueles que, presos por essa velha ordem em um isolamento embrutecedor,
querem ver-se a si próprios e suas propriedades salvos e beneficiados pelo fantasma do
império. 144

Marx faz bem uma separação entre o camponês conservador e anti-


revolucionário do camponês revolucionário que junto ao proletariado lutaria pela quebra
de seus grilhões. É do camponês revolucionário que Nestor Vera tem por perspectiva,
aquele que junto aos operários iriam fazer a Revolução socialista no Brasil.

Houve na esquerda brasileira, também a construção de um pensamento de não


crer que o campesinato seria revolucionário o bastante para implementarem as lutas que
o PCB sugeria. Após a Declaração de Março de 1958, o Partidão adota outra perspectiva
de alianças afastando-se dos agentes do campo, Flavio Carvalho e Raimundo Santos

143
MARX, Karl. O 18 Brumário e Cartas a Kugelmann. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1997.
144
MARX, ob. cit., p. 129.

58
escrevem que há uma mudança em relação ao pensamento do Partido sobre o
campesinato, reflexo da Declaração que possuía um caráter de novo direcionamento
para atuação do partido em relação a sua atuação política. Segundo os autores,

Nossa proposição é a de que, desde o “desenvolvimentismo” da Declaração de Março, o


PCB começaria a afastar-se da influência “orientalista” do passado e da sua derivação
residual: a política de curto prazo inclusive alimentada pela sobrevalorização das lutas
camponesas (fragmentadas e “subversivistas”, como diria Gramsci) do começo dos anos
50 ainda ressoando na memória comunista. Teria havido uma espécie de deslocamento
da questão nacional-camponesa do recorte da “teoria” da aliança operário-camponesa
terceiro-internacionalista para uma redefinição em torno da questão nacional-
antiimperialista num país em processo de modernização. 145

A partir dos anos de 1950, o Brasil experimentou o nacional-


desenvolvimentismo que consistia no rápido processo de industrialização do país
favorecendo a indústria nacional e a modernização das cidades. Iniciado com Vargas em
1950, teve em JK um impulso maior com sua política desenvolvimentista e plano de
metas, houve assim uma priorização a indústria do que o setor agro-exportador. No
plano de metas havia políticas para o desenvolvimento no aspecto econômico,
energético, nos transportes, indústria de base, alimentação e educação proporcionaram
avanços importantes nas transformações econômicas do Brasil. 146

O desenvolvimentismo teve forte apoio da camada nacionalista brasileira, o


plano político proporcionou o aumento da participação na política da burguesia com um
discurso mais nacionalista. O reflexo do desenvolvimentismo, segundo Segatto,
adentrou as fileiras do PC que já propunha há alguns anos a autonomia da economia
nacional, o discurso nacionalista burguês deslumbrou alguns comunistas que seriam os
proeminentes defensores da aliança proletariado e burguesia nacional.

Porém, a burguesia nacional que o PCB chamada de aliados, que o grupo de


Passos Guimarães aplaudia não romperam com o imperialismo. Ao contrário passaram
ao desenvolvimento de um capitalismo monopolista no Brasil não em contradição ao
EUA, mas avançaram em sua característica de dependência ao capital estrangeiro. A
burguesia brasileira entrou na dinâmica da Guerra Fria e incorporou o anticomunismo
como doutrina, saindo do campo populista para perseguição as medidas populares, eis o
golpe de 1964.
145
COSTA e SANTOS, ob. cit., p. 93.
146
MOREIRA, Vânia Maria Losada. Os anos JK: industrialização e modelo oligárquico de desenvolvimento
rural. In: DELGADO, Lucilia de Almeida Neves; FERREIRA, Jorge. O Brasil Republicano: O tempo da
experiência democrática: da democratização de 1945 ao golpe civil-militar de 1964. Rio de Janeiro:
Civilização Brasileira, 2003. p. 155-193.

59
A expansão do capitalismo industrial no Brasil (com as suas importantes influências na
agricultura e nos movimentos do capital financeiro) fez com que o Estado se tornasse
um elo fundamental da acumulação monopolista de capital. Aliás, ao longo dos anos
tanto decresceu a força da burguesia nacional como aumentou a articulação entre capital
monopolista e o Estado. Foram motivos econômicos e políticos que levaram a burguesia
nacional a abandonar a aliança populista que poderia ter sido, segundo o modelo, uma
base importante do capitalismo nacional. 147

Essa proposição pecebista foi criticada por Nestor Vera, o qual insistia na
questão do camponês para a Revolução. No pensamento de Vera encontramos a questão
da linha de lutar contra o imperialismo e contra a semi-feudalidade do Brasil, mas
critica as novas diretrizes do PCB afirma que o camponês é deixado de lado na
formação das alianças. Em suas palavras,

Não se pode falar da hegemonia do proletariado na revolução sem falar e colocar em


primeiro plano a questão camponesa, como não se pode falar de um Partido Comunista
à altura, ideologicamente, de conduzir o proletariado ao poder e mantê-lo no poder, se
não colocar a questão camponesa como questão central para a vitória da revolução.148

O cerne de sua critica centrasse na lógica de alianças ou mesmo na questão das


frentes únicas, algo frequentemente realizado pelo PCB, o principal aliado era o
camponês.149 Nestor escreveu baseando-se principalmente no pensamento leninista para
a Revolução de Outubro na Rússia de 1917, como tática revolucionária proclamava a
união entre operários e camponeses para a tomada do poder, temos que ressaltar que a
lógica de Nestor está, também, influenciada pelo momento histórico de camponeses
realizarem revoluções como é o caso da China (1949) e de Cuba (1959).

Lênin em contribuição a Terceira Internacional Comunista e no processo


revolucionário russo propunha maneiras de “neutralizar” o campesinato, como escreve
Franco Rizzi, mas mais para uma maneira de colocar os camponeses ao lado do
proletariado contra a burguesia. No VIII Congresso do PCR(b) Lênin propõe: “1)
confiscar todas as grandes propriedades; 2) nacionalizar as terras e pô-las à
disposição dos sovietes dos assalariados agrícolas e dos camponeses pobres.” 150

A partir do IV Congresso da Internacional Comunista o lema do governo


proletário-camponês surge, no começo levou-se em consideração o aumento de questões

147
IANNI, Otávio. A revolução democrático-burguesa (PCB). In. . Pensamento social no Brasil.
Bauru: EDUSC, 2004. p. 251.
148
VERA, Nestor. O papel dos camponeses na revolução.
149
Cf. VINHAS, Moisés. O Partidão: A luta por um partido de massas, 1922-1974. São Paulo: Hucitec,
1982.
150
RIZZi, Franco. A Internacional Comunista e a questão camponesa. In. HOBSBAWM, Eric. História do
Marxismo VI: o Marxismo na época da Terceira Internacional. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1985. p.221.

60
imediatas levantadas por camponeses dos países membros, “nele se indicava aos
comunistas, mediante uma política que considerasse as reivindicações parciais das
massas camponesas, a necessidade de conquistar ‘tropas auxiliares’ (Hilfstruppen),
para fortalecer o ‘exército da Internacional’, com referência à massa de pequenos
camponeses.” 151

Lênin não gostou dessas posições, mas, porém, depois dos acontecimentos na
Bulgária, em 1924, que a burguesia deu um duro golpe de estado, houve então uma
aliança entre Comintern e Crestintern (Internacional Camponesa) para avançar na
política de união operário-camponesa. A tática era penetrar cada vez mais militantes
comunistas nos meios rurais, fazendo com que as massas rurais tivessem um
direcionamento revolucionário bolchevique. No V Congresso do Comintern o governo
operário-camponês passou a ser sinônimo de ditadura do proletário, encontra-se então
que os dois principais grupos de trabalhadores da sociedade são fundamentais para
sustentar e chegar ao Estado Socialista.

Sendo um astuto político e militante Lênin percebeu a importância tática na


aliança operário-camponesa, tanto que para a Revolução de Outubro de 1917 as massas
camponesas que, diga-se de passagem maioria da população russa da época, se unissem
ao proletariado devido que ambas as classes tinham o mesmo interesse de vitória contra
a burguesia para sua libertação.

O socialismo pode satisfazer plenamente os interesses de uns e outros. Apenas o


socialismo pode satisfazer os seus interesses. Daqui a possibilidade e a necessidade de
uma ‘coligação honesta’ entre os proletários e os camponeses trabalhadores e
explorados. Pelo contrário, a ‘coligação’ (aliança) entre as classes trabalhadoras
exploradas, por um lado, e a burguesia, por outro lado, não pode ser uma ‘coligação
honesta’ devido à radical divergência de interesses destas classes. 152

O líder do POSDR polemizou com outra liderança em relação ao papel dos


camponeses no processo revolucionário russo, Trotsky apoiador da ideia que o
campesinato era conservador, dividido e inerte, Lênin discorda dessa concepção e
conclama a valorização dos camponeses no processo político,

No conturbado processo histórico em curso, uma reavaliação e revalorização do papel


revolucionário das massas camponesas. Lideradas pelo proletariado, elas possibilitariam

151
Idem. p. 235.
152
LENIN, Vladmir Ilitch. A Aliança dos operários com os camponeses trabalhadores e explorados. In.
. Obras escolhidas. São Paulo: Editora Alfa-Omega, 1988. p. 426.

61
um salto qualitativo na luta pela derrocada do tsarismo e na implantação do
socialismo.153

Saindo da concepção leninista que apresentamos anteriormente determinado


grupo dentro do PCB, descreviam que no sentido etapista no Brasil, a única saída viável
proposta era união com a burguesia nacional para combater o imperialismo
estadunidense, por pensarem que a burguesia teria o interesse de desenvolver um
capitalismo nacional, algo barrado pelo capital estrangeiro e o sentido semi-colonial e
semi-feudal da sociedade brasileira. O que se refletiu diretamente nas teses do PCB, na
Declaração de Março de 1958 e no V Congresso, algo que gerou forte critica de Nestor
Vera.

Infelizmente nosso Partido não está tratando a questão camponesa com acerto. Não
temos uma posição de principio justa. A subestimação e desprezo pelo trabalho
camponês reflete bem nossa posição de direita. Se não mudarmos de posição, os
prejuízos ao movimento revolucionário serão incalculáveis. No trabalho de campo está
o ‘calcanhar de Áquiles’ de nosso partido. Esta é uma questão ideológica ainda a ser
resolvida por nós. (...) E há mesmo dirigentes de alta responsabilidade que acham que,
como o movimento camponês está atrasado em relação ao movimento contra o
imperialismo americano, então o fundamental é a aliança com a burguesia e setores de
latifundiários, quando a luta antiimperialista só tomará seu devido impulso na hora em
que tivermos um forte movimento camponês pela terra contra o latifúndio. 154

O PCB a partir da Declaração de Março, sob o reflexo do XX Congresso do


PCUS passou adotar uma política de perspectiva desenvolvimentista, o que Antonio
Segatto chama de esquerda positiva155, conclamando um papel hegemônico para a
burguesia nacional no processo revolucionário de então deixando o proletariado em
segundo plano, fazer alianças até com latifundiários em contradição com o
imperialismo. Algo que para Nestor Vera era inadmissível, pois o latifúndio era
sustentáculo do imperialismo brasileiro em seu pensamento.

A historiadora Anita Leocádia Prestes avalia as mudanças no Partidão sobre as


interferências externas e as criticas internas,

sem dúvida, algumas mudanças tiveram lugar na tática, que passou a ser a da luta por
um governo nacionalista e democrático, na visão de um possível ‘caminho pacífico’ –
tese proveniente do XX Congresso do PCUS -, numa maior preocupação com o
movimento de massas em geral e com o movimento nacionalista então em
desenvolvimento, em particular. Ocorria também uma certa liberalização no Partido,

153
CUNHA, Paulo Ribeiro da. O campesinato, a Teoria da organização e a questão agrária:
apontamentos para uma reflexão. São Paulo: Expressão Popular, Marília: Oficina Universitária, 2012. p.
37.
154
VERA, Nestor. O papel dos camponeses na Revolução.
155
SEGATTO, ob. cit.

62
fruto da explosão de descontentamento com o mandonismo imperante no período
anterior. 156

Vera não entra em contradição com a tese etapista do PCB, para ele desde o
começo o Brasil deveria fazer a Revolução por etapas: primeiro a democrático-burguesa
e superior a socialista. Sua contradição esta no papel dos agentes para realizar tal tarefa,
tinha por certeza que mesmo na primeira etapa o proletariado deveria ser hegemônico
com fundamental aliança com o campesinato.

O pensamento etapista apareceu na época da II Internacional Socialista, na qual


os social-democratas criam um dogma em volta dessa tese. Mesmo que os comunistas
tenham rompido com a social-democracia, fundando a III Internacional Comunista no
que tange a questão de Revolução por etapas continuou como se fosse uma tradição do
movimento. Na compreensão da III Internacional os chamados “países coloniais e semi-
coloniais”, no qual se incluía o Brasil, deveriam fazer a revolução democrático-
burguesa para fortificar o desenvolvimento das forças produtivas para só assim partir
para o socialismo.

A teoria da revolução por etapas pertencia ao arsenal teórico do socialismo; mas a


social-democracia fizera disto uma espécie de dogma subtraído a oscilações e destacado
da realidade, o qual, por seu turno, contribuía para construir uma rede de leitura
deformante do significado das lutas camponesas no processo revolucionário. Apatia e
jacqueries, consequentemente, terminavam por ser atribuições mais adequadas com que
se caracterizava a realidade complexa do mundo camponês. 157

O publicista pecebista Alberto Passos Guimarães teve papel fundamental na


defesa das teses da Declaração de Março (1958) e do programa do V Congresso (1960)
no qual acreditava que a revolução agrária poderia ser realizada sem a participação do
campesinato, por avaliar que no Brasil essa classe e movimento eram incipientes e não
revolucionários. Acreditava que o país deveria fazer sua revolução antiimperialista e
antifeudal, sendo que o operariado organizado e mais consciente de seu papel histórico
revolucionário poderia caminhar em direção de aplicar uma transformação no âmbito
rural sem contar com o apoio do campesinato. Fazer uma reforma agrária não-
camponesa, Passos Guimarães, no entanto, não levava sua tese a todas as consequências
afirmava que depois de o proletariado fazer a reforma agrária assim poderia contar com
o camponês para dar sequência na revolução antifeudal e antiimperialista.

156
PRESTES, ob. cit., p. 217.
157
RIZZI, ob. cit., p. 222.

63
O cerne da sua teoria de reforma agrária não-camponesa se baseava, como
explica Raimundo Santos, em utilizar os assalariados agrícolas e os semi-assalariados
como meio de fazer a ponte entre o grupo revolucionário, os operários, com os
camponeses,

Alberto Passos Guimarães diz que a brasileira seria uma revolução rural que começaria
a partir de uma base de apoio criada pela luta de classes, isto é, por meio de um
‘movimento’ não-camponês. Ela poderia iniciar-se a partir de uma mobilização de
assalariados e semi-assalariados agrícolas (ou, repetindo os termos das Teses: ter suas
‘bases iniciais’ nos sindicatos que o PCB organizava com vistas a alcançar o
campesinato) 158

Nestor Vera não acredita que sejam apenas os assalariados e semi-assalariados


que possuam a potencialidade revolucionária, acredita que toda a massa rural estava em
contradição direta contra o latifundiário, consistindo assim o principal da Revolução
Brasileira.159 Nas disputas internas dentro do PCB aqueles que questionavam o caráter
feudal do Brasil como Caio Prado Jr, afirmando que o país aparece dentro da lógica do
capitalismo desde a colonização, e o grupo que tinha a concepção da centralidade da
questão camponesa e do campesinato para a Revolução como Nestor Vera, Rui Facó,
Mario Alves e Carlos Marighella foram considerados como membros da “Corrente
Esquerdista de Vanguarda” 160, principalmente pelos militantes ligados a Alberto Passos
Guimarães adeptos da teoria opositora.

Mário Alves escreveu o texto “Dois caminhos da Reforma Agrária”, publicado


na revista Estudos Sociais, em junho de 1962, que dialogava com Nestor Vera na
questão da principal aliança com o campesinato. Enaltece que as principais pressões nos
anos de 1950 vieram do campo com a participação ou não dos comunistas, os
camponeses estavam tomando consciência do seu papel político em busca de seus
direitos. Mário Alves ávido crítico das diretrizes do Partidão foi totalmente contrário a
concepção de aliança com a burguesia, afirma que os fatos reais demonstravam outra
saída, sendo a Revolução Russa o paradigma de então como comprovação da
potencialidade camponesa.

Tomando consciência de seus interesses reais, os homens explorados do campo


avançam no caminho da luta e da organização, realizam seus congressos independentes,
travam combates parciais contra o latifúndio (Formoso, Galiléia, Santa Fé, Sapé) e

158
SANTOS, Raimundo. Agraristas políticos brasileiros. Brasília: Fundação Astrojildo Pereira, 2007. p.
75-76.
159
Informação contida em escritos e rascunhos seus arquivados no fundo Nestor Vera, no acervo
ASMOB do CEDEM/UNESP.
160
CAVALCANTI, Paulo. Os equívocos de Caio Prado Jr. São Paulo: Argumento, s/d.

64
irrompe na vida política do país como uma força revolucionária cada dia mais atuante,
disposta a anular os privilégios seculares dos latifundiários. (...) Não corresponde à
realidade a concepção de certos nacionalistas burgueses e de seus seguidores de
esquerda, que se esforçam por destacar do processo revolucionário brasileiro o aspecto
nacional, imprimindo-lhe um caráter absoluto. Os fatos demonstram que a revolução há
de ser, em sua essência, não apenas antiimperialista, mas também agrária. 161

O ano de escrita do texto de Mário Alves significou o principal racha do


Partidão, após divergências internas entre suas teses de organização e atuação política,
um grupo composto por lideranças comunistas como João Amazonas e Maurício
Grabois, opositores claros das mudanças internas do PCB após duras críticas com as
resoluções do partido fizeram então a “carta dos cem” divulgada no jornal Novos
Rumos. Divulgaram uma severa crítica que os levou a expulsão do Partidão, assim
realizaram um congresso próprio votando em um novo Comitê Central, fundaram o
PCdoB (Partido Comunista do Brasil), tendo como meta a tentativa de reativar o
marxismo-leninismo no meio comunista, mas não passaram de um pequeno
agrupamento que depois na ditadura deve ações mais efetivas, porém não vitoriosas.162

O PCdoB adotou as concepções do Partido Comunista Chinês, tendo como


referência o líder Mao Tsé-Tung que concebia a importância do campesinato para a
Revolução. É interessante constar que mesmo se mantendo no PCB Nestor utiliza o
mesmo referencial da dissidência, algo que no Partidão era pouco utilizado as
referências de Mao Tsé-Tung.

Nos anos de 1960, Nestor busca mais referências em Mao do que no processo
cubano - algo que não estava em voga no Brasil, como mostra Jean Rodrigues Sales,
pois havia mais uma influência vinda de Cuba, principalmente pela ala Marighella e das
163
Ligas de Julião. Seja porque o camponês teve a centralidade na tomada do poder na
China de 1949, sendo que Mao coloca centralidade para a libertação do imperialismo na
China e a construção do socialismo nas mãos dos camponeses.

Paulo Cunha analisando o processo revolucionário chinês a partir dos escritos de


Mao sintetiza a participação do campesinato para a luta como força revolucionária de
então,

161
ALVES, Mário. Dois caminhos da reforma agrária. In: MARIGHELLA, Carlos; et all. A Questão Agrária
no Brasil.: textos dos anos 1960. São Paulo: Ed. Brasil Debates, 1980. p. 65-66.
162
SALES, Jean Rodrigues. As esquerdas brasileiras e a revolução cubana. São Paulo: Editora Perseu
Abramo, 2007. p. 20-22.
163
SALES, ob. cit.

65
O processo organizativo entre os camponeses, segundo ele, passa por fases
diferenciadas, incorporando estágios da luta revolucionária e suas particularidades,
oriundas das especificidades regionais. Nesse quadro, ele lança a palavra de ordem
‘todo o poder às associações camponesas’. (...) Mao Tsé-Tung também indicava que os
camponeses pobres são a força principal do processo revolucionário, sendo que os que
mais favoravelmente aceitam a direção do Partido Comunista. 164

A direção do Partido em Mao é influência leninista, substancialmente


encontramos em Nestor Vera essa mesma política, quando no artigo que trata sobre os
acontecimentos em Santa Fé do Sul165 enaltecia a necessidade de extinguir o latifúndio
no Brasil entregando aos camponeses, não encontramos em Nestor ainda o passo
seguinte da nacionalização das terras e sua socialização, mas a ideia da divisão do
latifúndio que Lênin propõe entre assalariados agrícolas e dos camponeses pobres
encontra-se no camponês comunista.

Em “Os acontecimentos de Santa Fé do Sul”, publicado em 1959 pela Revista


Brasiliense, Nestor tem a tarefa de divulgar a repressão do Estado na revolta camponesa
naquela localidade, mas também fazer uma análise sobre o momento e traçar caminhos
para a organização. De início procura explicar o desenvolvimento do capitalismo no
campo causando ainda mais uma centralização das terras em mãos do latifúndio em
detrimento dos trabalhadores rurais, segundo Vera, o avanço capitalista provoca a
monocultura e a priorização da pecuária no Brasil que tem por consequência a expulsão
dos camponeses de suas terras.

Em “O papel dos camponeses na Revolução” (1960) e “Ainda sobre os


camponeses” (1960) encontra-se o forte teor leninista no pensamento de nosso
militante, haja visto um destaque para o direcionamento do Partido Comunista para a
Revolução, essa ideia baseada na teoria da Vanguarda revolucionária de Lênin. O grupo
mais destacado que entenda a necessidade da organização e da superação do capitalismo
agrupados dentro do Partido Comunista direciona o proletariado e os camponeses para a
tomada do Estado e a construção de uma nova sociedade, primeiramente socialista e
posterior comunista.166

Como explica Paulo Cunha,

164
CUNHA, ob. cit., 2012, p. 72.
165
VERA, Nestor. Os acontecimentos em Santa Fé do Sul. Revista Brasiliense, nº 25, São Paulo, 1959.
166
LÊNIN, Vladmir Ilitch. O Estado e a Revolução. In. . Obras escolhidas. São Paulo: Alfa e
Omega, 1988.

66
o partido, exercendo um papel de vanguarda, teria por tarefa introjetar na classe operária
os fundamentos do socialismo científico, cuidando de sua educação política e do
desenvolvimento de sua consciência de classe; além disso, ele teria, principalmente, que
contribuir para a formação de operários revolucionários almejando elevá-los ao mesmo
nível de conhecimento dos intelectuais revolucionários. 167

A vanguarda revolucionária para Nestor Vera aparece na forma do Partido


Comunista que tem por tarefa guiar camponeses e proletariado para avançar em sua
consciência para a tomada do poder. Paulo Cunha descreve como em Lênin era
composta esse pensamento da vanguarda,

O partido exercendo um papel de vanguarda, teria por tarefa introjetar na classe operária
os fundamentos do socialismo científico, cuidando de sua educação política e do
desenvolvimento de sua consciência de classe; além disso, ele teria, principalmente, que
contribuir para a formação de operários revolucionários almejando elevá-los ao mesmo
nível de conhecimento dos intelectuais revolucionários. 168

O campesinato, na visão de Nestor Vera e dos comunistas do PCB, deveriam


estar guiados pelo partido e pelo proletariado, só assim poderia fazer a reforma agrária
radical. Seja pelos apoiadores de Nestor ou de oposicionistas como Passos Guimarães, a
luta no campo passaria por uma intermediação e uma direção de alguma entidade, o que
é criticado por José de Souza Martins afirmando que a tutela do PC nas lutas do campo
barrou seu desenvolvimento. Seu argumento consiste em atacar os marxistas que
excluíam o campesinato do papel político, colocando-os apenas como “aliados” ou
“perigosos” na ação.

De fato, os grupos de mediação não propiciaram o avanço na revolução agrária,


porém nem mesmo grupos como as Ligas Camponesas que Martins credita serem
autenticamente camponesas não alcançaram tal propósito, e muito menos alcançaram a
amplitude que o PC desenvolveu ao longo dos anos em nível nacional. Mas em relação
aos grupos de mediações Paulo Cunha realiza uma síntese interessante para
compreendermos suas ações:

As lutas do campesinato estiveram e estão muito á frente dos agentes de mediação,


principalmente pelo processo de avanço capitalista no campo nos últimos anos; mas em
geral, esses agentes também não têm conseguido incorporar as lutas e perspectivas de
classe do campesinato em um projeto político tático e estratégico. Ou seja, ao procurar
dimensionar o contexto de participação do campesinato no processo de formação da
sociedade verifica-se paralelamente a ‘hegemônica’ condução política do proletariado

167
CUNHA, ob. cit., 2012. p. 32
168
CUNHA,ob. cit, 2012.

67
(no caso do partido) ou da burguesia; esta teve em seu bojo a própria revolução agrária
ou um forte componente agrário no processo de transformações. 169

A referida revolução agrária da burguesia citada por Cunha é referência ao


desenvolvimento do capitalismo agrário, no Brasil e na América Latina, a partir da
década de 1970 – principalmente – houve todo um processo de mecanização e
capitalização agrária impulsionada pela chamada “Revolução Verde” difundida pelo
Banco Mundial e EUA. Essa tal revolução agrária proporcionou ao latifúndio sua
modernização e práticas de exploração diferentes, levando a intensificação da
concentração de terras e exploração capitalista das relações de trabalho no campo, com
a produção voltada para as commodities para o mercado externo.170 Consequentemente
uma expulsão dos camponeses de suas terras para as cidades ou a venda a baixos
valores sua força de trabalho.

Mas voltando para a questão da centralidade do camponês na visão de Nestor e


sua proposta de aliança proletário-camponesa, em discussão dentro do Comitê Central
do PCB para o VI Congresso do Partido que ocorreu durante a ditadura civil-militar, o
camponês comunista mantêm-se firme em seu posicionamento de anos atrás. O texto
são sugestões realizadas por Nestor para o congresso, em 1967, sua ação esteve no
sentido de aprimorar pontos – que em sua visão eram falhos – em relação ao campo,
problemas sobre leituras da composição social das classes sociais no campo e
novamente o descrédito a participação política dos camponeses.

Há de se destacar uma passagem que é sobre os arrendatários lutarem pela


reforma agrária, segundo consta no anteprojeto do VI Congresso os arrendatários não se
levantariam contra o latifúndio por conta de sua dependência ao latifundiário, algo
totalmente incoerente na leitura de Nestor Vera “isto não é correto, porque não são
somente os arrendatários que estão submetidos diretamente com os latifundiários, e sim
todos os camponeses, desde os assalariados agrícolas até os pequenos e médios.” 171

Referente à reforma agrária, a aliança operário-camponesa e a direção do


proletariado, Nestor continua em sua analisa que “a luta pela reforma agrária não
depende da ‘dependência direta dos latifundiários’ e sim, do grau do movimento

169
CUNHA, ob. cit., 2007, p. 29.
170
Cf. FERNANDES, Bernardo Mançano. Campesinato e agronegócio na América Latina: a questão
agrária atual. São Paulo: Expressão Popular, 2008.
171
Algumas opiniões ao documento “Estrutura de classe da sociedade brasileira”. Fundo Nestor Vera,
acervo ASMOB, CEDEM/UNESP.

68
revolucionário e da direção do proletariado urbano e do comando do Partido
Comunista. Os camponeses sozinhos jamais farão a reforma agrária.”

O interessante da citação é entender a contradição e o envolvimento de Nestor ao


Partido, mesmo considerando a centralidade da questão camponesa mantêm a direção
no operário. Nestor não rompe com a política do PCB em deixar o mundo rural como
força autônoma, como ocorreu com outros militantes na mesma época como Marighella
que saiu do Partido para formar a guerrilha ALN (Aliança Libertadora Nacional) a ideia
era fazer a luta na cidade para dar base para a revolução a partir do campo. 172

A potencialidade da aliança operário-camponesa foi questionada por Francisco


Julião, afirmava que o campesinato iria desenvolver sua própria luta política pela
Revolução à frente do operariado, sendo que esse segundo agente seria guiado por
pautas economicistas de reivindicação trabalhista. Sendo fiel as suas palavras,

Quando a luta se inicia no campo ela toma, imediatamente, caráter político, o que não
ocorre com a classe operária, cuja dinâmica é o aumento de salário. O campesinato
desatará o processo revolucionário brasileiro e conseguirá influir para que a classe
operária se associe à luta. (...) Os sindicatos rurais e outras associações não têm as
mesmas condições, porque, enquanto nosso objetivo é político, eles lutam por
reivindicações nos setores onde a classe operária é reduzida.” (Julião, 1962b; in:
Carvalho Costa, 1994a). 173

A posição de Julião subverte a concepção pecebista de primeiro operariado


como guia, o líder das Ligas Camponesas compreendia que era o campesinato brasileiro
que conduziria o operariado. Sua concepção faz sentido se analisarmos seriamente o
desenvolvimento das lutas dos trabalhadores urbanos e camponeses dos anos 1950 e
1960, o campesinato era o grupo social que mais intensificou enfrentamentos contra o
governo e pode avançar em termos de organização, questionando a estrutura social e
fundiária brasileira tanto que a reforma agrária era a principal meta a ser alcançada pelo
programa de reformas de base de João Goulart que desagradou à direita nacional.

O VI Congresso do PCB, ocorreu durante a clandestinidade da maioria de seus


militantes, em 1967, congresso que elevou ao Comitê Central membros que como
Nestor Vera acreditavam na potencialidade do camponês, como Elson Costa, Heros
Trench, Lyndolpho Silva e Mário Alves, além é claro de nosso camponês comunista. As
diretrizes do Partido, no entanto, não assumiu uma tática e nem estratégia específicos
para o campo, afirmavam a necessidade de um amplo movimento de massas contra a
172
SALES, ob. cit, p. 64-74.
173
JULIÃO, Francisco apud COSTA e SANTOS, ob. cit., p. 101.

69
ditadura militar para garantir as liberdades democráticas. O país que havia levado o
golpe em 1964, via a cada ano e a cada ato institucional o endurecimento dos militares e
a perseguição aos grupos de resistência.

No mesmo ano do congresso do Partidão, Nestor participou da V Conferência


Mundial dos Sindicatos dos Trabalhadores da Agricultura, das Florestas e das
Plantações, ocorrida na Alemanha Democrática, em seu discurso conclama
internacionalmente a sua teoria de aliança operário-camponesa, reafirma a necessidade
dos trabalhadores do campo e da cidade para superação da ditadura brasileira. 174 Nestor
fez um histórico do desenvolvimento das lutas camponesas em todo o Brasil, afirmando
que na organização é a única maneira que o trabalhador pode alcançar uma nova
sociedade justa e sair do regime de exploração.

Vera discursa para um grande público reunido na Alemanha Democrática, dessa


forma, tentou demonstrar quais foram os avanços ocorridos no Brasil pelo movimento
camponês contanto que a proposta leninista era fundamental para superação da ditadura
e posteriormente da construção do socialismo. Nestor, a partir de sua intervenção na
Conferência mundial começou há mudar um pouco sua leitura sobre a realidade
brasileira, afirmando em documentos para debater interno no CC que já era a hora dos
comunistas superarem a ideia de revolução democrático-burguesa e partir diretamente
para a conquista do socialismo, pois o capitalismo já havia se desenvolvido e a
burguesia se instalado de forma definitiva no poder.

Enfim, não poderemos desenvolver como foram os debates que Nestor Vera
propiciou no PCB na década de 1970 por falta de oportunidade, pois essa é uma
pesquisa que deve ser mais aprofundada e com maior tempo para sua realização, algo
que não temos nos momento. Ao longo desse texto nossa pretensão foi de apresentar
momentos de debates internos no PCB em torno do campesinato, guiados pela leitura
que Nestor Vera realizou em sua trajetória como militante, assim como quais foram às
principais referências do camponês comunista.

174
XAVIER, Jacinto (pseud. Nestor Vera). “A situação do movimento camponês no Brasil, suas lutas e sua
organização.” Fundo Nestor Vera, acervo ASMOB, CEDEM/UNESP.

70
Considerações finais

Nossa intenção com esse trabalho era apresentar a História de um personagem


histórico que contribuiu com o desenvolvimento de entidades sociais e, principalmente,
com uma classe social. A História de Nestor Vera é uma lacuna da História Social do
Campo que deve ser preenchida, com nosso trabalho procuramos fazer uma pequena
contribuição para as seguintes pesquisas que devem ser feita referente a Nestor e ao
movimento camponês brasileiro.

Ainda existem diversas lacunas sobre a história de Nestor Vera e do


campesinato, um dos motivos é o descaso dos historiadores pelo campo – algo que tem
mudado recentemente -, pela perda das fontes e perseguição de pessoas. Compreender a
História recente do Brasil é algo complicado, pois existem interesses políticos e
disputadas pela memória, no âmbito rural a repressão ainda hoje ameaça pessoas que
participaram de movimentos sociais anos atrás ou mesmo que possam contribuir para
revelar pontos importantes ainda encobertos.

Os camponeses ainda continuam as mesmas lutas pela reforma agrária e por seus
direitos como cidadãos, a partir da ditadura civil-militar houve todo um
desmantelamento do movimento no país, tanto rural quanto urbano, a “eficácia” da
repressão no que se refere ao desaparecimento de pessoas e histórias que poderiam
contribuir para a continuação de ações para transformação da sociedade. Porém
queremos ressaltar que em questão de desaparecimentos no mundo rural e a repressão,
como demonstramos ao longo do primeiro capítulo é algo corriqueiro que, infelizmente,
ocorre até a atualidade. Por esse motivo insisto na necessidade de que aumente as
pesquisas acadêmicas e dos movimentos sociais sobre a História dos camponeses.

Iniciamos nosso trabalho com a intenção de ser um panorama da participação de


Nestor para a realização do movimento dos trabalhadores do campo, com isso descrever
como foi à contribuição dos comunistas para conquistas de direitos trabalhistas e no
âmbito da reforma agrária no país. Ao longo dos anos 1950 e 1960, esses grupos de
pessoas tiveram centralidade no debate político brasileiro, comunistas e camponeses
foram os principais atores históricos tanto para aqueles que apoiaram como para seus
opositores.

71
No contexto da Guerra Fria, manter comunistas fora do campo foi à missão de
grupos conservadores como a Igreja Católica, latifundiários e direita política. Perceber
que mesmo com toda a repressão e o anticomunismo Nestor Vera conseguiu realizar
grandes feitos desde a formação da Liga Camponesa de Santo Anastácio até a
CONTAG, podemos concluir como os comunistas foram essenciais para colocar os
camponeses no cenário político brasileiro como forças fundamentais, do seu início nos
embates locais até o questionamento da estrutura fundiária nacional. É evidente que
outros grupos, além dos comunistas foram importantes para o desenvolvimento do
movimento camponês no Brasil, porém é claro que as proporções que tiveram foram
pela insistência da política de comunistas como Nestor Vera em apoiar o trabalhador
rural na luta de seus direitos.

Podemos refletir como até mesmo na esquerda o homem do campo foi tido como
atrasado e incipiente seu movimento, a sociedade não compreendia – compreende –
como esse setor não era selvagem e sabia fazer política. O pensamento dentro do
Partidão não era heterogêneo mesmo que o fim fosse comum a meio de alcançá-lo
divergia, uma das grandes contradições era o papel do camponês na Revolução,
apresentamos militantes como Nestor Vera e Mário Alves que influenciados pelo
momento histórico de efervescência dos acontecimentos no mundo rural, acreditavam
na centralidade do campo como meio de transformação. Enquanto outros faziam uma
leitura sobre o desenvolvimentismo brasileiro concebendo que era a burguesia nacional
o principal motor de mudanças na sociedade.

A pretensão de nosso trabalho de dividir em dois capítulos era de primeiro


demonstrar de forma a contextualizar o desenvolvimento das lutas no campo, assim
como os comunistas participaram junto aos camponeses, além é claro de apresentar a
contribuição e o foco de Nestor Vera em sua trajetória como líder camponês e militante
comunista. Não focamos mais alguns anos da vida de Nestor Vera devido à falta de
documentação que pudesse corroborar com nossa pesquisa em determinados momentos,
principalmente aqueles em que esteve na clandestinidade. Até o presente momento não
encontramos nenhum trabalho sistemático sobre a participação de Nestor Vera, a família
que poderia auxiliar nesse processo também é desconhecida, apenas o sobrinho Omene
Vera Martins que contribuiu com nosso trabalho, no entanto, também não tem
informações mais precisas da vida de seu tio.

72
O segundo capítulo foi realizado com o intuito de apresentar como era o
pensamento de Nestor em relação ao campo e aos camponeses, como que o Partido
Comunista influenciou suas abordagens teóricas, que por ventura iriam refletir em sua
ação prática. Tentamos também fazer um diálogo das proposições realizadas sobre a
temática camponesa dento do PCB, como o movimento camponês foi debatido dentro
do partido, quais eram as visões, dessa forma escolhemos as duas principais
interpretações que tiveram forte repercussão. A primeira é a de Nestor Vera que afirma
que no processo revolucionário brasileiro a questão camponesa era fundamental e
imediata, propondo dessa maneira a união entre operários e camponeses vertente do
pensamento leninista. Do outro lado haviam aqueles que afirmam sobre o movimento
camponês uma atraso e seu conservadorismo, no qual não poderiam ser agentes
revolucionários, tendo como fundamento uma aliança com a burguesia nacional
principalmente após o Manifesto de 1958.

Esse trabalho é apenas uma pequena contribuição para os novos estudos sobre
Nestor e o movimento camponês restando à necessidade de avanço nas pesquisas nessa
temática, além de compreender quais foram às principais contradições que Nestor Vera
teve em seu trabalho prático-teórico se o que escrevia conseguia colocar totalmente em
prática, algo que nossa pesquisa ainda não conseguiu concluir pelo pouco tempo para
sua finalização.

73
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