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Neste trabalho apresento uma síntese de parte da obra de Vrij (2003), sobre a deteção da
mentira. Foquei-me nos capítulos com mais interesse e implicações na intervenção em
reinserção social. A partir dos indicadores e tópicos emergentes atribuo outra significação
aos enganos intencionais que os arguidos constroem no contexto do acompanhamento das
medidas de execução na comunidade.
Focado nessas simulações faço uma demonstração teórica que permite conectar a mentira
com o transgressivo, marcando a sua proximidade criminal. Por fim, apresento o caminho
para a inclusão do episódio mentira nas entrevistas de apoio e vigilância realizadas pelos
TSRS.
mortificante.
processo de controlo social, seja na ação dos grupos primários, onde é gerado e
conformidade à vida em comum, seja na reação penal ao crime, o que aqui nos traz.
Cusson (2002) esclarece que “O controlo social procede do interesse que leva
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Aceite esta afirmação, suportada pelas ciências biológicas e psicológicas,
um estado de vida melhor do que neutro, produzir aquilo que nós, seres
Podemos então afirmar que em cada um de nós são naturais as tendências para
confiar nos outros e para nos protegermos dos atentados à nossa pessoa. É
estão a ser enganadas. Parece que a razão por que a mentira prolifera é a de
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Nos últimos anos têm surgido também investigações (Paul Ekman e colaboradores)
abordaremos aqui.
Comecemos por focar os conceitos. Segundo Furely (1986), fazer uma afirmação
falsa não é necessariamente mentir. Uma comunicação falsa (que não reflete a
A definição mais abrangente e aceite resulta das proposta de vários autores, como
Ekman (1992) e Vrij (2003), e postula que mentira é “uma tentativa deliberada,
bem ou mal sucedida, sem aviso prévio, de criar no outro uma crença que o
comunicador considera falsa”.
Para benefício de uma outra pessoa ou para beneficiar essa outra pessoa;
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Estas diferentes razões permitem distinguir tipos de mentiras. As primeiras três
razões dão origem às “mentiras orientadas para o próprio”, as outras duas são
Há uma outra classificação apresentada por DePaulo, Kashy, Kirkendol, Wyer &
são as mentiras em que os factos são distorcidos por aumento da informação que o
mentiroso considera verdadeira. Por fim, as “mentiras subtis” são aquelas em que
dizem mais mentiras “orientadas para o próprio”, enquanto as mulheres dizem mais
3 - Várias investigadores (Kashy & DePaulo, 1996; Drij & Holland, 1999;
Hunter, Gerhing & Boster,1982; Wilson, Near & Miller, 1998) apresentaram
com a mentira:
As “pessoas sociáveis”, aquelas que revelam maior apetência e à vontade pela vida
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“adaptáveis” estão muito motivados para darem uma impressão positiva aos outros,
A investigação (Kashy & DePaulo, 1996) confirma ainda que o facto de as pessoas
recorrerem à mentira.
controlo social e agir (são hábeis a representar papeis e põem-nos em prática para
objetivos.
facilmente controlado;
mudanças de posição)”.
agarram.
uma pessoa não é de confiança terá maior tendência para julgar essa pessoa como
B – “Recomendações”:
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As “mentiras” só podem ser detetadas via indicadores não-verbais se o
“mentiroso” experimentar alguma emoção (medo, culpa ou excitação/
ativação) ou se a “mentira” for difícil de fabricar;
O suspeito deve ser sempre encorajado a falar. Isto é fundamental para que
possam aparecer os indicadores;
sentidos”, através dos quais a pessoa exprime uma “experiência emocional positiva”
“orbicularis oculi” (musculo em redor dos olhos). O “falso” sorriso, que acontece
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quando a pessoa pretende fazer crer que está a viver uma emoção positiva, não
ativa o músculo orbicularis oculi. No entanto, os autores sublinham que nem sempre
quando em contexto de sorriso falso, o músculo pode ser ativado por emoções
outra diferença entre sorrisos, pois os falsos “são mais assimétricos, começam
movimentos com a cabeça, muda menos de posição, fala mais devagar, com
7 – Vrij (2003) nas suas guidelines diz-nos que mentir é “uma tentativa
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para produzir mentiras eficazes (difíceis de detetar); e que há duas
discurso verbal (e ainda uma terceira modalidade, que não abordamos, que
eficazes: estão bem preparados para simular; são originais; pensam rapidamente;
são eloquentes; têm boa memória; não experimentam sentimentos de medo, culpa
ou prazer quando mentem; e são bons atores. Vrij identifica estas características
mentira também servirem ao mentiroso, caso leia e estude o livro ou, digo
tarefa ao mentiroso.
As mentiras a que aqui nos referimos e com que lidamos diariamente são aquelas
ilustrativo, o caso de arguido que informa o TSRS que está a cumprir a prestação
Evitar a punição ou obter vantagem são razões que facilmente identificamos nos
intervenção específica.
resultados apresentados por Baião & Rijo (2011) indicam que cerca de 80% dos
Mas, a mentira que aqui nos interessa colhe-se noutro tipo de personalidades
delinquentes exercem uns sobre os outros tem papel determinante. Cusson (2002)
externa tem tanto mais impacto quanto menor for a crença do arguido em si
mesmo, quanto mais baixa for a sua autoestima. Como sabemos, este indicador de
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transgressivo, do grupo, que dirige e direciona a ação. Estes argumentos
perante uma questão ou situação mais ou menos complexa, “não atende a todos os
dados, não examina todas as opções possíveis nem todas as suas eventuais
tem uma proximidade criminal que obriga à sua inclusão nessa monitorização, no
mentira, da razão por que a utiliza e o que pretende alcançar; poderá gerar alguma
tensão na relação entre arguido e TSRS, mas tal é uma oportunidade e condição
bem como permitir que aceda ao sentimento de responsabilidade pelas suas ações.
Com tal procedimento, o TSRS, no contexto de entrevista, gera uma interação com
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administrativo de mera verificação de anomalia/incumprimento. Caso o arguido
aproveite este enquadramento, que permite planear ações inteligentes que evitem a
engendra.
(Antunes, 2009).
Amadeu Baptista.
Agradecimentos: Ana Leonor pelo incentivo e leitura atenta. Belarmina Xavier, Joaquim
Lourenço e Mário Simões pela disponibilidade.
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Referências bibliográficas:
VRIJ, A. (2003). Detecting Lies and Deceit: The Psychology of Lying and the
Implications for Professional Practice. England: Jhon Wiley & Sons, Ltd.
podem vir a melhorar. Psicologia e Justiça, Coimbra, Edições Almedina, pp. 255-
296.
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