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Ir.

Sobre
Comportamento
e Cognição
Análise comportamental aplicada

Volume 21

Organizado por Wander C M . Pereira da Silva

ESETec
Editores Associados
2008
Copyright © desta edição:
ESETec Editores Associados, Santo André, 2008.
Todos os direitos reservados

Silva, W. C. M. P.

Sobre Com portamento e Cognição: - O rg. W and er C. M. Pereira da Silva 1â ed.


Santo A ndré, SP: E S E Tec Editores Associados, 2 0 0 8 . v.21

436 p. 23cm

1. Psicologia do Comportamento e Cognição


2. Behaviorismo
3. Análise do Comportamento

C DD 155.2
C DU 159.9.019.4

ESETec Editores Associados

Diagramação e arte: Ana Carolina Grassi Leonardi

Solicitação de exemplares: comercial@esetec.com.br


Santo André-* SP
Tel. (11) 4438 6866/ 4990 5683
www.esetec.com.br
Sumário

Apresentação 9

Emoções: assunto não esgotado e implicações clínicas 13


Rachel Rodrigues Kerbauy

Emoções: raiva, tristeza, medo, podemos empregar autocontrole como


procedimento de intervenção? 19
Rachel Rodrigues Kerbauy

Contingências estabeiecedoras das habilidades sociais: foco da avalia­


ção clinica 27
Angeluci Reis Branquinho Ribeiro, Gina Nolêto Bueno

Comportamento verbal na prática clínica: considerações sobre o operan­


te na Análise do Comportamento 45
Naiene dos Santos Pimentel, Carmen Silvia Motta Bandini, Juliana Cristina Donadone,
Julio César C. de Rose, Sonia Beatriz Meyer.João de Fernandes Teixeira

O modelo comportamental na análise do TOC 61


Helen Copque, Hétio José Guilhardi,

Tratamento psicoterápico do tabagismo 75


Verena Castellani Vitor Santos, Luciana Roberta Donola Cardoso, Paulo Roberto
Abreu

Análise de contingências moduladoras do comportamento autista 81


Roberta Mala Marcon, Gina Nolêto Bueno

Baixas habilidades sociais e auto-regras negativas: o encadeamento de


repertórios-problema 97
Jéssica Cirqueira Alves, Gina Nolêto Bueno

Comportamento alimentar infantil: do normal ao patológico 111


Talita Lopes Marques, Denise Cerqueira Leite Heller

Comportamento governado por regras e resistência às mudanças: Um


estudo de caso 121
Márcia P. S. Batista, Michela Rodrigues Ribeiro

Do comportamento sexual à disfunção sexual: um estudo de caso135


Robertt Cardoso de Sousa, Gina Nolêto Bueno

5
Uma introdução à interpretação clínica analítico-comportamental de fenô­
menos grupais 151
Jocelaine Martins da Silveira, Alexandre Dittrich

A importância do envolvimento dos pais na vida escolar dos filhos 161


Ana Paula Viezzer Salvador, Lidia Nataüa Dobrianskyj Weber

Treinamento de pais na modalidade de grupo em clínica - Escola: o que


fazemos e fazemos é suficiente? 175
Fabiana Pinheiro Ramos, Sônia Regina Fiorim Enumo

Análise comportamental da ansiedade à Matemática: conceituação e estra­


tégias de intervenção 185
João dos Santos Carmo,Lívia de Oliveira Cunha, Paula Valéria de Souza Araújo

Agressão e vitimização entre pares: bullying e suas relações com a depres­


são na adolescência 197
Juliana de Brito Lima, Eleonardo Pereira Rodrigues, Josafá Moreira da Cunha, Lidia
Natalia Dobrianskyj Weber

Implicación fam iliar percebida, actitudes hacia las matemáticas y


rendimiento académico 209
Leila do Socorro Rodrigues Feio, Julio Antonio González-Pienda, Carlos Nunes,João
dos Santos Carmo, Marillac Cunha Ferranti

Programação de ensino como uma tecnologia para a educação 219


Mareio de Cassio Juliano, Sergio Vasconcelos de Luna

Análise das contingências no ensino de Análise do Comportamento em cur­


so de pós-graduação 235
Tania Moron Saes Braga, Sandra Regina Gimeniz-Paschoal, Maria de Lourdes Morales
Horiguela.

Análise do comportamento aplicada e a produção de tecnologia: implicações


educacionais do paradigma da equivalência de estímulos 243
Verônica Bender Haydu, Juliana Barboza Caetano de Paula

CMAI (Centro municipal de apoio à inclusão) - Um projeto de educação


inclusiva no município de goiânia - GO 259
Gláucia Helena de Almeida, Juliana Soares Dias, Michela Rodrigues Ribeiro

Uma análise de metacontingências na escola inclusiva 267


Andréia Schmidt, Deisy G. de Souza,

Utilizando o sistema de economia de fichas no ensino infantil: um relato de


experiência 283
Luciano de Sousa Cunha, Angélica Bohrer Fenira, Claudemi dos Santos, Elisângela
Adriano Gomes Marcheti, Enilza Teixeira Ribeiro

Alguns conceitos envolvidos na análise e compreensão dos fenômenos cul­


turais* 291
Vívica Lé Sénéchal Machado, João Cláudio Todorov

6
Punições do sistema penal sob a luz da Análise do Comportamento 305
Anna Beatriz Carnieili Howat Rodrigues, Felipe de Carvalho Pimentel, Lucínéia
Pesente

Função dos indicadores de sustentabilidade para o planejamento cultu­


ral e processos de Educação Ambiental 315
Hélder Uma Gusso, André Luiz Freitas Dias,

O papel dos reforçadores sociais na manutenção de crenças sobre ca­


racterísticas entre homens e mulheres: um estudo a partir do software
belief 327
Luciano de Sousa Cunha, Filipe Moreira Vasconcelos, Luiza Geaquinto Machado,
Paola Porto Câmara de Freitas, Paula Nunes Lima, Priscila de Assis Nogueira,
Renan Grilo de Almeida, Rosalina Barros Gomes, Sarah Muzi Cardoso,
Wagner Petri Travesani, Elizeu Batista Borfoti

Tempos modernos versus ansiedade: aprenda a controlar sua ansieda­


de 341
Gina Nolêto Bueno, Angeluci Reis Branquinho Ribeiro, Iran Johnathan Silva Oliveira,
Jéssica Cirqueira Alves, Roberta Maia Marcon

Psicologia da saúde: comunicando informação e ensinando comporta­


mentos de saúde 353
Áderson Luiz Costa Junior, Rejane Soares Ferreira, Antonio Bento Alves de Moraes,
Gustavo Satollo Rofim

Uma introdução da perspectiva comportamental sobre o bruxismo e ou­


tras disfunções temporomandibu lares 367
Neyfsom Carlos Fernandes Matias

Estratégias de enfrentamento entre pais de crianças com câncer:


contribuições teórico-metodológicas 377
Marina Kohlsdorf, Áderson Luiz Costa Junior

A inserção do analista do comportamento no campo da psicologia do


esporte: um relato de experiência. 391
Marcella Demoner Borges Coutinho, Maria Silvana Barbosa dos Santos, Luciano de
Sousa Cunha

Os distúrbios da imagem corporal e>a prática de exercícios físicos 401


Talita Lopes Marques,Denise Cerqueira Leite Heller

Avaliação do comportamento do treinador de uma equipe de basquete


pela visão do atleta. 413
Maria Silvana Barbosa dos Santos, Marcella Demoner Borges Coutinho, Luciano de
Sousa Cunha

Análise do comportamento no contexto esportivo: intervenções em uma


equipe de basquetebol 427
Luciano de Sousa Cunha, Felipe Moreira Vasconcelos, Paola Porto Câmara de Freitas,
Paula Nunes Lima, Renan Grilo de Almeida

7
Apresentação

Os textos que compõem os volumes 21 e 22 da coleção Sobre Comportamen­


to e Cognição" representam uma amostra qualitativa dos trabalhos apresentados no
XVI Encontro da Associação Brasileira de Psicoterapia e Medicina Comportamental,
ABPMC, realizado em Brasília, em 2007.
Oferecemos, nesses dois volumes, ao leitor, um conjunto de textos contem­
plando análises teóricas e conceituais sobre temas diversos ligados à Ciência do
Comportamento e trabalhos de pesquisa que fornecem um breve panorama da produ­
ção nacional na área. O volume 21 tem foco na análise comportamental aplicada (clíni­
ca, educação, fenômenos culturais, saúde e esportes) enquanto o volume 22 apresen­
ta algumas reflexões epistemológicas e conceituais em Behaviorismo e Análise do
Comportamento e os artigos direcionados a considerações metodológicas e relatos
de pesquisa.
Agradecemos, mais uma vez, a todos aqueles que acreditaram no papel
divulgador dessa coleção e colaboraram para sua publicação, enviando seus textos.
Análise comportamental
aplicada: clínica, educação,
fenômenos culturais, saúde
e esportes
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Capítulo 1
Emoções: assunto não esgotado e
implicações clínicas
Rachel Rodrigues Kerbauy.*
ÍPUSP

Devido à impossibilidade de publicar todo o conteúdo do curso ministrado na


ABPMC, 2007 Emoções: como estudá-las, destacando raiva, tristeza, medo e implica­
ções clínicas este artigo é parte dele. No entanto, dois pontos serão resguardados:
escrever um artigo com preocupação clínica e a ênfase nas emoções nomeadas no
título.
Evidentemente, o referencial teórico do pesquisador é uma variável de controle
importante quando escuta os relatos do cliente e pergunta ou analisa aquela seqüência
de relatos. Há ainda a visão social e cultural do momento ou a que permeou a história
passada do terapeuta e cliente. Formulo indagações ao cliente hoje, que nem pensaria
quando iniciei meu trabalho clinico, no final dos anos sessenta. Nesse caso de trabalho
clínico, a experiência e a vida universitária são fatores favoráveis, ao clinico... pelo me­
nos.

Influência da aprendizagem nas emoções.


A história de reforçamento determina a persistência e a generalização das
reações emocionais. Isto é observado com clareza nas sessões clínicas. É tão evidente
quanto descrever o choro operante de uma criança. No início, sinalizava fome e os
cuidadores forneciam alimento. Apesar de ser um padrão reflexo inato torna-se choro
operante, por ser reforçado dessa forma e pode aumentar com o desenvolvimento.
Mandar parar de chorar é insuficiente, e ensinar outro padrão, demanda tempo e vários
procedimentos. Os “chorões” são conhecidos nos consultórios pelas lágrimas que
acompanham relatos de tristeza, apesar dos trinta e tantos anos. Observo que muitas
vezes esse choro vem permeado com sorriso. Parece: "tenha pena de mim, veja como
sofro e sou engraçadinha”. É por isso que saliento a aprendizagem e a generalização
das emoções.
O livro de Ferster, Culbertson e Boren (1968/1977), não traz em seu índice as
denominações tradicionais dos livros de psicologia, mas se propõe a ensinar os pro­
cessos básicos do comportamento e desenvolver a habilidade de observação minuci-
Professor Ulular, IPUSP. Psjoótoga dfnica, analista de comportamento.

Sobre Comportamento e Cognição 13


osa para a análise do comportamento, sendo um bom guia para o estudo das emo­
ções. Claro que não há um capitulo com esse nome. Há, no entanto, diretrizes para
analisar e aplicar os princípios e procedimentos comportamentais em situação natural
e esclarece sobre emoções.
A pessoa pode inibir sinais externos das emoções. De fato, a aprendizagem
social influencia na manifestação das emoções. A cultura determina padrões masculi­
nos è femininos, o esconder expressões desagradáveis ou falar de certa forma, facili­
tando frases de aproximação e não de punição ou rechaço. De qualquer maneira, a
história passada de cada pessoa envolvida na interação é que permitirá a classificação
daquela interação especifica. Há um padrão ontogenético envolvido além de um
fiíogenético. De fato o comportamento emocional tem características únicas. Há mu­
danças no comportamento operante decorrentes do contexto ambiental.
A aprendizagem afeta também a força e estabilidade da mistura das emoções.
Os estudos sobre emoções primárias e como seria a mistura das emoções que permi­
tiria outras denominações, é fascinante. Percorre um caminho permeado por filósofos
que postulam um pequeno número de emoções primárias e as descrevem. Há a seguir
discussões e estudos sobre a mistura das emoções e a descrição fisiológica e
comportam ental da expressão facial ou topográfica. Os estudos de observação e des­
crição predominam. Começam a seguir, os estudos discutindo se emoções são
construtos hipotéticos ou estados idealizados, inferidos com pouca evidência. Apare­
cem as listas de palavras para descrever emoções e análises fatoriais para identificar
fatores relacionados a emoções e personalidade. Os estudos procuram em seu con­
junto identificar emoções primarias e as mistas. Geralmente, com análise fatorial, che­
gavam a fatores bipolares como depressão versus alegria, agradável versus beligeran­
te. É fascinante passar pelos diversos estágios de teoria e pesquisa e ainda observar a
influência, ainda'hoje, em certas classificações de transtornos mentais.
Como conseqüência, verificamos na situação clínica que raiva e expectativa
podem produzir agressão, expectativa com alegria pode gerar otimismo, mas somente
o relato do contexto dos comportamentos e a maneira de aprender, com observação
das conseqüências e do desempenho atual, é que permite ao clínico compreender o
produto final. Notamos hoje, na família e na escola um cuidado em descrever estados
internos e denominar as emoções. Vocês como eu, já observaram crianças jogando
brinquedos ou objetos e dizendo "estou bravo". Será que foi ensinado comportamento
alternativo? Já ouvi relato de adultos dizendo “meu irmão bateu em mim e minha mãe
me mandou correr atrás dele e bater também, quando eu era criança".
Esse problema de nomear e expressar emoções estão relacionados, a meu
ver, com o período em que se discutia na psicologia a dificuldade de nomear estados
internos do organismo pelo desconhecimento acurado deles. Desse ponto de vista, a
emoção era a causa do comportamento. Considero um avanço a introdução do contexto
e consequentemente a possibilidade de ensinar alternativas para nomear e lidar com
emoções. Especialmente o conhecimento atual de que não se sabe o que a pessoa
está sentindo e que se ensina a nomear a partir de um referencial próprio. O artigo de
Moore (1984) foi um dos pioneiros sobre o tema e pela organização dos conceitos de
uma forma compreensiva. Sabemos que a exposição a varias pessoas permite apren­
dizagem do que sente, em qual situação e o nome do sentimento. Evidentemente pode
dificultar também essa aprendizagem sutil. Você sente o estado de seu corpo, o nome
da emoção dependerá de como aprendeu a nomear aquela sensação. Quem já não foi
reclamar em uma loja e ouviu da gerente: “não precisa ficar nervosa”. Essa esta frase é
um “cala boca, não reclame, você está doente". É nomear não o comportamento do

14 Rachel Rodrigues Kerbauy


reclamante, mas uma maneira cultural de “diagnosticar"... doença mental... e pode ser
eficiente p$ra quem emite essa frase. O ouvinte geralmente fica quieto, por inúmeras
razões. Portanto, analisar o contexto é fundamental, bem como fazer análise funcional
das falas.

Características das emoções.


É um estimulo externo que propicia o aparecimento da emoção. Como conse­
qüência ela é dirigida ao estimulo específico que a provocou e o estado fisiológico
concomitarite não é claramente percebido. Considero que aqui esteja um dos pontos
de discordância discutidos pelos comportamentais e cognitivistas, pois o objeto é ava­
liado ou vi^to, e novamente precisamos acrescentar a história passada de aprendiza­
gem, que é peculiar, de cada individuo.
Um estudo experimental elucidativo é o realizado por Azrin para estudar o efeito
de um estimulo aversivo, um choque elétrico, liberado no piso da caixa experimental,
em ratos, mostra o efeito da punição e a desorganização do comportamento. Ao receber
o choque q rato atacava o estímulo presente na caixa e que não tinha relação com o
choque recebido. Poderia ser um outro animal, uma bola de ping-pong, ou qualquer
outro estímulo. Isto mostra que uma punição ou estímulo aversivo produz esses resul­
tados o que explica a generalização e a avaliação do organismo. Emprego muito em
sessões clinicas esse exemplo. A pessoa não está vendo claramente a situação, mas
responde ao estímulo presente de acordo com seu padrão pessoal de agredir o punidor,
que no caso não é o objeto escolhido. É esse muitas vezes o efeito da punição, especi­
almente quando a fonte do estímulo aversivo não é claramente percebido. O mesmo
efeito acontecerá a um comportamento reforçado positivamente mas o resultado é de
aproximação.
Desse modo, podemos identificar porque uma emoção pode aparecer e desa­
parecer rapidamente. Dependerá do estimulo do momento e da história de aprendiza­
gem. Uma pessoa c ria d a com estimulação aversiva e, portanto, punições freqüentes
pode desenvolver um 2 forte resistência à extinção. Mesmo sem reforçamento positivo
ou com punições manterá seu comportamento apesar do ambiente. Esse fato é mais
provável quando está envolvida uma regra que a pessoa considera ética ou ela identifi­
ca extremg manipulação do meio. Se estou em um ambiente que tolera o roubo...
roubarei também? Qu#i o quarto mandamento que aprendi, para evitar confundir o meu
com o do outro? O fetto de ocupar um cargo me permite confundir o meu com o dos
outros ou da instituição?
Portanto outr# característica das emoções é ser possível comunicá-la ou de­
monstrar, dependendo da história de aprendizagem. Isto explica o tçmpo necessário
em terapia; há n e c e s s id a d e de identificar estímulos internos e externos e maneiras
antigas e novas de atuar e a aprendizagem necessária que implica em extinção de
comportamentos e associações de estímulos.

Definir emoções?
Com a longa história de filosofias e psicologias escrevendo sobre emoções e
paixões e a consideração de seu papel central nas realizações humanas, temos um proble­
m a sério para defini-la. D e fato falar sobre a natureza das emoções, sua origem, expressão,
efeitos, é uma esoolha teórica e pessoal. O problema se agrava quando percebemos que
a conceitu^ção da ernoção tem efeito na maneira de atuar em áreas de aplicação e
metodologia de pesqu isa e principalmente entender seu papel na saúde do homem.

Sobre Comportamento e Cognição 15


Escolhi o referencial de análise do comportamento e, portanto definirei emo­
ções de acordo com a obra de Skinner (1953/1957), “estado particular de alta ou baixa
freqüência de uma ou mais respostas induzidas por qualquer uma dentre uma classe
de operações”, p.100. Além de uma definição o livro Ciência e comportamento humano,
em seu capitulo sobre emoção, delineia uma maneira de trabalhar que serve de inspi­
rarão para os analistas de comportamento até hoje.
Se verificarmos os escritos de analistas do comportamento, notamos que emo­
ção não é considerada um estado interno do organismo, mas como mudanças amplas
do comportamento operante que ocorrem devido a operações ambientais. Por isso,
segundo Millenson (1967) é preferível falarem comportamento emocional. Ba naco (1999)
escrevendo sobre eventos encobertos na prática clínica alerta sobre o risco dos
terapeutas aceitarem o relato de eventos encobertos sem buscar as relações ambientais.
Avança em sua análise ao propor planejamento de contingências respondentes e
operantes para provocar relatos de vários tipos de contingências. O autor faz ainda uma
proposta para alterar as coordenadas emocionais de Millenson para uma terminologia
adequada à população brasileira. Para isso, destaça a apresentação de reforçadores
positivos e a retirada de reforçadores negativos e os coloca em ordenadas que vá da
apresentação a retirada. Apresenta o caso das emoções primarias misturadas e não de
todas as emoções. Talvez Guimarães Rosa nos auxilie a ver emoções brasileiras e
contexto, em Campo geral, (1967) a história de certo Miguilim, menino míope.
A mistura de emoções é passível detectar quando vemos um estimulo ser
emparelhado com duas ou três emoções primárias. Um pai cuida do filho doente, um
S1 para cuidar e ser pai responsável, mas também para punição, S- que tem alta
probabilidade de ocorrer: perda de sono, menor ganho no trabalho. Com isto podemos
ver uma mistura de prazer e culpa que se manifestará através dos anos nas interações
pai e filho, se desempenhos e contextos não forem modificados.
Ao discutir ou trabalhar com emoções lidamos com dois eventos: o comporta­
mento emocional, como se manifesta e as condições manipuláveis das quais esse
comportamento é função. Decorre disto que há uma ruptura e mudança gerai em com­
portamentos que a pessoa esteja empenhada no momento. Decorre também a dificul­
dade em aprender a nomear emoções, pois estas mostram vulnerabilidade. Skinner
(1989/1991) expressa isto na p. 13 "aquilo que as pessoas sentem é tão importante
quanto aquilo que elas fazem” e este é um dos problemas mais difíceis no atendimento
do cliente e da denominação de emoções e da metodologia de seu estudo.
inferimos a presença de uma emoção observando as circunstâncias públicas
e por isso as palavras que designam sentimentos não são ensinadas com o mesmo
sucesso das que designam objeto. Nesse sentido a análise do comportamento favore­
ceu a nossa compreensão dos sentimentos por esclarecer os papéis do ambientes
passado e presente “p. 15”. Ao escrever o capítulo sobre o lugar do sentimento na aná­
lise do comportamento, parece que Skinner mostrou suas reflexões sobre as desco­
bertas dos estudos entre 1953 a 1989 e suas observações do comportamento humano.
Destacou as metáforas, hoje tão empregadas em terapia, como “todas as pa­
lavras usadas para designar sentimentos começaram como metáforas e é significativo
que a transferência sempre tenha sido do público ao particular' (p. 20). Portanto, há uma
história genética e pessoal responsável pelas condições corporais que o fisiologista
descobrirá. Este fato está ocorrendo, com os estudos da estrutura cerebral através da
ressonância magnética, que com grupos em que manipulam variáveis que provocam
emoções, procuram determinar as transformações cerebrais. Os resultados são inici­
ais, e a grande parte dos estudos além de buscar medicação para conter o fenômeno

16 Rachel Rodrigues Kerbauy


safientam a modificação de comportamentos via terapia. Mas há sobre tudo um falar
sobre emoções. Num estudo de Braga e Kerbauy (1997) observamos que hipertensos
ao descrever dores ou mal-estar e ao relacionar com a doença, faziam comparações
transmitidas pela cultura o que determinou uma intervenção com eles e seus familia­
res, para um descrição mais acurada e que permitisse manutenção do tratamento.
Portanto o uso prático das emoções parece ser eliciar os reflexos que ocorrem
nas emoções, construir procedimentos apropriados ao reflexo condicionado, por exem­
plo, removendo os estímulos, apresentar e treinar respostas incompatíveis e predispo­
sições emocionais. Esse último item é bastante visível se observarmos politicos em
ação antes de campanha, autores de livros de auto-ajuda, cientistas e pais ao educar
seus filhos.
A literatura de psicologia está repleta de sugestões para alterar as emoções,
algumas baseadas em estudos experimentais, outras na experiência clínica, outras
retiradas de práticas culturais que tem se mostrado eficazes através de gerações. Claro
que dessa preocupação de mudança surgem teorias e formas de terapia como a FAP
de Kolemberg e Tsai (1991/2001) e a maneira pessoal de trabalhar de cada terapeuta,
que constrói sua preferência a partir dos resultados que observa em clínica. Evidente­
mente será difícil obter uma resposta clara sobre esse assunto, de um terapeuta, pois
a resposta será “depende do caso”, o que é um acerto.

Referências

Banaco, R. O acesso a eventos encobertos na prática clinica: um fim ou um meio. Revista brasileira
de terapia Comportamental e cognitiva, vol. 1,2. 135-142.

Braga, T.M.S, e Kerbauy, R.R. (1997) Uma proposta de orientação familiar em casos de hipertensão
arterial. Sobre Comportamento e Cognição: uma análise do comportamento e da terapia cognitivo-
comportamental no hospital geral e nos transtornos psiquiátricos. Org. Denis Zamignani. Santo
André: Esetec. 206-215.

Ferster, C.B., Culbertson, S e Boren, M.C.P. (1968/1977) Princípios do comportamento. (Tradução


Maria Ignez Rocha e Silva, M.AIice C.Rodrigues e M. Benedita Lima Pardo). São Paulo: Hucitec e
EdUSP.
Kohlenberg, R.J. e Tsai, M. (1991/2001) FAP Psicoterapia Analítica Funcional. Trad organizada por
Rachel R. Kerbauy. Santo André: ESEtec.

Míllenson, J.R. (1967/) Princípios em análise do comportamento. Trad. Alina Souza © Dione de
Rezende Brasília: Editora Coordenada.

Moore, J, (1984) on privacy, causes and contingencies. The behavior analyst, 7, 3-16.
Rosa, J.G. (1967/1977) Manuelzãoe Miguilim (Corpo de Baile), 8a. Edição.Riode Janeiro. J. Olimpio.

Skinner, B.F. (1953/1967) Ciência e comportamento humano. Trad. Rodolpho Azzi e João Cláudio
Todorov. Brasília: Editora Univ. de Brasilia.

Skinner, B.F. (1989/19991) Questões recentes em analise do comportamento. Trad. Anita L. Néri.
Campinas: Editora Papirus.

Sobre Comportamento e Cognição 17


Capítulo 2
Emoções: raiva, tristeza, medo, podemos
empregar autocontrole como
procedimento de intervenção?

Rachel Rodrigues Kerbauy*


IPUSP

Continuando a apresentar o curso da ABPMC 2007, a dicotomia sobre emo­


ções, de como a ciência a vê e como as pessoas falam dela, está presente. Desvendan­
do seus segredos, os cientistas descobrem que há uma descrição verbal dos senti­
mentos e dos comportamentos observáveis sendo hoje possível medir e visualizar
alterações cerebrais que mostram os locais onde emoções são vivenciadas. Há por­
tanto, para o cientista, um campo amplo para continuar a explorar e alguns deles, com
evidências aceitas, quase pela unanimidade dos cientistas.
No entanto, para o homem comum, expressar, como fizeram Roberto e Erasmo
Carlos em Emoções (1980), é mais que suficiente: "se chorei ou se sofri o importante é
que emoções eu vivi” pois demonstra seu papei para emprestar significado a ações
humanas.Serve também para justificar seu estudo, como um dado além do consultório.
Esses versos esclarecem as questões preliminares do antológico Keller e Schoenfeld
(1950/1966): “deverá esta palavra ser mantida na ativa como um recurso, um auxiiio à
compreensão do comportamento ou deverá ser aposentada do serviço cientifico?"
p.342.Mais adiante eles respondem: “ não se pretende fugir à obrigação de tratar aque­
les aspectos do comportamento que, na linguagem comum através dos tempos, têm
sido chamados “emocionais”. Pergunta-se apenas se poderá ser dada à palavra um
sentido claro e distinto.”
A comunidade de analistas do comportamento observou, em experimentos,
que operações experimentais como sustar o reforço positivo ou apresentar estímulos
aversivos resultam em modificações operantes e reflexas. Por esses efeitos sabemos
que há emoções. No cotidiano, observamos que aumentar a intensidade de um estímu­
lo, pode tomá-lo aversivo e que as crianças dizem “com barulho não”, quando aprende­
ram ser da televisão em alto volume, com alguma interferência técnica. Não correm
mais longe do ruído, mas rejeitam e avisam o adulto para excluí-lo, que aquilo as
transtorna. Ao contrário, estímulos fracos podem tornar-se SD para reforçadores. Ob­
servamos isto facilmente com pessoas que falam baixo com crianças pequenas, quan­
do se aproximam delas.
‘ Professor titular, iPUSP. Psicóloga dínlca, analista de comportamento.

Sobre Comportamento e Cognição 19


Investigando comportamentos podemos descobrir inúmeros procedimentos
que possibilitam distinguir uma emoção de outra e isto deu origem a teorias sobre
emoções. Todas as observações demonstram a influência da cultura, mas alguns pa­
drões como o sorriso, próximo ao rir, aparecem cedo, com semanas, após o comer por
exemplo,com movimentos livres, certos movimentos ou cores. Portanto, apôs a apre­
sentação de reforço positivo. Claro que com o tempo a criança aprende a usar expres­
sões para conseguir o que deseja. As expressões faciais específicas para cada emo­
ção, parecem não ter sido encontradas, mas as circunstâncias nas quais o comporta­
mento ocorre permite denominar as emoções experienciadas. Ou seja, um padrão
emocional é identificado com base no comportamento e nas condições em vigor. Isto
permite manter o nome tradicional das emoções mas obriga justificar e descrever as
operações específicas que determinam a força do grupo de respondentes envolvidos
bem como dos operantes.

O uso prático das emoções


As emoções presentes em sessões de terapia e na vida cotidiana são utiliza­
das peias pessoas em seu benefício e dos outros também. A ênfase em quem, depen­
derá da situação e dos princípios éticos de cada um.
Vou listar, sem prioridades, como as emoções são salutares em nosso desen­
volvimento. Algumas são da espécie, portanto filogenéticas, outras ontogenéticas, apa­
recem e se expressam com a aprendizagem específica daquela pessoa e inúmeros
caracteres na expressão e na hora de sentir as emoções são culturais .

Eiiciar os reflexos que ocorrem nas emoções.


Determinadas situações, sejam visuais ou faladas, propiciam a estimulação
para que uma emoção aconteça. Os respondentes são eliciados e os operantes tambem.
Sabemos que há sobreposição operante respondente como salientam Keller e Schoenfled
(1950/1961) p.76 e notas. O experimento de Konorski e Miller (1937) mostrou que o
choque elétrico elicia a flexão da pema do animal, mas depois de alguns reforçamentos
o animal começa a elevar a pema independente do choque elétrico, quando entra na
situação experimental. Podemos considerar como exemplos, os dramalhões, as históri­
as tristes contadas para que tenhamos piedade ou ajudemos financeiramente; a mani­
pulação de pessoas com fofocas e maledicência de conhecidos ou familiares que po­
dem levar a brigas e rompimentos, os telefonemas anônimos para avisar da traição do
namorado ou marido, penso sempre ser arranjo de alguém bastante interessado, que
está puxando os cordéis. Os exemplos são inúmeros. Aqui no Brasil, se alguém fez algo
errado e o outro pontua pode esperar uma agressão na maior parte das vezes."Atacar,
sem esmorecer, avançar certo de vencer”... A cultura aceita e espera a pizza. Aprendemos
a analisar isto, assistir e ver tudo resolver com piadas. É essa aprendizagem de lidar com
emoções, eiiciando comportamentos que dificultam a educação em escolas e a discipli­
na e provavelmente tenham relação com o conceito de moralidade.

Procedimentos apropriados ao reflexo condicionado: remover ou


apresentar estímulos.
Pode ser difícil conseguir uma manipulação ambiental que impeça estímulos,
mas existem operações que modificam a força de um ou muitos comportamentos. A
remoção de estímulos condicionados, positivamente reforçadores, provoca emoções

Kachel Rodrigues Kerbauy


como tristeza e, sua apresentação, alegria. Ferster conceitua depressão como maior
número de punições que reforçadores positivos na vida diária. Quem não acompanha
comentários ou observa a depressão de idosos ou aposentados? Os programas atuais
propõem que se movimentem em direção a situações reforçadoras, mesmo que isso
implique em incentivar viagens e atividades a que nunca se dedicaram.São essas
atividades, ou as pessoas que conhecem e que propiciam interações que podem mu­
dar a rotina de vida? Respostas são necessárias, para evitar “conselhos” ridículos, em
programas educativos ou encontros sociais.
Há um experimento antigo de Gates(1926) que pesquisou com a hipótese de
que a interrupção de encadeamentos ou restrição física poderia ser uma estimulação
negativamente reforçadora. Na vida diária, romper um encadeamento pode provocar
raiva. Solicitou a estudantes que registrassem todas as ocasiões, durante uma sema­
na de auto-observação, em que sentiam raiva e fizessem um resumo das circunstânci­
as precipitadoras.
Seus resultados incluem situações de descomposturas, críticas, recusa de
solicitações, atraso de amigos a encontros, número errado ao discar o telefone, engui­
ços em objetos (relógios, canetas tinteiro, maquina de escrever... agora seria computa­
dor ou impressora) atraso de ônibus ou demora de elevador, desajeitamento no vestir
ou costurar, desobediência de cachorros ou crianças, sono interrompido e perda de
dinheiro. Essas situações davam “impulsos" de: retorquir com palavras,ferir fisicamen­
te o ofensor, injuriar objetos inanimados,sair da situação, chorar, gritar ou praguejar.
Note que as pessoas, ao invés de cousas, se constituíram a principal fonte de raiva.
Apesar das diferentes histórias de refòrçamento, há similaridade nos resultados .
Emprego esse procedimento em clinica, em casos de pessoas que têm res­
postas de raiva relatadas, e que geralmente respondem com inflexões raivosas: voz
alta, dedo em riste, ironia e que são eximias em reclamar pessoalmente ou por e-mail
quando se sentem mal-tratadas ou lesadas em lojas. A análise das anotações é um
material rico em terapia, embora os resultados possam demorar a acontecer e geral­
mente impliquem no ensino de respostas alternativas e discussões sobre o que é
justo, muito no estilo contestador. É interessante verificar que a raiva de quando, no
trabalho, ligam depois do expediente, é um item freqüente bem como no trânsito a raiva
dos motoqueiros e de pessoas que atravessam fora do sinal e as que não sinalizam
são também freqüentes. Os tempos são outros e as situações também.

Apresentar respostas incompatíveis.


Viver em sociedade implica frustrações, pois há proibições e conflitos. Como
muitas proibições são para o bem do maior número de pessoas e para salvaguardar o
bem estar, convém aprender a lidar com elas para evitar raiva e ansiedade. Algumas
pessoas têm a habilidade de evitar eventos ou confrontos aversivos e produzir reforçadores
positivos. Outras, devido sua história de controle aversivo não adquirem habilidades su­
ficientes ou não percebem os SDs que a sociedade dispõe. É necessário, então, a apren­
dizagem de respostas se não incompatíveis, pois as vezes não há, pelo menos alternati­
vas. Podemos evitar ficar a sós com pessoas que evocam raiva, quer pela sua ironia quer
pela retirada de reforçadores. Aqui no Brasil, tem um fazer não falado, que precisa ser lido,
peto conhecedor da cultura e que facilita a emissão de incompatíveis. Exemplos: “não
discuta com o chefe”, aproxime-se munida de reforçadores sutis. Não exagere, pois o
efeito é contrário. Não vá a situações sociais que é para um grupo reduzido ou, então,
contrarie sua necessidade social, ficando um tempo limitado e conversando assuntos
neutros. Pode sair com reforçadores... caso contrário é punição na certa.

Sobre Comportamento e Cognição 21


Munir-se de um repertório soda! e de frases para dizer a si própria é muito
eficiente. Em um dia em que tudo parece dar errado é melhor não pensar no que deu
errado para não piorar... ou, então, poderá considerar uma possibilidade de comportar-
sç diferente, de outra vez. E porque não pensar nos “ chatos” que encontrou... mas por
^fnuito. pouco tempo? O melhor é fazer outra cousa provavelmente reforçadora.
Existe um embasamento teórico e de experimentos para essas condutas. Um
sorriso produz um sentimento agradável talvez porque o estímulo sorriso foi associado
com estímulos afetivos, isto acontece da mesma forma que alimento produz salivação.
Porque o sorriso (CS) foi pareado com afeição (UCS) ele elicia uma resposta seme­
lhante ao sentimento agradável. Se as respostas são incompatíveis os dois estímulos
podem eliciar a resposta dominante. Se o medo de cobra for maior que o reiaxamento
provocado pela música os dois estímulos eíiciam a resposta dominante e então eliciarão
ansiedade. Se o relaxamento é dominante sobre a ansiedade então a cobra provocará
relaxamento. A tarefa do terapeuta comportamental é manipular a força das respostas.
Quem não se Jembra do erro técnico do filme.
Uma outra variável é a ordem temporal da apresentação dos estímulos. Há,
geralmente melhor aprendizagem se o CS ocorre antes do UCS e o intervalo é outra
variável, pois é de poucos segundos.
Geralmente o contra-condicionamento, condicionar uma resposta incompatí­
vel, uma nova resposta, muda a resposta condicionada. Por exemplo, relaxamento, que
é incompatível com medo. Para evitar que a resposta de ansiedade domine a resposta
de relaxar é que são empregados os procedimentos de dessensibilização. Se começa
com palavras, gravuras, ver o objeto temido à distância até a aproximação. Dessa forma
a ansiedade provocada pelo estimulo é enfraquecida e o relaxamento passa a ser a
resposta dominante. No entanto, aprender uma nova resposta para uma situação de
estímulo é a melhor maneira de modificá-ía e não somente enfraquecer a resposta
anterior. Em essência o contra-condicionamento consiste em isolar o estímulo que
elicia uma resposta indesejável e encontrar um outro que elicie a resposta desejável,
preferencialmente incompatível.

Alterar predisposições emocionais


Uma outra maneira de controlar respondentes é utilizando operantes opostos,
nas situações em que podemos prever o comportamento. Em defesa de tese podemos
supor as questões da banca e preparar as respostas e falar para si própria que há
respostas possíveis por conhecer bem o assunto, ocultar o medo.Também não chorar
ou reclamar embora possa estar sentindo tristeza, fazer uma face “de paisagem” para
evitar a leitura de emoções de raiva ou medo e assim por diante.
Com crianças, é bastante eficaz a "imaginação emotiva” como contra condicio­
namento de ansiedade, pois às vezes é difícil ensinar relaxamento. Como sugerem
Lazarus e Abramovitz (1962), encontrar imagens que produzam sentimentos de orgu­
lho, afeição é importante. Uma criança que tenha medo de cachorro pode imaginar-se
um jogador de futebol famoso que encontre um cachorro e brinque com ele. Pode
imaginar-se auxiliado pelo super-homem a combater o monstro que o amedronta ou
entrando em um local escuro com ele e examinando os ruídos e descobrindo o que os
produzem.
Emprego muito com crianças, que têm medo de ficar em seu quarto para
dormir, um passeio pela casa, comentando a função de cada local e terminando no
quarto que é descrito e salientado em todos os sinais particulares que caracterizam

22 Rachel Rodrigues Kerbauy


como dela. Acaba tendo a participação da criança na descrição. Depois de deitada com
carinho e de um boa noite, geralmente as cousas correm bem.
Os pais, atores, políticos, são exímios em apresentar uma expressão alegre e
tranqüila mesmo assoberbado com problemas. A cultura auxilia essa aprendizagem e
sua manutenção.

É possível preconizar exercícios para um viver emocional saudá­


vel?
Sim e não seria a resposta correta. No entanto, de acordo com a escolha pes­
soal há maneiras de viver que podem facilitar o aumento de reforçadores e conseqüen­
te emoções prazerosas
Para psicólogos é melhor citar algumas que poderão ser objeto de inúmeras
sessões de terapia e treinamento, pessoal e com clientes.
O relaxamento, aconselhado e realizado de formas diferentes por religiões e
cientistas, ainda é uma maneira de lidar com o dia. A melhor forma é uma reduzida e
imediata e que possa ser feita em vários iocais sem chamar a atenção. No momento
necessário alguns movimentos correspondentes ao locai de maior tensão podem acon­
tecer discretamente. Considero os relaxamentos melhores aqueles que a pessoa não
precisa "ausentar-se” da situação ou fechar os olhos. É para o bem dela e não para
mostrar sua competência em relaxamentos esotéricos. Geralmente emprega-se uma
forma reduzida de Jacobson (1938), adaptada as necessidades da pessoa.
Fazer uma lista de fatos e cenas agradáveis, para utilizar em varias situações
produtoras de aversivos. Essa lista pode ser renovada a critério de quem a emprega.
Paisagens em detalhes, são recursos preciosos em casos de grande dificuldade. Auxi­
lia na produção de um Intervalo de tempo e a paisagem foi escolhida anteriormente
como agradável.
Procurar identificar e compreender os estímulos que precedem os estímulos
aversivos do contexto. É o caso de “mudar de calçada". É um auxiliar para situações que
provocam raiva ou medo e permite uma preparação para moderar a fala e seu conteúdo
e a conter movimentos muito abruptos.
Evitar salientar as cousas desagradáveis que acontecem a menos que seja
para analisar e planejar mudança e começar a executá-la. É produtivo analisar passo-
a-passo o acontecido e planejar maneiras diversas de comportar-se é prever a mudan­
ça de resultados e os sentimentos resultantes. No consultório observa-se que o cami­
nho é longo pois geralmente em situação de interação social a pessoa muda o cenário,
a fala das pessoas enquanto ela continua com a mesmo comportamento. Até essa
situação ser enfrentada e reduzida as manifestações publicas ou encobertas de sua
ansiedade, raiva ou medo, há treinos e discussões. È esperada a fala “enfrentei diferen­
te e estou me sentindo bem". É importante não interromper o treino para evitar fuga ou
esquiva e se a sessão não puder ser prorrogada, pontuar bem onde parou, e que nota
o cliente daria para seus sentimentos. Se possível, nesses casos, planejar uma tarefa
de casa com garantia da possibilidade de execução.
Aceitação de fatos e sentimentos. Há vasta literatura sobre esse assunto. Pre­
firo deixar a escolha pessoal dos leitores. O importante é que sem aceitar os sentimen­
tos e os fatos é impossível planejar e executar mudanças. “Qualquer pressuposto
errôneo sobre o problema impede a resolução" como afirmam Watzlawick, Weakland e
Fisch (1973). Uma pergunta sobre o que está sendo feito aqui e agora para perpetuar o

Sobre Comportamento e Cognição 23


problema pode auxiliar a aceitar o que está acontecendo e os sentimentos resultantes
e até mesmo proclamá-los e com isso o problema pode terminar...
Qualquer desses exercícios precisam ser empregados, quando possível e
necessário, e a eficácia deles avaliada para permitir mudanças ou mesmo interrup­
ções. Uma terapia não tem como tarefa levar a felicidade mas aliviar o mal-estar e
auxiliar a observar o mundo e a si próprio.

Raiva, tristeza, medo


Emoções causadas peias circunstâncias, por uma história de vida permeada
por estímulos aversivos e situações enfrentadas sem sucesso, predominam no con­
sultório. Todas elas têm características observáveis para um observador atento: mu­
danças fisiológicas e conseqüências muito semelhantes pela dificuldade de adapta­
ção da pessoa. Machado de Assis (1876) se revela um bom comportamentalista em
seu conto “to be or not to be”. No dia em que perdeu a noiva e o emprego de cento e vinte
mil reis, com um insulto físico de quebra, não se matou nem tentou matar-se, nem
lembrou de o fazer. Tanto é certo que o suicídio depende mais das impressões e dispo­
sições do momento, que da gravidade do maí.”Realrnente ele parece conhecer a frase
de Skinner (1953) “a linguagem da emoção é quase inteiramente metafórica.,." p. 150,
Pensei em escrever sobre cada uma delas, mas permeei o artigo com elas. Foi
uma escolha de falar de emoções decorrentes de estimulação aversiva, pelo menos
para aquela pessoa. Explicar que atguém maltrata outro porque está com raiva, não
explica o sentimento da raiva. Quando descobrimos as variáveis relevantes a explica­
ção pela raiva fica de pouca importância. Todas as emoções podem passar desperce­
bidas se não são graves e, ultimamente, têm sido objeto de filmes que as toma mais
compreensivas, e até hilárias e consideradas como podendo permitir uma vida rica e
produtiva. Só é patológica quando persiste e inibe maneiras de realizar e viver, do con­
trário mesmo em seus extremos como no caso de fobias ou TOC, a tendência hoje é
viver com boa qualidade de vida.
A cultura atual tem alterado a denominação de emoções. Parece que não existe
mais tristeza, esquecem de que privação extrema é uma operação emocional que pode
provocar solidão, frustração. A dor de cotovelo ou a fossa estão virando transtorno e
depressão. As pessoas são medicadas, os antidepressantes transformam-se em pílu­
las mágicas para a doença, que está se tomando, a mais comum nos nossos dias. Os
livros e artigos atuais estão começando a desafiar a poderosa influencia dos laborató­
rios (Haley,1997; Horwitz e Wakefield, 2007). Todos já ouvimos relatos de efeitos colaterais
dos anti-depressivos, inclusive hemorragias graves, Provavelmente, com essas de­
núncias, novas pesquisas e discussões sobre os medicamentos e depressão mos­
trem-se necessárias. Ler e acompanhar essas discussões bem como as sobre Prozac,
(Healey,2004) pode nos fazer repensar fenômenos que observamos no consultório e na
dissolução de casamentos. Podemos pensar na privação do comportamento sexual ou
ameaça de perda da potência e suas conseqüências, e o entregar-se, ao comporta­
mento sexual, quando se apresente a ocasião.

Autocontrole: força de vontade, hábito ou comportamento?


O psicólogo comportamenta! utitiza dados de pesquisa para predizer compor­
tamento e analisar o ambiente, o contexto, o mundo fora, em interação com o organis­
mo. A pessoa é um organismo interagindo com outros organismos e objetos. Portanto,
tem uma história de aprendizagem

24 Rachel Rodrigues Kerbauy


Considero que Skinner em 1953, p.203, deu um grito de liberdade. "O indivíduo
controla parte de seu comportamento quando uma resposta tem conseqüências que
provocam conflito - quando tem tanto reforçamento positivo quanto negativo.”. Continua
na pagina seguinte “o organismo pode tornar a resposta punida menos provável alte­
rando as variáveis da qual é função. Quafquer comportamento que consiga fazer isso
será automaticamente reforçado. Denominamos autocontrole esse comportamento”.
Continua “uma resposta a controladora, afeta variáveis de maneira a mudar a probabi­
lidade de outra, a controlada. Examinando isto, em cada caso especifico observamos
as formas diferentes de autocontrole.
As respostas que a pessoa escolheu empregar são de autocontrole, são as
respostas controladoras. Há uma gama imensa que vão de retirar-se da situação,
mudar os estímulos removendo aiguns e apresentando novos SDs e claro, controlando
as predisposições através da saciação e privação. Todas são técnicas de autocontrole
podendo ser empregadas também com as emoções. Uma das mais preciosas, com
inúmeras pesquisas, é reforçar o próprio comportamento através do auto reforço, ou
seja, tendo o poder de obter reforço não o libera enquanto o comportamento escolhido
não for emitido. Outra maneira de preencher o tempo entre o comportamento e a espera
do reforço é fazer alguma cousa e talvez assim tenham sido inventado as atividades de
lazer. Embora eu tenha sido marcada pelo experimento sobre punição e ansiedade de
Estes e Skinner (1941) e, portanto, prefira não empregá-la, a não ser como último
recurso, dou a mão a palmatória, pela sua eficácia: se eu não fizer isso perco aquiio. É
geralmente a mais empregada pelas pessoas que consideram a forma mais eficaz. Vi
isto de forma dramática, em uma ciasse, há muitos anos nos idos dos anos setenta,
que ao fazer um programa de autocontrole para si próprio, no curso que eu ministrava,
a quase totalidade empregava em seu projeto, punição. Eram 40 estudantes de psico­
logia, intelectualmente sofisticados em sua formação.
As religiões têm inúmeras técnicas para as pessoas "virarem anjo" e as regras
de etiqueta procuram fazer a mesma coisa, para facilitar o convívio social. Valeria a pena
saber quai dessas regras, se possível, as pessoas ensinariam. Com certeza eu ensi­
naria a utilizar lenço de pano ou papel ao tossir e espirrar, para disseminar menos
doenças. Seria um pequeno passo para a prevenção de doenças. Ensinaria também a
não recíamar das cousas em voz alta, quando não pretende fazer nada eficiente para
mudar a situação. Seria uma forma de controle emocional que propiciaria um contexto
mais saudável. Eu teria que aprender a ir embora, para evitar pedir para a pessoa parar
de reclamar e dirigir-se aos órgãos competentes. Com essa saída iniciaria mudanças
emocionais. Ou então aprenderia a “não ouvir” e pensar em cousas agradáveis.

Referências

Carlos, R. e Carlos E (1980) Emoções. São Paulo: Produzida e mixada no estúdio innerground.

Estes,W.K. e Skinner.B.F. ( 1941)Some quantitative properties of anxiety. J.exp.psychol.29,390-400.

Gates, G.S. (1926) A observational study of anger. J. exp. Pschol.9, 325-336.


Healy.D. (2004) Let them eat prozac. New York: New York University Press.

Healy.D. (1997)77ie anti depressant era. Cambridge: Harvard University Press.

Sobre Comportamento e Cognição 25


Horwitz, A.V. e Wakefield,J.C.(2007) The loss of sadness. New York:Oxford University Press.

Jacobson,E. Progressive relaxation. Chicago: University press.


Ketler, F.S. eSchoenfied,N(1950/1966). Princípios de ps/co/og/a. Tradução: Carolina Bori e Rodolpho
Azzi. São Paulo: Editora Herder

Lazarus,A.A. e Abramovitz.A. The use of “emotive imagery" in the treatment of children's phobias.
J.of mental Science, 1962, 108,191-195.

Machado de Assis, (1876/1962) To be or not to be. Contos Fluminenses li. Obras completas de
Machado de Assis. São Paulo: Editora Mérito.

Skinner, B.F. (1953/1961) Ciência e comportamento humano. Trad.Rodoipho Azzi e João Cláudio
Todorov. Brasília: Universidade de Brasília.
WatzIawick.P. Weakland, J e Fish, R. (1973) Mudança: princípios de formação e resolução de
problemas. Trad. Jamir Martins. São Paulo: Editora Cultrix

Rachel Rodrigues Kerbauy


Capítulo 3
Contingências estabelecedoras das
habilidades sociais: foco da
avaliação clínica

Angelucí Reis SBranquinho Ribeiro*


Ç ína Nolêto Bueno**
Universidade Católica de Çoiás

Comportamento
De acordo com Skinner (1953/2000), o comportamento é uma matéria acessí­
vel, mas extremamente complexa. Não pode ser facilmente imobilizado para observa­
ção, visto ser um processo. É mutável, fluido e evanescente e faz grandes exigências
técnicas da engenhosidade e energia do cientista. Logo, não existe nada insolúvel nos
problemas que surgem deste fato. Nessa perspectiva, afirma Staats (1996) que as
pessoas ao longo do seu desenvolvimento vão recebendo estímulos que irão determi­
nar seu repertório de comportamento: adaptado ou desadaptado.

Comportamento adaptado e desadaptado


Comportamentos adaptados ou ajustados são aqueles que adaptam-se ao
meio em que são apresentados. Isto implica serem coerentes às normas convencio­
nalmente estabelecidas pela sociedade na qual esse indivíduo comporta-se (Staats &
Staats, 1966/1973).
Porém, as profundas transformações sócio-tecnológicas estabelecidas pelo
século XXI têm exigido cada vez mais dos indivíduos a ampliação de suas habilidades
sociais, portanto, a ampliação de sua capacidade de adaptar-se (Gerk-Cameiro, 2003).
Mas aquelas pessoas que não conseguem adaptar-se ao seu meio ambiente
apresentam os chamados comportamentos desadaptados. Tais comportamentos sa­
lienta Cabailo (2002/2003), podem ser consequêncíados pela disfunção cognitiva do
indivíduo, quando o mesmo, ao perceber os eventos de forma negativa, constrói pertur­
bações emocionais que influenciarão negativamente seu comportamento. Logo, os
'Psicóloga Especialista em Psicopatologla: subsídios pare a tuação clinica. E-maíl: angelp5i60@yahcio.com.br
** Mestra em Psicologia. Professora do Departamento de Psicologia e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia luto Sensu da
Universidade Católica de Goiás, membro do Núcteo de Pesquisa Aplicada em Intervenções Clínicase Comunitárias - NUPAICC. E-mall:
ginabuenopsl@hotmal .com

Sobre Comportamento c Cognição 27


comportamentos desadapíados são aqueles que o indivíduo não consegue ter controle
de suas respostas, sendo considerados como comportamentos sociais e culturais
inadequados (Staats & Staats, 1966/1973).

Contingências estabelecedoras das habilidades sociais e dos déficits


de habilidades sociais
Todos os seres humanos nascem com um equipamento biológico, cuja
potencialidade para desenvolver depende de vários fatores, como cuidados com a higi­
ene, saúde e estimulação adequada. Mesmo dispondo desse potencial biológico, ao
nascer o ser humano é um dos seres mais desamparados. E sua saída desse status -
de desamparo para amparo - implicará ter de aprender novos repertórios, imprescindí­
veis ao seu processo de interação com o meio ambiente. Ambiente esse que continua­
mente transforma-se, pela própria presença do indivíduo nele (Del Prette & Del Prette,
1999/2001).
Não há dados definitivos sobre como e quando são aprendidas as habilidades
sociais, embora a infância seja um período crítico (Caballo, 2002/2003). As crianças
reagem de forma diferente a todas as respostas sociais, como o contato físico nos
momentos de higiene, a observação dos pais, o aconchego do colo, bem como o
aleitamento (Del Prette & Del Prette, 1999/2001).
Os pais tornam-se modelos para muitos comportamentos sociais e organi-
zam-se como um sistema de regras, punindo ou recompensando o desvio ou a ade­
quação das crianças aos seus padrões. Já os irmãos são interlocutores que vivenciam
diferentes papéis possibilitando à criança experimentar diferentes relações e compor­
tamentos.
Assim, a habilidade social deve ser considerada dentro de um contexto cultural
determinado, sendo os padrões de comunicação amplamente variados entre culturas e
dentro de uma mesma cultura, dependendo de fatores como idade, sexo, classe social
e educação. Desta forma, o grau de eficácia que uma pessoa apresenta dependerá do
que deseja conseguir na situação específica em que se encontre. Mas, o comporta­
mento que é considerado apropriado em uma situação pode ser impróprio em outra.
Portanto, não é esperada uma forma correta de comportar-se que seja considerada
universal, mas uma série de diferentes enfoques que podem variar de acordo com o
indivíduo. Duas pessoas podem comportar-se de maneiras diferentes em uma mesma
situação, ou podem agir de forma diferente em duas situações similares, e tais respos­
tas podem representar o mesmo grau de habilidade social.
Ao definir o comportamento socialmente hábil é necessário levar em conta
tanto o conteúdo quanto as conseqüências. A ocorrência de qualquer habilidade é deter­
minada por fatores ambientais, variáveis da pessoa e a interação entre ambos. Uma
conceituai ização adequada do comportamento socialmente hábil implica três compo­
nentes de habilidade social: (a) uma dimensão comportamental (tipo de habilidade), (b)
uma dimensão pessoal (as variáveis cognitivas) e (c) uma dimensão situacional (o
contexto ambiental) (Caballo, 2002/2003).

A avaliação das habilidades sociais


A etapa inicial da avaliação do desempenho social dos indivíduos busca iden­
tificar as áreas problemáticas, bem como as não-problemáticas de seu repertório, que
deverão orientar objetivos e procedimentos específicos de intervenção. De acordo com

Angeluci R. B. Ribeiro, Qína Nolêío Bueno


McFall (1982), há duas questões de interesse relacionadas à avaliação das habilida­
des sociais. A primeira é teórica e prende-se à retação entre desempenho social, além
de outras variáveis e problemas psicológicos como: depressão, esquizofrenia,
delinqüência e diferenças sexuais. A avaliação objetiva compara o desempenho social
desses grupos, reconhecidos e uniformizados a partir dessas variáveis. A segunda se
relaciona à predição de ajustamentos sociais futuros baseando na avaliação do de­
sempenho social presente, e permite aferir a importância desse desempenho em dife­
rentes etapas ou condições de vida do indivíduo.
Para que haja significado às avaliações, é importante considerar como matri­
zes dos critérios normativos, o conhecimento sobre as dimensões situaciona! e cultural
do desempenho social do indivíduo (Del Prette & Del Prette, 1999/2001).
Embora a avaliação do desempenho social se justifique sob diferentes pris­
mas, a complexidade dessa tarefa deve ser considerada. Os principais problemas
residem em aspectos como a falta de consenso sobre o peso dos diferentes critérios
para se definir a competência social e a variedade dos conceitos de habilidades sociais
e de competência social, decorrentes da multidimensionalidade do desempenho soci­
al e da heterogeneidade de seus componentes. Apesar disso, são poucas abordagens
próprias da Terapia Comportamental e Cognitiva que dispõem de tantos e tão diversos
procedimentos de avaliação como, por exemplo, o Treinamento de Habilidades Sociais
ou THS (Caballo, 1993).
Porém, estudos como os de Del Prette e Del Prette (1999/2001), Caballo (2002/
2003), Bandeira e Quaglia (2006) demonstram que os défidts das habilidades sociais
podem ser substituídos por repertórios assertivos, através de programas dirigidos de
Treinamento de Habilidades Sociais - THS (Del Prette, Del Prette & Barreto, 2006).

Treinamento das habilidades sociais - THS


Caballo (2002/2003) sugere quatro elementos na estruturação do THS: (a) trei­
namento de habilidades sociais; (b) redução da ansiedade; (c) reestruturação cognitiva;
e (d) treinamento em solução de problema.
O (a) implica no ensinamento de comportamentos específicos praticados e
integrados ao repertório comportamental da pessoa. O (b) é conseguido através do
manejo da ansiedade que favorecerá a construção dos novos comportamentos mais
adaptativos. Já o (c) estará trabalhando a modificação de valores, crenças, cognições e/
ou atitudes da pessoa de forma indireta. E por fim, o (d) no qual ensina-se a pessoa a
perceber corretamente os ‘Valores’’ de todos os parâmetros situacionais relevantes; a
processar os “valores” desses parâmetros, visando gerar respostas potenciais; a
selecionar uma das respostas e a enviá-la de maneira que maximize a probabilidade
de atingir o objetivo que impulsionou a comunicação interpessoal.
Nesta perspectiva, Del Prette e Del Prette (1999/2001) sugerem como instru­
mentos essenciais para um eficaz e eficiente THS: ensaio comportamental, reforçamento,
modelagem, modelação (real e simbólica), feedback (verbal e videofeedback), relaxa­
mento, tarefas de casa, dessensibilização sistemática, bem como técnicas de
reestruturação cognitiva, como terapia racional-emotiva-comportamental, resolução
de problemas, parada de pensamento, modelação encoberta, instruções, dentre ou­
tras.
Os participantes em um programa de THS devem ter claro que o comportamen­
to assertivo geralmente é mais adequado e reforçador que os outros estilos de compor­
tamentos, ajudando a pessoa a expressar-se de maneira livre e a atingir os objetivos

Sobre Comportamento e Cognição 29


propostos. As pessoas aprendem a ser assertivas e não-assertivas através das expe­
riências ao longo de sua vida. Logo, serem assertivas torna-se essencial para a melhor
qualidade de vida.
A assertividade é um processo de aprendizagem que requer motivação. Uma
das maneiras de se conseguir motivar uma pessoa é mostrar-lhe as vantagehs de agir
assertivamente e as desvantagens que acompanham fazê-lo de forma não-assertiva
ou agressiva. O comportamento assertivo implica a expressão direta dos próprios sen­
timentos, necessidades, direitos legítimos ou opiniões, sem ameaçar ou castigar as
outras pessoas e sem violar os seus direitos. “A mensagem básica da asserção é: isso
é o que eu acho. Isso é o que eu sinto. É assim que vejo a situação. A mensagem
expressa ‘quem é a pessoa' e é dita sem dominar, humilhar ou degradar o outro indiví­
duo." (Caballo, 2002/2003, p.361).
O comportamento assertivo não é planificado para permitir que uma pessoa
obtenha o que quer, mas tem o propósito de comunicação clara, direta e não-ofensiva
das próprias necessidades, opiniões, etc. O comportamento assertivo em uma situa­
ção nem sempre tem como resultado a ausência de conflito entre as duas partes, aliás,
essa ausência total de conflitos é impossível. Há certas situações nas quais o compor­
tamento assertivo é apropriado e desejável, podendo causar algum incômodo à outra
pessoa. Logo, parece-nos que o comportamento assertivo resulta da maximização das
conseqüências favoráveis e da minimização das conseqüências desfavoráveis para as
pessoas, em íongo prazo (Caballo, 2002/2003).
Em geral, a pessoa que comporta-se de forma assertiva defende-se bem em
suas relações interpessoais, está satisfeita com sua vida social e tem confiança em si
mesma para mudar quando for necessário. O que é fundamental para se comportar de
forma assertiva é dar-se conta de si mesmo e do contexto que a rodeia. Dar-se conta de
si mesmo significa “olhar para dentro” para saber o que quer antes de olhar ao redor
para ver o que os demais querem e esperam em determinada situação.
O comportamento não-assertivo implica a violação dos próprios direitos ao ser
incapaz de expressar honestamente sentimentos, pensamentos e opiniões, permitin­
do aos demais que violem seus sentimentos, ou expressando os próprios pensamen­
tos e sentimentos de maneira autoderrotista, com desculpas, com desconfiança, de tal
forma que os demais possam não dar atenção. “Neste estilo de comportamento, a
mensagem total que se comunica é: Eu não conto - pode se aproveitar de mim. Meus
sentimentos não importam - somente os seus. Meus pensamentos não são importan­
tes - os seus são os únicos que valem a pena ser ouvidos. Eu não sou ninguém - você
é superior.” (Caballo, 2002/2003, p. 363).
Há um programa de treinamento que se centra em três específicos repertórios
comportamentais que parecem ser relevantes para as pessoas deprimidas, tais como:
a asserção negativa, a asserção positiva e as habilidades de conversação. A asserção
negativa implica comportamentos que permitem às pessoas defenderem seus direitos
e agirem baseadas em seus interesses. A asserção positiva refere-se à expressão de
sentimentos positivos acerca de outras pessoas, como afeto, aprovação, elogio e apre­
ço, além de apresentar as desculpas apropriadas. O treinamento em habilidades de
conversação inclui iniciar conversações, fazer perguntas, realizar auto-revelações apro­
priadas, bem como finalizar as conversações adequadamente. Em todas essas áreas,
treina-se o comportamento do cliente deprimido de forma direta e lhe proporciona trei­
namento em percepção social (Caballo, 2002/2003).

30 Angelucí R. B, Ribeiro, Çina Noíêío Bueno


Objetivo
O presente trabalho teve por objetivo investigar e descrever as contingências
estabelecedoras do repertório hábil social de um participante, do sexo masculino, com
a finalidade de melhor conhecimento dos comportamentos clinicamente relevantes.
Objetivou, também, avaliar se os déficits de habilidades estariam favorecendo a
manutenção da queixa clínica inicial do participante, visando um posterior delineamen­
to de intervenção terapêutica estruturada.

Método

Participante
Gabriel (nome fictício), 23 anos, à época deste estudo, solteiro, nível sócio
econômico baixo, garçom, ensino médio completo. O atendimento psicológico foi por
ele solicitado junto à Clínica Escola de Psicologia, ligada a uma instituição de ensino
superior.
História Clínica - Os dados sobre a história clínica de Gabriel são apresentados, base­
ados nas fases de seu desenvolvimento.
Tabela 1: História Clinica do Paticipante

Infância A d o le scê n cia A d u lta


(0 a 10 anos) (11 a 17 anos) (18 a 23 anos)

Nasceu na cidade de Pai muito ausente C o n sid e ra va sua


Belém. Infância infel­ emocionalmente, mas vida sexual s a tis ­
iz, por sentir falta do m enos a u to ritá rio . fa tó ria . Ao so fre r
pai. Pai era ausente Relacionamento es­ com o término do re­
emocionalmente, au­ tável com a mãe e lacionamento, procu­
toritário, rigído e chan- com os irmãos. Mo­ rou ajuda d e um
tagista (chorava rou com a tia materna psicólogo que o aler­
quando queria um durante quatro anos, tou de que ele só iria
fa v o r dos filh o s). pois não queria mu­ conseguir esquecer
Mãe era passiva, dar de cidade com os a ex-nam orada se
compreensiva, pais. por desejar con­ saísse de Belém. En­
cuidadosa com to­ tinuar na mesma es­ tão, Gabriei mudou-
dos. Sempre fez o cola, Ficando longe se para Goiânia aos
que podia para tor­ dos pais, sentiu mui­ 18 anos. Passou a
nar os filh o s p e s­ ta saudade da mãe. morar com sua Irmã.
soas do bem. Quan­ Passou a temer que Não se sentia res­
do não obedecia aos ela morresse, pois peitado nesse lar, re­
pais, ficava de cas­ desejava lhe retribuir solvendo mudar-se
tigo de joelhos sobre todo o carinho que ela de casa. Não man­
o chão e rezando, proporcionara a ele. teve contato com o
permanecendo um Fazia amigos com fa­ pai. Com a mãe, fala­
dia inteiro dentro de cilidade, mas não os va apenas por tele­
casa, sem poder mantinha por acredi­ fone. Trabalhou em
brincar. Foi punido tar só conseguir gos­ um supermercado e
fisicamente apenas tar de uma pessoa de lá conheceu uma ga­
pela mãe. Conside- cada vez. Os amigos rota, iniciando um re-

31
Infância Adolescência Adulta
(0 a 10 anos) (11 a 17 anos) (18 a 23 anos)

rou sua saúde exce- faziam piadas com [acionamento, após


fente. Foi cuidado seu.nome (real e não serem amigos por um
pela irmã, porque a o fictício, ora utiliza­ ano. Ficaram noivos
mãe trabalhava o dia do) e ele passou a e a mesma rompeu a
todo. Chupava os sentir vergonha ao se relação após dois
dedos e roia as apresentar ás pes­ anos e meio de na­
unhas. soas. Sua primeira moro, por causa das
relação sexual ocor­ previsões religiosas
reu aos 14 anos com feitas por sua mãe
uma mulher mais ve­ com relação ao na­
lha que ele. Namorou moro. Assim, Gabriel
com várias garotas, perdeu o interesse
mas não obteve su­ pela vida, pelo traba­
cesso nos relaciona­ lho, tornou-se desor­
mentos. Sendo um ganizado, emagre­
dos motivos o fato de ceu quatro quilos, e
Gabriel ficar com ou­ pensou em suicidar-
tras garotas, enquan­ se. Após dois meses
to namorava com uma do término do relacio­
delas. Apaixonou-se namento decidiu fa­
por uma garota aos zer íerapia.
17 anos. Aventurou-
se no relacionamen­
to to rnando-se ir ­
responsável.

Materiais e Ambiente
As sessões foram realizadas em um dos consultórios padrão de uma Clínica
Escola de Psicologia, ligada a uma instituição de ensino superior. Foram utilizados
materiais didáticos e pedagógicos, bem como o Questionário de História Vital de Lazarus
(1975/1980); Inventário de Depressão de B e c k - BDI; Escala de Desesperança de Beck
- BHS; Inventário de Ansiedade de Beck - BAI; Escala de Ideação Suidda de Beck - BSl
(Cunha, 2001); Inventário de Habilidades Sociais (Del Pretie & Del Prette, 2001/2003);
Inventário de Sintomas de Stress para Adultos - ISSL (Lipp, 2000); e Diários de Registros
de Comportamentos (Bueno & Britto, 2003).

Procedimento
O processo terapêutico foi composto pela díade terapeuta-estagiária e partici­
pante, com duas sessões semanais, com duração de cinqüenta minutos cada. Eie foi
composto peia fase de Investigação/Avaüação Clínica.

fnvestigação/Avaliação
Realizada entre a 1a e a 9a sessão. A primeira sessão iniciou-se com um
rapport, objetivando o estabelecimento de confiança significativa na relação terapêutica.

32 Angeiuri R. B, Ribeiro, Çina Notêto Bueno


Ainda nessa fase ocorreu a entrevista para a coleta de dados, verificando as queixas
descritas pelo participante, bem como o período de surgimento e duração das mes­
mas, possibilitando o início da Investigação/Avaliação. Houve, nesse momento, o con­
trato terapêutico, objetivando a explicação da metodologia de trabalho baseada na Tera­
pia Comportamental Cognitiva. Foi ressaltada a importância do processo de coopera­
ção, no qual o participante é ativo durante todo o processo terapêutico, o modo como as
sessões seriam estruturadas e a forma pela qual as estratégias iriam ser desenvolvi­
das. A fim de se obter maiores informações referentes às queixas do participante foi
utilizado, como tarefa de casa, o Questionário de História Vital de Lazarus (1975/1980),
que pesquisou minuciosamente questões relevantes de sua história, desde sua con­
cepção até o momento atual. Foi-lhe passado o Diário de Registro de Comportamento,
para monitorar os comportamentos clinicamente relevantes do mesmo, medindo sua
freqüência, duração, identificando os estímulos antecedentes a estes, bem como os
estímulos conseqüentes. Esse instrumento foi utilizado durante toda a Investigação/
Avaliação (Bueno & Britto, 2003).
Na segunda e terceira sessões foi realizada a análise do Questionário de His­
tória Vital de Lazarus (1975/1980), com a colaboração do participante, quando foram
verificadas todas as questões respondidas por ele. Foram trabalhados também os
Diários de Registros de Comportamento, visando observar os comportamentos emiti­
dos pelo participante durante o intervalo entre sessões, bem como a Análise Funcional
(Skinner, 1953/2000), com a finalidade de melhor compreensão das relações funcio­
nais entre os antecedentes e os conseqüentes às respostas apresentadas por ele.
Na quarta e quinta sessões foram trabalhados os Diários de Registros de
Comportamento, a Análise Funcional e conclusão das investigações do Questionário
de História Vital de Lazarus (1975/1980).
A sexta e sétima sessões serviram para melhor investigação dos eventos
registrados nos Diários de Registros de Comportamento, substanciando as análises
funcionais. Nelas ainda foram aplicados os testes da Bateria de Beck (Cunha, 2001):
inventário de Depressão de Beck (BDI), avaliador da presença e do nível de depressão,
com escores classificados em mínimo (0 a 11); leve (12 a 19); moderado (20 a 35) e
grave (36 a 63); Escala de Desesperança de Beck (BHS), pesquisadora da desespe­
rança, com escores: mínimo (0-4); leve (5-8); moderado (9-13); e grave (14-20); Inventá­
rio de Ansiedade de Beck (BAI), mensurador da intensidade da ansiedade vivenciada
pelo participante, cujos escores são classificados em mínimo (0 a 10); íeve (11 a 19);
moderado (20 a 30); e grave (31 a 63); Escala de Ideação Suicida de Beck (BSI), avalia­
dora da idéias e tentativas suicidas (Cunha, 2001). Houve, ainda, a aplicação do Inven­
tário de Habilidades Sociais, visando investigar o nível de habilidades do participante
em situações de enfrentamento, auto-afirmação, desenvoltura social, auto-exposição
às pessoas e às situações novas, e autocontrole da agressividade (Del Prette & Del
Prette, 2001/2003), assim como o Inventário de Sintoma de Stress para Adultos - ISSL
(Lipp, 2000).
Na oitava e nona sessões, além da investigação dos dados contidos nos Diá­
rios de Registros de Comportamento, substanciando as análises funcionais, houve a
investigação sobre os principais medos do participante e a corroboração dos resulta­
dos dos testes aplicados com sua história de vida.
A seguir, na Tabela 2, o procedimento é demonstrado de forma macro, pelo qual
é possível observar com clareza o desenvolvimento da Investigação/Avaliação sessão
por sessão.

Sobre Comportamento e Cognição 33


Tabela 2: Fases da Investigação/Avaliação por sessões

Sessões Procedim ento

Rapport; entrevista clinica; contrato terapêutico; educa­


1 “sessão ção sobre a Terapia Comportamental Cognitiva; Questio­
nário de História Vital de Lazarus; Diários de Registros
de Comportamento

Investigação do Q uestionário de H istória Vital de


2a e3a Lazarus; Diários de Registros de Comportamento;
s e s sõ e s Análise Funcional

Investigação do Questionário de História Vitai de Lazarus;


4a e 5 a Diários de Registros de Com portam ento; Análise
sessões Funcional

Diários de Registros de Com portam ento; Análise


Funcional; Aplicação da Bateria de Beck: BDI, BHS, BAI
e BSI; aplicação do IHS e do ISSL

8a e 9 a Diários de R egistros de Com portam ento; A nálise:


e Funcional, In ve stiga çã o dos p rincipa is medos;
sessões corroboração dos resultados dos testes aplicados com
a história de vida do participante

Resultados
Os dados, ora apresentados, foram coletados a partir da 1a sessão, prosse­
guindo até a 9a sessão, através de observações diretas e avaliações quantitativas no
setting terapêutico, bem como através de diários de registros feitos pelo participante,
quando em seu ambiente social.

Dados obtidos com a Bateria de Beck


Abaixo, são apresentados os resultados apontados pelo BDI, BHS, BAI, BSI,
quando da 6a sessão de investigação.

Tabela 3: Inventários de avaliação clinica aplicados no participante desse estudo

Linha de Base
inventário
(Sessões/Escore/Nível)
6a sessão - Escore 23: Nível Moderado
Depressão Beck - BDI

Escala Desesperança - BHS 6a sessão - Escore 8: Nível Leve

Ansiedade Beck - BAI 6a sessão - Escore 13: Nível Leve

6a sessão - Escore 3: Com Ideação


Escala de Ideação Suicida - BSI
Suicida

Angetuci R. B. Ribeiro, Çína Nolêto Bueno


Inventário de Depressão de Beck - BDI
Como demonstra a Tabela 3, Gabriel obteve escore 23, isto é, nivel moderado
de depressão nesse instrumento investigado. Chamam a atenção em seu BDI respos­
tas como: “Estou sempre triste e não consigo sair disto”; “Eu me sinto desanimado
quanto ao futuro"; “Não encontro um prazer real em mais nada”; “Eu me sinto culpado
grande parte do tempo”; “Estou decepcionada comigo mesmo"; "Sou crítico ém relação
a mim por minhas fraquezas ou erros”; "Choro mais agora do que costumava”; “Perdi a
maior parte do meu interesse pelas outras pessoas”; “Tenho mais dificuldades de
tomar decisões do que antes”; “Estou preocupado em estar parecendo velho ou sem
atrativo”; “Acordo 1 a 2 horas mais cedo do que habitualmente e acho difícil voltar a
dormir”; “Fico cansado mais facilmente do que costumava"; “Meu apetite não é tão bom
como costumava ser”; “Perdi mais do que 2 quilos e meio”; “Estou muito preocupado
com problemas físicos e é difícil pensar em outra coisa”; “Estou muito menos interessa­
do por sexo agora”.
Os fragmentos de sessões, a seguir, corroboram os resultados apontados
pelo Inventário de Depressão de Beck.

Fragmentos da 2ae 3a sessões:

(2asessão)
C: Fiquei o final de semana inteiro em casa.

T: Com qual finalidade?


C: Exclusivamente para pensar em meu rompimento.
T: Não havia compromisso socia) a cumprir?
C: Fugi de todos. Só queria chorar e lembrar.

(... na 3a sessão)
C: Não sinto mais prazer pelas coisas como antes.

T: Que coisas são essas?


C: Sair de casa, dançar, por exemplo.
T: Qual o motivo de você não sentir mais prazer por essas coisas?
C: Acho que é somente pelo rompimento do meu relacionamento.

Escafa de Desesperança de Beck - BHS


De acordo com a Tabela 3, Gabriel obteve escore 8, ou seja, nivel leve de
desesperança nesse instrumento investigado.
As respostas obtidas em sua BHS, as quais o participante considerou como
aplicando-se a ele foram: “Seria melhor desistir, porque nada há que eu possa fazer
para tornar as coisas melhores para mim"; “Não consigo imaginar que espécie de vida
será a minha em dez anos”; “As coisas simplesmente não se resolvem da maneira que
eu quero”; "O futuro me parece vago e incerto”. Já as respostas obtidas em sua BHS, as

Sobre Comportamento e Cognição 35


quais o participante considerou como não se aplicando a ele foram: “Quando as coisas
vão mal, me ajuda saber que elas não podem continuar assim para sempre”; “Acontece
que tenho uma sorte especial e espero conseguir mais coisas boas da vida do que uma
pessoa co m u m ”; “Minhas experiências passadas me prepararam bem para o futuro”;
“Posso esperar mais te m p o s bons do que maus”.
Estes resultados remeteram a investigação à 1a sessão do participante. Por ela
foi possível coletar o seguinte relato verbal dele;

Fragmentos da 1a sessão:
C: Hoje consigo perceber que as coisas não se resolvem da maneira que eu
quero.
T: Como é a maneira que você quer?
C: Eu quero voltar com minha ex-noiva, mas sei que não depende de mim.
T: Por qual motivo não depende de você?
C: Porque minha ex-sogra, através de previsões religiosas, convenceu minha
ex-noiva de que eu faria-lhe mai.
Os fragmentos de sessões, a seguir, também corroboram os resultados apon­
tados pela Escala de Desesperança de Beck.

Fragmentos da 3a sessão:
C: Já não sei como será meu futuro.
T: Por qual motivo?
C: Porque antes eu tinha pianos de casar com minha ex-noiva e agora já não
sei como será. Estou perdido. O futuro me parece incerto.
T: O que você considera um futuro incerto?
C: Um futuro sem planos, sem esperança.

Inventário de Ansiedade de Beck - BAI


Ainda pela Tabela 3, é possível observar que Gabriel obteve escore 13, isto é,
nível leve de ansiedade nesse instrumento investigado.
As respostas obtidas no BAI, consideradas como não o incomodando muito
foram: “Dormência ou formigamento”; “Sensação de calor"; "Atordoado ou tonto’'; "Ner­
voso"; "Tremores nas mãos"; “Indigestão ou desconforto no abdôm en”; "Rosto
afogueado”. Já as respostas obtidas nesse Inventário, consideradas como sendo-lhe
muito desagradáveis, mas suportáveis foram: “Incapacidade de relaxar”; “Medo de per­
der o controle"; "Suor" (não devido ao calor).
Os fragmentos de sessões, adiante, corroboram os resultados apontados pelo
BAI.

Fragmentos da 4asessão:
C: Âs vezes tenho a sensação de que irei perder o controle.
T: O que é perder o controle?
C: Não sei. Acho que é fazer uma besteira.

30 Angelud R. B, Ribeiro, Çina Noléto Bueno


T: Que tipo de besteira?
C: Se eu descobrir que ela está namorando outra pessoa, acho que vou brigar
com ela.
T: Por qual motivo você irá brigar com ela?
C: Porque acho injusto ela ter acreditado em sua mãe, quando disse que eu
faria-lhe mal.
T: Qual a vantagem de brigar com ela?
C: Talvez eu a fizesse enxergar o quanto sua mãe nos prejudicou.
T: O que ela iria fazer se enxergasse o quanto a mãe dela prejudicou vocês?
C: Talvez ela pudesse voltar para mim.
Na 5a sessão é possível analisar outros relatos verbais do participante,
favorecedores de uma melhor descrição de suas respostas ansiosas.

Fragmentos da 5a sessão:
C: Às vezes fico muito ansioso e meu corpo todo se altera. Sinto muito suor,
mas não é suor de quando estamos com calor.
T: Quando você percebe sentir esse suor?
C: Acredito que é sempre que penso em minha ex-noiva.
T: E quando você pensa em sua ex-noiva?
C: Quase o dia todo ou sempre que estou em casa.
T: Então você sente esse suor quase o dia todo ou sempre que está em casa?
C: Acho que sim.

Escala de Ideação Suicida de Beck - BSI


Observa-se na Tabela 3 que Gabriel obteve escore 3 na BSI, significando haver
a presença de ideação suicida.
As respostas obtidas na BSI foram: “Minhas razões para viver ou morrer são
aproximadamente iguais”; “Eu estou um tanto preocupado a respeito de me matar por
causa da minha família, de meus amigos, de minha religião, de um possível dano por
uma tentativa mal sucedida, etc.”; “Tenho evitado contar às pessoas sobre a vontade de
me matar”.
Em vários momentos de suas sessões, o participante relatou seus pensamen­
tos suicidas, motivados por sua frustração sentimental. Mas foi na 2a sessão dele, onde
houve um maior número dessas verbalizações.

Fragmentos da 2asessão:
C: Um dia após o término do meu relacionamento, pensei em me matar.
T: Como foi esse pensamento?
C: Foi um pensamento de que eu não iria agüentar viver sem ela.
T: Em que morrer resolveria o seu problema?
C: Eu iria parar de sofrer.

Sobre Comportamento e Cognição 37


T: E morrendo poderia viver sem esse seu problema?
C: Não havia pensado nisso.
{•••)

C: Naquele dia, pensei que minhas razões para morrer, estavam como minhas
razões para viver.
T: Pode me explicar melhor?
C: Para mim, não fazia diferença viver ou morrer. Eu já não queria saber de mais
nada. Tinha perdido o prazer pela vida.

Resultados obtidos pelo inventário de Habilidades Sociais (IHS)


Os resultados dispostos na Figura 1 apresentam o repertório de habilidades
sociais do participante, investigado no decorrer da 7a sessão, através do Inventário de
Habilidades Sociais

-IHS:

Figura 1 - Resultados Fatoriais e Total no Inventário de Habilidades Sociais - IHS.

Os dados apresentados na Figura 1 demonstram repertório global de habilida­


des sociais do participante: percentil 20, portanto, caracterizando déficits nesse repertó­
rio.
Já os resultados em cada um dos fatores, neste instrumento, são apresenta­
dos de forma mais descritiva, a seguir.

F-1: Enfrentamento e auto-afirmação com risco


Como demonstra a Figura 1, Gabriel alcançou escore 5 neste fator, revelando
ausência total de habilidades em relação: "Cobrar dívida de amigo”; “Abordar para rela­
ção sexual” e “Apresentar-se a outra pessoa". Compreendem seu baixo repertório nes­
te fator: “Declarar sentimento amoroso”; “Discordar de autoridade”; “Manter conversa
com desconhecido”; "Discordar do grupo”; “Lidar com críticas injustas”; e “Fazer pergun­
ta a conhecidos".

38 Angefuci R. B. Ribeiro, Q i n a Nolêto Bueno


F-2: Auto-afirmação na expressão de sentimento positivo
De acordo com a Figura 1, o participante obteve percentil dentro da mediana
esperada: 50. Porém, neste fator suas baixas habilidades referem-se a: “Defender
outrem em grupo”; "Elogiar outrem”; e “Expressar sentimento positivo".

F-3: Conversação e desenvoltura social


Segundo os dados apresentados peia Figura 1, Gabriel obteve o segundo maior
percentil: 80. Ainda que apresentando um alto escore neste fator, houve a presença de
déficit com relação a: “Encerrar conversa ao telefone”.

F-4: Auto-exposição a desconhecidos e situações novas


Gabriel obteve percentil 30, como pode ser observado na Figura 1, significando
um baixo repertório hábil neste fator. Seus principais déficits relacionam-se a: “Fazer
pergunta a desconhecidos"; “Pedir favores a desconhecidos"; e “Falar a público desco­
nhecido".

F-5: Autocontrole da agressividade


Este foi o fator de capacidade hábil máxima, o dobro da mediana esperada,
como pode ser percebido na Figura 1: 100. Mas, ainda assim, o participante apresentou
baixa habilidade quanto a: “Cumprimentar desconhecidos”.

Itens que não entraram em nenhum fator do IHS


Dos 7 itens avaliados nesta classe o participante apresentou déficit em 3 deles:
"Negociar uso de preservativo”; “Recusar pedido abusivo"; e “Interromper a fala do
outro".

Habilidades sociais e auto-regras


A Tabela 4 ilustra algumas das baixas habilidades sociais e auto-regras mais
relevantes do participante, identificadas ao iongo das 9 sessões realizadas.
Tabela 4: Baixas habilidades sociais, conseqüências e auto-regras.

Baixas Habilidades Conseqüência A u to -regras

Dificuldade em encerrar Mente para as Minto para a pessoa não


conversa ao telefone pessoas falar no assunto
Devido às piadas que os ami -
gos da adolescência fizeram
Dificuldade em apresentar- Não posso me apresentar
com relação ao seu nome (real
se a outra pessoa às pessoas, pois elas irão
e não o fictício, ora utilizado), o
rir de meu nome
participante passou a não a -
presentar-se às pessoas, por
sentir vergonha do mesmo
Tenho que ter um amigo
Dificuldade em ter vários Sente-se sozinho de cada vez, pois não
consigo gostar de vários
amigos
ao mesmo tempo

Sobre Comportamento e Cognição 39


Resultado apresentado pelo ISSL
Os resultados alcançados pelo participante no ISSL, aplicado na 7a sessão da
investigação clinica estão demonstrados na Tabela 5.

Tabela 5: - Inventário de Sintomas de Stress para Adultos (ISSL)

Quadros Total Diagnóstico

Q1 R
D O resultado aponta para
estresse físico e
O? 9 psicológico, na fase de
resistência
Q3 14

As respostas obtidas no ISSL, quanto ã presença de estresse físico, foram: "Nó


no estômago”, “Aperto da mandíbula", “Diarréia passageira", ‘Taquicardia1', “Mudança
de apetite”, “Problemas com a memória”, "Mal-estar generalizado sem causa especifi­
ca”, “Formigamento das extremidades”, “Aparecimento de problemas dermatológicos",
“Tontura/sensação de estar flutuando",. “Dificuldades sexuais e tiques”. Já as respostas
obtidas no ISSL, quanto à presença de estresse psicologia), foram: “Sensibilidade
emotiva excessiva”, "Pensar constantemente em um só assunto”, “Diminuição da libi­
do”, “Sensação de incompetência em todas as áreas”, “Vontade de fugir de tudo", “Apa­
tia", “Depressão ou raiva prolongada”, “Irritabilidade sem causa aparente”, “Angústia/
ansiedade diária", bem como “Perda do senso de humor".

Análise Funcional
A Análise Funcional foi realizada entre a 2a e a 9a sessões desta fase de inves­
tigação clínica. Os Diários de Registros de Comportamento deram-lhe sustentação. Na
Tabela 6 são apresentados 2 resultados obtidos com esse instrumento.
Tabela 6: Análise funcional de comportamentos desadaptados (3a Sessão)

Estím ulo (S) R esposta (R) C o n se q ü ê n cia s (C)

24:00 - Antes de Encobertas: diz a si mesmo que não há Não acredita que
dormir, pensa na ex- condições de viver longe da ex-noiva conseguirá esquecer
noiva Fisiológicas: taquicardia; tremores, a ex-noiva, demora a
sudorese dormir e no outro dia
Em ocionais: desesperança; tristeza; acorda com intensa
sofrimento dor de cabeça
Operantes: fica na cama quieto, sem ação

Encobertas: diz a si mesmo que sente muita Não allmenta-se


15:30 - Ouve saudade da ex-noiva e que não conseguirá corretamente e sente
músicas românticas viver sem ela intensa dor de
e escreve diversas F isiológicas: sudorese; taquicardia; calafrio cabeça
cartas à ex-noiva E m ocionais: tristeza
Operantes: chora compulsivamente

40 Angelud R. B. Ribeiro, Qina Nolêto Bueno


A demonstração da problemática vivenciada pelo participante, apresentada na
Tabeia 6, favoreceu uma melhor descrição das contingências aversivas e controladoras
do repertório comportamental inadequado do participante.

Avaliação dos principais medos


Gs principais medos do participante, sentidos por ele no decorrer de sua vida,
geradores das mais diversas conseqüências, estão descritos na Tabela 7. A identifica­
ção da origem de cada um deles favoreceu uma melhor anáiise deles.

Tabela 7: Resultado dos Principais Medos (8a sessão)

P rin c ip a is Medos O rig e m C o n se q ü ê n cia

“Nunca tive anteriormente uma


Medo de ficar só pessoa que demonstrasse Insegurança, complexo de
interesse e se propusesse a inferioridade
lutar por mim"

"Não tenho muita sorte com as


Medo que ninguém goste dele Sofrimento, perda, raiva
mulheres. Elas me detonam e
vão embora”

Medo de perder o controle “Desequilíbrio sentimental ou Vida infeiiz, vazia de emoções.


total da sua própria vida emocional. Não sei ao certo” Maus pensamentos e falta de
objetivos visiveis

Medo de perder sua mãe sem “Distância física em que nos Sensação de ser um filho
dar-lhe o carinho, a atenção e encontramos há algum tempo” pouco afetuoso
o amor que ela merece

“Tenho medo do desconhecido. Sente um desespero sem


Medo de morrer Tenho dúvida se haverá algo explicação
além daqui, deste plano”

Medo de nunca conseguir “Falta de planejamento e Fico se perguntando: ‘ Será que


objetivos que pareciam-lhe tão organização da minha vida. sou capaz, ou sempre
próximos no passado Talvez não tenha me dependerei de alguém para me
empenhado como deveria” motivar?"

Medo de não conquistar um Medo do novo quevírá. Ou


novo espaço que o permita “Mesmice durante 3 anos” talvez das surpresas
querer ser um cara que quer
mudar

Sobre Comportamento e Cognição 41


Discussão
Staats (1996) afirma que as pessoas ao longo do seu desenvolvimento vão
recebendo estímulos que irão determinar seu repertório de comportamento: adaptado
ou desadaptado. Sendo assim, pode-se observar através da história de vida do partici­
pante, que o mesmo recebeu estímulos que determinaram seus repertórios de com­
portamentos desadaptados. Um deles foi o fato de seus amigos terem feito piadas com
o seu nome (real e não o fictício, ora utilizado) e o mesmo, posterior a esse evento, sentir
vergonha de apresentar-se às pessoas.
Não há dados definitivos sobre como e quando são aprendidas as habilidades
sociais, embora a infância seja um período crítico (Caballo, 2002/2003). Nesse contex­
to, os pais tornam-se modelos para muitos comportamentos, além de organizarem-se
como Um sistema de regras, punindo ou recompensando o desvio ou a adequação
delas aos seus padrões (Del Prette & Del Prette, 1999/2001). Desta forma, fica claro na
história de vida do participante, que eíe apresentou um déficit de habilidade social ao
ficar afastado emocionalmente do pai, visto que o mesmo era ausente emocionalmen­
te, autoritário, rígido e chantagista.
Sendo assim, a partir dos resultados da Bateria de Beck (Cunha, 2001), ilustra­
dos na Tabela 3, foi possível aferir a intensidade dos repertórios-problema do partici­
pante. Resultados corroborados com sua história de vida, bem como pelos fragmentos
das sessões apresentados neste estudo.
Já pelos resultados do IHS, ilustrados na Figura 1, percebe-se um déficit em
habilidades sociais. Porém, seu repertório global apresentou-se muito abaixo da medi­
ana esperada (20), o que pode estar favorecendo os insucessos em sua vida, gerando-
lhe um estado emocional negativo, favorecendo-lhe um repertório verbal igualmente
negativista. Dados estes que podem ser observados na Tabela 4, que demonstra as
baixas habilidades sociais do participante e suas auto-regras negativistas, como: difi­
culdade em apresentar-se a outra pessoa, por acreditar que ela fará piadas com seu
nome. A relação entre ambas as dificuldades sugere que as mesmas podem ter bene­
ficiado a formação de seus repertórios-problema, já que a disfunção cognitiva do indiví­
duo é, como adverte Caballo (2002/2003), componente importante na construção do
comportamento desadaptado, bem como terem favorecido-lhe a construção do estresse.
Assim, através da Tabela 5, foi possível perceber que o participante desenvol­
veu estresse físico e psicológico na fase de resistência, visto que apresentou reações
fisiológicas como: taquicardia, insônia, perda do senso de humor, sensibilidade emotiva
excessiva, pensar constantemente em um só assunto.
As análises funcionais, demonstradas na Tabela 6, favoreceram um maior co­
nhecimento dos comportamentos clinicamente relevantes do participante com relação
às contingências sociais nas quais tinha que apresentar uma resposta assertiva. E
essas contingências, muitas vezes, foram interpretadas pelo participante como muito
aversivas, conseqüenctando-lhe comportamentos inadequados como: não acreditar
que esqueceria a ex-noiva, o que estava prejudicando seus ciclos sono-vigília e alimen­
tar. Sendo assim, Caballo (2002/2003) salienta que aquelas pessoas que não conse­
guem adaptar-se ao seu meio ambiente, apresentam os chamados comportamentos
desadaptados, que podem ser consequenciados pela disfunção cognitiva do indivíduo,
quando o mesmo, ao perceber os eventos de forma negativa, constrói perturbações
emocionais que influenciarão negativamente seu comportamento. Logo, os comporta­
mentos desadaptados são aqueles que o indivíduo não consegue ter controle de suas

Angeluci R.. B. Ribeiro, Qina Nollto Bueno


respostas, sendo considerados com comportamentos sociais e culturais inadequados
(Staats & Staats, 1966/1973).
Esses resultados parecem demonstrar que os déficits comportamentais apre­
sentados, pelo participante podem estar sendo mantidos pelo próprio medo das diver­
sas situações, que, em princípio, não geravam-lhe medo, mas com a discriminação
negativa das situações e com o acréscimo das próprias inabilidades comportamentais
passaram a reforçar e agravar a manutenção dos repertórios-problema de Gabriel,
formando-se assim uma cadeia de problemas.
Com relação aos dados apresentados na Tabela 7, pode-se perceber os prin­
cipais medos do participante no decorrer de sua vida, como: medo de perder sua mãe
e medo de que ninguém goste dele. Esses medos provocaram prejuízos diversos
como: sensação de ser um filho pouco afetuoso e sentimentos de sofrimento e raiva.
Del Prette e Del Prette (1999/2001) apontam que todos os seres humanos nascem com
um potencial biológico, mas mesmo assim, ao nascer, eles são um dos seres mais
desamparados. E sua saída desse status ~ de desamparo para amparo - implicará ter
de aprender novos repertórios, imprescindíveis ao seu processo de interação com ó
meio ambiente. Ambiente esse que continuamente transforma-se, pela própria presen­
ça do indivíduo nele.
Intervir no comportamento humano não é tarefa simples. E mais complexa se
toma ainda quando as auto-regras negativistas produzem as respostas constantes na
vida de um indivíduo, estando este inserido em um ambiente social pouco reforçador e
muito punitivo.
A avaliação do desempenho social é, de acordo com Caballo (1993), tarefa
imprescindível, mas muito complexa, visto que ocorre sob diferentes prismas.
Para que haja significado às avaliações, é importante considerar como matri­
zes dos critérios normativos, o conhecimento sobre as dimensões situacional e cultural
do desempenho social do indivíduo (Del Prette & Del Prette, 1999/2001). As contingên­
cias que estabelecem as habilidades sociais precisam ser objetivos centrais de avali­
ação clínica antes de haver intervenção terapêutica em qualquer problemática de um
indivíduo. Esse cuidado favorecerá um programa de tratamento eficaz e eficiente.
A partir dos resultados, pode-se avaliar como os déficits de habilidades favore­
ceram-lhe a manutenção de sua queixa inicial, ou seja, conseqüências negativas diver­
sas, motivadas por sua inabilidade para lidar com o rompimento de relação afetiva.
Desta forma, este estudo sugere a continuidade da investigação ao longo do
processo de intervenção para o melhor treinamento de habilidades sociais adequadas,
redução da ansiedade, reestruturação cognitiva, bem como treinamento em solução de
problema.

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44 Angeluri R. B, Ribeiro, Qina Nolêto Bueno


Capítulo 4
Comportamento verbal na prática
clínica: considerações sobre o
operante na Análise do
Comportamento*
Naiene dos Santos Pimentel
UFSCar
Carmen Silvia M otta Bandini
UFSCar
Juliana Cristina Donadone
USP
Julio César C de Rose
UFSCar
Sonía Beatriz M eyer
USP
João de Fernandes Teixeira
UFSCar

Um dos grandes desafios do terapeuta analítico-comportamental é transpor


os conhecimentos teóricos para a prática clínica. Análises que relacionem aspectos
conceituais e práticos podem vir a favorecer o trabalho do terapeuta neste sentido.
Um conceito que se apresenta como chave na filosofia behaviorista e é de
extrema importância dentro do contexto clínico é o conceito de probabilidade de respos­
tas. fsto porque a probabilidade é, segundo Skinner (1953/1965; 1957; 1969), o ele­
mento central ordenador dos dados do comportamento operante, na medida em que
possibilita a previsão e o controle do comportamento. Ma prática clínica prever e contro­
lar são papéis fundamentais do terapeuta.
Sendo assim, este trabalho pretende discutir a noção de probabilidade de
comportamento. Contudo, pretende transpor a análise do escopo conceituai para a
prática clínica, permitindo que se apontem quais os elementos presentes no discurso
do cliente que permitem ao terapeuta inferir alta ou baixa probabilidade de comporta­
mentos desejáveis e indesejáveis de seu cliente. Para isso, este texto percorrerá um
longo caminho. Inicialmente, analisar-se-á o conceito de probabilidade no comporta­
mento não verbal, enfatizando-se como Skinner o concebe. Em seguida, buscar-se-á

‘ Os autores deste texto contaram com apoio financeira da CAPES, CNPq e FAPESP.

Sobre Comportamento e Cognição 45


en te n d e r como a probabilidade pode ser entendida na concepção de comportamento
verbal, elemento central de uma análise clínica. Ao final, pretende-se mostrar por meio
de exemplos de casos clínicos, alguns aspectos específicos do comportamento verbal
do cliente que informam ao terapeuta a probabilidade de comportamento deste (Meyer;
Oshiro; Donadone; Mayer e Starling; (no prelo)).1

1 - Definição de Comportamento Operante: Aspectos relevantes para


a tecnologia comportamental
Para buscarmos “o lugar" da probabilidade de respostas na análise do operante
e verificarmos sua função na psicoterapia, acreditamos ser necessária antes, a apre­
sentação de alguns aspectos considerados por Skinner (1969) como obscurecedores
das variáveis ambientais que realmente determinam o comportamento e, sendo assim,
obscurecem o papel da probabilidade na análise do comportamento. Vejamos isso
mais de perto.
Skinner (1953/1965) apresenta o que denomina “causas populares” e “causas
internas”, como principais desviantes da atenção aos aspectos ambientais que de fato
importam para a determinação da probabilidade do comportamento. Segundo o autor,
causas populares seriam aquelas que dizem respeito a eventos que coincidem com a
emissão do comportamento e à estrutura física e genética do indivíduo. Já as causas
internas seriam eventos ou processos localizados no interior do indivíduo, sejam reais,
como os eventos neurais, ou supostos, como eventos psíquicos. Estas causas seriam
insuficientes ou impróprias na explicação do comportamento porque atribuem a causa,
segundo o autor, à: 1) variáveis imutáveis, como a genética e a estrutura física do
indivíduo; 2) variáveis localizadas em outros níveis de explicação, como a Biologia ou
Fisiologia ou mesmo 3) à variáveis meramente conceituais, como é o caso dos elemen­
tos psíquicos2
Além disso, Skinner (1969) apresenta uma crítica semelhante no que diz res­
peito ao obscurecimento de uma análise experimental séria da probabilidade de res­
postas, mostrando a existência de práticas explicativas equivocadas. O autor apresenta
basicamente seis dessas práticas.
A primeira delas seria considerar o comportamento um mero sintoma de
atividades mentais ou fisiológicas. Aqui, a taxa de respostas permitiria apenas acompa­
nhar um processo ou determinar um estado ou condição. Um exemplo que ilustra essa
prática é considerar a alta taxa de ingestão de alimentos como sintoma de fome (esta­
do) ou compulsão por comida (condição). Não se espera, nesses casos, que o compor­
tamento seja muito ordenado, uma vez que a estabilidade é buscada em estados e
processos inferidos com o auxílio de procedimentos estatísticos.
1Este capitulo é uma tentativa de interligar duas importantes fonmas de análise disponíveis ao analista do comportamento: a análise conceituai
e a prática clinica. As discussões que resultaram neste textovieram de análises particulares dos autores, mas que em um esforço conjunto,
procuraram unificara psicoterapia e a filosofia skinneriana do comportamento. Aspectos importantes tratados aqui, no quedlz respeito à
psicoterapia, podem ser encontrados em outra publicação, ainda no prelo: Meyer Oshiro; Donadone; Mayer e Starling (2006). “Subsídios da obra
“Comportamento Verbarde B.F.Sklrmer para a terapia analKico-connportamenta!". Revista Brasileira de Terapia Comportamental e Cognitiva

3Skiiner, evidentemente, nâo ignorava que o comportamento é Influenciada por fatores genéticos e que hé mecanismos fisiológicos e neurais
envolvidos na produção do comportamento. Se sustentava, no entanto, que leis vátldasreladonando comportamento a eventos ambientais podem
ser estabelecidas mesmo sem conhecimento dos mecanismos biológicos, embora um conhecimento dos processos fisiológicos e genéticos
venha a fornecer um quadro mais completo, elucidando os mecanismos dos processos comportamentais. É importante observar, também, que
na época em qua Skinner escrevia, o conhecimento dos mecanismos biológicos era bem más precário e os pfoces3c» aventados como causa
do comportamento eram geralmente hipotéticos. Nas últimas décadas a fisiologia do comportamento tomou-se, como previa Skinner, multo melhor
conhecida, assim como a genética do comportamento (e.g., Carison.2006; Plomin, DeFrfes, McCIeam, & McGuffin 2008), de modo que o
conhecimento dos processos comportamentaisjá incM uma compreensão bem mais avançada dos mecanismos biológicos, sem que Isso invalide
as leis relacionando comportamento a eventos ambientais.

46 N. dos S. Pimentel, C. S. M, Bandini, J. C. Donadone, J. C.


Rose, S. B. Meyer, J, F. Teixeira
A segunda prática equivocada apontada pelo autor seria aquela em que o com­
portamento apresentado é considerado significativo apenas no satisfazer a certos crité­
rios, como em avaliações de desenvolvimento. Nesses casos, o aumento na taxa de
apresentação de comportamentos previamente estipulados (geralmente por critérios
estatísticos) é atribuído à maturação genética ou cognitiva, por exemplo.
Considerar as mudanças na probabilidade como se fossem respostas ou atos
seria a terceira prática criticada por Skinner (1969). Por exemplo, quando afirmamos
que um individuo "aprendeu a discriminar”, estamos dizendo muito pouco acerca de
seu comportamento. A ênfase deve ser dada à taxa de respostas diferenciais diante de
dois ou mais estímulos.
O autor aponta ainda que algumas dimensões estudadas, embora sejam
quantificáveis, não estão relacionadas de forma simples à probabilidade de respostas.
Por exemplo, o tempo necessário para completar uma tarefa é perfeitamente quantificável,
porém não esclarece muito acerca da probabilidade. Já a taxa de respostas “é uma
dimensão básica, não apenas porque as respostas podem ser contadas acuradamente,
mas porque a taxa é relevante para uma ciência do comportamento" (Skinner, 1969, p. 77).
A quinta prática apontada por Skinner como pouco útil para a análise experi­
mental seria o uso de testes psicológicos. De forma geral, os dados não são obtidos
em um espaço experimental controlado. Além disso, os escores tomados como critério
ou medida possuem características arbitrárias. Também, em última análise, os dados
obtidos em termos de frequência de comportamentos são comumente interpretados
como sintomas de entidades internas, como traços, habilidades, personalidade.
A sexta e última prática descrita por Skinner (1969) seria a de substituir a obser­
vação do comportamento por relatos do sujeito acerca da probabilidade de suas res­
postas diante de determinadas circunstâncias. O sujeito pode não descrever
corretamente, tanto acerca da probabilidade de suas respostas como das circunstânci­
as envolvidas. O caminho percorrido por Skinner, portanto, parte da critica a práticas que
obscurecem o papel da probabilidade de resposta na explicação do comportamento,
conferindo-lhe status de mero sintoma ou critério de existência de processos intemos,
ou ainda como comportamentos em si.
Se tais causas e práticas são tidas como equivocadas e obscurecedoras de
uma análise efetiva, devemos supor que o Behaviorismo Radical de Skinner deve estar
na contramão desses tipos de explicação. Para Skinner, o comportamento é visto como
função das variáveis ambientais e o comportamento operante é aquele que atua no
meio gerando conseqüências. Estas, por sua vez, podem retroagir sóbre o organismo
e quando isto acontece, elas mudam a probabilidade de que o comportamento que as
produziu ocorra novamente. No entanto, uma resposta que já ocorreu não pode ser
prevista ou controlada. Apenas podemos prever a ocorrência futura de respostas seme­
lhantes, ou seja, a unidade de análise é uma classe de respostas.
Dentro deste contexto, podemos entender como o conceito de probabilidade de
respostas passa a ser fundamental na compreensão do papel das conseqüências no
comportamento operante: se apenas podemos prever a ocorrência futura de respostas
semelhantes às emitidas nos passado, então, somente podemos trabalhar com a
probabilidade de que estas respostas serão emitidas.
A probabilidade de emissão de uma resposta refere-se à variação do estado
dessa resposta, ou seja, a probabilidade varia entre um estado em que a resposta
nunca ocorre e um estado em que ela sempre ocorre. Por se referir a uma estado do
comportamento, a probabilidade não pode ser observada. As expressões cotidianas

Sobre Comportamento e Cognição 47


que carregam a noção de probabilidade, como “tendência" e "predisposição", apontam
para a freqüência com que os comportamentos ocorrem. Dizemos, por exemplo, que
uma pessoa é uma entusiasta do futebol quando observamos que ela fala sobre o
assunto freqüentemente.
Para Skinner (1969, p. 78), “uma tarefa da análise experimenta] do comporta­
mento é descobrir todas as variáveis das quais a probabilidade de resposta é função”.
O estímulo é uma importante variável independente. Na psicologia estímulo-
resposta ele era tido como incitador, algo que forçava o organismo a responder. Por
outro lado, teorias contrárias a esta visão atribuíam ao ambiente um papel totalmente
passivo diante do organismo, como sugerem termos do tipo “detectar’', “perceber”, que
não especificam o que o organismo está realmente fazendo (Skinner 1969)
Skinner (1969) defende que a posição da análise experimental do comporta­
mento deve diferir das anteriores. O estímulo não deve ser considerado uma força
inexorável sobre o comportamento, mas o ambiente não configura um cenário passivo
diante da ação do organismo. É nesse contexto que a noção de probabilidade de res­
postas constitui uma ferramenta importante do analista do comportamento. Quando
dizemos que o comportamento atua no meio gerando conseqüências, e estas, por sua
vez, alteram a probabilidade de ocorrência futura da classe de resposta, localizamos no
intercâmbio organismo-ambiente a possibilidade de previsão e controle do comporta­
mento.
A proposta de Skinner (1953/1965) no que diz respeito à probabilidade de com­
portamento é analisá-la em termos de contingência de reforço.
Inicialmente deve-se considerar que a noção de probabilidade de respostas
baseia-se em uma propriedade particular da relação operante, seu caráter não-
inexorável. Ou seja, como mencionamos anteriormente, o comportamento operante é
emitido, e não eliclado como o reflexo. Conseqüentemente, na descrição de uma con­
tingência de três termos, dizemos que o estímulo é a ocasião na qual a resposta é
seguida de reforço. O efeito resultante é que a resposta torna-se mais provável na
presença do estímulo, e o processo através do qual esse efeito ocorre é chamado de
discriminação, sendo o estímulo denominado, então, estimulo discriminativo. A conse­
qüência prática do tipo de relação que descrevemos é que quando uma discriminação
foi estabelecida, podemos alterar a probabilidade de uma resposta, apresentando ou
removendo o estimulo discriminativo.
A noção de probabilidade de comportamento explicita, em conjunto com a no­
ção de estímulo discriminativo, o caráter não-inexorável da relação funcional entre o
estimulo, a resposta e a conseqüência. Vale enfatizar ainda que a probabilidade, no que
diz respeito ao comportamento operante em geral, é inferida, geralmente, da taxa de
respostas e pode ser alterada através da manipulação de estímulos.
Nessa conclusão, evidenciamos a importância da noção de probabilidade de
comportamento para a tecnologia comportamental. Skinner (1971) considera que a
previsão e o controle são fundamentais ao desenvolvimento da tecnologia. Como dis­
semos anteriormente, um comportamento não se repete, ou seja, não podemos contro­
lar uma resposta que já ocorreu. Prevemos e controlamos respostas da mesma clas­
se, ou seja, que compartilham da mesma relação funcional. Nesse contexto, a aplica­
ção prática da noção de probabilidade configura uma ferramenta importante para o
tecnólogo. A partir da taxa de respostas apresentada, é possível inferir a probabilidade
de ocorrência futura do comportamento. Como dissemos anteriormente, a probabilida­
de pode ser alterada pela apresentação ou supressão do estimulo discriminativo, bem

48 N. dos S. Pimentel, C. S. M. Bandíni, J. C. Donadone, J. C.


Rose, S. B. Meyer, J. F. Teixeira
como por mudanças nas conseqüências do responder. Dessa forma, o analista do
comportamento pode arranjar contingências que podem alterar a probabilidade da
emissão de determinados comportamentos, com base na história de reforço.
É importante destacar, no entanto, que em termos de tecnologia, e, portanto de
psicoterapia, o controle sobre as variáveis é comumente mais difícil do que no ambiente
experimental. Geralmente não temos acesso a uma grande quantidade de contingên­
cias que controlam o comportamento do indivíduo nos diferentes contextos em que ele
se insere. No entanto, o arranjo de contingências mais amplas pode auxiliar na genera­
lização do controle das variáveis manipuladas.
Dito isso, como podemos efetivamente levar esta discussão para o comporta­
mento verbal e, em seguida, para a prática clínica? Em outras palavras, podemos veri­
ficar como a noção de probabilidade pode ser introduzida quando o assunto é compor­
tamento verbal e como o psicoterapeuta pode inferir a probabilidade de uma resposta,
dentro do discurso do cliente, para basear suas intervenções.
Vejamos estas questões a partir de agora.

2 - A noção de probabilidade no comportamento verbal


Para realizarmos uma análise que permita esclarecer como o conceito de proba­
bilidade de emissão de uma resposta se enquadra na análise do comportamento verbal,
precisamos, baseados no que foi dito anteriormente, (re) introduzir algumas idéias.
Na teoria skinneriana do comportamento, como vimos, variáveis dependentes
podem ser encontradas de forma a satisfazer certa ordenação dos dados
comportamentais. No caso do operante, este papel é desempenhado pela taxa de
reposta. Isso significa dizer que quando um organismo “aprende” um comportamento,
verifica-se que a taxa de respostas aumenta e quando tal comportamento é colocado
em extinção, a taxa diminui. A taxa de respostas é, portanto, segundo Skinner (1950/
1972), o dado que varia de forma significante para a direção esperada, nas condições
relevantes para o processo de condicionamento. A taxa é um dado importante porque,
na verdade, “nunca podemos observar a probabilidade como tal” (Skinner, 1953/1965,
p. 62), apenas podemos observar a ocorrência da resposta e, neste sentido, podemos
observar a taxa. Desta forma, no caso dos operantes não verbais, observar a própria
emissão das respostas deve ser uma medida de observação da probabilidade em si.
Isso significa dizer que no caso do comportamento não verbal encontrar a probabilidade
se mistura com medir a emissão real de uma dada resposta.
Contudo, isso se dá da mesma forma no caso do comportamento verbal?
Vamos tentar explorar melhor esta questão.
O comportamento verbal foi definido por Skinner (1957) como comportamento
operante. Sua diferença quando comparado ao comportamento não verbal é que o
comportamento verbal tem suas conseqüências mediadas pela ação de outro indiví­
duo, sendo o comportamento de mediação deste outro, condicionado pela comunidade
verbal. Isso significa dizer que o comportamento verbal é uma forma de comportamento
que age indiretamente sobre o ambiente, pois seu primeiro efeito é sobre um outro
homem preparado pela comunidade verbal para responder adequadamente. Usando
o exemplo clássico de Skinner: comportamento verbaí pode ser encontrado quando um
homem com sede pede a outro que lhe fraga o copo de água, em vez de ele próprio ir
buscar um pouco de água para beber (Skinner, 1957, p. 1). Neste caso, a conseqüência
do comportamento de pedir a água, que é receber a água, é mediada pelo comporta­
mento do indivíduo que trouxe a água.

Sobre Comportamento e Cognlçlo 49


Diante desta definição, comportamento verbal e comportamento não verbal não
têm diferenças de natureza. Sendo assim, explicar comportamento verbal consiste na
mesma tarefa que explicar comportamento não verbal, ou seja, consiste na procura de
relações funcionais. Nestes termos, o comportamento verbal deve ser tomado como a
variável dependente, que deve ser medida. Assim, ao tratar do comportamento verbal, o
dado básico de análise é também a probabilidade de ocorrência de uma dada respos­
ta. Contudo, será que a taxa de resposta, utilizada no caso do comportamento não
verbal, como medida de probabilidade de emissão tem a mesma utilidade?
A resposta neste caso é não. Isso porque, como parece ser óbvio, o falante não
emite a mesma resposta várias vezes da fornia como um rato pressiona centenas de
vezes uma barra no laboratório e obtém água ou comida A probabilidade de que uma
resposta verbal ocorrerá em um dado tempo, então, deverá variar atrelada a outros tipos
de medidas que não apenas a sua própria emissão. Skinner (1957) escreveu:

Algumas partes de um repertório verba! são mais prováveis de ocorrer que outras.
Esta probabilidade é extremamente importante, embora uma difícil concepção.
Nosso dado básico não é a ocorrência de uma dada resposta com tal, mas a
probabilidade de que ela ocorrerá em um dado tempo. Cada operante verbal pode
ser concebido como tendo uma probabilidade designáveí de emissão sob cir­
cunstâncias especificas % convenientemente chamadas de 'força'. Nós basea­
mos a noção dç força em muitos tipos de evidência, (p. 22)

Como podemos observar no argumento de Skinner transcrito acima, diferente


do comportamento não verbal, encontrar a probabilidade de emissão de uma resposta
verbal é uma tarefa complexa porque tal medida não pode estar baseada na própria taxa
de emissão da resposta. A taxa de respostas perde seu efeito, deixando de organizar os
dados verbais. Como, então, encontraremos a probabilidade de emissão?
As “evidências” nas quais tal probabilidade está baseada foram consideradas
por Skinner (1957) como sendo: 1) a própria emissão da resposta, que na maior parte
dos casos indica certa força do operante; 2) seu nívei de energia, como por exemplo, a
intensidade ou volume da voz, o prolongamento do tempo da resposta, como em um
longo e sonoro “Não", etc; 3) a velocidade com que é emitida, em geral, sendo forte se
é rápida e firme e fraca se é hesitante; 4) a repetição da resposta em uma mesma
ocasião, como repetidos “Não”, por exemplo, devem, ao enfatizar a resposta, mostrar
sua força na ocasião e por fim, 5) a freqüência total das respostas também pode mos­
trar que alguns comportamentos são fortes quando, por exemplo, um indivíduo usa
muitos termos como “eu”, “meu”, ‘ minha”, “de mim”. Neste caso, a alta freqüência deste
tipo de respostas pode ser um indicador de que há alta probabilidade de emissão de
comportamentos direcionados a si próprio.
É importante destacar, todavia, que existem evidentes limitações nestas medi­
das de força, as quais foram reconhecidas pelo próprio Skinner (1957). Variáveis inde­
pendentes podem alterar tais medidas, sem que implique em força ou fraqueza da
resposta. Por exemplo, uma pessoa que esteja em um cinema, assistindo a um filme
dramático, pode comentar com um amigo sobre um fato engraçado que lhe aconteceu,
falando baixo apenas porque falar alto em uma sessão de cinema poderá ser seguido
por conseqüências aversivas. O nível de energia aqui, no entanto, não garante fraqueza
da resposta. Ao contrário, contar um fato engraçado no meio de um filme dramático
pode ser uma medida de força da resposta, mesmo que esta seja emitida com um
baixo volume de voz.

N. dos S. Pimente!, C. S. M. Bandíni, J, C. Donadone, J. C.


Rose, 5. B. Meyer, J. F, Teixeira
Assim, medir a probabilidade de uma resposta verbal é uma tarefa complexa.
Para isso, detectar as condições nas quais a resposta ocorre, ou seja, quais são as
variáveis independentes da análise, pode ser uma tarefa importante. Nesta categoria,
Skinner (1957) apresenta: 1) o condicionamento operante como uma das formas de
controlar a probabilidade de ocorrência da resposta: se o objetivo é tomá-la altamente
provável, então deve ser programado um arranjo ambiental com ampla gama de refor­
ços. Caso contrário o arranjo deve suprimir os reforços, colocando assim, a resposta
em extinção. 2) O controle de estímulos também pode indicar a probabilidade de res­
posta, na medida em que quando um organismo emite uma resposta e esta é reforça­
da, repostas da mesma classe tendem a tomarem-se mais prováveis de serem nova­
mente emitidas diante dos estímulos discriminativos disponíveis na primeira situação
de reforçamento. Manipular tais estímulos em um ambiente, disponibilizando-os na
ocasião, pode, portanto, aumentar a probabilidade da .resposta ser emitida. 3) As condi­
ções motivacionais do organismo também favorecem, ou não, a probabilidade de uma
resposta, que pode ser aumentada ou diminuída de acordo com as condições de priva­
ção e saciação do organismo. Se uma criança estiver saciada de doces, por exemplo, e
uma resposta vocal de pedir doces tiver ocasionado a obtenção destes, então, a proba­
bilidade de que tal resposta seja emitida tende a diminuir. Da mesma forma, se a
criança estiver privada de doces, a probabilidade de tal resposta tende a aumentar. Por
fim, Skinner comenta o papel do, 4) controle aversivo na probabilidade de emissão de
respostas, pois o comportamento pode ser reforçado por remoção de estimulação
aversiva ou diminuir em sua presença. Assim, a resposta "Pare com isso", por exemplo,
deve ser reforçada se ocasionar a interrupção de algum dano físico ou cessar uma
situação embaraçosa para o falante. É possível, então, que situações aversivas pos­
sam ser manipuladas de forma a aumentar ou diminuir a probabilidade de respostas
verbais.
Apesar da dificuldade de encontrarmos uma medida de probabilidade de res­
postas verbais sabemos que é possível determiná-la baseando-se em evidências que
mostram a sua força. Mesmo que o comportamento verbal seja altamente mutável e
que os indícios de tal probabilidade sejam mais tênues que no caso do não verbal, o
cientista deve estar atento a estas evidências para predizer e controlar o comportamen­
to.
O mesmo pode ser dito do psicoterapeuta. Enquanto um profissional que pro­
picia mudanças comportamentais (e quem sabe sociais), ele lida, em grande medida,
com relatos verbais. Sendo assim, o psicoterapeuta deve estar apto a localizar no dis­
curso do cliente variáveis que o auxiliem a identificar a probabilidade de emissão de
comportamentos desejávejs e indesejáveis no futuro. Assim, a análise das respostas
emitidas pelo cliente passa pelas medidas de força citadas no tópico acima. Por exem­
plo, uma frase como “Eu vou tentar manter-me longe de confusões" dita de forma tímida
e relutante pode indicar uma baixa força de emissão do operante “estar longe de confu­
sões”. Além disso, como comportamento verbal é comportamento operante, o terapeuta
pode se valer das condições antecedentes que podem evocar uma resposta, como
condicionamento operante, variáveis motivacionais e etc para provocar ou suprimir res­
postas desejadas ou indesejadas, respectivamente É, portanto, papel do psicoterapeuta
saber relacionar funcionalmente as respostas de seu cliente a variáveis independen­
tes, bem como conhecer quais as medidas de força das respostas verbais, para que
possa desempenhar um bom trabalho. Vejamos a partir de agora quais os recursos
que o terapeuta tem disponíveis para realizar esta tarefa.

Sobre Comportamento e Cognição 51


3 - Comportamento verbal em intervenções clínicas comportamentais.
Levando-se em consideração que apontar a probabilidade de ocorrência do
comportamento verbal não é uma tarefa simptes, a seguir pretende-se apontar como o
psicoterapeuta se utiliza do comportamento verbal para ampárá-lo em sua prática. O
comportamento verbal pode ser um importante auxiliar na avaliação, na interação tera­
pêutica e na intervenção clínica.

3.1 - Comportamento verbal no contexto clínico como auxiliar na avaliação


Uma das funções do psicólogo clínico é a de avaliar, ou seja, a de identificar as
variáveis de controle das classes de respostas selecionadas para ser alvo de mudan­
ças e, a partir daí, derivar uma intervenção. Uma boa avaliação pode ser a principal
variável para a mudança na probabilidade de um comportamento ocorrer. Na clínica, ao
se trabalhar com operantes, no caso verbais, é desejável que se aumente a probabili­
dade de comportamentos mais adaptativos aos clientes e que haja uma queda acentu­
ada na probabilidade de comportamentos considerados desadaptativos. Porém, a
dificuldade desta tarefa está no fato de que na clínica lidamos com variáveis que na
maioria das vezes não estão presentes nas contingências da interação terapêutica.
O cliente faz um relato verbal de seus comportamentos e das condições que
parecem afetá-los, mas nem sempre há correspondência entre relato e contingências
controladoras do próprio comportamento. No entanto, tem sido sugerido que terapias
verbais têm ajudado por volta de 75% das pessoas que procuram psicoterapia (Lambert,
2001 ) e o fato de a terapia verbal incidir sobre relatos verbais e não sobre a emissão do
comportamento ao qual o relato se refere não é sempre ou necessariamente uma
limitação. Em várias ocasiões, é justamente o exame de prováveis controles de relato
do cliente o dado mais importante a ser observado (Meyer et a!., no prelo).
O terapeuta amplia sua possibilidade de sucesso na tarefa de avaliação se
levar em conta: a) que o comportamento verbal é mujtideterminado (possui múltiplas
causas); b) a presença de autocl(ticos e c) de processos de edição na fala do cliente.
Vejamos cada um destes fatores mais de perto.

3.1.1 - Causas múltiplas e seu papel na avaliação do comportamento do cliente


Baseando-se na definição de Skinner (1957), de que o comportamento verbal
possui múltiplas causas3, o terapeuta pode estar atento a indicadores de variáveis de
controle, presentes não só no conteúdo como em algumas características do compor­
tamento verbal de seu cliente. Uma vez que a complexidade das interações possibilita
que muitas variáveis influenciem o que é dito ao clínico, uma intervenção baseada
apenas no conteúdo pode ser ineficiente, por não ter levado em conta as variáveis
adicionais.
O terapeuta também deve compreender que as respostas verbais do cliente
podem ser consideradas tatos4, ou seja, o cliente relata ao terapeuta o que lhe aconte­
ceu e está acontecendo sem que nenhuma variável distorça o relato. Outras variáveis
podem produzir distorção do que é dito ao terapeuta, e uma intervenção baseada em
tais relatos pode não ser eficiente.
Um exemplo pode ser usado para demonstrar como a causalidade múltipla
pode ser um auxiliar na avaliação. Um rapaz com o diagnóstico de transtorno obsessivo

Definição de múltiptas causas: o comportamento vobal usualmente possui múlBpias fontes de controle. Uma única resposta poda ser função
demaisdeuma variável suma única variável usualmente afeta mais de uma resposta.

N. dos S. Pimentel, C. S. M, Bandiní, J. C. Donadone, J. C.


Rose, S. B. Meyer, J. F. Teixeira
veio à clínica relatando uma série de rituais, e o mais intenso e expressivo destes rituais
seria lavar as mãos constantemente Confirmado o diagnóstico, o terapeuta iniciou o
procedimento de dessensiblização sistemática. Este procedimento foi aplicado com
sucesso e houve uma redução acentuada no ritual de lavar as mãos. Após uma pausa
na terapia devido a viagens do terapeuta, o cliente relatou que outros rituais (diferente do
trabalhado) estavam muito intensos. O relato estava em contradição com os resultados
parciais obtidos no primeiro trimestre, em que houve descrições de redução em
freqüência e intensidade de diversos rituais, como o de tomar banhos. Essa discrepân­
cia foi um indicador de que poderia haver outras variáveis controlando o relato, ou seja,
um indicador de causalidade múltipla. A falta de melhora, após um periodo de ausência
da terapeuta, poderia ter sido tanto um fato descrevendo a ocorrência de rituais inten­
sos, como também um mandos, indicando uma necessidade de continuação da tera­
pia. O relato de melhora no comportamento trabalhado pela terapeuta poderia ser en­
tendido também como outra forma do mesmo mando (necessidade de continuação da
terapia) ao indicar que ele estava gostando do trabalho do terapeuta e queria continuar.
A partir da observação de que mais de uma variável poderia estar controlando o compor­
tamento do cliente, uma nova hipótese pôde ser levantada, a d e dependência do cliente
em relação ao terapeuta ou à terapia. Essa hipótese ganhou força pelo fato de já terem
aparecido, no inicio da terapia, indicadores de dependência, ou seja, de respostas com
aparente função de produzir cuidados especiais por parte de familiares e profissionais
da saúde. Possivelmente, a produção de cuidados especiais não foi a variável respon­
sável pela instalação de respostas de rituais, mas esses cuidados poderiam estar
contribuindo para sua manutenção (Meyer et al., no prelo).
Segundo Meyer (2000), a noção de causalidade múltipla pode ser empregada
também para entender o papel da estimulação suplementar na terapia. O que é dito em
terapia pode ter a propriedade de fornecer estimulação suplementar para que respostas
já existentes no repertório do cliente aumentem sua probabilidade de ocorrer. Quando as
contingências são complexas, nem sempre o comportamento é afetado por todos os
seus antecedentes e conseqüentes, por suas múltiplas causas. Assim, o que o terapeuta
fala em terapia, talvez possa ser considerado estimulação suplementar. Terapeutas não
alteram diretamente controle de estímulos e funções de estímulos que foram adquiridos
durante a história de vida do indivíduo sob controle de eventos ambientais, principalmente
quando éstes eventos não estão presentes durante a terapia. Propriedades específicas
da condição estimuladora podem controlar com maior ou menor força o comportamento.

3.1.2 - Autoclíticos e seu papel na avaliação do comportamento do cliente


Para Meyer, et al (no prelo), além de estar atento à existência de vários determinantes
do conteúdo e da forma das verbalizações, o terapeuta (enquanto ouvinte na relação tera­
pêutica) pode se beneficiar (aumentar a probabilidade de intervenções adequadas) da
análise dos autoclíticos8 presentes na fala de seus clientes, pois isso permitiria: a) identifi­
car o tipo de operante verbal que o acompanha. A ocorrência de um tato pode ser identificada
a partir de autoclíticos presentes na fala do diente como no exemplo: “Minha sogra não
gosta de mim. Ela me disse7 isso ontem quando fui visitá-la". A ocorrência de provável tato
distorcido, no sentido de que a fala é controlada por variáveis diferentes daquelas indicadas
em seu conteúdo pode ser identificada no exemplo: “Minha sogra não gosta de mim. Eu
acho isso porque ela conversa mais com as outras noras, fica me ofhando de um jeito
■“Entende-se por tato a resposta verba! controlada por estímulos discriminativos não verbais. Estes estfmuias discriminativos nâo verbais
podem ser um objeto, evento ou propriedade de um objeto ou evento.
‘ Entende-se por mandoa resposta v&bal controlada por uma opemçào estabelscedota.
Entende-se por operação estabelecèdors operação que altera o valor refbrçadorde uma conseqüência e que modifica a probabilidade de
ocorrências de comportamentos relasfônados a estes estimulas.

Sobre Comportamento e Cognição 53


... estranho e também porque eu sei que não tenho sorte com sogras, e normalmente nenhu­
ma sogra gosta de mim”. A ocorrência de um mando é indicada por autoclíticos como em:
“Como gostaria que tudo isso se resolvesse... Você poderia me ajudar! Como faço?; b)
identificar quais variáveis podem estar exercendo controle sobre o comportamento do clien­
te quando ele faz relações entre eventos, como por exemplo: “Quero falar com meu ex-
marido, mas acabo não indo...Há momentos que penso que tudo de errado que aconteceu
na minha vida é por conta da doença...Tem horas que uso a doença como uma desculpa,
pois caso eu não tenha as conseqüências esperadas ao falar com meu ex-marido, tenho
como justificar meus atos e assim não preciso justificar o que fiz, afinal sou doente, enten­
de..." Neste exemplo, o autoclítico emitido pelo cliente indica a relação que ele estabelece
entre a justificativa por não procurar seu ex-marido e sua doença; c) identificar o estado de
força de uma resposta, como num exemplo de autoclítico de fraqueza: “Eu acho que ela
estava falando mal da minha aparência sim...” Neste caso, a emissão do autoclítico eu
acho indica ao terapeuta uma baixa probabilidade de que o cliente se comporte em relação
à suposta opinião do outro quanto à sua aparência.; Num exemplo de autoclítico de força:
“Eu vou, mas eu tenho certeza absoluta que vou perder a viagem...p o terapeuta pode
identificar uma baixa probabilidade de que o cliente realmente irá ; d) identificar a existência
de um fraco controle por regras e um forte controle por reforçamento negativo: “Eu concordo
com você, eu sei que eu deveria ir; mas pra mim é muito difícil me expor a situações novas"
e, e) identificar a condição emocional ou estado motívacional do cliente: "Eu preciso muito
continuar na terapia, com você ou com qualquer outro terapeuta* “Esses dias eu tô arrasa­
da por causa das coisas que meu namorado me disse, sabe?” Esse último exemplo, caso
formulado de outra forma, poderia evocar uma resposta diferente do terapeuta:"Essa sema­
na meu namorado me falou que ela pretende fazer seu doutorado fora." A presença do
autoclítico, no primeiro caso, direciona a atenção do terapeuta para o efeito que a fala do
namorado teve.

3.1.3 - Autoclíticos e seu papel na avaliação da interação terapêutica


A relação estabelecida entre terapeuta e cliente pode ser uma das variáveis rele­
vantes para facilitar mudanças comportamentais, uma vez que as análises verbais feitas
na interação com o terapeuta podem controlar o responder do cliente fora da clínica (Ver,
por exemplo, Amorim, 2001; Beckert, 2005; Donadone, 2004, para estudos sobre consis­
tência ou não das relações falar/fazer/falar).
Meyer et al., (no prelo) apresentam um exemplo ilustrativo: “Eu estou muito cansa­
da hoje, quase que eu não vim aqui (terapia)” ê uma frase típica que pode ter mais de uma
função. Pode ser apenas uma descrição, um tato do seu estado físico ou um pedido, um
mando disfarçado: “não quero falar hoje”, “não retome aquele tema da semana passada”.
A qual das funções o terapeuta responde pode ser relevante para o progresso da terapia.
Esses mesmos autores apontam que clientes que usam excessivamente os
autoclíticos podem estar amenizando uma resposta que tem probabilidade de ser puni­
da, indicando a presença de uma audiência potencialmente punitiva. O terapeuta pode
ter se estabelecido como uma audiência aversiva, que sinaliza punição, ou, ainda, o
terapeuta não conseguiu até o momento reverter ou diminuir os efeitos produzidos por
uma história de aversividade. O exemplo a seguir mostra o que parece ser um exercício
do faiante para evitar a punição. Embora a resposta em que conta que voltou a usar
drogas tenha ocorrido em meio aos elogios à terapeuta, fica claro o uso de autoclíticos
10 auloditioo é um comportamento verbal que depende de e modifica os efeitos de outra comportamento verbal. O aotodltjco pode alterara
resposta doouvinte aos operantes verbais que ele acompanhH de diveísasfornias: a) descrsvendo-os; b), quandofunctonam também coma
mandos (por exemplo, “Preste muita atenção no que eu vou falar"; c) qualificando-os (negando ou afirmando); d) quantificando-os.
' Os trechos em negrito são os airtodíticos exemplificados.

54 N , dos S. Pimentel, C . S. M . Bandfni, J. C . Donadone, J. C.


Rose, S. B. M eyer, J. F. Teixeira
com a função provável de reduzir a ameaça de punição. O riso nervoso observado nessa
fala indica para o ouvinte que o falante sentiu o efeito da punição, mas que, apesar
disso, está emitindo a resposta. Exemplo:
C : Nossa..., você está tão bonite hoje (riso nervoso). Esta roupa lhe caiu bem...
(risos). Ai, ai... (riso nervoso). Tenho que te fe/ar uma coisa (autociitico)..., acho
que vou estragar seu dia... Você vai ficar brava comigo... (riso nervoso -autociitico).
Ÿ : O que é? Pode contar, não estou aqui para te punir.
C: É... Primeiro queria mais uma vez dizer que vermelho lhe cai bem... Ahm... (riso
nervoso),.. Ê que tem horas que eu canso de me vigiar... Isso às vezes é
desgastante... (riso nervoso - autociitico).
T: Obrigado pelo elogio... Mas, me diz, vai em frente.
C: Então vai, não vai estragar seu visual... Ficar chateada e brigar comigo... (risos
nervosos - autociitico).
T: Tudo bem.
C: Fiz aquilo de novo... Voltei a fumar... (silêncio).

Temas apresentados com muitos autocliticos podem indicar história de puni­


ção ou punição apresentada, mesmo que inadvertidamente, pelo terapeuta. Um núme­
ro pequeno de autocliticos presentes nas falas de cliente e terapeuta pode indicar a
estabilidade da relação, e o terapeuta pode conduzir sua avaliação pela observação e
registro da variação no número de autocliticos de um mesmo cliente, quando fala de
assuntos diferentes (Meyer et al., no prelo).
Exemplo: “Ê, eu tenho percebido que eu não sei perder de jeito algum. Tenho
percebido que só me sinto bem quando sou o melhor em tudo. Quando não sou
percebo que sou egoísta e não chego a desejar o bem das outras pessoas também.
Acho horrível ter que admitir ser egoísta, eu que sempre me considerei tão solidário!”.
Neste relato sugere-se que não houve necessidade de suavização autoclítica pelo cli­
ente, pois o terapeuta tornou-se uma audiência não-punitiva.

3.1.4 - Edição e seu papel na avaliação do comportamento do cliente


As instâncias de edição10 apresentadas pelo cliente também auxiliam a identi­
ficar variáveis de controle (levantar hipóteses sobre as variáveis de controle consideran­
do que a variável que está controlando a edição pode estar controlando outros compor­
tamentos do cliente). Segundo Meyer et al., (no prelo), a fala presumidamente editada
pode ser uma “dica" importante para o terapeuta investigar que variável poderia ter
controlado a edição.
No exemplo a seguir, a edição indicada pela expressão “não foi bem isso o que
eu quis dizer" propiciou ao terapeuta investigar qual a variável relevante a ser considera­
da quando a cliente relatou que não gostava de ficar sozinha. Uma interpretação possí­
vel seria a de que sua fala não era apenas sobre solidão, mas também sobre controlar
o comportamento do namorado.

C: Eu amo ele, não quero ficar sem ele, é ele que não entende nada. Foi muito
difícil quando ele estava na Alemanha; eu não consigo ficar sozinha.
T: E o que você pretende fazer?
C: Agora que ele chegou estamos bem, mas eu vou fazer de tudo para ficar um ano

* Onde encontra-se C, lê-se Cliente.

'Onde encontra-seT, Lê-se terapeuta.

Sobre Comportamento c Cognição 55


na Itália, e não entendo porque ele faz cara feia, é minha carreira, quero ir e
ninguém vai me impedir.
T: (com uma expressão de dúvida) Vocè quer ficar um ano fora, longe de seu
namorado?
C: Não foi bem isso que eu quis dizer, eu sinto falta dele sim, mas também preciso
me desenvolver profissionalmente e ele faz cara feia.
T: Você mesma falou que não consegue ficar sozinha, que foi muito difícil quando
ele estava fora, não entendi sua colocação...
C: Estou sendo confusa, já percebi que não falo coisa com coisa. Mas você enten­
deu errado, não era bem isso que eu queria dizer, tipo assim, que eu não consigo
ficar longe dele, eu quis dizer que é difícil ficar longe, mas que eu consigo agora.
T: E se ele passar no mestrado e for morar em outra cidade?
C: Ah, isso é uma outra história. Você não está entendendo o que eu estou falando.
T: Me desculpa, só gostaria que você fosse mais clara.
C: Ah, meu, ele já viajou e agora é minha vez, mas ele tem que ficar quieto no canto
dele me esperando (silêncio). Eu sei que estou sendo egoísta, mas é isso mesmo,
agora é minha vez.

A falta de edição ocorre em fapsos, nas falas com tom excessivamente alto,
ríspido, incompleto ou repetitivo e pode indicar ao terapeuta quais variáveis parecem ter
força no controle do comportamento observado.
Quando o cliente no contexto terapêutico fala muito de um assunto, pode-se
levantar a hipótese desta fala ser uma forma de edição ou esquiva. Segundo Meyer et al.
(no prelo), o falar muito de um assunto pode estar deslocando outras respostas que
poderiam ser passíveis de punição, ou seja, falar muito de um assunto é incompatível
com o falar de outro tema. Como exemplo, pode-se citar o caso de um cliente com história
de punições de comportamentos de relacionamento interpessoal e que apresentava
dificuldades de estabelecer um relacionamento com a terapeuta. Passava boa parte da
sessão falando sobre sua religião, sobre o desejo de se tomar pastor, e sobre as regras
da igreja quanto ao que era considerado pecado ou não. Após um longo período, a
terapeuta conseguiu que o cliente apresentasse conteúdos voltados ao relacionamento
interpessoal. Aparentemente, o cliente editava muito do que era relatado em terapia. Com
o estabelecimento de uma boa relação terapêutica, a edição deixou de ser tão freqüente
e ele passou a relatar dados relevantes relacionados a eventos aversivos. A edição, mas
agora já anunciada, passou a acontecer apenas quando o cliente entrava em temas
sobre episódios de relacionamento interpessoal afetivo.

C: “Venho pensando muito sobre namorar (riso nervoso). Eu vou te contar apenas
o que eu acho que não seja realmente grande pecado, até porque você pode me
denunciar, e eu não agüentaria isso. Já me sinto cuipado o suficiente”.
T: “Hum hum
C: %respira fundo, silêncio). Esses tempos atrás me senti atraído por uma pes­
soa... Aconteceu de novo (voz trêmula). Aquilo que sei que é pecado (...)".

3.2 - Comportamento verbal no contexto clínico como auxiliar na intervenção


O terapeuta pode assim como fez na avaliação, utilizar-se do emprego de: a)
causas múltiplas; b) autoclíticos e c) edição como instrumento de intervenção. Essas
10Definição de edlçâo: no processo de produção do comportamento verbal, respostas podem ser rejeitadas ou Rberadas pelo falante; de
acordo com os efeitos que esta manipulação já exerceu, e, portanto, poderia exercer sobre o ouvinte através da edição. Este é uma atividade
adicional do falante. O comportamento verbal pode afelarafelante antes de chegar até o ouvinte e assim pode ser cortado, rasurado,
cancelado, editado. Já no comportamento verbal vocal a edição é mais efêmera e de diffcfl descrição (Skinner, 1857).

56 N. dos S, Pimentel, C. S, M . Bandíni, J. C. Donadone, J, C.


Rose, S. B. Meyer, J. F. Teixeira
intervenções podem ser menos aversivas e mais facilmente aceitas.

3.2.1- Causas múltiplas e seu papel na intervenção clinica


Utilizando-se da noção de causas m últiplas, o terapeuta a n a litic o -
comportamental pode trabalhar com metáforas, fantasias, alegorias e ao utilizar-se
destes recursos ter a vantagem de diminuir o caráter aversivo de alguns temas. Por
outro lado, se o cliente comunicar-se apenas por metáforas, este pode estar dando
indícios de que está em contato com uma variável importante e intervenções que inten­
sifiquem tal contato provavelmente produzirão resultados importantes para o processo
terapêutico (Meyer et al., no prelo).

3.2.2 - Autoclíticos e seu papel na intervenção clínica


Para Meyer et al., (no prelo), instalar autoclíticos descritivos, fornecer modelos,
sinalizar prováveis funções do comportamento do cliente analisando os autoclíticos
empregados, suavizar intervenções potencialmente aversivas são ações que se valem
do conceito de autoclítico.
“Instalar autoclíticos descritivos pode ser uma intervenção útil, levando-se em
conta que boa parte dos clientes não possui repertório autodescritivo refinado (p.ex.
Kohlenberg e Tsai, 2001), uma vez que as contingências necessárias para o seu de­
senvolvimento só ocorrem quando a comunidade da qual o cliente participa faz pergun­
tas do tipo: ‘O que foi que você disse? ’, ‘Você disse isso? ‘Por que você disse isso? ’,
e essas perguntas nem sempre são feitas. Quando o terapeuta ensina o cliente a
descrever o próprio comportamento ou o de terceiros, está em última instância estabe­
lecendo autoclíticos descritivos no repertório verbal do cliente. Este repertório, por sua
vez, vai permitir ao terapeuta ter acesso às variáveis controladoras do comportamento
do ctiente, vai ampliar o seu repertório de auto-observação e, conseqüentemente de
suas respostas autodescritivas, o que pode facilitar a identificação das variáveis
controladoras do próprio comportamento1’. (Meyer et al., no prelo).
O autoclítico emitido pelo cliente pode ser pontuado na sessão e ser uma
intervenção sutil como no exemplo abaixo:

Ex: C: Eu quero passar no vestibular, mas é tão difícil. Eu poderia fa zer um


cursinho, mas não tenho dinheiro. Talvez se eu estudasse sozinho. Ah, mas eu
não tenho material para isto. Tem um cursinho muito bom perto da minha casa,
mas é tão careiro! È não tem chance de bolsa.

T: Nossa! Quantos mas...

C: Risos. É, sempre tem um mas que me impede, né?

O autoclítico mas é enfatizado pelo terapeuta e pode ter funcionado como


estimulação suplementar. Anteriormente já havia sido feita uma intervenção mais direta
‘Parece que você sempre coloca empecilhos’, que mesmo com o uso do autoclítico
Parece, foi rejeitada pela cliente.

A forma com que o terapeuta verbaliza suas análises pode ter um efeito impor­
tante. Empregar expressões autoclíticas do tipo “Não sei se eu estou sendo precipitado
em falar isso..." “Tá parecendo, até agora, que você está me falando que..." “Será que o
que você está me dizendo não é...” parecem diminuir possíveis impactos aversivos,
aumentando a receptividade do cliente e provendo um espaço no qual ele pode concor­

Sobre Comportamento e Cognição 57


dar ou discordar. Por exemplo, em um caso em que uma cliente não admitia que preci­
sasse "mudar’’, a terapeuta passou a usar os termos "adicionar habilidades ao seu
repertório" e encontrou aceitação por parte da cliente. (Meyer et al., no prelo).
O terapeuta pode utilizar-se de autoclíticos na tentativa de suavizar o caráter aversivo
de conselhos e tarefes que podem impedir a adesão ao tratamento e levar a um possível
abandono da terapia ou com resultados insatisfatórios (Bischoff & Tracey, 1995; Donadone,
2004). Por exemplo, quando um ciiente tem dificuldade de expor sua opinião e o terapeuta
quer estimulá-lo a arriscar-se em situações novas, poderia emitir um mando direto, Você
deve faiar como se sente em relação à festa do banco para seu m a r id o Mas essa forma
de mando poderia eliciar respondentes indesejados e enfraquecer a probabilidade de vir
a exercer controle sobre o comportamento do cliente. Então o mando pode ser dado de
forma indireta, com o uso de autoclítico tal como: ‘Será que não seria interessante se você
contasse ao seu marido como se sente em relação à festa do banco?'

3.2.3 - Edição e seu papel na Intervenção clínica


O conhecimento sobre processo de edição na fala do cliente, segundo Meyer et
al., (no prelo), pode ajudar o terapeuta a elaborar intervenções que favoreçam a discri­
minação do cliente sobre as variáveis que controlam o seu comportamento. No exem­
plo abaixo, a palavra avô é tão aversiva para a cliente que ela só consegue emitir a
resposta 'biscateiro'. O terapeuta aceita a resposta e dirige a atenção do cliente para a
possível edição em andamento, deixando explícita a variável aversiva.

7? Como foi esta história do seu avô ser afastado de vocês?


C: biscateiro.

T: Tá, seu avô- biscateiro.

C: Biscateiro, não chamo ele de avô e... ai, eu não quero falar sobre isto, deixa eu
continuar falando da minha adolescência, [edição].

T: Tá certo, vamos deixar seu avô e sua infância de lado por enquanto...

C: Você vai chamar ele de avô, né?

T: Você não suporta faiar e nem ouvir a palavra avô?

C: Não, não suporto nem ouvir falar nele...

T: Tá certo, então, por enquanto, vamos ficar com o 'biscateiro', mas uma hora
vamos ter que voltar nisso.

C: Eu sei, eu sei, mas não agora.

O excesso de edição pode ser um problema para alguns clientes altamente


controlados por reforçadores sociais e, portanto, alvo de intervenção do terapeuta; da
mesma forma, a ausência de edição pode ser um problema para outros clientes, aqueles
pouco controlados por reforçadores sociais ou que apresentam respostas agressivas.

Conclusão
O trabalho do psicoterapeuta é, sem dúvida alguma, um trabalho complexo.
Buscar no relato do cliente a probabilidade de respostas desejáveis e indesejáveis em
seu contexto social é uma tarefa que exige muitos cuidados. Se no caso do comporta­
mento não verbal podemos inferir probabilidade de ocorrência por meio da observação

5 8 N. dos S. Pimentel, C. S. M . Bandiní, J. C, Donadone, J. C.


Rose, S. B. Meyer, J. F. Teixeira
da taxa de respostas, no caso do comportamento verbal esta tarefa deve ser baseada
em medidas muito mais tênues e complexas. O terapeuta normalmente formula per­
guntas e conduz observações durante as sessões, sobre as ocasiões em que a res­
posta ocorre, sobre a própria resposta e sobre as conseqüências mantenedoras da
resposta. Quando ele identifica que as relações são, possivelmente, de dependência
entre eventos, ele produz análises comportamentais hipotéticas. Estas hipóteses fun­
cionais ganham força se as intervenções baseadas nelas produzem as mudanças
comportamentais previstas (Meyer, et al.; no prelo).
Os exemplos da prática clinica mostrados neste texto indicam que terapeutas
analítico-comportamentais devem se utilizar de aspectos do comportamento verbal como
forma de aprimorar a condução de uma terapia analítico-comportamental. São estes os
aspectos que vão indicar que respostas são mais ou menos prováveis ao seu cliente.
Sendo assim, tanto a presença de causas múltiplas como de autoclíticos, e da edição,
podem ser instrumentos de avaliação e, ao mesmo tempo, alvos de intervenções. (Meyer
et al., no prelo). O terapeuta estando atento à topografia do comportamento e não só a sua
função (o que permitira observar possíveis edições, ou presença de autoclíticos
explicativos), observando relatos sobre reforçamento social (por exemplo, relatos em que
o cliente tala’ o que acha que será aprovado pelo terapeuta), observando comportamen­
tos não-verbais e tomando-os explícitos pode realizar uma análise mais completa.
Além disso, são os aspectos do comportamento verbal do terapeuta que fazem,
em alguma medida, com que o comportamento do cliente tenha maior ou menor proba­
bilidade de ser emitido. O uso de autoclíticos por parte do terapeuta, por exemplo, indica
que um ambiente muito mais ‘'relaxado” pode ser estabelecido, o que propicia um
aumento da probabilidade de emissão de respostas verbais do cliente. Por outro lado,
terapeutas mais incisivos podem diminuir a probabilidade de comportamento verbal de
seus clientes, punindo respostas que possam ser consideradas indesejáveis. Tais
punições podem diminuir a possibilidade de intervenção do próprio terapeuta.
Neste sentido, é preciso que o terapeuta, para executar um bom trabalho clini­
co, consiga transpor os conhecimentos conceituais para seu trabalho dentro da terapia;
ou seja, é vital que o terapeuta se tome um bom analista do comportamento verbal. É
papel do psicoterapeuta saber relacionar funcionalmente as respostas de seu cliente a
variáveis independentes, bem como conhecer as medidas de força das respostas ver­
bais, para que possa desempenhar um bom trabalho.
Constantemente, a psicoterapia é alvo de criticas quanto ao seu alcance fora do
contexto da clínica. Como dissemos anteriormente, o terapeuta não tem acesso a uma
grande parte das contingências a que seu cliente é exposto fora da relação terapêutica.
Consideramos que uma boa análise do comportamento verbal do cliente pode ser útil
para que o terapeuta transponha essa barreira. Como vimos nos exemplos de interação
terapeuta-cliente, através da análise das múltiplas causas do comportamento verbal, da
presença de autoclíticos e de edições, é possível pnever não somente a probabilidade de
comportamentos verbais mais adequados (dentro e fora da sessão terapêutica), como
também a probabilidade de comportamentos não verbais. Ou seja, as medidas de força
de um comportamento verbal que descreve um comportamento não verbal mais adequa­
do, podem indicar a probabilidade de ocorrência do comportamento relatado. Por exem­
plo, quando o cliente diz “estou determinado a ir ao shopping centei”, a resposta de ir ao
shopping center parece mais provável do que quando ele relata “eu comecei a pensar em
ir ao shopping centei”
Acreditamos que a relação entre trabalhos conceituais e clínicos pode fortale­
cer a prática do psicólogo em todas as suas áreas: ajuda o psicólogo em relação ao

Sobre Comportamento e Cogníçáo 59


trabalho em psicoterapia e também favorece o aprofundamento teórico, por parte dos
analistas do comportamento que se dedicam a estudos conceituais, de questões rele­
vantes para a Análise do Comportamento Aplicada. Na medida em que trabalhos
conceituais analisam aspectos relevantes para o processo clínico, o trabalho do
psicoterapeuta pode ser facilitado. Da mesma forma, trabalhos clínicos bem
estruturados, quando relatados à comunidade científica, evidenciam aspectos impor­
tantes do comportamento humano que figuram como parâmetros para o desenvolvi­
mento de uma tecnologia adequada e útil para a comunidade como um todo. O
intercâmbio entre estas áreas, então, só vem a fortalecer e ampliar os progressos da
Analise do Comportamento em relação à compreensão do comportamento humano.

Referências

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60 N, dos S. Pimentel, C. S. M . Bandíní, J. C. Donadone, J. C.


<v R. Mever. I. F. Teixeira
Capítulo 5
O modelo comportamental
na análise do TOC
Helen Copque*
SERTOC-BA

Hélio José Quílhardi**


ÍTCR-SP

A Terapia Comportamental tem sido descrita como o modelo de eficiência para


o tratamento dos sintomas obsessivo-compulsivos, especialmente com a aplicação
da técnica de exposição com prevenção de respostas (Meyer, 1966; Rachman, Hodgson
e Marks, 1971; Salkovskis e Kirk, 1997). O modelo de terapia comportamental individual
é o que tem sido mais amplamente investigado (Meyer, 1966; Van Oppen et al., 1995;
Steketee e Van Noppen, 2003), embora se possa encontrar trabalhos que avaliam a
eficácia da terapia comportamental em grupo para o TOC (Fals-Stewart, Marks e Schafer,
1994; Volpato, ef ai., 2003; Barret, Healy-Farrell e March, 2004).
O sucesso psicoterapêutico demonstrado pela aplicação de técnicas
“comportamentais’’ não deve, no entanto, obscurecer o fato de que o termo Terapia
Comportamental abrange uma gama de atividades e de conceitos e não pode ser
identificado como um empreendimento único. A denominação Terapia Comportamental
deveria ser usada no plural, pois os próprios profissionais que a aplicam, não a avali­
am como exemplo de unanimidade, nem conceituai, nem tecnológica. Peio contrário,
há divergências nítidas entre as várias terapias comportamentais e, assim, por exem­
plo, há mais diferenças do que semelhanças conceituais e de atuação clínica entre as
abordagens comportamental e cognitivo-comportamental. As duas abordagens não
consolidam uma síntese conceituai e, nem mesmo quando alguém se refere à utiliza­
ção de técnicas de intervenção, deve-se afirmar que se identificam. Assim, as técnicas
de reestruturação cognitiva e de mudança de auto-regras não podem ser igualadas
uma à outra, por mais que alguns estudiosos insistam em afirmar as suas similarida­
des. Permanecem, portanto, dúvidas com relação às diferenças entre o que fazem e
como cada qual conceitua o objeto de estudo que lhe é próprio. Espera-se, com este
texto, discutir algumas diferenças entre as duas abordagens, partindo da maneira
como ambas lidam com o Transtorno Obsessivo-Compulsivo. R E ( y

’ Ambulatório de Transtornos do Espectro obsesslvo-a>mpulslvo(SERTOC} do Serviço de Psiquiatria do HUPES - BA, Salvador- BA


** Instituto de Terapia por Contingências de Reforçamento, Campinas - SP

Sobre Comportamento c Cognição 61


No presente artigo, serão usadas as terminologias: Análise do Comportamen­
to, por ser mais abrangente e adequada, quando se fizer referências a conceitos e
análises não experimentais da abordagem comportamental, e Terapia por Contingênci­
as de Reforçamento (TCR), designação proposta por Guilhardi (2004a), quando houver
referência à prática clínica, pois a TCR abrange conceitos e procedimentos derivados
da .Ciência do Comportamento e do Behaviorismo Radical (fundamentalmente, todos
os;trabalhos de Skinner), aplicados no contexto psicoterapêutico. A TCR, pela proposta
de análise e intervenção que expõe, dá contornos teóricos consistentes e maneja pro­
cedimentos claramente definidos, que fundamentam e caracterizam a prática do
terapeuta comportamental. A TCR substitui a terminologia Terapia Comportamental,
abordagem clínica que teve relevante papel histórico, mas que, atualmente, inclui um
emaranhado de conceitos e práticas, que chegam, muitas vezes, a serem incompatí­
veis entre si, e, como tal, a desgastaram e impedem sua consideração como uma
abordagem consistente e harmônica.

Comportamento e Contingências de Reforçamento


A Análise do Comportamento é uma maneira de abordar o fenômeno psicoló­
gico que teve origem e se identifica com as proposições teóricas e metodológicas de B.
F. Skinner (1 9 3 8 ,1 9 5 3 ,1 9 5 7 ,1969r 1974,1989). Desde seus primeiros escritos, Skinner
mostrou uma preocupação em redefinir o objeto da ciência psicológica, bem como em
distinguir sua contribuição pessoal das demais existentes. Desenvolveu, assim, um
sistema teórico e experimental que tem como foco a inter-relação entre as ações do
organismo, as condições sob as quais tais respostas ocorrem e as conseqüências
produzidas por elas.
Para tal sistema teórico, comportamento hão é expressão pública de um outro
fenômeno subjacente, inacessível ou profundo. O comportamento, e apenas ele, é o
objeto de interesse do estudioso comportamental e basta lidar com eíe na forma em
que é observado, ou seja, como ação do organismo, e buscar seu significado entre os
determinantes de tais ações e não entre as propriedades delas (Skinner, 1945). Com­
preende-se comportamento como um fenômeno natural e que obedece a leis que
podem ser descritas e analisadas. Tampouco, comportamento se reduz à resposta;
nem ambiente se reduz a estímulo. Aquilo que o organismo faz é um fluxo, divisível de
modo arbitrário apenas para fins de análise, sendo cada unidade classicamente cha­
mada de resposta. Skinner deu o nome de operante para uma classe de comportamen­
tos que descreveria a maior parte das realizações humanas e, assim, a diferenciou de
outra classe de comportamentos, chamados respondentes, basicamente reações neuro-
vegetativas e estados corporais. Os operantes são emitidos e selecionados pelas con­
seqüências que produzem; as conseqüências, por sua vez, determinam a probabilida­
de futura de ocorrência da mesma classe de operantes. Os respondentes são eliciados
por eventos antecedentes e, em geral, sua ocorrência futura pode ser alterada pela
associação que é feita entre o estímulo antecedente (US) e outros estímulos (que
adquirem a função de CS por associação com o US), não necessariamente produzidos
pela resposta. A resposta, quer operante, quer respondente, pode ser pública, ou seja,
observável por dois ou mais observadores, ou privada, só acessível a quem a produz.
Assim, por exemplo, falar em voz alta é uma resposta operante pública; pensar, imagi­
nar, sonhar etc. são respostas operantes privadas. Ao mesmo tempo, taquicardia, do­
res abdominais etc. são respostas respondentes privadas, enquanto sudorese, rubor
da face etc. são respondentes públicos. Tanto as respostas públicas, como as privadas
são da mesma natureza - manifestações do organismo - e, como tal, sujeitas às

Helen Copque, Hélio José Çuílhardi


mesmas leis que regem os comportamentos. Convém, neste ponto, concluir que com­
portamento é a interação entre organismo e ambiente. Somente identificamos um com­
portamento quando identificamos tal relação. Correr é uma resposta, não um compor­
tamento. Se, porém, ao ver um policial, um assaltante corre e, como conseqüência, se
livra da eventual prisão, a ação de correr ficou contextualizada. Podemos falar, então, em
comportamento e, inclusive, dar-lhe um nome: fugir. Na vida cotidiana, os operantes e
respondentes ocorrem simultaneamente e se inter-relacionam, de maneira que não se
pode falar da ocorrência de um operante puro, nem de um respondente puro. Cada
classe de comportamentos é regida por leis próprias.
O ambiente, assim como o comportamento, é um fluxo funcional (só é ambiente
aquilo que afeta o organismo), divisível de modo arbitrário apenas para fins de análise,
sendo cada unidade classicamente chamada de estímulo. Por eventos ambientais, en­
tendemos tanto estímulos públicos (observáveis por dois ou mais observadores): por
exemplo, um som claramente audívei, uma luz intensa, um aviso fixado na parede, as
ações de uma pessoa, minhas próprias ações etc.; quanto estímulos privados (acessí­
veis e observáveis apenas pelo organismo que se comporta): por exemplo, acidez esto­
macal intensa, contrações dolorosas produzidas por pedra nos rins, taquicardia, tontura,
pensar, imaginar, sonhar, sentir etc. (Observe que as ações públicas e privadas de uma
pessoa podem adquirir a função de estímulo, não obstante serem respostas quanto à
natureza. Não nos estenderemos sobre este tópico no presente artigo.).
Para um analista de comportamento, pensar (evento privado) em contamina­
ção e lavar (evento público) as mãos são ambos comportamentos operantes e um não
causa o outro. Talvez esteja aqui uma das grandes diferenças entre as abordagens
comportamental e cognitiva: comportamento não causa comportamento. Todos e quais­
quer comportamentos são produto das interações entre a história de contingências a
que o indivíduo vem sendo exposto durante todo o processo de seu desenvolvimento, a
sua história genética (a qual não é objeto de estudo, mas de interesse do analista de
comportamento) e a história atual de contingências de reforçamento, isto é, as condi­
ções que operam sobre ele no momento. Conclui-se que tanto o comportamento de
pensar em contaminação, como o de lavar as mãos têm o mesmo status: o que causa
um, também causa o outro; o que elimina um, também elimina o outro.
Segundo Matos (2001), o analista de comportamento se interessa pelos com­
portamentos e sentimentos do cliente, mas, de fato, maneja as contingências de
reforçamento das quais eles são função. Ou seja, o interesse do comportamentalista
está sob controle dos comportamentos emitidos e eliciados, mas a açãoj transformadora
se manifesta pela apropriada intervenção sobre as contingências de reforçamento que
produzem os comportamentos de interesse. Pode-se afirmar que a contingência de
reforçamento é a unidade mínima de análise e de intervenção de que dispõe o analista
de comportamento para alterar comportamentos e sentimentos. Em um episódio
comportamental, caso se deseje retomar uma linguagem mais tradicional, as contin­
gências de reforçamento são as variáveis independentes e os comportamentos e sen­
timentos, as variáveis dependentes. Assim, preferimos abandonar o uso do termo Tera­
pia Comportamental e substituí-lo por uma expressão que, mais apropriadamente, se
refere ao papel do analista de comportamento na atuação em clínica: Terapia por Con­
tingências de Reforçamento (TCR) (Guilhardi, 2004a). Resumidamente, a TCR se pro­
põe a identificar e a alterar as contingências de reforçamento, que estão operando na
vida da pessoa, com o objetivo de instalar, manter ou enfraquecer comportamentos e
sentimentos, em beneficio do cliente e do grupo social ao qual ele pertence.

Sobre Comportamento e Cognição 63


Jrig.1. Representação esquemática da tríplice contingência de Reforçamento.

Respostas operantes e respondentes,


públicas e privadas (as quais ainda não
Antecedentes Conseqüências
podem ser chamadas de
comportamentos)

As contingências de reforçamento podem ser constituídas por dois ou mais


componentes, mas a tríplice contingência, muito apropriadamente, permite a compre­
ensão de grande parte dos comportamentos e sentimentos humanos. Ela não se
define pela topografia com que cada elemento da contingência se apresenta, mas pela
função que cada um tem sobre os demais. O antecedente, a resposta e a conseqüên­
cia se influenciam reciprocamente, dando origem a uma unidade funcional, instrumen­
to operacional do analista de comportamento. Tal é a possibilidade que o psicoterapeuta
tem de transpor, do nível conceituai para o nível operacional, o objeto de estudo da
Análise do Comportamento: influir nos componentes das contingências de reforçamento,
de modo a alterar a interação entre organismo e ambiente. O profissional concretiza a
ação de estudar as interações organismo-ambiente, transformando-as nas.inúmeras
composições de tríplices contingências de reforçamento, tais como contingências de
reforçamento positivo discriminado, reforçamento negativo, punição positiva, punição
negativa etc. Qualquer ação humana é determinada pela interação de um grande nú­
mero de contingências de reforçamento, operando simultaneamente.
A Análise do Comportamento faz uma clara oposição às posturas “mentalistas”,
que atribuem um status causal aos estados mentais ou aos sentimentos. E também
não se limita a tomar como determinantes demonstráveis do comportamento os as­
pectos do ambiente ou estímulos que o antecedem: “nenhuma descrição do intercâm­
bio entre organismo e meio ambiente estará completa enquanto não incluir a ação do
ambiente sobre o organismo depois da emissão da resposta” (Skinner, 1969, p. 5). Os
estados mentais só caberiam numa versão dualista do ser humano. A Análise do Com­
portamento é monista e a determinação mental fica excluída. Os sentimentos são
manifestações do organismo. Assim, o sentimento de raiva, por exemplo, inclui compo­
nentes operantes (xingar ou esmurrar alguém, por exemplo); respondentes (taquicardia,
alterações na pressão arterial etc.); e as contingências de reforçamento que produzem
tais comportamentos operantes e respondentes (sem conhecê-las, não é possível
identificar, nem nomear os sentimentos ou emoções, uma vez que os mesmos
operantes e respondentes podem estar presentes em diferentes sentimentos ou emo­
ções, ou ser evocados e eiiciados por diferentes contingências). Os sentimentos, por­
tanto, são causados (e não causa) e fazem parte do conjunto de interações que ocor­
rem ná pessoa sob influência de contingências de reforçamento (Guilhardi, 20 0 2 ,2004b,
2004c). (Cabe concluir que a distinção entre comportamentos e sentimentos é arbitrá­
ria e desnecessária. Tanto comportamentos, como sentimentos são manifestações do
organismo. Quando se demonstra de quais contingências de reforçamento as mani-
féstáções operantes são função e quais estímulos eliciam as manifestações
respondentes, conclui-se que todas elas podem ser agrupadas sob um único termo:
sãp comportamentos,) Portanto, pensar em contaminação, sentir ansiedade, lavar re­
petidamente as mãos, sentir alívio são todos eventos comportamentais. Cabem duas
questões: o que os determina e como podem ser alterados em benefício do cliente?

64 Helen Copque, Hélio José Quilhardi


Pensar em contaminação pode ser considerado o primeiro elo operante de um
encadeamento de respostas operantes e respondentes e, como tal, usar um procedi­
mento que o elimine impossibilitará a ocorrência dos elos sucessivos (o que é desejá­
vel psicoterapeuticamente). Aí está a razão pela qual se tem a impressão de que a
mudança do pensamento de contaminação (obsessão) altera os sentimentos (ansie­
dade) e o comportamento de lavar as mãos (compulsão). De fato, é o procedimento que
elimina ou altera o primeiro elo do encadeamento (no caso, o pensamento de contami­
nação), o fator que causa a alteração dos elos seguintes. Assim, o foco da análise do
psicoterapeuta não deve estar centrado na mudança do pensamento (por exemplo, o
cliente passar a dizer para si mesmo: “O fato de eu tocar um objeto não significa que
contaminei minha mão."), mas no procedimento que produziu tal mudança no pensa­
mento. A mudança na crença não ocorre espontaneamente; eia é produto de contingên­
cias de reforçamento aplicadas pelo psicoterapeuta. É próprio afirmar que a mudança
no pensamento é importante para o progresso do cliente, mas tal mudança foi causada,
ela não é causa. A alteração no primeiro elo do encadeamento alterará os elos seguin­
tes. Às vezes, basta aiterar um elo, que ao perder a função de SD ou de S pré-aversivo
para os elos seguintes, interrompe toda a cadeia comportamental ou dá origem a uma
nova cadeia de respostas (a qual, espera-se, será desejável). Outras vezes, é também
necessário aplicar procedimentos sobre outros elos do encadeamento. Assim, por
exempio, o pensamento de contaminação pode ter mudado, mas não o ritual de lavar as
mãos (o oposto também pode ocorrer a pessoa cessa o comportamento compulsivo
de lavar, mas continua pensando que se contamina ao tocar objetos). Pode ser neces­
sário impedir a ocorrência da resposta de iimpeza e, desta forma, levar o cliente a testar
empiricamente a falsidade da relação supersticiosa por ele estabelecida, qual seja a
de que tem evitado a contaminação por manter-se lavando as mãos... Segundo este
raciocínio, qualquer procedimento que quebre o encadeam ento terá efeito
psicoterapêutico. Na prática, os dois procedimentos mais empregados são: mudar os
pensamentos (reestruturação cognitiva, segundo Beck, Rush, Shaw e Emery, 1979) ou
impedir a ocorrência do comportamento compulsivo (prevenção de resposta compulsi­
va). Ambos intervêm no encadeamento. Note que a variável com função psicoterapêutica
(variável independente), no primeiro caso, é o procedimento que mudou o pensamento
de contaminação. Não é o “novo” pensamento, (por exemplo, “tocar o sofá não me
contaminará”), uma vez que este é o produto, a variável dependente do procedimento
aplicado. No segundo caso, a variável com função psicoterapêutica é o procedimento
que impede a ocorrência do comportamento de lavar as mãos: manter a mão “contami­
nada", através do procedimento de prevenção da resposta de fuga-esquiva, no qual a
pessoa é orientada para cessar o ritual de lavar a mão, rompendo, desta forma, a
relação supersticiosa elaborada pelo próprio cliente. A eventual mudança no pensa­
mento ("Posso tocar os objetos e não me contaminarei") é também produto do procedi­
mento de prevenção de resposta e não é tal mudança que causa a eliminação do ritual
de lavar as mãos.
A interação entre ambiente e organismo, como se viu, deve sempre especificar
a ocasião na qual uma resposta ocorre, a própria resposta e as conseqüências por ela
produzidas (Skinner, 1953, 1957, 1969, 1989, 1990). Um analista do comportamento,
para explicar qualquer comportamento operante (lavar as mãos, sentir ansiedade e
pensar em contaminação) recorre às descrições das interações funcionais entre a
resposta apresentada e os ambientes antecedente e conseqüente à resposta. Tais
interações são denominadas de contingências de reforçamento, nas quais contingên­
cia é um termo que descreve regras que especificam relações entre eventos ambientais
ou entre comportamento e eventos ambientais (Skinner, 1969).

Sobre Comportamento e Cognição 65


Até o momento foram destacadas as duas principais diferenças entre o modelo
comportamental e o modelo cognitivo. Em primeiro lugar, para o modelo comportamental,
pensamentos e sentimentos são classes de comportamentos, tanto quanto a classe
de comportamentos motores. Em segundo lugar, as três classes de comportamentos
são fruto da história de contingências de reforçamento e devem ser explicadas buscan­
do-se as relações funcionais entre o ambiente antecedente, a resposta e o ambiente
conseqüente. O que diferencia a classe motora das demais é o acesso que o observa­
dor tem aos comportamentos que compõem cada classe comportamental. Comporta­
mentos públicos (por exemplo, andar, falar etc.) podem ser observados por outra pes­
soa, além daquela que está se comportando. Comportamentos privados (por exemplo,
pensar, imaginar, sentir etc.) tornam-se conhecidos para o outro através do relato verbal
do sujeito que está se comportando ou através de inferências feitas a partir de acompa­
nhantes públicos a eles associados (para maiores detalhes, ver Skinner, 1945).
Tal característica de difícil acessibilidade ao outro observador, entretanto, não
confere aos pensamentos ou sentimentos natureza diferente daqliela das demais
manifestações do organismo e nem lhe dá status diferenciado ou superior aos compor­
tamentos motores. Para explicar a origem de quaisquer comportamentos, deve-se vol­
tar à história genética (filogênese), à história de vida do sujeito (ontogênese) e à história
da cultura ou ambiente social mais amplo onde o sujeito está inserido. Portanto, pensa­
rnento e sentimento não devem ser propostos como causas de comportamento e de­
vem ser explicados também, como qualquer outro comportamento.
Com esta afirmação não se pretende afirmar que os analistas do comporta­
mento não dão importância a pensamentos e sentimentos. Muito pelo contrário. Se este
modelo tem como foco o comportamento e classifica pensamento e sentimento como
tal, é acertado concluir que o que pensamos e sentimos é tão importante quanto o que
fazemos.
Tanto os cognitivistas, como os analistas de comportamento têm os pensa­
mentos como objeto de estudo. A diferença é que os cognitivistas aceitam a proposição
de que o pensamento provoca ou causa o comportamento. No caso do TOC, um
cognitivísta afirmaria que os pensamentos obsessivos, ou seja, o modo como o porta­
dor interpreta as experiências determina a ansiedade e as compulsões. Para tal mode­
lo, acontecimentos ambientais evocariam pensamentos (processamento cognitivo) e
os pensamentos determinariam os sentimentos e os comportamentos. É interessante
sinalizar que o modelo cognitivísta, arbitrariamente, inicia o processo causal no pensa­
mento, que se torna o ponto de partida para o que se segue. Por que não iniciar o
processo causal num item anterior, respondendo a duas questões: o que causou aque­
le determinado pensamento? O que o vem mantendo presentemente? Respondidas
tais perguntas, seria possivel - se tal objetivo for desejável - evitar o aparecimento do
pensamento ou eliminá-lo. Outra questão é: o que toma tal pensamento tão devastador
para determinada pessoa? Todas as questões podem ser respondidas voltando-se
para a história de contingências e para as contingências de reforçamento atuais. Como
se pode mudar um pensamento, sem alterar o que o produziu ou o que o vem manten­
do? Como se pode mudar o significado idiossincrático aversivo que um pensamento
apresenta, sem lidar com o que produziu e mantém tal função adversa?
- ' A conclusão é que a Análise do Comportamento, uma vez mudado o pensa­
mento (por exemplo, o pensamento aversivo de contaminação), reconhece que o res­
tante do encadeamento, que inclui a ansiedade e a compulsão (por exemplo, lavar as
mãos, o que eliminaria o efeito da contaminação), também muda. O que ela discute é
como e o quê produz a mudança no pensamento, pois só assim se reconhece qual é o

66 Heten Copque, Hélio José Quílhardi


procedimento funcionalmente eficiente, do qual a mudança no pensamento é função. A
variável independente é o que o terapeuta faz com o pensamento e não o que o pensa­
mento faz com o resto.
Na Terapia Cognitiva, portanto, a principal estratégia psicoterapêutica é ajudar
os pacientes a identificarem seus pensamentos, principalmente os chamados
disfuncionais, testar se as cognições têm base na realidade e corrigir tais pensamen­
tos. Por este motivo utiliza-se o registro de pensamento automático (além de outros
recursos), instrumento que habilita o portador a reconhecer e a questionar seus pensa­
mentos disfuncionais (Beck, Rush, Shaw e Emery, 1979).
O Analista do Comportamento considera que os pensamentos obsessivos, a
ansiedade e as compulsões foram provocados ou determinados por contingências de
reforçamento. Estas são o objeto de estudo e de manipulação psicoterapêutica. O
papel do psicoterapeuta, que atua com a Terapia por Contingências de Reforçamento
(TCR), é investigar as variáveis que contribuem para a instalação e manutenção dos
comportamentos, descrevendo e alterando as complexas interações entre contingênci­
as de reforçamento.
O caso hipotético, apresentado a seguir de maneira esquemática e didática
para facilitar a compreensão do leitor, servirá para ilustrar, em linhas bastante gerais,
como seria conduzida, pela Terapia por Contingências de Reforçamento (TCR), a siste­
matização de contingências de reforçamento e a introdução de procedimentos
terapêuticos para lidar com um cliente com queixa de TOC com sintomas de contamina­
ção. Para fornecer uma visão geral do processo psicoterapêutico, serão apresentados
alguns níveis de análise conceituai e alguns procedimentos que alteram as contingên­
cias de reforçamento que instalaram e vêm mantendo os comportamentos e os senti­
mentos do portador do TOC (note que não é objetivo dos parágrafos seguintes demons­
trar precisamente o processo terapêutico de um caso real conduzido de acordo com a
TCR).
Considere-se, como ilustração, a seguinte narrativa. Uma criança adquiriu o
comportamento de íavar as mãos sistematicamente por: imitação (uma pessoa social­
mente significativa para a criança, por ex., a mãe, emitia tal comportamento, dando-lhe
modelo de como se comportar e, ao imitar a mãe, a criança recebia atenção); por
instrução verbal (uma pessoa socialmente significativa lhe dizia o que fazer e a
conseqüenciava com atenção por atendê-la); por fuga-esquiva (se a criança não lavas­
se as mãos, era criticada ou punida de alguma forma; “Você não pode sentar-se à mesa
e comer com essas mãos imundas’’.); por ouvir tatos verbais distorcidos1 sobre “mãos
sujas” (“As mãos são a porta de entrada para infecções"; “Há micróbiòs por toda parte
e basta tocá-los com as mãos para se contaminar" etc.); por modelação ou imitação
vicariante (a criança observou que a mãe ficava extremamente perturbada, ansiosa etc.,
quando tocava alguma coisa que considerava como fonte de infecção e ficava calma e
' Tacto dstorddo é o comportamento verbal emitido sob controle de aspectos Idiossincráticos de «ventos ou de relações entre eventos
ambientais, que não constituem 8 essência do evento controlador (a comunidade verbal em geral não f ca sob controle daquelemesmc
aspecto particular do evento ambiental) ou o evento controlador é inexistente para a comunidade (oomo ocorre no caso de um delírio
psicótico). C tacto distorcido pode vira controlar o oomportamento de parle dos ouvintes, os quais, dessa maneira, conseqüendam e mantêm
a emissão do tacto distorodo.
Per exemplo;
diante de um marido que chega tarde do trabalho, completamente exausto, a mulher dteque eleé Insensível" è família e “egoísta"
(possivelmente, os filhos, sob controle das verbalizações da mãe, começam a dizer que o pal ê egoísta); uma mãe diz ao pediatra que o fil ho
"n&o comeu nada’ o dia inteiro, embora a criança tenlha comido uma fruta e bolachas na hora do almoço (ocasionalmente, o pediatra pode
prescrever vitaminas para “abrir o apetite’ da criança). Pode ooorrer que um tacto distorcido venha a ser, posteriormente, um tacto puro ou
objetivo (Skhner, 1957). Tal mudança de função dos estímulos acontece naquelas situações nas quais a comunidade passa a responder sob
controle da aspectos do ambiente que antes não controlavam o comportamento verbal de seus membros, os quais ficam agora sob influência
da novos dados empíricos. Provavelmente, as primeiras asserções de Pasteur sobre a existência de microorganismos que causavam doenças
foram consideradas inaprapriadas...

Sobre Comportamento c Cognição 67


aliviada após engajar-se em rituais de lavar as mãos). Exposta a tais contingências de
reforçamento (e, possivelmente, a outras da mesma classe), que compõem sua história
de desenvolvimento comportamental, a criança pode adquirir não apenas o comporta­
mento de lavar as mãos (operante público), mas também pensamentos, imagens etc., a
respeito de lavar as mãos (operantes, inicialmente públicos, emitidos com a função de
tactos verbais - como, por exemplo, “mamãe, lavei minhas mãos direitinho, como você
gosta...” que, posteriormente, tomam-se operantes privados) e, ainda mais, sentimen­
tos associados ao comportamento de lavar as mãos (sentir o próprio corpo, isto é, sentir
os resporidentes eliciados pela emissão do comportamento de se lavar, aos quais a
criança aprende a nomear como “alívio”, “prazer” etc. A criança pode, inclusive, avaliar
seus comportamentos ritualísticos como “gosto de lavar minhas mãos”, "me sinto bem
com as mãos limpas” etc.). (Note que, se outras contingências de reforçamento forem
funcionalmente mais relevantes, a criança não irá adquirir os padrões comportamentais
assinalados e, como conseqüência, não será portadora de TOC.)
As mesmas contingências de reforçamento (de acordo com uma dada história
particular de interação familiar) que deram origem a comportamentos ritualísticos de
limpeza (chamados de compulsões) podem dar origem a pensamentos aversivos
repetitivos associados com contaminação: “há micróbios em toda parte.,.”; “micróbios
matam..."; “lavar muitas vezes as mãos evita doença...” (chamados de obsessões).
Note que a ordem de instalação dos comportamentos de lavar as mãos ou pènsar em
contaminação pode variar, dependendo de particularidades da história de contingênci­
as de cada um. O que importa destacar é que fazer (“lavar as mãos") ou pensar (“micró­
bios causam doenças") são comportamentos produzidos pelas mesmas classes de
contingências de reforçamento e, como tal, um não é hierarquicamente mais ou menos
relevante que o outro; um não detemiina o outro.
Atualmente, já adquiridos os comportamentos, tanto os públicos como os enco­
bertos, o funcionamento comportamental da pessoa pode passar ao controle de contin­
gências de reforçamento que produzem ansiedade. Tal ponto ficará mais claro apresen­
tando-se o paradigma da ansiedade demonstrado em condições experimentais:

Fig.2. Representação esquemática do paradigma da ansiedade

Estímulo Condicionado (CS) Resposta (R) Estímulo Incondicionado(US)

É apresentado um estimulo Não há resposta Após os 10 seg, a luz é


neutro arbitrário (luz) com possível que evite a desligada e é apresentado um
duração fixa qualquer (10 apresentação do S S aversivo inescapável
seg) aversivo (choque elétrico) com uma
duração fixa pré-determinada
(2 seg)

Após algumas associações Juz-choque, a luz adquire a função de um estimulo


pré-aversivo condicionado (CS) e a sua apresentação produz alterações comportamentais
e emocionais no sujeito experimental: respondentes (defecar, urinar, arrepiar os pelos
etc.) e operantes (roer as barras da base da caixa experimental, se mover “sem rumo”,
tentar se equilibrar em uma única barra da base da caixa etc.). Após o choque, tais
comportamentos cessam até a apresentação seguinte do CS. Convencionou-se chamar
tal procedimento de paradigma de ansiedade e as reações observadas durante a pre­
sença do CS de ansiedade condicionada.

68 Helen Copque, Hélio José Quilhardi


O análogo animal acima descrito oferece um modelo de compreensão do que
pode ocorrer com a pessoa. Assim, objetos neutros para as pessoas em geral, quanto
à possibilidade de contaminação, adquiriram para o cliente funções pré-aversivas con­
dicionadas (têm a função da luz), como resultado de uma história particular de contin­
gências a que foi exposto. A doença (que a pessoa acredita que poderá contrair como
resultado da contaminação) tem função equivalente à do choque: é o estímulo aversivo.
Há, no entanto, duas diferenças básicas entre o modelo experimental e a situa­
ção cotidiana da pessoa, que podem tomar o paradigma, no caso humano, disfuncional
1. A primeira diferença é que, na vida real, a infecção (equivalente ao choque) não ocorre.
No entanto, a pessoa, sob influência de alguém, pensa e acredita que se contaminará.
Aquilo que era uma "regra” arbitrária, sem apoio empírico, da pessoa socialmente signi­
ficativa (a mãe, por exemplo), formulada como uma contingência de reforçamento aversiva
para a criança: "Se você tocar o sofá, será contaminada por micróbios e, então, adoecerá",
passa a ser uma “auto-regra” para o cliente adulto, ou seja, ele próprio formula uma
contingência de reforçamento aversiva e passa a se comportar em função dela: “Se eu
tocar o sofá, serei contaminado”. Tal auto-regra cria o paradigma de ansiedade apenas
para aquela determinada pessoa e não para outras, as quais não foram expostas à
mesma história de contingências. A segunda diferença diz respeito à função da resposta
de fuga-esquiva: no análogo animal acima descrito, não há resposta de fuga-esquiva
possível durante o período entre a apresentação do CS pré-aversivo e a liberação do US
aversivo, ou seja, o sujeito experimental entrará, inevitavelmente, em contato com o cho­
que aversivo, doloroso e não emitirá nenhuma resposta operante com função superstici­
osa de fuga-esquiva do choque (na realidade, ocorre uma supressão do repertório operante
vigente antes e depois do período CS-US).
Durante seu desenvolvimento, o cliente aprendeu uma segunda “regra" com a
pessoa socialmente significativa, formulada como um comportamento de fuga-esquiva
do evento aversivo: “Se você lavar bem as mãos toda vez que tocar um objeto contami­
nado, então evitará contrair qualquer moléstia”. Tal “regra” passa a ser uma "auto-regra"
para o cliente adulto ("se eu lavar bem as mãos toda vez que tocar...”) e a “auto-regra”
passa a funcionar como uma instrução para si mesmo: “Vá e lave bem as mãos. Lave
ainda melhor. Lave também os braços” etc. e, desta forma, a resposta compulsiva vai
variando, se tornando mais complexa e mais elaborada. Nesta condição a pessoa
emite a resposta de fuga-esquiva (lavar as mãos) e evita supersticiosamente o evento
aversivo (contaminação e doença), que de qualquer maneira não ocorreria, mesmo que
a resposta não houvesse sido emitida,
O que mantém o comportamento compulsivo de fuga-esquiva lavar as mãos? É
a relação supersticiosa (no sentido de que não é uma relação real) de evitação da
moléstia, que efetivamente não vem (não necessariamente por causa do ritual de lim­
peza, pois a pessoa raramente tocará objetos contaminados). É como se ela dissesse
para si mesma: “Funcionou. Lavei as mãos é nada de ruim me aconteceu”. Como
podem ocorrer novas “contaminações" (a pessoa, necessariamente, continuará tocan­
do inúmeros objetos na sua rotina cotidiana), há necessidade de emissão de novos
rituais compulsivos. Assim, o ciclo: tocar um objeto (o qual, muito provavelmente, não
está contaminado), pensar que se contaminou, sentir ansiedade, lavar as mãos de
modo compulsivo, diminuir temporariamente a ansiedade, voltar a pensar que se con­
5Pode-se dizer que o paradigma gera padrões de comportamentos e de sentimentos 'atípicos“, quando os componentes do paradigma nã o têm
função generalizada para Indivíduos da mesma espécie. Assim, por exemplo, um choque doloroso Inescapávd tem função aversiva para o
oiganlsmo, experimental ou humar», Independente de história peoiiar de contato com contingências e,oomo tal, produz padrões comportamentais
de ansiedade, que não deveriam ser rotuladas de “atípicos“. Per outro lado. um comentário a respetta de um trabalho realizado pode lertunção
decríGca aversiva para uma pessoa ou de ajuda para melhorar o desempenho para outra, dependendo da hlstúria de contingências de cada uma
delas. Portanto, a ansiedade gerada por um comentário pode ser considerada “atípica“

Sobre Comportamento e Cognição 6 9


taminou e assim sucessivamente, vai se repetindo com a adição de pensamentos cada
vez mais aversivos sobre contaminação e com variações cada vez mais sofisticadas de
rituais de descontaminação.
Com tais informações disponíveis, o psicoterapeuta pode adotar vários proce­
dimentos, aplicados isoladamente ou em conjunto. (Estão exduidos desta apresenta­
ção os procedimentos médicos, não obstante poderem ser parte integrada dos proce­
dimentos terapêuticos.) Assim:
a. Descrever para o cliente as contingências de reforçamento sociais que deram ori­
gem à auto-regra. (Auto-regra é o termo usado na proposta comportamental, que
equivale aos termos pensamento automático, crenças centrais, crenças condicio­
nais, pensamentos irracionais etc.). Ao conhecer como as auto-regras foram instala­
das, foi dado um passo na direção de enfraquecê-las e eliminá-las. O cliente constata
que emite um comportamento que foi aprendido sob controle de contingências soci­
ais equivocadas, assim nomeadas, pois não descrevem a realidade. Se são compor­
tamentos aprendidos, podem, então, ser eliminados e substituídos por outros com­
portamentos apropriados, desde que sejam alteradas, na direção apropriada, as
contingências de reforçamento em operação. Fala-se em reestruturação cognitiva, na
abordagem cognitiva; ou substituição de auto-regra disfuncional por outra funcional,
na perspectiva comportamental:
b. Proceder a orientação familiar, visando a reorganizar as contingências de reforçamento
sociais que vêm mantendo e reforçando diferencialmente os padrões comportamentais
considerados indesejados, substituindo-as por-contingências de reforçamento con­
tingentes a comportamentos desejados, alternativos ou incompatíveis com aqueles
que se deseja eliminar, mesmo que expressos, no inicio, de forma incipiente;
c. Impedir o cliente de emitir o comportamento de fuga-esquiva supersticioso (ele não
pode lavar as mãos com o propósito de evitar a contaminação), de tal maneira que ele
passe a discriminar que a moléstia não ocorre, mesmo não tendo se descontaminado.
No início, há um aumento da ansiedade diante da suposta iminência do evento aversivo,
mas, com a sucessiva constatação de que a contaminação não ocorreu, o CS pré-
aversivo - “objeto que contamina” - perde a função aversiva. No análogo animal, seria
equivalente a apresentar a luz (CS) e não apresentar o choque aversivo. Paulatina­
mente, o CS perde a função de estímulo pré-aversivo e o animal deixa de apresentar
comportamentos operantes e respondentes sob controle do estímulo pré-aversivo e
desaparece a ansiedade (o estímulo com função pré-aversiva toma-se neutro). Fala-
se em prevenção de resposta de fuga-esquiva;
d. Aumentar o contato do cliente com as condições de contaminação, de modo a au­
mentar a probabilidade de, segundo a auto-regra por ele formulada, ser infectado
pelos micróbios. Esta técnica deve ser associada com a anterior, de tal maneira a
acelerar o processo de rompimento das seguintes relações supersticiosas: 1. tocar
objetos produz contaminação (com este procedimento ocorrem muitos contatos físi­
cos com objetos “contaminadores" e nada ocorre); e 2. lavar compulsivamente as
mãos elimina o efeito da contaminação, e a moléstia, por essa razão, não ocorre (a
pessoa é impedida de lavar as mãos e a moléstia não aparece). Trata-se de procedi­
mentos de extinção operante e de extinção respondente;
e. Instalar comportamentos de “contaminar-se”, isto é, de tocar objetos potencialmente
perigosos para o cliente e consequenciá-io com atenção, elogio etc., prováveis refor­
ços sociais generalizados positivos, de modo a fortalecer comportamentos de produ­
zir os eventos pré-aversivos e de testar a função supersticiosa que têm. O procedi-

Helen Copque, Hélio José Çuilhardi


mento chama-se reforçamento positivo de comportamentos incompatíveis com com­
portamentos de fuga-esquiva;
f. Instalar outros comportamentos que produzem reforços positivos sociais e não soci­
ais, arbitrários e naturais, com o objetivo de ampliar o repertório de comportamentos
do cliente, habituando-o a Interagir com novas pessoas, a engajar-se em atividades
culturais, de lazer, de participação comunitária, de trabalho etc. O aumento generaliza­
do e amplo de repertório de comportamentos de interação com o mundo em que a
pessoa está inserida e a manutenção de tal repertório por conseqüências reforçadoras
positivas são maneiras de enfraquecer um repertório inadequado forte, através do
fortalecimento de outros comportamentos que não aqueles indesejados. Tal procedi­
mento chama-se reforçamento positivo diferencial de quaisquer outros comporta­
mentos, exceto daqueles que são indesejados (DRO).

A aplicação simultânea de todos os procedimentos apresentados aumenta a


probabilidade de sucesso psicoterapêutico, ressalvando-se que cada técnica tem que
ser adaptada às condições particulares de cada cliente.
A proposta da Análise de Comportamento e da TCR apresentada para lidar com
o TOC é coerente com o modelo conceituai delineado no início do presente artigo e
abrange tanto os comportamentos privados como os públicos. A análise apresentada
os mantém sob controle das mesmas leis que regem quaisquer comportamentos e
subtrai dos comportamentos privados, quer sejam pensamentos ou sentimentos, a
função de causadores de comportamentos públicos ou de quaisquer outros comporta­
mentos. Os sentimentos envolvidos no episódio de TOC, sendo comportamentos
operantes e respondentes, também são influenciados pelo rearranjo das contingênci­
as de reforçamento e se alteram na direção determinada pelo manejo bem sucedido do
procedimento, sem merecer, nem exigir nenhum tratamento especial (por se tratar de
sentimentos), que vá além das mencionadas alterações das contingências de
reforçamento.

Referências

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Helen Copque, Hélio José Çuilhardi


- Qipítulo 6
Tratamento psicoterâpfco do tabagismo

Verena Castellaní Vitor Santos*


IP Q -H C -Q R E A
Luclína Roberta Donola Cardoso**
IP Q -H C -Q R E A
Paulo Roberto Abreu***
IPQ - H V J /H C -F M U S P

O tabagismo é uni dos maiores problemis mündiais de Saúde Pública. A


Organização Mundial de Ssúde (OMS) estima que um terço da população mundial seja
fumante. Segundo a OMS, o tabagismo é considerado a maior causa de mortes evitá­
veis do mundo. A cada ano, aproximadamente 4 mllhôes de homens e 1 milhão de
mulheres morrem no mundo por doenças relacionadas ao tabagismo. No Brasil, este
índice já chega a 200 mil mortes por ano (INCA, 2002; World Health Organization, 2007).
Segundo Gigliotti, 80,5% dos fumantes em quetro capitais brasileiras decla­
ram desejo de parar de fumar (Gigliotti, 2005). Poróm, mesmo os tratamentos que
envolvem múltiplas técnicas ainda conseguem taxas dfc eficácia menores do que o
desejado.
A eficácia no tratamento do tabagismo tem sido associada à combinação da
terapia farmacológica (medicações para controle do desejo de fumar e sintomas de
abstinência e repositores de nicotina) e a psicoterapia. A combinação desses dois
tratamentos tem mostrado melhores resultados quanto ao parar de fumar e se manter
abstinente.
A Terapia Com portam ental, Terapia Cognitiva e Terapia Cognitivo-
Comportamental são as p$icoterapias que apresentara os melhore^ resultados no
tratamento do tabagismo.
O presente trabalho teve por objetivo fázer um levantamento bibliográfico sobre
o tratamento psicoterápico do tabagismo, enfocando a Terapia Comportamentai,
Cognitiva e Cognitivo-Comportamental.

Metodologia
Foi realizada uma busca bibliográfica por meio de periódicos indexados nas
bases de dados MedIJne e Scielo nos períodos de 1997 a 2007, cruzando os unitermos

* Médica Psiquiatra, Pesquisadora no Instituto d® Psiquiatria do Hospital das Clinicas


** Mestre em Psicologia Experimenta!, Pesquisadora no Instituto de Psiquiatria do Hospital d*s Clinicas)
*** Espedaíista em Terapia Comportamentai, Colaborador no Serviço de Psiquiatria do Hospital Universitário da U S P .

Sobre Comportamento e Cognição 73


behavioral therapy,_cognitive therapy, terapia cognitiva, terapia comportamental com os
unitermos smoking cessationt nicotine addiction, tabagismo e dependência de nicotina.
Foram selecionados artigos em português e inglês e excluídos os trabalhos
não encontrados no Brasil. Os artigos incluídos enfocavam as terapias comportamentais,
cognitivas e/ou cognitivo-comportamentais como tratamento para o tabagismo.

Resultados
1.Terapia Comportamental
As intervenções baseadas na Terapia Comportamental visam analisar funcional­
mente os estímulos antecedentes e conseqüentes relacionados ao comportamento. Esta
análise tem por objetivo identificar eventos associados na instalação e/ou manutenção
do comportamento. A análise funcional, ou seja, descrição das variáveis relacionadas aos
Comportamentos favorece com que o terapeuta modele comportamentos adequados ao
contexto ou que gerem aumento de reforçadores positivos.
No tratamentQ do tabagismo, entende-se o fumar como um comportamento
multideterminado. Existem múltiplos reforçadores (positivos e negativos) que contribuem
na instalação e manutenção deste comportamento. Eventos contextuais geralmente es­
tão associados com reforçadores sociais positivos e negativos na manutenção do com­
portamento de fumar, como por exemplo, o reconhecimento socia! e a esquiva de brigas
familiares, respectivamente. Já os eventos internos, como a fissura e a abstinência cau­
sadas pelos efeitos da nicotina, estão relacionados, sobretudo, aos reforçadores negati­
vos. Deste modo, em muitas circunstâncias, pode-se entender o comportamento de
fumar como aquele mantido por esquiva de estímulos aversivos produzidos, tanto por
estímulos contextuais pareados ao comportamento operante de fumar (hábito de fumar)
quanto, pelos comportamentos respondentes elidados com a ausência da nicotina
O tratamento psicoterápico do tabagismo é planejado utilizando procedimen­
tos que visem ensinar o paciente a identificar os estímulos antecedentes e conseqüen­
tes associados ao comportamento de fumar; reforçar diferencialmente outros compor­
tamentos que não o de fumar (ou outros associados a este hábito) (DRO); treinar com­
portamentos incompatíveis; identificar os estímulos discriminativos que evoquem a
respostas de fumar; eliminar estímulos condicionados que eliciem fissura e/ou “desejo
de fumar”; modelar auto-regras; treinar habilidades sociais e resolução de problemas e
aumentar o repertório sociaí relacionado à rede de apoio fora do tratamento (APA, 1996;
Carmody, 1997; Fiore, 2000; Raw, 1998; USDHHS, 1996).
Em contrapartida, sabe-se que programas de tratamento nos quais as inter­
venções são baseadas somente na aplicação de técnicas comportam entais; na expo­
sição de contingências que envolvem o fumar com o objetivo de pareá-lo com um
estímulo aversivo; procedimentos que utilizam punição ao comportamento de fumar ou
as recaídas, ou ainda que utilizem de estilos confrontativos, não tem mostrado eficácia
no tratamento do tabagismo (APA, 1996; USDHHS, 1990).

2.Terapia Cognitiva
Segundo o modelo cognitivo desenvolvido por Beck et al, as crenças centrais
são responsáveis por sentimentos negativos que combinados levam a criação de cren­
ças de adicção (Beck, 1993). As crenças de adicção, por sua vez, estão associadas ao
comportamento de abuso de substância.
Irvings et al utilizaram a terapia cognitiva para tratar o tabagismo. Para tal, 152
sujeitos foram submetidos a uma intervenção composta por duas sessões em grupo
de duas horas (Irving, 2007). Os pesquisadores partiram do pressuposto que as cren­
ças sobre “o fumar” são distorcidas e, portanto são modificáveis.

Verena C. V. Santos, Luciana R. D. Cardoso, Paulo R. Abreu


Na primeira sessão foram abordadas as razões relacionadas ao h áb w d#
fumar e os benefícios percebidos do fumo (como a associação entre fumar e a di/flínuN
ção do estresse, relaxamento e prazer). Essas crenças são desafiadas e exploradii( já
que muitos destes benefícios são as eliminações dos sintomas de abstinêndii d§
nicotina. Nessa sessão, é conceitualizado a “fissura” e seus dois principais asplotO*.
O primeiro é o estresse causado pela abstinência, examinam-se pensamentos
“eu preciso do cigarro para lidar com essa situação”, ‘fumar é meu único prazer na vldi",
O segundo aspecto é a minimização e negação que freqüentemente aparecem erfl uma
pessoa que tenta parar de fumar, como: "quem quer viver para sempre?”, “o que ee
médicos realmente sabem?".
Na segunda sessão, foram abordadas técnicas de prevenção de recaídfl com
o foco em crenças como “só um não vai fazer mal”. Os participantes perceberam o
tratamento como positivo, os ajudando a mudar sua percepção do hábito de fumar,
aumentar sua confiança e motivação. O estudo mostrou bons resultados, já que 29.6%
dos participantes mantiveram-se abstinentes após 52 semanas. Entretanto, vale res­
saltar que houve falhas metodológicas ao apresentar grande perda de dados duranto o
seguimento de 52 semanas.

3-Terapia Cognitivo-Comportamental
A TCC consiste em desenvolver e aplicar estratégias que favoreçam mudanças
comportamentais e/ou cognitivas. Assim, ó uma combinação de diferentes cla sse s de
terapias, como a terapia racional emotiva, terapia de solução de problemas, terapia cognitiva
de Beck, terapia construtivista, entre outras. As combinações de estratégias vão de acordo
com as propostas teóricas das diferentes classes de terapia (Shinohara, 2001).
Muitos estudos vêm apontando a eficácia da TCC no tratamento do tabag ism o.
0 ’Connell et aí estudam a importância do tratamento psicoterápico (TCC) q u a rto se
pretende parar de fumar. Os autores distribuíram os indivíduos (N=292) em doisg!rupos.
Um grupo foi submetido a sessões d e psicoterapia e o outro grupo não foi su bm etid o à
acompanhamento terapêutico (tentaram parar de fumar sozinho). A s in terven çõ e s fo­
ram baseadas em estratégias de enfrentamento. As estratégias de enfrentam einto fo­
ram dividiram entre cognitivas (pensar nas conseqüências negativas de fumar,, aut5 '
motivação, auto-eficácia) e comportamentais (evitar situações de tentação, substituição
de comportamentos e distração) (O’Connell, 2006).
Foram avaliadas 1377 situações nas quais os participantes relatavam terem
"resistido'’ a “vontade” de fumar e 239 situações de lapso. Foram identificadas 2892
estratégias, onde 56% eram comportamentais e 44% cognitivas. Os resultados rfiostra-
ram que os participantes submetidos apenas as estratégias comportamentais (s>em as
estratégias cognitivas) apresentaram mais freqüentemente lapsos do que os partici­
pantes que foram submetidos à pelo menos duas estratégias comportamentais combi­
nadas. A combinação de uma estratégia comportamental e uma cognitiva mosírou os
mesmos resultados que as intervenções nas quais foram utilizadas duas estratégias
cognitivas associadas. Os autores concluíram que duas ou mais estratégias associa­
das têm maior chance de obter sucesso em relação ao parar de fumar, desde qiJQ uma
delas seja uma estratégia cognitiva.
Em outro estudo, Shadel investigou fatores que influenciavam fumantes ern trata­
mento para tabagismo. Para tal, avaliou o auto-conceito de fumante (importância de ser
um fumante) e o auto-conceito de abstinência (importância de se tomar um não-fuimante)
em 54 participantes. Após as avaliações todos os participantes foram submetidos 8 sete
sessões de TCC em grupo, com 90 minutos de duração (Shadel, 1997).

Sobre Comportamento e Cognição


O estudo encontrou uma relação entre o “status" (fumante ou abstinente) do
participante e os auto-conceitos. Os participantes que não conseguiram parar de fumar
ou que tiveram uma recaída apresentaram aumento no auto-conceito de fumante, en­
quanto os que tiveram sucesso em parar de fumar e conseguiram evitar uma recaída,
mesmo quando tiveram lapsos, apresentaram aumento do auto-conceito da abstinência.
A avaliação da eficácia da TCC no tratamento do tabagismo também foi verificada
por Jason, em seu estudo. O autor delineou um estudo no qual comparava os resulta­
dos obtidos em quatro intervenções diferentes, sendo elas: incentivo financeiro; auto-
ajuda; TCC e suporte socia! (Jason, 2005). Foram selecionados 1492 fumantes. Os
participantes submetidos à TCC e ao suporte social foram submetidos a seis sessões
nas primeiras três semanas e mais 14 sessões em 6 meses. Foi realizada uma avali­
ação com os participantes destes dois grupos a fim de investigar as estratégias que
eles relacionavam com a obtenção do sucesso em relação ao parar de fumar. Os
participantes relataram que as estratégias que consideraram mais importantes foram
técnicas de distração, diminuição de estresse e automonitorização.
Na primeira e segunda avaliação (em 6 e 12 meses) os participantes submetidos a
TCC foram aqueles que se mantiveram abstinentes ou com menores índices de recaídas,
comparado com os participantes submetidos as outras intervenções. O incentivo financeiro
mostrou melhor resultado que auto-ajuda em seis meses, mas não em 12 meses.
Como visto no estudo realizado por Jason, a combinação de diferentes teorias
é freqüente quando se pretende investigar os efeitos de uma intervenção na modifica­
ção de algum comportamento. Dando seguimento a este delineamento de pesquisa,
Carlson et al estudaram a relação do modelo transteórico na mudança de comporta­
mento em uma intervenção cognitivo-comportamental comunitária. Os grupos de inter­
venção, constituídos por aproximadamente 100 indivíduos, eram submetidos a oito
sessões de 90 minutos durante quatro meses (Carlson, 2002).
Foram abordados os efeitos nocivos do cigarro, automonitorização e uma data,
escolhida pelo grupo, para iniciar a abstinência. Também foram ensinadas técnicas
para manejo de estresse e para evitar o ganho de peso.
Os autores relataram que a terapia de grupo influenciou no tratamento do taba­
gismo. A terapia de grupo favoreceu discussões dos progressos, dificuldades e novas
estratégias desenvolvidas para parar de fumar e manter-se abstinente. Outro resultado
relevante nesse estudo é que estar no estágio de contemplação e preparação do modelo
transteórico mostrou ser um preditor de sucesso em três meses de abstinência.
A TCC freqüentemente è realizada em grupo e não apenas em um contexto de
terapia individual. Como visto no estudo realizado por Carlson, et al o contexto de grupo
parece muitas vezes estar associado ao sucesso do tratamento. Assim, a avaliação dessa
variável se toma importante quando se pretende verificar a eficácia de uma intervenção.
Os efeitos do grupo durante e após o tratamento foram estudados por Herzog et
a l . Os autores analisaram se membros de um grupo tendiam a se comportar da mesma
maneira em um tratamento para tabagismo. Foram realizados 33 grupos, totalizando 182
participantes. Os participantes receberam três tipos de tratamento com ênfase em técni­
cas de enfrentamento, redução de afeto negativo ou grupo de suporte e psicoeducacional.
Os resultados mostraram que os indivíduos tendem a se comportar da mesma maneira,
tanto na adesão (presença nas sessões) quanto na resposta ao tratamento (abstinên­
cia). Porém, esses efeitos se dissiparam em um mês (Herzog, 2002).
Outro fator, que quando abordado, parece estar relacionado ao sucesso do
tratamento do tabagismo são as variáveis relacionadas ao ganho de peso ou questões

Verena C. V. Santos, Luciana R. D. Cardoso, Paulo R. Abreu


relacionadas ao peso corporal. Pesquisas que consideram esta variável no tratamento
mostram resultados eficientes em relação ao parar de fumar e ao se manter abstinente.
Foram revisados dois estudos que abordam a relação do peso e terapia cognitivo-
comportamental em indivíduos dependentes de nicotina.
Mizes et al avaliaram o impacto das variações do peso corporal na recaída
durante um tratamento para tabagismo. Os participantes deste estudo recebiam trata­
mento medicamentoso com fluoxetina e terapia cognitivo-comportamental. A TCC foi
composta por nove sessões que abordavam automonitoração, controle de estímulos e
substituição de comportamentos (mascar chicletes e canudos, comer vegetais, cami­
nhada), técnicas para lidar com síndrome de abstinência e lapsos. A perda de peso não
tinha uma intervenção específica, mas os participantes eram estimulados a aumentar
os exercícios e diminuir ingestão calórica.
Os pesquisadores concluíram que os participantes que tinham maior preocu­
pação com o peso, independente do sexo, abandonaram o estudo mais rápido do que
aqueles que não tinham esta preocupação (Mizes, 1998).
Levine et al propõem um programa que aborda as preocupações com o ganho
de peso em tratamento para o tabagismo. O programa é dividido em três fases. Na
primeira fase discute-se questões relacionadas ao se manter abstinência. Na segunda
fase se escolhe uma data para parar de fumar e na terceira é enfatizada a prevenção de
recaída (Levine, 2003).
Os problemas relacionados ao peso são discutidos em todas as sessões.
Foram abordados os aspectos psicoeducacionais, como o risco de continuar fumante.
As crenças quanto à comida e peso são discutidas e é proposto modificações no estilo
de vida e não só relacionado ao peso.
Outro fator que não podemos deixar de citar é a associação da TCC com terapi­
as farmacológicas. O uso de terapias de reposição de nicotina (adesivo, chiclete, pas­
tilhas) associados com sessões de psicoterapia tem mostrado eficácia no parar de
fumar e em se manter abstinente (Pollak, 2007).
No tratamento do tabagismo além das preocupações em relação ao parar de
fumar, pesquisadores dão a mesma (ou até mais) importância ao fato do se manter
abstinente.
Sabe-se que um fator freqüentemente relacionado ao voítar a fumar é o
distanciamento da conseqüência que os levaram a cessar este comportamento, como
por exemplo, mulheres que param de fumar enquanto grávidas e com o nascimento/
crescimento dos filhos voltam a fumar.
Mercer propõem um modelo teórico a fim de discutir questões relacionadas à
recaída em mulheres. O primeiro aspectos relacionado a recaída foi a intenção prévia
de manter-se abstinente após o parto. O segundo aspectos foi relacionado as crenças
da mãe quanto a sua capacidade de prover cuidados ao bebe, especialmente quando
apresenta dificuldades para cuidar do filho. Essa insegurança pode refletir na sua auto-
eficácia para se manter abstinente e ocasionar uma recaída (Mercer, 2004).
Outro estudo que avalia o impacto da gestação no tratamento do tabagismo foi
realizado Lumbley em 2006. O autor avaliou diversas intervenções para o tratamento de
tabagismo durante a gestação. As intervenções que demonstraram melhores resulta­
dos, quando avaliados os riscos do próprio tratamento para a gestação, foram às inter­
venções cognitivo-comportamentais. Porém alguns fatores foram relacionados à me­
nor eficácia em relação ao parar de fumar a ao se manter abstinentes, como por exem-

Sobrc Comportamento e Cognição 77


pio, baixa escolaridade, ser fumante pesado (mais que 10 cigarros ao dia) e ter parcei­
ro sque fumam (Lumbley, 2006).
4.Terapia de Aceitação e Comprometimento (ACT)
A ACT é uma proposta terapêutica que visa interromper processos de aprendiza­
gem decorrente dos contextos sócio-verbais presentes em nossa comunidade. Esses
processos tenderiam a levar a não aceitação e a tentativa de controle e esquiva de deter­
minados sentimentos, como forma de resolução de problemas (Hayes e Wilson, 1994).
Formulada a partir da proposta do distanciamento compreensivo tem por objetivo
enfraquecer as esquivas emocionais e aumentar respostas relacionadas à capacidade
para mudança do comportamento, bem como “resgatar” reforçadores que atualmente
não fazem parte do repertório do sujeito (Brandão, 1999).
As estratégias de intervenção da ACT envolvem:

1. Desamparo criativo: mostrar para o cliente que dentro do contexto no qual ele está
inserido não existe solução e que a estratégia de resolução do problema é ineficaz
(controle dos comportamentos encobertos). Assim, o cliente tende a desenvolver outra
estratégia de resolução do problema
2. Controle dos eventos privados: aponta ao cliente as contingências relacionadas ao
comportamento (encoberto) de esquiva.
3. Discriminação entre o eu e o comportamento: Se promove a separação entre a pes­
soa que se comporta e o comportamento, criando um contexto em que se tome possível
a aceitação de reações emocionais indesejáveis
4. Escolha e valorização de uma direção: ao invés de controlar comportamentos enco­
bertos, deve alterar os comportamentos abertos.
5. Abandono da disputa: quando a luta do cliente com seus sentimentos serão abando­
nados, ou seja, o cliente aprender a aceitar os seus sentimentos
6. Compromisso com a mudança: ao final busca-se uma redução na esquiva emocio­
nal e aumento das habilidades de assumir e manter compromisso de mudança
comportamental

Utilizando essas estratégias uma pesquisa buscou mostrar a eficácia da ACT


no tratamento do tabagismo. O autor propõe comparar dois tratamentos: 1) interven­
ções baseadas na ÀCT e 2) uso de adesivos de reposição de nicotina. Os participantes
que usaram os adesivos compareciam semanalmente na clínica para a troca dos ade­
sivos, isso ocorreu durante sete semanas. Os participantes designados ao grupo de
ACT foram submetidos a sete sessões de 50 minutos individualmente ou nove ses­
sões de grupo, também de 50 minutos (Gifford, 2004).
As sessões de ACT foram baseadas em: análise de gatilhos internos e exter­
nos, problemas de controle de fissura (estratégias de aceitação), estabelecimento de
valores, objetivos e barreiras, habilidades de “mindfulness", exposição gradual, criação
de escalas para fumar, habilidades de difusão cognitiva e ativação comportamental e
aceitação.
Os participantes que foram submetidos à. ACT foram os que apresentaram
melhores resultados em relação a parar de fumar (21,2 % versus 9,3%) comparado
com aqueles que foram submetidos apenas a reposição de nicotina. Vale ressaltar que
o tratamento utilizado como controle pode ser considerado abaixo do recomendado
pela literatura, além do grande número de desistências. Porém esse é primeiro estudo
utilizando a técnica e foi considerado importante para essa revisão.

78 Verena C. V. Santos, Luriana R. D. Cardoso, Paulo R. Abreu


Conclusão
Nesse estudo foram analisadas diversas pesquisas que utilizam a Terapia
comportamental, cognitiva ou cognitivo-comportamental para o tratamento do tabagismo,
muitas delas utilizando diferentes estratégias para abordar o problema. Apesar dessas
diferenças, essa revisão mostra a eficácia da psicoterapia no tratamento do tabagismo.
Ressaltando que os tratamentos combinados de psicoterapia e psicofármacos mostra­
ram ser mais eficazes do que o tratamento medicamentoso isolado.

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Verena C. V. Santos, Luciana R. D. Cardoso, Paulo R. Abreu


Capítulo 7
Análise de contingências moduladoras
do comportamento autista

Roberta M aía Marcon *


CJina Nolêto Bueno **
Universidade Católica de C/oiás

O comportamento autista é uma das classes de comportamentos que o ser


vivo aprende como tantas outras ciasses, portanto, tendo função. E uma das ciências
que tem estudado essa classe de comportamento, que compreende o repertório huma­
no, é a Análise do Comportamento.

Comportamento
As origens do comportamento encontram-se na hereditariedade derivada da
história de vida da espécie (filogênese) e no ambiente presente e passado (ontogênese
e cultura) (Baum, 2005/2006). Portanto, a Análise do Comportamento considera o reper­
tório comportamental como um produto da filogênese, da ontogênese (história de vida)
e da cultura (comportamentos aprendidos na interação com o meio) (Catania, 1998/
1999).
Os comportamentos incluem todas as atividades do ser humano: o andar, o
pensar, o estar agressivo, e assim por diante. Desse modo, pode-se dizer que os
comportamentos referem-se àquilo que pode ser observado nos homens. Entretanto,
alguns termos, como ‘agressivo’, não parecem referir-se ao comportamento observável,
o que comumente leva alguns estudiosos a buscar uma entidade interna, como
‘agressividade’, para explicar o comportamento (Staats & Staats, 1966/1973).
Comportamentos bizarros de Indivíduos costumeiramente parecem tipificar o
comportamento ‘anormal’. São aqueles comportamentos tão discrepantes e inexplicáveis
aos ‘olhos’ do ambiente social dessa pessoa que, poder-se-ia inferir a ocorrência de
princípios diferentes operando nesses indivíduos tão ‘atormentados’, Todavia, conside­
ra-se que os princípios envolvidos na aquisição de padrões de comportamentos
desajustados são os mesmos princípios envolvidos na aquisição de outro comporta­
mento qualquer (Staats & Staats, 1966/1973).
* Psicóloga Espedatisia em Psicopatología: subsídios para aluação dínlca. E-mail: robertamaiamarcon@hotmail.com
** Mestra em Psloologla. Professara do Departamento de Pslcoloja e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Lato Sensu da Universidade
Católica de Goiás, membro do Núeleo de Pesquisa Aplicada em Intervenções Clinicas e Comunitárias - NUPAICC. E-mail:
ginabuenopsi@hotmall.com

Sobre Comportamento e Cognição 81


Importante destacar que parte do comportamento humano trata-se de compor­
tamento respondente (comportamento não-aprendido) e outra parte significativa trata-
se de ^comportamento operante (comportamento aprendido). Os comportamentos
respondentes (ou reflexos) são eliciados por estímulos antecedentes e constituem
parte das capacidades 'inatas' do organismo (De Rose, 1999). Enquanto que o com­
portamento operante é mais provável de ocorrer na presença de um estímulo
discriminativo, devido a uma história de reforço em sua presença (Baum, 2005/2006),
como resultado de um processo de modelagem, segundo a proposta de Regra (2004).
De.acordo com essa autora, a modelagem é uma técnica utilizada para "(...) ampliar o
repertório comportamental de um organismo por meio da aquisição de novas respos­
tas.” (Regra, 2004, p. 122).
Posto isto, Sanabio e Abreu-Rodrigues (2002) colocam que o comportamento
operante pode ser de dois tipos: modelado por contingências e governado por estímu­
los verbais. Sendo controlados, portanto, por suas conseqüências ambientais.
_ Jp príjrieiro tipo de comportamento é resultado do contato direto com as contin-
gênci^i^OTU^nto que o segundo tipo é produto de descrições verbais das contingên­
cias {Saf>àBraT'& Abreu-Rodrigues, 2002). A distinção clara destes termos favorece o
avançai sobre os estímulos discriminativos verbais classificados como regras.
> h'

Regras e Auto-regras
O comportamento controlado por regras depende do comportamento do ouvin­
te (de ouvir ou ler uma regra) e do comportamento verbal do falante (de instruir ou
escrever uma regra). Assim, o ouvinte segue a regra, reforçando o comportamento do
falante de formular a regra. Portanto, as regras podem ser reconhecidas como uma
relação de reforço, ou seja, entre atividades e conseqüências (Baum, 2005/2006).
Estudos têm investigado os efeitos de estímulos verbais gerados pelo próprio
indivíduo. Desse modo, de acordo com Jonas (1999), as auto-regras podem ser vistas
como descrições verbais formuladoras de contingências feitas pelo e para o próprio
indivíduo, cujo. comportamento essas contingências passam a controlar.
É importante ressaltar que para o estímulo verbal ser considerado estímulo
discriminativo é preciso identificar uma história de reforçamento diferencial que tenha
resultado no estabelecimento de tal função evocativa (Sanabio & Abreu-Rodrigues, 2002).
O termo reforçamento refere-se às situações nas quais a freqüência ou intensi­
dade do comportamento aumenta (Hawton, Salkovskis, Kirk & Clark, 1989/1997).

Reforçamento Positivo, Reforçamento Negativo e Punição


No reforçamento positivo^ a freqüência do comportamento aumenta por este ser
seguido por conseqüências positivas. No reforçamento negativo a freqüência do com­
portamento aumenta por este ser seguido pela ausência de um evento negativo previs­
to (Hawton et al., 1989/1997). Embora o reforço negativo possa ser confundido com a
punição, esta última objetiva remover um cpmportamento de um repertório, enquanto
que o reforço negativo gera comportamento'(Skinner, 1974/2006).
São dois os tipos de punição: positiva e negativa. Na punição positiva é apre­
sentado um estimulo aversivo contingente à resposta emitida, ou seja, um estímulo
aversivo é adicionado para se eliminar uma resposta do repertório do indivíduo. En­
quanto que na punição negativa é retirado um estímulo reforçador contingente à respos­
ta emitida (Queiroz, 2004).

82 Roberta M a ia M arcon, Qína N olêfo Bueno


O processo de aprendizagem ocorrido no reforço ou punição estabelecerá a
construção dos comportamentos adequados ou inadequados. A literatura aponta diver­
sas classes desses repertórios. Entre elas está a do comportamento autista.

Comportamento Autista
O Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais - DSM-IV-TR (APA,
2000/2003) ressalta que os indivíduos com Transtorno Autista apresentam um desen­
volvimento comprometido da interação social e da comunicação, bem como um reper­
tório muito restrito de atividades e interesses.
Muito embora existam repertórios típicos do autismo decorrentes de proble­
mas biológicos, não há uma relação causa-efeito direta comprovada entre característi­
cas orgânicas e características autistas (Goulart & Assis, 2002).
A teoria do Behaviorismo Psicológico acerca do autismo adverte não haver
condições biológicas impedindo ou distorcendo a aprendizagem do autista. Essa visão
aponta que a falta de resposta emocional e do afeto, de habilidade de comunicação,
bem como o repertório restrito de atividades da criança autista implicam em déficits no
seu repertório básico de comportamento. Posto que as condições de aprendizagem da
criança não produziram respostas emocionais-motivacionais, lingüístico-cognitivas e
sensório-motoras positivas (Staats, 1996).
Tal como entenderam Staats e Staats (1966/1973), Ferster (1961) discutiu o
comportamento autista com base nos princípios de condicionamento operante, suge­
rindo que a ausência de repertórios adequados em uma criança autista resulta de
déficits na sua história de condicionamento.
Estudos analítico-comportamentais fundamentam-se em identificar os aspec­
tos do ambiente que poderiam estar influenciando o desenvolvimento e manutenção do
comportamento autista, para posteriormente poder controlá-los (Goulart & Assis, 2002).

Como Intervir no Comportamento Autista


“A Análise Aplicada do Comportamento tem como objetivo, na intervenção com
pessoas diagnosticadas como autistas, desenvolver repertórios de habilidades soci­
ais relevantes e reduzir repertórios inadequados (...)." (Goulart & Assis, 2002, p. 155).
Através dela são avaliadas respostas apropriadas a serem fortalecidas e res­
postas inapropriadas a serem enfraquecidas, levando-se em conta a função que deter­
minada resposta tem sobre o ambiente social, ou seja, sua relação com os eventos que
a antecedem bem como com os eventos conseqüentes (Bagaiolo & Guilhardi, 2002).
Ademais, a intervenção comportamental pode ser transmitida para o meio so­
cial do autista, como os pais, capacitando-os a tomarem-se participantes no processo
de mudança do comportamento dos filhos (Bagaiolo & Guilhardi, 2002).
Importante destacar que, embora haja casos de pessoas que apresentem
características autistas desenvolvidas por estimulação ambiental deficiente, a
estimulação deficiente não deve ser entendida como produto de uma criação proposita­
damente ruim, mas como conseqüência da falta de informação dos pais acerca dos
pré-requisitos necessários para o bom desenvolvimento de seus filhos. Sendo assim,
a partir da manipulação dos ambientes físico e social do autista são ensinadas habili­
dades necessárias, porém ausentes em seu repertório (Goulart & Assis, 2002).

Sobre Comportamento e Cognição 83


O bjetivo
O presente trabalho teve por objetivo investigar e descrever as contingê
moduladoras do comportamento autista em um participante do sexo masculino, atra­
vés de pesquisa aplicada, com a finalidade de melhor conhecimento dos comporta­
mentos clinicamente relevantes. Objetivou, também, avaliar se os déficitsjie condicio­
namento adequado, devido às falhas sociais, estariam favorecendo a aprendizagem e
manutenção de repertórios inadequados. E, posteriormente, delinear uma intervenção
terapêutica estruturada, com a finalidade de favorecer-lhe a aquisição de comporta­
mentos apropriados, através da utilização de procedimentos da Análise Aplicada do
Comportamento. Pretendeu pesquisar, ainda, se os referidos procedimentos, para ele
definidos, favoreceriam a modificação dos comportamentos inapropriados resultantes
de processos complexos de aprendizagem.

Método

Participante
D., 2.1 anos à época do estudo, solteiro, sem alfabetização e de nível sócio-
econômico baixa Segundo filho de uma prole de dois, residindo com os pais e o irmão.
Quando chegou para tratamento fazia uso da seguinte farmacoterapia: Risperidona,
1 mg, uma vez ao dia. Essa medicação foi suspensa por conta própria do pai, um mês
após o início deste estudo, alegando que o filho comportava-se melhor sem ela, não
sendo observado piora em seu estado.
Sua história clínica está apresentada na Tabela 1, a seguir, segundo as fases
do desenvolvimento.

Tabela 1 - História de Vida em fases do desenvolvimento

InfândafO a 11 anos) Adolesc£ncia(12a 18 anos) Adulta(19 a 21 anos)

Sua gestação foi saudável e seu parto Aos 13 anos D. passou a freqüentar uma A os 21 anos D. ainda não havi»
foi cesariano. Teve um desenvolvimento escola especial. Aos 16 anos começou a desenvolvido a escrita. Porém, com
motor normal, no entanto, seu repertório apresentar comportamento de intolerânda vocabulário amplo, segundo relatados
lingüístico iniciou-se tardiamente. Aos a choro <Je criança Com 17 anos, começou pais: falava inglês’ e 'conheda os nomes
3 anos apresentou comportamentos a espalhar revistas pelo quarto. O contato das capitais de todos os países’.
agressivos diante dos seguintes com revistas consistia numa das poucas Segundo a psicóloga da escola de D., a
eventos: submeter-se a corte d« seus fornias de entretenimento que ele dispun ha instituição tinha lim itações, não
cabelos e portão de sus casa fechado. (quando iniciamos este estudo, suas atendendo adequadam ente seu
Sá aquietando-se quando dormia. revistas ocupavam toda a sua cama eplso potencial intelectual. Além disso, D.
Nessa época foi lev a do a um total de seu quarto. Por vezes, D. chegava a p res en tav a dificuldades de
neurologista. Seus exames de Imagem a dormir sobre efas). A partir dessa época socialização, posto que na escola
não constataram lesão cerebral. Com 4 passou a banhar-se com mais freqüência isolava- se, não participando de
anos, passou por outro neurolog ista que, chegando a tomar quatro banhos por dia. ativida des com outros colegas.
sem Identificar qualquer disfunção, Aos 1Banos, começou a apresentar outro Paralelemente a isso, o ambiente de D.
prescreveu-lhe T e g reto l. Essa lipo de comportamento de intolerância: â reforçava seu isolamento (seus pais
m edicação foi substituída, tosse de outras pessoas; expressando-se colocaram um televisor em seu quarto
posteriormente, pria Rllalina. Devldoà comlrritabllidadeexingamentos. Como p a ra que e le assistisse a seus
ausência de repertório lingüístico (aos conseqüência apresentava sudorese e por programas). Sua higiene pessoal
5 anos) foi submetido s um exam ede vezes chegava a morder sua mão, ferindo- sempre foi realizada por seus pais, até
audição, e os resultados revelaram que a. Visando evitar sua discriminação desses mesmo a escovaçãode seus dentes;
ele ouvia 100%. Com 7 anos começou a estímulos ‘averslvos', os pais deram-lhe assim como seu vestuário. A conquista
falar e a ler. Segundo relato dos pais, um rádio de mão, com fone de ouvido, para de seus objetivos continuamente era
alfabetizara-se 'sozinho' para a leitura. que utilizasse em ambientes com outras ating ida ao apresentar ao seu ambiente
As primeiras palavras que ouviram dele pessoas, visando inibir sua audição à social comportamentos de insistência e
constituíram leitura de figuras de tosses. Os pais de D. que já dedicavam- irritabilidade, levando as pessoas à sua
chiclete. Sà Ingressou na escola aos 6 lhe muita esslsténda, espedal mente seu volta a realizarem os comportamentos
anos, época em que começou a fazer genitor, à m edida que os novos que desejava. Os pa!s diziam que
tratamento fonoaudlológlco. Aos 10 m m nortí*m ^n tn «-n m hlA m a r u f a r a m a atertHÍArri-lfv; rorp w ita r m ata frassA

Roberta M aia Marcon, Qína Nolêto Bueno


lnfãncia(0 a 11 anos) Adole3cência(12a 18 anos) A du lta ( 19a 21anos)
anos fo i diagnosticado com a u lismo manifestar-se, mais atenção dispensaram- agressivo. Q uando conl/ariado , suas
Infantil pel a medicina neuropedlátrica e lhe. reações m ais oom uns eram gritar,
p e la n e u ro p s lc o lo g ia . 0 n ív e l espernear, agredir-se (m o rd e ra mão)
lingülstioo cognitivo do ambiente de 0 . Possuía interesses escassos, porém
não era favorecido; a m ãe tinha pouco intensos (determinados program as de
estudo, o pai não era alfabetizado. T V e ré cio, revistas sobre músicos, cds,
etc.). Era cuidado na m aior p a rte do
tempo por se pai, aposentado pelo INSS.

Materiais e Ambiente
O processo terapêutico foi composto por sessões realizadas em um consultó­
rio padrão da Clinica Escola de Psicologia. Foram utilizados jogos e materiais didático-
pedagógicos, como também o Questionário de História Vital de Lazarus (1975/1980).
Além de Diários de Registro (Bueno & Britto, 2003).

Procedimento
O processo terapêutico compreendeu-se de cinco fases e foi desenvolvido em
duas sessões semanais, com duração de 50 minutos cada. Foi estabelecido que as
sessões seriam intercaíadas: uma sessão com o participante e outra com os pais.
A Fase ! do processo terapêutico foi denominada Linha de Base, na qual foram
realizadas 6 sessões totais: 1 sessão com o D., em que o pai esteve presente no início;
4 sessões com seu pai; e apenas 1 sessão com sua mãe, que até então era ausente
do processo terapêutico. Esta fase constituiu o processo de investigação e de observa­
ção direta dos repertórios de D. e de seu ambiente social. Nela não houve intervenção
terapêutica,
Com os pais foram levantadas questões acerca de como e quando surgiu o
problema de D., da freqüência de ocorrência, das conseqüências positivas e negativas
no repertório do participante e dos próprios pais, entre outros. Os pais foram instruídos
acerca da Análise do Comportamento, que embasou a intervenção, sendo alertados de
que a mesma constituía-se em um trabalho de cooperação entre o participante, os pais
e a terapeuta. A obtenção de maiores informações sobre a história de vida do participan­
te deu-se com o Questionário de História Vital de Lazarus (1975/1980). Ele foi entregue
como tarefa de casa, aos pais. Utilizou-se ainda a Entrevista Psicológica com os pais.
A Fase II do processo terapêutico foi denominada Intervenção I e ocorreu entre a
7a e a 20a sessões, abrangendo 14 sessões totais: 9 sessões com o D.; 1 sessão com
seu pai; e 4 sessões com o casa! de pais. As sessões com D., visaram a interação dele
com a terapeuta. Foram aplicadas as técnicas: Descrevendo a Gravura e Disponibilizando
Estímulos. Outras técnicas trabalhadas nessa fase procuraram avaliar repertórios bási­
cos (como escrever, identificar figuras, cores, números, formar palavras): Verificando a
Escrita; Identificando Figuras; Diferenciando Cores; Identificando Números; e Formando
Palavras. Também foi utilizada a técnica Falando Inglês, para observar seu repertório.
Paralelamente, as sessões procuraram avaliar sua adaptação às situações
programadas, através das seguintes técnicas: Introduzindo Atividade Reforçadora e
Folheando Revista; e a técnica Treinando o Cumprimento de Regras, para treinar em D.
o comportamento de seguir regras, que utilizou-se de instruções já embutidas nas
atividades selecionadas, como a terapeuta escrever nomes de músicos por ele dita­
dos. Foi trabalhada a técnica Estabelecendo Regras Escritas, que utilizou-se de carta-

Sobre Comportamento e Cognição 85


zes nos quais foram descritas regras que estabeleciam os reforços que D. poderia
ganhar e/ou perder em função dos seus comportamentos.
Na sessão com o pai do participante, foram-lhe ensinadas as técnicas (1)
Educação Sobre o Reforço, (2) Punição e (3) Regras, para favorecer-lhe a consciência
da forma mais adequada a ser trabalhada no ambiente de D..
As sessões realizadas com o casal de pais objetivaram capacitá-los a toma­
rem-se participantes do processo de mudança do comportamento de D.. Na primeira
sessão do casal de pais foi entregue um Texto Teórico Explicativo Sobre Reforço, Puni­
ção e Regras, que abrangeu as seguintes informações: "Regras - Nelas devem estar
bem claro o que D. pode e não pode fazer. É preciso que sejam escritas para que D.
possa ler o que ele deverá cumprir. Reforço - Quando o reforço é dado, ele faz com que
o comportamento ocorra com maior freqüência do que o comportamento que não é
reforçado. Sempre que D. comportar-se de forma adequada, reforcem-no. Punição -
Não diz respeito a ferir, ou ação dessa ordem, mas trata-se de deixar de reforçá-lo, caso
ele tenha um mau comportamento".
Nessa fase foi instruído, também, o Treinamento para Escovar os Dentes, com
a finalidade de promover o desenvolvimento do repertório de higiene pessoal, realizado
pelo próprio D., e assim, ampliar seu repertório independente. Também foi estabeleci­
do com os pais Controle das Revistas Espalhadas, com o objetivo de ensinar a D. os
horários que ele poderia espalhar revistas pelo quarto, favorecendo a organização das
mesmas. Além disso, foi estabelecido um plano de atividades físicas para o participan­
te, no qual os pais optaram por caminhadas (atividade reforçadora para D.) objetivando
retirá-lo por algumas horas de sua rotina, oportunizando-lhe outra forma de entreteni­
mento. Nessa fase também foram utilizados os Diários de Registro, com a função de
que os pais, após treinamento, pudessem registrar os comportamentos de D. e suas
conseqüências e, assim, auxiliarem o processo terapêutico (Bueno & Britto, 2003), bem
como a Análise Funcional (Skinner, 1953/2003), objetivando identificar a relação funcio­
nal dos comportamentos-problema apresentados por D. e suas conseqüências.
A Fase III do processo terapêutico foi denominada Programa de Férias, na qual
foram estabelecidos dois Programas de Férias, um para o participante e outro para os
pais, sendo entregues na última sessão da fase anterior, com a finalidade de que as
atividades, até então desenvolvidas, não fossem interrompidas durante o recesso aca­
dêmico. Foram fornecidas ao participante as seguintes instruções: "Organizar suas
revistas, seguindo o mesmo comportamento por nós no consultório, ou seja, quando
terminamos uma atividade sempre organizamos os materiais nela utilizados. E é esta
a forma que você deverá seguir com suas revistas e outros pertences em casa: ao
terminar de usá-los, guardá-los nos locais próprios. Dessa forma, você manterá a
organização do seu quarto e de sua casa. Sempre que desejar pegar algo emprestado
de outrem, inicialmente pergunte se a pessoa pode emprestar-lhe. Em caso positivo,
tenha zelo e devolva no tempo combinado. As normas em sua çasa, assim como em
nossa sessão estão descritas em um cartaz. Cumpra-as para gerar harmonia em
casa”. AS instruções fornecidas aos pais corresponderam à: “Mantenham o treinamento
de D. quanto a escovar os dentes; e iniciem o treinamento para D. tomar banho e realizar
seu vestuário sozinho. Façam o registro. Sempre que D. comportar-se de forma ade­
quada, reforcem-no. Façam regras escritas para que ele cumpra. Utilizem habilidades
de relaxamento com D.. Por exemplo: o coloquem para ouvir uma música de sua prefe­
rência, em um lugar que ele goste. Registrem no Diário de Comportamento quando
ocorrer situações conflituosas. Pratiquem com ele caminhadas”.

Roberta M a fa M arcon, Qina N olêto Bueno


A Fase IV do processo terapêutico foi nomeada de Intervenção II e teve por
objetivo dar continuidade às intervenções realizadas nas fases anteriores. Essa fase
ocorreu entre a 21a e a 34a sessões, abrangendo 14 sessões totais: 7 sessões com D.;
e 7 sessões com sua mãe, uma vez que o pai passou a estar ausente do processo
terapêutico. O programa de intervenção realizado com D. objetivou estabelecer regras,
quando foi trabalhada a técnica Estabelecendo Regras Escritas; também teve por fina­
lidade treinar em D. o comportamento de seguir regras com a técnica Treinando o
Cumprimento de Regras. Essas técnicas, descritas anteriormente, nessa fase foram
ampliadas para outras classes de respostas.
As sessões realizadas com a mãe, nessa fase, tiveram por finalidade treiná-la
a trabalhar no ambiente de D. procedimentos de modificação de comportamento, tal
como o comportamento de D. de não querer ir para a escola. Foram introduzidas as
técnicas Elaborando Regras Escolares e Retirando Reforço ao Comportamento
Desadaptado. Esta última para ensiná-la a controlar o comportamento de intolerância à
tosse apresentado por D.. Nessa fase também foi utilizada Análise Funcional (Skinner,
1953/2003), bem como Diários de Registro (Bueno & Britto, 2003).
A Fase V foi a Avaliação Final, que objetivou analisar com a mãe, o controle dos
comportamentos indesejados e a freqüência de ocorrência dos novos comportamen­
tos, para posterior delineamento terapêutico.

Resultados

Diagnóstico Médico
O participante foi diagnosticado com Transtorno Global do Desenvolvimento,
mais especificamente com Transtorno Autista, pela medicina neuropediátrica e pela
neuropsicologia. No entanto, seus exames neurológicos constataram nenhum tipo de
disfunção cerebral. Foi encaminhado pelas profissionais de neuropediatria e
neuropsicologia ao processo terapêutico psicológico.
Na Tabela 2 estão apresentados os diagnósticos e tratamentos a que D. foi
submetido até chegar a este tratamento psicológico.

Tabeia 2 - Diagnósticos e Tratamentos realizados com D.

idade Avaliação Feita Diagnóstico Tratam ento Conseqüências

3 - 4 anos Neurológica Nenhuma Tegretol, pos­ Tegretol: agrava­


(mapeamento do disfunção teriormente mento dos compor­
cérebro, tomografia substituído por tamentos agressi­
computadorizada, Ritalina. vos. Ritalina: o fez
ressonância aquista r-se nos
magnética) primeiros dias.

Audiológica, a fim Potenciais auditi­ Nenhum trata­ Permaneceu sem


de verificar vos presentes e mento apresentar reper­
5 anos
hipoacusia, devido normais em ambos tório lingüístico até
ausência de re­ os ouvidos os 7 anos.
pertório lingüístico

Sobre Comportamento e Cognição 87


Id ade A valiação Feita D iagnóstico T ra ta m e n to C o n s e q ü ê n c ia s

10 anos Neuropediátrica/ Autismo Infantil Ritalina Nos primeiros dias


Neuropsicológica aquietou-se. O pai
suspendeu a medi­
cação.

Neuropediátrica/ Transtorno Global Risperidona, Nos primeiros dias


21 anos
Neuropsicológica do Desenvolvimento 1mg, umavez aquietou-se. O pai
(Transtorno Autista) ao dia e enca- suspendeu a medi-
minhadoà cação um mês após
tratamento o início deste írata-
psícoiógico mento.

Queixas Principais - Tratamento Psicológico


Nas entrevistas psicológicas com os pais foram apresentadas queixas refe­
rentes à falta de controle de D. em relação a tosse, a revistas espalhadas pelo quarto;
a conquista de seus objetivos ser atingida ao apresentar comportamentos de insistên­
cia e irritabilidade, levando as pessoas à sua volta a realizarem seus desejos.
Os dados obtidos, e ora apresentados neste trabalho, são o resultado do proces­
so terapêutico que ocorreu em dnco fases: Fase i - Linha de Base; Fase II - Intervenção I;
Fase III - Programa de Férias; Fase IV - Intervenção II e Fase V - Avaliação Final.

Dados coletados na Linha de Base - 1a a 6a sessões


(1) Sessão com D. - Na 1a sessão D. levantou-se por duas vezes da mesa de trabalho,
abrindo os armários do consultório ‘à procura de revistas1, segundo relato do pai. Só
aquietou-se quando foi-lhe entregue um folder. Interagiu com a terapeuta ao falar
sobre artistas e a mesma escrever os nomes por ele ditados. Quando ela interrom­
peu essa atividade, apresentou comportamentos agressivos (puxou um papel da
mão da mesma e aumentou o tom de voz).
(2) Sessões com os pais - As sessões iniciais realizadas com os pais, favoreceram
informações relevantes sobre o amplo repertório comportamental apresentado por
D., bem como a construção da sua história clínica.

Procedimentos realizados na Intervenção I - 7a a 20a sessões


Descrevendo a Gravura - Foi-lhe apresentada uma gravura (de uma menina e um
menino, ambos com um cachorro; no centro da figura, havia um bombom), com o
seguinte prompt verbal: ‘Construa uma história sobre esta gravura’. Ele pegou a gravu­
ra, nomeou um dos elementos contidos nela, a deixou de lado e não mais respondeu
diante dela, passando a falar nomes de cantores e, dessa forma, dirigir a sessão. Em
outra situação, foi-lhe apresentada nova gravura (de pessoas na praia; havia coqueiros
e um carro), com o prompt verbal: 'O que você vê?’. Ele respondeu corretamente diante
dos estímulos. No entanto, pegou um estojo da terapeuta verbalizando "caneta”, para
que ela escrevesse os nomes que ele queria ditar-lhe. Foi-lhe dado novamente o mes­
mo prompt porém ele não respondeu adequadamente ao estímulo.
Disponibilizando Estímulos - Foram espalhados jogos no consultório. Ele não os pe­
gou, apenas olhou em direção a eles quando questionado se havia algo diferente no
consultório. Verificou-se que a motivação que os jogos despertavam nele não

88 Roberta Maia Marcon, Qína Nlotêto Bueno


correspondia à motivação despertada por revistas, que eram buscadas por ele via
tentativa de abrir os armários, dirigir-se aos materiais dispostos no consultório.
Verificando a Escrita - O prompt verbal foi: ‘Vou escrever seu nome, depois, você vai
copiá-lo’. Ele segurou a caneta e nada fez no papel. A terapeuta colocou sua mão sobre
a dele e, com sua ajuda ele copiou o nome escrito por ela. Não apresentou coordena­
ção motora, pois deixou a caneta escorregar no papel ao desenhar as letras, apresen­
tado prejuízos no repertório de escrita.
Identificando Figuras - Foi utilizado um jogo de figuras para testar a habilidade do
participante em emitir verbais apropriados frente às figuras e às suas funções. Verifi­
cou-se que ele não apresentou prejuízos na lingüagem denominativa.
Diferenciando Cores - A terapeuta entregou-lhe giz de cera e instruiu-lhe a riscar uma
folha. Ao íado de cada risco, feito por ele, ela escrevia o nome que correspondia à cor
riscada. Então, apontava para cada uma das cores riscadas, perguntando: ‘Que cor é
esta?'. Nesse momento, o participante entreteu-se com uma revista, dispersando-se
da atividade proposta. Respondeu corretamente apenas diante da cor vermelha. Verifi­
cou-se que ele realizou a atividade com desatenção, o que pode ter favorecido a emis­
são de respostas inadequadas diante das cores primárias.
Identificando Números - Foi utilizado um jogo de números (do numeral 1 ao 20). As
figuras contendo os números eram mostradas, diante das quais o participante teria que
emitir verbais apropriados. Ele identificou corretamente os números 1, 2 e 20; porém,
verbalizou 5 diante de números que não correspondiam ao número 5, apresentando
prejuízos no repertório de identificar números.
Formando Palavras - Utilizou-se um jogo de letras e o seguinte prompt ‘Retire as letras
do saquinho para formarmos nomes’. O participante retirou as letras do saquinho e
completou dois nomes com a ajuda da terapeuta. Contudo, começou a cantar, porém
distraiu-se com outros materiais. Então, foi alertado para voltar à atividade. Ele atendeu
de pronto, mas de forma desatenta, não conseguindo formar mais palavra alguma.
Verificou-se que o participante tentou esquivar-se da situação programada a fim de que
a terapeuta escrevesse os nomes que ele queria ditar-lhe.
Falando Ingíês - Foi utilizado um jogo de figuras. As mesmas eram mostradas junto à
pergunta: ‘Qual o nome em inglês?’. Ele apresentou conhecimento de fragmentos de
dados, não se tratando de fluência na Hngua estrangeira, ora verificada.
introduzindo Atividade Reforçadora - Foi-lhe pedido que falasse nomes de artistas
para que a terapeuta escrevesse. Em momentos distintos ele emitiu respostas diferen­
tes: a) na situação a seguir o participante demonstrou descontrole quando a situação
exigiu dele aceitação. Ao término da sessão não aceitou interromper a atividade e apre­
sentou repertório conflituoso (continuou falando nomes para ela escrever; aumentou o
tom de voz; puxou-a e colocou a própria mão na boca, como se fosse mordê-la); b) na
situação que se segue houve uma tentativa de controle do comportamento dele por
parte da terapeuta. Ao ser informado do término da sessão, resistiu em sair do consul­
tório (tevantou-se e tentou segurar o braço dela para que a mesma continuasse a
escrever os nomes). Foi-ihe proposta a escrita de apenas mais um nome, mas já fora
do consultório, ao que ele acatou deixar aquele ambiente; c) já nessa situação, o parti­
cipante demonstrou resposta de adaptação. Falou nomes de artistas e de suas músi­
cas e permaneceu na situação programada, interagindo com a terapeuta. Ao ser infor­
mado do término da sessão, ievantou-se e pegou suas coisas para sair do consultório.
Folheando Revista - Foi-lhe pedido para folhear uma revista sobre artistas de TV e
verbalizar os nomes dos artistas que ele conhecia. Ao término da atividade, foi-lhe

Sobre Comportamento e Cognição 89


solicitado que deixasse a revista para trabalharem com outra atividade, pois ao final da
sessão e!e poderia levar a revista emprestada. Ele folheou a revista e falou nomes de
artistas. Ao ser-lhe solicitado que deixasse a revista e interagisse com a atividade se­
guinte, atendeu às demandas da situação programada.
Treinando o Cumprimento de Regras - Definiu-se que a terapeuta escreveria nomes
de artistas ditados por ele, mas que ao término da sessão ela iria parar de escrever e
eles sairiam do consultório. Em sessões distintas, o participante emitiu as seguintes
respostas: a) ao ser instruído que a sessão estava chegando ao fim, ditou mais um
nome. Após ter escrito o nome, a terapeuta anunciou o término da sessão e pediu que
ele a acompanhasse para saírem do consultório. Ele atendeu de pronto; b) em outra
situação, quando informado que a sessão já estava quase terminando, mas que ele
ainda poderia falar mais alguns nomes, ele falou mais quatro nomes de músicas. A
terapeuta escreveu os nomes das músicas e o chamou para saírem do consultório. Ele
levantou-se e a acompanhou.
Estabelecendo Regras Escritas - Utilizando-se de cartazes que continham regras, a
terapeuta o convidava a lê-los e apontava com o dedo as palavras que ele deveria ler,
objetivando focar a atenção dele no estímulo apontado. Ao fazer a leitura das regras ele
manteve um padrão de comportamento: lia as regras em voz baixa e pulava palavras
contidas nas mesmas. A terapeuta relia as regras e ele respondia com adaptação, ou
seja, olhando para ela enquanto esta lia. Por vezes, emitiu respostas diferentes: a) ao
fazer a leitura das regras, parou de lê-las e pegou uma revista sobre o armário. Ao ser
instruído a continuar a leitura, atendeu-lhe; b) em uma dada situação, diante da regra
‘Não pode morder o dedo na sessão’ (comportamento emitido por ele), D. olhou para o
dedo que havia mordido, demonstrando compreensão da inter-relação entre as regras
e seus comportamentos.
Concomitante às intervenções trabalhadas com D,, ocorreram as seguintes
intervenções com seus pais:
(1) Educação Sobre o Reforço, (2) Punição e (3) Regras - Embasado pelo conheci­
mento que essas técnicas forneceu-ihe, o pai passou a trabalhar no ambiente de D. de
forma mais assertiva. Relatou ter colocado uma caixa no quarto do filho para ele guardar
suas revistas; e prometeu reforçá-lo com a revista que quisesse, caso as organizasse
na caixa. D. organizou suas revistas, porém o pai não conseguiu achar a revista pedida
por ele, o que o levou a desorganizar as revistas novamente. Verificou-se que o pai ainda
necessitava de maiores explicações Sobre Reforço, Punição e Regras, posto que, dian­
te da situação relatada o pai não emitiu o reforço seguido do comportamento adequado
e, conseqüentemente, puniu tal comportamento. Além disso, a regra fornecida peio pai
restringiu-se a: ‘Se organizar as revistas na caixa, ganha a revista que desejar', o que
não incluía mantê-las organizadas. Esses resultados corroboraram para a construção
de um Texto Teórico Explicativo Sobre Reforço, Punição e Regras, já descrito na seção
Procedimento, entregue aos pais para que lessem e trouxessem dúvidas.
Texto Teórico Explicativo Sobre Reforço, Punição e Regras - A mãe trouxe um relato
sobre a eficácia dessa técnica. De acordo com ela, ao ir embora da casa de uma tia, D.
estava em mãos com um cd que lá escutara, querendo levá-lo. Ela tentou controlar o
comportamento de D. dizendo: 'Se você quiser levar o cd até pode, porém não vai mais
ganhar revista, livro. Mas, se você deixá-lo aqui poderá ouvi-lo no dia que retomarmos’.
D. devolveu o cd, sem insistir em levá-lo.
Treinamento para Escovar os Dentes - O treinamento de D., feito pelos pais, compre­
endeu a seguinte hierarquia, cumprida sempre por D.: (a) localizar sua escova, (b)

Roberta Maia Marcon, Qina Nolêto Bueno


pegá-la, (c) localizar o creme dental, (d) pegá-lo, (e) destampá-lo, (f) colocar o creme
dental na escova. Com o suporte de um copo, (g) colocar água na boca, (h) chacoalhá-
la e (i) jogá-la fora (vez ou outra D. engoliu um pouco da água que enxaguara a boca).
Controle das Revistas Espalhadas - Foi estabelecido com os pais que D. poderia
espalhar suas revistas em seu quarto ao chegar da escola e mantê-las assim, caso
desejasse, até a hora de iniciar um programa televisivo que ele gostava. Antes de ir
assistir ao programa ele deveria organizá-las, só voltando a desorganizá-las no dia
seguinte, ao retomar da escola. O reforço consistiria em D. assistir ao programa de sua
preferência no televisor ds sala. Os pais foram instruídos a escrever esta regra e treinar
D. quanto a mesma. D. passou a lê-la e, em seguida, organizar suas revistas e, assim,
poder assistir ao seu programa na TV. Conseqüência: D. passou a manter suas revis­
tas em ordem. É importante destacar que antes deste treinamento esta era uma situa­
ção geradora de muito conflito entre seus pais e D.: os pais jamais conseguiram desen­
volver controle da situação.
Plano de Atividades Físicas - Os pais introduziram à rotina de D. caminhadas, que
proporcionaram-lhe bem-estar: ele passou a dormir melhor.
Nessa fase, as técnicas Diários de Registro e Análise Funcionai foram apresentadas
aos pais, mas estes não apresentaram adesão.Nem mesmo aos Diários de Registro.

Procedimentos realizados na intervenção li - 21a a 34a sessões


Estabelecendo Regras Escritas - Utilizando-se de cartazes nos quais foram incluidas
novas regras, a terapeuta convidava o participante a lê-los e apontava com o dedo as
palavras que ele deveria ler, objetivando focar a atenção dele no estimulo apontado. Verifi­
cou-se que ele fazia a leitura dos cartazes com atenção adequada. Após lê-las, a terapeuta
as relia e ele respondia com adaptação, ou seja, olhando para ela enquanto esta lia.
Treinando o Cumprimento de Regras - Foram utilizadas instruções embutidas em jogos
e nas atividades. EJas requeriam do participante o cumprimento de regras simples. Pri­
meiramente, era apresentado um jogo e o prompt verbal: ‘Retire as peças da caixa e as
coloque sobre a mesa’. Posterior a isso, ele recebia instrução sobre a forma com a qual
o jogo deveria ser trabalhado. Finalizado o jogo, era fornecido novo prompt verbal: ‘Orga­
nize os materiais na caixa'. Tendo cumprido esses passos, era-lhe permitido folhear um
livro sobre músicos. Nesses momentos, a terapeuta folheava o livro junto a ele. Após
entreterem-se com esta atividade, era fornecida a instrução: ‘Guarde o livro, para escre­
vermos nomes de músicos’. Tendo o participante atendido a instrução, era iniciada a
atividade. Antes do início desta, nova instrução era fornecida: Vou escrever nomes de
músicos que você ditar, mas quando eu disser a sessão terminou nós iremos parar a
atividade e sair do consultório’. Posterior a isso, a atividade era iniciada. Quando do
anúncio do término da sessão, por vezes D. pedia que fosse escrito mais um nome. A
terapeuta não reforçava esse comportamento, retomando a instrução até o participante
atendê-la.
Elaborando Regras Escolares - A mãe foi treinada a elaborar regras focadas no com­
portamento de D. de não querer ir para escola, visto que estas não estavam ciaras em
seu ambiente. Observou-se que esse comportamento (não ir para escola) estava sen­
do reforçado de forma inadequada peios pais; quando não ia, D. ficava em casa entre­
tido com atividades reforçadoras (ouvir música, ler revistas, etc.). Foi estabelecido que a
mãe escrevesse regras descrevendo os reforços que D. poderia ganhar e/ou perder em
função do seu comportamento de ir e/ou não ir à escola, e as colocasse em seu quarto.
Segundo relato da mãe, foram colocadas as seguintes regras no quarto de D.: ‘Se você

Sobre Comportamento e Cognição 91


for à escola, quando voltar vai poder assistir ao DVD dos Beatles’, bem como, ‘Se você
não for à escola, você não vai poder ouvir música, ler suas revistas, etc.’. Ela afirmou que
as regras obtiveram sucesso: D. foi para escola. Desde então, os pais introduziram no
seu dia-a-día a leitura das regras, o que resultou na extinção do comportamento inade­
quado.
Retirando Reforço ao Comportamento Desadaptado - Foi estabelecida com a mãe a
retirada do reforço - atenção - diante do comportamento de D. de intolerância à tosse.
A investigação acerca desse comportamento foi substanciada pela Análise Funcional,
que forneceu o conhecimento sobre a relação funcional entre o comportamento
desadaptado e as contingências ambientais. O comportamento de D. estava sendo
reforçado inadequadamente pelos pais, o que será ilustrado na Tabela 3:

Tabela 3 - Análise Funcional do Comportamento de D. de Intolerância à Tosse

Situação Respostas do Respostas de D. C onseqüências


ambiente de D.

Som de tosse Mãe olha assustada Xingamentos D. continua com com­


dentro do ônibus para D. temendo o portamentos de
que ele vai fazer irritabilidade; a mãe
opta peia descida de
ambos do ônibus an­
tes de seu destino.
Som de tosse Mãe finge que não Faz bico D. não apresenta com­
dentro do ônibus escutou a tosse, portamentos de
'não faz alarme’ e irritabilidade, permane­
não olha para D. cendo eles, no ônibus.

Os dados contidos na Tabela 4 ilustram os estímulos eiiciadores de conseqü­


ências conflituosas no padrão de comportamento de D. e em seu ambiente social:

Tabela 4 - Estímulos eiiciadores de conseqüências conflituosas - Avaliação Final

Estímulos Conseqüências a ele e a seu Intervenção Resultados


ambiente social

Revistas D. chegava a dormir sobre as revis­ Controle das Quarto organiza­


sobre artistas tas, que ocupavam todo o espaço do Revistas Espa- do e amenização
e músicos seu quarto. Discussões com D. na lhadas(1) Educa­ dos conflitos em
tentativa de organização das mes­ ção Sobre o casa.
mas Reforço, (2)
Punição e (3)
Regras

Som {Tosse) Comportamentos de intolerância à Retirando Refor­ Quando D. não


tosse. Os pais ihe davam atenção ço ao Comporta­ recebe reforço
para amenizar seus comportamentos mento social (atenção)
agressivos Desadaptado dos pais, frente à
tosse de outrem,
‘pára com seu
teatrinho’, segundo
relato da mãe.

Roberta Maia Marcon, Çina Nolêto Bueno


Discussão

Os dados da história clínica de D. apontaram serem seus comportamentos


controlados via o contato direto com as contingências, posto que seus objetivos conti­
nuamente eram atingidos ao apresentar comportamentos de insistência e irritabilidade,
levando as pessoas à sua volta a realizarem seus desejos. Entendendo o comporta­
mento autista com base nos princípios de condicionamento operante (Staats & Staats,
1966/1973; Ferster, 1961), o qual pode ser modelado por contingências ou governado
por estímulos verbais, segundo Sanabio e Abreu-Rodrigues (2002), a intervenção rea­
lizada com D. buscou governar seus comportamentos via estímulos verbais, também
chamados de regras. A técnica Estabelecendo Regras, trabalhada com D., bem como
as técnicas: (1) Educação Sobre o Reforço, (2) Punição e (3) Regras; Texto Teórico
Explicativo Sobre Reforço, Punição e Regras; e Elaborando Regras Escolares, traba­
lhadas com os pais, parecem ter corroborado para o alcance desse objetivo. Os resul­
tados indicam que, quando sob o controle de regras explícitas, que referem-se ao que
se pode ganhar e/ou perder em função de seus comportamentos, D. não mais fez uso
de comportamentos de insistência e irritabilidade para o alcance de seus objetivos,
sugerindo, esses resultados, estarem seus comportamentos sob o controle de descri­
ções verbais.
Assim, Sanabio e Abreu-Rodrigues (2002) salientam que para o estimulo ver­
bal ser considerado estímulo discriminativo é preciso identificar contingências de refor­
ço. Este foi um dos focos da intervenção com D.: reforço apropriado. Os dados da
técnica Controle das Revistas Espalhadas sugerem que o processo de aprendizagem
ocorrido, via reforço, estabeleceu a construção dos comportamentos adequados, como
demonstram os resultados.
A teoria do Behaviorismo Psicológico (Staats, 1996) adverte o ambiente social
do autista quanto a favorecer-lhe défícits em seu repertório de comportamento, impres­
cindíveis à construção desta classe de comportamento: o autismo. Considerando es­
tes pressupostos, poder-se-ia avaliar que o contexto familiar/social de D. compreendeu
importantes contingências moduladoras de seu comportamento deficitário. Assim, o
processo de estabelecimento de repertórios adequados aos pais tem favorecido a
redução de comportamentos inapropriados em D., substituídos gradativamente por
repertórios apropriados. Dessa forma, fez parte da intervenção com os país, inclusive, o
Treinamento para Escovar os Dentes, uma vez que aos 21 anos D. não realizava sua
higiene pessoal, escovação de seus dentes, assim como seu vestuário, sempre de­
senvolvidos por seus pais. Os dados favorecidos por essa técnica apontam para a
ampliação do seu repertório.
Goulart e Assis (2002) advertem que os aspectos do ambiente que poderiam
influenciar o desenvolvimento e manutenção do comportamento autista são passíveis de
controle, quando identificados. A investigação de uma das classes de comportamentos
apresentada por D., intolerância à tosse, foi substanciada peia análise funcional. As
análises apontaram que esse comportamento estava sendo reforçado inapropriadamente
peíos pais de D.. Assim, a intervenção feita com eles trabalhou a forma mais efetiva dos
mesmos lidarem com D., quando da ocorrência do estímulo tosse. A técnica Retirando
Reforço ao Comportamento Desadaptado parece ter corroborado para o alcanoe desse
resultado.
Vê-se que houve variação na assiduidade dos pais nas sessões, posto que
em algumas sessões estava presente o casal e, em outras, apenas um deles, embora

Sobre Comportamento e Cognição 93


o estabeíecido fosse uma sessão com D. e outra com os pais. Portanto, poder-se-ia
sugerir que o repertório deficitário de D. parecia dar função à vida de aposentado do pai
que, a partir das primeiras modificações assertivas em D., deixou de comparecer ao
processo terapêutico. Enquanto a mãe que sempre pareceu ausente, tornou-se muito
comprometida com o processo. Assim, este estudo não deve ser interrompido, visando
a continuidade da melhoria do repertório de 0., bem como o suporte terapêutico maior
aos pais. Importante ressaltar que, com base nos dados obtidos neste estudo, poder-
se-ia afirmar que os objetivos propostos foram alcançados.

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Sobre Comportamento e Cognição 95


Capítulo 8
Baixas habilidades sociais e auto-regras
negativas: o encadeamento de
repertórios-problema
Jéssica Cirqueira Alves *
Cfina Nolêto Bueno **
Universidade Católica de Qoiás

As potencialidades existentes em todos os seres humanos desde o nasci­


mento são passíveis de desenvolvimento, mas dependendo de vários fatores, dentre
eles saúde e estimulação. Todavia, assim como o ambiente está em contínua transfor­
mação, o indivíduo também necessita aprender novas habilidades, a fim de adaptar-se
socialmente (Del Prette & Dei Prette, 1999/2005).
Importante salientar que algumas interações com o ambiente são genetica­
mente predispostas. Porém, as experiências de aprendizagem proporcionadas pelas
condições ambientais são fatores decisivos que proporcionam o enraizamento poste­
rior do repertório comportamental social do indivíduo (Del Prette & Del Prette, 1999/
2005).
O desenvolvimento das habilidades sociais é fortemente influenciado pelo
ingresso na escola, onde novas demandas são impostas para que a criança se adap­
te, apresentando-se com novos contextos, novas regras e exigindo a ampliação de
seus comportamentos sociais. O mesmo ocorre na adolescência, na idade adulta e na
senescêncía, períodos estes que exigirão sempre novas adaptações (Del Prette & Del
Prette, 1999/2005).
Já em relação aos baixos níveis de habilidades sociais, pode-se considerar
que vários fatores contribuem para sua aquisição, como a falta de oportunidades gera­
das pela baixa condição sócio-econômica; inteligência rebaixada; dificuldades para
resolver problemas; inadequação nas relações familiares, tanto pelo excesso (agres­
são) quanto pela fafta (apatia) nas práticas parentais, favorecendo o depender, o sub­
meter ou o punir e o obedecer (Del Prette & Del Prette, 1999/2005).
Os desempenhos socialmente habilidosos são formados pelas classes de
comportamentos que existem no repertório de todos os indivíduos. Contudo, muitas
pessoas não se utilizam desses conteúdos. Não pela faita de habilidades e sim por
* Psicóloga Especlatsta em Pslcopatologia: subsídios para atuação dlntoa. H-mail: jdrquetra_psl@hotmail.oom
** Mestra em Psicologia. Professora do Departamento de Psicologia e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia Lato Sensuda
Universidade Católica de Goiás, membro do Núcleo de Pesquisa Aplicada em Intervenções Clínicas e Comunitárias - MJPAICC. E-maíf:
ginabuenopsi@hotmail.com

Sobre Comportamento e Cognição 97


razões iníbidoras como ansiedade, regras errôneas, dificuldade de leitura dos sinais
do ambiente etc., vindo a gerar fala inexpressiva e negativista, hesitação no falar, medo
ou ansiedade social, dentre outros (Del Prette & Del Prette, 2001/2003).
Nesse sentido, percebe-se que o estudo do comportamento é algo bastante
complexo, não por sua inacessibilidade, mas por se tratar de um processo de difícil
imobilização para observação. Apesar de apresentar-se como mutável o comportamen­
to e os problemas decorrentes deste não apresentam-se como insolúveis. É importan­
te ressaltar, contudo, que tal procedimento exige um dispêndio maior de energia por
parte daquele que o analisa e com ele trabalha (Skinner, 1953/2000).
A compreensão mais clara sobre o comportamento requer a observação de
sua determinação: (1) filogenia, isto é, a estrutura ou a história evolutiva da espécie; (2)
ontogenia, que é tudo aquilo que faz parte da história de vida do indivíduo; e a (3) cultura,
que diz respeito à prática aprendida ao longo da vida. O comportamento é a ação que
visa a sobrevivência do organismo. E quando esta ação ou este comportar é reforçado,
estabelece-se a possibilidade de aumento de sua freqüência.

Reforçadores
Catania (1998/1999) define reforço como qualquer conseqüência que condu­
za ao aumento da probabilidade de ocorrência de um comportamento (ao provável
aumento da sua freqüência), isto implica que o reforço fortalece a ação efetuada.
Já o reforço positivo ocorre quando, ao ser apresentado, aumenta a freqüência
do comportamento ao qual foi contingente. Já o reforço negativo é aquele que, ao ser
retirado, aumenta a freqüência de tal comportamento (Skinner, 1953/2000).
Tanto o reforço negativo quanto a punição são considerados estímulos aversivos,
mas suas conseqüências são necessariamente opostas. Reforço negativo é a inter­
rupção ou impedimento de um estímulo aversivo a partir de uma resposta que passa a
ocorrer mais freqüentemente; enquanto que a punição é aquela ocorrida apenas quan­
do um operante específico é acompanhado por uma conseqüência que reduz sua
freqüência em situações semelhantes, tornando-o menos provável. Assim, a conseqü­
ência enfraquecedora é também conhecida como punição (Catania, 1998/1999).
Sob a perspectiva da Análise do Comportamento, tanto o reforçador positivo
quanto o negativo, e a própria punição, são considerados como instrumentos especí­
ficos de controle de comportamento. Porém, uma forma de controle exercida sobre o
comportamento das pessoas, a partir de reforçadores negativos e punições chama-
se coerção (Sidman, 1989/1995).
Nesses casos, os efeitos acarretados pelo controle do comportamento a par­
tir da coerção, acarretam conseqüências significativamente prejudiciais à vida das
pessoas, como a fuga e a esquiva de situações desagradáveis, o que diminui a
oportunidade do indivíduo de explorar o ambiente, restringindo sua criatividade e es­
pontaneidade. Desta forma, o indivíduo submetido à coerção pode apresentar-se
agressivo ou apenas comportar-se de maneira a evitar a punição (Kienen & Botomé,
2003).
Sidman (1989/1995), em seus estudos sobre os efeitos colaterais da coer­
ção, observou que a sensação constante de exposição às ameaças restringe as
possibilidades comportamentais do indivíduo e potencialidades de aprendizado, o
que torna a realização das metas e dos objetivos ameaçada. Enquanto os estudos de

Jéssica Cirqueira Alves, Qína No lêto Bueno


CabaHo e Bueia (1989) acrescentam ainda que os indivíduos considerados mais
habilidosos apresentam menor número de auto-verbalizações negativas, quando com-
parados àqueles com baixas potencialidades comportamentais.

Auto-regras
Boa parte das verbalizações descritivas referentes ao comportamento, suas
condições e conseqüências realizadas seja por outras pessoas ou pelo próprio indiví­
duo afetam diretamente seus comportamentos, planos, propósito, metas, etc. (Abreu-
Rodrigues & Sanabio-Heck, 2004). Assim, Zettle (1990) salienta que estas ordens de
descrições são denominadas de regras e auto-regras.
Abreu-Rodrigues e Sanabio-Heck (2004) ao analisar os estudos de Castanhei-
ra (2001) e Cerutti (1989) destacaram que "(-..) o termo regra é usado para indicar
contingências generalizadas e o termo instrução, contingências específicas." (p. 153).
Enquanto “As auto-regras podem ser vistas como estímulos que especificam contin­
gências que são produzidas pelo comportamento verbal da própria pessoa." (Zettle,
1990, p. 47).
Por se tratarem de estímulos verbais que especificam contingências, as auto-
regras incluem a porção do repertório com portamental (verbal) e afetam a outra porção
desse repertório (verbal e não-verbal), sendo ainda explicitadas publicamente ou
privadamente, em forma de pensamentos (Jonas, 1999).
Sendo assim, nota-se que comportamento não-verbal é fortemente influencia­
do pelo comportamento verbal, uma vez que a mudança nas falas do indivíduo pode
acarretar na mudança de suas ações (Bueno, 2005). Isto enseja que as representa­
ções e avaliações do indivíduo perante si mesmo, adquiridas no decorrer de suas
experiências poderão ser modificadas por suas novas verbalizações (Del Prette & Del
Prette, 1999/2005).
O presente trabalho objetivou investigar os repertórios-problema apresentados
pela participante dele, bem como analisar se as baixas habilidades sociais e as auto-
regras negativas seriam as variáveis mais relevantes no processo de construção e
manutenção de seus comportamentos-problema. Pretendeu também analisar se o
programa de tratamento proposto favoreceria a redução da freqüência desses repertó­
rios dela, além de possibilitar à participante a construção de habilidades socialmente
adequadas.

Método
Participante
A participante deste estudo de caso foi Lana (nome fictício), à época com 41
anos, solteira, classe média baixa, segundo grau completo, vendedora, residindo com
seus pais.
História Clínica - Lana é a oitava filha de uma prole de dez irmãos. Sua gesta­
ção foi normal, apesar das dificuldades financeiras e da morte de seu avô, abalando
muito sua mãe. Na primeira infância (0-5 anos) permanecia muito tempo com os vizi­
nhos, que residiam na mesma área de sua casa. Na segunda infância (6-10 anos)
apresentou muita dificuldade para aprender a ler e a escrever, sendo apelidada de
“boba", “retardada” e “besta”, por seus familiares, inclusive por sua mãe. Só aprendeu
tais repertórios a partir de seus 10 anos de idade (enquanto o esperado às crianças é

Sobre Comportamento e Cognição 99


que sejam adquiridos até sete anos). Não sentia vontade em aprender, principalmente
quando o assunto era relacionado à área cuitural. Já apresentava dificuldade de relaci­
onamento com sua mãe, por acreditar que esta fazia diferenciações entre os irmãos,
tais como a escolha da escola, até mesmo quanto aos presentes recebidos. Na adoles­
cência (11-17 anos) foi muito timida, a ponto das pessoas comentarem; e indecisa,
apresentando problemas para fazer escolhas simples, como eleger uma roupa para
sair. Aos 16 anos tinha mania de limpar a casa, destinando todo seu tempo a esta tarefa,
"esquecendo-se” dela. Na juventude (18-22 anos) sentia medo de enfrentar os obstá­
culos da vida, como arrumar um emprego, esperando que os outros a ajudassem,
principalmente sua mãe. Na Idade adulta seus problemas de relacionamento aumen­
taram: já não se restringiam à constelação familiar, estendendo-se para o campo pro­
fissional, quando trabalhava como crediarista. Aos 39 anos, com a morte de seu irmão
mais próximo, percebeu “O quanto a vida é traiçoeira, cheia de eventualidades" (Lana,
2005). O medo ou a dificuldade de tomar decisões, como por exemplo, escolher um
namorado, passou a contribuir para sua dependência em relação aos seus pais e às
pessoas ao seu redor. Não conseguindo ir atrás de nada pelo desânimo; sempre
necessitando de alguém para “empurrá-la’’. Tornou-se fechada; isolou-se em seu quar-
to, com receio de seu futuro, mesmo com a tomada de consciência adquirida, por não
saber como modificar sua situação de passividade e de descontrole a respeito da vida
dos outros. “Sou retardatária, só vejo as coisas depois que passam” (Lana, 2005). A
vontade de mudar veio daí, por ter “acordado" e notado não ter feito nada em função de
sua própria vida, mas ao contrário, “Tomei conta da vida dos outros, interferindo em
opiniões das quais nem era solicitada, preocupando-me com que os outros falavam de
forma automática, deixando de lado tudo em relação a mim mesma" (Lana, 2005).

Materiais e Ambiente
As sessões foram realizadas em um consultório padrão de uma Clínica Escola
de Psicologia, ligada a uma instituição de ensino superior. Foram utilizados materiais
didáticos e pedagógicos, além do Questionário de História Vital de Lazarus (1975/
1980), Bateria de Beck, completa (Cunha, 2001); Inventário de Habilidades Sociais (Del
Prette & Del Prette, 2001/2003); e Diários de Registro (Bueno & Britto, 2003).

Procedimento
O processo terapêutico foi realizado em 24 sessões, com duração de 50 minu­
tos cada, duas vezes por semana. Ele compreendeu-se por três fases; Linha de Base,
que ocorreu entre a 18 e a 8a sessão, com o intuito de averiguar as queixas trazidas pela
participante, para o delineamento de um plano de tratamento. Nesse momento foi res­
saltado o enfoque ativo e cooperativo do cliente em todo processo terapêutico, de acor­
do com a Terapia Comportamental Cognitiva.
A fim de obter maiores dados acerca da participante, foi utilizado o Questionário
de História Vital de Lazarus (1975/1980), que é compreendido por questões relativas à
vida, desde à concepção até o momento atual. Foi aplicada, ainda, a Bateria de Beck,
composta pelo Inventário de Depressão de Beck - BDI; Inventário de Ansiedade de Beck
- BAI; Escala de Desesperança de Beck - BHS; e Escala de Ideação Suicida de Beck -
BSI (Cunha, 2001). Outro instrumento aplicado foi o Inventário de Habilidades Sociais
(Del Prette & Del Prette, 2001/2003). Já os Diários de Registro tiveram a função de
monitorar seus comportamentos e levá-la, posteriormente, ao automonitoramento de
seus repertórios comportamentais (Bueno & Britto, 2003). Instrumento este, utilizado

100 Jésslca Círqueíra Alves, Çína Nolêto Bueno


em todas as fases do processo terapêutico.
A segunda fase deste estudo compreendeu a Intervenção, realizada entre a 9a
e a 17a sessão, quando foram aplicadas as seguintes técnicas comportamentais
cognitivas: (1) Análise Funcional (Kanfer & Saslow, 1973/1979); (2) Reestruturação
Cognitiva (Beck, 1997); (3) Hiperventilação/Treino Respiratório (Mundim & Bueno,
2006); (4) A.C.A.L.M.E.-S.E. (Rangé, 1998); e o (5) Treinamento em Habilidades Soci­
ais (Caballo, 1996/2002).
Uma nova técnica só foi aplicada quando a participante já detinha compreen­
são e adesão à técnica anterior Na 16a sessão realizou-se a reaplicação do IHS,
devido à relevância dos valores obtidos em sua 1a aplicação, na 7a sessão, visando o
acompanhamento evolutivo da intervenção. Também na 17a sessão foi definido e
aplicado um plano de férias, a fim de favorecer a manutenção da intervenção terapêu­
tica durante dois meses de interrupção do tratamento, devido às férias acadêmicas
na Clinica Escola de Psicologia. Neie continha o emprego de todas as técnicas apli­
cadas pela Intervenção, e foi assim apresentado: "a) Mantenha atualizados os diários
de comportamentos, lembrando-se de preenchê-los sempre que vivenciar eventos
evocadores de conflitos interacionais; b) Faça o Controle Respiratório, diariamente,
nas oito sessões definidas, com 6 repetições consecutivas cada (de relaxar muscula­
tura; inalar o ar pelas narinas; prendê-lo por 5 segundos; soltá-lo pela boca entreaber­
ta; respirar normal), preenchendo os diários do mesmo; c) Lembre-se sempre da
importância da realização do A.C.A.L.M.E.-S.E., realizando seu registro; d) Preencha
sempre o diário de dificuídades à situações sociais; e) Abra-se para experiências
novas; conheça lugares e pessoas diferentes, aumentando assim seu círculo de
amizades e de lugares visitados, atualizando sempre o Diário de Registro de Com­
portamentos; f) Mantenha os diários de auto-cuidado em dia; g) Lembre-se da impor­
tância de rever e conversar com os amigos; h) Procure manter constantemente inter­
pretações positivas em relação a si mesma, aos outros e ao mundo, e registre-as".
A última fase do processo terapêutico compreendeu a Avaliação Final, efetuada
entre a 18a e a 24a sessão. Sua finalidade foi averiguar a chegada da participarite, após
dois meses de interrupção do atendimento terapêutico com, incfusive, a reaplicação da
Bateria de Beck (Cunha, 2001) e do IHS j(Def Prette & Del Prette, 2001/2003). Assim
como a análise dos Diários de Registro, para a confrontação dos dados da Linha de
Base e Intervenção, com os obtidos neste momento.

Resultados
Os presentes dados foram obtidos no decorrer de todo processo terapêutico
em suas três fases: Linha de Base, Intervenção e Avaliação Final, com a finalidade de se
investigar as variáveis desencadeadoras e mantenedoras dos repertórios-problema da
participante, possibilitando assim o delineamento de um piano de intervenção
estruturado e diretivo, para a funcionalização de tais repertórios.

Bateria de Beck (BOI, BHS, BAÍ e BSi)


Serão apresentados, a seguir, os resultados do BDl, BHS, BAI e BSI aplicados
na Unha de Base e reaplicados na Avaliação Finai.

Sobre Comportamento e Cognição 101


Tabela 1. Inventários de avaliação clínica aplicados na participante'deste estudo

In yçn tário Linha de Base (Ses- Avaliação Final (Ses­


sã o /E sco re ) sã o /E sco re )

D epressão Beck - BDI ' (5a sessão)29: Nível Moderado (23a sessão)11: Níveí Mínimo

Escala D esesperança (5a sessão)5: Nível Lève (23a sessão)2: Nível Mínimo
-B H S

Ansiedade Beck - BAI . (5a sessão)21: Níveí Moderado (23a sessão)18: Nível Leve

Eseãla de Ideação Sui- (5a Sessão)0: Sem Ideação (23a Sessão)0; Sem Ideação
. çida - BSI

Os dados da Tabélá 1 evidenciam que o nivel de depressão em Lana reduziu


de moderado na Linha de Base, para mínimo na Avaliação Final. A desesperánça dè
nível íeve, verificada na Linha de Base, diminuiu para o nívei mínímo na Avaliação Final.
Já sua ansiedade que alcançou nível moderado na Linha de Base, decresceu para ò
nível leve na Avaliação Final. E por fim, foi caracterizada na Escala de Ideação Suicida,
aplicada na Linha de Base e Avaliação Final, a ausência de ideação suicida.

Inventário de Habilidades Sociais (IHS)


A Figura 1 traz informações comparativas a respeito dos dados obtidos no IHS
na Linha de Base, Intervenção e Avaliação Final.

Figura 1. Resultados Comparativos do Processo sobre o IHS

1 (& Jéssica Ctrqueira A lves, Ç tna Nolêto Bueno


A I a coluna da Figura 1 indica o percentil mediano 50 do IHS, referente ao
Escore Total e á todos os escores fatoriais, onde os valores acima desse percentil
mediano sinalizam níveis mais altos de habilidades sociais e os abaixo, nívejs defici­
tários de habilidades sociais. A 2a coluna demonstra o Escore Total, ilustrando os
percentis alcançados na Unha de Base, Intervenção e Avaliação Final com valores 3,
10, 20, respectivamente, indicando a aquisição geral de novas habilidades sociais por
parte da participante.
O fator F1 representa o repertório de enfrentamento e auto-afirmação com risco
apresentado pela participante na Linha de Base: percentil 10. Nota-se que na Interven­
ção este subiu para 50; e na Avaliação Final elevou-se a 60, assinalando a aquisição de
novas habilidades frente a situações de risco.
No fator F2, què avalia o repertório de habilidades em auto-afirmação na ex­
pressão de afetos positivos, Lana obteve o percentil 30, tanto na Linha de Base quanto
na Intervenção; e 35 na Avaliação Final, evidenciando o aumento de suas habilidades
na expressão de sentimentos positivos, ainda que aquém do percentil mediano espe-
rado.
Já no fator F3, que destaca a conversação e a desenvoltura social, a participan­
te alcançou percentil 1 na Linha de Base; subindo a 60 na Intervenção. Logo após, 50
na Avaliação Final, confirmando a obtenção de novos repertórios hábeis à desenvoltura
e à conversação social.
No fator F4, indicador da auto-exposição a desconhecidos ou a situações no­
vas, o percentil na Linha de Base foi de 10, caindo para três na Intervenção e chegarido
a 20 na Avaliação Final. Dados que corroboram a aquisição de habilidades para enfren­
tar essas situações.
Finalmente, no fator F5, demonstrativo de autocontrole da agressividade em
situações aversívas, o percentil obtido pela participante na Linha de Base foi de 85;
diminuindo na Intervenção para 20; aumentando para 70 ná Avaliação Final, o que
ratifica o alcance de repertórios assertivos por parte de Lana.
A Tabela 2 ilustra as baixas habilidades sociais e as auto-regras mais relevan­
tes colhidas ao longo das fases Linha de Base, Intervenção e Avaliação Final, assim
como as intervenções realizadas por meio do T.H.S..
Tabela 2. Baixas Habilidades Sociais e Auto-regras: conseqüências e intervenções

Baixas Habilidades C onseqüên­ A uto-regras Intervenção


cia
Dificuldade em ' Deixa de ir aos Não tenho tempo Reestruturação
chegar no horá­ lugares quando se para mim. Cognítiva;Refòrço
rio. atrasa. Positivo.

Dificuldade em realizar Não cumpre as Deixo tudo a meu Reestruturação


tarefas simples que tarefas propostas. respeito para de­ Cognitiva;Agenda
lhe dizem respeito. pois. de atividades.

Dificuldade em apren­ Não se interessa por Reestruturação


der, principalmente leitura, jornais ou Sou burra. Cognitiva;Programa
quando o assunto é qualquer tipo de de Estratégias
relacionado à área informação cotidiana. para o Aprendiza­
cultural. do.

Sobre Comportamento e Cognifão 103


Baixas Habilidades______ C o n s e q ü ê n -_________ A u to -re g ra s ________ In terven ção
cia
Dificuldade em fazer É reprovada nos tes­ Sou inútil. Sinto como Ainda não houve
contas 8 escrever. tes de emprego devido se não fosse alfabe- intervenção,
à falta do domínio tizada, sem alicerce.
esperado.
Dificuldade em tomar Tornou-se omissa, Sou dependente da Reestruturação
decisões. precisando de alguém opinião das pessoas. Cognitiva; Diário de
para orientá-la, sem­ Resolução de
pre. Problemas.
Mau relacionamento Permanece isolada e Minha mãe não gosta Reestruturação
com a mãe, por não afasta-se de sua mãe. de mim; dá mais aten- Cognitiva; Progra-
aceitar suas opiniões. ção aos meus irmãos, ma de estratégias
para aproximação.

Falta de habilidades Vive só em seu quar­ Não tenho nada a Reestruturação


para conversar, con­ to, evita as pessoas. oferecer em uma Cognitiva;Programa
quistar amigos e na­ Tornou-se fechada e conversa ou num de Estratégias
morados (em ser pouco comunicativa. relacionamento. Sou para Socialização,
sociável). feia, sem cultura e
falo mal. Não sou
sociável.
No trabalho, não acei­ Recusa grande parte Quem trabalha nes- Análise Funcional;
ta assumir cargos das ofertas de empre­ ses empregos são Reestruturação
‘'baixos' ou mal remu­ go. pessoas subalternas. Cognitiva.
nerados.

Interfere em assuntos Briga constantemente Os outros fazem Reestruturação


que não lhe dizem e cria conflitos famili­ tudo de ruim e são Cognitiva; Contrato:
respeito, por acreditar ares. considerados bons. só interferir quan-
que sua opinião é a Façotudo de bom e do solicitada,
melhor. me consideram ruim.

Não se dedica ao Problemas com a Meu rosto é estra- Reestruturação


auto-cuidado. auto-imagem. gado, deformado. CognitivajDiário
do Auto-cuidado.

O fragmento de sessão, abaixo, demonstra um padrão de comportamento da


participante, mas que ela apresentava-o em quaisquer contextos:

Intervenção ~ Fragmentos de Sessão - 9a sessão


T- Lana, venho percebendo o quanto o respeito é importante para você. Gostaria
que dissesse o que este significa.
L- Respeito? É não agredir, tratar bem, saber respeitar a opinião, seu ponto de
vista.
T- Você age com respeito quando não aceita a opinião do outro?
L- Não. Nunca respeitei nem a mim, piorou aos outros. Acho que estou sempre
correta e querendo que as pessoas ao meu redor ajam e pensem de minha maneira.
Isto gera um conflito familiar.

104 Jéssica Cirqueira Alves, Çina Nolêto Bueno


Nesta sessão foi estabelecido um contrato parg que ela só interferisse em
conversas alheias quando solicitada. Tarefa esta minuciosamente explorada nas ses­
sões posteriores.
A Figura 2 apresenta o encadeamento utilizado pela participante frente às situ­
ações que requeriam habilidades sociais. O esquema foi montado no settina terapêutir.n
durante a 12a sessão, fase de Intervenção, possibilitando a ampliação da consciência,
de Lana: “Nossa é dessa forma mesmo que eu me comporto. Preciso aprender a não
realizar esse ritual”.

Auto-regras negativas:
Sei que não sou sociável. Tenho dificuldades em tentar fazer qual­
quer coisa. Não tenho nada a oferecer numa conversa, pois não
________________ sou atualizada.
Repertórios-problema: Situação:

Está sempre fugindo ou / l í ELk Pessoa, amiga da família,


esquivando-se das pessoas vai visitá-los.
e situações.
Baixa Habilidade Social:
Não cumprimenta a visita, evitando ter que conversar
e ter que fazer sala à pessoa.

Figura 2. Baixas habilidades sociais e auto-regras negativas - o encadeamento de


repertórios-problema

O esquema proposto foi elaborado como uma estratégia para que a participan­
te pudesse observar o encadeamento de seus repertórios-problema. Então, como tare­
fa de casa ela foi estimulada a identificar os agentes específicos de controle de seu
comportamento que operavam nos contextos descritos, na Figura 2. O resultado desta
tarefa, que motivou intervenção posterior, está apresentado na Tabela 3.

Tabela 3. Agentes Específicos de Controie do Comportamento e Intervenções______

Agentes Específicos de Con- Intervenção Resultado


trole de Comportamentos

•Punição: ver-se obrigada a fazer •Na 13" sessão foi utiliza­ •Lana observou as
sala à visita; ser julgada como inade­ da a Reestruturação vantagens de tor-
quada pela família. Cognitiva e o estabeleci­ nar-se mais sociá­
mento de um plano de vel e passou a
estratégias para socializa­ cumprimentar as
•Coerção: regras sociais impondo um ção e o reforço positivo. pessoas.
comportamento ao qual não se sente
capaz.
•Na 14a sessão foi utili­ •Passou a se infor­
•Reforço Negativo: fugir a/ ou esquivar- zada também a mar mais, e a desen­
se da situação temida. Reestruturação Cognitiva volver conversas.
•Reforço Positivo: o alívio provocado e o delineamento das
pela fuga e ou esquiva da situação estratégias para se man­
temida. ter informada, além do
reforço positivo.

Sobre Comportamento e Cognição 105


Análise funcional
Esta foi realizada em todas as fases do processo terapêutico através das
verbalizações no setting e dos Diários de Registro de Comportamentos. A seguir, um
exemplo do uso deste instrumento.

Tabela 4. Análise funciona! de comportamentos * Linha de Base (4a Sessão)

Estímulo (S) Resposta (R) Conseqüências (C)

Avaliando a necessi­ Encobertas: diz a si mes­ Não acredita em si


dade de conseguir um ma que não há condições mesma e evita as
emprego. de uma pessoa amanhecer pessoas; o que man­
e anoitecer sem fazer ab­ tém sua dificuldade
solutamente nada; de arrumar emprego
Fisiológicas: calafrios e e o seu depender.
fatta de ar,Emocionais:
desesperança, tristeza,
vergonha e sofrimento;
Operantes: fica no quarto
quieta, sem ação.

A demonstração da problemática vivenciada pela participante, na Tabela 4,


favoreceu a discriminação de seus repertórios-problema, ou seja, possibilitou a obser­
vação, descrição, mensuração e análise de seu repertório, ocasionando a sua tomada
de consciência. A Tabela 5, a seguir, assinala esse processo.

Tabela 5.’Análise funcional de comportamentos - Intervenção (10a Sessão)

Estímulo (S) Resposta (R) Conseqüências (C)

Em uma empresa, no mo­ Encobertas: diz a si mes­ É admitida ao cargo.


mento do processo seletivo ma que escolheu muito e
. para contratação. acabou descobrindo que é
melhor pouco do que nada:
“Preciso aproveitar. 0 pior
dos empregos é o desem­
prego".
Fisiológicas: calafrios e
falta de ar;
Emocionais: esperança;
Operantes: entra na sala
de recrutamento e seleção
e participa da entrevista e
dinâmicas.

O resultado da Análise Funcional, apresentado na Tabela 5, destaca que houve


discriminação dos repertórios-problema pela participante, quando apresentou uma
nova categoria de comportamento, culminando com seu objetivo de conquistar o traba­
lho.
Algumas novas habilidades sociais e auto-regras puderam ser observadas
no repertório comportamental de Lana, a partir da 13a sessão, como mostra a Tabela 6.

106 Jéssica Cirqueira Afves, Çína Nolêfo Bueno


Tabela 6. Novas habilidades sociais e novas auto-regras

Nova Habilidade Social C o n s e q iie n c ia Nova A u to -reg ra

Mesmo quando se aírasa, vai Sente-se surpresa com seu Tenho mais tempo para mim.
ao compromisso marcado. novo comportamento.
Cumpre as tarefas que lhe Tomou-se mais produtiva. Estou mais confiante em mim
dizem respeito. mesma.

Responsabiliza-se por suas Deixou de ser tão dependen­ Agora posso decidir sozi­
decisões. te das opiniões de terceiros. nha.

Não mais interfere em assuntos, Diminuição dos conflitos Tenho mais reconhecimento
quando não solicitada. familiares. em minha casa.

Dedica-se ao auto-cuidado. Meíhorou sua aparência e Hoje esíou mais bonita e


sente-se mais bonita. confiante.

Respeita a opinião de sua mãe. Diminuíram,consideravelmente, Não quero mais viver aque­
os conflitos com a mãe. les momentos.

Aceita um trabalho, mesmo com Organiza-se financeiramen­ O pior dos empregos é o


baixa remuneração. te, deixando de ser tão desemprego.
dependente.

Apesar do delineamento da proposta de intervenção, em alguns repertórios-


problema não foi observada a aquisição de novas habilidades sociais e auto-regras,
conforme demonstra Tabela 7, a seguir.

Tabela 7. Repertórios-problema Não Modificados

R epertórios-problem a Baixas habilidades Auto*regra

Apesar de apresentar-se Objeções nos relaciona­ Não me dou bem em traba­


mais sociável, impõe barrei­ mentos no ambiente de lho de equipe. Não consigo
ras de aproximação aos trabalho. relacionar-me.
colegas de trabalho.

Afasta-se das pessoas Dificuldade em manter As pessoas me decepcio­


quando prestes a adquirir vínculos afetivos. nam rápido. Acabo des­
vínculo de intimidade. confiando de todos.

Discussão
O presente trabalho dedicou-se primeiramente a investigar se as baixas habi­
lidades sociais e as auto-regras negativas seriam os agentes de maior relevância no
processo de construção e manutenção do encadeamento de repertórios-problema.
Del Prette e Del Prette (1999/2005) apontam que as experiências de aprendizagem
proporcionadas pelas condições ambientais são fatores decisivos para a cristalização
de repertórios de comportamentos do indivíduo, principalmente as vivenciadas na fase
escolar. Os relatos de tan a sugerem que, logo nos primeiros anos escolares a mesma
apresentou problemas de aprendizagem e, devido a isso, foi rotulada por seus familia-

Sobre Comportamento e Cognição 107


res, inclusive por sua mãe, como “boba," “retardada" e "besta”. Estas rotulações pare­
cem ter influenciado no seu desenvolvimento, servindo de suporte para as demais
etapas de sua vida.
Abreu-Rodrigues e Sanabto-Heck (2004) salientam que as descrições verbais
referentes ao comportamento, suas condições e conseqüências, provenientes de ou­
tras pessoas ou do próprio indivíduo, influenciam significativamente seus comporta­
mentos e aspirações futuras. As descrições verbais realizadas pelos familiares de
Lana, no decorrer de sua vida, parecem ter favorecido no desencadeamento de suas
premissas sobre ignorância, incompetência e inutilidade, como descreve a Tabela 2,
quando diz “Sou burra", “Sou inútil. Sinto como se não tivesse sido alfabetizada. Sem
alicerce", “Não tenho bagagem cultural, não tenho nada a oferecer”. Observando-se,
ainda, a consonância destas auto-regras disfuncionais com as baixas habilidades so­
ciais apresentadas por Lana, sugere-se que as mesmas podem ter beneficiado a
formaçãu de seus repertórios-problema.
Habilidades sociais, de acordo com Del Prette e Del Prette (1999/2005), são as
potencialidades de todos os seres humanos, que podem ser plenamente desenvolvidas
a fim de proporcionar a adaptação social do indivíduo. Baixos níveis de habilidade social
podem ser proporcionados pela inteligência rebaixada, dificuldades para resolver proble­
mas, inadequação nas relações familiares, o que pode vir a desencadear uma dificulda­
de de adaptação social, como as demonstradas por Lana em sua adolescência. Devido
à timidez e à dificuldade de tomar decisões simples, acabava por distanciar-se das pes­
soas e dos cuidados consigo mesma, promovendo, ao mesmo tempo, sua dependência
e problemas de relacionamento. Ao relatar as dificuldades de aprendizagem, apontadas
na Tabela 2, Lana confirma as considerações de Del Prette e Del Prette (2001/2003),
quando salientam que muitas pessoas não se utilizam de seus conteúdos e
potencialidades por regras errôneas e dificuldade de leitura dos sinais do ambiente.
A Bateria de Beck (Cunha, 2001), ilustrada na Tabela 1, aferiu a intensidade dos
repertórios-problema da participante, bem como a significativa diminuição de todos os
escores avaliados, sugerindo o suporte favorecido pelas técnicas utilizadas no proces­
so terapêutico.
Segundo Catania (1998/1999), qualquer conseqüência que conduza ao au­
mento da probabilidade de um comportamento tem o nome de reforço. O encadeamen­
to de repertórios-problema apresentado na Figura 2 deixa implícita a existência de
reforçadores nas condutas de Lana. O comportamento de Lana de fugir e/ou esquivar-
se da situação temida, enquanto que caracterizado pela retirada do estímulo aversivo, a
fim de promover o aumento de sua freqüência, refere-se ao reforço negativo. Da mesma
forma que o alívio provocado por esta fuga e/ou esquiva pode promover o aumento do
comportamento ao qual é contingente, sendo este denominado de reforço positivo,
conforme apresenta a Tabela 3 (Skinner, 1953/2000). A punição, enquanto relacionada a
uma conseqüência enfraquecedora de um comportamento, apresenta-se como a obri­
gação que Lána julga ter de “fazer sala” e “conversar com as visitas”, assim como o
julgamento de inadequação proferido pela família perante este fato (Catania, 1998/
1999). Já a coerção, neste contexto, apresenta-se como seu sentimento de incapacida­
de evidenciado perante as exigências sociais de comportamento, uma vez que trata-se
de uma forma de controle externo exercido sobre sua conduta (Sidman, 1989/1995).
A partir da discriminação, favorecida pelas análises funcionais (Kanfer & Saslow,
1973/1979), a participante pareceu tomar consciência da necessidade de adquirir no­
vos repertórios de comportamentos: desta vez, adequados e condizentes ao seu ambi­
ente social, como demonstram as Tabelas 4 e 5.

108 Jéssica Círqueira A i ves, Qína Nolêto Bueno


Intervir sobre o sistema de regras disfuncionais e rígidos de Lana, como as
apresentadas na Tabela 2, foi o objetivo deste estudo com a técnica da Reestruturação
Cognitiva (Beck, 1997). Pode-se observar o sucesso desse recurso na Tabela 6, ao se
verificar a construção de novas auto-regras que permitiram uma melhor adaptação da
participante ao seu meio.
A Tabela 2 demonstra as baixas habilidades sociais e auto-regras negativas
mais relevantes apresentadas por Lana no decorrer do processo terapêutico, assim
como as intervenções pautadas no Treinamento de Habilidades Sociais (Caballo, 1996/
2002). Nota-se, na Tabela 6, que os resultados alcançados com esta intervenção ratifi­
cam sua eficácia na aquisição de novas habilidades sociais e a conseqüente
ressignificação das auto-regras da participante. Resultado este que pode ser ratificado
na Figura 1, que apresenta os resultados obtidos no IHS, onde está evidenciado o
aumento das habilidades de Lana, proporcionando-lhe uma melhor qualidade de vida.
Contudo, mesmo com a intervenção delineada, percebeu-se que a participante
não modificou alguns repertórios-problema, como pode-se verificar na Tabela 7, demons­
trando o quanto suas auto-regras negativas (por exemplo: “Não dou conta de relacionar-
me. Acabo desconfiando de todos") podem ter contribuído para a não adesão à interven­
ção global proposta. Ainda que o processo não tenha se utilizado de coerção, mas ape­
nas realizado intervenção em conseqüências de coerções sofridas pela participante ao
longo de sua vida, em muitos momentos a participante ainda apresentou comportamen­
tos agressivos, sentindo-se constantemente ameaçada. Lana também parece ter tenta­
do evitar a punição da terapeuta esquivando-se das tarefas e até mesmo das sessões,
como advertem (Kienen & Botomé, 2003). Assim, observou-se a necessidade de que a
participante continuasse com o processo terapêutico visando a extinção das sensações
de ameaça, para que suas potencialidades de aprendizagem e comportamentais não
fossem restringidas, como salientam os estudos de Sidman (1989/1995). Entretanto, a
participante optou por encerrar o processo terapêutico.
Diante do exposto, este estudo sugere que as auto-regras negativas foram variá­
veis muito importantes no processo de construção e manutenção dos repertórios-proble­
ma da participante, sendo estas motivadas pela coerção social, que parecem ter favorecido
suas baixas habilidades sociais. Sugere ainda que a intervenção proposta foi adequada,
uma vez que proporcionou uma considerável evolução assertiva nos repertórios da partici­
pante. Claro que não é tarefa fácil intervir no comportamento humano complexo. Mais com­
plicado ainda se torna quando a sensação de ameaça é resposta constante numa pessoa,
estando esta inserida em um ambiente sociai pouco refonçador e bastante coercitivo.
Este estudo pode verificar ainda que o ambiente familiar de Lana, foco de sua
atenção, apresentava-lhe pouco ou nenhum reforçador social. Não pela ausência deste
repertório, uma vez que outros membros da família recebiam o reforçamento social uns
dos outros, mas pela indisposição em dá-lo à participante. Sugere, também, que a
interrupção do tratamento por dois meses parece ter sido variável importante no desin­
teresse da participação quanto à continuidade do mesmo.

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Jéssica Cirqueira Alves, Çína Nolêío Bueno


Capítulo 9
Comportamento alimentar infantil: do
normal ao patológico

Talita Lopes Marques*


Clínica Equilíbrio
Denise Cerqueíra Leite Heller**
Universidade Tuiutí do Paraná

1. introdução
Nos últimos anos tem havido um crescente interesse da mídia pelos distúrbios
alimentares na infância e isso, de acordo com Bryant-Waugh (2003), cria 2 mitos: 1. que
está havendo uma “epidemia" desses transtornos e 2. que os transtornos alimentares
estão ocorrendo cada vez mais cedo. O autor afirma que nenhum dos mitos é verdade,
embora possa ser verdade que está havendo um aumento da sensibilidade do peso e
comportamentos de dieta, mas não há evidências científicas de que isto leve a um
transtorno alimentar.
Quando se fala em transtornos alimentares pensa-se em anorexia nervosa e
bulimia nervosa, que são as patologias mais veiculadas pela mídia, são mais comuns
no sexo feminino, principalmente entre adolescentes e jovens adultas, contudo, afetam
também mulheres mais velhas, homens e crianças de ambos os sexos (Bryant-Waugh,
2003). Embora haja pouca literatura sobre o assunto, existem evidências consistentes
de anorexia e, em menor escala, buiimia entre crianças (Morgan, Fontes, Moraes, 2006).
Pela alta morbidade e mortalidade dos transtornos alimentares (mortalidade mais alta
dentre as doenças psiquiátricas) se faz necessária uma investigação mais profunda do
assunto (Hill, Pomeroy, 2001, Robb, 2001).
Em relação às crianças, seu repertório comportamentai está sendo formado, o
comportamento alimentar serve também como via de expressão de suas experiências.
Desta forma, o comportamento alimentar infantil é muito flexível, adquire outras funções
além de garantir o aporte calórico, e isto torna o limiar entre normal e patológico muito
* Graduada pela Universidade Tulut) do Paraná (2004); formação em Terapia Cognitivo-comportamental pelo Centro de Estudos de Terapia
Comportamenla! e Cogrílíva (CETECC-PR -2005): Formação em Psicologia do Esporte pelo G2 Assessoria Esportiva (2005); licenciatura no
Programa RAFCAL (ReeducàçSo Afeto-oognltlva do Comportamento A/imentar - 2006); Especialização em Intervenção Cognitiva / Teoria da
Aprendizagem Mediada peia Faculdade Martinus e ICELP-Jerusalém (2007); Especialização em Transtornos Alimentares e Obesidade pela
Faculdade de Medicina do ABC (FMABC - 2008). Contato: (41) 9964-770018402-9930, taRmarques@holmall.com.
** Graduada pela Universidade Federal do Paraná, mestre em Psicologia Experimental pela USP, professora dos cursos de graduação e pós-
graduação da Universidade Tuiuti do Paraná, Professora e coordenadora do Centro de Estudos de Terapia Comportamentai e Cognitiva
(CETECC-PR).

Sobre Comportamento e Cognição 111


tênue, de difícil distinção. Nas crianças, além da anorexia nervosa e bulimia nervosa,
podem acontecer restrições alimentares que não estejam ligadas a preocupações com
o corpo e ao medo de engordar, bem como quadros de compulsão alimentar, principal­
mente em crianças propensas à obesidade.
Sugere-se que a designação transtorno alimentar de início precoce ou transtorno
alimentar com início na infância seja aplicada apenas aos casos de anorexia e bulimia,
em crianças de 7 a 14 anos. Chamam-se, então, de transtornos da alimentação as
patologias: recusa alimentar, transtorno emocional da recusa alimentar, seletividade ali­
mentar, disfagia funcional, restrição alimentar, recusa pervasiva, perda de apetite decor­
rente de depressão e compulsão alimentar (Gowers, 2005; Lask, Bryant-Waugh, 2003).

2. Epidemiologia
São escassos os estudos epidemiológicos sobre os transtornos da alimenta­
ção e transtornos alimentares com início na infância. Doyle e Bryant-Waugh (2003) rela­
tam 2 estudos descritos a seguir. Em estudo sobre a incidência de anorexia nervosa em
um condado da Dinamarca, Joergensen (1992) constatou a incidência de 9,2 meninas
por 100.000 habitantes por ano, em idade entre 10 e 14 anos. Lucas e colegas (1991)
conduziram uma pesquisa sobre a incidência de anorexia em Rochester, Minnesota (EUA)
e não encontraram nenhum caso em crianças de 0 a 9 anos, no entanto, constataram
uma média de 14,6 casos de anorexia por 100.000 habitantes por ano, em idades entre
10 a 14 anos, sendo 25,7 meninas e 3,7 meninos por 100.000 habitantes.
Segundo Morgan, Fontes e Moraes (2006) em adolescentes e adultos, esta
taxa gira em torno de 18,46 mulheres por 100.000 habitantes e 2,25 homens por 100.000
habitantes. A anorexia é mais freqüente em meninas, mas, comparativamente, no sexo
masculino, há mais casos de meninos do que de adolescentes ou adultos com anorexia.
Dados epidemiológicos da bulimia nervosa são mais escassos, mas alguns estudos
sugerem que na década de 90 tenha havido um aumento de casos em meninas de 10
a 19 anos e, paralelamente, uma diminuição de casos em mulheres mais velhas.

3. Etiologia
A etiologia dos transtornos da alimentação é variada e esse aspecto será abor­
dado junto à descrição do quadro. Os transtornos alimentares de início precoce (anorexia
e bulimia) são multi-determinados, com fatores sócio-culturais e eventos da vida que
impactam uma personalidade vulnerável, moldada pelo ambiente familiar, juntamente
a uma predisposição genética e biológica (Gowers, 2005).
Segundo Lask (2000, 2003) na etiologia desses transtornos deve-se levar em
consideração diversos fatores que podem ser divididos em fatores predisponentes, fato­
res precipitantes e fatores perpetuadores. Os fatores predisponentes incluem a
vulnerabilidade genética, expressa pelos fatores biológicos e características de persona­
lidade (relevantes para todos os transtornos alimentares), pressões sócio-culturais, que
podem assumir o papel de precipitantes e perpetuadores também. Os fatores precipitantes
incluem estressores como o desenvolvimento puberal, traumas, baixa auto-estima, pro­
blemas familiares, pressões dos pares e da escola, doenças e perdas. Todos esses
fatores podem também servir de perpetuadores, mantendo o transtorno.
Assim, os transtornos alimentares, em qualquer fase da vida, são multi-fatoriais
em seu desenvolvimento, e o desafio é compreender as diversas formas nas quais
esses fatores interagem nas diferentes fases da doença (Lask, 2000).

112 Talita Lopes Marques, Denise Cerqueira Leite Heller


O esquema abaixo facilita a compreensão do desenvolvimento de um transtor­
no alimentar:

Figura 1. O desenvolvimento de um transtorno alimentar (Lask, 2003, p.74).

4. Diagnóstico
A classificação dos transtornos alimentares de início precoce ainda não cons­
tam nas classificações diagnosticas oficiais (DSM-IV e Cl D-10). Quando utiliza-se des­
ses, diagnostica-se, pelo DSM-IV: anorexia nervosa do tipo purgativo e restritivo, bulimia
nervosa do tipo purgativo e não-purgativo e transtornos alimentares sem outras
especificações. Pela CID-10 diagnostica-se: anorexia nervosa, anorexia nervosa atípica,
bulimia nervosa, bulimia nervosa atípica, superalimentação associada a outros distúr­
bios psicológicos, vômito associado a outros distúrbios psicológicos, outros distúrbios
alimentares e distúrbios alimentares não-especificados (Bryant-Waugh, 2003).
Morgan, Fontes e Moraes (2006) ressaltam que as crianças ainda não têm
maturidade cognitiva para preencher tais critérios, que são baseados nas ocorrências

So b re C om p ortam en to e C o g n iç ã o 113
com adolescentes e adultos. E que, além da questão da fase de desenvolvimento físico,
emocional e cognitivo nos quais a criança se encontra, elas podem apresentar uma
grande variedade de alterações do comportamento alimentar, que ocorrem em um
continuam desde o nascimento até a puberdade. Estas alterações podem ser um qua­
dro passageiro, que fazem parte do desenvolvimento normal infantil, ou mais grave e
duradouro, gerando prejuízo ao desenvolvimento da criança, que são os transtornos da
alimentação (Bryant-Waugh, 2003). O diagnóstico dos transtornos da alimentação se­
rão abordados junto à descrição de cada quadro.

5. Fase pré-escolar (14 meses a 5 anos)


Na fase pré-escotar, a criança se utiliza da alimentação para firmar sua posição
e vontade, tentar controlar o ambiente e testar sua independência. Pode surgir quadros
de recusa alimentar ou inapetência.

5.1. Recusa alimentar na primeira infância


Segundo Morgan, Fontes e Moraes (2006) a recusa alimentar na primeira infân­
cia é também chamada de inapetência, e caracteriza-se pela recusa aos alimentos,
desinteresse pela comida, falta de prazer ao se alimentar, preferência por um número
restrito de alimentos, sempre do mesmo tipo ou consistência, recusa a experimentar
novos alimentos, tendência a ritualizar as refeições, recusa a se alimentar com alguém
em específico (pai, mãe, babá) ou lugar específico (casa ou escola),
Esses comportamentos, quando isentos de doenças orgânicas que os justifi­
quem, não estão relacionados a medo de engordar, eles fazem parte do desenvolvi­
mento normal da criança de 14 meses a 5 anos, atingem mais de 20% das crianças
nesta faixa etária e tendem a desaparecer com o tempo (Gowers, 2005). Contudo, esse
quadro gera uma grande preocupação dos pais, angústia, sentimento de frustração e
impotência, sendo uma das queixas mais freqüentes aos pediatras. Essas situações
podem ser desencadeadas por nascimento de irmãos, mudança de casa, ingresso da
criança em creche ou escola, separação da mãe (volta ao trabalho, por exemplo), morte
de um parente, entre outras mudanças (Moraes, Brasii, 2005).
Esta é a fase em que são inseridos novos alimentos (novos sabores e texturas)
no repertório alimentar da criança e é perfeitamente natural ela recusar em especial o
salgado, pois fomos programados fílogeneticamente para preferir o doce (Heller, 2004,
2006). Esses comportamentos de recusa tornam-se problemáticos quando os pais
não têm paciência em apresentar o mesmo alimento diversas vezes à criança, ou
quando, mediante a restrição da criança e a preocupação com seu estado nutricional,
os pais complementem a refeição com mamadeira ou acabam permitindo que a crian­
ça substitua a refeição saudável por salgadinhos, danoninhos e outras guloseimas,
Infelizmente esta falta de paciência e substituições alimentares acaba por reforçar o
comportamento de recusa da criança. Pode acontecer também de os pais tentarem
desesperadamente obrigar a criança a comèr, gerando uma verdadeira guerra em torno
da alimentação (Morgan, Fontes, Moraes 2006). Esta conotação emocional que o comer
adquire, prevalecendo sobre a necessidade fisiológica, torna-se uma artimanha que a
criança usa para controlar o ambiente (Bryant-Waugh, 2003).
Assim, o comportamento alimentar infantil saudável só poderá ser estabeleci­
do quando o conflito emocional for desvinculado da situação alimentar. Se, desde as
primeiras manifestações os pais compreenderem e tolerarem essa recusa, há gran­
des chances de qüe ela desapareça naturalmente. Se persistir e passar a prejudicar o

H4 Talita Lopes Marques, Denise Cerqueira Leite Heller


desenvolvimento físico e emocional da criança, a recusa pode estar sinalizando algum
tipo de mal-estar ambiental ou relacional. Nesse caso, é indicada a avaliação física
(para afastar qualquer possibilidade de enfermidades orgânicas) e psicológica (Morgan,
Fontes, Moraes 2006).

6. Fase escolar (a partir dos 6 anos)


Nessa fase a criança já tem o sentimento de identidade bem estabelecido,
possui repertório para expressar suas experiências por meios que não a alimentação e
o grupo social passa a ter maior importância, sendo que a criança está sempre se
comparando à ele. Essa é a fase em que podem se desenvolver quadros patológicos
de anorexia e bulimia de inicio precoce, pois a criança começa a ter as primeiras idéias
sobre peso, insatisfação com o corpo, dietas, beleza entre outros.

6.1. Transtornos da alimentação


6.1.1. Recusa alimentar
A recusa nessa fase da vida da criança está relacionada a uma dificuldade em
expressar situações vividas, retratando um desenvolvimento emocional pobre, bem
como pobreza na área de interesses. Sintomas associados são a enurese, dificuldade
de aprendizagem e de socialização, imaturidade e infantilidade para a idade cronológi­
ca (Morgan, Fontes, Moraes, 2006). Essa recusa caracteriza-se pela criança comer
seus alimentos preferidos sem nenhum problema, mas negar-se a comer na presença
de alguém em específico ou alguma situação específica. São exempfos as crianças
que não comem em casa, mas comem normalmente na escola, crianças de pais sepa­
rados que não comem com a mãe durante a semana, mas que se alimentam com o pai
no fim de semana (Bryant-Waugh, 2003).

6.1.2. Transtorno emocional da recusa alimentar


Para Bryant-Waugh (2003) nesse quadro, a recusa alimentar, o baixo peso e o
prejuízo no desenvolvimento parecem estar relacionados principalmente a um transtor­
no emocional, não havendo relação com o medo de engordar, tampouco distorção de
imagem corporal. A incidência é desconhecida, mas parece ser mais comum que a
anorexia nervosa nessa faixa etária. Há presença de distúrbios de humor que são
representados por ansiedade, depressão, obsessividade ou fobia de algum alimento
específico. É comum haver alguma doença física associada à recusa (Lask, 2000).
Parece que os sintomas alimentares acabam sendo uma forma da criança lidar com a
doença e, nestes casos, a recusa alimentar não é um sintoma direto da doença da
criança (Morgan, Fontes, Moraes, 2006).

6.1.3. Seletividade alimentar


É caracterizada pela criança comer pouca variedade de alimentos (5 ou 6 tipos),
preferir carboidratos (batatas fritas, pães e bolachas) e resistir muito a qualquer tentativa
de aumentar o repertório alimentar. É comum também haver seletividade quanto a mar­
cas, supermercado onde foi comprado e formas de preparar o afimento (Bryant-Waugh,
2003).
É mais freqüente em meninos, não apresenta preocupações com forma e
peso, e, apesar de raramente haver retardo de crescimento ou baixo peso (Lask, 2000),
a criança apresenta dificuldades sociais, como evitar aniversários, dormir na casa de

Sobre Comportamento e Cognição 115


amigos, viagens e passeios com a escola, que são decorrentes da seletividade alimen­
tar. É por esse prejuízo no campo social que os pais acabam buscando tratamento
(Bryant-Waugh, 2003).
Para os autores supracitados, esse quadro tende a melhorar naturalmente
quando, com o passar do tempo, a necessidade de convívio com o grupo sociaí aumen­
te, obrigando a criança a diminuir a seletividade em favor da interação com os pares.
Pode acontecer de a criança manter um certo grau de seletividade até a vida aduita mas,
desde que não haja prejuízo ao desenvolvimento físico, social e emocional não é ne­
cessária muita preocupação a respeito.

6.1.4. Oisfagla funcional


Nesse quadro pode haver baixo peso e prejuízo de crescimento, pois a disfagia
está relacionada à aversão a determinados alimentos, particularmente alimentos sóli­
dos, de certo tipo e textura, devido à dificuldade de engolir e medo de engasgar ou
vomitar (Bryant-Waugh, 2003). Esta aversão pode estar associada a experiências trau­
máticas como engasgos, endoscopía, intoxicação alimentar, presenciar alguém se
engasgado ou mesmo abuso, que podem estar gerando ansiedade e medo na hora de
se alimentar (Lask, 2000).
Para Morgan, Fontes e Moraes (2006) em alguns casos a disfagia é decorrente
de problemas anatômicos ou neuromotores, tratados com fisioterapia, fonoaudiologia
ou orientação nutricional.

6.1.5. Restrição alimentar


A restrição alimentar é caracterizada pelas crianças que comem vários tipos de
comida, porém comem pouco, parecem não se interessar por comida, sem que haja
preocupação em ser magro e a recusa alimentar não é proposital. Elas apresentam
peso e altura normal para a idade, e, embora sejam pequenas e leves, os pais e
pediatras devem estar sempre atentos a estas medidas. Enquanto criança, não é reco­
mendado que elas sejam forçadas a comer mais do que estão acostumadas, Quando
adolescentes, na fase do estirão, ficam muito magras e estão mais receptivas a conse­
lhos nutricionais (Bryant-Waugh, 2003).

6.1.6. Recusa pervasiva


De acordo com Lask (2000) a recusa pervasiva representa um pequeno grupo
de crianças que apresentam um risco potencial de morte manifestado por uma profun­
da e pervasiva recusa a comer, beber, andar, falar e de se cuidar, por um período de
meses. Essas crianças têm baixo peso e freqüentemente desidratação e são confundi­
das com casos de anorexia nervosa. Contudo, esses casos parecem ser mais comple­
xos, com mais sintomas e resistência a tratamentos. Sugere-se que este seja um
quadro^extremo de estresse pós-traumático.

6.1.7. Perda de apetite decorrente de depressão


A criança com perda de peso decorrente de depressão não apresenta um
transtorno alimentar, mas muitas vezes seu quadro é confundido com anorexia nervosa
devido à perda de peso e redução da ingesta alimentar. Contudo, nesses casos a
alimentação deficitária não é ocasionada pelo medo de engordar e preocupações com
peso e corpo (Netemeyer, Williamson, 2001).

116 Talita Lopes Marques, Denise Cerqueira Leite Heller


6.1.8. Compulsão alimentar
Segundo Tanofsky-Kraff et al. (2008) um episódio de compulsão alimentar é
descrito por ingestão descontrolada de uma quantidade de alimentos fora do normal,
durante um curto espaço de tempo. Contudo, quando se trata de crianças, preocupa-se
mais com a questão do descontrole do que com a quantidade de alimentos, pois ainda
não se tem parâmetros claros do que seria uma quantidade de alimentos fora do normal
para uma pessoa que está em fase de crescimento (Morgan, Fontes, Moraes, 2006).
Episódios de hiperfagia parecem ser comuns em crianças de 6 a 12 anos (Kraff
et al., 2008) e são mais corriqueiros em crianças com sobrepeso / obesidade, entretan­
to, a maioria dessas crianças não preenchem todos os critérios do DSM-IV para Trans­
torno de Compulsão Alimentar Periódica. Elas tendem a ser mais ansiosas, apresen­
tam mais sintomas depressivos, baixa auto-estima e maior insatisfação com o corpo,
muito pela questão do preconceito e buílying que sofrem de seus pares. Esses episó­
dios também são encontrados em casos de bulimia nervosa e anorexia do tipo purga­
tivo, mas com o diferencial de haver a purgação após o episódio, com vistas a não
engordar com o que foi ingerido (Morgan, Fontes, Moraes, 2006).

6.2. Transtornos alimentares de ínícío precoce


De acordo com Robb (2001) os transtornos alimentares de inicio precoce
(anorexia e bulimia) têm sido sistematicamente ignorados. Apesar de pacientes com
anorexia e bulimia tomarem-se sintomáticos na infância ou adolescência, eles geral­
mente só recebem tratamento na vida adulta. A autora afirma ainda que a anorexia é a
terceira doença crónica mais comum em adolescentes mais velhas.

6.2.1. Formação da imagem corporal


A partir dos 2 anos as crianças começam a reconhecer sua imagem refletida no
espelho, essa imagem passa a expressar a sua identidade e começam a pensar sobre
como os outros a vêem. Por volta dos 4, 5 anos, à medida que as crianças vão aprenden­
do com a sociedade conceitos como “atraente”, "belo", ou seja, como o corpo deveria ser,
aprendem a distinguir o que “não é atraente”, “feio”, ou seja, como o corpo não deve ser.
Dessa maneira, passam a julgar sua própria aparência conforme os modelos aprendi­
dos e, o resultado disso afeta os sentimentos de autovalor (Castilho, 2001).
Crianças escolares conseguem perceber se estão acima do peso e o porquê
de se sentirem mal com isto. Esse sentimento é corroborado pelas mensagens trans­
mitidas pelos seus pares quanto à aceitação dessa criança pela sua forma corporal,
podendo haver preconceito, brincadeiras maldosas, apelidos e buílying. Em estudo
realizado por Collins (1991), foi apresentado à crianças de 6 e 7 anos um instrumento
contendo figuras de crianças desde extremamente magra até obesa, e com os resulta­
dos o autor pode concluir que, para as meninas nessa idade, o ideal de beleza, que é
representado pela magreza, já está presente (Pine, 2001).
Se pensarmos nos brinquedos infantis que se aproximam do formato corporal
humano, os bonecos masculinos são, em sua maioria, senão 100%, fortes e musculo­
sos, e as bonecas femininas são, em sua maioria, senão 100%, extremamente ma­
gras. Por exemplo: a Barbie é modelo de corpo inatingível para qualquer ser humano e,
caso alguma mulher atingisse suas medidas, seria no mínimo estéril. O Max Steel
apresenta medidas que só poderiam ser conquistadas com o uso de anabolizantes

Sobre Comportamento e Cognição 117


(Pope et al., 2000). E. infelizm ente, esses são apenas alguns dos padrões de beteza
d isponíveis às crianças.
Os bonecos acabam sendo os prim eiros padrões de beleza com os quais a
criança convivo e se com para, além de seus pais e família. À m edida que a criança sc
aproxim a da puberdade, ela acaba sendo mais exposta a esses padrões, em especial
as m eninas, e se preocupam m ais com as form as de seu corpo (Pine. 2001). As nove­
las para adolescentes e pré-adolescentes reforçam o padrão de beleza (ex.: Maihação,
Rebeldes), revistas voltadas á esse público fazem o mesmo, inclusive fornecendo infor­
m ações sobre peso e beleza (Ex.: Capricho, Atrevida), as cantoras, atrizes e m odelos
são m agras (ex.: Sandy, Hanna M ontana, Gisele Bunchen). Estudos mostram que m e­
ninas de 8 a 11 anos se com param às m odelos e outros sím b o lo s venerados pela
m ídia e se sentem m al com a com paração (Marques, Hcller, 2003).
Em uma pesquisa realizada por M arques e Heiler (2003) sobro a influência da
m ídia no com portam ento infantil, pcrcebeu-se que as m eninas de 8 a 12 anos tinham
m odelos de beleza bem estabolecido (Sandy, Carla Perez, Feiticeira), consumiam m ui­
tos produtos cosm éticos (crem es, esm altes, m aquiagens, perfum es), pediam para os
pais com prar roupas de m arcas para ficarem parecidas com se u s ídolos, preferiam
program as voltados aos adolescentes (M aihação, Sandy & Jr) do que desenhos infantis
e costum avam brincar com roupas e m aquiagens das mães. A pressão que a m idia
im põe para a adequação aos padrões de beleza ficou evidente quando questionadas
quanto a parte do corpo que m enos gostavam (barriga, pernas, cabelos) e quanto a
profissão que gostariam de seguir (m odelo, cantor e atriz). Os pais responderam um
questionário quanto à influência da m ídia no com portam ento de sua filha. A m aioria
deles acreditava que a mídia realm ente influenciava o com portam ento da filha no que
se refere aos m od e lo s se guidos, co n su m o de produtos que e stim u la m a vaidade,
desses, quase 100% acreditavam que essa influência é positiva.
Assim, é possível com preender o papel da sociedade, da m ídia e da fam ília no
desenvolvim ento de um a im agem corporal negativa, baixa auto-estim a, construção de
um sistema de crenças disfuncíonais e predisposição aos transtornos alim entares aos
quais as crianças estão expostas.

6.2.2. Diagnóstico
Não há um a classificação diagnostica fechada para anorexia e bulirnia de inicio
precoce, em bora a apresentação clínica seja parecida com a ocorrência em adolescen­
tes e adultos (Bryant-W augh, 2003). Para se diagnosticar a anorexia, deve-se levar em
consideração a recusa voluntária em se alim entar de form a saudável com o objetivo de
p erder peso e evitar o ganho de peso; perda de peso ou a ausência de ganho de peso
com prejuízo ao crescim ento e desenvolvim ento puberal (atentando para a curva de
crescim ento e o percentil do IMC para crianças); prática de exercícios físicos em exces­
so; vôm ito auto-induzido; uso a busivo de laxantes e d iu ré tico s e considerar-se com
sobrepeso quando na verdade está abaixo do peso (Lask, 2000). Crianças anoréxicas
costum am ter um vasto conhecim ento sobre as calorias dos alim entos, bem com o a
quantidade de calorias que ingerem ; apresentam uma preocupação m órbida com peso
e corpo, podendo essa ser retratadas de form a mais concreta com o dor abdom inai,
sensação de em paebam ento, náuseas, perda de apetite e d ificu ld a d e de d eglutição
(B ryant-W augh, 2003). E sses relato s podem ser utilizados ta m b é m com o desculpa
para a recusa em se alim entar. Em m eninos é mais comum haver uma preocupação
com o form ato corporal, estar em form a - forte, do que com a intenção de emagrecer.

Talita Lopes Marques, Denise Cerqueira Leite H eller


É comum a criança com anorexia apresentar baixa auto-estim a, co m p o rta m e n ­
tos obsessivo-com plusivos, busca por controle, dificuldade na form ação da identidade
e na conquista da independência (Gowers, 2005), ansiedade e depressão. Além disso,
costum am ser perfeccionistas, trab a lh a d o ra s, a g ra d á ve is e d e scrita s co m o "cria n ça
que não causa problem as”, antes do aparecim ento do transtorno (Lask, 2000).
Para o diagnóstico da bulim ia deve-se considerar: episódios de su p e ralim en-
taçao (binge eating) caracterizados pela falta de controle, seguidos de m edidas co m ­
pensatórias (exercidos fisicos em excesso, jejum , vómito); preocupação m órbida com
peso e corpo: uso abusivo de diuréticos e laxantes; com portam entos auto-lesivos com o
queimar-se. cortar-se, usar álcool e drogas estar com o peso dentro do esperado para
a faixa etária e altura (Bryant-W augh. 2003) A bulim ia è mais comum entre m eninas do
que em m eninos e na infância parece ser m ais rara que a anorexia, pois refatos de
centros de tratam ento de transtornos alim entares indicam baixa procura por tratam ento
desses casos, embora jovens adultos que sofrem com a bulimia relatem a ocorrência
de sintom as desde o início da adolescência (Lask. 2000).

6.2.3. A fam ília das crianças com transtornos alim entares de início precoce
A cre d ita -se que a fa m ilia tenha uma p a rticip a çã o im portante no d e s e n v o lv i­
m ento e m anutenção dos d istú rb io s de im agem co rp o ra l e tran sto rno s a lim e n ta re s.
Nas fa m ília s de portadores d e ssa s patologias, percebe-se que o seu fu n cio na m e n to
apresenta problem as nas áreas de com unicação, relacionam ento do casal, co m p o rta ­
m ento alim entar (que é disfuncional), crenças e atitudes (alim entares in a d equadas e
que são passadas aos fiihos direta ou indiretam ente). Parece que a fam ília de pessoas
com bulim ia tende a apresentar m ais caos, hostilidade, isolam ento, falta de em patia,
instabilidade emocional, ansiedade, com pulsividade e critica. Já as fam ílias de pe sso ­
as com anorexia tendem a ser mais rígidas, superprotetoras e co-dependentes. Além
disso, é comum que as mães que estejam envolvidas com dietas tenham filhas que se
preocupem com peso, dietas e sentim entos de m enos-valia. Filhas b u üm icas m uitas
vezes têm m ães que fazem dietas restritivas e que encorajam suas ftlhas “acim a do
peso” a fazerem dietas e exercícios (Lask, Bryant-W augh, 2003).

7. Conclusão
Robb (2001) afirma que a anorexia é a terceira doença crónica m ais com um em
a d o le s c e n te s m ais velhas. E ste fa to co n firm a a d ificu ld a d e de se d ia g n o s tic a r ta is
transtornos e a necessidade de investigá-los para desenvolver estratégias de p re ve n ­
ção prim ária, bem com o diagnóstico correto que leve em consideração as etapas de
desenvolvim ento físico e em ocional e tratam ento eficaz.
É fundam ental que profissionais da saúde saibam diferenciar o que são co m ­
portam entos alim entares típicos da infância dos com portam entos alim entares que p o ­
dem e sta r retratando algo m ais sério com o um tra n sto rn o alim entar. O d ia g n ó stico
correto e precoce é de extrem a im portância para evitar prejuízos à saúde física e e m o ci­
onal da criança bem com o para que o prognóstico de sua doença seja m ais positivo.
Além disso, é im portante que principalm ente os psicólogos façam pesquisas
nesta área relacionando os sintom as dos transtornos alim entares com a pressão so ci­
al para um padrão de beleza estabelecido e que é inatingível, e para o im pacto que a
m udança de estrutura fa m ilia r que tem acontecido de poucas décadas para cá pode
causar na vida de um ser hum ano que está em form ação, com o é o caso das crianças.

Sobre Comportamento e Cognição 119


É necessário que se com preenda com o o desenvolvim ento da criança pode se
transform ar em um quadro patológico e de difícil tratamento, com o é o caso da anorexia
e da bulimia, para que m edidas prevontivas possam ser tom adas a fim de que estes
transtornos não se tom em uma "epidem ia” , com o alguns autores prevêem .

R eferên c ias

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Talita Lopes Marques, Denise Cerqueira Leite H eller


Capítulo 10
Comportamento governado por regras e
resistência às mudanças:
um estudo de caso*

M árcia P. S. B atista
Universidddo Católica de Ç oiás
M ichela R odrigues Ribeiro
Universidade Católica dc Cyoiás

De a co rd o com S kin n e r (1974) to d o co m p o rta m e n to operante é, em ú ltim a


in stâ n cia , m od e la d o p e la s suas co n se q ü ê n cia s a m b ie n ta is. E ntretanto, q u a n d o se
diferencia com portam ento m odelado pelas contingências e com portam ento g overnado
por re g ra s (e/ou a u to-re gra s) é im p orta n te re ssa lta r a origem de seus co n tro le s. O
prim eiro é controlado pelas suas conseqüências im ediatas, ocorrendo na ausência de
instruções; o segundo é controlado por antecedentes verbais que descrevem co n tin ­
gências (B aum , 2006; Catania, 1999; Zettle, 1990). O com portam ento m od e la d o por
contingências ocorre quando a pessoa se com porta de certa maneira porque seu c o m ­
p o rta m e nto entrou em c o n tato com co n se q ü ê n cia s d ife re n cia is no p a ssa do (M atos,
2001). O com portam ento governado por regras pode ser considerado com o o co m p o r­
tam ento sob o controle de estím ulos verbais que descrevem contingências. Já o co m ­
p o rta m e nto co n trolado por regras o co rre q u a nd o descrições d c co n tin gê n cia s fe ita s
pelos o u tro s (e algum as vezes pelo in d ivíduo que se com porta) passam a e x e rc e r
controle sobre o com portam ento do próprio indivíduo (Jonas, 2001). 1 *6 -5 3 8
R e g ra s (in s tru ç õ e s , c o n s e lh o s , s u g e s tõ e s , le is, d o u trin a s) são e s tím u lo s
discrim inativos verbais que ocorrem em um contexto envolvendo com portam ento verbal
do fa la n te (que em ite a regra) e do ouvinte (que seguirá ou não a regra). As regras são
produtos da interação social, produzidas através de contingências m ediadas pela c o ­
m unidade verbal (Baum, 2006; M atos, 2001; S chm idt & Souza, 2003; Zettle, 1990).
Se to d o co m p o rta m e n to é m od e la d o p elas co n tingências a m b ie n ta is, então
por que regras controlam o com portam ento? Regras são úteis e im portantes para a
so b re vivê n cia das espécies, com o tam bém da cultura. Perm item que o in d ivíd u o de
com porte de form a mais eficaz ou aprenda mais rapidam ente. São em pregadas quan-

' Art>go desenvolvido como requisito pardal para a obtenção do grau de psicólogo. O estágio foi realiza Ju pela primeira autora, sob
sjpervisã o da seg unda autora.

Sobre Comportamento e C ognifão 121


do as contingências naturais não tem muita expressão, pouca m agnitude ou as conse­
qüências vão acontecer a longo prazo (Abreu-R odrigues & Sanabio, 2004; Baldwin &
Baldwin, 1996; Jonas, 2001; Skinner, 1974). Um exemplo de com portam ento com co n ­
seqüência a longo prazo é o com portam ento de poupar dinheiro todo mês, que é pouco
reforçado de form a im ediata, mas quo há regras que indicam que as conseqüências,
por exemplo, com prar sua casa própria, seria possível a longo prazo. Uma outra situa­
ção em que as regras são necessárias seria quando as contingências naturais produ­
zem co m p o rta m e n to s in d e se já veis refo rça d os im ediatam ente com o, p o r e xem plo, o
co nsum o de drogas, em que a socie d a de im põe regras lim ita n d o o seu uso. Aiém
disso, regras podem contribuir para m inim izar os efeitos aversívos de contingências
naturais como, por exem plo, prevenir uma doença, ao seguir o conselho de tom ar uma
vacina (Matos, 2001).
Para Hayes (1988) o com portam ento governado por regras pode ser cla ssifica ­
do em três tipos: aquiescência, rastrearnento e aumentador. A quiescência se refere à
obediência da regra, que depende de contingências sociais. Veja o caso de um pai que
dita uma regra para que o filho chegue cm casa até m eia-noite; ao seguir a regra, o
com portam ento do filho é reforçado pelo pai (figura de autoridade) por seguir a regra e
não porque o chegar m ais cedo em casa im plique em ter m ais tem po para descansar.
O com portam ento de rastrearnento ó aquele cuja ocorrência d epende da co rre sp o n ­
dência entre a regra e os eventos am bientais. Q uando um a pessoa está via ja n d o e
segue o trajeto das rodovias até o destino final por interm édio de um m apa rodoviário, o
controle aqui é a própria regra, por meio de pistas para a realização da ação. Já o term o
aum entador é uma regra que funciona com o operação estabelecedora, aum entando a
efetividade de alguns reforçadores. Por exemplo, quando um prom otor em um super­
m ercado oferece um produto para os clientes sugerindo que ele é de alta qualidade,
isso pode tornar mais provável a compra desse produto (Catania, 1999; Hayes, 1988;
Matos, 2001; Meyer, 2005).
As regras facilitam a aquisição de novos repertórios com portam entais, porém ,
podem induzir um a redução da sen sib ilid a d e às contingências, im pedindo o contato
com o am biente de form a efetiva. Esse efeito pode ocorrer de form a generalizada e com
longa duração. O co m p o rta m e n to sensíveí é aquele que m uda dia n te de m udanças
am bientais. Q uando as contingências se alteram e o com portam ento não acom panha
ta is a lte ra çõ e s d iz-se q u e o co m p o rta m e n to é insensível às co n tin g ê n cia s (A b re u -
Rodrigues & Sanabio, 2004; Hayes, 1988; Matos, 2001; Meyer, 2005).
Nesse contexto, a pesquisa básica tem dem onstrado que instruções podem
provocar insensibilidade com portam ental às contingências, entretanto, tal característi­
ca não deve ser atribuída som ente ao controle instrucional. Há alguns aspectos que
interferem na sensibilidade com portam ental: (a) contingências que perm item o contato
com a d iscre p â n cia e n tre in s tru ç ã o e co n tin g ê n cia atual (e .g ., A b re u -R o d rig u e s &
Sanabio, 2004; Galízio, 1979); (b) o conteúdo das instruções (e.g., Raia, Shillingford,
Mifer & Baier, 2000; Danforth, Chase, Dolan & Joyce, 1990, citados por Meyer, 2005); (c)
a possibilidade de responder a várias contingências (e.g., Lefrancois, Chase & Joyce,
1988); (d) a de n sid ad e d e refo rço s co n tin ge n te s ao co m p o rta m e n to in stru íd o (e.g.,
Newman, Buffington & Hem m es, 1995, citados por A b re u -R o d rig ue s & Sanabio, 2004):
(e) a história de reforçam ento do com portam ento de seguir instruções (Aló, 2005; Meyer,
2005); e (f) o grau de discrim inabilidade das contingências em vig o r (e.g., M artinez &
Ribes, 1996, citados por Abreu-R odrigues & Sanabio, 2004).
Santos (2005) a firm a que os e stu do s e xp e rim e n tais rea lizad o s na área de
com portam ento g o ve rn a d o por regras concernentes à se n sib ilid a d e co m p o rta m e n ta l

122 Márcia P. 5, Batista, M ichela Rodrigues Ribeiro


sáo aplicados de igual form a aos com portam entos resistentes às rnudanças. S endo
considerada a resposta mais resistente à m udança, quanto menos ela se alterar diante
das m odificações nas condições ambientais. Dizendo de outra form a, o co m p o rta m e n ­
to governado por regras, sendo insensível às contingências, é resistente as m udanças.
Os estudos em situações de pesquisa básica sobre o a feito das re g ra s d e ­
m onstram va riáve is que contribuem na ocorrência da in se n sibilidade às m udanças.
Essa insensibilidade também pode ser vista em situações aplicadas com o, por e xe m ­
plo, no contexto clinico. Kohfenberg e Tsai (2001) argum entam que o com porta m ento-
problem a do cliente, com o no caso da insensibilidade às contingências, pode ocorrer
dentro do am biente terapêutico, e o terapeuta deve estar atento a sua ocorrência. A
relação terapêutica será o principal m ecanism o de m udança utilizado pelo terapeuta.
Tendo em vista que o controle por regras apresenta problem as no repertório do cliente,
é esperado que, na relação terapêutica, o com portam ento seja m ais fre q u e n te m e n te
m odelado pelas contingências da própria relação do que governado por novas regras.
Abreu-R odrigues e S anabio (2004) apontam alguns cuidados que o terapeuta
deve ter ao utilizar regras (conselhos, sugestões, interpretações) no ensino de novas
e stratégias para a m odificação do com portam ento-problem a do cliente. Em p rim e iro
lugar, as instruções e verbalizações do terapeuta devem ser usadas com cautela, pois
podem c o n trib u ir com a red u çã o da se n sib ilid a d e do co m p o rta m e n to do c lie n te às
m udanças nas contingências. Um a m aneira de e vita r tal redução da se n sib ilid a d e é
utilizar de m aneira conjunta as instruções e a m odelagem , corno tam bem p ro m o ve r a
v a ria b ilid a d e com portam ental. D essa m aneira, no ca so de m udanças a m b ie n ta is, o
cliente precisará de novos repertórios de com portam ento para se adequar ao am biente
e o terapeuta poderá oferecer reforçam ento diferencial para tal.
Um outro aspecto abordado é que o terapeuta deve estar atento para o co m p o r­
tam ento-problem a se este for o seguim ento excessivo de regras. A tentativa de e nfraquecê-
lo m ediante controle por regras não será produtivo e poderá fortalecer o seguim ento de
instruções de form a generalizada. Abreu-R odrigues e Sanabio (2004) sugerem que o
terapeuta treine o ciiente a discrim inar entre regras (auto-regras) que devem ou não ser
s e g u id a s .
O terapeuta também pode treinar o cliente para desenvolver o rep e rtó rio de
form ular auto-regras adequadas através da m odelagem de descrições feitas pelo p ró ­
prio cliente que correspondam às contingências que ele está exposto. A s auto-regras
são descrições de contingências form uladas pelo indivíduo a quem a regra se destina
e pode fu n cio n a r com o estím ulo discrim inativo para a resposta do m esm o. E la s são
aprendidas da m esm a forma que as regras e estão sob influência das m esm as variá-
veis, Dessa m aneira, para que o cliente form ule auto-regras de m aneira apropriada o
terapeuta deve indicar a correspondência entre o que o cliente diz e o que ele faz. para
que o d iz e r do clie n te e xe rça a fu n çã o de a u to -re g ra (B eckert, 2 002). S e h o u v e r
reforçam ento para o que o cliente diz e para a correspondência do dizer e o fazer, o fa ze r
poderá a contecer, e a m udança do co m portam ento ocorrerá, não p o r m eio d e m ais
regras, m as m odelando o que se diz acerca do m esm o (Catania, 1999).
G uilhardi (2002) aponta, entretanto, para a possibilidade de o cliente a p re se n ­
tar resistência às mudanças. Nesse sentido, o autor ressalta que o terapeuta deve estar
atento às diferentes histórias de contato com contingências de reforçam ento que p ro d u ­
zem d ife re n te s padrões de com portam ento do cliente. Essa análise perm itirá e n ten d e r
a resistê n cia às m udanças (in sen sib ilida d e às co n tin gê n cia s) buscando as va riá ve is
am bientais das quais ela é função: (a) a punição, que produz reações e m o cio n a is e
d im in u iç ã o da variab ilida d e co m p o rta m e n ta l; (b) o refo rça m e n to negativo, q u e gera

Sobre Comportamento c Cognição 1 2 3


com portam entos de fuga e esquiva; <c) o reforçam ento positivo m uito freqüente, que
interfere na tolerância à frustração e pode possibilitar a ocorrência de extinção de com ­
portam entos m uito facilm ente; (d) o reforçam ento positivo m uito infrequente, que au­
m enta a tolerância à frustração c im pede o engajam ento do cliente em um processo de
m udança com portam ental que altere as condições aversivas sob as quais vive; (e) o
refo rça m e n to positivo não contingente, que dificulta ao cliente e sta be le ce r relações
entre o seu próprio com portam ento e as relações do am biente que o cerca.
Se o com portam ento governado por regras e auto-regras pode ser insensível
às contingências em vários aspectos, então as m udanças a serem trabalhadas com o
cliente, devem ser preferencialm ente m odeladas pelas co n tin gê n cia s. O o b je tivo do
presente trabalho foi apresentar evidências de resistência às m udanças no decorrer de
um processo terapêutico cuja cliente apresentava um repertório com forte presença de
com portam entos governados por regras.

M éto d o
Participante
Participou deste estudo uma pessoa do sexo fem inino (nom e fictício Ana), 21
anos, solteira, ensino m édio com pleto, estu da n te de um curso té cn ico de fa rm á cia ,
desem pregada, participante da religião Testem unha dc Jeová. Ana era a prim ogênita de
três irmãos,
Veio ao CEPSl (Centro de Estudos, Pesquisa e Prática Psicológica - U niversi­
dade Católica de Goiás), trazida pela mãe, apresentando as seguintes queixas: tim idez,
irrita çã o , a n siedade, p essim ism o, baixa a u to -e stim a , brigas co n sta n te s em casa e
d ificu ld a d es de esta be le ce r vínculos interpessoais.

Materiais e Ambiente
As sessões terapêuticas foram realizadas nos consultórios do CEP Sl, e q u ip a ­
dos com uma m esa, três cadeiras, a rm á rio , duas p oltronas, um a m esa de ce n tro ,
tapete, alm ofadas e ilum inação artificial com lâm padas fluorescentes. Tam bém foram
u tilizados caderno, caneta, texto inform ativo (‘'Anorexia", Linhares, Neiva & Buchalla,
2006), gravador MP3 PLAYER RAYS digital.
Para avaliação foram utilizados os seguintes instrum entos: entrevista clínica.
Q uestionário de História Vital (Lazarus, 1980), Inventário de H abilidades Sociais - IHS
(Del Prette & De! Prette, 2003) e folhas de registro de com portam entos-problem a.

Procedimento
O procedim ento utilizado para este trabalho foi o estudo de caso único (n=1),
delineam ento AB, com posto por linha de base, intervenção e avaliação final. Inicialm en­
te foi feito um contato via telefone e m arcado o horário e o dia da sessão. Num prim eiro
m om ento, o atendim ento psicológico foi um a ve z por sem ana, com a dura çã o de 50
m inutos (1a a 11a sessão). Já num segundo m om ento, a partir da 12® sessão, o ate nd i­
m ento passou a ser duas vezes por sem ana. Durante a primeira sessão foi explicado
sobre o m étodo a ser utilizado, bem com o as norm as estabelecidas pelo CEPSl, le va n ­
tam ento das queixas, os objetivos a serem alcançados durante a terapia e orientação
quanto a realização das tarefas de casa d entro da abordagem com portam ental. Para
m elhor com preender a história de vida da Ana, foi aplicado o Q uestionário de História
V ital (Lazarus, 1980), contendo questões abertas, sem i-abertas e fechadas. A partir do

Márcia P, S. Batista, M ichela Rodrigues Ribeiro


desenvolvim ento da terapia, houve identificações de variáveis que fizeram parte do co n ­
texto da cliente tornando possível a análise dos problem as. Assim, diante dos dados
coletados, foi realizada a form ulação com portam ental (Ribeiro, 2001) do repertório de
funcionam ento global da cliente.
O Inventário de Habilidades Sociais - ÍHS (Dei Prette & Del Prette-, 2003) foi
utilizado para verificar a presença ou ausência de habilidades de enfrentam ento, auto-
a firm a ç ã o , d e s e n v o ltu ra s o cia l, a u to -e x p o s iç ã o a p e s s o a s e s itu a ç õ e s n o v a s e
autocontrole da agressividade, visando um plano para o desenvolvim ento de tais h a b i­
lidades. As folhas de registros de com portam entos-problerna foram utilizadas para o
registro da ansiedade para cada um dos com portam entos que seriam alvos da in te r­
venção. Foi inserida tam bém a observação do com portam ento verbal e não-verbal da
cliente em consultório, objetivando estabelecer correspondência entre ambos. De a co r­
do com os dados, reaüzou-se análise funcional com o propósito de observação e d e s­
crição dos estímulos antecedentes e conseqüentes, para a posterior intervenção.
A intervenção foi fundam entada na linha de base e nos objetivos apresentados
por Ana. Foram utilizadas técnicas com portam entais para a aquisição de novos rep e rtó ­
rios de com portam entos. Para tal, foram estabelecidas atividades que envolveram : (1)
preenchim ento de folhas de registro de com portam entos, para que a cliente pudesse
discrim inar o que controlava seus com portam entos; (2) confrontação de idéias, p ro p o r­
cionando uma correspondência entre o com portam ento verbal e não-verbal; (3) ap lica ­
ção de treino respiratório e do relaxam ento progressivo de Jacobson, com a finalidade
de dim inuição da ansiedade; (4) treinam ento de habilidades sociais com base na lista
dos com portam entos relacionados à alta ansiedade d e fin id os pela cliente, tra b a lh a n ­
do-se os m esm os com ensaio com portam ental e treino assertivo; (5) utilização de texto
(sobre a anorexia) para o ensino de repertórios de conversação, expressão de opinião,
contato visual e expressão facial.
Na avaüação final seria realizada a reaplicação do IHS (Del Prette & Del Prette,
2003), visando com parar os resultados obtidos na a va lia çã o com aqueles obtidos na
linha de base. para a verificação quantitativa e qualitativa da evolução da cliente. E n tre ­
tanto, não foi possível reaplicar o IHS em função da interrupção do processo terapêutico
na 133 sessão.

Resultados
Os dados a p re se n ta d os nesta seção re fe re m -se aos resultados do IHS na
linha de base, ã identificação do grau de ansiedade dia n te dos com portam entos-pro-
blem a, à a n á lise fu n cio na ! de co m p o rta m e n to s-p ro b le m a , a u to-re gra s e re g ra s nas
sessões iniciais e finais e aos indícios de resistência â m udança observados no decor­
rer das 13 sessões do processo terapêutico de Ana.
A Figura 1 apresenta os percentis de Ana no IHS (Del Prette & Del Prette, 2003),
para o escore total e para os cinco fatores de avaliação. Este inventário foi a p licado
durante o período de coleta de dados da linha de base. O percentil varia de 0 a 100,
sendo q ue valores próxim os de zero são considerados com o indicação para o tre in a ­
m ento em habilidades sociais e valores próxim os de 100 são considerados com o um
repertório bastante elaborado de habilidades sociais. A á re a som breada na Figura 1
indica a faixa de escores m edianos apropriados em ha b ilid a de s sociais. P ode-se o b ­
servar que Ana apresentou escores iguais (F1) ou abaixo de 10 no escore total e em três
fatores (F2, F3, F4) e apenas no fa to r F5 foi observado escore 50.

Sobre Comportamento e Cognição 125


Figura 1. Resultados do IHS na Linha de Base.

O fator F1 está relacionado a "habilidades de enfrentamento e auto-afirmação


com risco", demonstrando baixa habilidade em defender seus direitos, principalmente
em situações com potencial de reação de rejeição. O fator F2 está relacionado a "habi­
lidades de auto-afirmação na expressão de sentimentos positivos”, demonstrando di­
ficuldades em expressar afeto positivo. O fator F3 corresponde a “habilidades de con­
versação e desenvoltura social', apresentando uma falta de capacidade de lidar com
situações de aproximação com o outro. O fator F4 corresponde as “habilidades de auto-
exposição a desconhecidos e a situações novas", demonstrando uma dificuldade em
se expor a desconhecidos e à situações novas. Somente no fator F5 Ana obteve um
escore dentro da faixa de habilidades sociais apropriadas e tal fator correspondo a
“habilidades de autocontrole da agressividade" em situações aversivas.
Com os dados do IHS, foi possivel estabelecer um programa de intervenção, o
qual priorizou os deficits de habilidades. Dessa maneira, foram selecionados alguns
comportamentos de cada fator que Ana apresentava dificuldades para serem alvos de
intervenção na terapia. Foi construída uma folha de registro com 13 itens na qual Ana
indicou o grau de ansiedade (de 0 a 10) que sentia na presença de cada uma das
situações. Essa indicação se refere a uma aproximação, pois se baseia somente no
relato da cliente. A Figura 2 apresenta o grau de ansiedade relatado para cada um dos
comportamentos na linha de base (barras claras) e na intervenção (barras escuras). O
registro da linha de base foi realizado na sessão 7 e o da intervenção na sessão 12. Os
dados demonstraram que na linha de base Ana relatou ansiedade alta para todos os
comportamentos e que houve uma clara diminuição da ansiedade para comportamen­
tos abordados na intervenção: “lidar com críticas dos pais’’, “cumprimentar desconheci­
dos" e "lidar com críticas justas". Dentre as 13 situações foi observada diminuição da
ansiedade relatada por Ana em 11 delas. Dessa maneira, também foi observada uma

Márcia P. S. Batista, M ichela Rodrigues Ribeiro


diminuição do grau de ansiedade relatado para comportamentos que não foram traba­
lhados na sessão terapêutica, como expressar sentimento positivo, abordar autorida­
de. apresentar-se a outra pessoa, pedir favores a desconhecidos, indicando uma gene
ralização a partir da intervenção tcrapõutica.

Figura 2. Gráu díTànsíedade reTátaíd por Aná pará cada "um 3õs comportamentos.

A diminuição do grau de ansiedade relatado por Ana para seus comportamen­


tos foi corre spo nde nte ao su rg im e n to ou d e se n vo lvim e n to de novos padrões
com porta mentais em seu repertório. No decorrer do processo terapêutico Ana tomou
iniciativas para melhorar a com unicação com seu pai, a partir de conversas sobre
temas que os interessavam. O treinamento de habilidades sociais desenvolvido no
contexto terapêutico repercutiu em aprendizagem de novos padrões também no con­
texto escolar. Ana passou a manter conversações com seus colegas de classe, foi
escolhida para ser representante da turma e iniciou um namoro com um colega de sua
sala.
Ana trazia como uma de suas principais queixas a dificuldade no relaciona­
mento familiar. Na sessão 8 foi solicitado que ela fizesse um registro dos seus compor­
tamentos dentro do contexto familiar, para a realização de análises funcionais. Tais

Sobre Comportamento e Cognição 127


análises, apresentadas no Q uadro 1, tinham a finalidade de investigar o que estava
produzindo os seus com portam entos-problem a, identificando a situação antecedente,
d resposta e a conseqüência.

Ses- Antecedentes Respostas Consequências


sãn . .. . ■

0 Minha mãe brigou Retruquei/raiva/que na Acabei executando as


comigo, pois não fiz verdade ela esiova tarefas determinadas
todas ss tareias de­ cena
signadas por ela

9 Minha mãe falou pro Fiquei pensativa/que Meu pai nos deu um
meu pai que ela está realmente ela estava grande sermão, brigou e
muito cansada e que certa/que nós devemos nos ameaçou se não
eu e meus irmãos cum pir com nossas cumprirmos com as nos-
estamos deixando a obrigações indepen­ sss obrigações
desejar nas tarefas dente se o oulro cum­
pre ou não

10 Fiz todas as tarefas Falei de forma agressi­ Falei pros meus pais, e
que a minha mãe va pra ela fazer, ela eles disseram que da
pediu. Deixei o arroz disse que não ia fazer próxima vez que isso
pra minha irmã fazer, que não estava nem ai acontecesse, ela iria
ela disse que não ia pra que meu pai e fazer o arro 2 ou outra
fazer e não fez. minha mãe iriam dizer; tarefa determinada debai­
Quando minha mãe raiva dela/ ela acha xo de “pancada"
chegou, minha avó que só eu tenho obri­
tinha feito gação de fazer as
coisas porque não
estou trabalhando

Q uadro 1. Exem plos de anállise funcional de com portam entos - problem a de Ana no
contexto familiar.

O bserva-se que o padrão de com portam ento de Ana era a realização das ta re ­
fas de form a incom pleta, gerando desentendim entos fam iiiares, com o brigas, a m e a ­
ças e agressividade. Esse padrão de com portam ento tam bém foi observado nas ses­
sões terapêuticas, sendo que em relação ao cum prim ento das tarefas de casa Ana
deixou de fazer ou as adiou por cerca de sete vezes. A análise funcional tam bém de­
m o n stra a fa lta de h a b ilid a d e d e A na na co m u n ica çã o fa m ilia r, ou seja, fa lta n d o
assertividade, reconhecim ento dos seus erros para com os seus pais, e a form a a g re s­
siva de fa la r com a mãe e a irmã. Da m esm a maneira, foi observada falta de assertividade
e agressividade na relação terapêutica, especialm ente quando eram questionadas as
regras inacuradas (sem correspondência com as contingências reais) que Ana seguia.
F requentem ente Ana evitava fa la r sobre o nam oro, ofe re ce n d o respostas curtas ou
silêncios longos quando questionada sobre o assunto.
Ana apresentou diversas auto-regras em todo o processo terapêutico. Foi ob-
servado que as auto-regras funcionavam com o S° para os seus prováveis com porta­
m entos, tanto dentro com o fora da sessão terapêutica. O Q uadro 2 apresenta algum as
auto-regras em itidas por Ana nas sessões iniciais (1 e 2) e sessões finais (12 e 13) do
p rocesso terapêutico.

Márcia P. í>, Batista, M ichela Rodrigues Ribeiro


Sessões Iniciais Sess õe s Finais

■♦A minha mae briga muito comigo “♦ E u falei que iria namorar ele su depois
que falasse com meus pais
^ S o u tímida, estranha, não dou conta de
encarar as pessoas... ■♦Meu pai é bravo demais

■♦...fico com medo se litco vai c sr certo e -»E u estava com a consciência pesada
não vai.
-♦Foi bom e ao mesmo tempo
■♦Sou muito fechada
-♦N ão deveria ter aceitado
“í , .não tenho confiança própria.
■♦Poderia ser born.
■♦Sou muito pessimisla.
-♦N ão tem jeito.
■♦Acho que não vou dar conta, tenho
medo de encarar as pessoas. ■♦Aí vai ser dificil, que eu náo conheço
ninguém.
■♦Tudo meu pai xinga
-♦A cho dificil.
-♦Meu pai não é amoroso.
■♦Eu converso com quem conversa comi­
■♦Não gosto de fazer nada sob pressão. go, agora quem não conversa, eu nào to
nem aí.
^ S o u complicada, sou timida, tenho dificul­
dades em fazer amizades.. -♦E u tenho medo de perder a religião, de
perder os privilégios.

Quadro 2. Auto-regras de Ana nas sessões iniciais e finais.

Nas sessões iniciais observa-se as auto-regras de Ana funcionando com o S n


p ara s e u s c o m p o r ta m e n to s -p r o b le m a : na re la ç ã o c o m os p a is , n a s re la ç õ e s
interpessoais, não fazer nada sob pressão. Nas sessões finais as co n tin gê n cia s em
vigor m udaram, Ana já havia nam orado (o nam oro durou cerca de 20 dias e terminou
porque ele não era de sua religião), era representante de turm a, estava conversando
mais em saia de aula, podendo-se constatar com isso m udanças correspondentes em
algumas de suas auto-regras (“Foi bom e ao m esm o tem po difícil", "Poderia ser bom",
ambas a respeito do nam oro). Entretanto, ainda ob se rva -se sem elhança em m uitas
auto-regras quando com paradas às sessões iniciais. As auto-regras estavam sob co n ­
trole da ação que os seus pais exerciam sobre ela, com o tam bém de sua religião.
O Q uadro 3 apresenta alguns relatos verbais de Ana, indicando regras o fe re ci­
das pelos pais ou pela religião, ocorridos durante as sessões iniciais (1 e 2) e finais
(12 e 13) do processo te ra p ê u tico . Nas sessões in icia is o b servou-se o se g uim ento
rígido de regras quanto a am izades, constatando em su a s dificuldades a influência de
seus pais e a im posição de regras da igreja nessa área. Nas sessões finais percebe-
se um padrão sem elhante, com regras a respeito de seu nam oro. De acordo com Ana,
seus pais eram m uito agressivos e ela diz ter levado surras até os 18 anos. Na com u­
nicação da fam ília eram m uito freqüentes brigas, am eaças de surras e verbalizações
depreciativas. Ana relatava te r m uito m edo do pai e não te r interações de carinho ou
afeto com ele. Com sua m ãe, q u e trabalhava fo ra e pa ssa va a sem ana in te ira no
trabalho, havia m ais afeto, quando não havia discussões. Uma inform ação im portante

Sobre Comportamento e Cognição 129


é que os pais freqüentavam a igreja na época do nam oro e "eles foram desassociados
porque com eteram fornicação' e a m ãe engravidou de Ana.
Tendo em vista os dados apresentados, pode-se ve rificar que as m udanças
o bservadas nos com portam entos de Ana dura n te o p rocesso te ra p ê u tico foram : (a)
dim inuição da ansiedade relatada em 11 de 13 situações onde seus com portam entos-
problem a ocorriam e (b) desenvolvim ento em habilidades sociais, com o tornar-se re­
presentante de turm a, m anter conversação com os seus colegas de sala e com os país,
e também nam orar. As m udanças definidas com o objetivos terapêuticos que não ocor­
reram foram : (a) houve m anutenção das a u to-regras so b re co n sid e ra r difícil agir de
outra form a, de se sentir incapaz e (b) m anutenção de seu padrão de com portam ento de
não com pletar as tarefas que realizava m esm o quando havia se comprometido, sendo
que as in te ra ç õ e s d e s te s dois p a d rõ e s cu lm in a ra m na d e s is tê n c ia do p ro ce sso
terapêutico. Tais padrões com portam entais se configuram com o indicadores de resis­
tência à m udança. Além desses, outros indicadores que poderiam ser apontados fo ­
ram: (a) faltas freqüentes (em 5 m eses de terapia houve sete faltas), sendo que a lg u ­
mas vezes não houve nenhum aviso prévio; (b) fuga/esquiva ao falar sobre assuntos
que im plicavam em reflexão sobre seus padrões com portam entais (namoro, am izade,
religião, regras, aparência física), o fe re ce n d o respostas m on o ssilá b ica s ou dizendo
“ Não quero fa la r sobre isso!" e (c) na últim a sessão, Ana disse “você parece minha mãe
falando” quando a terapeuta-estagiária discutia sobre seu padrão de considerar q u a l­
quer m udança m uito dificil.

Discussão
De acordo com Del Protte e Del Prette (2005) as falhas na aprendizagem de
c o m p o rta m e n to s sociais adequados estão direta m e n te relacion a d a s a um am biente
punitivo: os pais quando agressivos se tornam m odelos in a d e qu a d o s de co m p o rta ­
mentos sociais. Ana procurou a terapia por dificuldades na área interpessoal dentro do
contexto fam iliar e em outros contextos, com o a escola e a igreja, apresentando uma
baixa freqüência de habilidades sociais, que repercutiram em alta ansiedade, prejuízo
nas relações fam iliares e dificuldades em fazer amizades.
Através dos relatos e da análise funcional dos com portam entos de Ana dentro do
contexto familiar, foi possivel constatar que esse am biente era pobre em estimulação. Os
seus pais eram m uito agressivos:"... brigou e nos am eaçou ... iria fazer a tarefa debaixo de
pancada ...” (com o dem onstra Quadro 1) além da cliente relatar que levou surras até os 18
anos. As interações familiares eram escassas e quando ocorriam frequentem ente havia
brigas, am eaças de surras, e verbalizações depreciativas, com o ‘:a minha mãe diz que eu
sou lerda, sonsa" ou “minha mãe e meu pai falam que eu tenho a cara muito fechada e as
pessoas não se aproxim am de m im ” (conforme Q uadro 3). Isso pode ter contribuído para
a falta de desenvolvim ento de com portam entos habilidosos de Ana. Com o a cliente apre­
sentava dificuldades em estabelecer vínculos interpessoais de am izades, a terapeuta-
estagiária priorizou o estabelecim ento de um a relação terapêutica que fornecesse um
contato de afeto e acolhimento, o que lhe faltava em seu am biente familiar. Conform e
Kohlenberg e Tsai (2001) argumentam, a relação terapêutica deve ser utilizada como o
principal m ecanism o de m udança nos com portam entos do cliente, perm itindo oferecer
conseqüências diferentes daquelas oferecidas peio am biente natural.
O trabalho terapêutico no treinam ento de habilidades sociais parece ter co n tri­
buído para a aq u isiçã o de novos repertórios de com portam entos. Esta análise se res­
palda nas m ud a n ça s sociais o co rrid a s na vida de A na: to rn o u -se representante de

Márcia P S. Batista, M ichela Rodrigues Ribeiro


turm a, passou a co n ve rsa r com todos os colegas da saia de aula, iniciou nam oro,
com eçou a conversar com o pai (uma do suas dificuldades). O trab a lh o te ra p ê u tico
tam bém contribuiu para a dim inuição da ansiedade em com portam entos subm etidos
na intervenção e em outros com portam entos que não foram diretam ente enfocados,
indicando uma generalização, com o mostra a Figura 2. Q uando a pessoa responde de
uma m aneira sem elhante a estím ulos diferentes, se considera que houve um a g e n e ra ­
lização do com portam ento para outras situações (W haley & Malott, 1980). Tal g e n era li­
zação pode ter ocorrido por dois fatores: por ter surgido uma oportunidade de ocorrência
de um com portam ento novo e porque Ana havia sido bem -sucedida e, portanto, seus
com portam entos haviam sido reforçados em outras situações de com portam ento h a b i­
lidoso socialm ente (C aballo, 2002, 2006; Guilhardi. 2002).
É importante ressaltar que os com portam entos de Ana estavam sob um forte
controle por regras. Isto a im pedia de entrar em contato com conseqüências naturais de
seus com portam entos (G uilhardi, 2002). Seu padrão com portam ental poderia ser co n ­
siderado insensível às contingências em diversas situações. Conform e M artinez e Ribes
(1996, citados por A breu-R odrigues & Sanabio, 2004) o com portam ento controlado por
regras pode ser insensível às contingências quando ha um a história de reforços so ci­
ais para o seu seguim ento. Com o os com portam entos da Ana dificilm ente eram refo r­
ç a d o s n a tu ra lm e n te , p o is h a v ia um g ra n d e d é fic it de h a b ilid a d e s nas re la ç õ e s
interpessoais, a m aneira alternativa de obtenção de reforços sociais ocorria por se g u i­
m ento rígido de regras da fam ília e da sua religião. Dessa m aneira, Ana apresentava
com freqüência o com portam ento aquicscente (Hayes, 1988) que se refere à o b e d iê n ­
cia de regras que dependem de contingências sociais. Tanto a fam ília quanto a igreja
serviam com o fonte de refo rça m o n to positivo para o se g uim ento de regras e com o
reforçam ento negativo para a esquiva de situações nas quais as regras poderiam ser
descum pridas, A religião (Testem unha de Jeová) tin h a grande a p ro va çã o dos seus
pais, da sua avó e dos seus irm ãos. Os pais da Ana foram e xclu íd os da igreja ao
engravidarem quando ainda eram namorados. A pesar do banimento, seus pais co n si­
deravam que os preceitos da igreja deveriam ser seguidos e exigiam isso dos filhos.
Sua avó incentivava os netos a freqüentarem a igreja acom panhando-os, entre ta n to
som ente Ana e a avó eram freqüentes. Para os pais de Ana ela era a possibilidade de
realização de suas asp ira çõ e s religiosas.
As regras da igreja eram rígidas quanto a am izades e nam oros, sendo que os
praticantes só poderiam se relacionar com outros m em bros da própria igreja, e a fa m í­
lia da A na reforçava qualquer com portam ento que seguisse esses preceitos (por exem ­
plo, enfatizando que por causa da reiigião eta não poderia namorar) com o d e m o n stra ­
dos no Q uadro 3. A despeito disso, Ana iniciou um nam oro no qual o rapaz não era da
igreja som ente após a aprovação de seus pais. Entretanto, houve questionam entos por
parte da fam ília sobre a religião dele. Com o Ana já tinha o conhecim ento de um a história
de punição da fam ília, com o o exem plo dos seus pais no passado que foram excluídos
da igreja, o seu m edo era que acontecesse o m esm o com ela. Esse m edo foi indicado
pelas auto-regras (“m edo de perder a religião, de perder os privilégios” ) conform e d e ­
m onstra o Q uadro 2. A na tentou convencer o rapaz a entrar para sua igreja e e le não
aceitou. A situação tornou-se bastante aversiva e Ana term inou o nam oro se esquivando
da aversividade das possíveis conseqüências d itadas pelas regras fam iliares, relig io ­
sas, au to-re gra s e fu g in d o das co n se qü ê n cia s na tura is do seu co m p o rta m e n to . R e ­
gras e auto-regras controladas p o r reforçam ento negativo, oferecem oportunidade para
a o co rrência de com portam entos de fuga e esquiva (G uilhardi, 2002). Tais co m p o rta ­
m entos são pouco sensíveis às m udanças porque não entram em contato com conse-

Sobrc Comportamento e Coçnição


qüéncias na tura is reforçadoras. D e s s a m aneira, e s s e re p e rtó rio de com p o rta m e n to
não se a m plia p o rq u e a pessoa e sq u iva -se para não so fre r qualquer conseqüência
social aversiva, conform e descrito por suas auto-regras.
Os dados encontrados por G alízio (1979) em laboratório indicaram que foi ne­
cessário o co n tato com a d iscrepância entre instruções e co n tin gê n cia atual para a
elim inação do co n tro le por regras. C onsiderando que esse fenôm eno também se apli­
ca ao contexto clínico, esse contato com a discrepância da regra não aconteceu no caso
de Ana. Em bora tenha sido exposta ás contingências e seus com portam entos tenham
entrado em contato com conseqüências reforçadoras positivas do namoro, esse contato
não foi suficiente para elim inar o controle por regras. Seus com portam entos perm ane­
ceram sendo m antidos por reforçamento social (fam iliar e religioso) e por reforçam ento
negativo, configurando-se como um exem plo de insensibilidade às contingências (Abreu-
Rodrigues & Sanabio, 2004; Catania, 1999; Guilhardi, 2002, Hayes, 1988; Matos, 2001;
Meyer. 2005) e, conform e Santos (2005) resistente ás m udanças. Essa resistência de
Ana ficou evidente a partir de com portam entos de esquiva que ocorreram dentro da
sessão te ra p ê u tica , tais como, não fa la r sobre o nam oro, resp o sta s curtas quando
questionada sobre esse assunto ou silê n cio s longos após algum as perguntas. Além
disso, o grande núm ero de faltas ás se ssõ e s, a p ro cra stin a çã o em realizar tarefas
solicitadas pela terapeuta-estagiária e a com paração desta com a mãe de Ana também
foram indicadores dessa resistência. Esse últim o fator perm ite a suposição de que o
processo terapêutico funcionou com o estim ulo aversivo para Ana. Grande parte do re­
pertório de Ana estava sob controle aversivo (reforçam ento negativo ou punição) dentro
da fam ília. A p e sa r dela afirm ar que sua m ãe era mais am orosa que seu pai, tanto o
Q uadro ? quanto o Q uadro 3 dem onstram vários exem plos de acusações, brigas ou
depreciações da fam ília. Dessa m aneira, ao com parar a te ra p e u ta -e sta g iá ria com a
sua mãe, Ana pode ter oferecido um sinal da aversividade do contexto terapêutico. Essa
hipótese, entretanto, não pode ser confirm ada porque Ana desistiu do tratam ento após
essa sessão.
A bre u -R o d rig ue s e Sanabio (2004) indicam que, para trabalhar com clientes
que apresentam seguim ento excessivo de regras, o terapeuta deve (a) evitar o uso de
regras e trabalhar com modelagem, (b) estim ular o desenvolvim ento de um repertório
de auto-regras acuradas e (c) estim ular a discrim inação de regras e auto-regras que
podem ou não se r seguidas. Durante o p ro ce sso te ra p ê u tico a te ra p e u ta -e sta g iá ria
envidou esforços para seguir essas e outras regras que fazem parte da práxis da te ra ­
pia. Contudo, foi interessante notar que houve a interação de duas pessoas com co m ­
portam entos controlados por regras, um a p o r sua história de aprendizagem e outra por
estar em treinam ento e ser uma terapeuta iniciante.
Apesar d o s progressos de Ana nos relacionam entos interpessoais, com o re­
sultado do processo terapêutico, o seu padrão de com portam ento de fuga e esquiva
ainda ocorria em alta freqüência. Tal p a d rã o dificultou o co n ta to com e o e feito de
reforçadores naturais em vigor, culm inando no abandono da terapia na sessão 13.
E sse e s tu d o b u s c o u a c o m p re e n s ã o de q u e o s e g u im e n to de re g ra s
in d iscrim in a d a m e n te pode a ssu m ir um c a rá te r n e gativo, im p e d in d o as pessoas de
entrarem em contato com os reforçadores disponíveis no am biente natural, por apre­
sentarem resistências às m udanças nas contingências. O trabalho terapêutico na cons­
trução de novos repertórios com portam entais em habilidades sociais foi parcialm ente
efetivo, pois produziu dim inuição da ansiedade em determ inados contextos e desenvol­
veu com portam entos novos que ainda não haviam sido observados no repertório de
Ana. Todavia, foi observado que o com portam ento governado por regras quando insen-

M árcia P, S. Batista, M ichela Rodrigues Ribeiro


SiVei ás contingências pode in te rfe rir no desenvolvim ento de novos com portam entos o
que o controle aversivo presente nesse caso contribuiu para a resistência a m udança c
para a fuga do processo terapêutico.

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134 Marcia P, S. Batista, M ichela Rodrigues Ribeiro


Capítulo 11
Do comportamento sexual à disfunção
sexual: um estudo de caso

Robertt C a rd o so d e Sousa*
Q ina N o lê to B u en o **
W m vcrsidddc C atólica de Q oiás

Skínner (1953/2003) define com portam ento com o uma ação. Para isto é n e ­
cessário que o organism o interaja com o am biente, sendo esta ação d e p endente de
variáveis externas. Nesta visão, C atania (1998/1999) pontua que co m p o rta m e n to e n ­
volve todo m ovim ento realizado pelo organism o (respirar, pensar, falar, andar, etc.).
Assim, todo o m ovim ento observável ou m ensurável realizado por um ser vivo, in clu in ­
do m ovim entos externos e internos, bem como as secreções glandulares e seus fe i­
tos, é com portam ento (Reese, 1966/1973).
Ao se fa la r e xclu siva m e n te sobre co m p o rta m e n to sexual é im p o rta n te fic a r
claro que este term o está relacionado a uma resposta vital do organism o, d iscrim inada
como especifica da espécie. É tam bóm característica do ser enquanto d otado de rep e r­
tório com portam ental, construtor de sua história, que se relaciona com algum tipo de
prática sexual selecionada no seu am biento cultural (Baptistussi, 2003).
Kaplan (1974/1977) salienta que o com portam ento sexual do indivíduo é resul­
tado de forças originadas da experiência e de reações biológicas. Enfatiza que a re s­
posta sexual do ser hum ano é um a sucessão profundam ente racional e orde n a d a de
processos fisiológicos. Nesse sentido, para que a relação sexual seja realizada com
sucesso é necessário que haja transform ações consideráveis nos órgãos g enitais de
cada parceiro, na form a e função, diferentes do seu estado normal. V isto que a excita ­
ção sexual desencadeia rea çõ e s neurológicas, va scu la re s, m usculares e horm onais
que atingem , com algum a profundidade, o desenvolvim ento de todo o corpo.
Segundo Cavalcanti e C avalcanti (2006), o com portam ento sexual é transacional.
Seu fu n cio na m e n to adequado é ao m esm o tem po pessoal e interpessoal. P o is todo
ato sexual gera no com panheiro um a conseqüência que pode ser agradável ou não, a
qual irá pro d u zir a adequação ou inadequação. C onsiderando que o indivíduo que se
com porta sexualm ente realiza tanto um ato de necessidade fisiológica e psicológica,
com o tam bém um a ação social que irá eliciar m udança no seu am biente de vivência.
* Psicólogo Analista do Comportamento. E-rnail; p$iruberU@gi‘nail.oom
** Mestra em Psicologia Professora do Departamento de Psicologia e óc Programa íle Pós-Graduação fim Psicologia Lato Sensu da
Universidade Católica de Goiás, membro do N údoode Pesquisa Aplicada em Intervenções ClínicaseComunitárias-NUPAICC. E-msil.
girtíbuer>o^£i@hottnâíl oorn

Sobre Comportamento e Cognição 135


Os autores salientam ainda que a se xualidade deve ser analisada sob très aspectos
fundam entais: biológico, sociocultural e psicológico. Sendo o com portam ento sexual o
resultado da aprendizagem que o indivíduo obtém no seu am biente. Uma vez que es­
ses co m p o rta m e n to s são a p re n d id o s, eles serão m an tid o s em sua a d e q u a ç ã o ou
inadequação através do m ecanism o de reforçamento.
Para B aptistussi (2003), o estu do do co m portam ento se xu a l requer a n á lise
sobre as co n tin gê n cia s nas quais ele está operando, ou se ja , in ve stig a r a relaçã o
fu n c io n a l e n tre a re s p o s ta a n a lis a d a e as v a riá v e is a m b ie n ta is , p o is na v is ã o
com portam entalista o contexto am biental em que está inserido o individuo pode d e se n ­
cadear o com portam ento sexuat indesejado.

C om portam ento Sexual Disfuncional


Hawton (1989/1997) salienta que uma das definições objetivas da Disfunção
Sexual é a redução consistente dos padrões normais de desejos ou relacionam entos
sexuais. Podendo s e r um a in te rru p çã o total ou parcial na resp o sta p sico fisio ló g ica
(Cavalcanti & Cavalcanti, 2006).
Na descrição do DSM -IV-TR (APA. 2000/2003), as disfunções sexuais evídenci-
am -se por desconfortos no desejo sexual e alterações fisio p sico ló g ica s que com pro­
vam o ciclo da resposta sexual, desencadeando so frim ento a ce n tu a d o e dificuldade
in te rp e sso a l.
O conceito disfuncional pode levantar dúvidas acerca da propriedade funcional
da resposta apresentada, mas é im portante deixar claro que em se falando do resposta
disfuncional o contexto e a função não estão ficando de fora, pois a d isfunção está
relacionada com as conseqüências aversivas produzidas pelas respostas que o indiví­
duo dá ás experiências. Desta form a, evidencia-se que o com portam ento sexual natural
terá pouca p o ssibilidade de ocorrer descontextuatizado do seu am biente. Com isto,
percebe-se que um com p o rta m e n to d isfu n cio na l tam bém a co n te ce em um contexto
am biental e produz conseqüências que serão reforçadoras ou não (Baptistussi, 2003).
Staats e Staats (1966/1973) esclarecem que ao iniciar a vida adulta o individuo
está sujeito à perda de reforçadores sociais positivos, o que poderá constituir co n tin ­
g ê n cia a ve rsiva . Uma p e ssoa com d é fic its c o m p o rta m e n ta is a rn p lo s rece b e m ais
estim ulação aversiva e pouco reforçam ento positivo, corroborando para que não consi­
ga m anter ou em itir respostas ajustadas.
Assirn, Sidm an (1989/2003) pontua que a conduta do ser hum ano é intensa­
m ente controlada por seu am biente e por suas co n se qü ê n cia s a tra vé s da coerção.
Definida com o sendo o uso da punição ou a ameaça desta e a prática de recom pensar
pessoas, para que as mesmas com portem -se com o o am biente deseja e assim esca­
pem das am eaças ou punições.
Pierce e Epling (1995/1999) destacaram em seus estudos que a punição não é
capaz de estabelecer um novo com portam ento, pois contingências punitivas extingüem
com portam entos operantes, talvez porque eliciem com portam entos respondentes con­
correntes. Nessa perspectiva, S kinner (1953/2003) salienta que os produtos em o cio ­
nais da punição e da coerção não trazem benefícios para o indivíduo e nem para o
grupo, pois o individuo apresentará padrões distorcidos de com portam entos por fortes
p re d isp o siçõ e s e m o cio n a is, que fo ra m e licia d a s pelas situ a çõ e s a ve rsiva s. S endo
assim, as emoções afetam o com portam ento operante por possuírem particularidades
de se n sib ilid a d e, além de serem siste m a s a d a pta tivo s do c o m p o rta m e n to hum ano
que direcionam as respostas, sejam positivas sejam negativas (Staats, 1996).

Robertf Cardos« de Sousü, Çina Nolêto füueno


As emoções negativas são interpretações errôneas que o indivíduo faz de uma
situação através de pensam entos e crenças disfuncionais (Beck, 1995/1997). Porém ,
na visão do Behaviorísm o Psicológico, se a situação fo r negativa o indivíduo p o dera
apresentar respostas e m o cio n a is de a n siedade, m edo ou de sg osto , re su lta n d o em
fuga ou esquiva do estímulo que as cliciou. E. se a em oção for positiva ocorrerá a p ro x i­
mação ao estim ulo que as gerou (Staats, 1996).
Ansiedade e medo com preendem o repertório em ocional do indivíduo, sendo
este repertório variável muito im portante para a com preensão do com portam ento s e x u ­
al humano. Nesse sentido, Baptistussi (2003) adverte que os problem as sexuais, por
serem com portam entos respondentes e operantes, têm a probabilidade de serem re ­
sultados de contingências aversivas, induzidas pela cultura ou pelos indivíduos que se
relacionam com essa pessoa.
E stu d o s d em onstram q u e vários são os a sp e cto s que podem in flu e n c ia r a
h istó ria do in d iv id u o e p re ju d ic a r seu c o m p o rta m e n to se xu a l, com o: e x p e riê n c ia s
vivenciadas anteriorm ente com o sexo; traum as vividos na infância; a apre n d iza g e m
que o h o m e m e a m ulhe r re ce b e ra m so b re e s tim u la ç ã o s e x u a l; b a ix o re p e rtó rio
com porta m ental na resposta o rgásm ica; o não co n h ecim e n to sobre a a n a to m ia e a
fisiologia das relações sexuais, resultando na ansiedade; se ntim ento de au to-e stím a
rebaixado; dificuldades interpessoais e se ntim ento de m edo, raiva, m ágoa e fa lta de
desejo e licia d o por co n tin gê n cia s a ve rsiva s, p o d en d o desencadear, por e xe m p lo , a
Ejaculação Precoce que co n figura-se em um dos problem as descritos com o c o m p re ­
endendo um a das disfunções sexuais (Life. 1979).

Ejaculação Precoce
Ejaculação Precoce é a incapacidade que o homem tem de controlar seu re fle ­
xo ejaculatório no ato sexual, ou seja. após ficar excitado atinge o orgasm o im e d ia ta ­
mente, não sendo capaz de controlar sua ejaculação (Baptistussi, 2003).
Para a Academ ia Internacional de Sexologta M édica a E jaculação P recoce é
uma condição persistente ou recorrente de form a rápida e inadvertida em que o in d iví­
duo não percebe e não pode controlar as sensações proprioceptivas que antecedem o
refle xo e ja cu la tório , d e se nca d e a n d o m a l-e sta r p e ssoal e na pa rce ira (C a v a lc a n ti &
Cavalcanti, 2006).
Em seus estudos, H awton (1989/1997) enfatiza que a Ejaculação P re co ce é
comum em : (a) hom ens jo ve n s, quando de suas p rim eiras relaçõ e s sexuais; (b) em
pessoas com stress', (c) e em indivíduos que tiveram poucas relações sexuais. M esm o
devido a estas variáveis, que tam bém d e se nca d e ia m a Ejaculação P recoce, e la só
pode ser considerada D isfunção Sexual q u a nd o fo r rápida, in d e se ja da e d u ra d o u ra .
Desta form a, seus critérios diagnósticos, segundo o DSM -IV-TR (APA, 2000/2003), são:
(a) ejaculação persistente ou recorrente com pouca estim ulação antes, no m om e n to ou
logo após a penetração antes que o indivíduo deseje; (b) dificuldade in te rp e sso a l e
s o frim ento intenso; e (c) a E ja culação Precoce não pode se r considerada e x c lu s iv a ­
m ente devido aos efeitos diretos de uma substância.
M as, é através de um a anátíse m inuciosa das contingências que estão e n vo lvi­
das na vida de cada indivíduo que se pode definir o conteúdo dos aspectos p sicológicos
envolvidos na Ejaculação Precoce (Baptistussi, 2003).
Experiências clinicas apontam para a insegurança, a ansiedade e a p a ssivid a ­
de com o fa to re s de alta p ro b a b ilid a d e na co n se qü e n cia çã o da E ja culação P recoce.
Relatam ainda que o perfil dos indivíduos que apresentam Ejaculação Precoce co m p re ­

Sobre Comportamento c C ognifão 137


ende-sc por baixa habilidade para enfre n ta r situações de conflito, sentim ento de baixa
a u to -e s tim a , e baixo padrão global do desenvolvim ento social (Baptistussi. 20 03).
C avalcanti e Cavalcanti (2006) a firm a m que o com portam ento soxual in a d e ­
quado pode ser desaprendido por m eio de técnicas com portam entais que irão desen­
volver um a nova aprendizagem e su b stituir os com portam entos desadaptados por com ­
p ortam entos funcionais.

Tratando a Ejaculação Precoce


Baseada na Terapia Com portam enta! Cognitiva, a intervenção terapêutica reor­
ganiza os com portam entos desa da p ta d o s e as cognições disfuncionais. substituindo-
os por outros mais adaptados (Neto, 2003). Para isso, apropria-se de técnicas que irão
p ro m o v e r a a p re n d iz a g e m de n o v o s r e p e rtó rio s c o m p o rta m e n ta is , ta is c o m o :
Hipervcntilação; Controle Respiratório; Educação sobre Ansiedade; Plano de Atividades
Recreativas: Análise Funcional; R eestruturação Cognitiva; Educação Sexual; Distração
Cognitiva e a Técnica da Com pressão, dentre outras.

Objetivos
Este estu do teve com o o b je tivo ve rific a r as variáve is c o m p re e n d e d o ra s da
Disfunção Sexual em um participante de 4 7 anos, à época, mais especificam ente quan­
to á Ejaculação Precoce. O bjetivou, ainda, verificar se as técnicas selecionadas para o
processo terapêutico favoreceriam o controle das respostas sexualm ente indesejadas,
além do desenvolvim ento de outros repertórios com portam entais necessários, inclusi­
ve para um ato sexual adequado, visando o seu bem-estar.

Método
Participante
O p a rticip a n te deste e stu d o fo i Fábio (nom e fictício ), 47 anos. nível sócio
econôm ico baixo, ensino fundam ental incom pleto, desquitado, paí de dois filhos (filha
20 anos, e filho de 24 anos), m etalúrgico, filho de uma prole de quatro irmãos.
Sua História Clinica - 0 a 5 anos: sua gestação e parto foram norm ais; tinha o
apoio dos pais. Sua mãe, d iscip lin a d o ra , batia -lh e com vara e chinelo. O pai, mais
com preensivo, sem pre dava-lhe carinho. Apresentou alergia a leite e produtos quím i­
cos. Sofreu sinusite, dores nas costas, além de ter quebrado a clavícula duas vezes,
brincando. 6 a 10 anos: infância feliz, período em que brincou muito. A chava-se muito
inteligente: construía seus próprios brinquedos. Os país brigavam e agrediam -se. Em
função disto, o pai continuam ente am eaçava ir em bora e Fábio deprim ia-se e desespe­
rava com essa possibilidade. P re se n cio u a saída de seu pai de casa em busca de
trabalho. Passou por necessidades su b stanciais com sua fam ília (não tinham nem o
que com er). 11 a 15 anos: nessa fa s e da a d o le scên cia brincou m uito, apre n d e u a
m asturbar-se, com eçou a sentir fascinação por seios de mulher. Com eçou a trabalhar
Sua m ãe d isciplinava-lhe m uito devido às brincadeiras inconvenientes que praticava
(quebrava os brinquedos do irmão). 16 a 20 anos: teve a primeira relação sexual com
um hom ossexual e depois com prostitutas, conseguindo ter satisfação sexual normal.
Seu conhecim ento sobre sexo fo i através de revistas e reportagens. 21 a 26 anos:
nam orou várias m ulheres. Conheceu aquela que tornar-se-ia sua esposa. Com eçaram
a te r vida sexual ativa, norm al (sem problem as) e satisfatória. Depois de seis m eses de
nam oro, ela engravidou-se dele. O avô dela os pressionou a casarem . Casaram -se.

Roberfl Cardoso de Sousa, Q itid N olêto Eueno


’5

Veio o prim eiro filho. Após dois anos e meio trabalhando, perdeu o emprego. A form a de
sustentar sua família transformou-se em seu grande pavor, por m edo de não conseguir
outro trabalho. Período em que ocorreu h prim eira ejaculação precoce. 27 a 32 anos:
intensifica ram-se os problemas conjugais em decorrência da ejaculação precoce. P rocu­
rou ajuda profissional antes de chegar a terapia, através da medicina urológica e p siqui­
átrica. Tornou-se freqüentador e consum idor de se x shop. Sua esposa traiu-lhe com seu
irmão: ele próprio os encontiou no ato sexual. Discutiu com a esposa e com irmão, e com
arma de fogo atirou nos dois e fuyiu. Separou-se de sua esposa. 33 a 37 anos: reconci­
liou-se com sua esposa e voltaram a morar juntos. As discussões familiares foram reto '
madas em decorrência dos ciúmes de Fábio e da ejaculação precoce. Desconfiava que
ela continuava traindo-lhe com seu irmão, e até com o patrão dela. 38 a 42 anos: Não
conseguia concentrar-se no trabalho, por pensar que sua m ulher estivesse traindo-lhe.
especialmente com seu irmão. Sua esposa propõe nova separação. 43 a 47 anos: em
julho de 2006 procurou atendim ento psicológico. Em 11 de agosto de 2006 desquitou-se
Continuaram morando juntos, mas, separados de quartos e corpos. Sua ex-m ulher co n ­
tinuava cuidando de suas roupas, mas quase sem com unicação. Em dezem bro de 2006
sua ex-esposa saiu de casa com os filhos, c Fábio passou a morar só.

Materiais e Ambiente
A s sessões aconteceram em um consultório padrão da Clinica Escola de P si­
cologia - C E P S i, da Universidade Católica de Goiás.
F oram utiiizados m ateriais did á tico s e ped ag ó g ico s: papel cham ex, caneta,
pastas para arquivo e fichas padrão do CEPSI, para controie de freqüência das s e s­
sões; in s tru m e n to s d ia g n ó stico s e testes a va lia tivo s: Q u e stio n á rio de H istó ria V ita l
(Lazarus, 1975/1980); Inventário de D epressão de Beck-BDI, Inventário de Ansiedade
de B e ck-B A l, Escala de D esesperança de B eck-B H S , E sca la de Ideação S u icid a de
Beck-BSI (C unha, 2001); Inventário de H abilidades Sociais-IH S (Del Prette & Del P rettc,
2001/2003); Inventário de Sintom a de Stress para A dultos - ISSL (Lipp, 2000) e Diários
de R egistro (Bueno & Britto, 2003),

Procedimento
D u ra n te 0 p ro ce sso te ra p ê u tico fo ra m re a liz a d a s duas se ssõ e s se m a n a is ,
com dura çã o de 50 m inutos cada, que consistiu em três fases: Linha de Base, In te rve n ­
ção e A valiação Final.
A Linha de Base com preendeu a fase inicial, sendo realizada da 1a a 7a ses
sões. Nela foi construido o rapport, objetivando enfatizar a em patia na relação terapêu
tica. Em seguida foi desenvolvida a entrevista inicial, visando a coleta de d a d os das
queixas do participante. Posteriorm ente, foi feita a explicação do procedim ento da Tera­
pia C om portam ental Cognitiva, bem com o o estabelecim ento do plano de tratam ento, e
o contrato terapêutico. Foi tam bém ressaltada a im portância da cooperação, da fidedig-
nidade das inform ações, da estruturação e realização das tarefas de casa pelo p a rtici­
pante. Foram aplicados nessa fase os seguintes instrum entos: Questionário de H istó ­
ria V ita l (Lazarus, 1975/1980), o qual com preende-se por questões que envolvem a vida
da pessoa, desde sua concepção até os dias atuais. Ele foi entregue com o tarefa de
casa. Foram aplicados os testes da Bateria de Beck (Cunha, 2001): BDl, para ve rificar o
nível de depressão, com escores cla ssifica d o s em : m ínim o (0 a 11), leve (12 a 19),
m oderado (20 a 35), e grave (36 a 63); BAI, para aferir o nível de ansiedade, cujos
escores são classificados em: m ínim o (0 a 10), leve (11 a 19), moderado (20 a 30), e
grave (31 a 63); a BHS, para avaliar a profundidade da desesperança, cujos escores

Sobre Comportamento e Cognição 139


são classificados em: (0 a 4) m ínim o, (5 a 8} teve, (9 a 13) m oderado, c (14 a 20) grave;
g a BSI, para investigar as tentativas suicidas (Cunha, 2001); e o IHS. para verificar as

habilidades presentes no com portam ento do participante. O escore total avalia, de fo r­


ma geral, a existência de recursos e déficits em habilidades. Os vaiorcs situados acima
do p e rce n til 50 indicam e sco re s m ais a lto s em h a b ilid a de s so cia is, a b a ixo de sse
percentil há indicação de haver uma baixa habilidade social e o valor situado no percentil
50 indica um a posição m ediana. Os escores fatoriais investigam : F-1. as habilidades
sociais de enfrentam ento de risco; F-2, auto-afirm ação; F-3, desenvoltura suciai; F-4,
auto-exposição às pessoas e às situações novas; F-5, autocontrole da agressividade
(Del Prette & Del Prette, 2001/2003). Além do 1SSL (Lipp, 2000) para verificar se o parti­
cipante apresentava stress. E por fim , os Diários de Registros de C om portam entos,
em itidos fora do am biente clínico (Bueno & Britto, 2003).
A segunda fase com preendeu a Intervenção, abrangendo da 8e à 26a sessão.
N e la fo i a p lic a d o o p la n o de tra ta m e n to , q u e in c lu iu as s e g u in te s té c n ic a s : a
Hiperventilação, que é uma respiração induzida pelo stress vivenciado pelo participante,
provocando o m edo elíciado por algum estím ulo antecedente, sendo porcebido por ele
com o um quadro clínico am edrontador (Craske & Barlow, 1993/1999). Controle Respi­
ratório, com a finalidade de produzir m udanças na freqüência respiratória, para o equi­
líbrio dos níveis de oxigénio no organism o (Shinohara, 1999). Educação sobre a A n sie ­
dade, para favorecer a autoconsciência e o b ter o autocontrole de suas respostas co rp o ­
rais. Plano de Atividades Recreativas que fossem -lhe prazerosas e que viesse a praticá-
las em seus horários livres, Esse plano foi definido conjuntam ente com o participante.
Análise Funciona!, objetivando identificar as variáveis envolvidas na causa e m anuten­
ção dos com portam eníos-problem a, assim com o suas conseqüências, com o objetivo
de m odificá-las para a obtenção de novos com portam entos adaptados (Kanfer & Saslow,
1973/1979). Reestruturação Cognitiva com o objetivo de ajudar o participante a identifi­
car e con fro n ta r os pen sam e n to s n e g a tivo s autom áticos, além de d e se n vo lve r um a
percepção realista de seu pensam ento, visando a funcionalização dos com portam en­
tos desadaptados (Beck. 1995/1997). Educação Sexual, para favorecer ao participante
co n h ecim e n to s b á sico s sobre ca ra cte rísticas sexuais, anatom ia e fisio lo g ia sexuais,
ciclo da resposta sexual e as diferenças de gênero nas experiências sexuais que cada
indivíduo vivência de acordo com suas preferências (Carey, 2003). Distração Cognitiva,
com o objetivo de neutralizar os pensam entos estranhos e levar o individuo a concen­
trar-se no ato sexual que está ocorrendo (Cavalcanti & Cavalcanti, 2006). Técnica da
C om pressão, para instruir o participante a controlar seu fluxo ejaculatório através da
m asturbação (Carey, 2003).
A terceira fase consistiu na Avaliação Final, desenvolvida da 27a à 280 sessões.
Nela foram reaplicados os testes da bateria de Beck, o IHS e o ISSL com fins com para­
tivos entre os dados alcançados na Linha de Base, e na Avaliação Final, para verificar
quantitativa e qualitativam ente a evolução do participante. Também houve o feedback
verbal do participante sobre seu repertório e suas conseqüências após o tratam ento. O
procedim ento está apresentado, de form a m acro, na Tabela 1.

Robertt Cardoso de Sousa, Çina N olêfo Bueno


T a b e la i A s três fases uo p roce sso -era pêu tico

Fases P ro ced im e n to

Linha de Base R s p p o it unlrevista inicial, educação sobre a TOC, plano d<;


1a à 7 a Ses­ tratamento dos comporta mentos-problema, contrato terapêutico
sões e aplicação dos instrumentos: Questionário de História Vital, e
os testes BDI, BAI, BHS, BSI, IHS e ISSL; Diários de Registros
de
In terven ção Hiperventilsção; Controle Respiratório, Educação sobre A nsieda­
de; Plano de Atividades Recreativas; Análise Funcional;
8B à 26a sessões
Re es ;ru tu ração Cognitiva; Educação Sexual; Distração Cognitiva;
Técnica da Compressão.

Avaliação Final Reaplicação dos da Bsíeria de Beck: BDI, BAI, BHS e BSI;
27a à 28a ses­ dos lesU;s: IMS e ISSL; Feedback verbal do participante
sões

Resultados
Os resultados apresentados neste trabalho foram adquiridos ao longo do pro­
cesso terapêutico, desenvolvido em três fases: Linha de Base, Intervenção e Avaliação
Final,

Bateria de Beck - BDI, BAI, BHS e BSI


Os inventários da Bateria de Beck foram aplicados na 4a e 58 sessões, durante
a Linha de Base e reaplicados na 27a sessão, na Avaliação Final. Na Figura 1 são
apresentados os resultados comparativos de Fábio nestas duas fases.

Figura 1 - Resultados da Bateria de Beck na Linha de Base e na Avaliação Final.

Sobre Comportamento e Cognição


No prim eiro grupam ento de colunas, da esquerda para a direita, há os resul­
tados de Fábio no BDí. Na Linha de Base. observa-se escore 30. ou seja, nível m ode­
rado de depressão. Já na Avaliação Finai o participante registrou escore 4, isto é. nívei
m inim o de depressão.
No segundo grupam ento de colunas há os resultados apontados peio BAI. Na
Linha Base o escore foi 2 4 ; nivef m oderado de ansiedade. Já na Avaliação Final o
escore foi 5. portanto, redução de sua ansiedade para o nível mínimo.
No terceiro grupam ento de colunas encontrarn-se os resultados do BHS. Na
Linha de Base o participante obteve escore 15, considerado nivel grave de d esespe­
rança; enquanto na Avaliação Final o escore foi 2, nível m inim o de desesperança. No
quarto grupam ento observam -se os resuitados da Escala de Ideação Suicida - BSI, na
qual o participante obteve escore zero na Linha de Base e na Avaliação F inaf represen­
tando ausência de ideação e tentativa de suicídio.

Manejo da Ansiedade
O bjetivando reduzir o nível de ansiedade apresentado pelo participante foram
aplicadas as técnicas de H iperventilação e Contrüle Respiratório. Posteriorm ente, foi
explicado ao participante o funcionam ento do Sistem a Nervoso Autônom o Sim pático e
P arassim pátíco, visando a discrim in a çã o e nom eação de suas alterações fis io ló g i­
cas, e sua relação com a interação am biental.

labela 2 Auto-regras negativas de Fábio na Linha cie Base versus intervenção

A uto-regras Intervenção Resultado

Sou incompetente na Análise Funcionai; Estou bem melhor; sou ca­


relação sexual Reestruturação Cognitiva; paz; quero viver; tenho von­
Educação Sexual; Distração tade de viver.
Cognitiva.

0 futuro me parece vago Não houve intervenção Vejo as coisas diferentes;


e inc.erto direta. estou bem melhor.

Acho que amar ê só uma Análise Funcional; Começa a desenvolver um


vez Reestruturação Cognitiva. novo relacionamento afetivo
com outra mulher

Acho que nunca vou Análise Funcional; Fábio começa a ter reiação
realizar uma mulher sexu­ Reestruturação Cognitiva; sexual com a namorada e
almente Educação Sexual; Distração sente-se impor.ante.
Cognitiva; Compressão.

Resultados apresentados no IHS


O IHS foi aplicado na 7a sessão, durante a Linha de Base e reaplicado na 28a
sessão, na A valiação Final, com o m ostra a Figura 2.

Robertt Cardoso de Sousa, Ç iíia N olêio Fueno


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Figura 2 Resultados comparativos do IHS: Linha de Base e Avaliação Fine

Através da Figura 2 é possível o bservar o repertório global do participante,


apresentado no segundo grupam ento de colunas, da esquerda para a direita. Na Linha
de Base o seu repertorio global apresentou-se m uito abaixo da m ediana (10), a va n çan ­
do para a m ediana (50) quando da Avaliação Finai. Já em relação ao fator F-1. avaliador
das habilidades sociais em situações de enfrentam ento de risco, o participante m an te ­
ve o m esm o fator de desem penho (60) nas duas fases de aplicação. Q uanto ás suas
habilidades para lidar com afeto, aferidas pelo fa to r F-2, o participante alcançou na
Linha de Base escore 35, registrando uma redução nesse fator para o escore 20 na
Avaliação Final, m om ento correlato à saída de seus fam iliares de casa. Já em relação
à sua habilidade de conversação e desenvoltura social, medida através do fator F-3.
Fábic pontuou 1 com o escore na Linha de Base; tendo alcançado 20 na Avaliação F ina1
M esm o sendo um escore abaixo da m ediana, d e staca -se um crescim ento relevante
dessa habilidade em 19 pontos na faixa de escores. Já com relação a auto-exposição
às pessoas e às situações novas, avaliada pelo fator F-4, Fábio que obteve escore 3 na
Linha de Base, registrou um aum ento de 22 pontos quando da Avaliação Final. Enquan­
to no fator F-5, investigador do autocontrole e da agressividade, obteve escore 60 na
Linha de Base; e 50 na A valiação Final, período em que lidava com a separação de
seus fa m ilia re s,

Resultados apresentados no ISSL


Na Tabela 3 são apresentados os resultados alcançados pelo participante no
ISSL, na prim eira aplicação ocorrida na 7a sessão, fa se de Linha de Base.

Tabela 3. Inventário de Sintomas de Stress para Adultos (ISSL) na Linha de Base.

Quadrante % Total Diagnóstico

Q1 0 Os resultados apontam
para stress psicológico,
Q2 6
na fase de resistência.
Q3 7

Sobre Comportamento c Cognição 143


A s re s p o s ta s o b tid a s no IS S L. p e lo p a rtic ip a n te , in d ic a m a p re s e n ç a de str& ss
p s ic o ló g ic o , c o m : h ip c rs e n s ib iiid a d e e m o tiv a ; d ú v id a s q u a n to a si p ró p rio ; p e n s a r e
fa la r c o n s ta n te m e n te um só a s s u n to ; irrita b ilid a d e e x c e s s iv a ; d im in u iç ã o da lib id o ;
v o n ta d e de fu g ir de tu d o ; a p a tia ; d e p re s s ã o ou ra iva p ro lo n g a d a ; a n g u s tia , a n s ie d a d e .

Manejo do Stress
Foi d e lin e a d o , ju n ta m e n te com F á bio, um P lano de A tiv id a d e s R e c re a tiv a s que
in c lu ía a p rá tic a da n a ta ç ã o (e s p o rte p re fe rid o de fe) d u a s v e z e s p o r se m a n a , no p e río d o
da no ite, a p ó s o e n c e rra m e n to de su a s a tiv id a d e s p ro fis s io n a is . Foi tra ç a d a ta m b é m
um a m e ta de v is ita ç ã o a a m ig o s e p a re n te s q u e rid o s no s fin a is d e se m a n a , a q u a l o
p a rtic ip a n te p a s s o u a re a liz a r ao s d o m in g o s .
Na T a bela 4 estã o os re s u lta d o s a p u ra d o s pe lo IS S L q u a n d o de sua re a p lic a ç ã o
na fa s e de A v a lia ç ã o Final, m a is e s p e c ific a m e n te na 2 8 a s e ssã o .

Tabela 4. !nventário ds Sintoma c-e Slress para Adultos (ISSL) na Avaliação Final

Q u adran te % Total Diagnóstico

Q1 1
Q2 3 Ausência de síress físico
e psicológico
Q3 2

Análise Funcional e Reestruturação Cognitiva


A A n á lis e F u n c io n a l foi re a liz a d a em to d a s as e ta p a s do p ro c e s s o te ra p ê u tic o ,
s u b s id ia d a p e lo s D iá rio s de R e g is tro de C o m p o rta m e n to s . N as T a b e la s 5 e 6 e s tã o
d o is e x e m p lo s da a p lic a ç ã o d e s s e in s tru m e n to .

Tabela 5. Análise Funcional ce SkuaçÒes Desconfortáveis na Linha de Base

Estímulo (S) Conseqüência (C)


Resposta (R)

Ouve seu filho conversan­ Privadas: '‘Se isso aconte­ Solidão; demorou a dormir;
do sobre o financiamento cer vai ser definitivo, eles sentiu-se deprimido; ficou
de uma casa. vão embora e morar longe preocupado.
oe mim”. Sentiu tristeza,
solidão, angústia,
taquicardia e palpitação.
P úblicas; ficou calaoo e
não comentou nada com
ninguém.

Privadas: “Será que vou Ejacula precocemente; sen-


Relação sexual com a conseguir? Acho que não te-se impotente; frustrado;
esposa. vou dar conta.” Sentiumedo, sua esposa pune-lhe com
ansiedade,tremor e agressão verbaí.
taquicardia.Públicas: a;o
sexual com a esposa.

Robertt Cardoso de Sousa, Q ina Nolêto Bueno


A Análise Funcional e a Reestruturação Cognitiva foram realizadas com situ a ­
ções desconfortantes que o participante apresentava. Fábio foi instruído a discrim inar
as variáveis envolvidas nos com portarnentos-problem a, assim com o suas respostas
privadas: pensam entos, sensações e sentim entos. Fábio passou a d e se nvo lve r uma
percepção mais realista de seus com portam entos, b u sca nd o m odificá-los por outros
assertivos, com o dem onstra a Tabela 6.

Tabela 6. Análise Funcional na ln:ervençáo

Estímulo (S) R e s p o s ta (R) C o n s e q ü ê n c ia (C)

A casa sem móveis, va?ia P rivadas: "Agora è recome­ Compra móveis; organiza
çar tudo de novo. Sentiu sua casa; busca motivar-se
tristeza: vazio, angústia e com a nova vida.
palpitação. P ublicas: sai
para comprar cs móveis

Relação sexual com a P rivada s: “Acho que posso Não ejacula precocemente;
namorada. conseguir. Estou mais segu­ sente-se importante; sua
ro, confiante: sem palpitação com panheira reforça-lhe
e taquicardia "P ública s: ato positivamente.
sexual com a namorada.

Educação Sexual
O participante foi instruido a com preender m elhor o processo de ejaculação e
os m ecanism os envolvidos (fisiológicos, emocionais e com portam entais) no ato se xu ­
al. Foi utilizada com o instrum ento de intervenção a Educação Sexual. Com a ajuda de
ilustrações sobre o corpo hum ano, explicando-lhe com o o corpo reage e prepara-se
para a relação sexual, inclusive as diferenças entre funcionam ento do corpo m asculino
e fem inino. Desta form a, foi possível, conform e fe edback do participante, obtenção dele
de um entendim ento m aior sobre seu corpo, auxiliando-o a discrim inar m elhor a rela­
ção existente entre o físico, a em oção e o com portam ento.

Fragmento da 18a sessão


T= De que form a você recebe estas inform ações sobre a sexualidade?
C= Pensava diferente sobre isso. Nossa, me gera um alívio!
T= C om o é esse alívio?
C= Tinha m uitas dúvidas, isso m e deixava ansioso. Agora percebo que a m inha form a
de analisar estava errada.

Distração Cognitiva
O participante foi instruído a usar a técnica de d e sviar o pensam ento “Não vou
conseguir segurar a e ja cuiação” para auto-verbaíizações ou im agens que focassem o
m om ento presente, e que ele tivesse a percepção do que ocorria na relação sexual,
além da ejaculação, com o a troca de carinhos, o uso de palavras e stim u la n te s e a

Sobre Comportamento e Cognição 145


penetração, etc.. O participante con se gu iu d iscrim in a r que sua atenção deveria estar
focada na situação presente de fo rm a positiva, para que as d istrações e os pensam en­
tos catastróficos fossem dim in uido s.

Fragmento da 26a sessão


T= Você está utilizando a técnica d a Distração?
C= Sim, estou.
T= Você tem perccbido m elhora?
C= Percebo que as coisas não são com o as im agino. Estou bem m elhor agora. Tenho
que me concentrar no ato sexual e vigiar o que digo a mim m esm o.

Técnica da Compressão
A té c n ic a da C o m p re s s ã o le vo u o p a rtic ip a n te a u tiliz a r-s e da prá tica da
m asturbação para aprender a c o n tro la r sua ejaculação. O participante foi instruído a
m asturbar-se três vezes por sem ana (segunda, quarta e sexta) até q u a se conseguir
ejacular Q uando estivesse próxim o de ejacular deveria d a r um a parada de movimento
usando a pressão dos dedos potegar, indicador e m édio na base da glande. O polegar
para fazer pressão na altura do fre io do pênis, enquanto que o indicador e o médio para
fazerem pressão na face oposta do pênis, por a p ro xim a d a m e n te 10 segundos, para
im pedir que a ejaculação ocorresse. Esse exercício era repetido em um m ínim o de sete
vezes seguidas. O participante aderiu ao procedim ento, o que sugere a facilitação do
controle de suas respostas de ejaculação.
A Tabela 7 m ostra o padrão sexual de Fábio em três fases de sua vida.

Tabsla 7. Padrão Sexual de Fábio

Antes da demissão Após a demissão Com a intervenção

Fábio mantinha relação Fábio torna-se preocupado Inicia um novo relacionamen­


sexual normal com sua com o sustendo de sua to Fábio apropria-se das
esposa, em uma média de família. Passou a ejacular técnicas que está aprenden­
quatro vezes por semana. precocem ente As relações do e passa a desenvolver
Não apresentava sexuais foram diminuindo, um novo repertório sexual
ejaculação precoce e seu cheganoo a ftear até 40 dias assertivo: passa a ter rela­
ambiente fam iliar era agra­ sem ter relação sexual. ção sexual ativa com a na­
dável (sem brigas e sem Introduziu a masturbação na morada; sem a ocorrência de
discussões) ausência de sexo com a ejaculação precoce. Sente-
esposa; houve aceleração se importante, feliz e capaz
da ejaculação precoce. de realizar uma mulher sexu­
Passou a tem er o corpo da almente
esposa, que o punia verbal­
mente.

Discussão

Verificar as variáveis com preendedoras da Disfunção Sexual quanto à ejaculação


precoce foi o objetivo deste trabalho, sendo para este fim utilizadas 28a sessões de 50
m inutos.

Robert! Cardoso de Sousa, Qina Nalêfo Bueno


A Intervenção sugere eficácia quando da análise dos resultados da Bateria de
Beck (Cunha, 2001) obtidos por Fábio fia Linha de Base e Avaliação Final A depressão,
que no primeiro mom ento foi definida com o no nível m oderado, reduziu para nivol m ín i­
mo. Já sua ansiedade na Linha de Baso obsen/ada com o dc nível m oderado, dim inuiu
para nível m ínim o na Avaliação Final. A desesperança, com nivel grave na prim eira fase,
decresceu para m inimo na Avaliação Final, como dem onstra a Tigura 1.
Exatam ente por ser o hom em dotado de uma ampla história de vida, m otivando
a construção dc um com plexo repertório com portam cntal, quando o terapeuta depara-
se com a problem ática, ora em foco. espera-se dele a inve stig a ção dos rep e rtó rio s
hábeis, assim como dos déficits de habilidades sociais da pessoa. Desta form a, o IHS
(Del Prette & Del Prette, 2001/2003) foi instrum ento relevante para coleta e a nálise
destes fatores, tanto na Linha de Base quanta na Avaliação Final. M esm o não tendo
havido intervenção em todas as baixas habilidades aferidas, houve m elhoria em seu
repertório global, alcançando a m edia esperada, o que sugere um a generalização da
intervenção realizada. E nquanto as reduções verificadas nos fatores F-2 e F-5 de m o n s­
tram o quanto as variáveis am bientais têm poder de afetar positiva ou negativam ente o
repertório hábii social do indivíduo. Sendo que estas reduções não devem ser analisa
das com o d éficits nas ha b ilid a de s, m as resp o sta s ad e qu a d a s às c o n tin g ê n cia s em
operação (Figura 2).
A aplicação das té cn ica s H ip e rventilação. C ontrole R e sp irató rio e P lano de
Atividades Recreativas parecem ter possibilitado o controle das respostas ansiosas do
participante bem com o a red u çã o dc seu quadro de stress. com o d e m o n strad o nas
Tabelas 3 e 4.
A Análise Funcional foi instrum ento im portante para a discrim inação do p a rtici­
pante s o b re as fu n çõe s que os e stím u lo s a ve rsivo s e xerciam no c o n tro le de suas
respostas em ocionais, fisiológicas, cognitivas e com portam entais, assim com o à m o ­
tiva çã o para aplicar as té cn ica s ap re n d id a s para o d e se n vo lvim e n to de re p e rtó rio s
assertivos, como se observa através das Tabelas 5 e 6. Pois com o considera S kinner
(1953/2003), a Análise Funcional é um instrum ento favorecedor do autoconhecim ento e
posterior autocontrole dos repertórios com portam entais do indivíduo.
Através da história clinica de Fábio é possível perceber que situações d iscrim i­
nadas por ele com o extre m a m e n te aversivas, tais com o ser pressionado a casar-se
após curto período de nam oro; iniciar a vida conjugal já esperando um filho; perder o
em prego e não conseguir outro facilm ente; e o m edo de não dar conta de sustentar a
farnília, geraram -lhe grande apreensão. Staats e Staats (1966/1973) esclarecem que o
indivíduo no inicio de sua vida adulta pode perder reforço social positivo, o que resultará
conseqüentem ente numa situação aversíva. Assim , uma pessoa que já possua déficits
com portam entais amplos, ao receber mais estim ulação aversiva e pouco reforçam ento
positivo, poderá não conseguir em itir ou m anter respostas adaptadas. Nessa fase da
vida de Fábio eíe tem sua prim eira ejaculação precoce.
O am biente fa m ilia r do p a rticip a n te ta m b é m co n stitu iu -se em c o n tin g ê n c ia
aversiva para ele: vivia sob a situação constante da relação extra-conjugal da esposa.
S itu a ç ã o essa agravada por seu ciúm e, separações e tam bém pelo co m p o rta m e n to
punitivo da esposa. Sidm an (1989/2003) pontua que a conduta do ser hum ano é in te n ­
sam ente controlada por seu am biente e por suas conseqüências através da punição; e
S kin n e r (1953/2003) a crescenta que o produto em ocional da punição faz com que o
indivíduo apresente padrões distorcidos de com portam entos por fortes predisposições
em ocionais, que foram eiiciadas pelas situações aversivas. Desta form a, o padrão de
eja cu la r precocem ente do participante parece adequado às em oções que exp e rim e n ta ­

Sobre Comportamento e Cognição 147


va, afetando conseqüentem ente a sua resposta sexual. Isto porque as em oções afetam
o co m p o rta m e n to , pois possuem p a rticu la rid a d e s de s e n s ib ilid a d e e são s iste m a s
adaptativos do se r humano, direcionando as respostas de aproxim ação ou de fuga ou
de esquiva (Staats, 1996). Com o passar do tempo, Fabio passou a evitar a esposa
com o form a de não m ais precisar ter relações sexuais com e!a.
Mas outros aspectos tam bém podem prejudicar o com portam ento sexual da
pessoa, inclusive o não conhecim ento sobre a anatom ia e a fisiologia do corpo e do ato
sexual, resultando em sentim entos de baixa auto-estím a, d ificu ld a d es interpessoais,
medo. m ágoa, falta de desejo, etc. (Life, 1979). Com o Fábio dem onstrava pouco co n h e ­
cim ento a esse respeito, foram -lhe m inistradas aulas sobre Educação Sexual, que o
auxiliaram a com preender o funcionam ento do seu próprio corpo bem corno o corpo de
sua parceira, assim com o sobre o com pleto com portam ento sexual, ou seja, sobre a
relação sexual. O participante m ostrou-se m uito com prom etido em neutralizar os p en­
sam entos ca tastróficos e concentrar-se no ato sexufíl através da D istração Cognitiva
(Cavalcanti & Cavalcanti, 2006), com o verifica-se no fragm ento da 26a sessão; além de
ter praticado adequadam ente a técnica da Com pressão, com u objetivo de adquirir o
controle do seu fluxo ejaculatório através da m asturbação (C areyr 2003).
Os resultados deste estudo sugerem que seus objetivos foram alcançados, ou
seja, as variáveis compreendedoras da Disfunção Sexual foram possibilitadas pelo
ambiente social, desencadeando a ejaculação precoce, Sugerem ainda que a
intervenção realizada foi eficaz, uma vez que houve a redução de comportamentos
disfuncionais e a aprendizagem de novos comportamentos adaptados. Mas é
necessário que mais estudos sobre o tema sejam realizados para uma melhor
compreensão destas variáveis. Necessário, também, que o participante não
interrompa, ainda, seu tratamento, para que seja possível o treinamento à recaídas,
bem como a intervenção em outras classes de habilidades sociais deficitárias.

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Sobre Comportamento e Cognição 149


Capítulo 12
l/m a introdução à interpretação clínica
analítico-comportamental de
fenômenos grupais

Jo celaín e M artin s da Silveira


A lexan d re Diltrich
Universidade Federal do Paraná

Terapeutas analítico-com portam entais (TAC) relatam com freqüência in te rve n ­


ções clín ica s na m odalidade grupai (Alm eida, 2003; Brandão & Torres, 1997). E ao
relata re m fe n ô m e n o s de g rupo, os TAC c o stu m a m m e n cio n a r n o ções tra d ic io n a is
advindas de outras orientações teóricas, com o por exem plo, as recorrentes m enções
ao trab a lh o de Vinogradov e Yalom (1992). Tais relatos traduzem o aco lh im e n to de
intervenções na m odalidade grupai por parte dos TAC ao m esm o tem po em que dei­
xam duvidas quanto à extensão na qual certas noções tradicionais de fenôm enos grupais
se ajustam à visão anatítico-com portam ental. Isto ê, perm anece a questão de com o as
noções tradicionais de liderança, cooperação, com petição, de fatores terapêuticos do
grupo, de processos grupais, dc papéis das pessoas no grupo, de bode expiatório e da
coesão seriam avaliadas e tratadas por TAC.
É certo que os grupos são pródigos em quase tudo, até m esm o nos e m b a ra ­
çosos desafios que impõem à Psicologia. Afinal, a prim eira questão que um psicólogo
se vê o b rig a d o a resp o n d e r n e sse ca m p o é se os fe n ô m e n o s g ru p a is co n stitu e m
legitim am ente parte do objeto desta disciplina científica. E videntem ente que as co n ­
cepções quanto à natureza do objeto da Psicologia, em suas diferentes esco la s de
pensam ento, definirão o tratam ento conferido ao grupo; derivando delas tam bém , as
técnicas e as estratégias de inte rve n çõ e s em grupo. O presente capítulo p retende
apresentar um a sistem atização te ó rico-conceitual introdutória em análise do co m p o r­
tam ento sobre fenôm enos grupais que consolidam a base das intervenções clínicas
em grupo. Para tanto, os argum entos de B. F. S kinner (1953/1981) na seção "O co m p o r­
tam ento das pessoas em grupo", m ais especificam ente no capítulo XIX intitulado "C om ­
portam ento SociaP serão discutidos e exem plificados em term os do contexto clin ico na
m od a lid a d e grupai.

Critérios norteadores da visão analítico-comportamental de grupo


Evitando prolongar o suspense da questão “Os fenôm enos grupais são objeto
da P sico lo g ia ? ", pode-se resp o n d e r pre lim in a rm e n te que, na co n ce pçã o de S k in n e r

Sobre Comportamento e Cognição 151


(1953/1981), em uma perspectiva analítico-com portam ental, sim, desde que se levem
em conta alguns critérios. Prim eiro: o em issor do co m portam ento é o individuo, em
contraposição à noção de que o grupo constitui-se em uma entidade com funcionam en­
to próprio. A explicação analitico-com portam entaí dos fenôm enos grupais, isto é, a sua
descrição, tem seu ponto de partida no com portam ento de cada um.

O comportamento do indivíduo explica o fenômeno do grupo. [...} preocupamo-nos


aqui sim plesm ente com a extensão em que uma análise do comportamento do
indivíduo, que já recebeu substancia! validação sob as condições favoráveis de
uma ciência natural, pode contnbuir para o entendimento dos fenômenos sociais.
(Skinner, í 953/1981, p. 286).

Um segundo critério é o de que a análise do com portam ento do individuo em


grupo parte dos m esm os princípios em pregados para analisar seu com portam ento na
ausência de outras pessoas De acordo com Skinner,

uma lei social deve ser gerada pelo comportamento de indivíduos F sempre o
indivíduo que se comporta e que se comporta com o m esmo corpo e de acordo com
os mesmos processos usados em uma situação não-sodai. (p. 285)

Portanto, pelo menos esses dois critérios dirigem a visão que o TAC adota ao
avaliar e intervir em grupos.
Os grupos potencializam vários eventos, de m odo que m uitos resultados pro ­
duzidos conjuntam ente excedem a soma do que poderia ser produzido por com porta­
m entos individuais. De acnrdo r.om Skinner (1953/1981),

As conseqüências reforçadoras geradas pelo grupo excedem facilmente os totais


das consequências que poderiam ser conseguidas pelos membros se agissem
separadamente O efeito reforçador total è enormemente acrescido, (p. 298).

Quanto à unidade de m edida de algum evento relacionado ao grupo, há duas


possib ilid a d es: a n a lis a r os co m p o rta m e n to s in d ividuais ou m ed ir algum produto do
grupo. Por exemplo, a intensidade de um ruido produzido por um a sala de aula é um
produto do grupo que pode ser aferido - em bora ela própria, a intensidade do ruído, não
seja a m edida de um com portam ento (Johnston & Pennypacker, 1993).

Alguns conceitos fundamentais: comportamento social, ambiente


social, episódio sociai e comportamento verbal
Alguns conceitos são fundam entais para a com preensão de fenôm enos grupais
em term os da A n á lise C o m po rta m e n ta l. Sâo eles: os co n ce ito s de com p o rta m e n to
social, de am biente s o c ia i e de ep isó d io sociai. O co m portam ento social contem pla
uma form a m uito especial de ação humana: o com portam ento verbal.
"O com portam ento so cia l pode ser definido com o o com portam ento de duas
ou m ais pessoas em relação a um a outra ou em conjunto em relação ao am biente
com um .” (Skinner, 1953/1981, p. 285). N ote-se que um o rganism o é um a condição
im portante para outro, tratando-se da em issão do com portam ento social. Essa condi­
ção caracteriza o am biente social. Nesse am biente, relações de reforço social e contro­
le de estímulos acontecem de um m odo peculiar.
Skinner (1953/1981) indica duas peculiaridades das respostas nesse am bien­
te - são mais extensas e mais flexive is que as que ocorrem nos am bientes não sociais.
A instabilidade das in te ra çõ e s é um terceiro aspecto pe cu lia r ao am biente social. A

Jocelaine M a rtins dd Silveira, Alexandre D iltrich


extensão, a fle x ib ilid a d e e a in sta b ilid a d e das resp o sta s em a m b ie n te s so cia is têrn
importante influência na m udança clinica.
Em am bientes sociais, o reforço variara dependendo da co n d içã o do agente
reforçador e ele, quando é uma outra pessoa, tende a ser m ais variável que os eventos
de um am biente mecânico. Um m arido pode agir de form as muito d ife re n te s cm re la ­
ção à sua esposa em diferentes ocasiões (por exem plo, de form a carinhosa num m o­
mento e agressiva em outro), a d e p ender de outras variáveis que estejam afetando seu
com portam ento em cada situação. Em razão dessa possível variação, S kin n e r afirm a
que uma das características do com portam ento sociai é que ele pode ser m ais extenso
que o com portam ento que acontece no am biente m ecânico.
É possível que Skinner (1953/1981) estivesse se referindo á extensão em te r­
mos da d e term in a ção do com p o rta m e n to , que, nesse c a s o . è e sp e cia lm e n te “ m u lti”
determ inado. Uma m esm a resposta em um am biente social pode pro d u zir d iferentes
efeitos e respostas diferentes podem produzir um m esm o efeito.
Uma outra propriedade do responder em am bientes sociais, segundo Skinner, é
a sua flexibilidade. A variação de uma resposta para outra, quando a primeira não é mais
eficaz, ocorre mais rapidam ente no ambiente social do que no am biente mecânico. Por
exemplo, a esposa cujo penteado foi elogiado no dia em que o m arido fora prom ovido,
pára rapidam ente de insistir que ele a elogie ao notar que chegou aborrecido do trabalho.
Em um grupo terapêutico, a flexibilidade e a extensão das respostas acabam
se com pensando e perm itindo que a m udança clínica ocorra. Isto é, se por um lado é
mais difícil prom over m udanças em uma classe de respostas tão extensa, por outro, as
pessoas se ajustam com certa rapidez a alterações nas conseqüências d isp ensadas
pelos ag e níe s sociais.
Um exem plo disso em um grupo terapêutico ocorreu com Giovana. G iovana
tinha trinta anos, era solteira, m orava ainda com os pais e vestia-se de um je ito a d o le s­
cente. Era m uito meiga e afável. Entretanto, sua m eiguice era, frequentem ente, e n te n d i­
da pelos m em bros do grupo com o fragilidade. Isso a poupava de participar das tarefas
mais árduas, difíceis e m aduras do grupo, como, por exem pla, ouvir um fe e db a ck sobre
seu com portam ento. O repertório m eigo de Giovana parecia ser m antido, portanto, em
um e s q u e m a de refo rço n e gativo, rem o ve n d o re sp o n sa b ilid a d e s d e sa g ra d á v e is da
vida adulta. D urante o processo te ra p ê u tico , os m em b ros do grupo p a ssa ra m a te r
consciência de com o agiam em relação à Giovana e deixaram de poupá-la. In icia lm en ­
te, o re p e rtó rio co m p o rta m e n ta l d e la a p re se n to u c a ra c te rís tic a s do re s p o n d e r em
extinção. G iovana chorou, variou um pouco o m odo de agir, mas logo estava re sp o n d e n ­
do de uma m aneira nova, isto é, engajando-se tam bém nas tarefas adultas pertinentes
ao grupo. A ssim , apesar da am pla extensão das respostas da classe problem ática (ora
m eiga, ora afável, ora frágil), um a vez que os agentes sociais m udaram as co n se q ü ê n ­
cias, G iovana ajustou-se com certa flexibilidade.
C o n fo rm e apontam os, há um a terceira p e cu lia rid a d e do co m p o rta m e n to em
a m bientes sociais. A interação nesses am bientes é m uito m ais instável. S kinner (1953/
981) ilustra essa instabilidade com o que ocorre quando pessoas entram em um a sala
na qual há um cartaz que pede silêncio. Todos silenciam inicialm ente, mas a p a rtir do
m om ento em que um com eça a falar, todos passam a fazer um pouco m ais de barulho,
até que o resultado é um a franca desobediência ã solicitação de silê n cio .1

' Um Qijlnj exemplo dado pelo autor è uma brincadeira nos veleiros cio século XVIII. Os marinhemos alavam diversos meninos pela mâo
esquerda a um mastro «yn um anel, deixando livre a mão direita de cada um, que segurava urna vara ou cliioote Os marinheiros instruíam os
rreninosa haterem no da frente sempre que sentissem que o de trás lhe batera Um marinheiro cutucava levemente urn dos meraros, que a
se-JHimo, cutucava o próxirno e assim suoessivamente. E, mesmo com um grande prejuízo para todas, orcsullado inevitável era uma
suces&ão de golpes furiosos.

Sobre Comportamento e Cognição 153


Essa instabilidade das respostas das pessoas quando estão em grupo é um
a s p e c to que os clín ico s m anipulam , e xp lo ra n d o seu p o ten cia l te ra p ê u tico . Mas, os
terapeutas sabem o quanto essa peculiaridade do com portam ento nos am bientes so­
ciais requer da condução de atividades cm grupo um m anejo cuidadoso e delicado. O
grupo acaba sendo, em certo sentido, um a "caixinha de surpresas". É comum , durante
o processo terapêutico em grupo, que um acontecim ento na vida de um dos m em bros
adquira função de estim ulo para respostas dos dem ais m em bros, ãs vezes im previsíveis
para o terapeuta.
Eis uma ilustração clínica: Juliana tom ou conhecim ento sobre sua condição de
saúde, e que havia chance de com prom etim entos graves caso engravidasse. Ao relatar
isso para o grupo, bastante em ocionada, Juliana provocou sentim entos e verbalizações
im portantes para o m anejo terapêutico. Os dem ais m em bros do grupo fataram sobre
seus sonhos e suas perdas, seus projetos e o m edo da frustração. Essa tem ática era
pertinente ao m om ento do proccsso terapêutico, e foi profícua para o tratam ento.
O utras interações instáveis, entretanto, são de m anejo m ais difícil e se maí
conduzidas, e podem redundar em experiências não terapêuticas para os m em bros do
grupo. Respostas de agressão em escalada podem ocorrer devido à instabilidade das
in te ra çõ e s cm am bientes sociais.

Observa-se uma instabilidade com parável [à das agressões induzidas nos m eni­
nos com a brincadeira dos marinheiros} quando dois indivíduos se empenham em
uma conversa casual que leva a uma discussão com impropérios. O efeito agres­
sivo de um com entário, provavelm ente é subestim ada peio homem que o faz,
efeitos repetidos geram agressão posterior (Skinner, 1953/198 í, p 296)

Em um grupo tera p ê u tico . esse desastroso efeito às vezes é precipitado quan­


do alguém está falando sobre outros m em bros do grupo. Ao com eçar a relatar o que
sente em relação ao com portam ento do outro, a pessoa pode passar a descrever os
aspectos indesejáveis do com portam ento do outro. Assim, sua fala logo toma o contor­
no de uma acusação. O outro se sente espezinhado, e tende a revidar. Se o terapeuta
não identifica e interrom pe esse processo em tempo, as verbalizações terâo pouco ou
nada de efeito terapêutico, destruindo a atm osfera de segurança e respeito necessária
para o funcionam ento do grupo. Os terapeutas de orientação analitico-com portam ental
vêm de uma tradição clínica diretiva. A ssim , um a possibilidade de m anejo nessa situa­
ção é fazer parar as verbalizações, dizendo algo como “André, volte a fa la r dos seus
se n tim e n to s, está bem ?':.
O com portam ento verbal produz a m ediação do com portam ento de outro nos
efeitos sobre o am biente mecânico. P or isso, segundo Skinner (1953/1981) o com por­
tam ento verbal sem pre acarreta reforço social.2 O conceito de com portam ento verbal
está sendo lem brado aqui porque boa parte dos com portam entos relevantes das p e s­
soas em grupos terapêuticos é verbal. A ssim , o terapeuta deve se p erguntar a todo
m o m e n to : “ O que e s ta p e sso a e stá p e d in d o ao fa la r isso, d e sse je ito ? ” . M u ita s
verbalizações que parecem tactos (de scriçõ e s) têm função de m andos (pedidos) em
grupos terapêuticos. O terapeuta tem a tarefa de identificar essas verbalizações e evitar
que m andos sejam “travestidos" de tatos. Esta técnica aum enta a consciência que
cada um tern de seu com portam ento e do com portam ento dos dem ais m em bros.

1Diz Skinner (1953/19S1) V quando a mãe alimenta a criança. o alimento, como reforço primário, não é sodal, c comportamento da mãe ac
apresentá -io 6 ' (p. 286} E ilustra o coi nporta men lo verba I aca rreta ndo rtfo rço sodai, com a situação em quê e Igjé-n pedo um copo Sc agua.
Evidentemente, a resposta de ped>r a agua não tem efeito no ambiente mecânico, mas acarretará, um oopo de água. por meio dc
comportamento de outro.

Jocelaine M artins da Silveira, Alexandre Dittrich


Os tactos e os m andos podem ter valor terapêutico. Em um dado m om ento do
processo terapêutico, é m uito im portante que as p e s s o a s descrevam sous c o m p o rta ­
mentos e as variáveis que os m antêm . Em fa s e s subseqüentes, m andos podern so r
im portantes quando a pessoa precisa aprender a se p o sicio n a r e a e xpressar suas
necessidades aos outros.
Em seu livro "A cura de S chopenhauer', Yalorn (2005/2006) narra um processo
de terapia cm grupo. Em uma das sessões, ocorre o seguinte diálogo:
(Julius, o terapeuta, dirigindo-se a Gill, um paciente do grupo ) "Você diz que não
é fácil ser alvo dos com entários de Pam e na sem ana passada se referiu a ela com o
Juiza do Suprem o. Pode falar mais sobre isso?
- Ah, é bobagem m inha, não sei direito, nao sei avattar bem isso, mas...
Julius interrom peu: - Pare! Vamos co n g elar a ação nesse ponto. Nesse m o ­
mento Virou-se para Pam: - Olhe o que Gill acaba de dizer. Está retacionado com você
não ouvir ou não conseguir ouvir o que ele d k ?
-T o ta lm e n te - Disse Pam. - O que eie disse foi o mais puro Gill. O lha, Gill, o
que você acabou de dizer foi: ‘Não prestem atonção no que ou vou falar. Não é im p orta n
te, eu não sou im portante, é bobagem minha. Não quero agredir. Não m e e s c u te m .1
Você não só se rebaixa, mas é chato. Muito chato. Porra, Gill! Tem algo a dizer? Pois
abra a boca e fale!
- Então, Gill - pediu Juliu s - se você fosse falar sem meias palavras o que
diria? (...)
- Eu diria a ela, a você, Pam, que você é a ju iza que me dá medo aqui. Você me
julga. Fico sem jeito, ou melhor, fico apavorado na sua frente.
- Isso é sincero, Gill. A gora estou ouvindo — disse Pam .” (Yalom, p. 232).
N esse diálogo, as ve rb a liza çõ e s iniciais de Gill, em bora parecessem d e s c ri­
ções de seu com portam ento (ou tactos), tinham a fu n ção de um pedido do tipo “Me
deixem c a la d o ” . Pam em itiu d e scriçõ e s (tactos) do co m p o rta m e n to de Gill - e le e ra
chato - e fez um pedido (um m ando): ‘ Fale claram ente o que deseja fa la r” . Então, Gill
em itiu um ta c to 3 m ais acurado, dizendo a Pam que o je ito dela causava m edo nele.
Esse m esm o d iá lo g o ilu stra um outro ponto im p o rta n te relativo ao co m p o rta m e n to
verbal no contexto do grupo. Ele perm ite o autoco n h e cimento. Assim , o terapeuta, com o
parte do am biente social dos integrantes do grupo terapêutico, tem o papel de fa ze r
perguntas geradoras de auto-observação e autoconsciência. As perguntas de Ju liu s
são provocadoras de auto-observação e geram autoconhecim ento.

O am biente social é especialm ente responsável pelo fato de que nosso sujeito
tenha crescido em uma atmosfera de amor. ódio, raiva, ou ressentim ento e que
muitos outros padrões emocionais tenham caracterizado seu comportamento. [...]
As respostas discrim inativas ao próprio com portamento e às variáveis das quais
o comportamento é função parecem ser produto exclusivo do ambiente social. Se
o nosso indivíduo será ou não autoconsciente e introspectivo vai de pend er da
medida em que o grupo insistiu em respostas com o O que está fazendo?' ou P or
que fez is s o ? ' (Skinner, 1953/1981, p. 396)

O episódio social im plica a análise do com portam ento de um dado organism o e


de um segundo organism o, o qual apresenta as variáveis a serem consideradas a fim de
com preender o com portam ento do primeiro. Igualm ente, porém, o segundo o rg a n ism o
tem seu com portam ento controlado pelo primeiro, com o fonte de variáveis. O episódio

3 Nute-se que essa versa'i?açSri podf? também ter a função de rrande. do tipo: "Pare; de tre julgar"

Sobre Comportamento e Cognição


social c então construído, dispondo as análises lado a la d o 4 Em um grupo terapêutico,
q u a n d o ainda não estão ciaras para o terapeuta as variáveis controladoras do com porta­
m ento dos m em bros, ele pode co n stru ir um episódio social logo após a sessão, ou
durante, com o auxílio de anotações do co-terapeuta. Esse m étodo ajuda a identificar
rapidam ente as variáveis que m antêm o com portam ento de cada um dos membros.
Ao descrever as respostas de cada um no episódio social, o TAC com preende
com o o grupo m antém cada m em bro no seu "papel”. Trata-se. portanto, da relação de
um ou mais com portam entos individuais em vez de um funcionam ento do grupo com o
entidade na m anutenção de cada um em seu papel. Por exem plo, Ricardo costum ava
ser ridicularizado pelo grupo, Ele contava piadas o tempo todo e era uma espécie de
"palhaço" do grupo. Suas brincadeiras, m uitas vezes livravam um outro m em bro de lidar
com um tema aversivo. Então, o com portam ento de contar piadas por parte de Ricardo
era positivam ente reforçado com o riso de quem se viu salvo da "saia ju s ta '. A risada,
por sua vez, era reforçada negativam ente, por desviar a atenção de um assunto m ais
difícil. Com isso. cada m em bro m antinha o padrão com portam ental do outro. Portanto,
a construção de um episódio social na análise do com portam ento em grupos terapêuticos
ajuda a com preender o com portam ento de cada m embro.
O u tro s a sp e cto s tip ica m e n te c o n sid e ra d o s em fe n ô m e n o s gru p a is, com o a
cooperação e a com petição, tam bém são explicadas a partir de um a análise funcional
das interações com portam entais entre os m em bros do grupo. E assim , tanto o coope­
rar quanto o com petir podem estar sendo m antidos pelo m esm o tipo de evento co n se ­
qüe nte .5 Por exemplo, em uma equipe de vendedores, dois deles podem se unir e agir
cooperativarnente angariando clientes, tendo seus com portam entos reforçados positi­
vam ente com os resultados das vendas. Por outro lado, eles podem tam bém com petir
entre si. disputando os m esm os clientes, sendo também esse com portam ento reforça­
do positivam ente com os resultados das vendas.
A m b ie n te s s o c ia is são ta m b é m re s p o n s á v e is p e la g e ra ç ã o de p a d rõ e s
com portam entais de liderança. Segundo S kinner (1953/1981), quando um único siste ­
ma externo requer uma ação com binada, as pessoas podem engajar-se em com porta­
m entos para m arcação do ritmo, podendo até prescindir do trabalho de um líder. O autor
ilustra dizendo que se dois hom ens puxam um a corda que não poderia ser m ovida por
som ente um deles, um homem pode d ita r o com passo para outro e estabelecer um
padrão ritm ico. Barqueiros podem cantar um a canção para m arcar um padrão tem poral
para um trabalho em conjunto. Porém, quando dois com portam entos diferirem m uito e
a contingência de reforço for complexa para a realização de um a tarefa em conjunto,
uma divisão do trabalho é necessária. Então, segundo Skinner, o trab a lh o do iíder é
praticam ente indispensável. Ele ficará prim ariam ente sob o controle de variáveis exter­
nas, enquanto que o liderado ficará sob o controle do líder. De acordo com o a u to r

A maioria das culturas produz algumas pessoas cujo comportamento é controlado


principalmente pelas exigências de uma dada situação. As mesmas culturas tam­
bém produzem pessoas cujo com portam ento é controlado principalm ente pe lo
comportamento de outros Em qualquer empresa cooperativa, parece que se re­
quer essa divisão de trabalho. O líder não é totalmente independente do liderado,
entretanto, pois seu comportamento requer o apoio do comportamento correspon­
dente po r parte de outros, e na medida em que a cooperação for necessária, o líder
é, de fato, levado pelos liderados. (Skinner, 1953/1981, pp. 293-294).
Em grupos que recebem intervenção clinica, as pessoas que em item com por­
tam entos típicos de liderança sâo facilm ente identificadas pelo terapeuta. Mas, diversa­
m e n te d o que o c o rre em g ru p o s de e q u ip e s de tra b a lh o , p a ra o T A C o p a d rã o

*1 5 0 Joceldinc M a rtins da Silveira, Alexandre D iltrich


com portam enta! de liderança é apenas mais um a ser a n alisado fu n cio na lm e n te no
contexto do grupo. Na lite ratu ra sobre processos gru p a is, eve n tu a lm e n te, in d ica -se
como um fenôm eno reievante a disputa que o lider t©rá com o terapeuta ou o c o n d u to r
do grupo. A experiência tem m ostrado que, com freqüência, os m em bros respondem ao
terapeuta do grupo dc m odo distinto do que o faz com os integrantes do grupo. Cada
pessoa relaciona-se com o terapeuta conform e sua história de vida com pessoas que
ocupam função sem eihante a do condutor.
Uma pessoa afeita à liderança poderá to m a r a frente do terapeuta e ter iniciativas
que atropelem a condução do grupo. Pessoas que desafiam figuras de autoridade po
dem responder ao terapeuta com o se ele e stive sse num a posição h ierárquica u ser
com batida. Um grupo de crianças com dificuldades de relacionam ento ;i!er>didas em
um a c lín ic a -e s c o la p a ra n a e n se resp o n d ia nas fa s e s in ic ia is do tra ta m e n to a suas
terapeutas corno se elas fossem professoras. Mais tarde, outras funções foram transferidas
para as terapeutas. Elas passaram a ser vistas com o "anjos da g u a rd a '. Pessoas tipica­
mente lideradas esperam que o terapeuta faça tudo pelo grupo, resolva 05 im passes e
elim ine todos os desconfortas em ocionais e desacordos entre os mem bros.
Às vezes, 0 grupo aparenta um funcionam ento próprio porque há urna intrigante
sim ila rid a d e no co m p o rta m e n to de seus m em b ros, que parecem a g ir de um m odo
orquestrado. De acordo com Skinner (1953/1981), isso ocorre, em parte, porque co m ­
portar-se com o os outros tem grande chance de ser reforçado. Em grupos terapêuticos,
nas sessões iniciais, as pessoas tendem a arriscar pouco, concordar com os in te g ra n ­
tes do gru p o e repetir co m p o rta m e n to s que os te ra p e u ta s aprovam ou valorizam . É
com um , em sessões iniciais, que as pessoas evitem conflitos, apazigúem , ou em itam
v e rb a liz a ç õ e s im pessoais. Isso é um je ito de co m p o rta r-se do m esm o m odo com o
outros com portam -se, com conseqüências reforçadoras.
Em um grupo para pais de cria nça s com co m p o rta m e n to op o sitor, os pais
relatavam as dificuldades com seus filhos nas sessões iniciais, sem pre a te nu a n d o a
intensidade de suas preocupações e desconfortos. S oraia dizia: “A G abriela fa z essas
traquinagens, mas isso é corsa de criança. Além do m ais, o im portante é o amor. Nós a
am am os m uito.” Os outros pais integrantes do grupo verbalizavam coisas se m e lh a n ­
tes. Som ente em estágios m ais avançados do tratam ento é que eles falavam , fin a lm e n ­
te, de com o se sentiam com a desobediência de seus filhos e de que o relacionam ento
com suas crianças os preocupava, entristecia, aborrecia, irritava e fazia com que se
sentissem incom petentes e incapazes.
Os conceitos de com portam ento social (0 qual inclui o de com portam ento ver­
bal), de am biente social e de episódio social fornecem os fundam entos para a visão
que 0 TAC adota do grupo, assim com o para sua avaliação e para o planejam ento de
intervenções na m odalidade grupai.

Os ambientes sociais e a gênese de padrões comportamentais


O s a m b ie n te s so cia is exp lica m m uito s p a d rõ e s co m p o rta m e n ta is a p a re n te ­
m ente desajustados. Para entendê-los, é preciso co nsiderar inicialm ente que os seres
h um anos são extrem am ente sensíveis a reforços típicos de am bientes sociais. Assim ,
a atenção, a aprovação, a afeição e a subm issão são positivam ente reforçadoras, e n ­
quanto que a desaprovação, 0 desprezo, o ridículo e o insulto têm função aversiva para
as p e sso as (Skinner, 1953/1981).
Tais eventos, porém , não ocorrem em um esquem a de reforço contínuo. Eles
acontecem interm itentem ente, em esquem as de razão - e eventualm ente, alternando
in te rv a lo e razão. S eg u n d o S kin n e r (19 5 3 /1 9 8 1), “ C om o m uitas vezes 0 o rg a n ism o

Sobre Comportamento e Cognição 157


re fc rç a d o r pode não responder apropriadam ente, é m ais provável que o reforço seja
interm itente. O resultado dependerá do esquem a” (p. 287). O repertório com portam ental
da pessoa considerada chata ou im pertinente, por exem plo, pode ser entendido co n si­
derando o efeito da interm itência dos esquem as de reforço:

respondemos a pessoas com menos confiança do que respondemos a um am bi­


ente inanim ado (...) não nos convencem os tão rapidam ente que o m ecanism o
reforçador não esteja 'funcionando'. O comportamento persistente que denomina­
mos chato, é gerado por um esquema em razão variável, que se origina do fato de
que o reforçador responde apenas quando uma solicitação for repetida até que se
tome avp.rsiva - quando adquire a propriedade de aborrecer. (Skmnor (1953/1981,
p. 287).

O TAC considera o efeito desses esquem as para interpretar o com portam ento
dos clientes de um grupo terapêutico. A história de vida de cada m em bro gera nele um
padrão com portam ental que, m uitas vezes, perpetua seu sofrim ento, im pedindo que
ele transform e seu ambiente. A prom oção de m udanças nesse padrão com portam ental
c uma tarefa difícil cm razão da força da extensão, típica do responder sob controle de
am bientes sociais, conform e explicado na seção anterior.
M esm o padrões que parecem m uito estranhes e d ifíceis de entender podem
ser analisados, considerando o efeito de um esquem a interm itente de razão variável.
Eles podem ser gerados, por exem plo, p o r um a história de dem anda g ra d u a lm e nte
crescente do esquem a, Pode-se ilustrar com o caso de Edna, uma cliente que tolera
muita pressão e até insultos de outros do grupo e engaja-se, o tem po todo. em te n tati­
vas de agradar aos colegas do grupo terapêutico, ao terapeuta e ao co-terapeuta. Seu
padrão é mais subserviente do que sedutor. Em um e stágio avançado do processo
terapêutico, Edna descreve, autoconhecendo-se, que m esm o fazendo isso não co n se ­
gue obter o respeito e a afeição que gostaria do grupo. Edna chora muito ao fa la r isso.
O terapeuta lhe pergunta por que isso estaria acontecendo, ao que Edna responde com
o tato: "Talvez seja porque agindo desse jeito, eu não estou m ostrando quem eu real­
m ente sou". Mesmo com tantos prejuízos ao agir assim, o padrão com portam ental de
Edna se mantém. A explicação está em sua história de exposição a am bientes sociais
cujo esquema de reforço incrementou gradativam ente a exigência para que Edna em itis­
se mais e mais respostas de submissão, tolerância, adulação, etc. De acordo com Skinner
(1953/1981),

Quando uma pessoa reforçadora se tomo mais difícil de contentar, o reforço fica
contingente a um comportamento mais amplo ou altamente diferenciado Começan­
do com especificações razoáveis e aumentando gradativamente os requisitos, con­
tingências muito exigentes podem ser feitas, as quais seriam quase ineficazes som
essa história. O resultado muitas vezes é um tipo de escravidão humana, (p. 287).

O TAC precisa avaliar como o padrão apresentado pelos clientes vem se m a n ­


te n do no próprio g ru p o terapêutico e nos a m b ie n te s so cia is atu ais (V ila . S ilveira &
G ongora, 2003). Com o se pode ver, a sutileza na variação da exigência do esquem a
tende a não ocorrer no am biente físico. Nela, o esquem a te n de a não se a ju sta r à
freqüência do responder.
Em s u m a , o s a m b ie n te s s o c ia is re la c io n a m -s e à g ê n e s e d o p a d rã o
com portam ental observado em cada pessoa do grupo terapêutico. A exposição a esses
am bientes e a história de responder sob um esquem a interm itente com requintes de

158 Jocelaine M artin? da Silveira. Alexandre D iltrich


ajustam ento na freqüência do responder, dosando intervalo e razão, faz do reperlorm
atual de m uitos clientes algo custoso c doloroso para eles. com o no caso de Edn^i O
grupo terapêutico, por sua vez, constitui um am biente social com propriedades singnlíi
res, tendo a função de m udar relações contingentes nos am bientes sociais da histnnn
de vida dos integrantes.

Manejo do grupo e procedim entos terapêuticos: a ênfase no aqu i/


agora
Os grupos podem variar m uito em relação a seus objetivos e seu form ato. Ha
grupos fechados e abertos, isto é, grupos que podem receber novos m em bros a q u a l­
quer m om ento ou que uma vez iniciados, não estão abertos a novos integrantes, Há os
que são centrados em uma dada temática, por exem plo, obesidade, orientação de pais.
cônjuges separados, etc., enq ua n to outros são g rupos p sico te rá p ico s sem te m á tica
definida, Tudo isso, é claro, define o form ato ou a estrutura da sessão. E xem plos do
procedim entos em grupo adotados por TAC podem ser consultados em Aim eida (2003)
D g m odo geral, a sessão é com posta por uma abertura ou aquecim ento, uma tarefa
central referente ao objetivo principal do grupo e um fecham ento, que pode e n vo lve r o
estabelecim ento do tarefas entre uma sessão g outra. No fecham ento da sessão, o TAC
norm alm ente interpreta o m ovim ento do grupo, descrevendo eventos im portantes o co r­
ridos naquele encontro, valorizando o esforço de cada um em sua própria m udança de
com portam ento e na colaboração com a m udança dos dem ais m em bros.
Conform e já exposto, o TAC dá grande ênfase ao episódio social do grupo a fim
de identificar as variáveis controladoras dos com portam entos de cada mem bro. A busca
da observação direta do com portam ento se afina com um a prática bastante com um em
outras abordagens teóricas - a ênfase no aqui/agora. Ao observar e descrever diretam ente
o c o m p o rta m e n to das p e s s o a s no g ru p o , o T A C fic a em c o n d iç õ e s de g e ra r
a utoconhecim ento, indicando o evento que sucede ou a n tece d e um a dada resposta
crítica do cliente, Voltando ao exem plo extraído do texto de Yalorn (2005/2006), o p a cie n ­
te Gill dizia

‘ ~Ah, é bobagem minha, não sei direito, não sei avaliar bem isso. mas...

Julius interrompeu: - P are! Vamos congelar a ação nesse ponto. Nesse momento.
Virou-se para Pam : -O lh e o que Gill acaba de dizer. Está relacionado com você
não ouvir ou não conseguir ouvir o que ele diz?"

A intervenção de Julius é uma técnica m uito usada tam bém pelos TAC, e p e rm i­
te que os clientes identifiquem uma dada resposta em seu repertório e o que p ro va ve l­
m ente a estaria controlando.
O TAC encoraja a em issão de tactos acurados de eventos privados, p rincipa l­
m ente em g rupos terapêuticos, porque esses am b ie n te s sociais são m uito e sp e cia is
para a geração de autoconhecim ento e supõe-se que neles, cada m em bro, ao interagir
com os outros, tem oportunidades de m udar seus sentim entos em relação a si próprio.
O grupo terapêutico, quando adequadam ente m anejado, é um am biente social ótim o,
que prom ove o aprendizado da tolerância às diferenças alheias, da aceitação da sin g u ­
laridade de seu próprio repertório, do enfrentam ento de desafios e situações a m eaça­
doras, da experiência de intim idade e do respeito.

Sobre Comportamento e Cognição 1


C onsiderações finais
A p re s e n ta m o s a q u i u m a in tro d u ç ã o a o s p re s s u p o s to s da c lín ic a
com portam ental na m odalidade grupai. Ao atender pessoas na m odalidade grupai, o
TAC considerará, portanto, que: 1) quem se com porta são pessoas que com põem o
grupo, e nào ele próprio como entidade; 2) a análise funcional do com portam ento das
p e sso as em gru p o é a m esm a que em o u tro s a m b ie n te s n ã o so cia is - isto é, os
princípios de aprendizagem são os m esm os: 3) os fe n ô m e n o s tip ica m e n te g ru p a is
recebem tratam ento naturalístico, e são explicados pelas leis que regem o com porta-
men:o; 4) os fenôm enos grupais são com preendidos a partir da descrição do co m p o r­
tam ento de cada membro; 5) essa descrição pode ser realizada construindo um e p isó ­
dio social, o qual acaba esclarecendo com o cada membro do grupo ó m antido em seu
'p a p e l'1; 6) o a m b ie n te so cia l fa c ilita in te ra ç õ e s m ais in s tá v e is e g e ra p a d rõ e s
com portam entais m ais extensos e fle xíve is que outros am bientes, propriedades que
influenciam a m udança clínica; 7) o com portam ento verbal é m uito im portante em co n ­
textos grupais, e retaciona-se com as intervenções clínicas geradoras ae auto-observa-
ção e autoconsciência, as quais requerem a m odelagem de ta cto s e m andos; 8) a
história de vida das pessoas em am b ie n te s sociais gera padrões com p o rta m e n ta is
im prováveis em am bientes não so cia is; 9) e squem as in te rm ite n te s q ue aju sta m a
frequência do responder em intervalo e razão podem produzir padrões com portam entais
que resultam em sofrimento.

Referências

Almeida. C G (2003) Intervenções em grupo: estratégias psicológicas para a melhoria da qualidade


de vida. Campinas: Papirus.

Brandão, M. Z S., & Torres, N. (1997). Psicoterapia de grupo: uma experiência com ênfase nos
enfoques íuncional-analítico e contextual. Em: M Delitti (Org.) Sobre o comportamento e cognição:
A prática da análise do comportamento e da terapia cogn iti vo-comportam e n ta I (pp. 218-229).
Santo André: ESETec.

Johnston, J. M., & Pennypacker, H. S. (1993). Strategies and tactics o f behavioral research. Nova
Jersey: Lawrence Erlbaum associates publishers.

Yalom, l. D. (2005/2006). A cura de Shopenhauer. Rio de Janeiro: Ediouro.

Skinner, B. F. (1953/1981). Ciência e Comportamento Humano. 5ed. São Paulo: Martins fontes.

Vila, E. M., Silveira, J. & Gongora. M. A. N (2003). Ensinando repertório comportamental alternativo
para clientes que apresentam padrões comportamentais passivo e hostil. Em: C. G. Almeida (Org.)
Intervenções em grupo: estratégias psicológicas para a melhoria da qualidade de vida (pp. 59-81).
Campinas: Papirus.

Vinogradov, S , & Yalom, I. D. (1989/1992). Manual de Psicoterapia de Grupo Porto Alegre: Artes
Médicas.

160 Jocclainc M a rtins da Silveira, Alexandre D ittrich


Capítulo 13
A importância do envolvimento dos país
na vida escolar dos filhos*

A n a Paula V iczzcr S alvador


Lidia N atalia D obrianskyi W eb er
Universidade Federal do Paraná

A inserção e adaptação de crianças e a dolescentes ao contexto e sco la r tém


sido tem a de inúm eras pesquisas, nacionais e in te rn a cio n a is. M uitos estudos d iscu ­
tem a relevância de se considerar o aspecto m uítideterm inado do desem penho acadê­
mico (Hübner, 1999; Martini & Del Prette, 2002; M arturano, 1999; Mullis, Rathge & Mullis,
2003; Santos & G ram inha. 2005). Os fatores associados ao desem penho académ ico,
freqüentem ente apontados pela literatura, referem -se a: am biente fa m ilia r e atitudes
parentais, relação com professores, reíação com pares, aspectos da história de vida da
criança e c a ra cte rísticas e co m p o rta m e n to s do p ró p rio rep e rtó rio da criança. Com o
afirm am Freller e cols. (2001, p. 130), "as dificu ld a d es enfrentadas pelas cria nça s na
escoia são fenóm enos p ro d u zid o s por um a rede d e re la çõ e s que inclui a e sco la , a
fam ília, e a própria criança, em um contexto socioeconôm ico que engendra um a política
educacional específica” . Em m eio a esta grande rede de relações que interferem de
alguma m aneira na adaptação da criança ao contexto escolar, optou-se, neste trabalho,
em dar especial im portância para variáveis do relacionam ento familiar.
Uma extensa revisão de literatura verificou que um a grande variedade de pes­
quisas, realizadas desde a década de 80, apontam para um a direção em com um que
inclui m uito envolvim ento e pouca coerção. Parte sig n ifica tiva das pesquisas (28,3% )
ressaltou a im portância do en vo lvim e n to parental para o sucesso acadêm ico. E outra
parte (18,9% ), ressaltou o uso de coerção, hostilidade, punições com o fatores associ­
ados ao baixo desem penho acadêm ico (Salvador & Weber, 2007).
Por ser o ‘e nvolvim ento parental na vida e scolar dos filh o s’ o fo co central deste
trab a lh o , to rn a -se n e ce ssá rio d is c u tir m elhor tal co n c e ito . Je yn e s (20 0 5 ) d e fin iu o
envolvim ento parental com o sendo a participação no processo educacional e nas expe­
riências de suas crianças. C onceito bastante am p lo que, segundo os re su lta d o s en­
contrados por este autor, pode in cluir: com unicação so b re as atividades escolares, a
ajuda e supervisão nas tarefas de casa, expectativas parentais sobre o de se m p e n h o do

‘ O presente trabalho apresenta dados parciais da dissertação de mesl/adoda primeira autora sob orientação da segurrda aulora (Mestrado
do Progr&ma de Pós-Graduação em Ed.jfaçâo da UPPR

Sobre Comportamento e Cognição 161


filho, leitura com as crianças, assistência e participação ein reuniões escolares. Para
Soares, Souza e M arinho (2004, p.255), “o envolvim ento dos pais na vida acadêm ica
dos filhos é um aspecto que deve ser incentivado porque pode prom over condições
favorecedoras para a aprendizagem ” .
O e n vo lvim e n to dos pais em tarefas e sco la re s pode se r considerado com o
um a prática pare n ta l direcionada ao co m portam ento de estu do dos filhos. S egundo
Sam paio, Souza e Costa (2004). os pais podem ser considerados agentes de m udan­
ça, pois podem alterar condições antecedentes à ocorrência de com portam entos de
e s tu d o , m o d e la r re s p o s ta s e n v o lv id a s na e x e c u ç ã o de a tiv id a d e s a ca d ê m ica s e
c o n se q ü e n cia r a d e q u a d a m e n te ta is resp o sta s para q ue elas se m antenham . Além
disso, os pais tam bém podem ajudar na disposição de tem po e espaço na casa para a
realização das tarefas escolares, exigir o cum prim ento dessas tarefas e. ainda, contri-
buir com um clim a emocional favorável na fam ília, dem onstrando coesão, afeto, apoio e
ausência de hostilidade (D 'A vila-B acarjir M arturano & Elias, 2005).
Dada a relevância do assunto, neste trabalho objetivou-se investigar a reíação
entre o envolvim ento dos pais nas tarefas escolares dos filhos e o desem penho acadê­
mico dos filhos, bem com o fazer uma breve descrição da análise realizada a partir da
entrevista com dois adolescentes.

1. Participantes e instrumentos utilizados


Para a tingir os objetivos, este estudo foi d ivid id o em duas fases de coleta e
análise de dados: uma fase quantitativa e outra qualitativa.
Na fase quantitativa participaram 348 alunos de 6a a 8 a séries do ensino funda­
m ental de quatro escolas, públicas e privadas, localizadas na região de Curitiba. Os
participantes tinham idade entre 11 e 17 anos (m édia de 13,1 anos e desvio padrão de
1,2), sendo 56,3% do soxo fem inino e 43,7% do sexo m asculino.
Foram u tiliza d o s dois in stru m e n tos, e la b o ra d o s pelas pró p ria s pesq uisad o ­
ras especialm ente para a presente pesquisa:
1) Escala de E nvolvim ento dos Pais em Tarefas E scolares (EPTE), com 11
questões, avaliadas pelo sistem a Likert de 5 pontos, que são divididas em duas d im en­
sões: envolvim ento p o sitivo dos pais (EPP), que avalia o quanto os pais incentivam ,
ajudam e reforçam o com portam ento de estudo dos filhos; e envolvim ento negativo dos
pais (ENP), que avalia o quanto os pais brigam, castigam e punem o baixo desem penho
e pouco engajam ento dos filhos nos estudos e tarefas escolares. Para obter um escore
final, utilizou-se a equação EPP-ENP.
2) E scala de E nvolvim ento dos A d o le sce n te s em Tarefas Escolares (EATE),
com 9 questões, avaliadas pelo sistem a Likert de 5 pontos, que são divididas em duas
dim ensões: e nvolvim ento positivo dos adolescentes (EPA), que avalia o quanto o a do­
lescente sente o m om ento de estu do com o prazeroso, tendo a inicia tiva de revisar
conteúdos, a princípio, não solicitados pelos professores; e envolvim ento negativo dos
adolescentes (ENA), que avalia o quanto o adolescente se esquiva do estudo, procrastina
e apresenta d ificu ld a d e s em relaçã o às tarefas so licita d a s pe lo s professores. Para
obter um escore final, utiíizou-se a equação EP A -E N A .
Além dos dois instrum entos utilizados, o desem penho escolar dos adolescen­
tes foi acessado através de suas notas escolares, com o o fizeram Brancalhone, Fogo e
W illiam s (2004), Cruvinel e Boruchovitch (2004), Dalvesco, M attos, Benincá e Tarasconi
(1998), Gurlland, Kõrbes e Hernandez (2000) e Lemes e cols. (2003). Foi utilizada a

1 6 2 A n a Paula Viez?er Salvador, Lidía N aíalia Dobrianskyj VVcbcr


média das notas tiradas nas disciplinas de Português. M atem ática, Ciências, G eoqrafia
e História, do ano letivo de 2006.
O s in s tru m e n to s fo ra m a p lic a d o s c o le tiv a m e n te , c o m a d e v id a a u to riz a ç ã o d a s
e sc o la s , e os d a d o s fo ra m a n a lis a d o s atra vós do p ro g ra m a de c o m p u ta d o r S tn tis tic a l
P a c k a g e fo r th c S o c ia l S c ie n c e s (S P S S ), com a u tiliz a ç ã o d o te s te d e C o rre la ç ã o dc:
P e a rs o n .

N a fa se q u a lita tiv a p a rtic ip a ra m dois a lu n o s d e u m a e s c o la p ú b lic a lo c a liz a d a


na re g iã o d e C u ritib a . O c a s o 1 re fe re -s e à e n tre v is ta re a liz a d a co m o a d o le s c e n te
J u n io r1, da 6a série. O caso 2 re fe rc -s e à e n tre v is ta re a liz a d a com a a d o le s c e n te J u lia n a 1,
da 7 a sé rie . O s dois p a rtic ip a n te s d e s ta fa se fo ra m p re v ia m e n te s e le c io n a d o s a tra v é s
do c rité rio de m é d ia de no ta s: J u n io r co m e x c e le n te m e d ta d c n o ta s (7 7 ,7 , fo i a s e g u n d a
nota m a is a!ta en tre os p a rtic ip a n te s d e s ta e s c o la na fa s e q u a n tita tiv a ) e J u lia n a co m
m é d ia de no ta s b a s ta n te b a ix a (4 2 ,2 , foi a s e g u n d a no ta m a is b a ixa e n tre os p a rtic ip a n ­
te s d e s ta e s c o la na fa s e q u a n tita tiv a ). O alu n o com a no ta m ais alta e o a lu n o co m a nota
m a is b a ix a nã o a c e ita ra m p a rtic ip a r da fa s e dc e n tre v is ta s , p o r isso h o u v e a e s c o lh a da
s e g u n d a n o ta m a is alta e s e g u n d a n o ta m a is baixa.

N e s ta fa s e , fo i u tiliz a d o um ro te iro de e n tre v is ta s e m i-e s tr u tu ra d o p a ra a re a liz a ­


ção d a s e n tre v is ta s . A s e n tre v is ta s in d iv id u a is fo ra m re a liz a d a s na p ró p ria e s c o la , com
a d e v id a a u to riz a ç ã o d a d ire ç ã o d a e s c o la e dos pa is.

2. Resultados da fase quantitativa


A re la çã o e n tre as v a riá v e is d e e n v o lv im e n to (e n v o lv im e n to d o s p a is na s ta re fa s
e s c o la re s d o s filh o s , e n v o lv im e n to d o s a d o le s c e n te s n a s ta re fa s e s c o la re s ) e o d e ­
s e m p e n h o a c a d ê m ic o foi in v e s tig a d a p o r m e io do te s te d e C o rre la ç ã o de P e a rs o n . O s
re s u lta d o s p o dem s e r v is u a liz a d o s na T a bela 1 .

Tabela 1: Coeficientes de Correlação de Pearson entre as variáveis de envolvimento nas tarefas


escolares (E P P-Envolvim ento positivo dos pais; E N P -E nvolvim ento negativo dos pais; EPA-
E nvolvim ento positivo dos adolescentes; EN A-Envolvim ento negativo dos adolescentes) e o
desempenho acadêmico dos filhos

Desempenho acadêmico dos filhos

Envolvimento dos pais nas tarefas -0,009


escolares dos filhos EN3 -0,319”
Total (EPP-ENP) 0.231**

Envolvimento dos adolescentes nas EPA -0.008


tarefas escolares -0,267**
ENA
Total (EPA-ENA) 0,162*
* Nlvel de significânáa de 0,Q. Nível de significar,cia de 0,001

Pode-se observar, na Tabela 1, que o envolvim ento negativo dos pais nas ta re ­
fa s e sco la re s (ENP) ap re se n to u co rrelação in ve rsa m e n te pro p o rcio n al ao d e se m p e ­
nho a ca d ê m ico dos filh o s (r = -0,319), ou seja, q u a nto m aior foi o uso de co n tro le
a v e rs iv o d o s pais, m e n o r foi o d e se m p e n h o a ca d êm ico a p re se n ta d o p e lo filh o . D e
a c o rd o com Regra (2004) e S o a re s e cols. (2004), o uso de sistem as ave rsivo s de
co n tro le não leva a m ud a n ça s no co m p o rta m e n to do filh o em relação aos estudos.
1Os noTics dos partidpanles são fictícios

Sobre Comportamento e Cognição 163


C a s tig o s , retirada de privilégios, punição física, broncas, se rm õ e s, hum ilhações sâo
práticas que nao ensinam com portam entos adequados, como, por exemplo, realizar as
tarefas escolares (Soares & cols., 2004).
M esm o não sendo um a estratégia eficaz, Regra (2004) enfatiza que m uitos
pais, sem orientação adequada, acreditam que o uso de castigos e de controfe aversivo
possa realm ente co n trib u ir para que o filho estude de form a apropriada e o utilizam
freq ü e n te m e n te . P orém , pais q ue coagem seu filho para q u e ele estude, utilizando
punição física ou restringindo seus privilégios (proibindo o uso de televisão, vídeogame,
sair com am igo s), acabam por co n se g u ir efeitos d ife re n te s do que esperam . Para
S oares e cols. (2004), quando os ca stig o s são relacion a d o s a questões escolares,
podem contribuir para a falta de interesse do filho por assuntos da escola, que pode
passar a não querer m ais fazer as tarefas escolares, não querer ir para a escola ou não
prestar atenção no que lhe é ensinado. O filho pode tam bém aprender a utilizar burlas
de forma mais refinada para esquivar-se do controle aversivo dos pais (Reqra. 2004).
Além disso, há o g ra n d e problem a dos inúm eros su b p ro d u to s gerados peio uso da
coerção, com o a raiva e o medo do punidor que, para Regra (2004), dificultam o desen­
volvim ento da autocrítica da criança ou adolesccnte.
A Tabela 1 m ostra também que o envolvim ento negativo do adolescente com as
tarefas escolares (EN A) apresentou correiação inversam ente proporciona! ao seu d e ­
sem penho (r - -0,267), ou seja, quanto m aior foi o envolvim ento negativo do aluno, mais
baixas foram suas notas. O adolescente que apresenta dificu ld a d es na execução da
lição, e com portam entos de fuga e esquiva, se expõe m enos às situações de aprendi­
zagem do que aquele adolescente que não apresentam dificuldades na execução da
lição, que é mais concentrado, e que apresenta com m enor freqüência com portam en­
tos de fuga e e sq u iva (R egra, 2004). Para esta autora, se o adolescente se expõe
m enos às tais situ a çõ es, ele aprende m enos, e isto pode ag ra va r sua dificuldade e
fo rta le ce r seus com portam entos de esquiva.
Foi também importante verificar a relação entre as duas variáveis de envolvimento:
o envolvimento dos pais nas tarefas escolares dos filhos e o envolvim ento dos filhos nas
tarefas escolares. Na Tabela 2 estão apresentados os resultados desta Correlação.

Tabela 2: Coeficienles de Correlação de Pearson entre envolvimento dos pais nas tarefas escolares
(EPP-Envolvimento positivo dos pais; ENP-Envolvimento negativo dos pais) e envolvimento dos
adolescentes nas tarefas escolares (EPA-Envolvimento positivo dos adolescentes; ENA-Envolvimento
negativo dos adolescem es)
Envolvimento dos adolescentes nas
tarefas escolares
EPA ENA Total (EPA-ENA)

Envolvimento dos pais EPP 0,473” -0,249** 0,407”


nas tarefas escolares B \P 0,034 0,186** -0,094
dos filhos
Total (EPP-ENP) 0,390* -0,360*’ 0,429**
' Nivel de signNtóindadeO,05 ** Nível de signrfieância de 0,001.

Pode-se observar, na Tabela 2, que o EPP esteve diretam ente relacionado ao


EPA (r ~ 0,473) e inversam ente reiacionado ao ENA (r = -0,249), isto significa que o
envolvim ento positivo dos pais (EPP), com o ajuda e incentivo, pode contribuir para que
o ad o le scen te se e n vo lva de fo rm a m ais e fica z e a d e quada com as suas próprias
tarefas escolares. S eg u n d o R osário e cols. (2005), pais que valorizam o papel da esco-

A n a Paula Vie?zer Salvador, Lidia N atalia Dobrianskyj Weber


ja e m anifestam m aior expectativa de p io g re s s á o acadêm ica m odelam c o m p o rta m e n ­
tos escolares de se u s filhos mais favoráveis a o sucesso acadêm ico. Coopet, L in d s a y e
Nye (2000) verificaram que p a is que oferecem m aicr suporte para a autonom ia tinham
filhos que faziam suas tarefas e s c o la re s de form a mais com pleta.
Verificou-se também quo o ENP esteve diretam ente relacionado ao ENA (r -
0,186), demonstrando novamente que o uso de coerção por parte dos pais. principalm en­
te vinculado aos assuntos acadêm icos, pode ser prejudicial para o envolvim ento do a d o ­
lescente com seus estudos (Hübner. 1999; Regra, 2004; Soares & cols., 2004).

3. Resultados da fase qualitativa:


3.1. Caso 1
O C a s o 1 re fe re -s e à e n tre v is ta re a liz a d a co m o adolescente Jun io r, da sé rie .
Na o c a s iã o d a en tre v is ta , J u n io r e s ta v a com 12 anos e m orava co m s e u s p a is e um
irm ã o m a is velho (de 19 an o s, qu e fa z ia ü c u rs o d e pedagogia). A b a ix o s e g u e a d e s c ri
ç ão da s in fo rm a ç õ e s o b tid a s a tra v é s da en tre vista .

a) A titudes e sentim entos do aluno:


• O pinião sobre a im portância do estudo. Junior afirm ou que considera o estudo algo
m uito bom , falou que “a inteligência traz beleza' . A credita que o estudo possa lhe
proporcionar, futuram ente, um bom emprego, e que é o cam inho para conseguir as
coisas que quer, como ter um carro equipado e ter dinheiro para ajudar a sua fam ília
e ou tra s pessoas necessitadas.
- Percepção do próprio d esem penho acadêm ico. Junior se considerou um ótim o a lu ­
no, afirm ou que se sente com o o “rei do m undo" e disse “eu me abro de felicidade,
porque eu adoro tirar nota boa e ver todo m undo feliz” .
- Perspectiva de futuro profissional. Junior expressou sua vontade em ser cientista ou
astronauta. Explicou que gostaria de ser cientista para fazer rem édios que pudessem
ajudar seu pai e as pessoas que precisam.
- Estratégias de estudo. Ju n io r relatou estudar diariam ente, sendo que costum a a lte r­
nar o seu horário de estudo, “pra m udar o meu ritmo, pra fica r mais agitado” . Ju n io r
intercala seu estudo com atividades de lazer, com o jo g a r bola, visitar seus tios, jo g a r
videogam e, assistir film es etc. Afirm ou que. às vezes, estuda com a televisão ligada,
mas que quando é para estudar sério m esm o (quando tem prova) costum a e studar
no quarto, sem televisão e sem computador, pois assim se concentra melhor. Sobre
as estratégias utilizadas, relatou que costuma fazer um a leitura, página por página, do
conteúdo que precisa estudar, Depois tenta relem brar o conteúdo estudado, e volta
nas p áginas anteriores para co n ferir o que conseguiu relem brar, e então, fa z uma
nova leitura. Disse que, quando tem provas, costum a elaborar perguntas para depois
respondê-las e para seus pais ou seu irmão lhe "tom ar" o conteúdo. Também já fe z
resu m o s da m atéria da prova, e sp e cia lm e n te qu a nd o p re ciso u re cu p e ra r a lg u m a
nota, pois afirm ou que fazer resum os ajuda bastante a fixa r o conteúdo. Ju n io r relatou
que foi seu irmão que lhe ensinou a estudar desta form a.

b) A m biente físico:
- Local de estudo. Junior relatou que costum a estudar na sala ou no seu quarto. P ortan­
to, não parece haver um local específico para o estudo, já que Junior estuda ou no
sofá ou na sua cama. Entretanto, afirmou se sentir m uito bem nestes locais, e que

Sobre Comportamento e Cognição 1 65


sua mãe cotnprou uma alm ofada para colocar na cama, que fica encostada na p a re ­
de e que ele usa com o cncosto. sentindo-se confortável para estudar.
- Acesso a recursos. Junior relatou ter em casa um com putador, porém som acesso à
internet. A!ém do com putador, Ju n io r relatou ter acesso a m uito s livros, pois seu
irmão, que gosta m uito de livros, compra e os deixa à d isposição de Junior.

c) Relacionam ento com pais


- Escolaridade e ocupação dos país. A mãe de Junior estudou som ente até a 4 a série e
seu pai até a 5a série. Seu pai, na ocasião da entrevista, era bom beiro, com 24 anos
de profissão, e sua m ãe era dona de casa. Além disso, J u n io r relatou que seu pai é
presidente da APM da escoia e também da Associação de M oradores do bairro onde
m oram .
- Regras que os pais apresentam sobre o estudo. De acordo com Junior, seus pais
costum am dizer que o estudo e m uito importante, que para ser alguém na vida. para
ter um bom em prego e dinheiro precisa estudar bastante. De a cordo com Junior, seus
pais parecem dem onstrar certa frustração por não terem tido oportunidade de estudar
quando adolescentes, pois acreditam que poderiam ter um a vida m elhor se tivessem
estudado. O adolescente contou que seu pai lhe disse: “tá vendo, Junior, se o pai
tivesse estudado mais, já seria um cabo ou sargento".
- M odelo de com portam ento que os pais oferecem em relação aos estudos. Os pais
e o irmão de Junior parecem dem onstrar um hábito fre q ü e n te de leitura, “a m inha
fam ília gosta m uito de ler” . Junior relatou que sua m ãe e seu pai costum am ler revis­
tas e que seu irm ão sem pre lê os livros da faculdade.
- A titudes dos pais que antecedem o com portam ento de estudo. De acordo com
Junior, seus pais g e ra lm e n te não precisam de term in a r h o rá rio ou local para seu
estudo. Disse que seus pais apenas fazem avisos ou pedidos para que Junior possa
se organizar com suas atividades, como, por exemplo: “Junior, nós vamos sair, então
dê uma estudada antes ai, né, que nós vam os ter que s a ir’, “quando estou estudando
com a televisão m uito alta, ela fala 'Junior abaixa um pouco aí, porque senão você não
vai conseguir se concentrar m uito’ “. Relatou que seus pais sem pre o aconselham a
estudar, conversando e incentivando, m esm o quando Ju n io r está com preguiça dc
estudar. E, ta m b é m , que seus pais o ajudam a estudar, a ju d a n d o a relem brar a
matéria e fazendo perguntas.
- Atitudes dos pais que conseqüenciam o com portam ento de estudo. Os pais de Junior
costumam lhe dar perm issão para jogar bola com seus am igos depois de estudar. Em
relação às notas, afirmou que seus pais sempre ficam felizes quando tira notas boas e
que costum am falar ‘‘Parabéns! Continue assim! Você está m uito bom! Tomara que
você passe de ano!”, mas quando a nota não é muito boa, eles falam “estude, estude,
estude, porque senão o bicho pode pegar!", sendo que Junior relatou achar engraçada
a forma com o seus pais (Fie dizem isso. Quando sua nota não é m uito boa seus pais
também o encorajam a estudar e se esforçar mais, dizendo "Junior, você tem que se
esforçar agora, porque senão essa nota pode reprovar. (...) Você tem que passar, com
certeza. Se você passar, daí sai da escola mais cedo, e nós vam os poder viajar m ais” .
Contou também que, nas férias no meio do ano, sem pre sai para passear com seus
pais e seu irmão, vêem jogos de videogame, “eles sem pre estão me aconselhando e
me dando coisas que eu gosto". Seus pais também falam que se Junior passar de ano
lhe darão um presente, e então “eu estudo, estudo, estudo, mas não é só porque eles
vão dar um presente, é que eu adoro estudar” .

1 6Ó A n a Paula Viezzcr Salvador, Lidia Natalia Dobrianskyj W eber


- Sentim entos em relação às atitu des d o s pais. Junior sfirm ou que gosta m uito do jeito
de seus pais, “eu adoro eles, eles m e adoram! Eu adoro o jeito deles com igo, e a
m inha vida!". Disse que eles não precisariam m udar em nada.
Além das inform ações o b tid a s na e n tre vista , in fo rm a çõ e s c o m p le m e n ta re s
foram obtidas através das escalas de envolvim ento (Escala de E nvolvim ento dos Pais
em Tarefas Escolares e Escala de Envolvim ento dos Adolescentes ein Tarefas E sco la ­
res). Os resultados dem onstraram que os escores m arcados por Junior em cada um
dos instrum entos foi superior ao escore obtido para ponto de cortu (quartil 75) da a m o s­
tra total.
Quanto ao envolvim ento dos pais nas tarefas escolm os. o b se rvo u -se que o
escore apresentado por Junior (escore de 30) no lotai (FPP t-NP) foi berri superior ao
quartil 75 (que foi um escore de 18), dem onstrando, mais uma vez. a p re d om inância de
práticas educativas adequadas e não-coercitivas.
Q uanto ao envolvimento do adolescente nus tarefas escolares, verificou-se que
o cscore de Junior {escore de 2) dem onstrou um envolvim ento positivo com o estudo,
sendo seu escore Total (EPA-ENA) igual yo quartil 75 (que também foi um cscore de 2).
O s da d os coletados a tra vé s da entrevista e das escalas a p o nta ra m p ara a
discussão de aigum as im portantes hipóteses que podem explicar o ótim o d e s e m p e ­
nho acadêm ico de Junior. Estas hipóteses referem -se ao manejo adequado de a n te c e ­
dentes e de conseqüências p or parte dos Dais do ad o le scen te , que ca ra cte riza m a
pre d o m in â ncia do uso de d iscip lin a indutiva (nã o -co e rcitiva ). Q uanto ao m a n e jo de
antecedentes e conseqüências, po d e-se citar:
1) M odelo parental. A leitura parece ser um hábito valorizado na fam ília de Junior. O
a dolescente relatou que seus pais costum am ler revistas e que seu irm ão costum a
ler (ivros da faculdade com bastante freqüência. Portanto, tal com portam ento dos pais
e do irm ão pode funcionar com o um estím ulo discrim inativo, apontando, para o a d o ­
lescente, a possibilidade de reforço quando agir de form a sem elhante.
2) Uso de regras claras. De acordo com o relato de Junior, seus pais parecem e sp e ci­
fic a r c la ram e n te a im p ortâ n cia de e stu da r e, e sp e cia lm e n te , as c o n s e q ü ê n c ia s a
m édio e longo prazo do estudo, desde ganhar um presente ou sair viajar no fim do ano
até poder "ser alguém na vida", ter um bom em prego, crescer p ro fissio n a lm e n te e
g a n ha r m ais dinheiro.
3) Envolvim ento dos pais nas tarefas escolares. De acordo com os resultados obtidos
na escala e tam bém na entrevista, pôde-se observar que os pais de J u n io r têm um
envolvim ento bastante ativo na sua vida académ ica, através de ajuda, incentivo, o rie n ­
tação, aconselham ento (atitudes que podem ser tanto antecedentes com o co n se q ü ­
ências). As atitudes parentais de valorização do estudo, perm eadas por um am biente
fa m ilia r afetivo e protetor, podem contribuir positivam ente para o aprendizado de Junior,
fortalecendo a regra de que o estudo é realm ente im portante.
4) Uso de reforçadores positivos. Pôde-se perceber que os pais de ju n io r utilizam
reforçadores positivos com bastan te freqüência, especialm ente a e xp re ssã o de afeto
e alegria. Além disso, os pais de Junior oferecem conseqüências de atividade, com o
p o d er jo g a r bola, passear com a fam ília, viajar no fim do ano, e conseqüências m a te ­
riais, com o presentes. As con se qü ê n cia s m ateriais parecem ser m ais esp o rá d ica s.
T odos os a n te ce d e n te s e co n se q ü ê n cia s d is cu tid o s podom te r c o n trib u íd o
para o desenvolvim ento de um repertório com porta m ental adequado de Junior em rela­
ção ao estudo. Este repertório adequado inclui o uso de estratégias eficazes (re visa r a

Sobre Comportamento e Cognição


m atéria, elaborar perguntas e repostas, fazer resumos) e a clareza sobre a im portância
do estudo e sobre o que ele pode proporcionar (conseqüências a curto e longo prazo),
com o, por exemplo, “eu vou estudar pra não ficar nervoso na hora da prova", “Eu estudo
f 5 h
bastante inglês, porque eu quero levar eles (a fam ilia) pra outros p a ises” .
Além de com portam entos acadêm icos adequados, Junior dem onstrou, duran­
te a entrevista, um repertório de com portam entos altruístas, expressando grande dese­
t*

jo em a judar ou tra s pessoas (da fa m ilia ou não). Tais co m p o rta m e n to s podem ser
^ y if

decorrentes de valores fam iliares e religiosos, urna vez que a fam ília é bastante envol­
vida com a com unidade e com a igreja, e também da profissão do pai, que é bombeiro.

3.2. Caso 2
O Caso 2 refere-se à entrevista realizada com a adolescente Juliana, da 7a
'I série. Na ocasião da entrevista, Juliana estava com 14 anos e m orava com seus pais e
' um irmão mais velho. Abaixo segue a descrição detalhada das inform ações obtidas
através da entrevista.

a) A titu des e sentim entos do aluno:


- Opinião sobre a importância do estudo. Juliana afirmou que considera o estudo algo
muito chato, algo que ela odeia fazer. Entretanto, sua resposta pareceu confusa, pois
quando questionada do porquê de ser chato, disse que o estudo é importante para seu
futuro e que é só por isso que ela ainda vai para a escola. Acredita que o estudo possa lhe
proporcionar, futuramente, a possibilidade de uma faculdade e de um bom emprego.
- Percepção do próprio desem penho acadêm ico. Juliana se considerou uma péssim a
aluna, a trib u in d o seu d e sin tere sse pelo estudo à fa se da a d o le scê n cia que está
passando, fase na qual só pensa em nam orar e que não tem tem po para o estudo.
- Perspectiva de futuro profissional. Juliana expressou interesse em ser veterinária e
tam bém em ser m odelo.
- Estratégias de estudo. Juliana relatou que trabalha diariam ente no restaurante de seu
pai, e muitas vezes, nos finais de sem ana também . Afirm ou que esta atividade a deixa
estressada. E, no tem po que teria disponível para estudar, não o faz. Juliana disse
q ue estuda a penas na segunda de noite ou quando tem algum a lição para o dia
seguinte, e afirmou que ‘dura n te a sem ana eu nem estudo nada” . Relatou que, quan-
!! ( do estuda, o faz sem pre com o som ligado, ouvindo vários tipos de m úsica, disse que
‘ assim consegue estudar melhor. Sobre as estratégias utilizadas, relatou que costu-
,-ir^ ma somente responder perguntas, e estas perguntas são feitas geralm ente ou pela
J j;^ professora ou p e ia sua m ãe. Além d isso, m uitas p e sq u isa s e tra b a lh o s não são
feitos por Juliana, m as sim por seu irmão, “ele sai com o trabalho pronto já e eu nem
preciso fazer n a d a ” . Para Juliana, e stu d a r assim “é m ais fáciT', pois só responde
‘•iL perguntas sobre o que a professora disse que será cobrado na prova.

b) Am biente físico;
- Local de estudo. Juliana relatou que costum a estudar na cozinha, perto da sala de
estar e da sala de televisão, onde se pode escutar a televisão. Disse que não gosta de
estudar em seu quarto por se sentir m uito isolada e, tam bém , porque uma de suas
irm ãs dormia ali com ela, mas era uma irmã com o qual m antinha um relacionam ento
m uito conflituoso.
- A cesso a recursos. Juliana relatou ter em casa um com putador, com acesso à Internet
banda larga, porém afirm ou que o utiliza som ente para conversar com am igos. Além

1 6 8 A n a Paula V ie7/er Salvador, Lfdía N alalia Dobiiànskyj W eber


do com putador. Juliana relatou ter alguns livros cm sua casa, m as que nunca teve
interesse em ler. Contou que sua m ãe com prou m oveis (escrivaninha e arm ário, até
m esm o o computador) para que tivesse um local apropriado para estudar, m as estes
móveis foram colocados em seu quarto, lugar onde não gosta de ficar.

c) Relacionam ento com pais:


- Escolaridade e ocupação dos pais. A mãe de Juliana estudou som ente até a 7a série
e acha que seu pai estudou até a 4y série, m as não tem certeza. Seu pai, na o casião
da entrevista, trabalhava com um restaurante, e sua m ãe trabalhava com o atendente
num consultório odontoiógico. De acordo com Juliana, sua inãe parece d e m o n strar
certa frustração em ter interrom pido seus estudos. A m àe de Juliana, a p e sar de se m ­
pre apresentar notas muito boas e de ter m uita vontade de continuar os estudos, teve
que p a ra r o estudo para trabalhar, pois seu pai (avó de Juliana) adoeceu.
- Regras que os pais apresentam sobre o estudo. De acordo com Juliana, seus pais
não falam muita coisa sobre a im portância do estudo. Relatou que sua m ãe diz que
precisa estudar porque um dia vai precisar do que a professora ensinou, “ela fala que
tem que estudar, que eu vou ver que vou precisar. Nada a ver aquelas coisas que a
professora passa, eu nunca vou u sa r!’’. E seu pai “faia que é pra estudar, porque ele
não vai estar aqui a vida inteira".
- M odelo de com portam ento que os pais oferecem em relação aos estudos. O pai de
Jufiana lê som ente docum entos e co n tra to s referentes ao re sta u ra nte e sua m ãe
costum a le r somente livros de rom ance esporadicam ente.
- A titu des dos pais que antecedem o com portam ento de estudo. De a cordo com
J u lia n a , sua mãe procura d e te rm in a r ho rá rio s para o e stu do , m as Ju lia n a n ã o a
obedece. Sua mãe falou para fa ze r um calendário, um a espécie de p ro g ra m a de
atividades, delim itando bem quais são as atividades e o horário para fazê-las. e então
Juliana disse “eu falo pra ela fazer tam bém , dai ela nem faz, m inha m ãe é m eio louca
assim , m as ela nem faz, ela só fa la ’’. Juliana tam bém afirm ou que existe um a co m u ­
nicação m uito negativa com sua m ãe, que eia só xinga, grita e briga. A lém disso,
p a re ce h a ve r um a in co n sistê ncia de regras e ntre a m ãe e o pai de Ju lia n a , pois
quando a sua mãe insiste e briga para que Juliana estude, seu pai diz “deixe ela, se
ela q u ise r ir, ela vaí’\ A m ãe de Juliana ajuda nos estudos som ente e la borando p e r­
guntas, “às vezes eu peço pra m inha m ãe fa ze r pra mim (as perguntas), ela lè o texto
e faz as perguntas e me dá a folha, daí eu só respondo".
- A titu d e s dos pais que conseqüenciam o com portam ento de estudo. Juliana relatou
que costum ava tirar notas boas quando criança, m as foi perdendo o in te re sse nos
estudos. Diante desta m udança e desinteresse, Juliana relatou que sua m ãe co m e ­
çou a briga r e xingar muito, “toda hora ela me xinga" e “ eia ainda briga e é briga feia!".
Juliana relatou que sua m ãe não bate “porque m eu pai não deixa m inha m ãe bater em
mim e ele não me bate” . Em relação às notas, afirm ou que geralm ente não m ostra
seu bo le tim aos seus pais, e q ue no 1o bim estre de 2006 sua mãe foi pegar o boletim
e fe z um escândalo na escola, b rigando com Juliana. A adolescente d isse q u e se
sentiu envergonhada, e que nos outros bim estres sua m âe não falou m ais nada.
- Sentim entos em relação às atitudes dos pais. Juliana afirmou que o relacionam ento
com seus pais é péssimo. Disse que seu pai é mais legal, mas que sua mãe é m uito
chata. Juliana relatou que gostaria de poder sair mais, pois, além de ter que trabalhar a
sem ana toda, disse que seu pai é cium ento e que seus pais não chegam ao acordo
sobre a perm issão de sair.

Sobre Comportamento e Cognição 169


Além das inform ações o b tid a s na e n tre vista , in fo rm a çõ e s co m p le m e n ta re s
foram obtidas através das escalas de envolvim ento (Escala de Envolvim ento dos Pais
em Tarefas Escolares e Escala de Envolvim ento dos Adolescentes em Tarefas E scola­
res). Os resultados dem onstraram que alguns dos escores m arcydos por Juliana em
cada um dos instrum entos foi inferior ao escore obtido para ponto de corte (quartil 25)
da amostra total.
Quanto ao envolvim ento dos país nas tarefas escolares, observou-se que o
escore apresentado por Juliana (escore de 12) no Total (EPP -E N P) m ostrou-se inter­
m ediário, ou seja, entre os quartis 25 e 75 (que foram 5 e 18 respectivam ente). E ntretan­
to. o escore de envolvim ento positivo dos pais (EPP) foi inferior (escore de 29) ao quartil
25 (que foi um escore de 32). Isto dem onstra que havia pouco apoio e incentivo dos pais
de Juliana.
Q uanto ao envo lvim e n to da ad o le scen te nas ta re fa s esco la re s, ve rificou -se
que o escore de Juliana (escore de -3) tam bém se m ostrou interm ediário, ou seja, entre
os quartis 25 e 75 (que foram -6 e 2 respectivam ente).
Os dados coletados através da entrevista e das escalas apontaram para a
discu ssã o de algum as im portantes h ipóteses que podem explicar os problem as a c a ­
dêm icos e desinteresse de Juliana. Estas hipóteses referem -se ao m anejo ina d e qu a ­
do de antecedentes e de conseqüências por parte dos pais da adolescente, que ca ra c­
te riza m a p redom inância do uso de d iscip lin a coercitiva e in co n siste nte . Q u a nto ao
m anejo de antecedentes e conseqüências, pode-se citar:
1) Uso de regras inconsistentes. Pôde-se perceber inconsistência entre as regras
co locadas pela m ãe e pelo pai de Juliana. A adolescente citou três situ a çõ es de
discordância entre seus pais: quanto ao bater (porque meu pai não deixa minha m ãe
bater em mim e ele não me bate), quanto a deixar sair (quando eu peço pra sair, daí
ele fala "Peça pra sua m ãe", dai eu peço pra ela, e ela "Peça p ro teu p a í\ ai eu fico
naquele lero-lero e nem saio), e principalm ente, quanto ao estudo (estudo só na hora
que me dá vontade, a minha mãe q ue fica falando, meu pai é m ais legal, m inha mãe
é chata. Daí o meu pai faia "deixe ela, se ela quiser ir. ela vai”).
2) Pouca valorização do estudo. De acordo com o relato de Juliana, seus país parecem
não especificar claram ente a im portância de estudar, nem as conseqüências a longo
prazo do estudo. Aqui há dois pontos a se destacar. O prim eiro é o fato de Juliana
passar considerável tem po de sua sem ana trabalhando no restaurante de seu pai,
dem onstrando que o estudo não é visto pela fam ília com o algo prim ordial. E o segun­
do é o tipo de regra exposta pelo pai (meu pai fala que é pra estudar, porque ele não
vai estar aqui a vida inteira). Uma regra deste tipo parece não incentivar a autonom ia
da filha, pois pode dar a idéia de que enquanto o pai estiver vivo e com saúde será
responsável pelo sustento de Juliana, e a preocupação com o próprio sustento pode
parecer algo m uito distante.
3) Uso inadequado de reforçam ento. Pôde-se perceber que a m ãe e o irmão de Juliana,
provavelm ente com o intuito de ajudá-la ou apenas de atender uma solicitação, fazem
trabalhos e leituras por ela. A o fazerem isto, a m ãe e o irmão reforçam com portam en­
tos inadequados de Juliana (de pedir que outras pessoas façam ), que são co m p o rta ­
m entos de fuga e esquiva das tarefas e do estudo.
4) Controle coercitivo pela mãe. Juliana relatou que sua m ãe utiliza controle coercitivo
de form a intensa e freqüente, brigando e xingando. É im portante relem brar aqui que o
uso de coerção gera uma série de subprodutos e efeitos colaterais. Tais com porta­
mentos da mãe, além de gerar raiva e ressentim ento, tam bém podem contribuir para

A n a Paula Viezzcr Salvador, Lidia N atalia Dobrianskyj W eber


a construção de auto-regras negativas, com as quais Juliana pode se auto-avaliar
como incapaz e incompetente. Auto-regras negativas podem fazer corn que Ju liyn n :;e
esquive cada vez mais do contexto escolar, dim inuindo suas possibilidades de a p re n ­
dizagem .
Ju lia n a apresentou, no início de sua a d o le scê n cia , um grande d e sin te re sse
pelos estudos (nos anos iniciais apresentava boas notas, na 6a serie reprovou, e, na
o ca s iã o da entrevista, estava na em inência de reprovar novam ente na 7* série). A través
da entrevista realizada, não foi possível investigar m ais profundam ente as variáveis que
fizeram com que ocorresse taf desinteresse e esquiva, pois Juliana apenas explicou
seu desinteresse com o decorrente da fase da a d o le scê n cia . Entretanto, a inte ra çã o
com seus pais atualm ente (antecedentes e co n se qü ê n cia s discutidos a n terio rm e n te )
pode ter contribuído para o desenvolvim ento e fortaleci m ento de um inadequado re p e r­
tório co m p o rta m e n ta l de Juliana em relação ao e stu d o . E ste rep e rtó rio in a d e q u a d o
inclui com portam entos de fuga e esquiva do estudo (eu não queria estudar, tinha mês
que eu nem ia pra aula, ficava só na rua, ficava no quarto sem fazer nada, d o rm ia ) e
pouca clareza sobro a im portância do estudo e so b re o que ele pode p ro p o rcio n a r
(conseqüências a curto c Songo prazo), como, por exem plo, relatou que em provas 'e u
durmo! Nossa fico agoniada com a prova, eu quero rasgar e tirar da m inha fre n te ” , e.
ainda, “agora que eu vejo, que dou im portância, agora no fim do ano, porque daí precisa
de nota (...) até o meio do ano pensa que é festa".

4. Considerações finais:
Os resultados, apresentados no presente trabalho, levarn a d iscussão de a l­
guns a spectos extrem am ente relevantes, destacados abaixo:

4.1. Modelo parental em relação ao estudo


Os pais dos dois adolescentes parecem ter hábito de leitura, e n tre ta n to , os
pais e irm ão de Junior (o pai que estuda para cursos no corpo de bom beiros e o irm ão
que estuda para a faculdade) parecem ter uma leitura m ais acadêm ica, Há a utores que
ressaltam a im portância do m odelo parental para o aprendizado dos filhos, sendo que
"as crianças aprendem o que etas vivenciam ” (Severe, 2000, p.39), e por isso "os pais
devem se com portar como gostariam que seus filhos se com portassem " (W eber, 2005,
p. 124). Portanto, o hábito de leitura e o com portam ento de estudo dos pais pode ser um
im portante fa to r para o desenvolvim ento do m esm o repertório nos filhos.

4.2. Regras que os pais apresentam sobre o estudo


Os de Junior apresentavam regras claras e consistentes sobre a im portância do
estudo e sobre as conseqüências advindas do estudo (a curto e longo prazo). Porém , os
pais de Juliana apresentavam regras inconsistentes sobre o estudo e com pouca clareza
das conseqüências a longo prazo. Alguns autores verificaram que filhos de pais que
apresentam regras inconsistentes e sem clareza se m ostraram menos m otivados, per­
sistentes, satisfeitos e com pior desempenho (Ginsburg & Bronstein, 1993; Hill, 2001).

4.3. Envolvimento dos pais nas tarefas escolares


Ju n io r relatou grande envolvim ento de seus país na sua vida acadêm ica, pois
seus pais o ajudam com as tarefas de casa, ajudam a repassar a m atéria e participam

Sobre Comportamento e Cogniyão 171


ativamente das atividades da escola, lembrando que o irmão de Junior também tem um
papel importante, sendo alguém que o auxilia bastante nos estudos. Já os pais de
Juliana mostraram pouco envolvimento nos estudos da filha. c. ainda, a participação da
mãe, ao ler os textos e elaborar perguntas, pode ser inadequada, uma vez que Juliana
não precisa se esforçar para fazer a leitura do conteúdo. Estas informações qualitativas
convergem com os dados quantitativos encontrados, nos quais se verificou correlação
significativa entre envolvimento dos pais nas tarefas escolares dos filhos e desempe­
nho acadêmico (r - 0,231; p < 0,05). O fato de os pais ajudarem adequadamente nos
estudos do filho pode ser um fator motivador, e pode ressaltar que o estudo tem valor
para a família, uma vez que todos se envolveram neste processo. Vários pesquisadores
verificaram associação entre o envolvimento dos pais nas atividades escolares e su­
cesso acadêmico (Fehrmann, Kcith & Reimers, 1987; Grotnick & Slowiaczek. 1994;
Juang & Silbereisen, 2002; Steinberg, Lamborn, Dornbusch & Darüng, 1992), sendo que
Fehrmann e cols. verificaram que o envolvimento parental levou a um aumento do tem­
po gasto com tarefas escolares, o que contribui para urn rneihor desempenho. Além
disso, Rosário e cols. (2005) ressaltaram que pais que valorizam o papel da escola
podem modelar comportamentos escolares favoráveis ao sucesso acadêmico.

4.4. Uso de reforçadores positivos


Pôde-se pe rceb er que os pais de Ju n io r utilizava m , fre q ü e n te m e n te ,
roforçamento positivo para o comportamento de estudar do seu filho. Verificou-se, ain­
da, a variedade dc reforçadores dispensados por estes pais: afeto, atenção, alegria,
interesse pelas atividades acadêmicas do filho, atividades (como passear e jogar boia)
e presentes. No caso de Juliana, ficou evidente o constante uso de práticas coercitivas,
sendo que a adolescente, durante a entrevista, não relatou exem plos de uso de
reforçadores positivos para o estudo por parte de seus pais. Aqui se encontra, provavel­
mente, a principal diferença entre as famílias de Junior (com sucesso acadêmico) e a
família de Juliana (com fracasso acadêmico). Estes dados convergem com os resulta­
dos quantitativos, com os quais se verificou que o desempenho acadêmico esteve
inversamente correlacionado a práticas coercitivas, como o envolvimento negativo dos
pais nas tarefas escolares (ENP) (r = -0,319; p < 0,05). O uso da coerção é freqüentemente
discutido por pesquisadores, que apontam os prejuízos que tais práticas podem ocasi­
onar no desenvolvimento globai dos filhos, inclusive em seu desempenho acadêmico
(Feldman & Wentzel, 1990; Ginsburg & Bronstein, 1993; Hili, 2001; Pettit, Bates & Dodge,
1997; Soiomon & Serres, 1999), Para Sidman (2001, p. 248), o uso da coerção como
forma de contrnie deve ser substituída pelo uso de reforço positivo, sendo que este
último "pode nos ensinar novas formas de agir ou manter aquilo que já aprendemos,
sem criar os subprodutos típicos da coerção". Aièm disso, Sidman ressalta que pais
que utilizam reforçadores positivos deparam-se com crianças felizes, autoconfiantes e
competentes.
Além de verificar diferenças importantes nas práticas parentais das famílias
dos adolescentes com alto e baixo desempenho (medido por notas), pode-se perceber,
por meio da análise das entrevistas, que as práticas parentais também podem contri­
buir para o aprendizado de estratégias de estudo eficazes, e para a formação de regras
adequadas sobre o estudo, de valorização e de mafor discriminção das conseqüências
a curto e longo prazo.
Todos estes resultados demonstram a importância da atuação do psicólogo
na orientação às famílias cujos filhos apresentam dificuldades escolares.

A n d Paula Viezzer Salvador, Lídia N a taiia Pobrianskyj W eb er


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1 7 4 A n a Paula V iezzer Salvador, Lidia N atalia Dobrianskyj W eb er


Capítulo 14
Treinamento de país na modalidade de
grupo em clínica - Escola: o que
fazemos e fazemos é suficiente?
fabiana Pinheiro Ramos*
f a;. uklcKÍc Stilesiana de V itória, WIT.S
Sõnia Regina Fiorirn Lm im o**
UFES

O Treinamento de Pais é uma estratégia utiüzada erri contextos clinicos e dc


saúde que visa a ensinar aos pais habilidades de manejo do comportamento infantil, a
fim de aumentar os comportamentos adequados dos filhos e reduzir os inadequados,
por meio da modificação das interações entre pais e filhos (McMahon, 1996; Williams &
Ayelo, 2001). Nesta modalidade de intervenção, o objetivo do terapeuta comportamental
é mudar, no contexto, os aspectos que criam e/ou mantém o comportamentoprobloma
ou as dificuldades que atingem a criança no seu desenvolvimento. Gerar esse tipo de
mudança significativa, sem o envolvimento dos pais, é uma dificuldade.
O pressuposto teórico subjacente a este tipo de intervenção decorre da própria
concepção de homem em sua relação com o am biente, derivada da abordagem
skinneriana, quer seja: os pais, como “ambiente” primordial da criança, certamente
reforçam ou punem determinados comportamentos, contribuindo, de alguma maneira,
para a configuração dos problemas que a criança apresenta (Williams, 1983).
A participação dos pais no tratamento dos problemas de comportamento de
seus filhos pode ocorrer de diversas maneiras, com ou sem a participação da própria
criança; desde uma intervenção mais “passiva", em que os pais aplicam as técnicas
ensinadas pelo psicoterapeuta, até uma postura mais “ativa", que visa a formar os pais
como para profissionais, habilitados para analisar as contingências e escolher e apli­
car as melhores estratégias a serem adotadas naquele contexto, tornando-se, assim,
efetivamente capazes de resolver problemas. Silvares (1995) faz uma adequada revi­
são e explicação dessas diferentes possibilidades. Já Williams e Matos (1984) e Olivarcs,
Méndez e Ros (2005) podem ser consultados para uma revisão histórica do surgimento
e evolução do campo de Treinamento de Pais no âmbito da Terapia Comportamental.
O Treinam ento de Pais tem sido utilizado em diversos problemas infantis
(agressividade, birra, enurese, fobia social, por exemplo) e a literatura da área tem apon­

* Professora de Curso de Psicologia da Faculdade Salesiana de Vitória e Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da
Universidade Federal do Espíntc S a n to - e-mai! rsmosfabiana@boi.txim.br
“ Professora D outorado Departamento de Psicologia Social e do Desenvolvimento e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da
Universidade Federal do Espirito Santo, bolsista de produtividade em pesquisa nivel 16 do CNPq prnim aS tm .cntxi.hr

Sobre Comportam ento e Cognição 175


tado a efetividade deste procedimento, seja na eliminação da queixa comportamentai,
seja na sua diminuição em termos de freqüência e intensidade (Coelho & Murta, 2007;
Marinho & Siivares, 2001; M elo& Silvares, 2003; Melo, Silvares & Conte: 2000; Pinheiro,
Haase & Del Prette. 2006; Serra-Pinheiro, Guimarães & Serrano, 2005).
O Treinamento de Pais pode ser feito individualmente e em grupo, com vantagens
e desvantagens em cada caso. A principal vantagem da modalidade individual se refere ao
fato do termos um único terapeuta para uma única criança e, dessa forma, termos uma
intervenção focada nas dificuldades daquela criança e sua família, especificamente. Entre
as vantagens da modalidade grupai, podemos destacar a maior diversidade de rnodeios
de atuação (fornecidos pelos demais pais participantes do yrupo) e o fornecimento de
suporte social entre os participantes, além do fato do grupo oferccer uma perspectiva mais
favorável para o desenvolvimento do auto-conhecimento dos pais, a partir da comparação
com o repertório comportamentai dos demais participantes (Wessler, 1996).
No contexto das clínicas-escolas dos cursos de Psicologia no Brasil, soma-se
a essas vantagens o fato da modalidade em grupo atender mais rapidamente a uma
clientela que costuma ser numerosa e que, geralmente, excede a capacidade de aten­
dimento do serviço. Diminuí, assim, a incapacidade funcional dos serviços tradicionais
de atendimento psicológico, reduzindo custos e elevando a eficácia das intervenções -
motivos estes que, historicamente, levaram á expansão do modefo de treinamento em
grupo (Marinho, 2005).
A implantação desse procedimento em clínicas-escolas traz, no entanto, algu­
mas questões, que precisam ser analisadas, pois, segundo Lõhr (1999):

O treinamento de pais não é uma panacéia capaz de solucionar todas as proble­


máticas infantis. Constitui, no entanto, im portante instrum ento para o terapeuta
comportamentai, desde que estejamos atentos às suas vantagens, bem como às
suas limitações (p. 116).

Apresentaremos, a seguir, algumas dessas questões relevantes para a presente


discussão. Atuando há mais de dois anos na supervisão de alunos estagiando em clínica'
escola, com Treinamento de Pais, temos nos confrontado com alguns dos principais pro­
blemas citados na literatura da área. A anáíise será permeada por exemplos retirados da
prática de supervisão de alunos em uma clínica-escola, feita pela primeira autora deste
trabalho, na graduação de Psicologia de uma escola privada, situada na Grande Vitória/ES.
Não pretendemos fazer uma descrição detalhada das intervenções realizadas e seus re­
sultados, mas uma breve caracterização, para contextualizar o que será discutido.
As supervisões ocorreram ao longo de dois anos, em uma sessáo semanal,
com quatro horas de duração, com seis alunos por turma de supervisão. Nesse periodo,
os alunos atenderam um grupo de pais, com filhos que apresentavam um quadro espe­
cífico - a deficiência auditiva -, com queixas relativas a pouca independência e autonomia
para realizar tarefas cotidianas relativamente simples, e quatro grupos mistos de pais,
cujos filhos tinham diversos tipos de probiemas de comportamento: agressividade, de­
sobediência, dificuldades de cumprir tarefas domésticas e escolares, dentre outros.
Os pais inscreviam seus filhos na clínica-escola, em geral para atendimento
individual, e preenchiam uma ficha inicial, com uma breve descrição da queixa, a qua!
era utilizada para a triagem inicial. Alguns pais eram selecionados com base na descri­
ção da própria queixa e participavam de uma entrevista individual, na qual era feita uma
anamnese da criança e eram explicados os objetivos do grupo e os procedimentos a
serem adotados.

Fabiana Pinheiro Ramos, Sônia Regina Fiorim Cnumo


Caso o pai desejasse participar, era encaminhado para um dos grupos um
funcionamento, caso não concordasse, permanecia na fiia de espera até que o criança
pudesse ser atendida individualmente. Ao final da intervenção grupai, se ainda h o u v e s ­
se necessidade, a criança poderia sor encaminhada para intervenção individual, ou ato
o mesmo o pai/mãe para a psicoterapia individual.
O Treinamento dc Pais foi realizado com base no modelo proposto por Marinho
(1999, 2005). sendo constituido por dez sessões estruturadas, cada uma com objetivos,
tarefas de casa e procedimentos cspecíficos; e duas sessões individuais com os pais.
a primeira para avaliação e estabelecimento do contrato grupai e a segunda, após a
realização do treinamento. No nosso caso, observamos a necessidade dc rnais algu­
mas sessões uma vez que, ás vezes, um dos objetivos da sessão não era cumprido
adequadamente (seja por falta dc compreensão de algum procedimento, seja pela não
implementação do mesmo na tarefa de casa). Dessa maneira, ao invós de darmos
seqüência ao planejamento das atividades do grupo, retomávamos o conteúdo da ses­
são anterior. Esta ampiiação do número de sessões é prevista pela autora citada (Ma­
rinho, 2005), principalmente nos casos de participantes com baixo nível de escolarida­
de e que apresentam dificuldades de compreensão dos procedimentos.
A intervenção era realizada em sessões semanais, que duravam, em média,
duas horas cada, totalizando entre 12 e 15 sessões para cada grupo de pais, que era
composto por seis participantes, em média. A maior parte desses pais possuía nivel
sócio-econômico rnédio-baixo ou baixo, com escolaridade média de Ensino Médio in­
completo. No geral, eram as mães que participavam da intervenção, embora houvesse,
ocasionalmente, alguns pais nos grupos.

Pesquisar no contexto da intervenção


Uma das principais dificuldades apontadas nessa área se refere à questão de
fazer pesquisa no contexto da intervenção (Ervjmo, 1996; 2005a, Marinho, 1999; Silva­
res & Pereira, 2005). As variáveis que controlam o intervir não são necessariamente as
mesmas que controlam o pesquisar. O clínico-pesquisador precisa responder a dois
grupos de contingências, que exigem repertórios diferenciados e modelam comporta­
mentos distintos (Guilhardi.1988).
A dificuldade toma-se maior quando o clínico-pesquisador ainda é um aluno em
formação, pois, para muitos, é a primeira experiência em clinicar e, para alguns, também
em pesquisar. É preciso um esforço muito grande dos envolvidos para que sejam alcan­
çados os objetivos de pesquisa £ os objetivos de intervenção, faltando ainda produções
e maior integração entre as atividades de pesquisa e da psicoterapia, especialmente
aquela voltada para o atendimento infantil, em que habilidades específicas são exigidas
(Cherry, Messenger & Jacoby, 2000; Conte & Regra, 2000; Marinho, 1999; Regra, 2000;
Shirk & Phillips, 1991; Tryon, 2000; Weisz, Donenberg, Han & Weiss, 1995).
Especificamente na área de Treinamento de Pais, em uma primeira revisão da
área no país, Williams (1983) apresentou alguns critérios que têm sido usados na área
como importantes para avaliar a pesquisa relativa ao treinamento de pais, entre os
quais destacamos: a avaliação da mudança com portam entai, a repíicabilidade e a
eficácia dos procedimentos,

A questão da avaliação da mudança comportamentai


Tradicionalmente, o uso do sujeito como seu próprio controle tem sido o recur­
so m etodológico usado na avaliação das alterações de intervenções em Psicologia
Clinica e Educacional (Kadzin, 1982; 1998; Nunes & Nunes, 1987; Tawney & Gast,
1984). Pode-se, também, utilizar a análise da significância clinica da mudança, que

Sobre Comportam ento e Cognição 177


considera a obtenção de escores dentro da faixa normal em avaliações padronizadas e
a rnelhora de. no mínimo, 30% em relação à linha-de-base, em instrumentos de avali­
ação sem padrões normativos (Kadzin, 2004; Patterson, Chamberlain & Reid, 1982;
Wcbster-Stratton. 1994; Webster-Stratton & Hammond, 1997), análise esta também uti­
lizada em pesquisas com intervenção com crianças com necessidades especiais (Motta,
2007; Paula. 2004, por exemplo).
Para a avaliação da mudança, em termos qualitativos, podem ser considera­
dos como indicadores de resultados gerais de programas desenvolvidos em clínicas-
e s c o la s , a exemplo do programa de intervenção com pais de crianças com necessida­
des especiais, desenvolvido por Enumo (2005b): (a) os relatos verbais dos usuários -
estagiários e clientes, classificando sua participação no projeto; (b) comportamentos
observáveis dos usuários - alguns estagiários, apesar dc terminarem a habilitação em
Psicologia, podem permanecer por mais um semestre no projeto, mesmo sem ne­
nhum vinculo formal; os clientes, da mesma forma, continuarem a participar das
atividades; (c) a procura de aiunos de Psicologia para participação no programa, mes­
mo c o m o voluntários; (d) apresentações dos trabalhos cm eventos científicos.

A replicabilidade dos procedimentos


Quanto á replicabilidade do procedimento, há vários modelos de programa
disponíveis para o Treinamento de Pais na modalidade de grupo, a exemplo do Progra­
ma de Qualidade na Interação Familiar (Weber, Salvador & Brandenburg, 2006), o Pro­
grama de Intervenção Comportamentai em Grupo para Pais - PICGP (Marinho, 2005) e
o Triplo P - Programa Parental Positivo (Sanders, 2005), entre outros.
Essa variedade de técnicas e procedimentos ilustra a diversidade da área, mas,
também dificulta a comparação dos resultados de diferentes modelos de intervenção,
pois estes poucas vezes são replicados e testados em diferentes contextos para verificar
sua eficácia ou apresentar as variáveis relevantes para o sucesso ou fracasso do proce­
dimento. Williams (1983) salienta que a especificação das operações terapêuticas é
fundamental para obtenção de medidas adequadas no caso de replicação de estudos.

A avaliação da eficácia dos procedimentos


Quanto à avaliação da eficácia, destacamos os seguintes aspectos: obtenção
de medidas de avaliação da alteração dos comportamentos-problema na direção de­
sejada; avaliação da generalização dos comportamentos-alvo da intervenção, manu­
tenção dos ganhos por certo período de tempo, e medidas fidedignas de pré e pós-teste
e de seguimento (Graziano & O'Dell citados por W illiams,1983).

A questão da generalização da aprendizagem


Na avaliação dos resultados de um Programa de Treinamento de Pais, a gene­
ralização e manutenção dos ganhos sâo fatores importantes para determinar a eficácia
do programa. A generalização pode ser de dois tipos: (a) contextual, que se refere à
transferência dos efeitos do tratamento a lugares diferentes daqueíes nos quais foi
aplicado; e (b) temporal, que se refere à manutenção dos efeitos do tratamento após a
sua finalização (McMahon, 1996; Williams, 1983). Toma-se fundamental, portanto, obter
medidas de seguimento de médio e longo prazo ("follow up") para realizar esta avalia­
ção. Entretanto, no caso de clínicas-escolas, essas medidas são difíceis de serem
conseguidas, sem que haja um esforço institucional da clínica-escola, que vá além da
atuação de alguns professores-supervisores preocupados especialmente com essa
questão. (Silvares, 2006)

Fabiana Pinheiro Ramos, Sônia Regina Tiorim Enumo


Caso a clínica, institucíonalmente, não defina medidas de seguim ento dns
rotinas de atendimento, os dados podem ficar comprometidos, pois a rotatívichirjc; do
alunos é alta e. às vezes, a rotatividade de professores também, principalmente no t.a s o
de clínicas-escolas de faculdades privadas, ts te era justamente o nosso caso, pois, na
clínica-escola em que atuávamos, não havia medidas de seguimento para qimisquer
tipos de intervenção, independentemente da abordagem teórica adotada.

O problema da adesão dos participantes


Outro problema comum nas clínicas escolas refere-se ás altas taxas de desis­
tências dos clientes, em quaisquer tipos de procedimentos ou abordagens teóricas (Bar­
bosa & Silvares, 1994; Forreim, 2006; Lopez, 1983), com taxas variando de 10 a 35%,
segundo Vianna (2006). Há criticas sobre a clínica-escola adotar o modelo clínico tradici­
onal, semelhante a um consultório particular, voltado para urna camada da população
com características específicas (ciasse média, com bom nível educacional) não aten­
dendo, assim, às demandas da população que, de fato, a procura (Silvares, 2006) Mes­
mo assim, segundo Silvares (1998). deve-se procurar alternativas de atendimento pata
as pessoas que buscam as clínicas-escolas, como o atendimento erri grupo.
Marinho (2000) aponta algumas estratégias para prevenção de faltas e aban­
dono do tratamento em clínicas-escolas, entre as quais destacamos: (a) adotar progra­
mas objetivos, com número de sessões reduzidas; (b) realizar intervenções individuais
com os pais, antes da intervenção grupai; (c) realizar sessões individuais, com rnem ■
bros do grupo que possam ter dificuldades de compreender ou aplicar as estratégias
discutidas; e (d) fazer contato telefónico com os participantes no intervalo das sessões.
Observamos nas supervisões que, as sessões individuais com os pais, intercaladas
com o treino em grupo, deram bons resultados na prevenção da desistência.
Um outro aspecto interessante da adesão se refere ao atendimento das expecta­
tivas daquele que busca auxílio, especialmente nos casos de atendimento a famílias com
crianças com necessidades especiais (Enumo & Cunha, 2001; Enumo, Santiago &
Medeiros, 1999; Lefèbre, 1981). Quanto mais a intervenção se afasta dessas expectati­
vas, maior tende a ser o abandono. Isso se configura como um problema, pois temos
observado que, via de regra, o pai inscreve seu filho na clínica para atendimento e espera
que o filho seja atendido e não ele, Essa expectativa advém do senso comum, que situa
o problema "na criança''; assim, ela deve ser o alvo da intervenção (Enumo, 1998).
Nossos alunos traziam diversas vezes para a supervisão o relato de que, mesmo
com a intervenção grupai dos país mostrando resultados na mudança comportamentai
da criança (relatada pelos próprios pais), alguns pais ainda perguntavam durante as
sessões de grupo: "Mas, meu filho não vai mesmo ser atendido?" Outras vezes, percebí­
amos que o pai aderia à estratégia do grupo, esperando assim 'acelerar" o acesso da
criança, que estava na fila de espera da clínica para atendimento individual.

O treinamento das habilidades do aíuno-terapeuta


As novas diretrizes curriculares para Cursos de Graduação em Psicologia no
Brasil (2004) enfatizam o desenvolvimento de habilidades e competências no egresso
para o exercício profissional, e o estágio é visto como um dos momentos privilegiados
para o desenvolvimento dessas habilidades e competências. Disto decorre que a inter­
venção em clinica-escola é feita por um aluno que também está em uma situação de
treinamento de suas habilidades. Soma-se a isso o fato de que o professor-supervisor
dificilmente terá oportunidade de observar o desempenho real do aluno na situação de

Sobre Comportamento e Cognição 179


grupo, e lidará com o relato verba! que o aluno faz da sessão de treinamento de pais.
Há mais de duas décadas, Guilhardi (1988) apontou diversos problemas en­
frentados quando se busca treinar terapeutas comportamentais, sem que haja uma
observação direta do contexto de atuação do aluno:

[...] freqüentemente, o aluno deixava de relatar aspectos considerados relevantes


pelo supervisor e pelos próprios colegas, além de ocorrerem distorções na p e r­
cepção do que o cliente havia relatado e, até mesmo, no que o próprio aluno havia
dito. Em suma, os estímulos aos quais os alunos respondiam eram aqueles aos
quais eram capazes de responder e não, necessariam ente, aos quais deveriam
responder; o$ desem penhos que descreviam eram aqueles que achavam que
tinham emitido e não , necessariamente, o que haviam feito (p. 318).

Outra questão relevante reside na falta de habilidades prévias que os alunos


deveriam adquirir ao longo do curso de Psicologia, como analisou Enumo (2005b)
sobre o desenvolvimento de programa para atendimento de crianças com necessida­
des especiais, em clínica-escola, em que os alunos apresentaram:

descom passo entre as habilidades exigidas, com o saber aplicar escalas de de­
senvolvim ento infantil, redigir relatórios de aplicação de testes e de síntese de
casos, ter tido algum a experiência com crianças excepcionais, ter conduzido
atendimento em Psicodiagnóstico, saber elaborar um projeto de pesquisa, conhe­
c e r os princípios básicos de A nálise E xperim ental do C om portam ento e suas
aplicações na escola e na área da excepcionaiídade, saber elaborar e executar
uma programação de ensino (estabelecimento de objetivos, sua operacionalização,
registro e avaliação) (p. 158).

Assim, para se tomarem terapeutas comportamentais, os alunos devem apren­


der habilidades complexas, que levam ao domínio de métodos, técnicas e recursos
diversos, que permitem a avaliação, a formulação de casos clínicos e a intervenção, como
já indicavam Bootzin e Ruggil (1988) há 20 anos atrás. Para treinar essas habilidades
complexas, autores da área consideram mais viável o treinamento misto, que combina
instrução, modelação, ensaio e feedback. (isaacs, Embry & Baer, 1982; Gongora, 1995).
Kerbauy (2001) e Webster-Stratton (1994) também identificaram alguns ele­
mentos fundamentais para a formação do terapeuta comportamentai, entre eles o uso
de sessões gravadas, com recursos audiovisuais, que permitiriam ao terapeuta e ao
supervisor melhor acesso ao que foi feito na sessão, favorecendo, assim, o desenvol­
vimento das habilidades do terapeuta aprendiz. Apesar das vantagens desse recurso
inclusive para a pesquisa (Carvalho et al., 1996) e a intervenção clínica (Moura, Silvares.
Jacovozzi, Silva & Casanova, 2007), novamente, esta pode ser uma situação dificil, pois
nem sempre é fácil obter consentimento do cliente para tal procedimento, e nem sem­
pre temos recursos disponíveis para este tipo de registro de sessão.
Em nossa prática, uma alternativa encontrada à filmagem de todas as sessões de
grupo, devido às dificuldades acima expostas, foi a utilização de sala de espelho unidirecional,
pelo qual a supervisora assistia a aigumas sessões do Treinamento de Pais em grupo,
escolhidas aleatoriamente. A observação direta do desempenho dos alunos, mesmo em
poucas situações (uma média de três observações por grupo), trazia informações impor­
tantes para se oferecer feedback corretivo ao aluno sobre seu desempenho.
A atuação do aluno-terapeuta na modalidade de grupo requer que ele fique sob
controle de estímulos bastante específicos e, mais complexos do que em uma terapia
individual. Rose (1977) listou algumas das atividades do terapeuta de grupo, que ilustram

l abíarid Pinheiro Ramos, Sônia Regina Fíorim Enumo


essa complexidade: organizar o grupo; orientar, monitorar e avaliar os membros <fo grupo;
implantar o piano de tratamento; estabelecer e manter y relação terapêutica entre o
terapeuta e os membros do grupo e entre os membros do grupo entre si; monitorar os
comportamentos considerados problemáticos e avaliar o progresso ao tratamento. Alem
dessas habilidades, o sucesso do trabalho com yrupos, segundo Barnard e Erickson
(1982), citados por Enumo (1997), depende em grande parte das habilidades sociais do
terapeuta. Este deve ser capaz de levantar e propor temas de interesse do grupo, permitir
a expressão franca de idéias e sentimentos, coordenar as discussões, incentivar a parti­
cipação de todos, sintetizar e reforçar as experiências mais proveitosas dos membros do
grupo, ser empático e não repressor.
Os desafios são grandes. Não obstante todas as dificuldades apresentadas, o
Treinamento de Pais na modalidade de grupo tem se consolidado como uma estraté­
gia efetiva e eficaz, gerando resultados, crescimento na área e novas discussões (Co­
elho & Murta, 2007; Lõrh, 1999; Marinho.1999, 2005; McMahon, 1996; Sanders. 2005;
Serra-Pinheiro et al., 2005)
A afirmação de McAuley (1995), feita há pouco mais de uma década, ainda
parece atual:

A maioria dos estudos sobre a instrução de pais foi realizada cm ambientei, de


pesquisa , mas existe necessidade urgente de se estudar a cficácia dn método na
rotina da clinica, a fim de determ inar com o essa tecnologia se revela quando o
tempo disponível é pouco e a carga de serviço é pesada (p 49).

Poderiarrtos acrescentar à afirmação do autor: "... especialmcnte quando te­


mos um terapeuta-aprendiz ainda em treinamento..." Este é um dos desafios que se
apresenta aos analistas do comportamento interessados nesta área.

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Fabiana Pinheiro Ramos, Sônia Regina Fíorim Fnumo


Capítulo 15
Análise comportamental da ansiedade à
Matemática: conceituação e
estratégias de intervenção *

João dos Santos Carmo


V/FSCdr
Lívia de O liveira Cunha
Universidade da Amazônia - U N A M A
Paula Valéria de Souza Araújo
Universidade da Am a/ônia - U N A M A

O ensino tradicional das matemáticas' tem se caracterizado pelo uso do con­


trole aversivo (Skinner, 1968), gerando uma série de respostas de fuga, esquiva e pa­
drões emocionais relatados como medo e tensão diante de situações escolares típicas
(provas, exames, atividades). Este controle aversivo caracteriza-se pela punição, amea­
ça dc punição e reforça mento negativo (Sidman, 1989).
Algumas formas bastante comuns de fuga e esquiva em ambiente escolar são
descritas por Sidman (1989), como “desligar-se”, “fechar os ouvidos", "ausentar-se", "de­
sistir", ‘ não fazer nada", "agredir". Estas respostas estão diretamente relacionadas ao
controle coercitivo, embora também sejam geradas por outras formas inadequadas de
ensino (ausência de reforçamento contingente à resposta; a desconsideração de habili­
dades pré-requisitos a um determinado conteúdo; ausência de planejamento gerando
improvisação, etc; além das condições inadequadas de trabalho dos docentes). Parale­
lamente a esta constatação, efeitos emocionais gerados pelo controle aversivo - chama­
dos de indiretos, subprodutos ou colaterais - têm sido amplamente descritos por analis­
tas do comportamento. Apesar dessas evidências, o uso de técnicas aversivas ainda é
bastante corrente em nossas escolas. É objetivo do presente capitulo abordar um efeito
do uso de contingências aversivas no ensino das matemáticas, o qual tem gerado diver­
sas investigações: as respostas de ansiedade relacionadas às matemáticas ou, como
utilizado pela literatura, ansiedade à matemática. Esta será aqui tratada de um ponto de

Traba:ho apresentado no XI Encontro da Associação Brasileira de Psicolerapiae Medicina Comporiamental, 2007, Brasllra/DF. Apoio:
FI DE SA - F ural açáo Inst' tuto para o Desenvo h/i mento da Amazõni a Con latos: jcarmogufecar.br
' Utilizamus o termo rrieleniáticaspata evidenciarmos que há diferentesformas de descrever relações espadais, geométricas, numéricas e
aritméticas, cujos axiomas e teoremas foram desenvolvidos em períodos ecorMextns culturais. sodaise políticos diferenciados. A uiatemálica
ensinada na escoia. portanto, compõe-se de conteúdos diversificados que requisitam diferentes repertórios a serem adquiridos pelos aluros e
tíevcrte ser. rrais propriamente, etiamadade matemáticas

Sobre Comporia men to e Cognição 185


vista analitico-comportamental. partindo-se de sua definição e descrição de seus compo­
nentes e propondo-se algumas formas de intervenção.

O uso de controle aversivo


Azrin & Holz (1966/1976) realizaram uma ampla revisão dos estudos sobre
punição, apresentando dados demonstrativos de que o uso de estimulação aversiva
em geral, e de punição ern particular, pode produzir estados emocionais perturbadores
ou indesejáveis. Tais efeitos emocionais indesejáveis são descritos como resultantes,
principalmente, de esquemas específicos de punição não-contingente quando compa­
rados à liberação de estímulos aversivos contingentes, em estudos experimentais com
sujeitos não-humanos. Estes dados conduziram a algumas afirmações apressadas
acerca do uso da punição como método eficaz de ensino de comportamentos social­
mente adaptados, inclusive em ambiente escolar.
No início dos anos 1950 era comum, entre analistas experimentais do compor­
tamento, a seguinte pergunta: "o que produz uma aprendizagem mais rápida: reforço ou
punição?”. Esta questão não tinha sustentação uma vez que, pela definição técnica,
reforço aumenta a freqüência da resposta, enquanto punição a suprime. Azrin & Holz
(1966/1976) argumentam que um tipo particular de arranjo experimental gerou dados
que davam a falsa impressão de que aquela era uma pergunta pertinente: em uma
situação em que o sujeito era obrigado a escolher apenas uma dentre outras opções
em cada ensaio, um decréscimo na proporção de respostas punidas era acompanha­
do de um aumento na proporção da resposta não-punida; daí a interpretação de que a
punição de uma resposta conduz ao aumento de freqüência de outras respostas. O
equívoco desta interpretação talvez parta da desconsideração de que as respostas não-
punidas só aumentavam de freqüência se houvesse reforço contingente. Azrin & Holz
(1966/1976, p. 513) concluem que “se pode reform ular a pergunta em termos da
efetividade relativa da fuga ou da esquiva comparada com o reforça mento, pois fuga,
esquiva e reforçamento são métodos para ensinar novos comportamentos".
Uma recente revisão dos estudos sobre controle aversivo (Mazzo & Gongora,
2007) esclarece alguns pontos controvertidos no uso de estimulação aversiva, desta­
cando duas classes de subprodutos: os desejáveis e os indesejáveis. Quanto aos
subprodutos desejáveis. Mazzo & Gongora (2007, p. 56) informam que o controle aversivo
pode “favorecer a aprendizagem de com portamentos importantes, aumentando as
chances de um dado indivíduo lidar meihor com as adversidades de seu ambiente” . E
acrescentam que estes efeitos indiretos são considerados como desejáveis somente
na condição de a estimulação aversiva não atender aos critérios de uma estimulação
considerada severa (cara cte riza da pela elevada intensidade, alta freqüência e
incontrolabilidade da situação aversiva pelo indivíduo que a recebe). Dentre os efeitos
indiretos desejáveis, as autoras apontam o comportamento de esquiva, o comporta­
mento de enfrentamento, a resolução de problemas, autocontrole, seguimento de re­
gras. Quanto aos subprodutos indesejáveis, Mazzo & Gongora (2007) referem-se a
reações emocionais perturbadoras, respostas de fuga e de esquiva, ausência de/ou
dificuldade em apresentar comportamentos alternativos.
Uma questão que se impõe é a necessidade de identificar o que seria uma
estimulação aversiva severa, uma vez que as histórias de reforçamento, punição e
seguimento de regras diferem entre os indivíduos. Em outras palavras, intensidade e
alta freqüência não podem ser parâmetros seguros para se afirmar que uma dada
estimulação é ou não severa. Da mesma forma, a incontrolabilidade da situação, por si
só, também pode não ser encarada como severamente aversiva. Mais uma vez, os

João dos Santos Carm o, Lívia dc O liveira Cunha, Paula V . de Souza Araú jo
efeitos sobre o indivíduo são o parâmetro fundamental para indicar se determinada
estimulação pode ser considerada como severa. Esta é uma questão prática quo preci­
sa ser perseguida, principalmente quando se trata de definir de forma mais precisa a
eficácia de procedimentos alternativos a punição.
Por outro lado, há dados indicando que alguns efeitos obtidos pt;lo uso de
controle aversivo reforçam o próprio uso por parte do agente punidor fcm outras pala­
vras, pais, professores o outros agentes educacionais, que em geral são bem -sucedi­
dos ao usarem punição, tendem a repetir seu uso em situações especificas. Hübner
(1987) destaca que não só a manutenção ou o aumento na freqüência de aplicação de
estimulação aversiva são observadas, mas também urna espécie de reação em c a ­
deia, na medida em que indivíduos cujos comportamentos foram punidos podem eies
próprios utilizar a estimulação aversiva como forma de controlar comportamentos de
outros indivíduos. Hübner (1987, p. 19) afirma categoricamente que "a punição não
pode ser considerada um mal necessário ate que estejamos certos de que nenhuma
outra solução foi encontrada”.

Ensino das matemáticas e subprodutos emocionais


Hà várias dimensões pelas quais se pode investigar o ensino das matemáti­
cas, A que apresentamos a seguir é uma dimensão ainda pouco explorada e que se
refere ao uso do controle aversivo severo e seus possíveis efeitos sobre o desempenho
dos alunos. Não é nossa intenção discorrer sobre dificuldades clássicas de aprendiza­
gem das matemáticas, como acatculia e discalculia; Embora reconheçamos serem
relevantes as informações acerca de supressão de habilidades aritméticas após al­
gum acidente cerebral (acalculias), bem como os dados de pesquisas longitudinais
que descrevem como certos repertórios matemáticos são negativamente afetados em
função de limitações desenvolvimentais (discalculias), nossa ênfase será nas conse­
qüências emocionais relacionadas à aprendizagem das matemáticas e geradas pelo
controle aversivo no ensino escolar
Para nossa análise, partiremos de algumas afirmações: 1) As matemáticas
são, a rigor, comportamento verbal; 2) A comunidade verbal impõe regras a respeito da
aprendizagem das matemáticas; 3) Há predominância de controle aversivo no ensino
das m atem áticas; 4) Um dos efeitos do uso de controle aversivo é a ansiedade à
matemática; 5) Por ser um repertório operante e respondente complexo, é possível
desenvolver estratégias de redução e até de reversão dos efeitos indesejáveis do con­
trole aversivo sobre o comportamento dos indivíduos.
Marr (1986) apresenta uma série de argumentos para afirmar que as matemá­
ticas são, em última instância, comportamento verbal. Como as matemáticas são abor­
dagens numéricas e computacionais utilizadas para descrever relações presentes na
natureza, pode-se dizer que não há como descrever essas relações sem o uso de
linguagem. Para Marr (1986, p. 162 ), as matemáticas são "um corpo de regras utiliza­
das para a efetiva manipulação de regras”; regras essas consideradas como fazendo
parte do domínio das matemáticas, mas que refletem contingências ambientais. A con­
clusão de que se trata de comportamento verbal também é expressa por Staats & Staats
(1966/1973, p. 240), ao afirmarem que “a matemática deveria ser analisada da mesma
maneira que outro comportamento de linguagem que envolve tactura de objetos e ou­
tros estímulos verbais, seqüências verbais, e assim por diante”. Skinner (1968), afirma
que o comportamento matemático nada mais é que um repertório verbal extremamente
complexo e a análise das matemáticas como repertório verbal também é desenvolvida
em mais de uma seção por Catania (1998).

Sobre Comportamento e Cognição 187


As considerações do parágrafo anterior, embora pertinentes e esclarecedoras,
acerca da natureza das matemáticas, não levantam um aspecto que, em nosso enten­
dimento, e fundamental: a intersecção entre duas linguagens diferentes. Em outras
palavras, as matemáticas são um conjunto de exercícios descritivos de relações pre~
sentos no ambiente (relações espaciais, geométricas, quantitativas, etc) e suas decla­
rações (definições, axiomas, postulados e teoremas) são expressas em uma lingua­
gem específica (caracterizada pela manipulação de símbolos arbitrariamente conside­
rados como símbolos matemáticos), mas cuja aprendizagem requer o domínio de um
outro repertório verbal: a língua materna. Esta abordagem foi apresentada fora do âmbi­
to da Análise do Comportamento (Machado, 1991) e aponta questões extremamente
relevantes, como a gênese de parte significativa das dificuldades de aprendizagem dos
alunos e das dificuldades de ensino dos professores: como exigir o domínio de um
repertório verbal compiexo se este repertório, para ser adquirido, necessita de domínio
prévio de outros repertórios interligados e tão complexos quanto o primeiro: a língua
materna falada e escrita?2
Na prática, o que se verifica é a presença de professores com tantas dificuldades
de estabelecer uma programação eficaz de ensino quantas são as dificuldades dos
alunos em suas tentativas de aprender um novo repertório complexo. Provavelmente esta
é uma das condições geradoras de regras (dedarações) acerca da aprendizagem das
matemáticas na escola: "matemática é difícil”; “para aprender matemática exige-se gran­
de empenho"; "matemática não é para qualquer um”, etc. Estudos experimentais têm
evidenciado o quanto regras podem controlar comportamentos, ao ponto de deixarem
estes comportamentos insensíveis a mudanças de contingências, principalmente quan­
do estas regras são derivadas pelo indivíduo, as auto-regras (Albuquerque, 2005). A co­
munidade verbal, portanto, exerce um controle fundamentai sobre a aquisição e emissão
de determinados comportamentos. No caso das matemáticas vistas na escota, a comu­
nidade escolar (e a família) pode veicular regras que descrevem aquelas como extrema­
mente difíceis de serem aprendidas. Por outro lado, programações inadequadas de
ensino podem ter como efeito a derivação de auto-regras (declarações, crenças) acerca
00 quanto é difícil entender as matemáticas e acerca do quanto o indivíduo tem dificuldade
em aprendê-Jas (auto-atribuições negativas).
Outra questão relevante è que, ao serem geradas regras e auto-regras acerca
do ensino e da aprendizagem das matemáticas, e sendo estas regras confirmadas a
partir do uso de controle aversivo e de programações inadequadas de ensino, é prová­
vel a ocorrência regular de erros. Carmo (2002) defende que erros podem ser traduzi-
dos como desempenhos que não atingiram certos critérios/parâmetros arbitrariamente
determinados pelo professor: além disso, chama a atenção para o fato de que um erro,
por ser um desempenho como qualquer outro, em geral é produzido por contingências
de ensino programadas pe/o professor. Como conseqüência, Carmo (2002) afirma que
a dimensão principal de um erro é a dimensão ambiental, ou seja, o aluno pode desem­
penhar abaixo de determinados critérios, porém, em geral, são as contingências de
ensino, inadequadamente estabelecidas, as fontes fundamentais da ocorrência de um
desempenho abaixo do esperado.
A ocorrência regular de erros na aprendizagem pode gerar desistência e, tam­
bém auto-atribuições negativas (“não consigo aprender”, “por mais que me esforce,
jamais serei um bom aluno em matemática”, etc). Caso o aluno não desenvolva estra­
tégias adequadas para lidar ou superar a situação, é provável que respostas de fuga e
' A mesma quer, tão pode ser levantada em relação a indivíduos que se utilizam de ou Iras modalidades de expressão, como a língua dc sinais
dos surtos e o cfidigo Braille dos cegos. Em ambos os casos há necessidade de domínio da lomia predominante de oomunicação. por meio
da qual muitos conteúdos matemáticos seriam on sina des.

João dos Santos C arm o, Lívia de O liveira Cunha, Paula V . de Souza Araú jo
de esquiva sejam cada vez mais freqüentes, levando à paralisação do aluno (n;k> om is­
são de respostas de enfrentamcnto, contracontrole). trazendo como conscqiiéru;i;i sua
reprovação. Desistência, reprovação, ausências freqüentes são tidas c o r n o f m o a s s o
escolar (do aluno), quando na verdade o fracasso deveria ser atribuído ao s is te m a
escolar que ainda falha em nâo prover o professor de condições satisfalnnar, de: t r a b a ­
lho e em não garantir-lhe uma formação que o habilite a programar um e n s in o p a u ta d o
em contingências de reforçamento.

Ansiedade como parte do programa de investigação de analistas do


comportamento
A literatura que trata d a aprendizagem de conteúdos matemáticos tem destaca­
do padrões típicos do ansiedade diante de situações como provas, exames, aulas '
textos, e qu a lq u e r situ a çã o a sso cia da à s m a te m á tica s. Num a p e r s p e c t i v a
com porta mental, falar em ansiedade remete inicialmente a unia discussão mais ani
pia sobre como aprendemos a descrever (1) o que se passa conosco, os e v e n to s
encobertos (estimulações, declarações, imagens etc), (2) como frequentemente nos
comportamos e m determinadas situações e ( 3 ) em que medida identificamos r e l a ç õ e s
entre eventos ambientais e nossas respostas públicas ou encobertas.
Falar em ansiedade também nos remete a um conjunto amplo de reações
reflexas e operantes chamado de emoção ou, mais apropriadamente, respostas em o­
cionais, Cfaro está que a comunidade verbal exerce um papel fundamental no ensino
de discriminações sutis de estados fisiológicos, ações operantes e contextos ambientais
relacionados, nomeando essas ocorrências e estabelecendo um repertório verbal que
possibilite minimamente ao indivíduo o convívio social.
Por outro lado. emoção e ansiedade podem ser encarados como term os
mentalistas que pouco auxiliam no entendimento das relações organismo-ambiente.
Não há uma precisão no uso do termo, tanto no senso comum quanto na academia,
razão pela qual Estes & Skinner (1941) afirmam que ansiedade é um termo que pode se
referir a diversos estados fisiológicos e comportamentais, não sendo um padrão espe­
cífico de resposta, podendo sua descrição variar de acordo com os parâmetros adotados
c de acordo com as discrim inações sutis e auto-relatos valorizados (reforçados) e
mantidos pela comunidade verbal. De fato, a comunidade verbal pode ensinar, com
muita precisão, um indivíduo a nomear o efeito, em seu corpo, de uma estimulação
aversiva'específica como sendo “d o f: e este indivíduo pode ser ensinado a identificar e
relacionar determinados eventos ambieniais como produtores de reações orgânicas
desagradáveis, podendo, por exemplo, se referir a uma dor no estômago ou a uma dor
no tornozelo. Porém, outras ocorrências são de difícil discriminação e a c o m u n id a d e
verbal não possui parâmetros claros para descrever e definir, por exemplo, angústia,
ansiedade e outras classes de respostas semelhantes. Rotular estas respostas corno
sendo estados subjetivos em nada ajuda, nem ao senso comum nem á ciência. Aban­
donar a busca de entendimento dessas manifestações comportamentais também não
traria vantagens à Análise do Comportamento e deixaria os cientistas comportamentais
a margem de um amplo e complexo campo de investigação.
Seja como for. uma das extensões da Análise do Comportamento tem sido a
aplicação dos princípios do comportamento à clínica, e a tentativa de descrição e
operacionalização de expressões mentalistas passou a ser um grande desafio para
analistas aplicados do comportamento, terapeutas e psicólogos comportamentalistas.
Nesse sentido, Friman, Hayes & Wilson (1998) discutem acerca da necessidade e da

Sobre Comportamento e Cognição


importância de se conduzir estudos comportamentais sobre ansiedade. Friman et al
(1998) defendem que há um cquivoco apresentado por muitas analistas do comporta­
mento ao rejeitarem o estudo de eventos emocionais por considerarem inapropriado
despenderem seu tempo com a investigação de construtos mentalistas, sobretudo
porque tais construtos, argumentam: partem de descrições idiomáticas ou metafóricas.
As metáforas estariam centradas em descrições do tipo “como se...”, ou seja, declara­
ções que tentam expressar sensações através de comparações que o vulgo juiga apro­
priadas: “sinto como se estivesse com uma bola no estômago”, "é comv se alguém
estivesse pressionando meu peito”, “parece que meu coração vai sair pela boca", etc.
Para Friman Gt ai (1998), estas declarações podem ser uma rica fonte de identificação
de contingências avcrsivas. histórias de punição e de reforçamento negativo. Defen­
dem ainda que ansiedade pode ser estudada como uma categoria de resposta que
engloba eventos públicos e privados integrados.
Friman ot a! (1998) afirmam que o fato de ser ansiedade um termo vago. assim
como é vago o fenômeno a que se refere, não é razão suficiente para que analistas do
comportamento não investiguem urna área cada vez mais em foco. Pode-se afirmar que
o termo ansiedade não é suficientemente preciso para ser considerado um termo téc­
nico, porém negar seu uso cotidiano não traz vantagens; até porque ele é empregado
em situações especificas de constrangimento e podem dar importantes pistas acerca
do que se passa dentro do organismo, bem como possibilita acesso a contingências
aversivas passadas ou em vigor, além de auxiliar na previsão de respostas específicas
em contextos específicos.
Apesar da pertinência dos argumentos levantados por Friman e colegas, ainda
há um certo conservadorismo entre analistas do comportamento no uso e no estudo
desse padrão de respostas. Mesmo tendo Estes & Skinner (1941) inaugurado um
profícuo modelo experimental de ansiedade - a supressão condicionada - poucos
foram os analistas do comportamento que se arriscaram a estudar o fenômeno, prefe­
rindo utilizar termos e expressões que encobriam o estudo de ansiedade.
Fantino (1973). em uma breve revisão dos estudos sobre respostas emocio­
nais, propõe que mais experimentos sejam conduzidos para investigar o efeito que
diferentes esquemas de reforçamento exercem sobre o padrão de supressão de res­
postas. Indica ainda a necessidade de considerar as investigações experimentais que
descrevem relações diretas entre reações fisiológicas específicas (alterações na pres­
são arterial e na freqüência cardíaca) durante o processo de supressão condicionada.
Lundin (1972/1969) faz uma incursão nos estudos experimentais de ansiedade e pro­
põe uma formulação geral do fenômeno em seres humanos. Para Lundin. há situações
que evocam padrões de respostas especificas de ansiedade: impossibilidade evidente
de fuga; antecipação da punição; separação do apoio. Essas são condições gerais que
podem ocasionar padrões de ansiedade, porém o autor ressalta que as diferenças
individuais são evidentes, variando conforme a história de condicionamento e de imita­
ção. Defende ainda que há a generalização de ansiedade em indivíduos cujo padrão de
ansiedade se tornou crônico.
Até aqui tratou-se das dificuldades e limitações do uso do termo ansiedade e,
apesar dessas considerações, verificou-se a importância prática de estudos experimen­
tais do fenômeno. Em relação ao termo ansiedade matemática, as dificuldades e limita­
ções são praticamente as mesmas. No entanto, uma rápida consulta à literatura interna­
cional não-comportamental, no campo da clínica e no da educação matemática, deixa
evidente a crescente preocupação com o fenômeno. Da mesma forma que se esquivar ao
estudo da ansiedade não traz vantagens à Análise do Comportamento, evitar o contato

João dos Saníos Carm o, Lívia de O liveira Cunha, Paula V dc Souia Araú jo
cum um problema de aplicação não é vantajoso para os analistas do comportamento e
psicólogos comportamcntalístas que labutam na clínica c ou na escola.

Ansiedade à matemática como parte do programa de investigação


em Análise do Comportamento
Um relato inicial de Dreger & Aiken, Jr. (1957), accrea <ie ansiedade a números
ern estudantes universitários, abriu um promissor campo dc investigações aplicadas.
Estes investigadores iniciam o relato afirmando que “muitas pessoas relatam, etn ses­
sões clínicas e em aulas acadêmicas, que ficam emocionalmente perturbados diante
das matemáticas". E acrescentam que reaçòes desta natureza, em situações especifi­
cas de aprendizagem das matemáticas, representam um amplo campo de investiga­
ção acerca de reações emocionais ern educação.
Em seu estudo, Dreger & Aiken, Jr entrevistaram setecentos e quatro estudan­
tes que fre q ü e n ta va m aulas de m atem ática e le m e n ta r em uma u n ive rsid a d e
estadunidense. Os estudantes responderam a uma escala de ansiedade, com 47 itens,
especialmente adaptada com a inclusão de três itens que mediam sentimentos de
ansiedade relacionados ao trabalho com números, Os itens acrescentados eram: “Fico
frequentemente nervoso quando tenho que fazer aritmética"; Muitas vezes em que vejo
um problema de matemática, simplesmente ‘congelo ' ; “Nunca fui tão bom em mate­
mática como sou em outras matérias” . A escala foi aplicada ao término de aulas em que
foram devolvidos, pelo professor, testes de matemática resolvidos pelos estudantes.
Os e sco re s o b tid o s, por cad a e stu d a n te , nos trê s iten s e s p e c ífic o s foram
correlacionados, individualmente e em conjunto, com os demais itens da escala. Ou­
tros tratamentos estatísticos de correlação foram conduzidos, incluindo aplicação de
escala de inteligência e verificação do histórico dc matemática dos estudantes. Os
dados indicaram que: 1. Ansiedade a números parece ser um fator separado da ansie­
dade geral, apesar de haver uma pequena relação entre as duas sindromes (para
respeitar a expressão utilizada pelos autores); 2. Não há relação direta entre ansiedade
a números e inteligência geral: 3. Pessoas com alta ansiedade a números tendem a
apresentar baixo desempenho em matemática.
A partir do estudo original de Dreger & Aiken, Jr. (1957), diversos estudos têm
sido conduzidos, cobrindo uma vasta gama de fatores, como: idade; sexo; curso; tipo de
teste; estilo de aprendizagem; uso de estratégias mnemónicas; elaboração e aplicação
de escalas específicas para ansiedade à matemática; estratégias de reversão da ansi­
edade (p. ex.: Aiken Jr., 1976; Ashcraft, 2002; Ashcrafi & Faust, 1994; Bessant, 1995; Betz,
1978; Dew, Galassi & Galassi, 1983; Hendel & Davis, 1978; Resnick, Viehe & Segai,
1982; Richardson & Suinn, 1973; Rounds, Jr. & Hendel, 1980) . A expressão ansiedade
a números passou a ser substituída por ansiedade à matemática e seu uso se genera­
lizou a partir de 1978 com os estudos de Tobias.
Uma revisão da literatura realizada por Johnson (2003) revela que os estudos
acerca de ansiedade ã matemática são conduzidos quase que exclusivamente por
pesquisadores cognitivistas, estando os analistas do comportamento à margem da
produção internacional, Apesar dessa constatação, e com base nas considerações
apresentadas nas seções anteriores, os autores do presente capitulo defendem a
possibilidade, relevância e necessidade de condução de estudos comportamentalistas
acerca do fenômeno.
Uma primeira tentativa nessa direção foi feita por Carmo (2003), O objetivo do
estudo foi formular uma definição operacional de ansiedade à matemática e discutir as

Sobre C o m poria mento e Cognição 191


diversas estratégias de intervenção e seus resultados. Para tanto, fez-se urn levanta­
mento em três áreas: 1) Educação Matemática: identificação de situações típicas de
ansiedade matemática; 2) Clínica Comportamental e Cognitiva: estratégias de trata­
mento mais comuns apontadas na literatura; 3) Análise do Comportamento; o modelo
experimental de ansiedade.
O levantamento indicou os seguintes resultados:
Na área de Educação Matemática há relatos não sistemáticos acerca de reações
de fuga, esquiva e estados fisiológicos desagradáveis durante aulas, exercícios e pro­
vas dc m atemática. Dentre as reações fisiológicas desagradáveis, encontram os:
taquicardia; sudoresc; extremidades frias; sensação de torpor ou desmaio; cefaíéias;
gastrites. Quanto às respostas de fuga: sair da sala; resolver os exercícios rapidamen­
te. Dentro as respostas de esquiva: fattar aulas e exames; adoecer. Também identificou-
se a presença de respostas encobertas: auto-regras e auto-atribuições negativas.
Na C lín ica a an sie dad e à m atem á tica é c a ra c te riz a d a por padrões
comportamentais diferentes daqueles que caracterizam dificuldades de aprendizagem,
comc acalculia e discalculia. Além destes, são relatadas reações fisiológicas desagra­
dáveis e sensações de perda de controle e desmaio.
Na Análise do Comportamento há destaque para o modelo experimental de an­
siedade (supressão condicionada) e poucos relatos de uso de estratégias, clínicas de
redução de ansiedade aplicadas a casos específicos de ansiedade à matemática.
Quanto aos procedimentos de intervenção, são relatadas estratégias adequadas
de ensino: programas de ensino individualizado; reestruturação do ambiente de estudo;
reestruturação de hábitos dc ostudo; uso de monitoros durante aula. Também foram
identificadas técnicas terapêuticas de redução de ansiedade, como relaxamento progressi­
vo e dessensibilização sistemática. Atém dessas, foram relatadas técnicas terapêuticas de
reestruturação cognitiva: alteração de auto-regras e auto-atribuições negativas; treino de
assertividade em sala de aula. A associação de técnicas de redução de ansiedade,
reestruturação cognitiva e mudança de ambiente e hábitos de estudo mostrou-se mais
eficaz quando comparada ao uso isolado de cada uma dessas estratégias.
D iante desta descrição sucinta, pode-se propor que, do ponto de vista
comportamental. ansiedade à matemática caracteriza-se por um conjunto específico de
reações fisiológicas e comportamentais diante de estímulos matemáticos simples ou
complexos e diante de contingências de aprendizagem de matemática, ou em contex­
tos que requisitam o uso de repertórios matemáticos. Alguns estímulos podem adquirir
a função de sinalização de uma estimulação aversiva iminente; a presença do profes­
sor de matemática, por exemplo, pode sinalizar o inicio de uma contingência aversiva. A
exposição regular a estimulações aversivas severas presentes em situações de apren­
dizagem das matemáticas (aulas; dever de casa; provas etc), pode gerar alta produção
de erros e, por conseguinte, liberação de novas punições (notas baixas; deboches dos
colegas etc) contingentes aos erros, mantendo o ciclo aula-erro-punição. Efeitos
operantes colaterais freqüentes são auto-regras (auto-atribuições negativas), respos­
tas de fuga e ou de esquiva. Efeitos respondentes colaterais são alterações fisiológi­
cas, como alteração na pressão arterial, aumento da freqüência cardtaca, descritas
pelo indivíduo como altamente desagradáveis.
Pode-se conjecturar que, na ansiedade à matemática, estímulos fisicamente
dessemelhantes passam a controlar o mesmo padrão emocional complexo; ou seja,
diferentes modalidades de estímulos podem fazer parte de uma só classe equivalente.
A presença do professor, a palavra escrita matemática, a palavra falada matemática, o

João dos Santos Carm o, Lfvia de O liveira Cunha, Paula V dc Souza A raú jo
livro de matemática etc. podem sc tornar associados a respostas reflexas condu mna-
das e a respostas operantes públicas ou privadas. Essa formulação precisa sor ostu
dada experimentalmente.
Os fenômenos descritos como ansiedade geral em humanos. bem como a
a n s ie d a d e especifica á matemática, guardam relação direta com os campos <to estu­
dos sobre comportamento verbal e comportamento governado por regras Referir se
a n s ie d a d e é. em grande parte, refenr-se aos relatos verbais feitos por indivíduos duran
te ou após a exposição a situações aversivas ou pré-aversivas. Os relatos geralmente
descrevem ou identificam sensações desagradáveis, sentimentos de fracasso, forniu
lação de regras, imagens ou lembranças de situações semelhantes
Para Forsyth & Eifert (1996) é de fundamental importância rever as perguntas
que são comumente feitas em relação às respostas emocionais. Para estes autores, a
ênfase na busca e descrição dc várias dimensões das respostas emocionais (dimen­
sões cognitivas, fisiológicas e operantes públicos) pode denunciar um equivoco de
perspectiva: a suposição de que as ornoções existem em si, ou seja, são coisas Em
lugar de perguntar o que são as emoções, cientistas comportamentais deveriam por
guntar o que as pessoas fazem e em que contextos específicos. No caso da ansiedade
à matemática, mais do que relacionar as diferentes dimensões de respostas (neces­
sárias, mas nâo suficientes), os investigadores deveriam perguntar ern que contextos e
sob quais contingências os indivíduos agem.
O relato dos indivíduos pode fornecer pistas importantes, assim como a mani­
pulação de contingências pode ajudar a entender como o indivíduo aprende a relatar
sentimentos. Dados oriundos dessas duas fontes podem auxiliar no desenvolvimento
de estratégias terapêuticas e educacionais eficazes para auxiliar indivíduos a: adquiri­
rem um controle maior sobre respostas emocionais; planejarem contingências que
aum entem a p ro b a b ilid a d e de re sp o sta s a d e q u a d a s (so lu çã o de p ro b le m a s ,
assertividade, enfrentamento produtivo etc); programarem um ambiente de estudo po­
tencialmente enriquecedor de seu desempenho matemático; enfim, que possam agir
produtivamente em contextos específicos de aplicação de repertórios matemáticos.
Hendel & Davis (1978), Richardson & Suinn (1973), Banaco (2001), Banaco & Zamignani
(2004), oferecem importantes contribuições e sugestões nessa direção.

Considerações Finais
A Análise do Comportamento caracteriza-se por um programa de pesquisa
extenso e diversificado em torno das relações organismo-ambiente. Suas declarações
acerca do comportamento dos organismos são pautadas em dados obtidos experi­
mentalmente e muitas aplicações de seus princípios são conduzidas com êxito em
uma gama variada de contextos.
O estudo da ansiedade à matemática representa um campo de intersecção
entre a clinica e a escola e exige o apoio de dados experimentais de importantes áreas
de investigação, como controle aversivo, comportamento governado por regras, equiva­
lência, desenvolvimento de procedimentos terapêuticos, programação de contingênci­
as de ensino, para faiar de alguns. Professores, alunos e outros agentes educacionais
poderão se beneficiar substancialmente dos achados experimentais e da proposição
de estratégias de prevenção e de reversão de padrões de ansiedade relacionados à
aprendizagem das matemáticas. Neste sentido, há muito a ser investigado e as possi­
bilidades de contribuição da pesquisa comportamental são bastante promissoras.
Estudos brasileiros estão sendo conduzidos com o propósito de descrever graus dife-

Sobre Comportamento e Cognição 1 9 3


ren d a d o s de ansiedade à matemática; ter acesso às regras e auto-regras acerca da
matemática escolar, estabelecer a reiação entre auto-conceito e ansiedade à matemá­
tica; implementar programas de reversão da ansiedade à matemática.
O presente capítulo buscou apresentar alguns aspectos considerados funda­
mentais ao inicio de um programa de investigação necessário em um país no qua) são
extremamente altos os índices de desistência e abandono escolar. Embora esta seja
uma questão social complexa e ampla, fruto de práticas políticas e econômicas que não
garantem à maioria da população u acesso a direitos básicos, entendemos que esfor­
ços no sentido de compreender fenômenos pontuais e minimizar ou superar o impacto
de práticas educacionais aversivas, mesrno não sendo a solução, pode ser uma contri­
buição relevante oferecida à população em gerai e ao campo educacional ern particular,
com repercussões sociais satisfatórias.

Referências

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Sobre Com portam ento e Cognição 195


Capítulo 16
Agressão e vitimização entre pares:
bullying e suas relações com a
depressão na adolescência

Juliana de Brito Lima*


WfSPI
Eleonardo Pereira Rodrigues**
WFKA
Josafá M oreira da C u nha***
U I-PR
Lídia Natalia Dobrianskyj W eb cr****
UFPR

Dentre os diversos problemas que afligem a sociedade, a violência tem reccbi-


do destaque especial, tendo sido citada como um dos mais graves problem as de
saúde pública da contem poraneidade (Segredo, Kahan, Luzardo, Najson, Uyo e
Zamalvide, 2006). Entre suas diversas facetas, a violência praticada por jovens tem
recebido grande visibilidade, sendo comum reportar-se ao ambiente onde estos convi­
vem, principalmente à escola (Sposito, 2001).
A violência nas escolas é o tipo mais freqüente e perceptível da violência juvenil,
tendo recebido especial atenção nas últimas décadas (Lopes Neto, 2005; Sposito.
2001), constituindo um problema social complexo c grave. E ao tratar deste assunto,
incluem-se tanto comportamentos anti-sociais e agressivos que incorrem em um con­
flito com a lei, quanto formas de violência que podem, à primeira vista, parecer menores,
como a violência entre pares, assédio moral e outras formas intimidação. A despeito de
décadas de pesquisa sobre o tema em muitos países, e do impacto significativo da
violência no sistema educacional brasileiro, este ainda é um tópico pouco estudado no
BrasiL como aponta Sposito (2001) em uma revisão da literatura nacional sobre a vio­
lência escolar, verificando que os estudos nacionais sobre este tema concentraram-se
principalmente em casos locais relacionados a crimes perpetrados no espaço escolar
‘ Psicóloga, graduada pela Universidade Estadual do P ia jí (UESPI).
"M nstrando em Vled ián ae Saúde (Neurociêndas) pelo Depadamento de Neiiropsiqtilatrta da Faculdade de Medicina da UFBA
* ” G raduadoem Psicologia e Meslrando efn Educação f.'ela Universidade Federal do Paraná {UFPR)
“ “ Professora-doulora da Universidade Federal oo Paraná dos cursos de graduação em Psicologia e Mestrado e Doulnrado em Educação.
’ Ressalta-se que, apesar de o bullying ser denominado na literatura em língua portuguesa como -provocação/vilim ização' e “agressividade/
violência'{Carvaltiusa, Lrnia e Matos. 2001. Cunha. W eber. 2007) e air>daoomo'maiis-tralosentre guais" (Martins, 2005b), não há um correlato
fie l a o se nti do or ig iria I d o termo r-a I írtg ua portu guesa. Ne ste tra bal ho, os termos ‘ agressão en tre pares", "vio Ifi ncia i nt erpes so a , "a a ressá o e
vilimização" serão utilizados para referir-se ao 'buliytnçf.

Sobre Comportamento c Cognição 197


ou nas proximidades deste, deixando, assim, de abordar form as mais sutis de violên­
cia. como c o caso da violência interpessoal.

2. B u llying 1: agressão e vitimização entre pares


Ao abordar a vitimização entre pares, surge o desafio de utilizar uma definição
que seja especifica o bastante e, com isto em vista, neste trabalho será utilizada a
definição proposta por Dan Olweus (1993), a partir de estudos realizados ao iongo da
década de 80. que utilizou o termo bullying para designar, (a) um comportamento agres*
sivo e negativo - incluindo tanto comportamentos físicos quanto verbais, (b) que ocorre
repetidamente ao longo do tempo, (c) em um relacionam ento caracterizado por um
desequilíbrio de força e poder de maneira física ou psicológica. O bullying tem sido
oescrito nâo somente através de suas modalidades fisíca, verbal e psicológica, mas
também tem incluído formas de violência relacional e sexual, corno apontam Piedra,
Lago e Massa (2006). É importante ressaltar que estas e outras estratégias de bullying
podem ser utilizadas separadamente ou simultaneamente, acarretando prejuízos sig­
nificativos para o clima escolar e qualidade de vida dos envolvidos (Cunha, Weber,
2008: Nansel. Overpeck, Piila, Ruan, Simons-Morton & Scheidt, 2001),
Outras características do bullying que devem ser enfatizadas são elencadas
por Carvalhosa, Lima e Matos (2001): intencionalidade, cronicidade e regularidade da
agressão e/ou ameaça de agressão. Dessa forma, conforme ressaltado por Constantini
(2004), o bullying não se refere a brigas ou conflitos com uns e esporádicos entre
estudantes. Refere-se a atos reais de intimidação preconcebidos que, associados à
violência física e/ou psicológica, impõem às vítimas extrema vulnerabilidade e incapaci­
dade de a u to -d e fe s a , re su lta n d o em s o frim e n to p s ic o ló g ic o , iso lam e nto e
marginalização. Porém, não só aqueles considerados como “vítimas1' sofrem conseqü­
ências negativas por este envolvimento (Nansel e cols, 2001).
Tradicionalmente, os envolvidos na vitimização entre pares podem ser classifi­
cados em agressores, vitimas, vítimas-agressoras e expectadores (Lopes Neto, 2005).
Segundo Lopes Neto (2005), os agressores são os indivíduos que, sozinhos ou em
grupo e sem motivação evidente, elegem intencionalmente unia pessoa para agredi-la
continuamente de forma direta e/ou indireta através da violência física, psicológica,
social, sexual e/ou verbal.
A categoria das vítimas se refere àqueles que estão expostos, repetida e conti­
nuamente, às ações intencionais do agressor ou grupo de agressores (Lopes Neto,
2005). Já as vitim as-agressoras são o sujeito ou grupos de sujeitos que, uma vez
submetidos à vitimização por bullying, reproduzem os comportamentos agressivos aos
pares, pela modeiagem e modelação (O’Connell, Pepler & Craig, 1999).
Por sua vez, os expectadores são os estudantes que não se envolvem
diretamente com o bullying, presenciando direta ou indiretamente e muitas vezes reti-
rando-se das cenas por medo de serem as próximas vítim as, por não saberem a
melhor conduta a ser adotada ou por não acreditarem nas providências das autorida­
des escolares (Lopes Neto, 2005).

2.1.Contextuaíizando o comportamento agressivo na adolescência


Skinner (1953/2003), ao descrever as agências controladoras, destaca a im­
portância da escola e da família no controle do comportamento humano, visto que
nestas instituições há o estabelecimento de regras sociais que determinam as condu-

1 9 8 Juliana de I?. Lim a, Eleonardo F. Rodrigues, Josafá M . da Cunha, Lkiía N . D. W eber


tas humanas. Ao ser introduzida no ambiente escolar, a criança se comporta do a c o rd o
conn o treinamento social recebido em suas interações pré-escolares. sendo quo cm
particular o comportamento agressivo de crianças e adolescentes recebo influência
direta da família e da interação social no ambiente escolar (Patterson. HcHiiryshe.
R am sey, 1989: Patterson. Reid, Dishion, 1992). Quanto a isso, a literatura mdica uma
relação significativa entre o comportamento agressivo e diversos aspectos do contexto
familiar (Cunha, Weber, 2007; Tolan & Loeber, 1993; Pinderhughes, Dodge. Rates, Pettit
& Zelli, 2000). Por exempio, ambientes familiares caracterizados por disciplina negativa
tem sido associado positivamente com o desenvolvimento do comportamento agressi
vo, de modo que as crianças agressivas seriam provenientes de um ambicnk: familiar
caracterizado por estilos parentais negativos (Cunha, Weber. 2007; Kigby. 2003)
Entretanto, para uma melhor compreensão da vitimização entre pares, è preci­
so investigar particularmente como se dão estes episódios de vitimização, e quais
seriam algumas possiveis conseqüências para os diferentes envolvidos. Bandura (1977)
sugere a existência de três condições básicas para que haja probabilidade de modelação
por uma criança; (1) que o modelo seja uma figura de poder e de autoridade, (2) que o
comportamento executado por ele seja mais recompensado que punido, (3) e que o
modelo e a criança compartilhem características similares. No caso do bullying, essas
três condições geralmente estão presentes, pois nessa circunstância os expectadores
podem observar o agressor (ou grupo de agressores) corno uma figura forte que rara­
mente é punido (tanto por profissionais quanto pelos alunos) quando pratica os maus-
tratos com os colegas, discriminando uma maneira não habilidosa de se obter ganhos
através da subjugação do outro ao seu poder. E, através do condicionamento operante,
o comportamento agressivo é mantido por suas conseqüências reforçadoras para o
agressor, como a popularidade perante os escolares e recursos materiais e/ou finan­
ceiros através da extorsão (Lopes Neto. 2005).
Até mesmo a observação do expectador pode fazer com que haja reforçamento
positivo do comportamento do agressor através da atenção aos episódios coercitivos e
até mesmo com o silêncio e a passividade. Na pesquisa de O’Connell, Pepler e Craig
(1999) constatou-se que os expectadores reforçaram o comportamento dos agressores
em 54% do tempo, por observarem passivamente os episódios, não socorrendo às
vítimas. Assim, a passividade dos expectadores, embora pareça neutra, pode reforçar
os atos de violência dos autores do bullying, uma vez que o silêncio destes pode ser
interpretado petos autores como afirmação de sua força.
Outro grupo que merece particular atenção é aquele formado pelos indivíduos
que, após sofrerem vitimização, agem de forma agressiva contra seus pares. Sídman
(2003), expondo as implicações da coerção, afirma que um indivíduo coagido severa­
mente, e que executa uma retaliação bem sucedida, acaba provendo um reforçamento
rápido e poderoso: os que estavam em desvantagem tomam-se poderosos, e os que
eram os temidos opressores agora buscam seu favor. Ainda segundo Sidman, é fácil
verificar como a agressão pode tornar-se um novo modo de vida para os inicialmente
subservientes, Assim, no caso do bullying, uma vítima que se toma agressora confirma
que coerção gera coerção, e que o comportamento agressivo se perpetua através do
reforçamento positivo.
Porém, as conseqüências da vitimização para os envolvidos, assim como ou­
tras form as de coerção, vão muito além daquelas observáveis nos pátios escolares,
estando relacionadas a problemas de internalização como, por exemplo, a depressão
(Craig, 1998; Klomek, Marrocco, Kleinman, Schonfeld, & Gould, 2007). Para discutir as
associações entre a vitimização e a depressão na adolescência, são apresentados a

Sobre Comportam ento e Cogniçdo


seguir alguns aspectos peculiares da depressão, sob a perspectiva psiquiátrica (DSM-IV-
TR, 2002) e sob a perspectiva psicológica, através do viés da Análise do Comportamento.

2.2. Depressão: perspectivas biomédica e analítico-comportamental


A depressão, como todo transtorno psiquiátrico, possui um guadro de sinto­
mas orgânicos e com portam entais que podem ser agrupados nas classificações
diagnosticas internacionais. De acordc com o DSM-IV-TR (2002). os sintomas da De-
pressão Maior são os mesmos em se tratando de crianças, adolescentes e adultos,
incluindo sintom as principais e secundários. Dentre os sintomas principais encon­
tram-se: estado de humor irritável ou deprimido (disforia) e diminuição do interesse ou
prazer nas atividades (anedonia). Quanto aos sintomas secundários, estes são: altera­
ções do apetite (tanto ganho como perda de peso), alterações de sono (insônia ou
excesso d c sono), alterações psicomotoras (re ta rd o psicomotor ou agitaçao), perda de
energia, cansaço e fadiga; sentimentos de inutilidade ou de culpa excessiva ou impró­
pria (distorção cognitiva com recordação seletiva, atenção para eventos negativos); d i­
minuição da capacidade de pensar. concentrar-se ou tomar decisões e. finalmente,
pensamentos de morte, idéias suicidas ou tentativas de suicidio.
A depressão, como muitos outros quadros psiquiátricos, vem sendo estudada
sob a perspectiva de muitas teorias psicológicas. Para a Análise do Comportamento
(AC), embora as descrições topográficas de depressão dos manuais de classificação
nosológica sejam extremamente úteis ao clínico, a anáiise funcional destes comporta­
mentos são imprescindíveis (Kanter, Callaghan, Landes, Busch & Brown, 2004).
Skinner (1953/2003) afirmou que a depressão seria resultado de um debilitamento
do comportamento, devido à interrupção de contingências reforçadas positivamente peio
ambiente social. Fatores como mudanças nas contingências de reforço podem resultar
em uma taxa reduzida de comportamento, que caracteriza a depressão, pois o reforço
positivo raramente apresentado a um comportamento pode diminuir a sua freqüência ou
mosmo extingui-lo completamente (Lewinsohn, Gotlib & Hautzinger, 2003).
Como possíveis explicações para a baixa taxa de comportamentos da depres­
são, Lewinsohn, Gotlib e Hautzinger (2003) sugerem o excesso de experiências aversivas,
diminuição da capacidade da pessoa para desfrutar das experiências positivas ou um
aumento na sensibilidade de um indivíduo diante de acontecim entos negativos; ou
ainda deficiências no repertório comportamental ou nas habilidades do indivíduo, e falta
de reforços potenciais no ambiente do sujeito devido ao empobrecimento ou perda dos
m esm os.
Considerando o excesso de experiências aversivas, Dougher e Hackbert (2003)
ressaltam que os efeitos de uma perda de fontes reforçadoras são graves para o indiví­
duo, mas caso este tenha um repertório adequado para obter fortes alternativas de refor­
ço, o mesmo pode não entrar em um quadro depressivo, ao contrário daqueles que
possuem inabilidades nesse âmbito. Quanto à punição, também outra hipótese para
explicar a baixa taxa de comportamentos, estes autores afirmam ainda que as histórias
de punição prolongadas também são comuns em se tratando de clientes com depressão
crônica.
Dougher e Hackbert (2003) afirmam que, além do efeito sobre a taxa de respos­
ta, o reforço insuficiente, a extinção e a punição apresentam ainda a função de eliciação
respondente. Assim, tais contingências fu n c io n a m como estím ulos incondicionados
que eliciam respondentes comumente conhecidos como frustração, cólera e tristeza.
Estas reações emocionais, por sua vez, podem ser condicionadas quando há a asso­

200 Juliana dc B. Lima, Eleonardo P. Rodrigues, Josafá M . da Cunha, l.idia N!. D , W eber
ciação entre a estimulação aversiva e estímulos discriminativos, de forma qun qualquer
estím ulo associado à punição ou à indisponíbilidade do reforço tam bém ohcia
respondentes. tornando-se eliciador respondente condicionado. Um exemplo disso b
uma pessoa que. sendo constantemente ridicularizada perante os paros na escola,
após muitos anos sente reações emocionais muito fortes simplesmente ao ver o Inc^l
onde ocorreu essa estimulação aversiva.
A pesquisa básica tom colaborado com a abordagem experimental da depres­
são ao verificar uma topografia comportam ental peculiar resultante da exposição
repetitiva e incontrolável a eventos aversivos, o que se denominou desamparo aprendi­
do (Seligman. 1974). Os efeitos comportamentais dessas contingências se assem e­
lham aos da depressão em termos de sintomatologia e são enumerados por Sanabio-
Henck e Motta (2005} como: diminuição da motivação e dificuldade em emitir respostas
operantes (d é fic it mottvacionaf), interferência na aprendizagem de relaçõ es de
conírolabilidade através da associação resposta-conseqüència ( déficit cognitivo ou.
conforme Capelari (2003), déficit associativo) e diversas alterações fisiológicas, como
perda de peso, inapetência, passividade e aparecimento de úlceras (déficit emocional).

2.2,1. Depressão na adolescência


Apesar de ser enfatizada atualmente a abrangência da depressão nas diversas
fases do desenvolvimento humano, a discussão e a preocupação cientificas sobre a
depressão na infância e adolescência é recente, conforme destaca Bahls (2003). Com
o reconhecimento da depressão infanto-juvenil, vários autores propuseram conjuntos
operativos para diagnosticá-la. Os critérios Weinberg (Weinberg, Rutman, Sullivan, Pencik
& Dietz, 1973) consideram, dentro dos sintomas principais, as mudanças no rendimen­
to escolar (queixas freqüentes dos professores devido à falta de concentração e mem ó­
ria, perda do prazer e interesse por atividades escolares, inclusive as extra-escolares),
socialização diminuída (retraimento social, menor participação em grupo, perda de
interesse sociaf habitual), mudança de atitude na escola (recusa ou dificuldade em ir à
escola) e queixas somáticas (cefaléias. mialgias, algias abdominais, entre outros).
Conforme Del Prette e Del Prette (2005), na psicopatologia infantil, os problemas
comportamentais e emocionais inerentes aos transtornos psicológicos e que podem se
expressar como dificuldades nas relações interpessoais na infância, são classificados
em problemas extemalizantes (os que se expressam em sua maioria na interação social,
como agressividade física e/ou verbal, condutas anti-sociais e abuso de substâncias) e
os internalizantes (aqueles que se expressam em relação ao próprio indivíduo, como
baixa auto-estima, timidez e retraimento). Os problemas internalizantes têm implicação
tanto para o isolamento social quanto para o autoconceito e estão presentes em transtor­
nos como depressão, ansiedade, queixas somáticas, fobia e isolamento sociais.
Segundo Ferster (citado em Baptista, Baptista & Dias, 2001), a vulnerabilidade
do adolescente para apresentar depressão deve-se ao fato de que o mesmo enfrenta
um mundo complexo para o qual ainda não dispõe do um repertório comportamental
adequado, pois está continuamente aprendendo as novas regras sociais que o ambi­
ente exige. Dessa forma, há um custo de resposta muito alto, fazendo com que ele
tenha o risco de apresentar com portam entos dito depressivos perante situações
conflituosas que requerem comportamentos mais elaborados e habilidosos.
Voltando-se para a depressão na infância relacionada com retraimento e quei­
xas somáticas (problemas internalizantes), tem-se descrito em Menegatti e Ingberman
(2003) que as conseqüências de sofrer episódios depressivos na infância são muito
negativas. As crianças depressivas têm déficits sociocognitivos que se agravam com o

Sobre Comportamento e Cognição 201


passar do tem po, o rendimento oscolar tende a decair, e. por não participarem
efetivamente das atividaües escolares (pela perda do prazer), fazem poucos amigos e
tendem a ser inenos ‘ populares" (isto é, estímulos menos reforçadores aos pares).
Além disso, elas têm tendência a apresentarem ideação suicida, risco de suicídio (prin­
cipalmente na adolescência), risco de uso e abuso de álcool e outras substâncias,
além de ser um antecedente expressivo para a depressão na adolescência e na idade
adulta. Porém, do que forma a vitimização entre pares e a depressão na adolescência
podem estar associados?

3. B ullying e suas relações com a depressão na adolescência


Enfatizasse que o contexto da vitimização entre pares é uma situação coercitiva
com conseqüências negativas para os envolvidos (Cunha, Weber, 2007), com uso de
força contra o outro através de reforçamento negativo e punição. É preciso lembrar que
a exposição continua ao reforçamento negativo e punição, características do bullying.
leva o sujeito a adotar estratégia de fuga e esquiva, além deste apresentar um nivei
aumentado de ansiedade (Sidman. 2003). Com isto, pode-se dizer que as consequên­
cias para aqueles envolvidos em bullying, especialmente como alvos de coerção, po­
dem estar relacionadas ao padrão de fuga-esquiva, ocasionando prejuízos para a soci­
alização. desempenho escolar e ajustamento psicológico dos envolvidos, como indica
a literatura (Farrington, 1993; Olweus, 1993; Kumpulainen & cols.,1998; Salmon, James
& Smith, 1998; Haltiala-Heino, Rimpelã, Rantanen & Rimpelá, 2000; Garbarino & DeLara,
2002; DeVoe & Kaffenberger, 2005).

3.1. Prejuízos ao repertório comportamental


Como preconiza a definição proposta por Olweus (1993), que destaca a repeti­
ção ao longo do tempo como uma das características principais do bullying, pode-se
concluir que os envolvidos ficam expostos a acontecimentos coercitivos durante um
tempo considerável. Pelo fato de o agressor ter discriminado que obtém sucesso agin­
do coercitivamente com a vítima (por exemplo, intimidando alguém, ele consegue di­
nheiro), ele é reforçado positivamente, aumentando a probabilidade de comportar-se
assim em outra oportunidade. Dessa forma, o agressor torna-se um reforçador negati­
vo para a vítima (pois esta se comportará de modo que possibilite se livrar do estímulo
aversivo). Obtendo êxito nessa primeira estratégia, a vítima agirá da mesma maneira
para evitar futuras situações aversivas com o agressor (por exemplo, evitando ir à esco­
la - esquiva; ou mesmo fugindo para a sala dos professores ao visualizar o agressor -
fuga).
Assim, conforme Sidman (2003), reforçamento negativo gera fuga, ou seja. a
pessoa faz tudo o que pode para escapar dele, e quando encontra o objeto de aversão,
novamente o sujeito se comportará conforme a estratégia que funcionou anteriormente.
Também pode gerar esquiva, quando o sujeito evita entrar em contato com o estímulo
aversivo, adiando o quanto puder esse encontro.
Percebe-se, então, que o sujeito submetido a uma contingência de reforçamento
negativo desenvolve um repertório comportamental estreito, fazendo com que, além de
restringir os seus interesses, ainda haja uma visão limitada, que o impede de atentar
para qualquer outro fato, exceto para o estresse em que se encontra. Assim, o indivíduo
fica restrito em termos de habilidades, apresenta medo de explorar, vivendo assim sob
forte estresse e ansiedade, pois discrim ina que há a im inência de circunstâncias
aversivas a todo o momento e, assim, há a necessidade constante de esquiva e fuga.

202 Juliana de B. Lima, Eleonardo P. Rodrigues, Josafá M da Cunha, Lídia N . D . Weber


Tal limitação no repertório com porta montai se dá não apenas em ralação üs
vítimas, mas aos agressores e vítirnas-agrcssoras que, não encontrando contenção
necessária contra a impuísividade e agressividade no contexto em que c reforçado
positivamente para agir dessa maneira, acabam não recebendo ajuda social do escuta
e implementação de repertórios mais habilidosos para conseguirem socialização, re­
conhecimento social e poder perante os pares (Constantini, 2004). Dossa torm y, o
agressor torna-se estímulo reforçador negativo também para os demais colegas, que
agem conforme o padrão evitativo por medo de se tornarem as pròxirnas vitimas.

3.2. Desempenho acadêmico


Sidman (2003), ao abordar o comportamento de esquiva em pessoas severa­
mente coagidas, dá um exempio de uma resposta dc esquiva contextualizada ao bullying
escolar, demonstrando que muitos comportamentos evitativos passam despercebidos
para pais e autoridades dessa instituição:

Usualmente ficamos intrigados toda vez que uma pessoa se mantém fazendo algo
que não tem uma vantagem óbvia. Isso sem pre nos deveria fazer susp eitar dfí
esquiva Se uma criança resiste a ir para a escola todas as manhãs e talvez não
apareça na escola depois de ter sido levada a sair de casa, ela pode muito bem
estar se esquivando da dor e humilhação diárias que o fanfarrão da escola inflige
a ela. O produto presente desta esquiva - o contato reduzido da criança com seu
atormentador - é invisível para nós porque ele requer comparação com eventos
passados, assim, a conduta da criança pode parecer misteriosa (p. 139).

Assim, além de destacar a importância de uma análise funcional ideográfica


para reconhecer o comportamento-problema como esquiva, buscando contingências
passadas e atuais que possam mantê-lo, Sidman (2003) permite associar o seu exem ­
plo às conseqüências do bullying às vitimas na escola.
Dentre os envolvidos na vitímização. os alvos podem utilizar-se, por exemplo,
das faltas à escola para esquivar-se e fugir do ambiente que, para eles, é coercitivo. Ao
não aprender novas habilidades e, muitas vezes, sem contar com a responsividade de
adultos, estes acabam concebendo não só o agressor, mas também a escola, como
um ambiente extremamente aversívo, onde não há outra saida além do desligamento
momentâneo desse ambiente. Comprovando tal asserção, Boulton & Smith (1994)
elencaram ansiedade, medo de ir para a escola e sentimentos de insegurança e infeli­
cidade na escola como conseqüência do bullying para as vitimas, o que poderia ocasi­
onar repercussões negativas ao desempenho acadêmico dos mesmos.

3.3. Agravos ao ajustamento psicológico


Viver submetido à coerção nas relações sociais também afeta o ajustamento
psicológico das pessoas, pois prejudica o repertório básico comportamental e, simul­
taneam ente, alterar a fisiologia do organismo. Subm etido a sucessivas situações
aversivas, o indivíduo busca novas formas de adaptação (nem sempre funcionais) ou o
oposto, simplesmente não responde aos estímulos. Trabalhando a primeira hipótese
(as respostas desadaptativas às situações aversivas), um comportamento bastante
comum em situações coercitivas é o uso de drogas devido ao seu efeito rápido no
esquecimento das restrições, repressões e agressões da vida, além de induzir a pró­
pria reprodução da coerção (Sidman, 2003).

Sobre Comportamento e Cognição 203


P'1!' !.í

Considerando a segunda hipótese (a extinção de respostas em situação coer­


citiva), deduz-se que as constantes exposições a eventos aversivos no bullying podem

'W *-*
levar a vitima ao quadro de desamparo aprendido pelo fato de ela muitas vezes discrimi­
nar que não importa o mecanismo adotado, nada funcionará para se livrar do agressor.
Tal fato se deve principalmente aos deficits de habilidades no enfrentamento de proble-
mas e também ao despreparo por parte do ouvinte, que pode apresentar audiência ou
providências punitivas que. por sua vez. podem garantir represálias ainda maiores para
l5f,- a vítima.
r . Newman, Holden e Delville (2005) confirmam esta afirmação, defendendo que
' é possível que a vitimização crônica ocasione uma espécie de desamparo aprendido,
fazendo as vitimas se tornarem particularmente vulneráveis a sintomas de estresse.
..., Slee e Rigby (1993), por sua vez, argumentam que a depressão pode ser o resultado ou
; a razão de ser vitimizado por bullying, pois as vítimas são mais introvertidas, menos
{.. assertivas, atraindo também a atenção negativa dos pares,
Apesar do destaque da vulnerabilidade das vítimas para o desenvolvimento da
depressão, a literatura internacional tem demonstrado preocupação com a categoria
H das vítimas-agressoras: em termos de saúde mental, é a que apresenta problemas dc
i: comportamento internalizantes (depressão, retraimento etc.) tão significativos quanto
os externalizantes (agressividade, abuso de substâncias), conforme Ivarsson, Broberg;
Arvidsson e Gillberg (2005). Klomek, Marrocco, Kieinman, Schonfeld e Gould (2007)
acrescentam que, havendo conseqüências negativas do bullying aos envolvidos (alto
risco para depressão, ideação suicida, ou mesmo suicídio), o risco é ainda maior para
a categoria de vítimas-agressoras.
Um estudo correlacionai recente sobre bullying e depressão (Lima, Cunha,
Weber, Carvalhais, 2007), indica que, dentre os participantes do estudo com sinais de
depressão conforme os critérios do GDI (Children’s Depression Inventory), cerca de
57% pertenciam à ciasse de vítimas-agressoras. Uma hipótese para isso refere-se ao
resultado de uma contingência quo envolve: a) limitação nas habilidades de dispor de
reforços através de comportamentos mais adaptativos (ou seja, que não envolve agres­
são e coerção entre pares) e b) o estado de ansiedade e estresse resultante do ciclo
agredir e ser vitimizado a qualquer circunstância, que faz com que o sujeito fique em
estado de alerta para um enfrentamento à base da agressão ou para a passividade.
Intimamente relacionado à depressão e à coerção tem-se o suicídio e a ideação
suicida. Kim, Koh e Leventhal (2005) destacam que especialmente vítimas-agressoras
■■ (sobretudo as meninas) têrn significativos riscos para a ideação suicida e atos suicidas
'! quando comparados àqueles que não se envolveram com o bullying. Quanto a isso,
....... Sidman (2003) complementa tal asserção ao defender que muitas vezes o estado em
que se encontra o coagido acaba !evando-o ao suicídio, a fuga última das garras de
necessidade e coação esmagadoras, ou de uma vida dominada por reforçamento ne-
gativo e punição.
Algumas tragédias envolvendo estudantes que assassinaram colegas ou pro-
Ç(r fessores em escolas receberam grande atenção da mídia nas últimas décadas. Um
estudo sobre 15 incidentes de estudantes que realizaram ataques armados em suas
escolas revelou um histórico de rejeição aguda (ostracismo, bullying e/ou rejeição
romântica) em pelo menos 13 destes casos (Leary, Kowalski, Smith & Phillips, 2003).
Ao “matar a escola” e suicidar-se depois, ressalta-se para mais uma forma de
coerção na automutilação. Sidman (2003) descreve que o próprio ato suicida é uma
forma de coerção, algumas vezes não-intencionada, mas freqüentemente deliberada: é

204 Juliana de B. Lima., tieonardo P, Rodrigues, (osafá M . òa Cunha, Lidia N . D. W eb er


uma maneira de fazer com que as pessoas prestem atcmçao e mesmo que façam o quo
se quer. Através do suicídio há tarnbém uma forma de punição para aqueles que, do
forma real ou imaginária, exerceram coerção devastadora sobre o sujeito (por exemplo,
família, amigos e comunidade).

4. Conclusão
Apesar de o bullying requerer exposição contínua e prolongada a eventos
aversivos e humilhantes, brincadeiras de mau gosto entre pares, efetuadas de forma
esporádica, podem vir a se caracterizar como bullying ao longo do tempo à medida que
as conseqüências dos episódios forem reforçadores positivos para o agressor.
São preocupantes, dentre as conseqüências do bullying. tanto os comporta­
mentos extemalizantes, (como comportamento agressivo pelas pessoas que antes
eram vítimas), quanto os comportamentos internalizantes (como a depressão resultan­
te de contínuas exposições a eventos aversivos aliadas a habilidades sociais deficitá­
rias ocasionadas pela prevalência de operações de esquiva c fuga que impedem uma
implementação do repertório de resolução de problemas).
Eienca-se algumas considerações sobre a prevenção de episódios agressi­
vos entre pares e suas repercussões negativas no ajustamento psicológico Um as­
pecto relacionado à prevenção do bullying (e também à depressão na adolescência) é
a promoção de práticas parentais protetivas. Por meio de uma educação parental não-
coercitiva, que privilegia o respeito aos direitos humanos, a tolerância das diferenças e
o treinamento de condutas assertivas dos filhos, dentre outros fatores, é possível que
ensinar crianças e adolescentes a construir maneiras habilidosas para enfrentar desa­
fios nas interações com pares no ambiente escolar.
É fundamenta! que haja um efetivo intercâmbio entre os resultados das pesqui­
sas e a sociedade a respeito de comportamentos agressivos entre pares para que
possam ser traçadas estratégias de prevenção de agravos ao ajustamento psicológico
dos envolvidos com o bullying, A consciência sobre a severidade de cada episódio e
suas conseqüências a curto e longo prazo são essenciais para que escolas e comuni­
dade trabalham unidas. No que diz respeito ao atendimento clinico de crianças e ado­
lescentes envolvidos em episódios de bullying, a análise funcional do comportamento
torna-se imprescindível, pois através desta é possível compreender, de forma mais
aprimorada, as relações que esse individuo estabelece com o seu meio, verificando
déficits e excessos que permitiram a manifestação de comportamentos inadequados,
sejam eles abertos ou encobertos

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208 Juliana de B. Lima, Fleonarrio P. Rodrigues, Jcsofa M . da C unhd, Lidia N . P . W eber


Capítulo 17
Implication familiar percebida, actitudes
hacia las matemáticas y rendimiento
académico
Leila do Socorro Rodrigues Feio
UNiovr
Julio Antonio Qonzález Pienda
U N IO V I*
Carlos Nunes
U N IO V I*
João dos Santos Carmo
UFSCar, Brasil
M arillac Cunha Ferranti
U N A M A , Brasil

La interacción entre escueia, profesores y família es muy importante para cl


desarrollo de los ninos. Muchas veces cuando un de esos segmentos fallan, puede
favorecer el fracaso escolar de este nino.
Sin embargo, el fracaso escolar está relacionado con otros múltiples factores,
tales como: (a) el sistema educativo, (b) el contexto familiar, c) la metodologia utilizada,
(d) la habilidad dei profesor, (e) los factores socio-económ icos, y (f) las variables
personales dei alumnado.
Las variables que están relacionadas al rendimiento de los estudiantes son
diversas, como la motivación, el auto-concepto, los sentimientos, etc. Sin embargo, la
ímplicación familiar puede ser una variable que influye en las actitudes dei alumnado; y
esta incide en el rendimiento académico de los mismos.
Todas las variables deben ser consideradas porque poseen relación directa con
los contextos familiares y escolares dei alumnado. Los distintos contextos con los que los
estudiantes mantienen contacto son relevantes para el aprendizaje de las matemáticas.
Todos que constítuyen el proceso de ia ensenanza y dei aprendizaje escolar participan de
la vida académica de un nino. Además, todos inciden sobre el éxito dei mismo.
La importancia de los distintos contextos en el aprendizaje de tas matemáticas
es decisiva para que el estudiante este bien adaptado, posea auto-estima elevada y
perciba la utilidad de las matemáticas en su vida cotidiana (ver, Cowan, 1993; Cornell,

‘ UnivereidaddeOviedo, Espanha

Sobre C omportamento c Cognição 209


1999; Schwarz. 2000; Gilroy. 2002; Burns, 2004, 2005). El contexto familiar y el contexto
escolar son los scctores fun d a m e n ta ls, quizás más importantes que el estudiante
enouentra en su vida académica.
La familia es el primer contexto donde el nino se desarrolla socialmente, es
decir, es el primer agente de socialización en la vida dei nino, seguido de la escuela, de
ahí la importancia de que estos dos âmbitos estén relacionados armónicamente, para
posibifitar el éxito dei nino en el campo escolar. Sin embargo, la realidad de la vida
laborai, etc., puede dificultar estas relaciones. Tanto la familia como la escuela han ido
evolucionando en el transcurso dei tiempo, por ejemplo, la familia se ha urbanizado, las
mujeres se han incorporado al mercado laborai, los hijos acuden a las clases cada vez
más temprano. Por eso es muy importante que ia familia y la escuela se relacionen ya
que tal relacíon establece una mayor confianza entre padres y profesores. Por tooo ello,
esto cs un tema que suscita la reflexion desde el punto de vista psicológico y pedagógi­
co.
Discutir cl papei da la familia en el desarrollo general de sus hijos, no es una
tarea simple. Y más especificamente sobre las actitudes positivas y negativas en el
aprendizaje de las matemáticas. Se ha encontrado en distintos estúdios que el nivel de
la im p lica ció n de los padres en la educación ge n e ra l de sus hijos, a ctitu d y
comportamicnto de los estudiantes hacia las matemáticas es muy importante para el
desarro llo del estudiante. Algunos estudios m uestran que cuanto m ayor es la
participación de los padres en la vida escolar de los hijos, la posibilidad de que estos
tengan cxito es muy alta, en especial en el aprendizaje de las matemáticas.
El contexto escolar es una variable ampliamente estudiada. sin embargo, la
implicación familiar en el proceso de aprendizaje es una variable, que aunque no ha sido
tan ampiiamente estudiada. parece ser decisiva para el desarrollo afectivo, cognitivo y
comportamental de los estudiantes, y por tanto, para lograr el éxito académico, Los resul­
tados de los estudios realizados sobre el proceso de ensefianza y aprendizaje escolar,
han mostrado que existe una relación significativa entre la implicación familiar y el éxito
académico de los estudiantes (Kaplan, Liu y Kaplan, 2001; Keith, Keith, Quirk, Sperduto,
Santilio y Killings, 1998; Paulson, 1994; Ryan y Adams, 1995; Steinberg, Lamborn,
Dombusch y Darting, 1992). Por ejemplo, ha sido senalado por diversos investigadores
que la implicación familiar positiva influye en todos los estudiantes, independientemente
del curso en que se encuentren (Muller, 1993, 1998); y disminuye la posibilidad de que el
estudiante abandono la Ensefianza Secundaria (Teachman. Paasch y Carver, 1996).
Aunque el contexto familiar (la implicación familiar y la educación de los ninos)
no sea muy estudiado, parece que hay un esfuerzo por parte de los investigadores en
ampliar esta temática (ver, Bogenschneider, 1997; Eccles, Jacobs, y Harold, 1990; Epstein,
1991; Gonzáles-Piendas y Nunes, 2005; Muller, 1998; Schneider y Coleman, 1993; Smith,
1992; Snow, Barnes, Chandler, Goodman, y Hemptill, 1991; Teachman, Paasch, y Carver,
1996; Useem, 1992). Hay poca información sobre si la implicación de los padres y
madres difiere para hombres y mujeres. Aiguna literatura sugiere que las prácticas de
socialización tradicionales resultan en pequenos cambios de los padres y madres en
relación a las mujeres (Smith, 1992; Wellesley College Center for Research on Women,
1992; Wigfield y Eccles, 1994).
En el presente estúdio, la implicación de los padres/madres se analiza desde
la perspectiva de los adolescentes; es decir, las respuestas de los estudiantes fueron
consideradas como un indicador importante en cómo ellos percibian la implicación de
ia farnilia con su educación. Así, el objetivo de la presente investigación se trata de
obtener información sobre:

210 Leila do S. R. Feio, J. A . Çonzález-Píenda, Caries Nunes, João dos 5. Cam io, M arillae C. Ferranti
1. La influencia de la variable “sexo" sobre la percepción del alumno respecto a diversas
dimensiones de la implicación familiar en cl ostudio de las matemáticas. Interest conncer
en qué medida mujeres y hombres percibcn de modo diferencial la im p lic a c ió n de ios
padres en sus estúdios en el área dc las matemáticas.
2. La influencia de la variable “c u is ó ' sobre la percepción del alumno respecto a diver
sas dimensiones de la implicación familiar en el estúdio de las matemáticas Interesa
conocer en qué medida los estudiantes de los tres cursos considerados (se<)iindn
curso dei tercer ciclo de Educación Primaria, 6o EP; segundo curso de primer c ic lo do
Educación Secundaria O bligatoria. 2° ESO; segundo curso dei segundo ciclo dc
Educación Secundaria Obligatoria, 4o ESO) perciben de modo diferencial la implicación
de los padres en sus estúdios en el área de las materriaticas.

Metodo
1. Diseno
Los datos recogidos para la contiastación de los objetivos planteados han sitio
obtenidos a través de un procedimiento de "investigación mediante encuesta" y con un
planteamiento “transversal", de tipo correlacionai. Esto quiere decir que la informacion se
obfiene en una sola ocasión para todas las variables, mediante cuestionarios tipo
autoinforme y sin controles específicos sobre posibles variables intervini entes (o extranas).

2. Participantes
La muestra total en esta investigación la forman 311 estudiantes de tres Cen­
tros de Estúdios Públicos de Oviedo (Colégio Santo Domingo, Colégio Novo Mier, y
Colégio Leopoldo Alas Clarin). En cuanto a la variable género, de la muestra total. 183
son hombres (58,8%) y 128 son mujeres (41,2%). En lo que se refiere a la variable
curso, 102 son estudiantes de segundo curso dei tercer ciclo de la Ensenanza Prirnaria
(6o curso, 32,8%); 136 son estudiantes de segundo curso del primer ciclo de la Ensenanza
Secundaria Obligatoria (2o ESO. 43.7%), y 73 son estudiantes de segundo curso dei
segunda ciclo de la Ensenanza Secundaria Obligatoria (4a ESO, 23,5%).

3. Instrumentos
Han sido administrados dos cuestionarios para ta evaluación de las variables
incluídas en este estúdio: el Inventario de Actitudes hacia las Matemáticas (IAM), y el
Cuestionario de Implicación Familiar (CIF).

3.1. Inventario de Actitudes hacia las Matemáticas (IAM)


El IAM es una version ampliada, con relevantes modificaciones de las escala
de e va lu a ció n de actitu des ha cia las m atem áticas (FSS - F enn em a -S he rm a n
Mathematics Attitude Scales), elaborada por E. Fennema y J. A, Sherman (Fennema y
Sherman, 1976) y utilizadas desde entonces por una gran cantidad de investigadores
sobre el aprendizaje y la Ensenanza de las matemáticas.
El IAM está constituido por gran parle de los items del FSS (adaptados a cultura
espanola) y nuevos items destinados a medir de modo más preciso el tipo de orientación
motivacional asociada a la actitud y e! tipo de atribuciõn causal realizada (necesaria
para comprender correctamente la actitud prevalente).
En total, el IAM posee 86 items para la evaluación de 15 dimensiones primarias.
Son escalas tipo Likert con 5 alternativas (siendo que el valor de la puntuación 5

Sobre Comportamento e Cognição 211


representaba "totalmente cierto", y el valor 1 respresentaba "totalmente falso”. Es decir,
a m ayor puntuación. mayor la valoración dc la actitud del alumnado. Los análisis
fa c to ria ls realizados confirman la estructura teórica mencionada. En ia Figura 1, se
presenta la estructura factorial del IAM, en la que se describe el significado de cada una
de las 15 dimensiones y los items que las conforman.
INVENTARIO DÊ ACTITUDES HACIA U S MATEMATICAS[I A M ]

FT Incapacidad percibida (Lack of Conticence) 6 , 7, 8, 9, 15: 45, 84, 85

F2: Las matemáticas es para los hombres (Maths 50, 51, 52, 53, 54, 55, 56
as a Male Domain)

F3: Ulilídad de las matemáticas para e! futuru 28. 29. 30, 31


(Usefulness of Maths)

F4: Falta de interés por !as matemáticas 32, 33, 34, 35

F5: Competencia percibida (Confidence in Learning 1, 2, 3. 4. 5, 41


Maths)

F6: Orientación Motivacional hacia el Yo 57, 58, 59, 60, 61

F7: Motivación Intrínseca 72, 73, 74, 75, 76, 77, 78, 86

F8: Actitud de los Padres (Parent's Attitudes) 18, 19 ,20. 21, 22, 25, 26, 27

F9 Ansiedad ante las Matemáticas (Maths Anxiety) 10, 12, 13, 14, 16, 17

F10: Implicación Negativa en Matemáticas por 63, 64, 65, 66


mantener la valoración de los iguales

F11: Favorito del profesor como medio para el éxito 36, 37, 43, 45
(Atribución Causas Externas)
F12: La inteligencia como medio para el éxito 40, 42
(Atribución Causas Internas al Éxito)

F13: La ineptitud dei profesor como explicación del 47,48


fracaso en Matemáticas (Atribución Causas Inter­
nas del Fracaso)

F14: Sentimientos provocados por Matemáticas 79, 80, 81, 82, 83


(M aths related-Affect)

F15; Actitud de los proíesures (Teacher's Altitudes) 67, 68, 70, 71

3.2. Cuestionario de Implicación Familiar (GIF)


El CIF es una adaptación del “Cuestionario sobre el ambiente familiar" elabora­
do por Song y Hattie (1984), realizado por González-Pienda y Nunez (1994).
Ef CIF es un cuestionario utilizado para medir la implicación familiar y ha sido
desarròllado de acuerdo con seis dimensiones que son: a) expectativa de los padres
sobre el rendimiento de los hijos; b) nivel y tipo de ayuda que prestan los padres a sus
hijos a la hora de realizar las tareas académ icas en el hogar; c) conductas que
demuestran interés de los padres respecto a cómo realrzan los trabajos escolares sus
hijos; d) expectativas de los padres sobre la capacidad de sus hijos para alcanzar
logros importantes; e) grado de satisfacción o insatisfacción de los padres con el nivel
alcanzado por sus hijos en los trabajos escolares; f) conductas de reforzamiento por
parte los padres respecto a los logros de sus hijos.

212 Leila do S. R. Feio, J. A , Qonzález-Pienda, Cados Nunes, João dos S. Carm o, M arillac C. Fcrranti
En total, el CIF posee 4 3 ítems para la evaluacion de 6 dimensiones T io n o
quince escalas ripo likert, a saber: son nueve escalas que tienen do 1 a 4 items (sinudo
1 la puntuacion más alta y 4 la más baja); y seis escalas que tienen do 1 a b íto m s
(siendo 1 la puntuacion más alta y 5 la más baja). La puntuación 1 corrospondm a
valoraciones de "muy buenas; muy verdadero, o mucho"; y la p u n tu a c io n 4 o 5
representaba "Muy falso; muy malas o muy poco". Es decir, a_mewrpuntuíK;ión,_/nlvyor
es la valoración de la implicación fam iliar percibida por el alumnado. l os análisis
factonales realizados confirman !a estruetura mencionada. En la Fiqum 2, so presonta
la estruetura factorial dei CIF, en la que se describon el significado do cada una de las
seis dimensiones y los ítems que las conforman.

CUESTIONARIO DE IMPLICACIÓN FAMILIAR[C!F]

F1: Expectativa de rendimiento 1. 2, 3. 4 5


F2: N:vel y tipo de aytda 8 . 9, 10, 11. 13

F3: Interés por los progresos 17, 18, 19. 20. 23 24

F4: Expectativa de capacidad 25,26,27,28,30,31,33

F5: Gradü de satisfacción 34,35,36,39

F6: Conductas de reforzamiento 40,41,42,43

4. Procedimiento
Los cuestionarios fueron aplicados por la primera autora con el apoyo dei equi­
po de orientación de los centros educativos. La aplicación dei cuestionario se realizo en
algunos casos en el aula o en el salón de actos. Todos los estudiantes han sido infor­
mados previamente. Los pasos utilizados para la aplicación dei cuestionario han sido
los siguientes; primero, se visitó la escuela y se habló con la dirección para entregar la
solicitud de permiso para hacer la encuesta; segundo, la dirección de la escuela se
responsabilizo de informar a los padres, alumnos y profesores; tercero, la administración
escolar informo !a fecha más adecuada a la investigadora. En el momento de la aplicación
de los cuestionarios al alumnado, la investigadora dio las instrucciones para rellenar el
instrumento. Los estudiantes tenían aproximadamente 1h y 30 minutos para ta realización
dei trabajo, siempre en el turno de la mafiana.

5. Análisis de datos
Para el estúdio de los objetivos planteados en esta investigación, teniendo en
cuenta la naturaleza de los mismos, se utílizan análisis estadisticos descriptivos,
análisis de fiabilidad mediante el procedimiento de Alfa de Cronbach, análisis de la
varianza (ANOVA, MANOVA) y análisis de regresión lineal. Los análisis fueron realizados
mediante el paquete estadístico SPSS 12.0.
Para el análisis de la influencia de variabíes sexo, y cursos de los alumnos
sobre la percepción de la implicación familiar se han llevado a cabo análisis rnultivariados
de la varianza (MANOVAs). En estos análisis, las variabíes independientes (VI) son sexo
y curso; las variabíes dependientes (VD) son ias seis dimensiones dei CIF. Para conocer
el grado de incidência de la percepción de implicación fam iliar sobre la actitud dei
estudiante hacia las matemáticas se han llevado a cabo análisis de regresión en los
que las variabíes independientes (VI) son las seis dimensiones dei CIF. y !as variabíes
dependientes (VD) son las dimensiones de! IAM.

Sobre Comportam ento e Cognição 213


Resultados
Influencia de la variable sexo del estudiante sobre su percepción de la
implicación familiar
En la Figura 3, se presentan los datos descriptivos para mujeres y hombres
respecto de las seis dimensiones de la implicación familiar consideradas en el CiF.

DIMENSIONES DEL CIF HOMBRES N° 183 MUJERES N° 128


M DT M DT

Exp. De los padres sobre el rendimiento de los 1,70 0,59 1,76 <162
hijos
Nivel y ;ipo de ayuda que prestan los padres a 2,40 0,74 2,33 0,77
sus hijos a ia hora de realizar las íareas
académicas en el hogar
C onduces que demuestran interés de los pa­ 1.97 0,72 1,87 0,68
dres respecto a cómo reaiizan los trabaios
escolares sus hijos
Exp. de los padres sobre la capacldad de sus 1,98 0,66 1,90 0,62
hijos para alcanzar logros importantes
Grado de satisfacción o insatisíacción de los 2,31 0,86 2,15 0,76
padres con el nivel alcanzado por sus hijos en
los trabajos escolares
Conductas de reforzamiento por parte los pa­ 2,33 0,66 2,48 0,73
dres respecto a los logros de sus hijos

Los resultados de los contrastes multivariados indican que la variable sexo no


explica significativamente la variabilidad observada en la totalidad de las variabies
dependientes (dimensiones del CIF): valor de Lamda de Wilks P% 0.968; F63MP%
1,702; p P% 0,120; ç2 P% 0,032.
Aunque no han sido observadas diferencias estadisticamente significativas a
nivel global, parece razonable examinar si en alguna de las variabies dependientes
(dimensiones del CIF) la variable sexo muestra diferencias significativas.
Las pruebas de los efectos inter-sujetos para cada una de ias variabies
dependientes, (dimensiones de la escala CIF), indican que no existen diferencias sig­
nificativas entre mujeres y hombres en ninguna de las seis dimensiones evaluadas en
el CIF: Expectativa de rendimiento (F i m P% 0,549; p P% 0,459; ç2 P% 0,002), Ayuda
(F1SDftP% 0,550; p P% 0,459; ç2 P% 0,002), Interés (F1J08 P% 1,334; p P% 0,249; ç2 P%
0,004), Expectativa de capacidad_(F130gP% 1,219; p P% 0,270; ç2 P% 0,004), Satisfacción
(F 13MP% 3,184; p P% 0,075; ç2 P% 0,010), Refuerzo (F, 30aP% 3,459; p P% 0,064; ç2 P%
0 . 011 ).

Influencia de la variable curso del estudiante sobre su percepción de la


implicación familiar
Interesa conocer en qué medida los estudiantes de los tres cursos considera­
dos (segundo curso del tercer ciclo de Educación Primaria, 6o EP; segundo curso de
primer cicio de Educación Secundaria Obligatoria, 2° ESO; segundo curso del segundo
ciclo de Educación Secundaria Obligatoria, 4o ESO) perciben de modo diferencial la
implicación de los padres en sus estúdios en el área de las matemáticas.

214 Leila do S. R, ^eío, J. A . Q onzákz-Pienda, Carlos Nunes, João dos S. Carm o, M arillac C. Ferranti
En la Figura 4 se presentan los datos descriptivos para el curso respecto de las
seis dimensiones de la implicación familiar considuradas en el CIF.

DIMENSIONES DEL CIF M nv


6EP 22ESO 4ESO 2ESO 6EP 4ESO

Exp. de los padres subre el rendímiento de tos 11,58 11,76 11,86 0,57 0,57 0,67
hijos

Nivel y tipo de ayuda que prestan los padres a 22.13 22 43 22 60 00,71 00,78 00,67
si>s hijos a la hora de realizar las tareas
académicas en el hogar

Conductas que demuestran interes de los 11.63 22.15 11,93 00.56 00,71 00,73
padres respecto a córno realizan lus trabajos
escolares sus hijos

Exp de los padres sobre la capacidad oe sus 11,69 22,13 11,98 00,58 00,63 00,64
hijos para alcanzar logros importantes

Grado de satisfacción o insatisfacción de los 11.88 22,38 22.51 00,76 00,82 00,73
padres con el nivel alcanzado por sus hijos en
los trabajos escolares

Conductas de reforzamiento por parle ios 22-16 22,27 22,54 00,69 00,64 00,76
padres respecto a los logros de sus hijos

Los resultados de los contrastes multívariados indican que ía variable curso


explica significativamente la variabilidad observada en la totalidad de las variables
dependientes (dimensiones dei CIF): valor de Lamda de Wilks P% 0,747; F 12eo<. P%
7,911; p P% 0,000; ç2 P% 0,135.
Habiendo sido observadas diferencias estadisticamente significativas a nivel
global, a coníinuación se examina cuáles de las variables dependientes (dimensiones
dei CIF) son las que dan lugar a tales diferencias estadisticamente significativas.
Las pruebas de los efectos inter-sujetos para cada una de las variables
dependientes, (dim ensiones de la escala CIF), indican que existen d ife ren cias
estadisticamente significativas entre los tres cursos en las seis dimensiones evaluadas
en ei CIF: Expectativas de rendímiento (F230a P% 5,094; p P% 0,007; ç2 P% 0,032), Ayuda
(F230a P% 9,494; p P% 0,000; ç2 P% 0,058), ln te rés{F2;W8 P% 17,471; p P% 0,000; ç2 P%
0,102), Expectativas de capacídad (F230a P% 14,655; p P% 0,000; ç;' P% 0,087),
Satisfacción (F2308 P% 17,188; p P% 0,000; ç2 P% 0,100), Refuerzo (F2Jttó P% 4,401; p
P% 0.013; ç? P% 0,028).
El resultado de los a n á lis is de datos m ostró en general d ife re n cia s
estadisticamente significativa entre ios estudiantes de Primaria (6o) y Secundaria (2o y 4°).
Sin embargo, en esta dimensión (refuerzo), se puede observar en la gráfica que los
estudiantes de 2o ESO presentan la percepción de refuerzo más favorable de los padres.
Se observa que los estudiantes de 2° ESO perciben efectivamente las conductas de
refuerzo de sus padres respecto a sus logros académicos; seguidos por los estudiantes
de 6o ER También se observa que la percepción de los estudiantes dei último curso de la
ESO (4o) disminuye en relación a las conductas de reforzamiento de sus padres.

Sobre Comporta men lo c Cognição 215


En conciusión, los estudiantes de 2o ESO perciben más positivamente la conducta
de reforzamiento de los padres que los estudiantes do 6o EP y 4o ESO. Los estudiantes
que menos perciben la conducta de reforzamiento de los padres son los de 4o ESO.

Conclusiones
Teniendo en cuenta todo ci dosarrollo efectuado en esta investigación, los re­
sultados de !os análisis realizados en una muestra de estudiantes espanoles de se­
gundo curso dei tercer ciclo de Educación Primaria, 6o EP; segundo curso de primer
ciclo de Educación Secundaria Obligatoria, 2° ESO y segundo curso dei segundo ciclo
de Educación Secundaria Obligatoria, 4° ESO) muestran que éstos perciben de modo
diferencial la implicación de los padres en sus estúdios en el área de las matemáticas.
Cuanto más positiva es la percepción dei alumnado en retación a implicación familiar
(ver las seis dimensiones dei CIF), mejor será el nivel de aprendizaje y consecuentemente
el rendimiento académico. Por ello se concluye que es importante y sustancial la pre­
sencia efectiva de los padres en la vida académica de los hijos.
En lo que se refiere a! variable sexo, sc ha observado que hombres y mujeres
no perciben de modo diferencial !a implicación de los padres en sus estúdios en el área
de las matemáticas.
Se aprecia claram ente que la variable curso explica significativam ente la
variabilidad observada en la totaiidad de las variabíes dependientes (dimensiones dei
CIF). Los estudiantes de segundo curso dei tercer ciclo de Educación Primaria (6o EP);
segundo curso de primer ciclo de Educación Secundaria Obligatoria (2o ESO) y segundo
curso dei segundo ciclo dc Educación Secundaria Obligatoria, (4o ESO) perciben de
modo diferencial la implicación de los padres en sus estúdios en el área de las mate­
máticas. En resumen, se destacan tres puntos: (1) la implicación familiar percibida por
tos estudiantes (de 6o EP, 2o y 4o) decrece con el paso dei tiempo; (2) A menor edad de los
estudiantes, m ayores la implicación familiar percibida por ellos respecto a la participación
de sus padres en la ayuda a las tareas escofares; en el interés por los progresos; en el
grado de satisfacción, en las expectativas sobre ei rendimiento; en las expectativas
sobre la capacidad y en las conductas de reforzamiento; y (3) cuanto más los estudiantes
van ascendiendo a los cursos avanzados, la implicación familiar percibida por ellos va
disminuyendo; es decir, los estudiantes perciben sus padres menos implicados con
sus actividades académicas.

Implicaciones educativas
Se aprecia que e! curso es una variable importante en este estúdio. Es de
destacar que a medida que los estudiantes van avanzando en los cursos escolares la
implicación familiar percibida por ellos va cambiando drástica mente. Los estudiantes
que se encuentran en los cursos iniciales perciben más positivamente la implicación
de los padres hacia las actividades escolares (por ejemplo, la ayuda a las tareas, el
interés por los progresos, las expectativas de rendimiento y capacidad para logros
importantes). Todo lo contrario pasa con los estudiantes de la Ensenanza Secundaria
(2o y 4o) que perciben sus padres cada vez menos implicados con su vida académica.
Por ello y con base en este contexto, parece que seria razonable sugerir medi­
das de prevención o de concienciación con el fin de cambiar estigmas y promover la
participación efectiva de todos que participan (profesores, padres, equipo de orientación,
etc.) en la vida académica de los hijos en todos los cursos escolares. Cada uno mismo
tiene su parcela de colaboración en el âmbito escolar y familiar, y en esta investigación

216 Leila do S. R. Feio, \. A . Q oitó lez-P íe n d a, Carla« Nunes. João dos S. Carm o, M arillac C. Ferranti
los resultados son claros. pues la participación efectiva de los padro;. en l;i vkIh escolar
de los hijos puede beneficiar tanto a los hijos, como a elios misrrios Uil p;irticipacion
deberia llegar especial/nente a los estudiantes adoiescentes, porque; t;iI corno ha sido
comentado en la parte introduetoria, a medida que los ninos vyn dosarroliándose y
creciendo, parece que los padres se alejan de sus hijos. quizás p^rn concederles más
autonomia e independencia. Lo que parece claro es que no cs por osta via que se
alcanza estos atributos (autonomia e independencia), sino, por la intcracción familta y
escuela en todos los niveles escolares.

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218 Leila Jo S. R. Feio, J. A . Qonzalez-Pienda, Carlo? Nunes, joao dos S. Carmo, M aritla c C . Ferranti
Capítulo 18
Programação de ensino como uma
tecnologia para a educação

Mareio de Cassto Juliano


Faculdade da Cidadania Zumbi dos Palmares
Sergío Vasconcelos de Lu na
P U C -S P

O controle aversivo na educação


No subtítulo “Reforço Educacional”, Skinner (1953) traz à tona o problema da
utilização das técnicas aversivas de controle. Segundo ele, embora seja verdade que o
uso da palmatória, felizmente, já tivesse sido abandonado e que as formas de violência
disciptinadora fossem cada vez menos utilizadas, ainda assim, logo que uma conseqü­
ência aversiva era afastada do ambiente educacional, outra logo a substituía2. Skinner
se referia a certas formas de ameaças de retirada de atenção ou reconhecimento por
parte do professor para fazer com que o estudante se comportasse da maneira que ele
julgasse ser a melhor, ou ainda, à estimulação averstva condicionada (ameaça de
reprovação, suspensão ou expulsão) baseada nos reforçadores usualmente disponí­
veis no contexto escolar
Sidman (2003) também trata da Educação em seu livro Coerção e suas Impli­
cações e, assim como Skinner, indica que, embora o uso da punição corporal em
ambientes educacionais seja refutado pela maior parte das comunidades, professores
ainda a utilizam como ferramenta pedagógica.
Os estudantes que tendem a fracassar no ensino, apresentando notas baixas,
fraco desempenho acadêmico, lentidão na execução das tarefas propostas, são mais
propensos a serem vítimas de meios coercitivos. O professor trata esse tipo de estu­
dante expondo-o ao ridículo perante aos demais estudantes com as seguintes práticas
consideradas coercitivas:
• submete-no a testes orais, mesmo sabendo que não será capaz de responder, reve­
lando para todos os demais as suas deficiências;
• divulga a sua prova, geralmente com uma nota baixa, muitos erros e comentários
jocosos escritos pelo próprio professor, de maneira que todos os outros estudantes

1 Ê impertante lembrar que Skinner escreveu Isso no fina! da década de 1960

Sobre Comportamento c Cognição 219


tenham acesso a ela e possam se divertir às custas de seus erros;
• destaca suas notas baixas no boletim com uma cor chamativa, na maioria dos casos,
a cor vermelha.
» solicita carga de trabalho inadequada, maior do que a que o estudante pode agüentar;
• cria mecanismos para obrigar o estudante a passar mais tempo que o normal na
escola, como forma de castigo pelo fraco desempenho apresentado, privando-o do
prazer de brincar e de se divertir;
• atribui tarefas extra-sala de maneira excessiva para compensar os “erros” cometidos
em sata de aula.

Ainda, segundo Skinner (1972), as práticas citadas acima são uma das princi­
pais causas da evasão escolar, pois a fuga do estudante torna-se inevitável. Ele come­
ça a se desligar da aula, perdcndo-se em seus próprios sonhos e, desde que não
perturbe a aula, o professor dificilmente se importará com isso. A continuidade e manu­
tenção dessas condições coercitivas acarretarão no estudante, de maneira progressi­
va, um caminhar vagaroso, atrasos freqüentes, invenções de doenças inexistentes,
faltas, e o afastamento definitivo dcie do ambiente educacional.
Esse “caminho" poderá ser encurtado pelo professor e pelo sistema educacio­
nal, de maneira que poderia ser considerada irônica, se nâo fosse tão irresponsável,
com a apresentação de uma advertência que indicará a sua suspensão e posterior
expulsão da escola (instruindo-o sobre como proceder para se ver livre da coerção que
lhe aflige).
Sidman (2003) considera as crises de disciplina e desistência como resultado
da história da coerção educacional. O próprio uso da coerção gera a destruição do
sistema por meio de um mecanismo de contra-controle, de modo que, quem foi coagi­
do se volta contra quem coagiu. Assim, a relação professor-afuno foi se deteriorando e
se tomando uma relação de disputa e quem foi vítima, os pais dos alunos atuais, “...não
mais apóiam o sistema contra seus próprios filhos" (p. 119).
Antes de Sidman (2003), Skinner (1953) já citara alguns subprodutos do contro­
le aversivo como algazarras, rebeliões, trotes e vadiagens, indicando que existem van­
tagens óbvias para se mudar a forma de controle comumente utilizada na Educação,
Sidman (2003), mas, novamente Skinner antes dele (1972), indica que existe
uma alternativa à coerção, chamada de reforçamento positivo, que deve ser ensinada
explicitamente aos professores que não a conhecem. O professor que utilizar, sistema­
ticamente, o reforçamento positivo e rejeitar a coerção não dará motivos para que os
estudantes fujam da escola.
Nas palavras do autor:

A queles que conduzem os seus alunos com sucesso a cada passo, reforçando
positivamente acertos, em vez de punir fracassos, não criam desistentes; eles não
dão aos seus alunos qualquer razão para fugir. (p. 119)

Ao defender a utilização do reforçamento positivo na educação, Sidman (2003)


afirma que essa é a mais poderosa ferramenta de ensino e deveria fazer parte do
currículo de formação do professor. O autor enfatiza que o professor deve levar o estu­
dante a fazer algo novo, a se comportar de uma nova maneira e reforçar positivamente

220 Leila da 5. R, Feio, J. A . QonM lez-Pienda, Carlos Nunes, João dos S. Cam io, M a rilla c C. Ferranti
o comportamento desejado imediatamente apôs » sua emissão. Ele exem plifica os
reforçadores, citando o elogio, o reforçamentn social, notas e pontos para serem troca­
dos por algo de interesse do estudante, mas enfatiza que esses reforçadores devurn
ser substituidos gradativamente pelo próprio prazer e vantagem que a aprendizagem
proporciona, estimulando o estudante a utilizar o que foi aprendido de diversas manei
ras em outros ambientes - fora da escola - e criando condições para issu Urna suges­
tão dele é ensinar o estudante que adquiriu um novo vocabulário a ensinar esse novo
aprendizado aos seus parentes mais próximos, ou aquele que aprendeu princípios de
eletricidade a fazer pequenas melhorias em seu próprio lar.
Skinner (1953) indica que, muitas vezes, na situação de ensino formal, na esco­
la. é inevitável que os estímulos empregados como reforçadores positivos para fortale­
cer o comportamento de vários modos sejam artificiais. Assim, é função do educador
planejar a manutenção do comportamento sob conseqüências naturais presentes na
vida futura do aprendiz, bem como planejar a ampliação, em relação àquelas usadas
durante o ensino, das condições sob as quais ele devera se comportar.

A função do erro na aprendizagem


Skinner (1972), ao tecer suas considerações sobre a função de erros, sugere
que um indivíduo pode aprender com seus erros, pelo menos a não cometê-los outra
vez” (p, 7), mas ratifica que "É falso o pressuposto de que só ocorre aprendizado quando
se cometem erros" (p. 7).
Em um estudo que revisa as descobertas iniciais sobre aprendizagem sem
erros, analisando o erro e suas implicações para a aprendizagem discriminativa, Stoddard,
De Rose & Mcllvane (1986) indicaram que:

a) a aprendizagem, mesmo a mais complexa, pode ocorrer sem erros;


b) a ocorrência de erros é desnecessária para a aprendizagem;
c) a ocorrência do erro pode prejudicar o desempenho que se segue, inclusive o já
exibido e aprendido anteriormente; n c - s ie »
d) com o erro, certos efeitos emocionais podem surgir e perturbar a aprendizagem.

Sidman (2003) sugere maneiras de ensinar que minimizam a possibilidade de


ocorrência de erros e indica que as descobertas e os desenvolvimentos recentes de
metodologias de ensino oriundos da análise do comportamento estão considerando
esse aspecto. Esse autor afirma que “O que torna a aprendizagem sem erro possível é
a programação efetiva.” (p. 291) e considera que um programa de ensino efetivo tem
que estabelecer os pré-requisitos necessários para a aprendizagem, ou o que um
estudante deve saber antes de aprender um determinado conteúdo.
A este respeito, outra consideração importante de Sidman (2003) versa sobre o
papel do professor de arranjar o material de maneira seqüenciada, em passos suces­
sivos que se relacionem com o que já foi aprendido e envolva esse conteúdo, do sim­
ples para o complexo. Dessa maneira, acredita o autor, o estudante que apresentar os
pré-requisitos, percorrerá cada passo com mínimas chances de ocorrência de erros.
Uma última consideração de Sidman (2003) diz respeito à necessária habilidade do
p ro fe s s o r em e s p e c ific a r o que o e s tu d a n te de ve rá a p re n d e r em te rm o s
comportamentais, pois assim ficará claramente estabelecido o que se espera dele e
criará condições favoráveis de avaliação para verificar se ele (estudante) atingiu os

Sobre Comportam ento e Cognição 221


objetivos propostos e se o método criado pelo professor foi eficaz.

Modaüdades para a programação do ensino segundo Skinner.


Existem, pelo menos, quatro modalidades diferentes para a programação,
(Skinner 1972).
Uma delas é aquela que “... procura gerar novos e complexos padrões ou
topografias’ de comportamento" (p. 63). Por meio de programação de contingências de
reforço c modelagem o comportamento complexo é ‘'construído'’ gradativamente por
aproximações sucessivas, sendo reforçadas respostas iniciais mais simples e que
contribuirão para a sua composição final. Exemplos típicos desta modalidade de pro­
gramação são o ensino da caíigrafia e do andar de bicicleta. Em ambos os casos, o
comportamento final é precedido de etapas intermediárias, mais simples, que facilitam
sua aquisição.
Uma segunda modalidade é empregada para modificar as propriedades tem­
porais e de intensidade de um comportamento. Com o emprego do reforçarnento dife­
rencial a força ou o ritmo pretendido para o comportamento em questão será selecionado
entre as várias respostas emitidas por um organismo. Ao aprender a escrever, a criança
precisará colocar a pressão exercida sobre o lápis em um nível adequado: fraco demais,
a escrita poderá não sair; com força excessiva, a ponta do lápis quebrará.
Outra modalidade serve para colocar o comportamento sob controle de estímu­
los. Como conseqüência, o reforçarnento dependerá de que organismo emita um dado
comportamento se um estimulo estiver presente no ambiente. A importância desse tipo
de programação é fazer com que uma pessoa fique sob controle de estímulos, Nas
palavras do autor:

Uma pessoa sob coníroie de estím ulos pode d ize r as diferenças entre cores,
formas e tamanho de objetos; pode identificar form as tridim ensionais vistas de
diferentes ângulos; pode de scobrir padrões ocultos sob outros padrões; pode
identificar notas, intervalos e temas musicais e distinguir entre vários tempos e
ritmos - tudo isso numa variedade quase infinita de situações, (p. 70 e 71)

Finalmente, há a modalidade de programação que se preocupa em manter o


comportamento sob controle de reforçarnento intermitente com baixa freqüência de
apresentação. É importante que um organismo mantenha um elevado nivel de atividade
sem a presença de reforçadores imediatos, o que caracterizaria reforçarnento contínuo.

O ensino “tradicional” e suas implicações


Michael (1991) investigou metodologias de ensino e variáveis que podem afetá-
las em classes que possuem grande número de estudantes (mais de 40) como as dos
primeiros anos de um curso superior3. Ele apontou que os principais meios de ensino, no
início da graduação, são as aulas expositivas e a leitura de textos, reconhecendo que
esses meios são efetivos para a aquisição de um repertório verbal extenso. Porém, faz-se
necessário que o estudante se empenhe em ler os textos sugeridos ou exigidos e revise
as anotações realizadas em aulas expositivas, dedicando um tempo para estudo depois
do. horário de aula, para que essa efetividade se confirme. As aulas expositivas e os textos
começam a perder efetividade quando o estudante é exposto a outras contingências que

'A s refe-rôntías são iodas a cursos de urvvefsidadfis r>ofl£~amfiFlcônaâ

2 2 2 Lciia do S. R. Feio, j. A . Qoruález-Pienda, Cario? Nunes, João dos S. Carm o, M ü rillac C. Ferranti
concorrem com o comportamento de estudar, como uma atividade esportiva, um encontro
amoroso, uma reunião com amigos, cinema, televisão, internet, festas etc.
Em linhas gerais, essa metodologia consiste na solicitação de leitura dc um ou
mais textos pelo professor e na complementação da leitura com uma aula expositivo. As
avaiiações da aprendizagem do estudante, nesse formato de curso, acontecem com a
aplicação de exames em sala de aula. salvo raras exceções, não mais freqüentes do
que duas vezes por semestre.
Michael (1991) propõe que os testes sejam realizados curn uma freqüência
maior que os costumeiros dois por semestre. Um teste por semana diminuiria o inter­
valo entre o seu anúncio e a sua realização, deixando pouco tempo para que o estudan­
te possa se engajar em atividades concorrentes. Outra vantagem em realizar testes
com maior freqüência é que a quantidade do conteúdo abrangido é menor, exaurindo
menos o estudante e aumentando a probabilidade de ele demonstrar o desempenho
esperado, facilitando o trabalho do professor de identificar possíveis dúvidas ou pontos
mal entendidos pelos estudantes c posteriormente esclarecê-los.

Programando contingências de ensino


Ao se deparar com uma situação de aprendizado forçado, extenso e malogra­
do, que dele exigiu exaustivos esforços para adquirir o repertório necessário para utili­
zar o código Morse, Keller (1999) levantou suposições sobre "... um processo menos
árduo para quem quisesse tornar-se especialista" (p. 9). Esse autor, ao citar as carac­
terísticas de um centro de treinamento militar, descreveu um método de ensino análogo
ao que ele próprio viria a desenvolver: instrução altamente individualizada (com grande
núm ero de pessoas nas salas), estudantes a va nça nd o em seu próprio ritm o,
especificação clara das habilidades finais que eram esperadas dos estudantes,
escalonamento cuidadoso das etapas de ensino que levariam ao resultado final dese­
jado, utilização de tutores (monitores) para auxiliar o professor, aulas expositivas em
pequena proporção e maior participação ativa do estudante. Keller estava visualizando
o Personalized System of Instruction (PSI), método de ensino fundamentado nas contri­
buições teóricas da análise do comportamento.
A despeito da importância da contribuição trazida por Keller com seu o PS/4 vale
assinalar que uma preocupação excessiva com a metodologia de ensino pode masca­
rar o que é mais importante: a programação de ensino em si. Quando falamos em
programação de ensino, estamos utilizando um conceito mais amplo, que se preocupa
não só com a metodologia, não só com o meio ou a forma que a relação de ensinar e
aprender assumirá. A programação de ensino tem a preocupação de. além de conside­
rar o meio ou a forma, identificar o que deverá ser ensinado e a partir dai, elaborar
objetivos comportamentais de ensino, preparar m aterial de ensino considerando a
evolução do conteúdo a ser ensinado (identificando pré-requisitos e conceitos bási­
cos), planejar a apresentação do material de ensino e as atividades necessárias para
que eies possam ser cobertos pelos estudantes, elaborar meios de avaliação para
verificar se os objetivos estão sendo atingidos, levantar informações sobre o quão bem
o aprendizado está ocorrendo e as dificuldades que os estudantes estão encontrando
no material, no curso, na avaliação e em relação ao conteúdo.
Segundo Michael (1975)4, um programa de ensino é um arranjo de contingências
que consiste na elaboração das respostas finais que se espera do estudante em termos
'N o te-se que o que ae expõe, a seguir, c 3 concertuação que Michael fez, á época, de programa de ensino Como será visto adianle, esse
conceitofoi m udando 00 longo no tempo Aliás, os quatro tipos de programa otados por Skinner, e há pouco indicados já oonstituerr' uma
muda nça nesle conceho.

Sobre Comportam ento e Cognição


de objetivos comportamentais e, com base nessas respostas, organiza-se um conjunto
de materiais (estímulos) com uma ordem crescente de dificuldade ou complexidade,
considerando o repertório atual do estudante e visando aumentar gradualmente esse
repertório, por meio do reforçamento positivo: no sentido da consecução dos objetivos
comportarnentais propostos. Pode-se descrever a programação de ensino como uma
seqüência de atividades a serem desenvolvidas que podem envolver a leitura e discus­
são de material textual e realização de exercidos educativos que oferecem oportunidade
para o estudante responder (se comportar), proporcionando um avanço gradativo e
reforçador para ele em uma dada disciplina, curso ou conteúdo. A organização do material
expõe o estudante a textos que, inicialmente, são simples e de fácil entendimento, abran­
gendo os pré-requisitos necessários para o desenvolvimento mais complexo do seu
repertório, e evita que um exercício, que o estudante ainda não está preparado para
resolver, seja apresentado a ele. A apresentação de um exercício, dentro deste contexto,
não organizado, provavelmente levará o estudante a errar e o erro traz conseqüências
negativas ao desenvolvimento do estudante (Stoddard, De Rose & Mcllvane, 1986).
A programação de ensino funciona, também, como meio para se estabelecer
critérios para o acompanhamento do progresso do estudante investigando o desenvol­
vimento do seu repertório no conteúdo que se pretende ensinar.
Michael (1975) descreve três componentes para uma instrução efetivas. O pri­
meiro componente consiste na exposição do conteúdo pelo professor, apresentação de
textos, exercícios e estudos de caso para possibilitar (estimular) o estudante a respon­
der. O segundo componente trata de direcionar o estudante a se engajar no comporta­
mento de estudar, lendo, escrevendo, realizando os exercícíos, discutindo o conteúdo e
resolvendo estudos de caso e a não se engajar em outros comportamentos, tais como:
conversar sobre assuntos alheios ao conteúdo, brincar, andar pela sala ou dela se
ausentar. O terceiro componente diz respeito ao reforçamento das respostas corretas,
com o objetivo de fortalecer as relações entre o estimulo apresentado e a resposta
esperada emitida pelo estudante.
Em suma, uma programação de ensino deve fornecer ao estudante o materia!
adequadamente arranjado, considerando os pré-requisitos para a consecução dos
objetivos e estabelecer conseqüências reforçadoras para as respostas esperadas.

Programação de ensino no Brasii


Ao escrever sobre a contribuição da professora Carolina Bori à programação de
ensino no Brasil, Nafe (1998) apresentou aspectos relevantes para serem considera­
dos, tanto na programação de uma pequena unidade de ensino, como em um curso
completo. O autor, contando passagens de sua relação com a Prof* Carolina Bori. aca­
bou disseminando e ratificando o saber construído por ela.
Esse autor destaca a preocupação com a concepção do objetivo de ensino,
antes do planejamento das contingências, como uma grande contribuição da Profa
Carolina Bori para a programação de ensino. Segundo Nale (1998), a Prof* Carolina
Bori, ao ser apresentada aos tópicos de conteúdo que ele - seu orientando - pretendia
abordar em um curso de Biologia, primeiramente elogiou-o pelo conteúdo; em seguida,
exclamou que conteúdo é mera informação, questionando-o sobre quais eram os
objetivos daquele curso e que comportamentos ele pretendia ensinar aos estudantes
dele. O autor então concluiu que a mera transmissão de informação pode não mudar o
comportamento de alguém, a menos que o propósito da informação seja a consecução
de um objetivo previamente definido e que, se alcançado, seja comprovada a alteração
no comportamento de quem manteve contato com tal informação.

224 Leiia do S. R. Feio, j. A . Qom ález-Píenda, Carios Nurjes, João dos S. Carm o, M arillac C. Ferranti
Seguindo as considerações desse autor, não sc devem definir objc.-tivov, de
ensino em termos de expectativa de emissão de respostas apenas em situações <Je
ensino / aprendizagem tipicas de reprodução de informação acadêmica. O fundamental
é definir os objetivos na forma de comportamentos relevantes que façam sentido na
vida do estudante.
Para Nale (1998), podem-se ampliar e diversificar as fontes de consulta para
5e elaborarem objetivos de ensino relevantes. Segundo esse autor, alqunias informa
ções podem ser conseguidas com professores da mesma disciplina, de disciplinas
adjacentes, com estudantes que já passaram pelo programa (levantando as suas difi­
culdades) e. se aplicável, com os pais das crianças que serão onsmadas. Outras fontes
de consulta listadas pelo autor são: documentos legais que regulamentam o exercício
da profissão e literatura sobre as atividades exercidas pelo profissional em seu campo
de trabalho. O autor sugere que a consulta a várias fontes para se propor objetivos de
ensino relevantes para o púbiico-alvo poderia scr chamada de estudo preparatório à
atividade de programação. Vale ressaltar que essa diversificação não e considerada
um passo obrigatório em uma programação de ensino.
Nale (1998) discorreu sobre os estudos que tiveram como objeto a programa­
ção de ensino no Brasil, destacando suas importantes contribuições. Segundo ele, a
mais fundamental de todas essas contribuições foi dada pela Prof;i Carolina Bori ao
sustentar que, mais importante que o formato habitual dos cursos programados indivi­
dualmente, é definir objetivos de ensino em termos comportamentaís e, a partir da
análise desses objetivos, planejar atividades e dispor contingências para atingi-los.
Dessa forma, os métodos de ensino Personalized System o f instruction (PSI) e Instrução
Programada são partes integrantes da programação de ensino corno meio de ensinar
gradualmente, em pequenos passos, no ritmo do estudante, com feedback imediato,
os comportamentos desejados, dentro de um conceito mais abrangente e flexível que é
a Programação de Ensino.
Um avanço que a programação de ensino deu no Brasil, apontado por Nale
(1998), foi a avaliação do método de ensino. A literatura descreve avaliações por meio de
delineamento clássico de comparação entre grupos, de maneira que, geralmente com­
paravam-se resultados obtidos por um grupo de estudantes, ensinados em cursos
individualizados com base em metodologia comportamental, com resultados obtidos
por estudantes ensinados de maneira não programada {‘'tradicional"). Alóm da compa­
ração dos resultados obtidos, os estudantes tinham a possibilidade de avaliar o curso
que tinham realizado e compará-lo com outros cursos não programados ("tradicionais’')
que já tinham freqüentado anteriormente. Nas palavras do autor:

Esses tipos de avaliação são muito discutíveis, p o r uma série de razões, entre as
quais a dificuldade de se estabelecer equivalência entre os grupos e entre as
situações envolvidas em cada caso; o fato de os cursos programados representa­
rem uma novidade para o aluno e, como tai, despertarem m aior interesse ; o possí­
vel maior em penho dos docentes que trabalhavam com o que lhes parecia ser um
método ou uma técnica inovadora de ensino. (Nale, 1998, pág. 228)

Já no caso das avaliações nos estudos brasileiros, a ênfase foi na verificação


dos produtos das respostas do estudante, identificando-se o controle que as contin­
gências programadas exerciam na direção de levar os estudantes a realizarem as
5É importante lernbraroue Michael fala da perspectiva norte-aniericana de ensino superior, em que o fjrucedinifer-tohsNtiraí é a /dcfc/re (aula
Kxpositíva}.

y>brc Comportam ento e Cognição 225


tarefas propostas e aprenderem os comportamentos estabelecidos como objetivos.
Em outros estudos, ainda no Brasil, foi avaliado, diretamente, o desempenho que com­
punha o objetivo comportamental, avaliando-se também a aprendizagem em situações
que se aproximassem da realidade do aprendiz.
Outra autora brasileira aue aborda a Programação de Ensino é Matos (1992),
que indicou as seguintes orientações para programar o ensino de modo eficaz:

1. Especificar o comportamento que se deseja ensinar expressando-o em termos do


que o estudante deve apresentar como produto do processo ensino aprendizagem.
2. Reforçar imediatamente o comportamento especificado, com boa densidade, princi­
palmente no início da aprendizagem.
3. Reforçar apenas os comportamentos explicitamente emitidos pelo estudante confor­
me especificado no objetivo, criando situações de aprendizagem que sejam natural­
mente reforçadoras. Se isso não for possível em um primeiro momento (geralmente no
inicio do processo de ensino aprendizagem), empregar reforçadores artificiais e dimi­
nuir gradativamente sua intensidade ou densidade até que o reforçador natural passe a
controlar o comportamento.
4. Utilizar sempre o principio de progressão gradual (aproximação sucessiva) no esta­
belecimento de repertórios complexos. Ao construir longas seqüências, fracioná-las
passo a passo (do mais simples ao mais complexo), ajudar muito o estudante no início
e retirar a ajuda gradualmente com o decorrer do curso, estabelecer padrões de exigên­
cia mínimos e aumentá-los conforme o progresso do estudante.
5. Escolher de maneira cuidadosa as situações antecedentes de ensino - aprendiza­
gem, optando por aquelas que facilitam e / ou sejam condições necessárias para que
o comportamento a ser ensinado seja emitido e também que indiquem a relevância
desse comportamento.
6. Programar e monitorar respostas de observação e de imitação do estudante, para
criar a oportunidade de emissão de comportamento verbal (ecóico) coberto ou encober­
to. mais comumente chamado de “prestar atenção". Demonstrar e descrever cada mo­
mento de execução de um comportamento complexo, solicitando a imitação do estu­
dante, é uma importante estimulação suplementar.
7. Tomar cuidado com a ocorrência de erros procurando evitá-los ao máximo. As situa­
ções em que os erros ocorrem são punitivas e podem diminuir a freqüência do compor­
tamento do estudante porque eles são aversivos, ocasionam efeitos emocionais e dimi­
nuem a motivação e a auto-estima do estudante. Uma maneira de evitar a ocofrência de
erros é estabelecer uma hierarquia de aprendizagem, identificando os comportamentos
pré-requisitos e certificando-se que eles fazem parte do repertório do estudante antes de
exigir a execução de uma tarefa para ensinar comportamentos mais complexos.
8. Ficar sob controle do comportamento do estudante, observando-o e permitindo que
ele participe da elaboração do programa de ensino.
Esse conjunto de exigências, entre outras, feitas a um programador de ensino têm sido
aventado como uma razão pela qual acabou havendo pequena adesão à programação
de cursos. Ao mesmo tempo, a concepção do que significa programar contingências de
ensino, evidenciada pela Prof8 Carolina Bori, tira do professor/programador a oportuni­
dade de contar com um receituário e o obriga a planejar e replanejar cada unidade em
função dos seus objetivos, das contingências dispostas e do feedback que vai obtendo
à medida em que seus alunos vão se comportando.

226 Leila do S. R. Feio, j. A . Qonzáleí-Pienda, Cartas Nunes, João dos Ç. Carmo, M drillac C, Ferranti
Guedes (1974) demonstrou ser isso possível a o progianmr. im plementar e
analisar os resultados de um curso programado de M e to d o lo g ia Cientifica, para clas­
ses numerosas. A seguir, seu estudo é sintetizado, como fonim de ilustrar os elementos
de um a programação de ensino. Sua programação c o n ta v a com os seguintes elemen­
tos:

1. E s p e c ific a ç ã o d o s o b je tiv o s d e e n s in o

2. A n á lis e do c o n te ú d o e e s p e c ific a ç ã o das respostas e s p e ra d a s


3 . O b je tiv o s suplementares

4 . S e q ü e n cia m e n to dos o b je tiv o s


5 . S e le ç ã o das atividades

6. Material do curso
A seguir, cada um destas etapas da programação de Guedes será descrita
comentada brevemente.

1. Especificação dos objetivos de ensino


Levando em consideração os objetivos institucionais da Universidade, as con­
dições em que os estudantes ali chegavam e as possibilidades proporcionadas por um
programa de Metodologia Cientifica (conteúdo, carga horária), a autora especificou dois
grandes objetivos para o curso: um basicamente teórico, que correspondia ao primeiro
período letivo e que considerava que ao seu término o estudante “ ...seria capaz de
descrever a atividade científica - diferenciando-a de outras formas de conhecer, e de
justificá-la dentro de seus próprios pressupostos." (Guedes, 1974, p. 17); e outro de
iaboratório, que correspondia ao segundo período letivo e se preocupava em instalar
‘...alguns comportamentos próprios da atividade científica." (Guedes, 1974, p. 17)

2. Análise do conteúdo e especificação das respostas esperadas


Com base nos dois grandes objetivos do curso, a autora tratou de traduzi-los
em respostas que seriam esperadas dos estudantes após passarem por esse proce­
dimento de ensino. Como o primeiro período tratava, basicamente de teoria, eram es­
peradas essencialmente respostas verbais dos estudantes.
A primeira resposta definida como esperada foi à questão "o que ciência é?"
expressa da seguinte maneira: (p. 20)
• Citar e definir as características essenciais que permitem distinguir ciência de
outras formas de conhecer
• Citar e definir características que enfatizam o método cientifico de conhecer, e
não o resultado.

Uma segunda questão a ser respondida peios estudantes era "por que é como
é?’: considerando a emissão das seguintes respostas: (p. 20)
■ Citar pressupostos do método científico
• Dar significado de alguns principais postulados de ciência hoje
• Discutir a sua importância para a ciência

Sobre Comportamento e Cognição 227


A terceira resposta a ser emitida pelos estudantes consistia em: (p. 20)
* Com base em um texto, identificar correções ou violações a algumas das
p rin c ip a is atitudes de ciência, considerando os dados oferecidos e as relações afirma­
das.

A quarta resposta esperada a ser emitida peios estudantes consistia em: (p. 20)
» Citar implicações destas atitudes na maneira de trabalhar do cientista.
* Por último, a resposta que sc esperava que o estudante emitisse, com base
em relatos científicos, c o n s is tia em: (p. 20)
* Identificar se se trata de estudo descritivo ou experimentai, dizendo o porque
* Identificar o que corresponde a resultado obtido e o que se refere a interpreta­
ção ou explicação do autor
* Identificar correções e violações de comunicação científica

A ordenação desses passos (Guedes, 1974) fornece condições para evitar a


omissão de passos essenciais, nâo exigindo do estudante uma resposta para a qual
ele não está devidamente preparado para emitir. Ainda, essa ordenação permite de­
compor a carga horária disponível em unidades de ensino, que no estudo dessa autora
foram decompostas em 4 unidades para um período de 12 semanas, a saber:

Primeira unidade - O que ciência é e o que efa não é.


Segunda unidade - Postulados da ciênda.
Terceira unidade - Atitudes da ciência.
Quarta unidade - Métodos da ciência.

3. Objetivos suplementares
A nalisar o conteúdo conform e o anteriorm ente descrito permitiu, segundo
Guedes (1974), levantar objetivos adicionais relacionados à atividade científica, como
ler, escrever e discutir. Dessa maneira, pretendia-se levar o estudante à leitura semanal
de texto; discussão semanal de texto (com verbalização de perguntas ou afirmações
diretas ou indiretas sobre o texto) e o treino em redação com a intenção de levar o
estudante a se expressar com maior clareza e coerência.

4. Seqüenciamento dos objetivos


No estudo de Guedes (1974), cada unidade poderia ser vista como independen­
te, formando “...um todo a ser colocado em qualquer dos momentos do semestre.” (p. 22),
não existindo uma razão que pudesse sustentar uma seqüência instrucional cronológica,
natural ou de complexidade (sem a exigênda de se considerar primeiro as unidades que
tratasse de pré-requisitos para as outras). Pelo exposto, a autora definiu a seqüência
instrucional "lógica” tal qual os conteúdos se agruparam quando foram levantados.

5. Seleção das atividades


Foram selecionadas por Guedes (1974) três atividades básicas; estudo de
texto em casa; exercícios em grupo e seminários.

228 Leila do S. R, M o , }. A - Çcm?á[e/-Piçnda, Carlos Nufies, João dos S. Carmo, M arillac C. Ferraníi
No estudo de texto em casa, o estudante poderia simplesmente ler um ciado
texto em casa, ou analisá-lo seguindo dicas ou respondendo a perguntas previamente
formuíadas. Essa atividade foi prevista semanalmente para durar aproximadamente
duas horas.
Nos exercícios em grupo, que aconteciam no inicio da aula, os estudantes
podiam ser agrupados em uma quantidade que variava dc 2 a 10 elementos por grupo,
tendo como atividades: debates, discussão de textos, execução dc exercícios escritos.
Esperava-se que eles preenchessem fichas de avaliações, respondessem a redigis
sem os resultados da discussão etc.
Nos seminários, o professor coordenava uma discussãu de um tema especifica­
do de maneira clara seguindo o seguinte procedimento exposição realizada pelo profes­
sor, discussão realizada de modo direto com o professor ou com a sala dividida em
subgrupos e finalmente o professor expunha uma síntese dessa atividade à classe como
um todo.
Ainda foram previstas duas aulas com carater motivaciona! e exercícios indivi­
duais para treinar a expressão escrita do estudante.

6. Material do curso
Todo o material do curso foi entregue já impresso ao estudante com o objetivo de
aumentar a probabilidade de ocorrência do comportamento esperado e consistia em:
• Textos de leitura selecionados pelo coordenador e seus assistentes, que
eram mais curtos no início do curso, tornando-se maiores ao longo dele.
• Questões de estudo que eram elaboradas pelos assistentes e pelos profes­
sores da classe e que destacavam o conteúdo do texto e os motivos peios quais foram
escolhidas para aquele momento.
• Questões de discussão, também elaboradas pelos assistentes e professo­
res da classe, que continham questões de estudo, questões que permitiam compara­
ções com eventuais comentários ou opiniões de outros autores.
• Apresentação de unidades elaboradas pelo coordenador que explicitava o
significado da unidade em relação ao curso como um todo, os objetivos e as instruções
de como proceder.
• Guias de estudo elaborados pelo coordenador e assistentes que mostrava os
objetivos do passo e as atividades que deveriam ser cumpridas em casa ou em classe.
• Folhas de avaliação elaboradas pelo coordenador e assistentes referentes
ao plano de cada exercício.
• Questionário de metodologia e atitude cientifica elaborado por todos os parti­
cipantes da pesquisa, foi aplicado no primeiro e último passo dando oportunidade ao
estudante de perceber e assumir a sua avaliação.

Assim, Guedes (1974) criou um procedimento para programar o ensino que


pode e deve ser seguido, não como uma receita de bolo, mas como um esquema que
descreve os principais pontos que um programador deve considerar para uma progra­
mação de ensino efetiva.

Sobre Comportamento e Cognição 229


Objetivos de ensino comportamental (OEC)
Segundo Vargas (1974). o professor tem a função de aumentar a velocidade de
aprendizagem do estudante, considerando aprendizagem como uma mudança no com­
portamento. Portanto, é responsabilidade do professor mudar comportamentos que
ocorrem na sala de aula e que ocorrerão fora dela, tempo depois que o estudante já
estiver separado do mestre.
Para alterar o comportamento do ostudante de maneira efetiva, a concentração
do professor deve ser no comportamento dele, estudante, mais do que no seu próprio
com p ortam e nto. Q uando o p ro fe sso r planeja uma aula ele pretende alcançar
determinado(s) objetivo(s) que podem ser designados pelo currículo da escola, por
livros-texto ou, ainda, peio próprio professor com ou sem participação dos estudantes.
Esses objetivos descrevem o que se espera que o estudante aprenda após o final do
curso. Uma observação especial deve ser feita para diferenciar objetivo de atividade,
pois atividades ‘ são os meios para atingir os objetivos". (Vargas, 1974, p 4)
Um objetivo comportamental é uma afirmação do que o estudante deve ser
capaz de fazer ao completar uma dada atividade programada de ensino. Para ser con­
siderado comportamental deve referir-se ao comportamento observável do estudante, a
uma ação que possa ser vista ou ouvida.
Os objetivos comportamentaís apresentam trés funções, a saber:
1. Auxiliam o professor a selecionar meios adequados para a aprendizagem. Pelo fato
de estar claramente definido para o professor o que quer que seus estudantes façam,
fica facilitada sua tarefa de seiecionar as atividades relevantes para serem executadas
pelos estudantes na sala de aula, para a sua aprendizagem. Dessa maneira, o período
da auia é utilizado de modo eficiente.
2. Descrevem e. assim, possibilitam comunicar aos estudantes - principalmente - e
demais interessados o que se espera deles, de maneira que o professor lhes expresse
essa expectativa explicitamente. Para auxiliar o aprendizado de um estudante, ele preci­
sa ser comunicado formalmente sobre qual(is) ação(ões) espera(m)-se dele, e orienta­
do sobre o que ele deverá estudar.
3. Criam e descrevem padrões para medir e avaliar o progresso e desempenho do
estudante e do curso, acompanhando-o a cada instante e a cada tarefa, não permitindo
que a avaliação do resultado seja obtida apenas no final do curso, sem possibilidade
para correções ou melhoria.

A partir do momento que um estudante conhece os objetivos que terá que


atingir em cada passo do curso, a sua motivação tenderá a aumentar, "...pois perceber
o progresso encoraja futuros esforços." (Vargas, 1974, p. 6)
Mager (1983) inicia sua obra com a proposta de tomar seu leitor capaz de redigir,
de maneira exata aquilo que se propõe a ensinar antes do planejamento do ensino e da
seleção dos procedimentos, materiais e conteúdos. Para este autor, a elaboração de
objetivos claros fornecerá os fundamentos para a seleção e escolha dos métodos e
materiais assim como para os meios de avaliação dos resultados da aprendizagem.
Mager (1983) indica que assim que se intente ensinar alguma coisa a uma
pessoa deve-se ter certeza que esse ensino ê necessário, verificando se existe um moti­
vo para essa aprendizagem e quanto os aprendizes conhecem do assunto a ser ensina­
do. Paralelamente, os resultados esperados, como produtos ou ações oriundos do pro­
cesso de ensino, devem ser claramente definidos. “Primeiro você decide aonde ir, e

230 Leila do S. R. Feio, J. A . Çonzalez-Pienda, Carlos Nunes, João dos S. Carmo, M aríllac C. Ferranti
depois cria e dispõe os meios de chcgar lá e aí você trata de descobrir se chegou" (Mager,
1983, p. 1).
Para viabilizar um ensino efetivo (que sitva a propósitos válidos e relcvi-intos).
eficaz (que mude o comportamento do estudante) e eficiente (que otimize o processo do
ensino aprendizagem ) o autor sug ete a consid eraçã o de três fase s -- analiso,
planejamento e implantação - que organizarão os passos para o desenvolvim ento
sistemático de tal ensino.

Análise
Para que não se construa um curso suntuoso, mas que não ajude a ninguém
ou do qual ninguém precise, se faz necessária uma análise do contexto, da relevância
e importância do tema baseando-se nas respostas às seguintes questões:

Existe urn probiema que valha a pena ser resolvido?


O ensino constitui elemento relevante na resolução?
Em caso afirmativo, que resultado deve alcançar? (Mager, 1983, p 2)

Planejamento
Constatada a necessidade de ensino, delineiam-se os objetivos que retratem
os comportamentos que se pretende instalar e os testes que verificarão a consecução
desses objetivos.

Implantação
Completadas as fases anteriores, é chegado o momento de fazer uma revisão,
colocar o plano em prática e testar a aprendizagem
Segundo Mager (1983):

Um objetivo é a descrição de um desempenho que você deseja que seus alunos


sejam capazes de exibir, antes de considerá-los competentes. Um objetivo des­
creve um resultado que se pretende alcançar com o ensino, de preferência ao
processo de ensino propriamente dito. (p. 5)

Um objetivo é uma afirmação que descreve um resultado da aprendizagem, de


preferência a um procedimento ou processo educacional, (p. 7)

Elaborar objetivos é importante e traz as vantagens indicadas a seguir.


1. Eles servem de base sólida para selecionar e definir os métodos, materiais, ou
conteúdos de aprendizagem. Se alguém não sabe para onde está indo, fica difícil
selecionar meios adequados para se chegar lá. Um professor deve estar cônscio do
que deseja como resultado advindo do ensino de seus estudantes.
2. Saber se o objetivo foi alcançado por meio de testes e exames, informando professor
e estudante, de maneira justa e objetiva, sobre o quanto foram bem sucedidos no que
diz respeito ã realização dos objetivos do curso.
3. Objetivos claramente formulados ajudam o estudante a se organizar e a focar seus
esforços para atingi-los, decidindo melhor sobre quais atividades o ajudarão a chegar

Sobre Comportamento e Cognição 231


aonde é importante.
4. O processo de elaborar objetivos provoca uma reflexão sobre o que é realmente
relevante para ser ensinado, criando critérios para validar a aprendizagem e fornecendo
base concreta para melhorar o processo de ensino.
A boa elaboração de um objetivo comunica de maneira significativa a quem o lê o motivo
da aprendizagem de maneira específica, sem margem para outras interpretações. Sua
utilidade está na transmissão de uma imagem de quão bem sucedido será o estudante
após passar pelo processo de ensino. Para que um objetivo seja eficaz e útil. ao comu­
nicar o intento nele contido, um professor deverá considerar três características: de­
sempenho, condições e critério.

Desempenho
Um objetivo sempre diz o que o estudante deve ser capaz de fazer.

Condições
Um objetivo sempre descreve as condições importantes (se as houver) em que
o desempenho deve ocorrer.

Critério
Sempre que for possível, um objetivo descreve o critério de desempenho
satisfatório, indicando quão bem o estudante deve atuar para ser considerado aceitável.
(Mager 1983, p. 21)
Espera-se que este artigo contribua para a criação de uma condição de ensino
mais efetiva, auxiliando os interessados a transporem as informações aqui descritas
para a sua prática pedagógica, considerando os pré requisitos necessários para que o
estudante possa aprender, e assim mudar o seu comportamento, sem a necessidade
de cometer erros, em um ambiente isento de características coercitivas e que estimule
o responder ativo dele para facilitar a constatação do aprendizado previamente planejado.
Melhorar o ensino, e o desempenho dos estudantes, é uma necessidade cons­
tante no Brasil e em todo o mundo, a programação de ensino é uma prática, devidamen­
te fundamentada teoricamente, que contribui efetivamente com a aprendizagem, procu­
rando medi-la por cada objetivo de ensino alcançado.
É inegável que o furor provocado pelo ensino programado (individualizado ou
não) nos anos 70 e parte dos anos 80 só teve contrapartida no seu declínio a partir de
então (Vargas e Vargas, 1992). Parte dos argumentos arrolados para esse declínio
dizem respeito ao custo operacional (se não financeiro) da programação, as exigências
feitas ao professor, o timing exigido em contraposição às exigências burocrático-admi-
nistrativas das instituições de ensino, sem contar a rejeição do referencial teórico por
trás dos procedimentos envolvidos. No entanto, também é verdade que inúmeras ava­
liações realizadas para testar a eficiência de programas de ensino (Sherman. 1992)
deram conta de resultados extrem am ente positivos (quando elas eram feitas em
contraposição ao ensino “tradicional", os resultados mostraram-se superiores aos des­
tes). Assim, os resultados das várias avaliações de nosso ensino médio e fundamental
sugerem que este pode ser um bom momento para verificar de que maneira podemos
nos valer da metodologia representada pela programação de ensino e empregar os
recursos tecnológicos atualmente disponíveis como forma de reduzir o custo da res­
posta dos programadores e professores.

232 Leila do S. R. Feio, J. A . Qonzález-Píenda, Carfos Nufies, João dos S. Carmo, M a riiia c C. Ferranti
Referências

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Sobre Comportamento e Cognição 233


PSWW’'’
Capítulo 19
Análise das contingências no ensino de
Análise do Comportamento em
curso de pós-graduação

Tania M o r o n S aes B raga


S an d ra R egin a Ç im e n iz -P a s c h o a l
M a r ia d e L ourdes M o r a le s H o r ig u c la .
Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita I ilho
UNfcSP/Marília - São Paulo*

Educação e Análise do Comportamento (AC) continuam distanciadas. De acor­


do com Carrara (2004), o espaço de acolhimento desta abordagem junto à Educação
tem diminuído pelo predomínio recente de outras abordagens, sobretudo ligadas ao
socioconstrutivismo e ao cognitivismo.
O distanciamento constatado, entretanto, é um desafio para os analistas de
comportamento que atuam na área. Por um lado verificam que esta abordagem, desde
seu início, esteve bastante voltada à educação, sendo grande parte dos escritos do seu
principal contribuinte, Skinner, assim direcionados (Carrara, 1992; Andery, Micheletto &
Sério, 2004), bem como atestam um continuo crescimento na produção de conheci­
mentos, como por exemplo, a publicação em 1997 de uma coletânea de artigos focali­
zando os novos trabalhos comportamentais na área educacional no periódico Behavior
and Social Issues (Holpert, 2004), Por outro lado se deparam com uma série de criticas
e rejeições advindas desta mesma área (Carrara, 1998; 2004).
É difícil compreender como os profissionais que freqüentam cursos da área da
Educação não se envolvem com o estudo da Análise do Comportamento. Potencial­
mente são profissionais que estão ou estarão trabalhando diretamente com o ensino e
a aprendizagem. Além disso, atualmente parece haver concordância dos mais diferen­
tes segm entos sobre a precária situação da Educação. Mudanças são sugeridas e
algumas até realizadas, mas o que se verifica é que não são mudanças na forma de
ensinar, nos métodos de ensino. Como é possível mudar o cenário da Educação sem
com preender princípios de Análise do Com portamento, sem analisar os processos
básicos de aprendizagem e ensino, sem compreender como os professores ensinam
e como os alunos aprendem? Preocupação esta que também tem sido m otivo de
investigação por especialista da área como Zanotto (2000) onde busca explicitar “as
‘ Correspondência oara GEPAC - Grupo deEsludose Pesquisas e n Análise do Comportamento. UN ESP. Faculdade de Filosofia e Ciências
Av. Hygino Muzzi Filhe 737, CEP 17525-900, Mariía-SP Departamento de Psicotogia da Educação, aos cuidados de Maria de Laureies Morares
HorigueJa. 6-mails: ]Ania.ian@icm.ct)m.br(i srgp@tetTn.com.br

Sobre Comportamento e Cognição


proposições de Skinner relativas ãs funções do professor, aos conhecimentos e forma­
ção necessários para o enfrentamento dos probiemas do ensino e às contingências
que explicam seu comportamento’' (Zanotío 2000, p. 121).
Moreira (2004) afirma que professores que ensinam como ensinar deveriam
ser os mais efetivos no campo da Educação. Chama a atenção, sobretudo, dos profes­
sores que estão ligados à Análise do Comportamento, de modo que ensinem a aborda­
gem em consonância com seus pressupostos e teorias.
Temos investido esforços para compreender e alterar as barreiras existentes
em curso de Pós Graduação cm Educação. Uma das maneiras encontradas foi a de
inserir e manter o oferecimento de disciplinas para o ensino de Análise do Comporta­
mento, com a finaiidade de informar adequadamente e esclarecer as inúmeras críticas
dirigidas á área. Segundo Tomanari (2000), esta seria uma maneira de tornar sem
sentido afirmações do tipo "Anáiisc do Comportamento é reducionista”, “baseia-se
numa filosofia da Ciência ultrapassada: o positivismo lógico", ou ‘;que é uma Psicologia
animal que não cabe ao estudo do comportamento humano". Embora o referido texto
enfatize o laboratório como condição privilegiada para o ensino de princípios básicos e
de atitudes, deixa claro que a maior parte das críticas que a AC recebe há anos refietem
um desconhecimento básico em relação a área, seus princípios conceituais, suas
práticas metodológicas e aplicações.
Outros autores como Capeiari, Fonseca e Hamasaki (2005), igualmente preo­
cupados com o ensino da Análise do Comportamento investigam, a partir da experiên­
cia docente, as variáveis que possam ter efeito no ensino da disciplina como: formação
docente, a formulação do programa da disciplina AC e as estratégias didático-pedagó-
gícas utilizadas.
Frente ao distanciamento existente entre a AC e a Educação consideramos que
o planejamento de disciplinas que divulguem a Análise do Comportamento e ao mes­
mo tempo ofereçam oportunidade e material para a realização de pesquisas, podem
contribuir para uma aproximação,
Divulgar estes esforços pode ser uma forma de contribuir com discussões e
novas mudanças, pois, para esta abordagem, o fazer vai modificando o próprio fazer,
justificando a realização deste trabalho, que faz parte de uma pesquisa maior.
Considerando o exposto, o objetivo deste trabalho foi analisar como os conteú­
dos da Análise de Comportamento (AC) foram veiculados em quatro disciplinas minis­
tradas anualmente no programa de Pós Graduação em Educação, no sentido de inserir
e manter a divulgação da AC em curso de Educação

Método
Ambiente
Este estudo foi realizado nas dependências de uma Universidade Pública do
Estado de São Paulo, mais especificamente as saias de aula onde as quatro discipli­
nas do Programa de Pós Graduação em Educação foram ministradas.
As três primeiras disciplinas, ministradas nos anos de 2004, 2005 e 2006,
tratavam basicamente de métodos de investigação numa perspectiva da Análise do
Comportamento, e a quarta, ministrada no ano de 2007, tratou especificamente de
Tópicos de Aprendizagem numa Perspectiva da Análise do Comportamento. Todas eram
disciplinas de 90 horas/aula.

236 Tania M . Sacs Braga, Sandra R. GimenLz-Paschoal, M aria dc L. M orales Horiguela.


participantes
Participaram deste estudo 43 disccntes que freqüentaram as quatro discipli­
nas alvo de investigação no Curso de Pós Graduação em Educação, corri formação cm
diferentes áreas, especialmente provenientes de Cursos de Graduação em Psicologia,
Fonoaudiologia. Medicina. Enfermagem e Pedagogia, conforme podo sor observado na
Tabela 1. Quanto ao nível de formação dos alunos, eram principalmente doutorandos e
mestrandos do próprio curso de Pós Graduação em Educação, mas também participa­
ram alunos especiais (que são aqueles matriculados em cursos do outra Universidade
ou aqueles que prestaram o processo seletivo junto ao Procjrairia do Pos Graduação
em Educação e permaneceram até a fase final do processo seletivo, embora não con­
seguiram ser aprovados como alunos regulares) c alunos ouvintes. Ressalta-se, entre­
tanto, que para todos os alunos, independentemente da forma em que se encontravam
inscritos na disciplina, as responsabilidades dos discentes e das docentes eram as
mesmas.
Tabela 1 - características dos participantes discentes de acordo corn as disciplinas.

CARACTERÍSTICAS d o s c a t e g o r ia s DISCIPLINAS TOTAL


PARTICIPANTES 1 2 3 4
n= 12 r ;—7 n- 8 n-16 ri-43

Ar e a d e f o r m a ç ã o Psicologia 4 1 2 4 11
Fonoaudiologia 2 3 2 2 9
Medicina - 1 1 3 5
Enfermagem 1 - 2 1 -1
Pedagogia - - 1 2 3
Fisioterapia - 1 - 1 2
Filosofia e Teologia 2 - - 2
Filosofia 1 - - 1
Filosofia e Pedagogia - - - 1 1
Pedagogia e Letras - 1 - - 1
Enfermagem e Psicologia - - - 1 1
Artes Cênicas - - - 1 1
História 1 - - - 1
Nutrição 1 - - 1

NfVEL DEFORMAÇÃO Cursando doutorado 5 3 3 4 15


Cursando mestrado 5 - 3 5 13
Graduação 2 2 2 4 10
Mestrado - 2 3 5

TIPO DE INSCRIÇÃO Regular 10 3 5 9 27


Especial 2 2 1 6 11
Ouvinte - 2 2 1 5

Também foram participantes da investigação as três docentes responsáveis


pelas disciplinas, duas com formação em Curso de Graduação em Psicologia, uma
com formação em Pedagogia e as três com formação em Curso de Pós Graduação em
Psicologia (mestrado e doutorado).

Materiais
Para a coleta de dados foram utiiizados instrumentos elaborados pelas docen­
tes/pesquisadoras e preenchidos por escrito pelos discentes, anotações das docen­
tes, e os trabalhos entregues pelos alunos.

Sobre Comportamento e Cognição 23 7


Procedimentos
As disciplinas foram planejadas, ministradas, avaliadas e investigadas pelas
trés docentes/pesquisadoras. Ressalta-se que as três docentes permaneceram pre­
sentes no decorrer de todas as auias das quatro disciplinas e realizaram discussões e
atividades atinentes ás disciplinas de forma periódica.
Para a coleta dos dados foram utilizados os instrumentos elaborados pelas
docentes, que eram entregues petos alunos preenchidos semanalmente durante nove
semanas. Esses instrumentos eram enviados aos docentes impresso ou por emaü.
Os materiais produzidos pelos alunos foram analisados elaborando-se qua­
dros referentes à natureza das atividades realizadas e quadros sínteses, para facilitar a
demonstração. Outras informações referentes ás disciplinas, sobretudo as percep­
ções/opiniões escritas por parte dos alunos, serão tratadas em outros trabalhos.

Resultados e Discussão
Os resultados preliminares permitiram constatar que a inserção de conteúdos
mais específicos da análise do comportamento nas disciplinas ministradas foi gradual,
havendo aumento da utilização de conteúdos relativos especificamente à análise do
comportamento na quarta disciplina, o que pode ser observado no Quadro 1,
Quadro 1 - características dos conteúdos das disciplinas aivo desta investigação.

CONTEÚDOS DISCIPLINAS
1 2 3 4

CONTEÚDOS GERAIS
Sobre ciência e teorias científicas X X X X
Sobre m étodos de pesquisa em ciências do X X X
comportamento
Sobre ética nas investigações X X X

CONTEÚDOS ESPECÍFICOS SOBRE ANÁLISE


DO COMPORTAMENTO (AC)
Sobre características gerais da AC X X X X
Sobre história da AC X
Sobre filosofia da AC X
Sobre princípios básicos do com portam ento X
(aprendizagem) em AC
TOTAL 4 4 4 5

Para esta inserção gradual, foram variáveis relevantes os objetivos que as


disciplinas englobavam, ou seja, as três primeiras disciplinas tiveram como objetivos
gerais desenvolver habilidades para a análise de pesquisas em aprendizagem e em
desenvolvimento humano numa perspectiva da Análise do Comportamento e a quarta,
analisar e discutir tópicos de aprendizagem numa perspectiva da Análise do Comporta­
mento e sua aplicação na educação. Ressalta-se, entretanto, que esta última foi criada
justam ente em razao das solicitações dos alunos e da demanda visualizada pelas
docentes nas três disciplinas anteriores.
Também foi possível verificar que, para tratar de conteúdos gerais e específicos
da Análise do Comportamento, a inserção de autores clássicos e atuais diferentes teve
um aumento a partir da segunda disciplina, e o número de textos indicados foi maior na
terceira e na quarta disciplina, tal como pode ser observado na Tabela 2.

238 Tania M . Sacs Braga, Sandra R. Çim eim-Paschoal, M aria de L. M orales ! lorigueid
Tabela 2 - autores e respectivos textos utilizados nas disciplinas alvo desta investiga-
9a AUTORES* DISCIPLINAS TOTAL
1 ? 3 4
Skinner 1 4 1 17
Cosby 5 1 7 19
Danna e Matos 12 12
Schilinger 3 3 2 a
Luna 3 2 2 7
Moreira e Medeiros - 4 4
Sério - - 3 3
Matos - 1 1 2
Pereira, Marinoti e Luna - 1 1 - 2
Fazzi e Cirino 1 - 1
De Rose 1 - 1
Lattal 1 - 1
Baun - - 3 3
W eber . . 1 1
Keller - - 1 1
Meyer - . - 1 1
Miguel - -
1 1

TOTAL DE AUTORES DIFERENTES 4 8 8 11


TOTAL DE TEXTOS 12 20 37 31

Os procedimentos de ensino-aprendizagem e de avaliação nas disciplinas se


mantiveram constantes para alguns procedimentos, como a solicitação de entrega
semanal de questões escritas (para serem discutidas em aula, sobre os textos indica­
dos previamente para leitura) e o preenchimento de um questionário geral ao final da
disciplina (no qual vários aspectos eram solicitados para os discentes opinarem, des­
de conteúdos adotados como as interações mantidas). Alguns procedimentos diferen­
tes foram criados na quarta disciplina. De acordo com os procedimentos que foram
sendo adotados, a coleta de dados durante as disciplinas para a realização de pesqui­
sas foi mais sistemática a partir da terceira disciplina oferecida, especialmente na
quarta, dada a natureza dos trabalhos exigidos semanalmente e para conclusão da
disciplina, tal como pode ser observado no Quadra 2.
As alterações foram introduzidas à medida em se desenvolviam as disciplinas,
o que é destacado por Zannoto (2000) “Por considerar que cabe ao professor alterar
seus comportamentos como condição para produzir mudanças comportamentais no
aluno". Como a mesma autora menciona, “cabe ao professor definir, de modo explicito
e claro, os objetivos do processo de ensino, em term os de alterações a serem
planejadamente produzidas no comportamento do aluno" (Zanotto 2000, p 123).
Quadro 2: procedimentos de ensino-aprendizagem e de avaliação adotados nas
disciplinas.
PROCEDIMENTOS (atividade/periodicidade) DISCIPLINAS
1 2 3 4

Questões por escrito sobre os textos indicados / X X X X


sem anal

Q uestionário geral inicial / prim eiro dia de aula X X X

Q uestionário geral final 1 último dia de aula X X X X

Sobre Comportamento e Cognição 239


PROCEDIMENTOS (atividade / periodicidade) DISCIPLINAS
1 2 3 4

Projeto de pesquisa do discente por escrito para X X X


üer a p re s e n ta d o e d e b a :itío / um a sem ana de
a n te c e d ê n c ia da a p re s e n ta ç ã o , para to d o s os
discentes

P ro je to ce p e s q u is a por e s c rito do d is c e n te X X X
reform ulado / ao final ca disciplina

Síntese do texio / semana! X

E x e m p lo s de v iv ê n c ia s lig a d a s à e d u c a ç ã o X
ilustrativas do texto ! sem anal

Apreciação ca compreensão do texto /semanal X X

Apreciação da utilidade do texto /semanal X

Apreciação da informação do texto /semanal X X

Levantamento de literatura sobre tema específico X


ligado á disciplina e em form ato de artigo para
periódico i ao final da disciplina

Instruções por escrito aos discentes sobre todas X X


as atividades na disciplina

TOTAL 4 5 8 10

Conclusões
Concluiu-se que, embora seja este um estudo exploratório e preliminar, que faz
parte de uma pesquisa maior, as disciplinas ministradas, bem como os ajustes nos
procedimentos que foram sendo implementados, têm permitido gradativamente difun­
dir princípios de análise do comportamento em curso de Pós Graduação em Educação.

Referências

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240 Tania M . Saes Braga, Sandra R. Gimeniz-Pascboal M aria de L. M orales Horiguela


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Zanotto, M. L B. (2000) Formaçào de pruíessores: a contribuição da análise do cnmparlamnntc S;io


Paulc EDUC.

Sobre Comportamento c Cognição


Capítulo 20
Análise do comportamento aplicada e a
produção de tecnologia:
implicações educacionais do
paradigma da equivalência de
estímulos
V erô n ica B e n d e r H a y d u
UEL
Juliana B arb oza C a e ta n o d e P a u la
U EL*

A importância de estudos de Análise do Comportamento Aplicada é am pla­


mente documentada na bibliografia da Análise do Comportamento, tanto nacional, quanto
internacional, como, por exemplo. Botomé (1982); Brekstad (1985); Buskist, Morgan e
Terrel (1985): Carvalho Neto (2002); Hyten e Reilly (1992); Luna, (1997); Michael (1985);
Navarick, Bernstein e Fantino (1990); Wacker (2000), para citar apenas alguns. O pró­
prio Skinner dedicou-se especialmente a esta questão em diversos textos (1953/1981,
1957, 1969/1980, 1972a), argumentando que "(...) as conseqüências práticas geral­
mente torçam o cientista a tidar com variáveis que de outra maneira ele colocaria de
lado para consideração posterior" (Skinner, 1972a. p. 279).

A relação entre a pesquisa básica sobre comportamento e pesquisa aplicada


está condicionada à aplicabilidade da ciência do comportamento a problemas
práticos que têm relevância social. Os conceitos, termos, princípios, métodos
etc, da pesquisa básica devem fornecer as bases para a pesquisa aplicada, para
aplicações que não são de pesquisa e para extrapolações por analogia; novos
achados em pesquisa básica devem levar a novas aplicações e extrapolações
mais sofisticadas; problemas em aplicação devem fornecer o feedback para
promover novas direções em pesquisa básica (Michael, 1985, p. 159).

Segundo Johnston (1996), o anúncio oficial do nascimento da Análise do Com­


portamento Aplicada foi a publicação do Journal of Applied Behavior Analysis, em 1968,
‘ Endereço paia correspondência. VerSxüca Bender Haydu, Rua Duqoe de Caxias, 1235, Rolândia, PÍVS6 600-000 Ernail.haydu@uel.br

Sobre Comportamento e Cognição 243


editado por Montrose Wolf. No primeiro volume desse periódico, foi apresentado um
artigo de Baer, Wolf e Risley (1968), que teve um impacto substancial na área. com a
exposição das características definidoras do que vem a ser Análise do Comportamento
Aplicada, resumidas no paragrafo seguinte.

(...) uma análise do comportamento aplicada torna óbvia a importância das mu­
danças comportamentais, suas características quantitativas, a manipulação ex­
perimental que analisa com clareza o que foi responsável peias mudanças, a
descrição tecnológica exata de todos os procedimentos que contribuem para
essa mudança, a eficácia de tais procedimentos em produzir alterações com valor
e a generalidade dessas mudanças (Baer et a i, 1968. p. 97)

Apesar de ter tido um início bem contundente, a Análise do Comportamento


Aplicada e também a Análise Experimental do Comportamento Humano (Experimental
Analysis of Human Behavicr - EAHB) não tiveram uma evolução sistemática e constan­
te. Segundo Michael (1985), houve um rompimento da relação normal entre pesquisa
básica e pesquisa aplicada no final dos anos de 1960.
Em relação à Análise Experimental do Comportamento Humano, Buskist e
Miller (1982), e Dougherty, Nedelmann e Alfred (1993) fizeram uma comparação do
número de publicações de pesquisas com esse enfoque desde a primeira edição do
Journal o f Experimental Analysis of Behavior, em 1958 {Buskist e Milfer examinaram o
período de 1958 a 1981. e Dougherty etal., o período de 1982 a 1992), Eíes demonstra­
ram que houve uma redução acentuada deste número, no final da década de 1960 até
o inicio da década de 1980, Os dados apresentados por Buskist e Miller foram usados
por Nevin (1982), no editorial do JEAB, desse ano, para encorajar a submissão de
artigos sobre Análise Experimental do Comportamento Humano, Coincidentemente,
como apontam Hyten e Rcilly (1992), foram publicados, nesse mesmo volume do peri­
ódico, dois artigos seminais sobre equivalência de estímulos, ambos de Sidman e
colaboradores (Sidman, et al., 1982 e Sidman e Tailby, 1982). Equivalência de estímu­
los, e também o tema comportamento governado por regras foram os temas classifica­
dos como os mais influentes, isto é, os mais citados, de acordo com a estatística feita
por Dougherty et al.. nas publicações do JEAB, no periodo de 1982 a 1992.

O modelo da equivalência de estímulos


É interessante notar que os estudos sobre formação de classes de estímulos
equivalentes tiveram início com questões práticas, como pode ser constatado em Sidman
(1971) e Sidman e Cresson (1973). O trabalho de Sidman (1971) consistiu em ensinar
um jovem portador de microcefalia a ler. No início do experimento, o participante já sabia
escolher uma figura diante do nome ditado e dizer o nome diante da figura. Foi então
ensinado a ele, relacionar paiavras ditadas a palavras impressas, num total de 20
palavras. Em decorrência desse treino, o participante foi capaz de, diante da figura,
escolher a palavra impressa correspondente e, diante da palavra impressa, escolher a
figura correspondente, bem como foi capaz de nomear as palavras impressas. Sidman
concluiu que, tendo acrescentando apenas mais uma resposta ao repertório que o
jovem apresentava inicialmente, a resposta de relacionar palavras faladas a palavras
impressas, ele aprendeu a ler com compreensão.
Sidman e Cresson (1973) replicaram os resultados do estudo anterior com
dois jovens com necessidades especiais, demonstrando a eficácia da estratégia de

244 Verônica Pender H aydu, Juliana Barboza Caetano de Paula


ensino proposta. O procedimento básico usado nos dois estudos consiste cm estabe­
lecer discriminações condicionais entre estímulos, por meio de repostas de empare
lliamento com modelo, procedimento esse denominado, também, escolha do acordo
com modelo (matching-to-sample, ou MTS). O MTS envolve a apresentação de um esti-
mulo-modelo e dois ou mais estímulos de comparação. Um dos estímulos de compa­
ração (S1) é definido como o estímulo positivo (S+) e o outro (S J) como o estímulo
negativo (S> ). Respostas na presença do S+ são reforçadas e as respostas em presen­
ça de S> são punidas ou colocadas em extinção. Na presença do um outro estimulo-
modelo, os estímulos discriminativos têm suas funções alternadas, de tal forma que, o
estímulo S1 passa a ser o S> e o S?passa a ser o S \ Sidrnari e Cresson destacam que
esse procedimento pode ser programado em máquinas de ensinar, permitindo que
muitas crianças com atraso no desenvolvimento possam ser beneficiadas.
Sidman (1971) apresentou um diagrama que sintetiza as relações entre estí­
mulos estabelecidas no ensino de leitura, considerando-o corno sendo o paradigma
básico da equivalência de estímulos. Com baso nesse paradigma, o repertório de
leitura pode ser estabelecido, por exemplo, da forma descrita a seguir: a) se diante do
desenho de uma flor (A1), a resposta de escolher a palavra impressa FLOR (B1) e não
a palavra impressa BOLA (B2) for reforçada; b) se diante do desenho de uma bola (A2),
a resposta de escolher a palavra impressa BOLA (B2) e não a palavra impressa FLOR
(B1) for reforçada; c) se diante da palavra impressa l-LOR (B1), dizer "flor" (C1) for
reforçado; d) e se diante da palavra impressa BO U\ (B2), dizer ‘ bola" (C2) for reforçado.
Como resultado, tem-se que: diante do desenho da flor c escolhida a palavra impressa
FLOR e diante da palavra impressa FLOR é dito "flor”: diante do desenho da boia é
escolhida a palavra impressa BOLA e diante da palavra impressa BOLA é dito "bola".
Após esta seqüência de ensino, que estabelece as relações entre os estimu
los A e B, e entre B e C, é provável que o aprendiz selecione, sem treino adicional: A1 de
um conjunto de comparações, dado B1 como modelo, ou B1 dado C1 como modelo; A2
de um conjunto de comparações, dado B2 como modelo, ou B2 dado C2 como modelo.
Também é provável que ele selecione: A1 dado C1 como modelo, e C1 dado A1 como
modeio; A2 dado C2 como modelo, e C2 dado A2 como modelo. Aíém disso, diante de A1
selecionará A1; diante de B1 selecionará B1, e assim por diante. De acordo com Sidman
(1986 e 2000) e Sidman e Taílby (1982), isto demonstra a formação de classes equiva­
lentes, que devem apresentar as propriedades definidoras de reflexividade, simetria e
transitividade.
A formação de classes de estímulos equivalentes possibilita a expansão das
classes, por meio do emparelhamerito de um novo estimulo a somente um dos mem­
bros da classe, sem a necessidade de emparelhar esse estimulo com cada elemento
da classe. Por exemplo, se a palavra impressa bonita for relacionada, por meio do
procedimento de emparelhamento com o modelo, a qualquer um dos membros de
uma classe já formada, como o desenho de uma flor, então o estímulo bonita passará
a fazer parte daquela classe. Assim, ao ouvir a palavra "flor", o aprendiz apontará a
palavra impressa BONITA. Esse processo representa uma grande economia para o
ensino, porque comportamentos novos emergem sem que tenham que ser diretamente
ensinados.
Os dois estudos iniciais desenvolvidos por Sidman e colaboradores pareciam
inspirar um grande número de aplicações, o que de fato não ocorreu de forma tão
expressiva, conforme o próprio Sidman aponta. Entretanto, uma grande quantidade de
pesquisas empíricas foi desenvolvida (ver revisão histórica em Sidman, 1994), sendo a
maioria dessas pesquisas direcionada pela amplitude que o fenômeno tem. Conforme

Sobre Comportamento e Cognição 245


sugeriram Spradlm, Cotter e Baxley (1973), o que se destaca nesses estudos não é
apenas o fato do ter sido sistematizado um procedimento eficaz para o ensino de leitura
a pessoas com necessidades especiais, mas o fato de que esse procedimento produz
a emergência de comportamentos que não foram diretamente ensinados. Esses com­
portamentos consistem em responder a relações entre estímulos, quando se ensina
duas ou mais relações com um estímulo em comum. O processo vai além da aprendi­
zagem da leitura com compreensão.

(...) estamos claramente lidando com um processo mais geral. Nossos dados nos
levaram ao ponto em que estamos prontos a falar, não somente de relações que
nos ajudam a definir a leitura com compreensão, mas acerca de relações de
equivalência que podem ajudar a fornecer uma base comportamentai para toda a
correspondência entre palavras e coisas, entre o que dizemos e fazemos, e entre
regras e contingências (Sidman, 1994, p. 123).

As pesquisas tomaram então rumos que mostram uma preocupação com


questões conceituais e metodológicas (ver revisões em Clayton & Hayes, 1999; de
Rose, 1993; Green & Saunders, 1998; Horne & Lowe, 1996; Sidman, 1986, 1994, 2000).
Nó que diz respeito às questões conceituais, destacam-se, por exemplo, a que foi
formulada pelo próprio Sidman (1990, p. 93); “Equivalência de estímulos: de onde elas
vêm?” e questões como: Quai é o papel da nomeação na formação de classes de
estímulos equivalentes? (Home & Lowe, 1996; Saunders & Green, 1996; Sidman, 1994;
Smith, Dickins & Bentall, 1996); Qual a natureza do responder sob as contingências que
estabelecem a formação de classes de estímulos equivalentes? Trata-se de um pro­
cesso que pode ser explicado por princípios comportamentais já existentes ou trata-se
de um principio novo? (Bames, Hegarty, & Smeets, 1997; Boelens, 1994; Hayes, 1991;
Ribeiro, 1995; Sidman, 1994).
Para responder às questões conceituais, inúmeros estudos experimentais
têm sido desenvolvidos, os quais testaram as variáveis que afetam a formação de
classes de estímulos equivalentes. Estas variáveis são, entre outras, o número e tama­
nho das classes a serem formadas, as estruturas de treino (linear, estímulos de com­
paração como nódulo - CaN e estímulo modelo como nódulo - SaN), o tipo de treino
quanto à apresentação dos estimulos-modelo e de comparação (simultânea e suces­
siva), a seqüência de treinos e testes (simples para complexo, complexo para simples
e combinado), o tipo de estímulo (familiar e não-familiar), a história dos participantes,
etc (ver revisões em Barros, Galvão, Brino, Goulart, & Mcllvane, 2005; de Rose, Kato,
The, & Kledaras, 1997; Green & Saunders, 1998, Sidman, 1986, 1994, 2000).
Alguns autores têm investigado também, as variáveis que contribuem para a
manutenção, reversão e o ressurgimento de classes de estímulos equivalentes (e.g.,
Garotti, de Souza, de Rose, Moüna, & Gil, 2000; Haydu & de Paula, no prelo; Pilgrim &
Galizio, 1995; Rehfeldt & Hayes, 2000; Smeets, Barnes-Holmes, Akpinar, & Barnes-
Holmes, 2003; Wilson & Hayes, 1996).

Contribuições do modelo da equivalência de estímulos para a Edu­


cação
No que diz respeito à produção de conhecimento que pode ser aplicado ao
contexto educacional, encontram-se na bibliografia algumas publicações dirigidas a

246 Verônica Bender Haydu, Juliana Barboza Caetano de Paula


professores, como. por exemplo, o artigo de Stromer, Mackay e Stoddard (1992). Nesse
texto, o paradigma da equivalência de estímulos c descrito detalhadamente, como um
procedimento de ensino de leitura e de escrita. Além das relações que Sidman (1971)
diagramou, este inclui outros estímulos e respostas que fazem parte do repertório de
escrita. Um diagrama ampliado das relações entro os eventos a serem ensinadas e
testadas foi apresentado e encontra-se reproduzido na Figura 1.

O procedimento apresentado por Stromer et al. (1992; ver também, Dube,


McDonald, Mclvane, & Mackay, 1991; Matos, Hübner-D’Oliveira, Serra, Basaglia, & Avanzi,
2 0 0 2 ) representa um avanço para a área aplicada de ensino de leitura, porque inclui
respostas de construir anagramas e de soletrar. As respostas de construir anagrama são
ensinadas por meio de uma variação do MTS, que foi identificada como escolha de acordo
com modelo com resposta construída (CRMTS). Nesse caso, as palavras são fragmenta­
das em suas unidades menores, letras ou sílabas, e respostas de escolha dessas
unidades, em sua seqüência correta, diante da palavra impressa ou diante da figura ou
ainda diante da palavra oralizada levam o aprendiz a discriminar as unidades das quais a
palavras é formada. Essa discriminação permite a ele construir a palavra impressa e
contribui para que ele aprenda a compor as palavras com suas unidades menores. Matos
et al. destacaram que o aspecto que torna o CRMTS altamente relevante para o contexto
educacional é que ao possibilitar o estabelecimento do controle pelas unidades menores
que compõem a paiavra, ele leva o aprendiz a recombinar as letras ou as sílabas em
novas palavras, estabelecendo a leitura recombinatlva com compreensão.

A suposição p o r trás dessa seqüência de procedimentos - de acordo com as previ­


sões de Skinner (1957) - é que o treino com unidades verbais maiores ('palavras”)
permite o desenvolvimento de controle sobre o comportamento textual por unidades
verbais menores ( “sílabas"). Se isto ocorrer, então a apresentação de novas pala­
vras - produzidas pela recom binação de sílabas das palavras anteriores - não
deverá apresentar problemas de leitura. (Matos et ai., 2002, p. 287).

Sobre Comportamento e Cognição 247


Um outro aspecto importante, no que diz respeito à aplicabilidade do modeio
da equivalência de estímulos para o ensino de leitura e escrita e de outros repertórios
acadêmicos, é o fato de que o procedimento de formação de ciasses de estímulos
equivalentes pode ser combinado a diversos outros procedimentos de ensino. Essa
combinação aumenta a probabilidade de a aprendizagem ocorrer. Como exemplos de
procedimentos desse tipo podem ser citados a discriminação por exclusão, a modela­
gem de estímulos ou de respostas, o aumento gradual das dificuldades, entre outros.
A discriminação por exclusão é combinada ao procedimento de discriminação
condicional na maneira como as tentativas de escolha de acordo com o modelo são
arranjadas. Um dos estímulos de escolha deve ser um estímulo previamente definido,
isto ó, um estímulo cuja relação condicional o participante já conhece. Diante de um
estímulo-modelo novo e de dois estímulos de comparação (sendo um definido e o outro
não), é selecionado aquele que não foi previamente relacionado a nenhum estímulo-
modelo. por exclusão do estímulo de comparação definido (Bagaiolo & Micheletto. 2004:
de Rose. de Souza. & Hanna, 1996: Meehan, 1995; Wilkinson, Dube, & Mcllvane. 1998).
A modelagem de estímulo, também chamada de fading, é um método de acordo com o
qual, inicialmente, o experimentador reforça o responder a uma relação entre estímulos
que o participante já tenha ou que possa ser facilmente adquirida, e, gradualmente,
modifica um dos estímulos até que ele se torne um estímulo diferente do inicial (Sidman
& Stoddard, 1967). Por sua vez, a modelagem de resposta, que consiste no reforço
diferencial e aproximação sucessiva à resposta especificada, pode, também, ser acom­
panhada por estratégias que induzem a resposta como os denominados prompts, que
são, geralmente, introduzidos nas tentativas iniciais do procedimento. Eles consistem
da indução da resposta correta, por exemplo, pela sinalização do estímulo de compara­
ção correto a cada tentativa (de Rose et al., 1997).
A combinação desses procedimentos e de outros foi amplamente investigada
e. de forma especial, por pesquisadores brasileiros, pois a maioria que estuda esse
fenômeno mostra uma preocupação com questões aplicadas. Uma busca no diretório
de pesquisadores do CNPq revelou 10 grupos de pesquisa que investigam o tema
equivalência de estímulos, sendo que quase todos eles têm uma ou outra pesquisa
sobre ensino de habilidades acadêmicas. Entre elas encontram-se estudos voltados
para as questões relativas ao ensino de leitura e escrita, matemática, habilidades mo­
netárias, língua brasileira de sinais e também para questões clinicas (e.g, Assis &
Gaivão, 1996; Carmo, Silva, & Figueiredo, 1999; D'Oliveira & Matos, 1993; de Rose et al.,
1996; Figueiredo, da Silva, Soares, & Barros, 2001; Goyos, 2000; Medeiros & Silva, 2002;
Neves, et al., 1999). Esta metodologia está sendo levada para os contextos educacio­
nais ainda de forma precária de diversos modos, como, por exemplo, no treinamento de
professores de Ensino Fundamental (Gusmão, 2001; Ribeiro & Haydu, 1998), de pro­
fessores de Educação Especial (Tini & Haydu, 2003), de terapeutas e pais de crianças
com dificuldades de aprendizagem (Souza, 2000), e na forma de programa de compu­
tador (Goyos & Almeida, 1994).
Um levantamento bibliográfico realizado por de Paula e Haydu (manuscrito não
publicado), no ano de 2005, buscou todos os resumos de artigos de periódicos, anais
dos eventos da Associação Brasileira de Psicoterapia e Medicina Comportamental
(ABPMC) e Sociedade Brasileira de Psicologia (SBP), dissertações de mestrado e te­
ses de doutorado publicados no Brasil, no período entre 1997 e 2005, que tivessem
pelo menos uma das seguintes palavras: equivalência; classe de estímulo; equivalen­
te; redes relacionais; responder relacional; pares associados ou transitividade. Entre
os periódicos nacionais, foram selecionados aqueles que puderam ser acessados

Angeluci R. R. Ribeiro, Q ina N olcto Rucno


pela base de dados da CAPES, do PEPSIC, do INDhXPSI, do LILACS e do PsycINTO.
Este estudo revelou um tota! de 524 resumos que atendiam aos critérios estabelecidos
Destes 524 resumos, 30 são de artigos publicados cm revistas, 91 de dissertações e
teses, e 403 de anais de congressos. Tal levantamento demonstrou que as pesquisas
com humanos sobre equivalência de estímulos têm focalizado, com maior freqüência,
os estudos na área da educação, sendo privilegiado o ensino de leitura. No entanto,
nenhum desses resumos foi encontrado em periódicos da área da Educação. Atém
disso, observou-se que, no geral, os trabalhos em congresso também não vão para
sessões de Educação, sendo a maioria, mesmo que relativa ao ensino de habilidades
acadêmicas, apresentada na sessão de Psicologia Experimental.

Tecnologias de ensino desenvolvidas no cenário brasileiro


Em dois estudos realizados por de Rose e colaboradores (de Rose, de Souza,
Rossito & de Rose, 1989; Melchiori, de Souza, & de Rose, 199?) foi testado um procedi­
mento em que houve preocupação em garantir a aprendizagem da leitura, tendo sido
combinados ao paradigma da equivalência de estímulos: o procedimento de discrimi­
nação por exclusão; o aumento gradual de dificuldade e testes de generalização da
leitura pela recombinação de sílabas. Esse procedimento tem sido usado como m ode­
lo, ou seja, como um programa de ensino, cm diversos outros estudos sobre ensino de
leitura (por exemplo, de Rose et al., 1996; Medeiros, Monteiro, & Silva, 1997; Medeiros,
1998; Peres, 2001; Ribeiro & Haydu, 1998).
Todos esses estudos tiveram como objetivo principal avaliar o procedimento
proposto por aqueles autores, ensinando leitura de palavras e este nde nd oo em a l­
guns casos à escrita. Esses estudos foram desenvolvidos em diversos contextos e
com diferentes objetivos. Por exemplo, Ribeiro e Haydu (1998), e Tini e Haydu (2003)
visaram capacitar professores de Ensino Fundamental e de Educação Especial a apli­
car um programa de ensino, usando recursos de informática (o Software Mestre), que
será descrito posteriormente; Medeiros (1998) aplicou um programa de ensino de leitu­
ra em situações de sala de aula, numa condição de ensino coletivo; Peres (2001)
demonstrou que o repertório de interações sociais de um menino de 12 anos de idade,
que cursava a 4 a série do Ensino Fundamental, foi ampliado após a superação de
dificuldades de leitura e de escrita; Medeiros et al. (1997) ensinaram leitura com com­
preensão a um adulto com história de fracasso escolar, o qual passou a ler inclusive
palavras novas compostas pela recombinação das silabas das palavras de ensino.
Os procedimentos usados nos programas de ensino por Medeiros (1998),
Medeiros, Vettorazi, Kliemann, Kurban e Mateus (2007), Peres (2001), Ribeiro e Haydu.
(1998), Rossit (2003), assim como outros, foram viabilizados por meio de um importan­
te recurso de ensino desenvolvido por Goyos e Almeida (1994). Trata-se do programa
de computador Mestre®, criado com o objetivo de permitir o desenvolvimento de atividades
relacionadas ao ensino de habilidades académicas básicas, como leitura, escrita, in­
glês, geografia, matemática e história. Podem ser programadas tarefas de escolha de
acordo com o modelo, com um modelo e até três estímulos de escolha. Os estimulos-
modelo podem ser imagens, sons ou palavras impressas. Os estímulos de escolha
podem ser imagens, palavras impressas, letras para formar palavras ou ainda a opção
de quadros azuis que podem ser estipulados como estímulo de escolha correspondendo
à resposta correta ou incorreta, diante da emissão do som pela criança. As tentativas de
escolha podem ser precedidas ou, seguidas por estímulos em que são apresentadas
as instruções, como, por exemplo, “escolher as letras que formam a palavra”. Pode-se
acessar, no final, o relatório de desempenho do usuário.

Sobre Comportamento e Cognição 249


A pesquisa realizada por Rossií (2003) consistiu em dois estudos, que tiveram
como objetivo desenvolver e avaliar um currículo para o ensino de habilidades matemá­
ticas. que envolviam o manuseio de dinheiro, a jovens com necessidades educativas
especiais, com idade variando de 12 a 32 anos. A pesquisa foi realizada com o uso do
software Mestre® O procedimento envolveu os seguintes passos: 1} treino em tarefas
MTS de identidade com numerais impressos (1. 5, 10, 25, 50 e 100); 2) treino da respos­
ta de escolher os mesmos numerais impressos na presença dos numerais ditados e
das figuras de moedas na presença de valores ditados; 3) testes para verificar a emer­
gência das relações de equivalência entre moedas e numerais impressos; 4) tarefa de
seleção de um numeral impresso (ex; 5) na presença do mesmo valor quebrado" em
componentes de menor valor e intercalados com o sinal da adição como modelo (ex;
1 + 1+1 + 1+ 1); 5) testes de escolha de acordo com o modolo com construção de respos­
tas, nos quais a figura de uma moeda e o valor ditado da moeda foram apresentados
como estímulos-modeio e moedas reais foram apresentadas como estímulos de com­
paração. Os resultados dessa pesquisa permitiram concluir que os participantes for­
maram classes extensas de estímulos equivalentes, as quais foram generalizadas
para valores não treinados e para situação simulada de compra, tendo aprendido a
manusear o dinheiro.
Um projeto de pesquisa, financiado pelo CNPq e pela FAPESP, está sendo
desenvolvido por pesquisadores da Universidade Federal de São Carlos sob a coorde­
nação da Dra. Deisy das Graças de Souza (http://www.ppgpsi.ufscar.br/arquivos/File/
Proj_Deisy.pdf), com a participação de pesquisadores da mesma instituição e de ou­
tras [Julio Cesar de Rose (UFSCar); Ana Claudia Almeida-Verdu (UNESP/Bauru); Wagner
Rogério da Silva (Bolsita /P//FAPESP); Jair Lopes Junior (UNESP/Bauru): Maria Cecília
Bevilacqua (USP/Bauru); William Mcllvane (UMASS); Lidia Maria M.Postalli (Doutorado/
FAPESP); Raquel Melo Golfeto (Doutorado/FAPESP)], o qual poderá fornecer dados para
o desenvolvimento de uma tecnologia de ensino relevante para reabilitação de indivídu­
os submetidos a implante coclear. O procedimento da pesquisa emprega o modelo de
equivalência de estímulos como instrumento metodológico para o desenvolvimento da
tecnologia proposta e para esclarecer questões teóricas sobre relações simbólicas. Ao
considerar a importância dos estudos, os pesquisadores argumentam que o implante
bem sucedido permite a recepção dos estímulos sonoros, que. no entanto, são despro­
vidos de conteúdo simbólico se o indivíduo tiver sido acometido de surdez antes da
aquisição da linguagem. Assim, faz-se necessário estabelecer aprendizagem relacional
em que os estímulos recebidos por meio do processador de fala (captados diretamente
do ambiente) e a estimulação elétrica diretamente na cóclea (com o processador de
fala desligado) se tornem equivalentes, o que pode ser feito por meio do modelo de
formação de classes de estímulos equivalentes. Este projeto tem produzido muitos
resultados que podem ser localizados nas publicações dos autores do grupo de pes­
quisa (e.g, Almeida-Verdu, 2004; Alves, Almeida-Verdu, de Souza, Bevilacqua, & Vitti,
2005; de Souza, Schmidt, da Costa, & Almeida-Verdu, 2003; Huziwara, 2006).

Um manual para professores alfabetizadores aplicarem o modelo da


equivalência de estímulos em sala de aula
Um outro recurso tecnológico que possibilitará o uso da tecnologia derivada
das pesquisas sobre equivalência de estímulos, a professores da Educação Especial,
da Educação Infantil e do Ensino Fundamental, está sendo desenvolvido por Haydu
(manuscrito não publicado). Esse recurso consiste de um manual de ensino de leitura
de palavras substantivadas escrito numa linguagem acessível e totalmente ilustrado. O

Verônica Bender H aydu, Juiiana Barboza Caetano de Paula


manual descreve, com detalhes, tarefas de ensino e procedimentos de testes, envol­
vendo as seguintes relações entre estímulos: palavra ditada e figura; palavra ditada e
palavra impressa; nomeação de figura; nomeação de palavra impressa; figura e palavra
impressa; palavra impressa e figura; palavra impressa e montagem de anagrama;
figura e montagem de anagrama; palavra ditada e montagem de anagrama. Os materi­
ais sugeridos são cartões com as palavras e as figuras correspondentes impressas,
os quais podem ser confeccionados em sala de aula com o auxílio dos alunos. As
atividades de ensino de leitura são organizadas de forma a evitar a ocorrência de erros,
com o procedimento de discriminação por exclusão e o aumento gradual da complexi­
dade das tarefas. O aumento da complexidade é feito pelo acréscimo do número de
estímulos de escolha nas tarefas de MTS e do aumento de palavras ensinadas em
cada passo. Além disso, a complexidade das palavras ensinadas também aumenta
gradualmente, tendo sido sugerido iniciar com palavras dissilabas cujos valores dos
grafemas não variam dependendo da posição na palavra. Erri seguida, ensinar dissilabas
cujos grafernas tenham valores dependentes da posição c depois a introdução de
palavras trissilabas, monossílabas, acentos, encontros oonsonantaís etc.
O ensino das palavras deve ser feito de forma contextualizada com histórias,
fábulas, cantigas, contos do folclore, relatos de passeios, relacionados ou a um tema
transversal proposto para o currículo, ou ainda, a um tema de interesse dos alunos.
Para as etapas iniciais do programa são apresentadas, no Manual, histórias que
contextualizam as palavras a serem ensinadas. Além disso, sugere-se que a aprendi­
zagem, o acerto e o interesse do aluno devem ser valorizados o tempo todo.
O Programa de Ensino é organizado em etapas que apresentam uma seqüência
de passos, os quais devem ser ajustados ao ritmo dos alunos, aos seus interesses e
a aspectos relacionados corn a variedade sociolingüística (aspectos culturais, geográ­
ficos, profissionais etc.). Sugere-se a utilização do “Guia Prático de Alfabetização: Base­
ado em princípios do sistema alfabético do português do Brasil”, de Scliar-Cabrai (2003),
para que as questões da lingüística sejam consideradas ao se escolher as palavras a
serem ensinadas. Em cada etapa do Programa de Ensino, são sugeridas atividades na
forma de jogos que complementam os passos. Essas atividades dão oportunidade
para o professor enriquecer as aulas com condições que possam aumentar a participa­
ção dos alunos e garantir a aquisição das relações entre estímulos necessárias para a
emergência da leitura com compreensão e a generalização desta. As etapas do progra­
ma de ensino são sumariadas a seguir.
A Etapa 1 é composta pelos Passos 1 a 9, para os quais foi sugerido o ensino
de uma palavra por passo. A cada dois passos é apresentada uma estória nova a ser
contada pelo professor. No Passo 10, é proposta a avaliação da aprendizagem de
leitura com compreensão. As palavras são díssílabos simples, sem diferenças nos
valores dos grafemas dependentes da posição: GALO, LOBO, BOLO, BOCA, MACA,
MAPA, TOCO, MATO, PATO. Cada passo de ensino envolve: 1) recontar a estória que foi
introduzida em uma aula anterior, na qual os alunos devem ser familiarizados com os
personagens e as figuras da história; 2) mostrar um cartão e dizer o nome da palavra a
ser ensinada; 3) pedir aos alunos para repetirem a palavra; 4) escrever na lousa a
palavra com letra manuscrita; 5) pedir para que os alunos peguem um cartão com a
palavra impressa apresentada; 6) conferir as respostas e elogiar o acerto; 7) repetir a
tarefa de pegar um cartão com a palavra impressa; 8) construir a palavra com letras
diante da palavra impressa; 9) repetir a construção da palavra.
No final da Etapa 1, é sugerido um passo em que é avaliada a leitura com com­
preensão e a leitura de palavras formadas pela recombinação das sílabas. As palavras
de generalização, que são: BOBO, CABO, BOTO, GATO, MAGA, COCO, CACO, CALO. Essa

Sobre Comportamento c Cognífão 251


avaliação envolve as seguintes relações emergentes: ler a palavra irr,pressa: escolher a
palavra impressa diante da figura; escolher a figura diante da palavra impressa; construir
a palavra com ietras diante da figura; construir a palavra com letras diante da palavra
oralizada. Em seguida, propõe-se reaplicar essa seqüência de tentativas.
A Etapa 2 é composta por 12 passos, ainda com o ensino de uma palavra por
passo, totalizado 12 palavras. Sugeriu-se a introdução gradual de palavras cujos
grafemas tenham valores dependentes da posição na palavra e do acento de intensida­
de. O procedimento de ensino é igual ao da etapa anterior. Após os 12 passos dessa
etapa, é sugerida uma nova avaliação da aprendizagem no Passo 23 Nesse passo, é
testada a leitura com compreensão das 12 palavras de ensino e de mais 10 palavras de
generalização.
A Etapa 3 é composta por mais 12 passos. Sugeriu-se a introdução de palavras
formadas por uma sílaba e por quatro sílabas; palavras com acentos agudo e circunfle­
xo; continuidade na inserção de grafemas cuja pronúncia é diferente, dependendo do
contexto ou da posição na palavra. O procedimento é igual ao da etapa anterior. No
passo de avaliação {Passo 36), é testada a leitura com compreensão, envolvendo as 12
palavras de ensino e mais 10 palavras de generalização.
A Etapa 4 é formada, também, por 12 passos, na qual se sugeriu o ensino de
duas palavras por passo. Na descrição da Etapa 4, não são mais apresentadas histó­
rias ou outro tipo de texto para os passos de ensino. Espera-se que o professor tenha
aprendido a fazê-lo e que crie suas próprias histórias ou, de preferência, faça isso junto
com os alunos.
Após a Etapa 4, sugere-se ao professor que ele deve avaliar se os alunos
necessitam que esse procedimento continue ou se eles já têm condições de aprender
palavras novas de forma menos sistemática e sem as avaliações individuais da forma
com que foi sugerido. Se o professor decidir que os alunos não necessitam mais desse
tipo de procedimento, os cartões e as letras podem continuar a ser usados em jogos ou
algumas tentativas de escolha mais esporádicas, como na introdução de dificuldades
ortográficas, que envolvem encontros consonantais. No início do programa de Ensino,
sugere-se que o professor apresente conseqüências reforçadoras de forma continua e
que depois passe a fazê-lo de forma intermitente e, quando o programa estiver mais
adiantado, passe a liberar as conseqüências no final de um conjunto de tarefas,
Apesar de o Programa Ensino ter uma seqüência pré-estabelecida, enfatizou-se
que as atividades sugeridas podem ser modificadas para atender a uma variedade muito
grande de necessidades que podem surgir em situações educativas de Educação infan­
til, de Ensino Fundamental e de Educação Especial. No entanto, destaca-se a importân­
cia de: as atividades serem organizadas em seqüências, com um aumento gradual das
dificuldades; de o programa ser adaptado a diversas situações e metodologias de alfabe­
tização; de ser feita uma supervisão individual e constante da aprendizagem; de ser feita
uma retirada gradual das contingências artificiais estabelecidas no início do programa.
Espera-se que com a descrição detalhada dos passos iniciais, o professor seja capaz de
programar suas aulas de acordo com esse tipo de procedimento, por isso, as informa­
ções dadas a ele são gradualmente retiradas.

Conclusão
Conforme foi salientado no inicio deste trabalho, a importância de estudos de
Análise do Comportamento Aplicada é amplamente documentada na bibliografia da Aná­
lise do Comportamento, tendo este sido um interesse particular de Skinner (1972a). A

252 Verônica Bender H aydu, Juliana Earboza Caetano d(? Pauiu


geração de tecnologia de ensino foi também valorizada por ele, como ficou evidente com
a publicação do livro Tecnologia de Ensino (Skmner. 1972b) editado originalmente em
1968.
Conforme foi descrito aqui, os analistas do comportamento têm p ro d u z id o muito
conhecimento, que tem grande aplicabilidade nas mais diversas áreas de atuação do
psicólogo e de outros profissionais. Pode-se constatar a aplicabilidade deste conheci­
mento desde o ensino de repertórios básicos, como o que foi detalhado nesto c a p itu lo ,
ate a analise de contingências complexas como as presentes em problemas que estão
acontecendo a nível mundial, como o terrorismo, conforme destacou Sidrnan (2003):
Existe muito trabalho a ser feito aqui para ir dus princípios n açao. A ciência da
Análise do Comportamento experimental, tnnnr. >o aplicada c uma fonte inexplorada
de diplomacia em geraí e em particular nu qutí dis respeito ao terrorismo. De
qualquer forma, os objetivos da diplomacia são cemporiameniais; seus alvos são
influenciar a conduta daquclos que governam as nações Analistas do comporta­
mento c os especialistas em metodologia cientifica, quem sabe formando um
grupo de cientistas dc serviço extenor (foreign-service scientists), poderiam nju
dar a implementar nosso crescente conhecimento a cerca das fontes da conduta
humana, com objetivo particular e imediato de promover a cessação da atividade
terrorista e, em iongo prazo, facilitar a paz mundial, (p 89)

Os analistas do comportamento devem ser encorajados a publicar seus estu­


dos em periódicos e livros de outras áreas que não só os da Psicologia. Além disso,
devem promover intercâmbios para que o conhecimento produzido possa ser aplicado
por aqueies que atuam nas diversas áreas profissionais, pnncipalmente, a da Educa­
ção, para a qual os princípios de aprendizagem baseados na Análise do Comportamen­
to são extremamente relevantes.

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Sobre Comportamento 0 Cognição 257


I

Si
Capítulo 21
C M A I (Centro municipal de apoio à in­
clusão) - Um projeto de educa­
ção inclusiva no município de
Çoiânia - Q O
Cyláucia H elen a de A lm e id a +
Centro M unicipal de A po io a Inclusão
Juliana Soares Dias*
C M A I Universidade Calólica dc Qoiás
M ich e la Rodrigues R ibeiro**
Universidade Católica de Qoiás

A educação inclusiva é resultado de um movimento social iniciado na década


de 1980 nos países desenvolvidos. No Brasil, esse movimento ganha maior destaque
na década de 1990, a partir da reivindicação, por parte de portadores de deficiências e
seus familiares, para uma maior inserção em espaços sociais, sobretudo na Escola.
Os princípios que fundamentam essas ações estão estabelecidos na Consti­
tuição da República Federativa do Brasil de 1988, em seu art. 205, que dispõe: "(...) a
educação, direito de todos e dever do Estado e da Familia, será promovida e incentivada
com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu
preparo para o exercício da cidadania’’. A educação inclusiva tem sido discutida em
âmbito nacional atualmente como um paradigma a ser adotado pelas escolas. Pode­
mos definir como educação inclusiva, a ação que acolhe todas as pessoas, sem exceção.
É para o estudante com deficiência física, para os que têm comprometimento mental,
para os superdotados, para todas as minorias e para a criança que é discriminada por
qualquer outro motivo. O ato de estar junto, se aglomerar no cinema, no ônibus e na sala
de aula com pessoas que não conhecemos, é inclusão. Sendo assim, inclusão é estar
com, é interagir com o outro.
Na cidade de Goiânia-GO, no ano de 2001, foram lançados os primeiros pro­
gramas de educação inclusiva, A implementação das diretrizes políticas gerais do perí­
odo de 2001-2004 da Secretaria Municipal de Educação - SME pretendeu ser um avan­
ço na prática educativa como um todo, porque é uma ação de suma importância em
favor da inclusão social da rede.

‘ Psicóloga, Especialista em Psicopedayoyia e Ps ico motricidade


‘ Psicóloga Componente do Núcleo de Pesquisa do CMAI. Meslreem Psicoiogia
■* Doutora cm Psicoiogia

Sobre Comportamento e Cognição 259


No ano de 2005. com o objetivo de fortalecer as açõos já desenvolvidas para a
efetivação de urna educação inclusiva no município de Goiânia, a SME, deu início à
elaboraçao de um projeto que pretendia apoiar os Educandos, ou seja. alunos da Rede
Municipal de Goiânia que, por diversos motivos, apresentam dificuldades de aprendiza­
gem . Como resultado, no ano de 2006, a SME criou o Centro Municipal de Apoio à
In c lu s ã o - CMAI, que tem como meta atender aos Educandos com Necessidades Edu­
cacionais Especiais da Rede Municipal de Ensino do Município de Goiânia. De uma
maneira m ais específica, o CMAI tem como objetivo subsidiar os Educandos que apre­
sentem Necessidades Educacionais Especiais - NEE. temporárias ou permanentes,
com idade a partir de seis anos, matriculados nas Unidades Escolares da SME de
Goiânia. Para tanto o CMAI reune uma equipe voltada para o desenvolvimento infantil e
ap ren diza ge m em d ive rsa s áreas d is c ip lin a re s : p sicó lo g o s, psicop eda go go s,
fonoaudioiogos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais, psicomotricistas, Serviço
Social e intérpretes de LIBRAS (Língua Brasileira de Sinais).
Além d e s s e s profissionais, o CMAI, ocasionalmente, também pode contar com
o apoio de outros profissionais da rede pública de saúde da Prefeitura de Goiânia como
neuropediatras, psiquiatras, dentre outros. Atualmente o CMAI conta com 114 profissio­
nais distribuídos em duas unidades de atendimento em Goiânia (Unidade Brasil de
Ramos Caiado e Unidade Maria Thomé Neto).
O atendimento oferecido pelo CMAI é desenvolvido pela Equipe Multiprofissional,
nas seguintes etapas: (1) Solicitação de atendimento especializado; (2) Entrevista; (3)
Avaliação: (4) Reunião Devolutiva; (5) intervenção. A solicitação para atendimento espe­
cializado. é encaminhada pela escola e pelas Unidades Regionais. Com a chegada
destes encaminhamentos, é marcada uma entrevista com a família, que ó realizada
pelo Serviço Social. Após esta entrevista, a criança é encaminhada para avaliação. A
Avaliação é realizada por uma Equipe Multidisciplinar e após a conclusão destas, todos
os profissionais indicados ao caso. realizam o Estudo de Caso e posteriormente, com
a conclusão da Avaliação e com Plano de Intervenção definido, o Serviço Social agenda
uma reunião, de caráter obrigatório, junto as Unidades Regionais, Escolas e a Equipe
Multiprofissional, com objetivo de (a) devolver dos resultados da avaliação do Educan­
do; (b) trocar informações sobre dificuldades e possibilidades educacionais do Edu­
cando; e (c) oferecer sugestões e apoio para que a Escota possa ajudá-lo a superar
suas dificuldades nesse processo.
Com o objetivo de avaliar o perfil dos educandos atendidos pelo CMAI foi reali­
zada uma pesquisa, em seu primeiro ano de funcionamento. O método utilizado para
coleta de dados foi a análise documental, ou seja, foi realizado um levantamento das
categorias Gênero, Idade, Escolaridade e Renda Familiar, a partir dos prontuários dos
educandos atendidos entre janeiro de 2006 até junho de 2007. Foram analisados os
prontuários das duas unidades do CMAI.
A partir do levantamento realizado, no qual foram analisados 409 prontuários,
foi observado que a maioria dos educandos atendidos era do sexo masculino (69%)
com idades variando de 6 a 18 anos, sendo que as idades mais freqüentes observadas
estão entre 8 e 12 anos nas duas unidades de atendimento do CMAI. A Figura 1 apre­
senta a porcentagem das idades dos educandos atendidos pelo CMAI - Unidade Brasil
de Ramos Caiado e pe!o CMAI - Unidade Maria Thomé Neto.
A Renda Famiiiar dos educandos foi de 1 a 2 salários mínimos na Unidade
Brasil de Ramos Caiado (38%) e de 2 a 3 salários mínimos na Unidade Maria Thomé
Neto (30%). Este dado mostra que as familias atendidas na Unidade Brasil de Ramos
Caiado são famílias, que de acordo com o Censo de 2006, estão localizadas na classe

260 Gláucia H elena de Alm eida, Juliana Soares Dias, M ichela Rodrigues Ribeirp
Figura 1: P orce n ln g o m de id a d e s a te n did a s pela su nid a do s do CM Al.

E (renda mensal de até R$ 479,00} e a Unidade Maria Thomé Neto na classe D (renda
mensal entre R$ 479,00 e R$ 1.035,00), visto que o salário mínimo era, no período da
coleta de dados, de R$ 380,00.
Quanto a sscolaridade dos educandos atendidos no CMAI Unidade Brasil de
Ramos Caiado a maioria foi do Ciclo I (47%) e do CMAI Unidade Maria Thomé Neto a
maioria foi íambém do Ciclo I (42%).
Com a finalidade de exemplificar o trabalho realizado, a seguir serão apresen­
tadas duas avaliações comportamentais, realizadas no CMAI.

Estudo de Caso i
Paula é uma adolescente de 16 anos e meio que cursa a 5a série (Ciclo II) na
Rede Municipal de Ensino de Goiânia. Mais nova de três filhas, perdeu a mãe aos 3
anos e foi criada pelo pai (e irmãs). A mãe era cardiopata, hipertensa e teve eclãmpsia
pré-natal.
A queixa da escola e da família é de dificuldade de aprendizagem e de interação
nos grupos bem como de expressão oral e física. Desde o inicio de sua escolarização,
aos 4 anos de idade, apresentou problemas de aprendizagem e comprometimento da
fala. Não lê, reconhece algumas letras e números até o nove. Cozinha e cuida sozinha
da casa.
A avaliação foi realizada nas dependências do CMAI, pela primeira autora, em
uma sala destinada a atendimentos psicológicos. Foram utilizados os testes psicológi­
cos WISC III: Escala de Inteligência Wechsler para Crianças (Wechsler, 2002), Raven -
Escala Geral (Raven, 2003), inventário de Habilidades Sociais (Del Prette & Del Prette.
2001) e alguns jogos e atividades, tais como Tapa Certo, Cara a Cara, Lince, Quebra
Cabeças, Jogo dos 7 erros, Jogo de Memória e desenhos para a observação do com­
portamento de Paula. Foram realizadas 12 sessões.
Em avaliação apresentou um importante comprometimento em quase todas
as funções do aspecto cognitivo (principalmente no que se refere às habilidades acadê-

Sobre Comportamento e Cognição


micas e funções executivas de planejamento e previsão), atingindo nivei “intelectual­
mente deficiente" nos subtestes de execução e um pouco melhor ('lim ítrofe” ) nos
subtestes verbais do Wise III, que é considerado um excelente teste preditor de sucesso
acadêmico. As funções executivas de planejamento e previsão estão relacionadas aos
comportamentos de cópia de modelos, realização de labirintos, comportamentos soci­
ais automatizados. No entanto, alcançou nível IV (“ Inteligência inferior á média”) no
Raven - Escala Geraf, considerando sua validade preditiva para o desempenho
ocupacional, que se refere às habilidades de autocuidado e asseio pessoal, trabalhos
domésticos, manuseio do dinheiro, uso de aparelhos em geral, entre outras.
Apresentou resultados considerados dentro da média no aspecto específico
da memória e nas funções de atenção seletiva e atenção sustentada obteve bons
desempenhos, apesar da baixa pontuação no principal subteste do Wise III, que mede
esta função. Obteve ótimo desempenho em atividades que envolvem percepção visual,
como por exemplo. Jogo dos 7 erros, Lince e Tapa Certo.
Nos aspectos sócio-emocionais, de acordo com o Inventário de Habilidades
Sociais, em fatores relacionados ao “enfrentamento e auto-afirmação com risco” e "auto
exposição a desconhecidos e situações novas’1 (que envolvem maior risco do reação
indesejável do outro), Paula apresentou bom repertório de habilidades sociais (pouco
abaixo da média). Comportamentos tais como cumprimentar e despedir-se das pesso­
as usando locuções de civilidade, aguardar a vez para falar, iniciar conversações, fazer
e receber elogios, seguir regras, fazer e responder perguntas, chamar as pessoas pelo
nome, demonstrar interesse pelos outros e oferecer ajuda corroboram tal resultado.
Porém, obteve um escore total sugestivo de indicação para treinamento em habilidades
sociais, uma vez que estes déflcits podem ser fonte de problemas, como é o caso de
sua dificuldade em ser assertiva ao expressar raiva e lidar com críticas e gozações,
causando conflitos freqüentes com colegas de escola por não conseguir se acalmar
diante de uma situação problema, ou situações em que se torna agressiva por não
conseguir lidar com os próprios sentimentos e emoções, como a morte da mãe ou as
chacotas dos colegas.
Baixos escores também aparecem de forma específica no repertório em habi­
lidades de “auto-afirmação na expressão de sentimentos positivos" (relacionadas a
auto-estima) e um pouco melhor nas habilidades de “conversação e desenvoltura soci­
al” (provavelmente por envolver menor risco de reação indesejável do outro). Somente
no fator específico relacionado ao “autocontrole da agressividade" em situações
aversivas, os resultados pareceram divergentes, sugerindo comportamentos oscilan­
tes ou de acordo a quem se direcionam. Essa divergência aparece, por exemplo, na
maneira agressiva com que Paula freqüentemente se direciona a seus colegas de
escola ou a quem lhe dirige alguma crítica, o que não acontece em relação a sua família
e a outros adultos que interagem com ela de maneira acolhedora.
As observações clinicas apontaram para comportamentos reativos ("ataque
como melhor defesa”), critica aguçada, resistência em lidar com sentimentos negativos
(principalmente relacionados a morte da mãe), boa tolerância à frustração e contato
aversivo com a aprendizagem sistemática (provavelmente em função de uma história
de constantes fracassos).
Como com plem entação da avaliação foram realizadas sessões com uma
fonoaudiótoga, que indicou em seu parecer principalmente a presença freqüente de
dificuldades na oralidade e sessões com uma psicomotricísta que também indicou
uma série de dificuldades principalmente no que se refere a coordenação e equilíbrio,
lateralidade e orientação temporal.

262 Çláucia 1^ le n a dc A lm eida, Juliana Soares Dias. M ichela Rodrigues Ribeiro


Conclusão
Paula apresentou baixos resultados nos aspectos cognitivos I im iim fcf e in­
telectualmente Deficiente” segundo Wisc lllT contrapondo em parte. n indict» <> inteli­
gência Inferior a média" no Raven - Escala Geral.
No entanto, segundo David Wechsler (2002), criador da Escala de Inteligência
Wechsler (Wisc III) "... um indivíduo, para ser diagnosticado comu deficiente mental,
deve mostrar indícios de funcionamento intclectual abaixo da media, tanto em seu
funcionamento intelectual, como em seu comportamento adaptativo em uma variedade
de contextos." (p. 7). Portanto, uma avaliação de capacidade intelectual geral é necessá­
ria, mas não é suficiente para estabelecer o diagnóstico de deficiência mental. Tatorns
como extrema diferença cultural ou lingüística em relação ao grupo de padronização
dos testes, dificuldades de expressão oral o o aspecto aversivo da aprendizagem aca­
dêmica para Paula, provavelmente interferiram no resuitado dos testes, o que explicaria
o melhor resultado no Raven. que é um teste que não depende da comunicação verbal
g das aprendizagens acadêmicas.

índices próximos a média no Inventário de Habilidades Sociais, parecem ser


indicativos de bons “comportamentos adaptativos", mencionados por W cchsicr (2002),
o que também pode ser observado em suas AVD’s (atividades da vida diária), tais corno
hábitos de higiene e cuidados pessoais, trabalhos domésticos, manuseio de dinheiro,
uso de telefone, entretenimento, relacionamento interpessoal, orientação espacial, en­
tre outras.
Portanto, confirmam-se os motivos de encaminhamento da escola e da família
no que se refere a dificuldade de aprendizagem “sistemática”, visto que Paula possui
capacidade para outras aprendizagens (cuidar de casa, por exemplo), e dificuldade dc
interação nos grupos, provavelmente por ser muito freqüentemente exposta a criticas
indevidas (“chacotas”) pelos seus pares, o que ofereceu oportunidade para o desenvol­
vimento de comportamentos reativos.
De acordo com o DSM-IV-TR (APA, 2003) pode se tratar de um caso de Retardo
Mental com características de Leve a Moderado. “Com apoios apropriados, os indivídu­
os com retardo mental leve habitualmente podem viver sem problemas na comunidade,
de modo independente ou em contextos supervisionados” (p. 40). Dentro das conside­
rações do Retardo Mental "Moderado", o DSM-IV-TR (2003) afirma q u e ' ...provavelmente
não progredirão além da 2a série em temas acadêmicos" (p. 41) o que parece concordar
com alguns déficits acadêmicos observados no repertório de Paula.
Baseada nessa avaliação, a proposta de intervenção sugerida ao CMAI incluiu
atendimentos de Psicologia, Fonoaudiologia, Psicopedagogia. Psicomotricidade, Tea­
tro e Dança. Foi sugerido também a todos os profissionais que comportamentos soci­
ais apropriados deveriam ser reforçados em todos os contextos de atendimento, com o
objetivo de desenvolver habilidades sociais e diminuir as dificuldades nas relações
interpessoais.
Para a escola também foi sugerido um investimento no treinamento de habili­
dades sociais, incluindo os colegas da turma de Paula, com o objetivo de melhorar as
relações interpessoais de forma geral e em especial no que se refere a compreensão
e aceitação das dificuldades que Paula apresenta. Além disso, é importante que a
escola continue investindo em sua escolarização (com o intuito de desenvolver novas
habilidades cognitivas), porém com expectativas mais reais, valorizando seus compor­
tamentos adaptativos e reforçando seus comportamentos pró-sociais.

Sobre Comporta mento c Cognição 263


A orie n ta çã o dada à fa m ília foi de que Paula fiz e s s e cursos técnicos
profissionalizantes (extra-escola) dentro de áreas de seu interesse. Essa sugestão se
baseou na observação de que Paula é hábil, por exemplo, nos afazeres domésticos e
na culinária. Dessa forma, o contato com atividades em que a aprendizagem acadêmi­
ca não é essencial poderia fortalecer desempenhos competentes em outras áreas. Tal
e xp eriência po de ria c o n trib u ir para um sentim ento m aior de com petência, de
autoconfiança e de auto-estima.

Estudo de caso 11
Paulo é um adolescente de 14 anos que cursa a 7a série (Ciclo líl) na Rede Municipal
de Ensino de Goiânia. Filho único, criado pela avó materna, teve os pais sempre distantes na
educação (principalmente o pai). A avó relata que o avó é uma pessoa bastante agressiva e
que a mãe de Paulo é muito Impaciente”. Portanto, situações tensas eram sempre mediadas
pela avó. Paulo tem poucos amigos e convive muito com primas mais velhas. Muito vaidoso,
asseado, organizado, “preocupa-se muito com as coisas”. Lê e escreve bem.
Foi encaminhado pela escola por apresentar problemas de comportamento, não
fazer as atividades de sala e brincar muito. A escoia também se queixou de dificuldades na
leitura, escrita e “outros aspectos cognitivos”. A família se queixa de que Pauio repete várias
vezes um mesmo assunto e às vezes fica agitado e nervoso.
Sua avaliação foi realizada pela primeira autora em uma saía de atendimento psico­
lógico do CMAI durante 10 sessões. Os testes psicológicos utilizados foram: WISC 111: Escala
de Inteligência Wechsler para Crianças (Wechsler, 2002), Raven - Escala Geral (Raven,
2003), ESI - Escala de Stress Infantil (Lipp & Lucarellí, 2005), TDE - Teste de Desempenho
Escolar (Stein, 1994). Além disso, também foram utilizados jogos e atividades, tais como Tapa
Certo. Cara a Cara, Lince, Quebra Cabeças, Jogo dos 7 erros. Jogo de Memória e desenhos.
Durante a avaliação Pauio mostrou-se assíduo, pontual e colaborativo, Demonstrou
ansiedade nos diálogos e frente às tarefas propostas em alta freqüência, como por exemplo,
apertando as mãos. coçando a cabeça, fazendo muitas perguntas (ou respondendo de fornia
interrogativa), duvidando da própria competência, dando respostas corretas e retirando-as,
não mantendo olhar direto e agitando-se na cadeira. Foi observado também um cuidado
excessivo com o asseio pessoal e aparência, indicado, por exemplo, peto uso de um chinelo
de borracha (Havaianas*) branco que invariavelmente estava limpissimo. Ele o lavava diaria­
mente.
Paulo apresentou escores de "inteligência inferior á média” no Raven - Escala Gerai,
e “Intelectualmente Deficiente” no Wisc III, resultados estes que foram desconsiderados em
virtude do alto nível de ansiedade observado no decorrer da avaliação. No T.D.E. (Teste de
Desempenho Escolar), apresentou pontuações inferiores em escrita e aritmética e média em
leitura, o que pode significar um déficit de conteúdos e/ou um atraso escolar. Não foi observa­
do qualquer comprometimento de memória e atenção e demonstrou uma ótima capacidade
de planejamento e antecipação. Além disso, apresentou seu material escolar, em especial
seu caderno, muito limpo e organizado.
Em relação aos aspectos sódo-emocionais, submetido a E.S.I. (Escala de Stness
Infantil) de Lipp e Lucarelli (2005), apresentou pontuações dentro da normalidade no que se
refere às reações físicas, psicológicas e psicológicas com componente depressivo. Porém
nas reações psicofrsiológicas, demonstrou estar em fase de alerta. Tal resultado pode ser
corroborado com observações de comportamentos respondentes no decorrer de algumas
sessões, como suor, mãos geladas, gagueira ao responder algumas questões, dentre ou­
tros.
Paulo demonstrou muita insegurança e medo de errar, retraimento e excesso

£64 G lá u c ia Helena de A lm eida, Juliana Soares Dias, M ichela Rodrigues Ribeiro


de preocupação consigo mesmo, rigidez, ansiedade e comportamentos característicos
de obsessividade compulsiva e meticulosidade. Em algumas ocasiões prefere optar
por não emitir determinados comportamentos do que emitir e errar, como por exemplo
arriscar-se em responder perguntas das quais não tem absoluta certeza das respostas
e retirar a resposta correta.

Conclusão
Paulo apresenta comportamentos característicos de Transtorno O b s e s s iv o
Compulsivo de acordo com o DSM-IV-TR (APA, 2003). Isto pode explicar os baixos índi­
ces nos testes de inteligência que não condizem com um adolescente que lê, escreve
razoavelmente bem, possui ótimas AVD’s e linguagem fluente. Muito provavelmente
todas as suas baixas pontuações, bem como seus maus resultados escolares, podem
estar relacionadas ao medo de errar, ansiedade e características perfeccionistas. A
origem destes com portam entos pode estar relacionada ao m odelo de sua atual
cuidadora, no caso sua avó, que sempre esteve próxima de Paulo em sua educação, e
que parece emitir comportamentos semelhantes, servindo tanto como modelo quanto
como uma fonte de reforçamento diferencial.
Como proposta de intervenção, foi sugerido para o CMAI que Paulo fosse inse­
rido no atendimento psicológico, duas vezes por semana, individualmente ou em grupo
com características semelhantes. Esse atendimento teria como objetivo a diminuição
de ocorrência de comportamentos obsessivos e ansiosos e a aprendizagem de formas
mais adaptativas de solução de problemas. Além disso, foi sugerido que ele participas­
se do Teatro, Dança e Arteterapia, com o intuito de desenvolver suas habilidades ex­
pressivas e a auto-observação de comportamentos obsessivos.
A família de Paulo foi orientada sobre a importância da participação da avó
(principalmente) nos grupos de pais e/ou em atendimentos individuais, oferecidos pelo
CMAI, visando uma maior compreensão dos problemas apresentados pelo neto e uma
aprendizagem de formas alternativas de educação que contribuam para a melhora do
quadro de ansiedade de Paulo. Adicionalmente, foi sugerido à escola o desenvolvimen­
to ou um maior investimento no treinamento de habilidades sociais com a turma e a
organização de pequenos grupos de debates sobre problemas comuns na adolescên­
cia, no intuito de que a turma se integre e possa discutir sobre assuntos considerados
incomuns e/ou “proibidos" dentro da escola, evitando essas discussões de forma e em
momentos impróprios, e favorecendo uma descontração benéfica a realização das
atividades acadêmicas.

R eferências

A ssociação de Psiquiatria Am ericana (2003). Manual diagnóstico e estatístico de transtornos


mentais - DSM-IV-TR. Porto Alegre: Artes Médicas.
Del Prette, A. & Del Prette, Z. A. P. (2005). Psicologia das Habilidades Sociais na Infância: Teoria e
Prática. Petrópolis: Editora Vozes.
De! Prette, A., & Del Prette, Z. A. P. (2001). Inventário de Habilidades Sociais: manual de aplicação,
apuração e interpretação. São Paulo: Casa do Psicólogo Livraria e Editora Ltda.

Sobre Comportamento e Cognição 265


Lipp. M. E. N. & Lucarelli, M. D. M. (2005)- ESI. Escala de Stress Infantil - Manual. São Paulo: Casa
do Psicólogo.

Raven. J C. (2003). Raven Escala Geral - Manual. Rio de Janeiro: CEPA - Ceniro Editor de Psicologia
Apiicada Ltda.

Stein, L M (1994) TDE Teste de Desempenho Escolar: manual para aplicação e interpretação.
São Paulo: Casa do Psicólogo.

Wedissier. D. (2002) WiSC III: Escala de Inteligência Wechsler paro Crianças - Manual. Adaptação
e Pacronização de uma amostra brasileira por Vera Lúcia Marques de Figueiredo - São Paulo: Casa
do Psicólogo.

266 Çláucia Helena dc Alm eida, juliana Soares Dias, M ichela Rodrigues Ribeiro
Capítulo 22
Uma análise de metacontíngêncías na
escola inclusiva*

A n d r é ía S chm idt"
Wniversidcide Positivo
Deísy Q . de S o u za "
WFSCar

A educação brasileira tem passado por muitas transformações desde as duas


últimas décadas do século XX {embora transformações não sejam, necessariamente,
sinônimo de sucesso ou de qualidade). Talvez a mais expressiva delas seja o movi­
mento pela inclusão escolar de pessoas com necessidades especiais (PNEs). Esse
movimento faz parte de um modelo de educação inclusiva, que se refere ao processo de
educar-ensinar no mesmo grupo alunos com ou sem necessidades educativas espe­
ciais, durante parte ou na totalidade do tempo de permanência na escola. A noção de
inclusão se fundamenta no principio do reconhecimento da diversidade na vida em
sociedade, o que deveria assegurar o acesso de todos os indivíduos às oportunidades,
independente de suas peculiaridades (Aranha, 2001). O movimento pela escola inclusi­
va tem como princípio o direito constitucional de educação de qualidade para todas as
pessoas, independente de suas condições biológicas ou sociais.
As transformações que a proposta de educação inclusiva exigem são profun­
das. Por um lado, faz-se necessária a adequação física das instituições escolares,
garantindo o acesso de alunos com limitações físicas à escola. Por outro, demanda
uma mudança na concepção do currículo escolar e das práticas dos educadores envol­
vidos diretamente com o ensino de PNEs, Tais mudanças não podem ser feitas de
forma isolada. Para serem efetivadas, eias requerem ações coordenadas provenientes
de diferentes setores da sociedade.
O objetivo desse texto é apresentar uma análise das ações que vêm sendo
implementadas por diferentes agentes sociais no sentido de implantar a inclusão edu­
cacional de PNEs no Brasil. O referencial teórico que fundamenta a análise é o da
análise do comportamento, e mais precisamente, o da análise de metacontingências
(Andery, Micheletto, & Serio, 2005; Glenn, 1986,1988,1991,2004; Todorov, 1987; Todorov
& Moreira, 2004; Todorov, Martone, & Moreira, 2005). Será feita, inicialmente, uma breve
revisão histórica do processo de inclusão no Brasil, com a identificação dos principais
agentes sociais responsáveis pelas práticas que deveriam ter como produto agregado
* Apoio FAPESP (Processo No 03/09926^4-).
“ Docefile da Universidade Poaiíno nrtdreia.schrndt@up.edu.br
Docente tio Departamento de Psicologia da Universidade Federa! de São Cartos: cfdg$@power.uf$c3; br

Sobre Comportamento e C o g n iflo 267


(Glenn, 1987; Todorov. 1987) o acesso amplo da PNE ao ensino regular. Esses elemen­
tos fornecerão as bases para uma análise, baseada em dados, sobre os resultados
das ações propostas e efetivamente levadas a cabo pelos diferentes agentes envolvi­
dos.

M etacontingências e inclusão
Analisar um fenômeno social à luz do conceito de metacontinyència envolve o
delineamento de um conjunto de contingências comportamentais entrelaçadas que
estabelecem e mantem uma determinada prática cultural. A análise das práticas cultu­
rais em nossa sociedade pode se beneficiar fortemente do instrumental teórico da
análise do comportamento, apesar dc investimento ainda incipiente de anafistas do
comportamento nessa área (Todorov & Moreira, 2004). A unidade dc análise para esse
fim é a metacontingència (Glenn, 1986, 1988,1991,2004). A análise de metacontingências
é possível quando o foco de análise é uma prática cultural, ou seja, um conjunto de
ações de grupos suciais que se interligam (entrelaçam) na geração de um resultado
final comum, um produto agregado diferente das conseqüências específicas geradas
pelos comportamentos de agentes individuais, e que pode afetar todos os membros do
grupo em questão. Os individuos envolvidos nessa prática não necessariamente preci­
sam trabalhar em conjunto e nem mesmo expressar os mesmos objetivos, mas os
comportamentais de cada participante e suas conseqüências podem funcionar como
eventos ambientais que estabelecem a ocasião para as ações de outros envolvidos e/
ou mantêm essas ações (Hovell, Wahlgren, & Russos, 1997).
Por que uma “análise de metacontingências na escola ínctusiva”? Porque per­
mite uma análise de diferentes classes de operantes, emitidas por diferentes agentes,
que estão conectadas pela produção de uma mesma classe de conseqüências (produ­
to cultural): a inserção social e escolar da pessoa com necessidades especiais (PNE).
Mais que afetar o comportamento dos agentes individuais dessa prática, as conseqü­
ências das ações de tais agentes afetam o grupo, e não os operantes individuais de
cada agente. Entender como essa prática vem se instalando em diversos lugares do
mundo, e no Brasil em particular, e identificar os possíveis agentes sociais envofvidos
constitui um passo importante nessa análise.

Breve histórico do m ovim ento pela inclusão de portadores de ne­


cessidades educacionais especiais
Pode-se identificar a origem da escola inclusiva nos movimentos em prol dos
direitos humanos das décadas de 40 e 50, com o surgimento de movimentos em prol
dos direitos humanos, seguidos de perto pelos movimentos pela integração do porta­
dor de deficiências na sociedade (a partir do final da década de 70), que culminaram,
nas décadas de 80 e 90, na produção de vários documentos internacionais com diretrizes
de ações para os países promoverem a inclusão do PNE {Documento do Ano Internaci­
onal do Portador de Deficiência, Declaração de Salamanca, etc).
A produção de resoluções e de ações concrefas pela comunidade internacional
exerceu pressão para que o Brasil e outros países tomassem a iniciativa de implementar
medidas decisórias e práticas no sentido de viabilizar a inclusão de PNEs nas escolas.
O esquema apresentado na Figura 1 representa algumas dessas relações. Inicialmen­
te, as ações emitidas pelo Governo Federal consistiram na elaboração de legislação
específica para a garantia legal de acesso da PNE ao ensino público regular, o estabe­
lecimento de políticas públicas que permitissem as mudanças necessárias para ajus­

268 Andréia Schmidf, Deisy Q. de Souza


tar física e tecnicamente as escolas que receberiam essa população de alunos e. a
designação de orçamento espccifico para a viabilização de tais políticas.
Na hipótese dessas ações se concretizarem, algumas consequências especi­
ficas poderiam resultar para o próprio governo (íinhas tracejadas na parte inferioi da
Figura 1):
- Redução dos gastos com a cducação - a manutenção de serviços segregados
de educação especial (escolas especiais. por exemplo), consome recursos adicionais
substanciais, enquanto a inclusão de PNEs no ensino regular poderia se beneficiar da
estrutura já existente, com as adições que se fizerem necessárias;

Figura 1. Representação esquemática das relações de controle envolvidas no estabe­


lecimento de políticas públicas e legislação pertinente para a implantação dc um siste­
ma escolar inclusivo.

Sobre Comportamento e Cognição 269


- Reconhecimento da comunidade internacional aos esforços do gover
sileiro para concretizar políticas inclusivas, o que conferiria ao país maior credibilidade
junto a agências internacionais.
A longo prazo, porém, todas essas ações teriam conseqüências mais gerais
sobre a sociedade como um iodo (tinha cheia da parte inferir da Figura 1) e que poderi­
am ser resumidas sob o rótulo de “concretização da inclusão de PNEs nas escolas".
Assim, na análise do processo de transformação das escolas no país, uma
ação do Governo Federal tem especial importância pelas conseqüências produzidas.
Ao elaborar uma legislação específica para regularas ações inclusivas, o poder legislativo
designou uma série de grupos ou agentes (direta e indiretamente) como responsáveis
pela implementação de ações coordenadas que deveriam resultar na inclusão escolar
de PNEs. Os três conjuntos de leis mais importantes nesse sentido são a Constituição
Federai de 1988, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação de 1996, e a Política de
Educação Especial de 1994. Nesse grupo de leis, estão descritas, de forma direta ou
indireta, como se verá na análise a seguir, uma série de ações que diferentes agentes
devem desempenhar para concretizar a educação inclusiva. A Figura 2 apresenta uma
representação esquemática desses agentes e de suas respectivas ações.
Como se pode observar na Figura 2, a partir do conjunto de leis elaboradas
pelas instâncias federais (círculo central) é possível identificar pelo menos quatro agen­
tes que deveriam emitir ações diretamente ligadas às mudanças necessárias para a
implantação de um sistema educacional inclusivo (Governos estadual e municipal,
secretarias de educação, diretores e orientadores pedagógicos de escolas e professo­
res), e dois agentes que, de forma indireta, deveriam contribuir substancialmente no
processo gera! (instituições formadoras de educadores e técnicos, e a comunidade
científica da área de Educação Especial).
Os governos estadual e municipal seriam responsáveis por regular o ingresso
de alunos com necessidades especiais nas escoias, prover os recursos para a ade­
quação dos espaços dessas instituições para receber o alunado e capacitar tecnica­
mente os recursos humanos diretamente ligados à educação sob sua responsabilida­
de (por exemplo, oferecendo cursos a professores, diretores e técnicos para que estes
possam complementar sua formação básica e, assim, trabalhar de forma mais ade­
quada com as PNEs).
As secretarias de educação estaduais e municipais, por sua vez, deveriam
regulamentar e fiscalizar a abertura de vagas nas escolas, acompanhar o trabalho dos
profissionais e fornecer apoio técnico-pedagógico aos professores, orientadores e
diretores, quando isso se fizesse necessário,
No âmbito da escola, diretores e orientadores deveriam levantar as necessida­
des de adequação física e técnica de seus estabelecimentos de ensino (comunicando
tais necessidades para as secretarias de educação e solicitando providências) e orientar/
fiscalizar o trabalho dos professores junto aos alunos com necessidades especiais ma­
triculados; por sua vez, os professores, seriam responsáveis pelo trabalho direto em sala
de aula, conduzindo o processo de ensino/aprendizagem de todos os alunos, seguindo
as diretrizes do que deveria ser um ensino inclusivo, que atendesse às necessidades de
todos os alunos, independente de terem ou não necessidades especiais.
Para que as ações desses agentes pudessem se efetivar, principalmente no
âmbito do trabalho direto de ensino, as ações de dois outros agentes seriam de funda­
mental importância, ainda que de forma indireta. As instituições formadoras, em nível de
graduação e pós-graduação, deveriam rever seus currículos e adequá-los visando de-

270 Andréia Schmidt, Deisy Ç . de Souza


Figura 2. Representação esquemática das ações a serem desempenhadas por
diferentes agentes de acordo com as determinações da Legislação Federal Brasileira.

Sobre Comportamento e Cognição 271


senvolver adequados repertórios de ensino nos futuros profissionais da educação, de
maneira que eles estivessem preparados para desempenhar suas funções de avalia­
ção e planejamento de condições de ensino, segundo as diretrizes da escola inclusiva.
Também seria função dessas instituições colocarem-se a serviço da educação conti­
nuada dos que já atuam como professores (Capeilini & Mendes, 2004).. As ações das
instituições formadoras, por sua vez, deveriam ser subsidiadas pelas ações da comu­
nidade científica, responsável por produzir conhecimentos (conceituais e metodológicos)
na área de Educação Especial e, assim, aiim entar as mudanças necessárias nas
universidades e instituições técnicas de ensino médio.
Em uma outra esfera, um agente importante a ser considerado é a família da
pessoa com necessidades especiais. As ações dessas famílias não são determinadas
pela legislação vigente (por isso esse agente não consta na Figura 2), mas são influenci­
adas pelas novas possibilidades legais que se abrem. Por exemplo, a lei não determina
que a família seja obrigada a matricular a criança com necessidades especiais na escola
regular, mas possibilita que isso ocorra, caso os pais escolham esse tipo de educação
escolar para o filho. Ao proclamar a educação regular como um direito de todos, inclusive
das PNEs, a legislação abre aos pais a oportunidade de acompanhamento e fiscalização
das condições da escola e do trabalho específico dos professores e, também, de reivin­
dicação de condições condizentes com as necessidades de seus filhos .
Uma breve análise das co n tin g ê n cia s e n volvida s na rede de relaçõ es
esquematizada na Figura 2 mostra que as classes de ações de cada um desses
agentes, controladas pela legislação pertinente, gerariam classes de conseqüências
próprias que contribuiriam para sua manutenção e diferenciação ou por sua deteriora­
ção e mesmo por seu desaparecimento; por outro lado, também gerariam condições e
conseqüências para comportamentos de outros agentes.
As ações dos governos teriam como conseqüências próprias gastos financei­
ros mais elevados (com a contratação de pessoal capacitado a executar as determina­
ções legais ou com a oferta de cursos de capacitação aos profissionais do serviço
público envolvidos nas ações, por exemplo), mas também um eventual reconhecimento
da comunidade internacional e das pessoas beneficiadas (resultando, talvez, em votos
em épocas de eleições). As ações das secretarias de educação de Estados e Municípi­
os teriam como conseqüência o deslocam ento de funcionários para serviços de
planejamento de ações e fiscalização dos trabalhos nas escolas, acarretando, talvez,
dificuldades com pessoal técnico especializado; por outro lado, essas mesmas ações
teriam como conseqüência o cumprimento das funções das secretarias, designadas
pelas determinações legais dos órgãos legisladores, Diretores e orientadores pedagó­
gicos das escolas, no desempenho de suas ações, teriam um custo de resposta alto
para sua capacitação (não necessariamente em termos financeiros) e teriam que agre­
gar funções adicionais àquelas já desempenhadas. Por outro lado, o desempenho de
suas ações teria também como conseqüência o atendimento de demandas legais
advindas de suas chefias (com conseqüente reconhecimento por isso) e atendimento
de demandas da comunidade. Já as ações dos educadores teriam como conseqüên-
cia um alto custo de resposta proveniente de investimentos em sua formação e na
mudança de seu modo de trabalhar (reformulação de procedimentos de ensino e de
avaliação em sala de aula). A longo prazo, porém, as ações dos educadores poderiam
resultar não só no reconhecimento de seu trabalho por suas chefias e pelos pais de
alunos, mas na solução de problemas práticos encontrados em sala de aula com os
alunos, aumentando a eficiência de suas ações. As ações da comunidade cientifica
implicariam no aporte de (já escassos) recursos financeiros e humanos para a produ-

272 Andréia Schmidt, Deisy Cv. dc Souza


ção de conhecimentos relevantes para subsidiai as instituições formadoras e as práti­
cas inclusivas. Também gerariam um aumento da produção intelectual na área, e o
conseqüente cumprimento de seu papel junto à comunidade em geral e, em especial,
junto às instituições formadoras. As ações dessas instituições, por sua vez, teriam
como conseqüências mudanças profundas em suas propostas curriculares e nos es­
forços para implementá-las. Ao mesmo tempo, as mudanças estruturais implementadas
resultariam na formação de profissionais mais bem qualificados e preparados para
assumir suas funções junto ás PNEs (não só docentes, mas todas as categorias p ro
fissionais com algum grau de responsabilidade e de atuação que afete a vida das
pessoas).
Nessa análise verifica-se que, em cada esfora especifica, existem relações de
contingência particulares que podem favorecer ou não a emissão das ações pelos
agentes designados pela legislação. No entanto, é o entrelaçamento dessas contin­
gências particulares, próprias das ações dos diferentes agentes, que resulta em urri
produto geral aqui denominado de ‘ escola inclusiva' ou ‘inclusão da pessoa com ne­
cessidades especiais” no ambiente escolar', como mostra a representação esquemática
da Figura 3.

Os agentes sociais e suas ações na realidade escolar


Governo Federal, Estadual e Municipal
As agências governamentais são responsáveis pela criação de leis que regu­
lem o ingresso da PNE na escola e peio repasse de verbas para que esses alunos
possam ser atendidos integralmente (investimentos em formação continuada para pro­
fissionais da Educação, em reformas estruturais nas escolas, na aquisição de material
didático, entre outros). Observa-se que há um número considerável de leis que garan­
tem à criança e ao adolescente com necessidades especiais o acesso à escolarização
regular, em todos os níveis governamentais. No entanto, não basta garantir legalmente
o ingresso dessas pessoas às escolas; é necessário o repasse de verbas para a
adequação física e de recursos humanos para garantir o real acesso desse alunado à
educação de qualidade. Analísando-se o total de gastos do Governo Federal com Edu­
cação Especial entre os anos de 2000 e 2004 (INEP/MEC) observa-se que em 2000
foram gastos 43 milhões de reais com a Educação Especial, enquanto em 2004, foram
gastos 41 milhões. Durante esse periodo, o registro de menor investimento na área de
Educação Especial ocorreu no ano de 2001, quando foram gastos 32 milhões de reais
com a Educação Especial. Nos anos seguintes observa-se um aumento graduai de
gastos nessa área, mas em 2004 o Governo Federal ainda não tinha conseguido atingir
o nível de gastos realizados em 2000. Não se pretende nesse artigo discutir se o
montante investido pelo Governo è ou não suficiente para suprir as necessidades da
área. Porém, a simples análise dos números mostra que a educação Especial não è
uma área prioritária de investimentos para o Governo Federal, já que o nível de gastos,
em 5 anos, manteve-se praticamente estável. Supõe-se que em nível estadual e muni­
cipal o mesmo quadro se repita.

Secretarias de Educação
Responsáveis pelo controle, abertura e preenchimento de vagas nas escolas
por alunos com necessidades especiais, os únicos dados a que se tem acesso sobre
as ações das secretarias municipais e estaduais de educação são aqueles referentes ao
‘ Este artigo trata espedfican lente darndusáo escolar, embora a indusão plena requeira ações em todas as esferas da vidasodal

Sobre Comportamento e Cognífào 273


Figura 3. Representação esquemática dos diferentes agentes envolvidos na produção
de contingências entrelaçadas que resultariam em um produto cultural final denomina­
do “Escola Inclusiva”.

número de matriculas de alunos com necessidades especiais nas escolas públicas


brasileiras. Dados do Inep/MEC mostram que entre 2002 e 2005 as matriculas de alunos
na modalidade Educação Especial (tanto nas escolas regulares quanto nas escolas
especiais) aumentou de aproximadamente 338 para 378 mil. Apesar do incremento ob­
servado no número de matrículas nessa modalidade de ensino, se forem analisados os
dados de 2004 e 2005, observa-se que o aumento no número de matriculas foi de 1,8%
(de 371 para 378 mil matrículas na modalidade educação especiaf), enquanto que, no
mesmo período, o incremento de matriculas na Educação Infantil foi de 4,4%.
O número crescente de matrículas de pessoas com necessidades especiais

274 Andreia Schmídi, Deisy Ç . de Souza


nas escolas demonstra que as Secretarias de Educação têm cumprido, ao menos
parcialmente, seu papel de favorecer a abertura de vagas nas escoías públicas para
PNEs. No entanto, a função de supervisionar o trabalho realizado pelos profissionais da
educação, bem como o de promover modificações na estrutura física das escolas ainda
não ocorre de maneira efetiva. Em parte, as secretarias não podem determinar mudan­
ças estruturais nas escolas e nem provê-las de todos os materiais didáticos necessá­
rios ao atendimento de PNEs porque, para isso, dependem de dinheiro liberado pelo
poder público (Governo Federal, Estadual e Municipal). A análise do item anterior mostra
que esse repasse de verbas para a Educação Especial, ao menos no que se refere ao
Governo Federal, tem se mantido relativamente estável ao longo dos últimos cinco
anos. isso pode significar que o aumento de matrículas de PNEs nas escolas regulares
aumenta a necessidade de investimentos estruturais e de capacitação profissional,
mas que esse aumento não tem sido acompanhado por equivalente aumento de ver­
bas para investimento.

Diretores, orientadores, coordenadores


As ações de diretores e de orientadores pedagógicos estão diretamente vincu­
ladas ao monitoramento e orientação do trabalho de educadores e à detecção de ne­
cessidades da escola, tanto em termos de estrutura física e pedagógica, quanto em
relação ao preparo dos demais profissionais para atuar em salas de aula. Não existem
dados disponíveis sobre a ocorrência ou não de tais ações. Ainda assim, deve-se
reconhecer que muitas dessas ações estão estreitamente vinculadas ás ações de
outras agências. Por exemplo, o diretor de uma escola pode detcctar a necessidade de
reformas estruturais na escola, porém essas mudanças só ocorrerão pelas ações das
secretarias de educação, que destinam verbas provenientes do orçamento do governo
e determinam a realização das reformas necessárias. Da mesma forma, diretores e
orientadores podem solicitar cursos de capacitação para professores e demais profis­
sionais da escola a fim de melhor prepara-los para o trabalho. No entanto, a realização
desses cursos também depende de deliberações de instâncias superiores à escola.
Por outro lado, também é importante destacar que o trabalho de monitoramento e orien­
tação, aparentem ente uma ação que depende exclusiva m en te dos d iretore s e
orientadores, pode ser prejudicado em função de motivos que estão além deles própri­
os. Imagine-se a situação em que um orientador verifica a inadequação do trabalho de
um professor em sala de aula: a melhoria do trabalho desse profissional dependeria de
orientações adequadas, mas, para isso, o próprio orientador deveria ter suficiente pre­
paro técnico para auxiliar o professor nas mudanças didáticas necessárias. Como será
visto nos próximos dois itens, a formação dos orientadores pedagógicos apresenta as
mesmas deficiências da formação dos professores, fazendo com que esse profissio­
nal não se encontre, de modo geral, em situação mais privilegiada que o professor, em
termos de preparo técnico, para a concretização de um ensino efetivo e que seja, de fato,
inclusivo. As ações desses agentes, portanto, parecem mais limitadas do que as de
quaisquer outros aqui apresentados.

Comunidade científica, instituições de pesquisa


A pesquisa na área de E ducação Especial tem papel im portante para a
implementação do processo de inclusão escolar da PNE, especialmente em dois as­
pectos. Primeiro, subsidiando decisões políticas e diretrizes de ação para a efetivação
do processo. Segundo, validando empiricamente procedimentos que possam benefici­
ar diretamente a aprendizagem da PNE, auxiliando no aprimoramento dos sistemas

Sobre Comportamento e Cognição 275


educacionais existentes (Nunes Sobrinho & Naujorks, 2001) e fornecendo subsídios
para que as universidades possam capacitar melhor os futuros educadores. As institui­
ções brasileiras têm dado mostras inequívocas de comprometimento das questões
relativas à educação pessoas com necessidades especiais: a partir do final da década
de 70 o programa de pós-graduação em Educação Especial da UFSCar praticamente
inaugurou um nova área de pesquisa no país (de Souza, 1998) e vários outros progra­
mas na área de educação implementaram áreas de concentração e ou linhas de pes­
quisa em educação especial. Ainda assim, apesar dos avanços alcançados em termos
de conhecimento cientifico produzido e da qualificação de pesquisadores, a produção
cientifica nacional encontra-se aquém da dimensão de problemas que aguardam por
investigação científica. O extenso trabalho de caracterização da produção científica em
Educação Especial no país empreitado por Nunes, Ferreira, Glat e Mendes (1999) mos­
trou lacunas importantes: produção relativamente baixa em rolação às necessidades
da área, predominantemente concentrada nos cursos de pós-graduação stricto sensu,
sob a forma de dissertações e teses (o que limita o acesso ao conhecimento produzido
pelos agentes interessados), sobretudo utilizando métodos descritivos de investiga­
ção, em sua maioria sobre deficiência mental, com poucos estudos de interface com
outras disciplinas (fundamentais para o avanço técnico-científico da área) e baixa pro­
dução sobre os profissionais que atuam diretamente na área (em especial sobre o
professor). Essas lacunas comprometem o pape! desempenhado peia comunidade
científica junto aos demais agentes do processo inclusivo, ou seja, governos e comuni­
dade escolar que, direta ou indiretamente, poderiam se beneficiar dos conhecimentos
produzidos. Embora o quadro tenha evoluído substancialmente nos últimos dez anos,
muitas das lacunas apontadas em 1999 (Nunes et al.) continuam a demandar os esfor­
ços da comunidade científica.

Instituições formadoras
As universidades, a par com a contribuição científica e, com base nela, deveri­
am desempenhar um papel fundamental nos processos de formação de profissionais
para atuar na linha de frente do processo de inclusão. Esse papei foi bem descrito já na
Política de Educação Especial (Brasil/MEC, 1994), que indica como meta a implantação
dc programas de formação e especialização de recursos humanos na área de Educa­
ção Especial, bem como a inclusão de disciplinas ou itens em disciplinas do currículo,
além de estágios nas grades curriculares dos cursos de formação profissional, em
especial nos de licenciatura, mas não só, considerando-se que todas as classes de
profissionais formados nas universidades deveriam se familiarizar com as importantes
questões da diversidade na sociedade brasileira.
Passados 12 anos desse documento, uma rápida consulta via internet às gra­
des curriculares dos cursos de Pedagogia de algumas universidades públicas brasilei­
ras (30 universidades federais e duas universidades estaduais paulistas) mostra que
as determinações do documento oficial foram insuficientes. Das 32 universidades con­
sultadas, 19 disponibilizavam a grade curricular do curso de Pedagogia em seu site.
Analisando os currículos dessas universidades foi possível observar que 11 ofereciam
uma ou duas disciplinas relacionadas à Educação Especial em caráter obrigatório, em
geral semestrais e com títulos como ‘'Fundamentos de Educação Especial" ou “Introdu­
ção à Educação Especial". Cinco universidades listavam uma ou duas disciplinas
optativas ou eletivas na área, sendo que três dessas universidades apenas ofereciam
disciplinas nessa modalidade, não havendo, pois, qualquer matéria obrigatória sobre
Educação Especial durante o curso. Apenas uma universidade oferecia oportunidade

276 A ndréia Schmidt, Deisy Ç . de Souza


de estágio específico na área, além das disciplinas obrigatórias ou eletivas, e urna das
universidades oferecia disciplinas específicas de Educação Especial apenas em Cur
so de Especialização (pós-graduação lato sensu). Das 19 universidades com cursos de
pedagogia, quatro não ofereciam qualquer disciplina que, pelo menos pelos títulos,
sugerissem algum foco em Educação Especial ou em Educação Inclusiva, sugerindo
que, se estes conteúdos são trabalhados durante o curso de Pedagogia, o sáo no
contexto de disciplinas mais amplas. Uma universidade consultada ofcrocc um curso
específico de graduação em Educação Especial.
Esses dados são limitados, pois referem-se a uma consulta rápida a apenas
algumas universidades públicas brasileiras, mas fornecem algumas indicações im ­
portantes. Por exemplo, encontrou-se nos currículos de grande parte dos cursos de
Pedagogia consultados um número reduzido de disciplinas especificas na área de
Educação Especial, que dão ênfase a aspectos teóricos da área (fundam entos ou
introdução a conteúdos da área) e poucas oportunidades de atuação prática, bem como
uma baixa oferta de estágios supervisionados que seriam fundamentais para desen­
volver um repertório suficiente para que os professores em formação fossem capazes
de atender adequadamente na sala de aula pessoas com necessidades especiais. Tal
situação resulta em muitos dos problemas práticos apontados por professores, como
descrito no item a seguir. Portanto, apesar de uma extensa literatura que aponta diretrizes
de mudanças importantes nos cursos de formação de professores para a educação
inclusiva (p. ex. Baumel, 2003; Freitas, 2004; Nunes Sobrinho & Reis, 2004, dentre
muitos outros), não se observam ações efetivas por parte das instituições formadoras
no sentido de garantir uma qualificação profissional dos futuros professores que aten­
da às mudanças de várias ordens requeridas para uma "escola inclusiva". É possível
que esta situação reflita os “problemas de identidade” enfrentados atualmente pelo
curso de Pedagogia (Lima, 2004).

Professores
De acordo com Oliveira (2004), a formação de professores em Educação Espe­
cial tem sido historicamente dissociada da formação dos educadores em geral. En­
quanto os professores formados nos cursos de Pedagogia aprendiam conceitos e
noções amplas de ensino em educação infantil, séries iniciais e ensino fundamental,
os professores advindos de formação específica em Educação Especial se tornavam
"especializados” em tipos de deficiência; deficiência mental, auditiva, visual etc. Embora
de fato possa ser necessário dominar Braille ou lingua de sinais para ensinar a uma
parcela da população com necessidades especiais, a literatura na área (e.g., Wang,
Reynolds, & Walberg., 1995} tem enfatizado que o mais importante é o domínio de
procedimentos de ensino eficazes e, sobretudo, de atenção mais individualizada, com
respeito ao ritmo de aprendizagem de cada aluno (o que vale, inclusive, para o ensino
de leitura em Braille e para a aprendizagem da língua de sinais). Porém, com as espe­
cializações difundiu-se a idéia de que ensinar alunos com necessidades especiais
requer bases pedagógicas e processos didáticos m uito diferenciados. Tal idéia se
difundiu a tal ponto que os professores da rede regular de ensino que não possuem
h a b ilita ç ã o e s p e c ífic a em E du caçã o E sp e cia l co n s id e ra m -s e c o m p le ta m e n te
desqualificados para trabalhar com tal alunado. Tais crenças apóiam-se, obviamente,
tam bém em dificuldades reais encontradas nas experiências desses profissionais
com PNEs sem que tenham qualquer fundam entação conceituai que lhes apóie o
desenvolvimento de estratégias específicas para efetuar as adaptações curriculares
necessárias. Beraldo (1999) constatou, em uma pesquisa que analisou as concep­

Sobre Comportamento c Cognição 277


ções de professores de escola pública sobre a inserção de alunos tidos como deficien­
tes mentais em classes regulares, que todos afirmaram não estar preparados para o
trabalho com essa clientela, independente de terem ou não formação superior, o que
replica achados similares aos relatados para outros países (Foriin, 1998).. Além de não
fazerem adaptações (do currículo, metodológicas ou de avaliação) para os alunos com
deficiência mental, grande parte dos professores declarou que receber bem tais alunos
e dar-lhes carinho era a forma encontrada de fazer “adaptações" no ensino.
Somarrvse a isso algumas dificuldades de ordem prática, como a exigência do
cumprimento de currículos-padrão, determinados por instâncias superiores regulado­
ras do ensino (Ministério da Educação, por exemplo); as dificuldades em fazer adapta­
ções curriculares necessárias para as pessoas com necessidades especiais, fazendo
com que os professores baseiem suas ações mais em conhecimentos do senso co­
mum e da observação de outros professores do que em conhecimentos adquiridos
durante a formação; uma grande ênfase para as dificuldades do aluno com necessida­
des especiais e para a necessidade de instituições especiais para educação destes
indivíduos, em detrimento de um foco mais voltado para as suas potencialidades e sua
individualidade, dentre outras (Ferreira, 2004).

Conclusões
A modificação do sistema escolar como um todo para a concretização de um
projeto inclusivo de fato depende, pois, de classes de ações por parte de diferentes
agentes sociais. Como é possível verificar nas análises até aqui apresentadas, o cum­
primento apenas parcial dessas ações por parte dos agentes tem como conseqüência
imediata o insucesso do processo; a longo prazo, esse insucesso pode contribuir
inadvertidamente para reforçar regras socialmente estabelecidas sobre a impossibili­
dade de inserção social e escolar dessas pessoas, com prometendo ainda mais o
processo como um todo. Infelizmente, porém, como a interação entre professor e aluno
com NE é a contingência mais evidente do processo, há uma tendência geral a
responsabilizá-lo por possíveis fracassos, sem se levar em conta todas as demais
contingências envolvidas nos demais níveis e setores.
O comportamento de ensinar do professor ê modelado por suas experiências
em sala de aula. Como sua formação é deficiente para o desenvolvimento de um reper­
tório de análise de contingências de ensino em geral, e para o trabalho didático dirigido
às especificidades de cada aluno (com ou sem necessidades especiais), observa-se
que as conseqüências desse trabalho em classes freqüentadas também por alunos
com necessidades especiais tendem a punir o comportamento de ensinar. O baixo
rendimento do aluno (segundo critérios que são adotados em relação a todos os alu­
nos, independente de suas peculiaridades), os resultados apenas discretos decorren­
tes das variações do comportamento de ensinar, aliados às críticas de outros profissi­
onais da escola, que não adotam medidas que possam realmente melhorar a qualida­
de do ensino, são fatores que podem colaborar para que o educador adote ações de
esquiva do trabalho inclusivo. Essas ações podem ir desde a recusa de ministrar aulas
em classes com alunos com necessidades especiais (sob diversas alegações), até
criticas pesadas às medidas inclusivas determinadas por instâncias superiores. Ao se
esquivar do trabalho com alunos com necessidades especiais, o professor evita ser
responsabilizado pelo eventual “fracasso" escolar dessas pessoas.
Essa situação poderia ser modificada pela oferta de capacitação em serviço
aos professores, com diferentes modalidades de atividades, incluindo a parceria e a
consultoria colaborativa (Capellini & Mendes, 2004; Ferreira et al., 2007). Lauand (2000)

278 Andreia Sehmidt, Deisy Q . de Souza


realizou uma pesquisa na qual, além de planejar, implantar e avaliar medidas no ambi­
ente físico para a inclusão em classes especidis de alunos com deficiências múltiplas
associadas a disfunções motoras, implementou um programa de capacitação para os
professores dessas classes. A conclusão do estudo foi que a adaptação fisica do am­
biente, aüada à capacitação dos professoras e á assessoria de especialistas que
possam auxiliar esse professor em suas dificuldades práticas são elementos neces­
sários para a garantia de uma educação de qualidade para alunos com necessidades
especiais. Um importante aspecto discutido por Lauand 2000 é que o professor que já
passou pela formação universitária se encontra em uma situação ainda rnais difícil,
pois suas oportunidades de qualificação dependem não mais de sua iniciativa pesso­
al. mas das oportunidades e permissões de seus empregadores (e, portanto, de ações
governamentais em aigum nível, pefo menos nas escolas públicas). Se tais ações não
ocorrem, existe uma outra dificuldade de ordem prática: caso o professor busque indi­
vidualmente recursos para auxiliar na sua formação, a disponibilidade de fontes de
consulta é restrita, pois não há profissionais que assessorem seu trabalho, e as fontes
bibliográficas concentram-se, em geral, em aspectos conceituais. O professor encontra
muitas dificuldades em transpor aquilo que iè (instruções sobre o trabalho com PNFs)
para a prática (as contingências cotidianas que vive), e essas tentativas frustradas
acabam por extinguir o comportamento de busca individual por capacitação. Diante
dessa situação, verifica-se que urna ampla história de punição, somada a uma forma­
ção precária, a um conjunto de regras distorcidas a respeito das capacidades dos
PNEs e a um alto custo de resposta inicial para fazer análises funcionais e adaptações
curriculares aos alunos, favorece um desempenho insuficiente do professor no seu
trabalho. Esta situação, por sua vez, favorece a manutenção da atribuição generalizada
(embora infundada) de responsabilidade pelo insucesso da implantação de um siste­
ma de ensino inclusivo ao professor.
Diversas pesquisas (Faleiros, 2001; Lauand, 2000; Reis, 1996) mostraram
que o conhecimento teórico, aliado ao acompanhamento direto da aplicação prática do
conhecimento (modelagem de habilidades de ensino) é a forma mais eficaz de capaci­
tar o professor para o trabalho com pessoas com necessidades especiais. No entanto,
essas ações deveriam ser desempenhadas por outros agentes. Como tais agentes
(secretarias de educação, governos e instituições form adoras) não experim entam
diretamente as conseqüências de deixar de emitir tais ações, o controle social desses
agentes é insuficiente para as mudanças que se fazem necessárias.
O sucesso da inclusão escoiar de pessoas com necessidades especiais de­
pende de mudanças profundas nas contingências atualmente em vigor no processo e
do cumprimento efetivo, pelos agentes destacados, das ações descritas pela legisla­
ção da área. Enquanto essas ações não forem implementadas de fato, será impossível
concretizar o projeto de inclusão tão calorosamente debatido. Uma análise mais pro­
funda das metacontingências envolvidas nas relações entre as ações desses agentes
poderia servir como um referencial para os necessários ajustes desse processo.

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Sobre Comporta mento e Cognição 281


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4
Capítulo 23
Utilizando o sistema de economia de
fichas no ensino infantil: um
relato de experiência

Luriano de So usa C u n h a 1
A n g élica B o h rer Ferrira
C laudem i dos Sanlos
Elisângela A d ria n o Q om es M arch cti
Fnibra Teixeira R ibeiro

U W

A Análise do Comportamento é a ciência que se embasa nos pressupostos


filosóficos do Behaviorismo Radical de Skinner e nos conhecimentos advindos da
Análise Experimental do Comportamento.
Na década de 60 a Análise do Comportamento teve sua transposição para a
aplicação prática (Dougher & Hayes, 1999). Em outras palavras, deixou de se preocu­
par apenas com o estudo do comportamento individual e começou a atender também
demandas sociais. Esses trabalhos tratavam de uma Análise Aplicada do Comporta­
mento (AAC).
Segundo Baer, Wolf & Risley (1968) a AAC é o processo pelo qual se aplicam
os princípios do comportamento em um ambiente social e se avalia se foi o procedi­
mento utilizado que produziu as mudanças observadas. Seu objetivo é buscar variáveis
que efetivamente melhorem comportamentos-alvo, ou seja, aqueles socialmente rele­
vantes para a sociedade em que o trabalho está sendo executado.
Não se deve confundir a AAC com a Análise Clínica do Comportamento (ACC),
pois diferentemente, a última tem como setting o contexto clínico e como objetivo lidar
com o desenvolvimento, manutenção e tratamento de transtornos clínicos, enquanto
que a AAC trabalha com problemas específicos e em contextos com maior controle de
variáveis e com um manejo direto das contingências (Dougher & Hayes, 1999).
Entre os trabalhos desenvolvidos, a aplicação de conceitos operantes em divi­
sões psiquiátricas, desenvolvido por Ayllon & Azrin, possibilitou a descrição pela primei­
ra vez, em 1968: de um procedim ento cham ado de econom ia de fichas ( “ token
econom y), que foi e é uma técnica muito útil no trabalho aplicado.

' E-mail para correspondência: luda'iogjnha@ rH.ccfr.hr

Sobre Comportamento e Cognifão 283


Urna economia de fichas é um sistema de reforçamento no qual se adminis­
tram fichas como reforço imediato, que são respaldadas posteriormente permitindo
que se troquem por reforços mais valiosos (Patterson, 1996).
De acordo com Tomanari (2000). o método de economia de fichas possibilita a
formação de cadeias comportamentais e tem como um de seus objetivos, instalar e
manter comportamentos desejáveis, além de poder modificar e até mesmo reduzir a
emissão de muitas classes de comportamentos inadequados. Este método geralmen­
te é implantado através de reforçamento positivo e pode ser aplicado em grande escala.
O sistema dc economia de fichas foi desenvolvido para suprir uma necessida­
de encontrada pelos analistas do comportamento em utilizarem os princípios operantes
em grande escala, além de poder alterar muitas classes dc comportamentos através
de um único reforçador condicionado (Patterson, 1996).
Este estudo tem como objetivo relatar a aplicação de um sistema de economia
de fichas, pretendendo mostrar a eficácia da técnica e incentivar trabalhos aplicados cm
Análise Aplicada do Comportamento no Brasif. Apresentar-se-á abaixo variáveis que
motivaram a escolha da técnica de economia de fichas.

Análise Funcional do Contexto Escolar


Os comportamentos-alvo de intervenções, neste relato, foram relacionados às
demandas identificadas no decorrer da experiência de estágio básico em psicologia
realizado na UMEI - LUiZ AUGUSTO AGUIRRE DA SILVA no município de Vila Velha / ES,
partindo das queixas feitas pelos professores dessa unidade de ensino, na qual as
crianças dos jardins l, II e Pré vinham apresentando comportamentos inadequados
para o contexto escolar, tais como: bater e morder os colegas, não prestar atenção na
aula, não colaborar com os colegas e com a professora, desorganização, não participar
das atividades em sala de aula, serem agressivos uns com os outros, fazer ‘'bagunça"
dentro da sala de aula. atrapalhar os colegas que estão fazendo alguma atividade.
Depois de apresentado o problema, solicitou-se ao interventor que alterasse
tais queixas. Surgiu então a necessidade de reduzir a freqüência desses comporta­
mentos emitidos pelos alunos.
Questionando as tentativas anteriores de solucionar o problema, ievantou-se
que foram utilizadas repreensões verbais e até castigos (ficar fora de atividades), porém
ambas sem êxito.
Sidman (1989/1995)1 alertava para a questão do controle aversivo, “punição c
privação levam a agressão. (...) como punidores não apenas nos estabelecemos como
alguém de quem se foge ou esquiva, mas também nos descobrimos recebendo paga­
mento em espécie, objetos de contra-ataque induzido por punição” (p. 221-222).
Era claro que através do controle aversivo, não se conseguiria sucesso na modi­
ficação destes comportamentos-alvo, pois este já havia sido tentado, além de sor um
método que deve ser evitado devido às conseqüências colaterais por ele produzidas.
Para mudar o comportamento, sem utilizar-se de controle aversivo ou punição, Skinner
(1969/1984) discorre que “é preciso mostrar que uma determinada vantagem é contin­
gente ao comportamento, de modo a alterar a sua probabilidade de ocorrência" (p. 307).
Uma segunda preocupação estava ligada â indisponibilidade de se dispor de
diversas recompensas para cada um dos comportamentos-alvo a serem alterados, o
que criou a necessidade de tomar todos os comportamentos-alvo pertencentes a uma
mesma unidade funcional, mantida por uma mesma conseqüência (Skinner, 1953/2003).

284 Ludano dc S. Cunha, Angélica B. Ferrira, Claudemi dos Santos, Flisângela A. Q. Marchcli
F-nilza T. Ribeiro
Como não seria possível, ou pelo menos viável, prom over a lte raçõ es
comportamentais através de intervenções individualizadas, devido ao grande número
de participantes, optou-se por manejar contingências ambientais que pudessem alte­
rar os comportamentos-alvo dos participantes de modo mais amplo.
Uma outra preocupação na escolha da intervenção advinda da necessidade de
se mostrar que as mudanças ocorridas eram decorrentes do sistema implantado. Para
tal, optou-se por utilizar um delineamento ABA, como maneira de verificar o desempe­
nho dos mesmos sujeitos diante de condições diferentes. A comparação entre as con­
dições de linha de base (A) e de intervenção (B) dá ao investigador maior confiança ern
afirmar que a modificação do desempenho é produto da intervenção.
Sabendo-se que um tempo maior seria gasto ao sc optar por modelar as res­
postas esperadas, decidiu-se pela utilização de instruções, em outras palavras, descri­
ções de contingências que tornariam as respostas mais rapidamente prováveis. De
acordo com Catania (1999), "as instruções podem modificar o comportamento do ouvin­
te em situações em que as conseqüências naturais são, por si mesmas, ineficientes ou
são oficazes somente a iongo prazo '’ (p. 275).
Todas as variáveis levantadas acima fizeram com que o sistema do economia
de fichas parecesse à intervenção mais apropriada para este cenário.
Com o reforça positivo disponibílizou-se dois tipos de recom pensas: as
“Estrelinhas dos alunos-modelo da semana", distribuídas semanalmente, no dia de
visita ao campo, como maneira de reforçar de maneira mais imediata os comportamen­
tos adequados emitidos pelos alunos. E um brinquedo, como recompensa para os
alunos que conseguissem manter a freqüência de emissão dos comportamentos ade­
quados ao longo da intervenção, sendo importante ressaltar que todos os alunos pode­
riam ser reforçados, como estratégia para evitar comportamentos de competição.

Método
Participantes:
O sistema de economia de fichas foi aplicado na Unidade Municipal de Ensino
Infantil (UMEI) Luiz Augusto Aguirre da Silva, localizada na cidade de Vila Velha - ES.
Participaram 111 alunos de seis (6) salas: Jardim I A (19 alunos), Jardim I C (17 alunos),
Jardim II A (16 alunos), Jardim II B (18 alunos), Jardim II D (22 alunos)e Pré A (19 alunos).

Procedimento:
Inicialmente, com a ajuda dos professores responsáveis por cada sala, foram
estipulados dez (10) comportamentos, cinco (5) adequados, que as crianças deveriam
emitir, e cinco (5) inadequados, que elas não deveriam emitir. Cada um destes compor­
tamentos, adequados e inadequados, seriam convertidos em pontos, que foram defini­
dos a partir das demandas apresentadas em uma entrevista inicial não-estruturada
com os professores, com a finalidade de identificar os comportamentos problemáticos
emitidos pelos aiunos com maior freqüência: prestar atenção quando a professora
explicar a atividade sem interromper, participar/realizar as atividades e tarefas propos­
tas em sala de aula, ser organizado/recolher o material ao final da aula (+1 ponto);
colaborar com os colegas que apresentassem dificuldades nas aulas e ser educado
ao solicitar ou fazer alguma coisa (+3 pontos); bagunçar ou interromper as explicações
com conversas e brincadeiras inadequadas, não participar das atividades propostas
pelas professoras, atrapalhar o andamento das aulas e das atividades e, ser desorga­
nizado (-1 ponto) e; ser agressivo ameaçando ou agredindo verbal ou fisicamente os
colegas ou a professora (-3 pontos).

Sobre Comportamento e Cognição 2 85


Após a definição dos comportamentos que iriam ser utilizados no sistema de
Economia de Fichas, estes deveriam ser observados peios professores de maneira
não sistemática, sem um registro diário de freqüência absoluta de emissão peios
aiunos. Semanalmente, os estagiários se reuniram individualmente com cada profes­
sor para registrar para cada aluno a pontuação da semana, que correspondia à soma
dos pontos computados peia emissão dos comportamentos selecionados, sendo que
os comportamentos considerados inadequados que correspondem a pontos negati­
vos iriam subtrair pontos pela emissão dos comportamentos adequados.
Foram confeccionados seis (6) quadros - sendo um para cada sala - que
correspondiam a um jogo de tabuleiro com dez (10) casas, que os alunos deveriam
percorrer. Para cada aluno foi confeccionado um peão {peça utilizada para a movimen­
tação no tabuleiro) contendo a sua foto para uma melhor visualização, tanto para as
crianças como para os estagiários.
Após a contabilidade dos resultados individuais, os estagiários da Psicologia
voltavam às salas para que fosse dado um feedback sobre os resultados aos alunos O
aluno que alcançasse nove (9) pontos, que no caso seria nota máxima, seria conside-
raao um aluno modelo, e a cada 5 pontos, poderia andar uma casa no jogo de tabuleiro
e receberia uma “estrelinha”, confeccionada pelos estagiários com o intuito de propor­
cionar um reforço imediato para os alunos, É importante ressaltar que os pontos para
que os alunos andassem uma casa eram cumulativos (somados a cada semana) e
que todos os alunos poderiam ser reforçados, medida tomada para evitar a ocorrência
de comportamentos de competição,
Quando algum aluno alcançasse a décima casa (alcançando o sucesso), rece­
beria um prêmio (brinquedos sortidos).
Durante o feedback semanal, ao entregar os resultados, os alunos eram sem­
pre lembrados sobre quais eram os comportamentos que deveriam ser emitidos, e
quais não deveriam, e eram parabenizados por terem alcançado o resultado esperado
pelo Sistema. Da mesma forma, os professores foram instruídos a avaliar durante a
semana os comportamentos dos alunos, sempre lembrando a eles quais comporta­
mentos deveriam (ou não) ser emitidos, estratégia adotada para que se produzisse
uma melhora da percepção do professor sobre os comportamentos dos alunos, au­
mentando a probabilidade de uma reação adequada do professor diante da emissão
desses comportamentos.

Estratégia de Análise de Dados:


Para a tabulação dos dados coletados, foi utilizada a estatística descritiva. Os
resultados obtidos com base nas informações passadas pelos professores foram pas­
sados semanalmente, durante a supervisão de estágio, para uma tabela, (confeccionada
para cada sala individualmente), na qual era calculada uma média de pontuação para
cada comportamento emitido pelos alunos e representada em dois histogramas, que
permitiam visualizar a evolução dos alunos separados por sala pela média de pontos
alcançados, e também pelo número de "alunos modelo a cada semana".

Resultados
A figura 1 apresenta a evolução do comportamento dos alunos representada
pela média de pontuação semanal por turma.
Os resultados mostram um aumento na pontuação média das turmas ao longo
do desenvolvimento do trabalho.

286 Luciano de S. Cunha, Angélica B. Fcrrira, Llaudemi dos Saníos, blisângela A . Q. Marcbdi,
Ertilza T. Ribeiro
B Se mana 1 □ Semana 2 Q Ôemarta 3 Qs«manâ4 06«m «rra5 0 Se mana € f l Semana 7

Figura 1 - Média de Portfuaçào Semanaf por turma.

Ao iniciar as intervenções na sala do jardim 1 A, encontrou-se certa dificuldade


em explicar de uma maneira geral como se dava o sistema de economia de fichas. No
entanto, a professora desta sala mostrou-se muito receptiva com o projeto. Após o
esclarecimento de duvidas sobre o funcionamento completo do sistema de economia
de fichas, a referida professora verbalizou: “Depois que eu entendi o que deveria fazer, e
passei a fazer do jeito certo, o comportamento dos alunos passou a melhorar, isso da
certo mesmo (sic)”. Outro ponto a ser citado foi o interesse das crianças, que pode ser
ilustrado a partir de algumas frases: "tia eu me comportei bem (sic)', "olha eu fiz o dever
(sic)” ou “fulano ta fazendo bagunça (sic)”. Desta forma, as crianças também passaram
a discernir sobre o que elas deveriam ou não fazer.
A turma Jardim I A, que iniciou o trabalho com uma pontuação média de 4,8
pontos, apresentou ao final da intervenção uma pontuação média de 8,3 pontos, reve­
lando um aumento de 3,5 pontos na média total da turma.
Desde o início do trabalho, a tuima Jardim i C não apresentou variações signi­
ficativas de comportamentos, obtendo uma média elevada nas pontuações semanais.
Esta turma iniciou o trabalho com uma pontuação média de 8,4 pontos, e apresentou ao
final da intervenção uma pontuação média de 9,0 pontos, revelando um aumento de 0,6
pontos na média total da turma.
A turma Jardim IIA iniciou o trabalho com uma pontuação média elevada, de 7,9
pontos, e também apresentou uma pontuação média de 9,0 pontos ao final da interven­
ção, revelando um aumento de 1,1 pontos na média total da turma. É importante ressal­
tar que nesta turma havia um aluno com diagnóstico de TDHA, e que na primeira e
segunda semana houve pouca colaboração dele. Foi sugerida uma atenção individua­
lizada para o mesmo, com o intuito de monitorar e dar feedback imediato para os seus
comportamentos. Após esse aluno receber a primeira "estrelinha”, foi registrado uma
grande mudança (melhora) em seu comportamento.
A turma Jardim II B, que iniciou o trabalho com uma pontuação média de 1,8
pontos, apresentou ao final da intervenção uma pontuação média de 7,2 pontos, reve­
lando um aumento considerável de 5,4 pontos na média total da turma. Esse aumento
considerável não só está relacionado ao efeito do reforço, mas também a monitoria
consistente (e contingente) da professora junto a essa turma.

Sobre Comportamento e Cognição 287


A adesão da turma ao projeto foi tão significativa que foi observado a ocorrência
de um comportamento pecuüar por parte dos alunos, que começaram a policiar seus
próprios comportamentos de maneira cooperativa.
A turma Jardim II D iniciou o trabalho com uma pontuação média de 1,2 pontos,
apresentando ao final da intervenção uma pontuação média de 9,0 pontos, revelando um
maior aumento na média total entre todas as turmas, 7,8 pontos. Percebeu-se que o enten­
dimento sobre as regras do sistema de economia de fichas foi determinante para se
alc a n ç a r bons resultados. A professora desta turma agradeceu e frisou que obteve grandes
meihorias em sua sala de aula e também um melhor relacionamento com seus alunos.
A turma Pré A, que iniciou o trabalho com uma pontuação média de 3,1 pontos,
apresentou ao fina! da intervenção uma pontuação média de 8,9 pontos, revelando um
aumento de 6,8 pontos na média total da turma. Pode se dizer que este “avanço” está
relacionado a uma qualidade já presente nos comportamentos da turma, não sendo
necessário uma modelagem intensa para se chegar a um repertório esperado.
A figura 2 apresenta a freqüência de ‘ alunos modelo da semana’: por turma ao
longo do desenvolvimento do trabalho.

[ B Semana 1 □ Semana 2 DSem ana3 D Semana 4 □ Semana 5 □S em an a 6 ■ Semana 7

Figura 2 - Freqüência de nomeação de “Alunos Modelo da Semana"

Os resultados mostram um aumento na freqüência de nomeação de “alunos


modelo da semana” ao longo do desenvolvimento do trabafho.
A turma Jardim I A, que iniciou o trabalho com quatro (4) "alunos modelo", apre­
sentou ao final da intervenção treze (13) “alunos modelo". Pode-se inferir que esse
aumento está relacionado a um interesse da professora, que relatou fazer questão de
aplicar o sistema de economia de fichas de forma correta, assim como dos alunos, por
prestarem atenção quando ihes eram comunicadas as normas do jogo, e por se esfor­
çarem para alcançar o êxito no jogo. Muitos dos alunos afirmavam que iriam ganhar o
jogo, e se mostravam muito felizes quando avançavam as casas, chegando cada vez
mais perto do objetivo fina! do jogo, que era ganhar um prêmio.

2 88 Luciano tie S. Cuni>a, Angélica B. Ferríra, Claudemi dos Santos. Elísln^ela A . Ç. M archcti,
Eniba T. Ribeiro
A turma Jardim I C iniciou o trabalho com doze (12) ' alunos modelo” e apresen­
tou ao final da intervenção quinze (15) “alunos modelo". Na quinta semana, a baixii
freqüência de “alunos modelo" pode ser explicada por urna greve de ônibus, que redu
ziu o número de alunos presentes em sala de aula.
A turma Jardim íl A também iniciou o trabalho com doze (12) "alunos modelo” e
apresentou dezesseis (16) "alunos modelo” ao tina! da intervenção.
A turma Jardim II B, que iniciou o trabalho sem nenhum (zero) “alunos modelo”,
revelou um aumento considerável no número de “alunos modelo” , doze (12).
Esse aumento é justificado pela forma como a turma assimilou em sua rotina
o sistema de economia de fichas. O projeto aplicado possibilitou identificar algumas
dificuldades apresentadas por aiguns alunos que não eram percebidas até então pela
professora. Foi sugerido que aiguns alunos tivessem um acompanhamento mais indi­
vidualizado, para minimizar essas dificuldades.
A turma Jardim II D que iniciou o trabalho com apenas um (1) “aiuno modelo”,
revelou o maior aumento no número de "alunos modelo” entre todas as turmas, tendo
ao final da intervenção vinte e dois (22) “alunos modelo”,
De uma forma geral, a turma colaborava com a professora, no entanto, quatro
crianças apresentavam dificuldades em se comportar da forma esperada, atrapalhan­
do em algum as ocasiões o desem penho dos colegas. Esses alunos receberam
feedback sobre a importância de melhorar seu comportamento para poder receber as
"estrelinhas". Outra observação foi que na primeira semana, apenas uma aluna rece­
beu a “estrelinha" de “aluno modelo", e que esta serviu de exemplo para os demais
alunos e principalmente para os quatros alunos que mais incomodavam a professora.
Também foi relatado pela professora que uma aluna que não finalizava os exercícios
que eram passados em sala de aula apresentou uma melhora e foi uma das alunas
que mais obtiveram “estrelinhas’’, após o inicio do trabalho, produzindo por parte da
professora admiração com o progresso da turma, que apresentou um aum ento no
rendimento nas atividades em sala de aula.
A turma Pré A, que também iniciou o trabalho sem nenhum (zero) “aluno modelo”,
apresentou um aumento considerável, finalizando a intervenção com (17) “alunos modelo".
Cabe relatar que nessa turma um dos alunos que era caracterizado pelo não
envolvimento com a turma e por apresentar comportamentos inadequados no início do
projeto, nas ultimas semanas, em uma de suas falas narrada pela professora, se mos­
trava totalmente envolvido com o projeto e com a turma: “Professora, eu não quero só
“estrelinha" aqui (na testa), mas eu quero lá também! (sic)”, se referindo ao quadro de
pontuação.

Considerações Finais

Os resultados apresentados ao longo da aplicação do projeto ilustram o objetivo


da utilização desse sistema, no caso, a melhora do rendimento. Constata-se que o
mesmo foi satisfatoriam ente alcançado, o que também possibilita com preender al­
guns princípios da técnica, bem como a análise de alguns pontos importantes que
influenciaram nos resultados.
Podem ser destacados, como pontos negativos, a recusa de alguns professo­
res pela participação no trabalho e a rotatividade dos mesmos entre as turmas, o que

Sobre Comportamento c Cognição 289


produzia uma monitoria inconsistente. Outro ponto a ser ressaltado, foi o pouco tempo
disponível semanalmente para um acompanhamento pela equipe de estagiários, pois
um trabalho com crianças exige um contato diário.
É im portante destacar que o sistema fez uso de um reforçador arbitrário
("estrelinhas', pontuações, brinquedos) para se chegar aos reforçadores naturais (me­
lhora no rendimento escolar e da qualidade ensino/aprendizagem). No inicio do traba­
lho, durante a exposição das regras às professoras, houve um questionamento sobre o
sistema como um método chantagioso, e também uma indagação sobre a continuida­
de da emissão de comportamentos adequados pelos alunos sem esses reforçadores
arbitrários. Esse questionamento não se confirmou, pois ao final do projeto o reforçador
arbitrário foi gradualmente substituído peios reforçadores naturais que ao longo do
projeto foram inseridos de forma imperceptível como objetivo final. Para isso. foi suge­
rido um período de acompanhamento pós-intervenção, para verificar se a frequência de
emissão de comportamentos adequados pelos alunos e o reforçamento destes com­
portamentos pelos professores se manteriam.
Nesse contexto, o objetivo geral era que a retirada gradual dos reforçadores
arbitrários ("estrelinha”, pontuações e prêrnios) permitisse a identificação de reforçadores
naturais, que seriam (ou pelo menos deveriam ser) os verdadeiros responsáveis pela
manutenção dos comportamentos adequados dos alunos e dos professores.
O sistema de economia de fichas na educação infantil permite não só a melho­
ra no desempenho do aluno, mas também garante uma percepção mais apurada do
professor sobre os comportamentos dos seus alunos, aumento a probabilidade de
uma reação mais adequada e contingente frente a esses comportamentos.
‘Ensinar é simplesmente arranjar contingências de reforçamento" (Skinner,
(1968/1972).

Referências

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Journal ot A pplied Behavior Analysis, 1 ,1 , 91-97.

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Traa.). Porto Alegre: Artmed Editora. (Trabalho original publicado em 1998).

Dougher, M. J e Hayes, S. C. (1999). Clinical Behavior Analysis. In: M. J. Dougher (Ed.). Clinical
Behavior Analysis Cap. 1, (pp. 11-25). Reno: Context Press

Patterson, R. L. (1996). A Economia de Fichas. Em' V, E. Caballo (Org.) Manual de Técnicas de


Terapia e M odificação do Comportamento. (Trad. M. D. Claudino). Cap. 15, (pp. 297-313). São
Paulo: Santos.

Sidman, M. (1995). Coerção e suas implicações (M. A. Anderry, & M. T. Sério, Trad.). Campinas:
Editoral Psy II. (Trabalho original publicado em 1989).

Skinner, B.F. (1968). The Technology o f Teaching. New York: Appleton-Century-Crofts.

Skinner, B. F. (1984). Contingências do reforço: uma análise teórica, (R. Moreno, Trad ), Coleção
"Os pensadores" São Paulo, Abril Cultural, (Trabalho original publicado em 1969).

Skinner, B. F. (2003). Ciência e Comportamento Humano (J. C. Todorov & R. Azzi, Trad.) 11a ed. São
Paulo: Martins Fontes, 2003 (Trabalho Original Publicado em 1953).

Tomanari, G. V. (2000). Reforçamento condicionado. Revista Brasileira dc Terapia Comportamental


e Cognitiva. 2, 1, 61-77.

290 Luciano de S. Cunha, Angélica E, Fcnira, Ciaudemi dos Santos, Fiisângela A . Q . Marcheti,
1
tn il/a . Ribeiro
Capítulo 24
Alguns conceitos envolvidos na análise e
compreensão dos fenômenos
culturais*

V ívica Lé Sénéchal M ach ad o


U nb
João Cláudio Todorov
Unb

O estudo dos chamados fenômenos culturais tem despertado, cada vez mais,
o interesse e a preocupação dos Analistas do Comportamento em desenvolver instru­
mentos de análise e intervenção para lidar com esse tipo de fenômeno. Esse capítulo
tem como objetivo apresentar uma visão geral dos conceitos de metacontingência e
macrocontingência, conceitos estes de grande relevância para a análise e interpreta­
ção dos fenômenos culturais sob a perspectiva da Análise do Comportamento. E, apre­
sentar, também, uma visão geral das principais operações de controle do comporta­
mento envolvidas na aprendizagem dos comportamentos sociais constituintes de prá­
ticas culturais. Mudanças no repertório social de motoristas e pedestres no estabeleci­
mento da prática cultural do respeito á faixa de pedestre na cidade de Brasília/DF serão
descritas com o propósito de exemplificar a alteração de comportamentos socialmente
relevantes (Lé Sénéchal-Machado, 2007).

Cultura e Práticas Sociais


De acordo com Skinner (1953/2000, 1969/1984, 1971/1983), o ambiente social
é aquilo que chamamos de cultura. Assim que uma criança nasce, ela começa a interagir
com as contingências ambientais às quais é exposta, que são, a maior parte delas,
forne cid as por outras pessoas. A cultura se refere, então, às con ting ên cias de
reforçam ento social que geram e mantêm o com portam ento dos m embros de uma
cultura, cuja existência vai além do período de vida dos membros do grupo. Normal­
mente, essas contingências são formuladas por meio de regras e leis que constituem
os costumes e tradições, habituais de um povo: o modo como se vestem, comem,

Sobre Comportamento e Cognifão


como criam os filhos, como se governam, e assim por diante. Ou seja, cultura é um
conjunto particular de condições no qual um grande número de pessoas se desenvolve
e vive.
Glenn (2004) se refere à cultura como um conjunto de padrões de comporta­
mentos aprendidos, transmitidos socialmente, bem como os produtos de tais compor­
tamentos (objetos, tecnologias, organizações, etc); e às práticas culturais como pa­
drões sim ilares dc conteúdo comportamental, usualmente resultados de similarida­
des nos ambientes. Essa similaridade no conteúdo operante do repertório de várias
pessoas, ao longo da passagem do tempo, é o que garante nomear esse fenômeno
como uma prática culturaí. As práticas culturais envolvem, então, consistência no com­
portamento de muitos indivíduos. Variações de práticas culturais estão sempre ocor­
rendo, já que estas envolvem o comportamento de gerações sucessivas de indivíduos
que vivem em ambientes comportam entais um pouco diferentes dos indivíduos da
geração anterior (Glenn, 1988).

Macrocontingência e Metacontingência
O comportamento humano é o produto conjunto de contingências de sobrevi­
vência, responsáveis pela seíeção natural das espécies - seleção filogenética de
contingências de reforçamento, responsáveis pelos repertórios adquiridos por seus
membros durante o seu período de vida - seleção ontogenética - e de contingências
especiais mantidas por um ambiente cultural evoluído - seleção cultural. Desse modo,
o indivíduo deve ser compreendido nos níveis biológico, individual e cultural, não sendo
possível explicar o comportamento sem levar em consideração a relação entre os três
(Skinner, 1981).
É possível observar em vários trabalhos de Skinner (1948/1978, 1953/2000,
1957/1978, 1961, 1969/1984, 1971/1983, 1972/1982, 1981, 1986), além do empenho
na compreensão do comportamento individual, uma grande preocupação com as ques­
tões culturais, correspondentes ao terceiro nível de seleção. De acordo com esse autor,
ainda, a cultura evolui quando suas práticas contribuem para o sucesso do grupo pra­
ticante em resolver seus problemas, E ressalta que è o efeito sobre o grupo, e não as
conseqüências reforçadoras para os membros individuais, que é responsável pela
evolução e seleção de uma cultura.
Dessa forma, o grande desafio no estudo dos fenômenos sociais é que sua
configuração não se limita às contingências que descrevem o comportamento operante
de um único indivíduo, implicando a utilização de uma outra unidade de análise para a
compreensão de tais fenômenos (Andery, Micheletto & Sério, 2005).
Glenn (1986) apresenta o conceito de metacontingência diferenciando-o do
conceito de contingência de reforçamento, com o intuito de fazer uma distinção entre a
seleção do comportamento operante em indivíduos e a seleção de práticas culturais.
Ela afirma que as contingências comportamentais dão conta da evolução e manuten­
ção das u n id a d e s co m p o rta m e n ta is - seleçã o o n to g e n é tic a - e que as
m etacontingências dão conta da evolução e manutenção das unidades culturais -
seleção cultural. As metacontingências, então, descrevem relações funcionais no nivei
cultural - envolvem relações de contingência entre contingências comportamentais
entrelaçadas e um resultado comum a longo prazo.
Contingências entrelaçadas são mais do que a soma de contingências indivi­
duais, por produzirem resultados que não são possíveis de serem obtidos pelos indiví­
duos se comportando isoladamente. Dessa forma, as contingências comportamentais

292 Vívíca Lé Sénéchal Machado, João Cláudio Todorov


entrelaçadas são contingências sociais nas quais o comportamento e os produtos
comportamentais de cada membro funcionam como evento ambiental com o qual o
comportamento dos outros indivíduos interage. O comportamento de cada pessoa pos­
sui um duplo papel: de ação e de ambiente para a ação de outros. E o comportamento
verbal cumpre o papel de fazer a ligação entre as contingências atuais e as conseqüên­
cias a longo prazo, através do estabelecimento dc regras e fornecimento de reforçamento
social para o seu cumprimento (Glenn, 1988, 1989, 1991).
O con ceito de m e ta co n tin g ê n cia c la rifica que os pro cesso s c u ltu ra l e
comportamental ocorrem em diferentes níveis de organização, embora apresentem pro­
cessos de seleção análogos. Nenhum processo comportamental novo está envolvido.
Na seleção cultural, os resultados culturais não selecionam o comportamento dos indiví­
duos que fazem parte do entrelaçamento de contingências - eles selecionam as contin­
gências comportamentais entrelaçadas. Desse modo, o resultado cultural tem a mesma
relação com as contingências entrelaçadas que as conseqüências comportamentais
têm com o operante. Assim, a evolução cultural constitui-se não de atos individuais repe­
tidos, mas sim da repetição de contingências comportamentais entrelaçadas que funcio­
nam como uma unidade integrada, produzindo resultados que afetam a probabilidade
futura da recorrência do entrelaçamento (Glenn, 1988, 1991, 2004).
Porém, a formulação do conceito de metacontingência, como relações funcio­
nais entre contingências comportamentais entrelaçadas e um resultado comum a lon­
go prazo, sofreu algumas m odificações ao longo dos anos, permitindo um m elhor
entendimento da relação entre as contingências comportamentais entrelaçadas, o pro­
duto gerado desse entrelaçamento e o ambiente selecionador.
Glenn (2004), Glenn & Mallot (2004) e Mallot & Glenn (2006) destacam a impor­
tância da distinção entre o produto e a conseqüência de um comportamento, apesar de,
às vezes, eles poderem ser o mesmo. Assim como o comportamento operante, que
envolve um produto comportamental, as contingências comportamentais entrelaçadas
também produzem um produto, que é um produto agregado resultado de recorrentes
operantes inter-relacionados de várias pessoas. Assim como o comportamento operante
é seguido por uma conseqüência, responsável pela recorrência ou não desse operante,
as c o n tin g ê n cia s co m p o rta m e n ta is en tre la çada s, e seu produto, tam bé m são
selecionados por uma conseqüência final - efeito no ambiente externo - responsável
pela recorrência ou não desse entrelaçamento. O ambiente externo é o recipiente do
produto agregado e funciona com o o am biente selecionador das contingências
entrelaçadas, ou seja, esse entrelaçamento não se repetirá mais caso não haja de­
manda por seus produtos,
O conceito de metacontingência, então, melhor explicitado, descreve:

R e la çõ e s c o n tin g e n te s e n tre re c o rre n te s c o n tin g ê n c ia s c o m p o rta m e n ta is


entrelaçadas, que tem um produto agregado, e conseqüências funcionais basea­
das na natureza desse produto. A repetição das contingências com portamentais
entrelaçadas de duas ou mais pessoas constitui uma linhagem cu ltu ra l sendo
selecionada. (M allot & Glenn, 2006, p. 38).

É possível distinguir duas fontes de produtos agregados - produtos culturais.


Uma fonte é a interação organizada e recorrente de múltiplos indivíduos, dos quais o com­
portamento inter-relacionado resulta em um produto agregado. Nesse caso, o produto
requer não só o comportamento de todos os indivíduos, mas também as contingências
entrelaçadas recorrentes que mantêm a inter-relação entre os comportamentos de diferen­

Sobre Comportamento e Cognição 293


tes pessoas. Esse é o produto agregado envolvido em uma relação de metacontingência,
mantido por uma linhagem cultural que é selecionada. Outra fonte se dá através da soma
dos produtos de pessoas se comportando individualmente e recorrentemente. Esse é o
produto agregado envolvido em uma relação de macrocontingência. Macrocontingência,
então, diz dá relação entre comportamentos recorrentes, e funcionalmente independentes,
de vários indivíduos, e um produto agregado resultante da som a dos produtos
comportamentais individuais. Ou seja, é a relação entre linhagens operantes, que são
repetições de um comportamonto operante como resultado de contingências de seleção
comportamentais, e seu produto agregado (Glenn, 2004; Maliot & Glenn, 2006). Desse
modo, na macrocontingência há apenas uma única contingência sendo repetida milhares
de vezes, por diferentes pessoas. A repetição sucessiva de uma mesma contingência por
muitas pessoas caracteriza uma determinada prática cultural, que produz um efeito cumu­
lativo a longo prazo, como o resuitado do somatório dos efeitos do comportamento de cada
um, Nesse sentido, uma característica importante da macrocontingência é que seu efeito
cumulativo é aditivo. Quanto mais difundida a prática, maior o efeito cumulativo.
Na macrocontingência não há seleção cultural. O produto cultural não seleciona
o comportamento individual recorrente das pessoas. O produto não funciona como uma
conseqüência que mantém o comportamento que constitui a prática. As únicas contin­
gências de seleção envolvidas na macrocontingência são contingências operantes. A
mudança cultural é uma mudança de comportamento de vários indivíduos, como resul­
tado de contingências comportamentais de seleção operando no comportamento de
cada indivíduo. Nesse caso. para produzir alguma intervenção cultural sobre um efeito
cumulativo é preciso encontrar maneiras de alterar, individualmente, o maior número
possível do mesmo comportamento dos vários participantes.
Dessa m a n e ira , in te rv e n ç õ e s em uma m e ta c o n tin g ê n c ia e em uma
macrocontingência são diferentes. Intervenções culturais para alterar o produto agrega­
do em macrocontingèncias têm como alvo somente mudanças comportamentais ~
linhagens operantes especificas, Intervenções culturais em uma metacontingência têm
como alvo de interesse contingências comportamentais recorrentes que produzem um
produto agregado - linhagens culturais — e que resultam em inputs - efeitos no ambi­
ente extemo - que mantêm essas recorrências (Maliot & Glenn, 2006).
Mattaini (1995, 1996b) argumenta que para que uma determinada prática cultu­
ral seja alterada, em função de efeitos que podem afetar a viabilidade de uma cultura,
são necessárias intervenções planejadas sobre os com portam entos dos membros
constituintes da prática. O planejamento de intervenções culturais deve sempre buscar
identificar as contingências operantes dos comportamentos dos indivíduos, estejam
eles se comportando de forma inter-relacionada ou não. O comportamento do indivíduo
é a base a partir da qual as práticas culturais emergem em uma cultura, Os processos
pelos quais as práticas são esta belecid as e m antidas consistem das relações
comportamentais básicas, já que não há nenhum processo comportamental novo. Por
isso se faz necessário identificar os princípios comportamentais subjacentes à apren­
dizagem destes comportamentos.
Dessa maneira, as intervenções culturais são designadas para alterar condi­
ções geradas pelo comportamento, inter-relacionado ou não, de muitos indivíduos.
Quando estes comportamentos geram um produto agregado que afeta outras pesso­
as, ou a própria sobrevivência de uma cultura, este produto se torna um problema
social, podendo ser perigoso e causar prejuízos à saúde, segurança ou felicidade de
um grande número de pessoas. Assim, nessas situações, uma intervenção cultural se
faz necessária e justificável.

294 Vívica Lé Scnéclial Machado, João Cláudio Todorov


0 Estabelecimento da Prática Cultural do Respeito à Faixa de Pe­
destre e a Aprendizagem de Comportamentos Sociais
Brasília/DF, patrimônio da humanidade, nos anos de 1995 e 1996, era conside
rada uma das cidades brasileiras mais violentas nu trânsito, não só pelo grande núme­
ro de acidentes c vítimas fatais, mas também, pela violência dos desastres e pelo
grande índice de pedestres atropelados. Os limites médios de velocidade dc 60Km/h
nas vias urbanas e de 80Km/h nas rodovias, eram descumpridos pela grande maioria
dos motoristas que, constantemente, desrespeitavam as leis de trânsito A velocidade
média atingia os 90Km/h nas Vias Urbanas. O número de atropelamentos nesses anos
representava, respectivamente, 49,8% e 47,3% do número total de acidentes, com mor­
te, em tudo Distrito Federal. Números assustadores, que revelavam a situação grave
em que se encontrava a relação pedestre - veículo, em Brasilia-DF, uma cidade planejada
para a rápida e fácil circulação de carros, com pistas largas e longas, que favoreciam o
abuso da velocidade e dificultavam a travessia das ruas pelos pedestres.
Apesar da lei que garante ao pedestre a preferência de passagem sobre a faixa
de pedestre estar prevista no Código de Trânsito Brasileiro, desde 1966, pode-se afir­
mar que, praticamente, ela nunca foi cumprida por motoristas e pedestres brasileiros.
Porém, na cidade de Brasília-DF, desde o ano de 1997, tem sido possível observar o
respeito à faixa de pedestres. Esse cumprimento da lei foi possível a partir de uma
mobilização social que promoveu a união entre a mídia, o governo e a sociedade civií
brasiliense em prol de um mesmo objetivo: a Paz no Trânsito.
Essa articulação social, denominada Campanha pela Paz no Trânsito, foi inici­
ada em 1996 peio maior jorna! da mídia escrita de Brasília-DF - O Correio Braziliense -
e logo contou com o forte apoio e adesão do governo e da sociedade brasiliense. Já
nesse mesmo ano, essa campanha reduziu significativamente a velocidade dos carros
nas mas e o número de vitimas fatais de acidentes de trânsito. No ano seguinte, em
1997, foi proposta e aprovada uma nova Campanha pelo Respeito à Faixa de Pedestre.
Esta, por sua vez, permitiu o estabelecimento dessa prática cultural na cidade, reduzin­
do o número de atropelamentos fatais.
Alguns dos processos comportamentais. envolvidos na aprendizagem e modi­
ficação de grande parte do repertório comportamental de motoristas e pedestres de
Brasília/DF, e que promoveram a constituição da prática cultura! do respeito à faixa na
cidade, estão relacionados à modelação, a exposição direta às contingências de refor­
ço e ao pape! das regras no controle do comportamento (Lé Sénéchal-Machado, 2007).

• Modelação
Muitas vezes, comportar-se como o outro se comporta, como no caso da imita­
ção, tem grande probabilidade de ser reforçador, seja por obter reforçadores positivos
ou por evitar conseqüências aversivas. A aprendizagem por observação é baseada na
observação do comportamento de um outro organismo. A pessoa que primeiro produz o
comportamento é chamada de modelo. Nesse sentido, a imitação é uma reiação de
controle de estímulos. A atividade de um organismo tem a função, como estímulo, de
evocar uma topografia similar, ou de relação de controle similar (repetição das contin­
gências que mantém esses com portamentos), no comportamento de um segundo
organismo (Baldwin & Baldwin, 1986; Catania, 1999; Glenn, 2003).
A imitação é crucial para o desenvolvimento de muitas práticas culturais sofis­
ticadas, pois, através dela, muitas atividades culturais específicas são passadas de
uma geração para a outra. Atos de imitação, como instâncias primárias de um repertó-

1 295
Sobre Comportamento e C.ogniçãc
rio, constituem-se como uma boa maneira para variantes comportamentais aparece­
rem, sendo depois selecionados pelas contingências operantes. Por isso, um elemen­
to necessário para a origem de culturas é a replicação de comportamentos operantes
através de repertórios sucessivos, nos quais os comportamentos dos anteriores funci­
onam como parte do ambiente comportamental para os aprendizes posteriores. (Glenn,
2003; Mattaini, 1996a).
Durante o período de campanhas educativas sobre o respeito à faixa de pedes­
tres, em Brasília/DF, a Polícia Militar ficou encarregada de instruir a população sobre a
mudança que iria ocorrer. Guardas foram colocados nas principais faixas de pedestre do
Plano Piloto com o intuito de orientar motoristas e pedestres. Os carros eram parados
antes da faixa de pedestres para que estes reaiizassem a travessia segura. Os guardas,
nesse momento, além de fornecerem regras, serviam como modelo para o comporta­
mento dos pedestres, demonstrando a maneira correta e segura de realizar a travessia
sobre a faixa, que consistia em: aproximar da faixa, parar, olhar para ambos os lados,
aguardar os veículos pararem para, só então, atravessarem. De forma decorrente, quan­
do os motoristas paravam antes da faixa, serviam como modelo para o comportamento
de outros motoristas que se aproximavam da faixa. Tais atos de imitação promoveram as
primeiras ocorrências da mudança do repertório de motoristas e pedestres sendo, pos­
teriormente, selecionadas pelas contingências operantes (descritas mais adiante).
Os gnjpos de teatro da Policia Militar e do Detran também foram muito impor­
tantes no fornecimento de modelos comportamentais. Ao realizarem diversas apresen­
tações nas ruas e em escolas, os atores serviam como modelo para o comportamento
dos motoristas de parar antes da faixa, e para os pedestres, de como realizar a traves­
sia de forma correta. Dessa forma, os atores encenavam a nova relação de controle
entre o comportamento de motoristas e pedestres, permitindo ao público, a aprendiza­
gem por observação.
Após o fim do período educativo, a lei começou a vigorar e a mídia divulgou o
grande número de motoristas multados: “ Motoristas começam a ser punidos: no pri­
meiro dia de aplicação da lei, 396 foram multados no Plano Piloto por desrespeito à
faixa" (Jornal de Brasília). Essas notícias serviram para que os 'leitores motoristas’
aprendessem com outros motoristas que foram multados e que, por sua vez, serviram
como modelo do comportamento punido por não respeitar a faixa. Dessa forma, a
divulgação dessas notícias, além de ressaltar a regra do respeito á faixa, serviu, tam­
bém, como um modelo eficiente que afetava muitas pessoas ao mesmo tempo, livran-
do-as de uma exposição direta às contingências aversivas.

• Exposição Direta às Contingências


Uma outra forma de aprendizagem social que caracteriza uma porção substan­
cial do comportamento humano se dá através da modelagem do comportamento por
exposição direta às contingências de reforçamento: o organismo atua diretamente so­
bre o ambiente e obtém as conseqüências diretas dessa ação. Apesar desse tipo de
comportamento se assemelhar, muitas vezes, topograficamente, ao comportamento
governado por regras, as variáveis controladoras são diferentes e por isso os compor­
tamentos são diferentes. Quando o comportamento é apenas produto da exposição
direta às contingências, não se observa o que é chamado de seguir um plano ou uma
regra.
A formulação das interações entre um organismo e o seu ambiente deve sem­
pre especificar três aspectos: a ocasião na qual ocorre a resposta, a própria resposta e

296 Vívica Lé Sénéchal Machado, João Cláudio Todorov


as conseqüências produzidas por ela. As relações entre elas constituem as contingênci­
as de reforço. Portanto, a descrição do comportamento operante envolve a relação entre a
resposta emitida e a sua conseqüência, e a relação entre a resposta emitida e os estímu­
los antecedentes presentes na ocasião em que a resposta foi reforçada. As continyóno
as de reforço envolvem comportamento social quando a emissão e/ou o reforçamento do
comportamento de um organismo depende, ao menos parcialmente, do comportamento
de um outro organismo (Sério, Andery, Gioia & Micheletto, 2002; De-Farias, 2005).
No caso da relação entre a resposta emitida e os estímulos antecedentes,
quando estes se tornam efetivos como sinais, geralmente, são chamados de estímu­
los discriminativos, e as operações que envolvem estes sinais, de operações de con­
trolo de estímulos. O estabelecimento do controle de estímulos antecedentes sobre
uma determinada resposta é produzido por uma história especifica de reforçamento, na
qual a resposta foi seguida de reforço na presença de certos estímulos e não foi segui­
da de reforço na presença de outros estímulos (Michael, 1980, 1982). Por isso, quando
uma resposta é seguida por reforçadores em um contexto, mas não em outros, essas
pistas do contexto, associadas com o reforço, se tomam estímulos discriminativos.
Durante a campanha pelo respeito à faixa de pedestre, a mídia divulgou, de
forma intensa, diversas noticias sobre a ‘nova’ lei. As manchetes das noticias podem ter
servido como estímulos discriminativos para alguns comportamentos verbais como o
textual e o intraverbal (e.g. comentar com outras pessoas sobre o conteúdo das notíci­
as, avisar sobre os riscos no trânsito, conversar sobre as leis de trânsito, etc). Estes
comportamentos, possivelmente, se tomaram mais prováveis de ocorrer depois quo as
pessoas fiam as notícias, produzindo consequências reforçadoras como estar informa­
do dos perigos no trânsito, se informar sobre as leis, ser agradecido por alertar outros,
evitar multas, entre outras.
No caso da relação entre a resposta emitida e suas conseqüências produzi­
das, dois tipos de contingência podem ser descritos: as contingências de reforço e as
contingências de punição. Nas contingências de reforço, as consequências que se
seguem ao comportamento aumentam a probabilidade deste mesmo voltar a ocorrer
sob circunstâncias semelhantes. Já no caso das contingências de punição, as conse­
qüências que se seguem ao comportamento diminuem a probabilidade deste voltar a
ocorrer. Há uma supressão do comportamento, muitas vezes apenas temporária.
De acordo com Sidman (1995), muitas vezes, as recompensas por agir fora da
lei são maiores do que agir de acordo com ela. Uma vez que as pessoas podem ganhar
mais dinheiro, poder, etc, sem ter que seguir as leis, então por que se submeter a elas?
Além disso, às vezes, o custo por agir de acordo com elas ê muito mais alto. Assim
parecia funcionar com relação à lei sobre a travessia na faixa. Nenhuma conseqüência
aversiva se seguia ao comportamento do motorista de não parar na faixa. E, possivel­
mente, o comportamento de não parar na faixa e seguir em frente era reforçado com
economia de tempo, fluxo no tráfego, etc. Reforçadores fortes, mas ilegais, que destro-
em o comportamento adequado, ficando acima da lei.
Nesse caso, para que houvesse o cumprimento da lei foi necessária a atuação
da Polícia Militar do DF, com o planejamento da fiscalização. A aplicação de multas por
parte da Polícia e a divulgação dessas punições através da mídia, parecem ter dado
contribuições muito importantes no processo de conscientização, por parte dos moto­
ristas. Infelizmente, as raízes da consciência estão no controle coercitivo. A punição real
ou ameaçada ensina o significado do que é ruim. A punição e a tendência de repetir os
atos punidos passam a servir como sinais de aviso que são chamados de consciência,

Sobre Comportamento e Cognifão 297


gerando comportamentos de esquiva, rotulados de moralidade e civilização. Então, atri­
buísse à consciência os atos de esquiva que a punição, ou ameaça dela, gorou.
É o mundo externo que impõe às pessoas a consciência. São relações de
contingências reais do mundo, de relações entre condutas c consequências, que ge­
ram o comportamento adaptativo (no caso, o respeito à faixa) e também comportamen­
tos problemáticos. A consciência é um fenômeno socialmente construído por arranjos
de contingências de reforçamento, estabelecidos por uma comunidade verbal (Sidman,
1995; Skinner, 1957/1978, 1953/2000. 1974/1982).
Assim, além de todo o trabalho educativo da campanha pelo respeito á faixa, foi
preciso, tam bém , um planejam ento de contingências sociais que controlassem
diretamente o comportamento dos motoristas. A aplicação dc multas permitiu a exposi­
ção direta do comportamento dos motoristas às contingências anunciadas pelas re­
gras, o que colaborou muito com o processo de conscientização.
Porém, o Detran reconheceu, logo após o início da aplicação das punições,
que era necessário suspender as multas para completar as obras de engenharia. Essa
suspensão teve um lado positivo, na medida cm que diminuiu o carater aversivo da
nova prática e seus efeitos colaterais, como o contracontrole. Além disso, a retirada da
aplicação de multa, por um período, possibilitou o estabelecimento de um controle
social mais forte entre os próprios motoristas e pedestres, sem a interferência coerciti­
va do Estado. As consequências reforçadoras e aversivas, que passaram a ser
fornecidas para os motoristas, vinham do comportamento de outros motoristas e pe­
destres. Consequências reforçadoras, como as de ser agradecido e elogiado. E
consequências aversivas, como xinçjamentos e reclamações de pedestres e de outros
motoristas que respeitavam a faixa, podendo gerar constrangimento e vergonha social
nos motoristas desrespeitosos. A estimulação aversiva condicionada, gerada pelo mau
comportamento como resultado da punição, se associa com um padrão emocional
comumente chamado de vergonha. Motoristas e pedestres passaram não só a se
comportar apropriadamente às contingências, como também passaram a construir
regras necessárias para a comunidade como um todo. Como afirma Skinner (1969/
1984). a tomada de consciência é necessária para a construção de regras que gerem
comportamentos apropriados à certas circunstâncias.
Junto às contingências de reforço que descrevem como o ambiente controla os
organismos através de estímulos antecedentes e conseqüentes, é importante conside­
rar as variáveis motivacionais que podem alterar, momentaneamente, a função desses
estímulos. Skinner (1953/2000) discorre sobre as variáveis motivacionais denomina­
das privação, saciação e estimulação aversiva, distinguido-as de outros tipos de variá­
veis e re!acionando-as a conceitos tradicionais da psicologia como impulsos, desejos
e necessidades.
Michael (1993) denominou essas variáveis m otivacionais como operações
estabelecedoras, as quais definiu como uma operação ambiental que altera, momen­
taneamente, (1) a efetividade reforçadora de algum objeto, evento ou estímulo e (2) a
freqüência de ocorrência do comportamento que tem sido reforçado por aquele objeto,
evento ou estímulo. Esses dois efeitos são denominados, respectivamente, de efeito
estabelecedor do reforço e efeito evocativo.
Voltando ao caso de Brasífia/DF, algumas notícias divulgadas pela mídia du*
rante a campanha pelo respeito à faixa de pedestre podem ter funcionado como opera­
ções esta b e le ce d o ra s, s u g e rin d o um efe ito a lte ra d o r do v a lo r re fo rça d o r de
consequências como, por exemplo, parar o carro antes da faixa porque evitava levar

298 V ív ita Lc Sénechal Machado, João Cláudio Todorov


uma multa: 'Faixa de pedestre dará multa: em abril, m o to ris ta que não respeitar a fa ix a
vai pagar R$53,00” (Jornal de Brasília).

• Regras
As regras são estímulos especificadores de contingências. Desse modo, o
comportamento governado por regras pode ser considerado como o comportamento
sob controlo de estímulos verbais que especificam a contingência. As regras são estí­
mulos verbais que funcionam, muitas ve?es, como estímulos discriminativos com alt*
probabilidade do influenciar o comportamento do ouvinte, cm um conjunto de contin
gèncias de reforço (Baum, 1995; Glenn, 1987; Skinner, 1969/1984).
Em Brasilia/DF, as ações educativas promovidas pela Polícia M ilitar e pelo
Deiran, com suas campanhas educativas nas escolas e nas ruas, consistiram, basica­
mente, no fornecimento de regras para o comportamento de motoristas e pedestres,
que especificavam as novas formas de conduta a serem seguidas.
Alguns autores destacam a função das regras como ‘estímulos alteradores do
função’ uma vez que podem alterar a função de outros estímulos - discriminativos, neu
tros e reforçadores-descritos pela regra (Albuquerque, 2001; Mistr& Glenn, 1992; Sanabio
& Abreu-Rodrigues, 2002; Schlinger, 1993). Esses autores diferenciam, ainda, estímulos
discriminativos e regras, ao afirmarem que os efeitos destas últimas são atrasados e os
efeitos dos estímulos discriminativos são imediatos. O estimulo discriminativo evoca o
comportamento imediatamente, enquanto que os efeitos das regras, como estímulos
alteradores de função, são observados, freqüentemente, depois de um período de atraso.
Sendo assim, a regra não evoca o comportamento por ela descrito. O que evoca o com­
portamento é o aparecimento do estimulo descrito pela regra. O pnncipal efeito das re­
gras é alterar a função de outros estímulos. Por exemplo, o estímulo verbal "Quando os
hóspedes chegarem, prepare um café” altera o papel da chegada dos hóspedes, que
passa a ter funções evocativas sobre o comportamento de preparar c café. Nesse caso,
o estímulo verbal pode ser considerado como alterador da função.
Algumas notícias divulgadas durante o período do trabalho educativo da cam­
panha pelo respeito à faixa, anterior à aplicação de multas, foram identificadas como
regras funcionando como estímulos alteradores de função, para o comportamento do
motorista de parar antes da faixa de pedestre: “Novas regras para o trânsito: medidas
visam conscientizar motoristas em relação à faixa destinada ao pedestre, que será o
próximo alvo da campanha do GDF" (Correio Brazíliense).
É im portante ressa ltar que as no tícias não funcionam com o estím ulo s
discriminativos para comportamentos no trânsito. As noticias têm efeito evocativo so­
m en te nos exe m plos c ita d o s de c o n v e rs a r sob re as leis, etc. Os e stím u lo s
discrim inativos para os comportamentos que são relevantes no trânsito, como não
ultrapassar o limite de velocidade, obedecer à sinalização, entre outros, estão na pró­
pria situação de trânsito. Nesses casos, as notícias podem ter o papel de regras,
funcionando como estímulos que alteram a função de outros estímulos - discriminativos,
neutros ou reforçadores. Mas elas não evocam diretamente o comportamento. Os efei­
tos das regras, quando funcionam como estímulos alteradores de função, são atrasa­
dos. e os efeitos de estímulos discriminativos são imediatos.
Os estímulos discriminativos para o comportamento de respeito à faixa estão
na pró p ria situação de trânsito. As notícias parecem ter estabelecido a função
discriminativa de alguns estímulos tais como a própria faixa de pedestres, o pedestre
com a intenção de atravessar a rua, a placa de sinalização da faixa, e outros. Estes

Sobre Comportamento e Cognição 299


estímulos adquiriram funções discriminativas e evocativas como resultado das regras
noticiadas e passaram, então, a controlar de forma mais eficiente os comportamentos
de motoristas, pedestres e todos os outros envolvidos no dia-y-dia do trânsito, produ­
zindo consequências reforçadoras como nâo se envolver em acidentes, não atropelar
pedestres, entro outras.
Mailot (1988) argumenta que o comportamento governado por regras tem gran­
de importância dentro das contingências comportamentais dos indivíduos de uma cul­
tura, tendo um papel principal na evolução e manutenção dos padrões culturais. Em
geral, o comportamento governado por regras é aprendido mais rapidamente do que o
comportamento modelado pelas contingências. Por isso, este comportamento é crucia!
na aprendizagem de comportamentos envolvidos nas práticas culturais.
As regras possuem um papei muito importante na manutenção do comporta­
mento até que as conseqüências atrasadas objetivadas possam ser experimentadas.
O problema das conseqüências atrasadas é que estas não se constituem como contin­
gências que agem diretamente sobre o comportamento atual. As conseqüências atra­
sadas estão envolvidas em contingências que não agem diretamente sobre o compor-
tamento e como tais, apresentam suas dificuldades no controle do comportamento.
Tal relevância ficou evidenciada na campanha do estabelecimento do respeito
à faixa de pedestre, que fez um uso intensivo de regras que especificavam os novos
comportamento a serem seguidos por motoristas e pedestres, naquele presente mo­
mento, com o intuito de promover, a longo prazo uma melhor qualidade no trânsito de
Brasília/DF, preservando um grande número de vidas.
O comportamento verba) identificado como regra, então, tem um papel funda­
mental na ligação entre o comportamento e as conseqüências a longo prazo. Elas regem
as interações entre as pessoas organÍ2 adas em grupos e preenchem a lacuna entre os
objetivos a longo prazo e o comportamento que deve ocorrer, especificando regras de
conduta a serem seguidas. O reforçamento social fomece as conseqüências que man­
têm o comportamento sob controle de regras até o momento em que as conseqüências
a longo prazo possam ser distinguidas. Isso ocorre devido ao fato das mudanças dese­
jadas no comportamento acontecerem tão lentamente e tão distribuídas ao longo do
tempo, que a mediação social parece ser fundamental para que elas ocorram. Por isso,
quando mudanças são propostas è preciso um trabalho de determinação de regras
especificas, de providenciar conseqüências imediatas para a observação delas, e de
avaliação dessas regras e de suas conseqüências. Essa parece ser uma maneira de
tentar garantir que, quando especificadas, estas regras sejam aprendidas por todos e
afetem o comportamento de todos (Glenn, 1986; Todorov, 1987. 2005).
Portanto, o processo de aprendizagem de comportamentos sociais, assim
como o de com portam entos não sociais, depende do arranjo de contingências
ambientais que envolvem o estabelecimento de relações entre o comportamento dos
organismos e as conseqüências ambientais de tais ações.
Glenn (2003, 2004) chama atenção para o fato, jà abordado por Skinner (1953/
2000), de que a distinção entre eventos sociais e não sociais tem levado alguns autores
a fazer uma diferenciação entre aprendizado individual e aprendizado social, como en­
volvendo diferentes processos de aprendizagem. É dito que se requer uma disciplina
especial, como a ciência social, por causa dessa aparente ruptura. Mas essa distinção
confunde processo e conteúdo comportamentais. Todo aprendizado é individual no
sentido de que o locus da aprendizagem está na relação individual entre o organismo e
o ambiente. O caráter social ou não dos eventos ambientais é uma questão de conteú-

300 Vivica Lé Sénécbal Machado, João Cláudio Todorov


do e não do processo pelo qual o ambiente afeta o comportamento. Os processos
comportamentais são os mesmos, independente do ambiente selecionador do com
portamento ser social ou não.

O desafio de se empreender estudos sobre os fenômenos culturais.


Devido a pouca tradição da Análise do Comportamento em estudar o comporta­
mento de muitas pessoas ao mesmo tempo, ainda há que se aperfeiçoar o instrumen­
tal conceituai e metodológico para tais pesquisas. Grande parte da utilização dos con
ceitos de metacontingência e macrocontingência, no estudo dos fcnõmonos culturais,
ainda requer interpretações teóricas dos fenómenos, pelo fato da grande maioria dos
estudos sobre costumes culturais não serem pesquisas experimentais c por isso, não
ser possível a manipulação de variáveis. Além disso, as dificuldades de obter medidas
adequadas e precisas, de desenvolver delineamentos metodológicos e de trabalhar
com certos tipos de dados não usualmente utilizados (dados históricos, documentos
oficiais e não-oficiais, registros de outros pesquisadores, entrevistas) são alguns ou­
tros obstáculos enfrentados pelo pesquisador, no empreendimento de tais estudos.
Como afirma Biglan (1995), uma ciência para compreender práticas culturais será de­
senvolvida a partir do desenvolvimento de seus métodos. Melhorando os métodos, a
habilidade para analisar o contexto de práticas culturais específicas irá, conseqüente­
mente, melhorar. Por essa razões, o estude dos fenômenos culturais ainda são um
desafio para os Analistas do Comportamento.
Como Skinner (1971/1983) observa, a cultura está associada a um grupo de
pessoas, sendo que é mais fácil ver as pessoas do que o comportamento delas. E este,
por sua vez, é mais fácil de ser visto do que as contingências de reforçamento que o
produzem. Daí resultam, muitas vezes, a dificuldade de se empreender estudos sobre
os fe n ô m e n o s c u ltu ra is. M as a p ro p o sta de id e n tific a ç ã o do s p ro c e s s o s
comportamentais básicos envolvidos na aprendizagem de repertórios sociais relevan­
tes pode ajudar a ver esses processos funcionando em casos mais complexos, mes­
mo que não possam ser rigorosamente tratados.
O pre sen te tra b a lh o a p re se n to u a lg u n s exe m p lo s de p ro c e s s o s
comportamentais básicos presentes na construção de repertórios sociais, mas sem a
intenção de esgotar a identificação de tais processos, Além disso, tais identificações
não excluem outras possíveis e plau síve is in te rp re ta çõ e s acerca da m udança
com portam ental de motoristas e pedestres na cidade de Brasília/DF.

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Sobre Comportamento c Cognição 303


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Capítulo 25
Punições do sistema penal sob a luz da
Análise do Comportamento

A rm a Beatriz C am íelli \ low at R odrigues'


Felipe de C arv alh o Pim entel"
Lucinéid Pesenle "

1. Introdução e objetivo

A norma jurídica não apenas descreva, mas prescreve, normaliza com portam en­
tos e dita medidas de valores sociais com o objetivo de m o ld ar os indivíduos
segundo o espírito das leis, convertendo em uma construção legal legitimadora de
praticas poíítico-norm ativas que reclam am a hom ogeneização dos hum anos no
universo jurídico dominante (Philippi, 1994, p. 173).

A Psicologia há algum tempo, vem ganhando espaço no campo jurídico, contu­


do, essa é uma área ainda pouco estudada e pesquisada (Caires, 2003). De acordo
com Miranda (1998) a Psicologia passa a coabitar o campo judiciário a partir da
Psicopatologia, convocada a dar um parecer técnico (pericial) aos casos nos quais a
justiça não sabia como proceder, tendo como principais clientes os monores e os
loucos. Desta maneira, no campo judiciário a Psicologia acabou por se servir dc pare­
ceres, laudos e relatórios, que na maioria das vezes constituem-se em instrumentos
avaliativos e de base para os magistrados, curiosam ente não havendo ainda um
referencial teórico próprio neste cenário com tamanhas idiossincrasias (Arantes, 2004).
Nas palavras de Philippi (1994) a junção das ciências direito e psicologia "desemboca
na concepção de um sujeito responsável, racional, imputável e, portanto, controlável"
(p. 172). Para atender a esse controle as normas jurídicas descrevem e estabelecem
normas para o comportamento, assim como apontam valores sociais "com o objetivo
de moldar os indivíduos segundo o espírito das leis, convertendo cm uma construção
legal legitimadora de práticas potítico-normativas que reclamam a homogeneização
dos humanos no universo jurídico dominante" (Philippi, 1994, p. 173).
' Gradua rida de Psicologia da Universidade Federal do Espirito Santo e Bolsista do Programa de Iniciação Crfintfica
~ Mestrando de Psicologia da Universidade Federal do Espírito Sanlo e
Bolsista da Capss
- Mesfranda de Psioologia da Universidade Federal do Espfrito Santo

Sobre Comportamento e Cognifào 305


O cenário jurídico traz em sou bojo uma série de polêmicas que carecem de
uma adequada resolução. No final dos anos 70, as discussões sobre as condições
humanas nos espaços prisionais e de reclusão ganharam corpo no Brasil possibilitan­
do que houvesse uma racionalidade crítica também sobre os procedimentos de traba­
lhos dos psicólogos nesses espaços (Aguiar. 2005).
Quando faiamos em Psicologia Jurídica podemos estar nos referindo à atuação
na área de família, infância e juventude, criminai, entre outras, privilegiando aqui o
campo criminal, ondo serão focalizadas as práticas punitivas judiciárias de penas priva­
tivas de liberdade (prisões) e as penas e medidas alternativas pensando-as sob a luz
da Análise do Comportamento a partir do cenário teórico construido pela literatura refe­
rente ao tema. Mais especificamente, cabe aqui então analisar os rnodeios de práticas
punitivas e seus possíveis efeitos “desejados" sobre o comportamento dos usuários
assim como analisar os efeitos colaterais de tais práticas, pensando, também no nos­
so papel como psicólogo neste campo de atuação.

2. Breve Histórico das prisões e a possibilidade das penas e medi­


das alternativas

A prisão, tal qual conhecemos na atualidade, á uma instituição que nasce com o
capitalismo e desde então, vem sendo utilizada para administrar, seja pela via da
correção, seja pela via da neutralização, as classes tidas como perigosas (Kolker,
2004, p 158)

No contexto brasileiro existe o reconhecimento de que as prisões não oferecem


as desejáveis e legais soluções para a reeducação e ressocialização do indivíduo
(Biscaia & Souza. 2005; Mameluque, 2006), todavia é importante que contextualizemos
o surgimento desse sistema e para isso voltaremos na história até a Era Clássica
européia tomando emprestado alguns escritos de Foucault (1997) em Vigiar e Punir. De
acordo com o autor a maior parte das condenações para aqueles que iam contra o que
era “bom” fazia-se por banimento (acompanhado pela exposição e marcação com ferre­
te) ou multa (acompanhada por açoite), entretanto, para as penas mais sérias somente
esses meios não bastavam, ocorrendo, durante o séc XVIII e séculos antes na Europa,
o espetáculo do suplício, que eram punições que envolviam grande quantidade de
sofrimento, correlacionando o sofrim ento com a gravidade do crime, sendo então
marcantes os exemplos destas práticas, como a decapitação, o esquartejamento, entre
outras que manifestavam ao máximo do poder de quem punia.
No fim do séc XVIII e começo do séc XIX, com o advento do movimento iluminista,
tudo o que retomava ao espetáculo punitivo passou a ter cunho negativo e tais práticas
passaram a ser extintas (Foucault, 1997; Rosa, Ribeiro Junior & Rangel, 2007). O que
aconteceu neste período, segundo Biscaia & Souza (2005), foi que o Direito Penal
inaugurou o período humanitário não aceitando um sistema repressivo e sangrento.
Por motivos comerciais, neste momento o condenado passa então a pagar sua pena
em benefício da sociedade, a partir de trabalhos forçados, tornando-se menos custoso
ao Estado e “reparando" o dano causado ao social (Rosa, Ribeiro Junior & Rangel,
2007). As prisões, utilizadas anteriormente como forma de guardar os criminosos até
julgamento, em princípios do século XIX, surgem como peça fundamentai no conjunto
das punições (Foucault, 1997; Kolker, 2004; Mameluque, 2006; Rosa, Ribeiro Junior &
Rangel, 2007). Os homens da lei passam a entender que a punição deveria ser eficaz

306 Arma B. C. H . Rodrigues, l-clípe dc C. Pimenlel, Lucinéia Pesente


para livrar o homem do crime, o essencial seria corrigir, reeducar, “curar". De certa
forma, pretendeu-se extinguir o domínio sobro o corpo, pois desta maneira estaria se
exercendo uma fraca influência da razão e da religião sobre o “espírito humano", logo, o
castigo passou do sofrimento físico e dor no corpo para uma economia dos direitos
suspensos. Ironicamente, como nos lembra Mameluque (2006), as prisões surgiram a
partir do progresso das idéias, como a fornia mais civilizada de penalidade.
As prisões, anteriorm ente conhecidas pelos povos primitivos como medida
preventiva enquanto decidia-se a pena imposta para o indivíduo (Biscaia & Souza, 2005),
transformaram-se, após a Segunda Guerra, como espinha dorsal do sistema. O Código
Penal foi publicado em 1940 instituindo como penas privativas de liberdade a pena de
reclusão (máximo 30 anos) e detenção (máximo de 3 anos) (Mameluque, 2006).
Percebe-se, desta forma, que durante os tempos tentou-se implementar práti­
cas “mais voltadas para o respeito e humanidade', menos cruéis, menos sofridas e
mais suaves, entretanto, pensamos que um paradoxo passa então a tomar forma: ao
mesmo tempo que é defendida a idóia de reabilitação e reconstituição da conduta de
quem infringe a lei, não é tão clara a empreitada pública no investimento sobre tais
ambientes, muito menos em tecnologias comportamento que promovam tal reabilita­
ção; o aparelho judiciário/penal, como coloca Adorno (1994, citado por Souza et aí.,
1998), da forma que é hoje e que veio sendo construído, acaba deixando seu ideal de
reeducação de lado contribuindo para a perpetuação da violência, mudando o foco para
a questão das diferenças e das desigualdades, mantendo assimetrias e preservando
distâncias hierárquicas.
A partir da falência das penas de prisão, surge a necessidade de buscar alter
nativas, a partir de um desenrolar econômico, histórico e social, o Código Penal de 1984
passou a prever 3 tipos de sanções penais: a pena privativa de liberdade, a pena
restritiva de direitos (penas alternativas) e a pena de multa (medidas alternativas) (Biscaia
& Souza, 2005). Dotti (1998, citado por Biscaia & Souza, 2005) diz que se pensou nas
medidas e penas alternativas como uma forma de tom ar mais eficiente e significante o
Direito Penal, evitando a entrada de uma pessoa na prisão e buscando dim inuir a
reincidência criminal, o que se coloca como algo muito interessante de ser pensado,
pois, como nos lembra Kolker (2004). quando o indivíduo adentra na máquina peniten­
ciária, se devolvido â sociedade, o é na qualidade de delinqüente,

afastados do seu meio social, em geral por muitos anos [...]; submetidos a condi­
ções que só estim ularão a sua revolta; perseguidos por seu estigma e por sua
folha corrida, recusados no mercado de trabalho p o r seus antecedentes penais e,
doravante sob a vigilância freqüentemente da policia, os condenados à pena de
prisão serão também condenados a reincidência (p. 168).

A título de contextualização, vale lembrar que as penas alternativas são: a) pres­


tação de serviço à comunidade ou entidades públicas (art. 43, IV, e art. 46 do CP) na qual
o condenado realiza tarefas gratuitas em hospitais, creches, escolas, etc e cada hora de
prestação de serviço equivale a 1 dia de condenação; b) prestação pecuniária (art. 43, l,
CP), que consiste no pagamento à vítima, seus dependentes ou entidade publica ou
privada de destinação social uma importância em dinheiro fixada pelo juiz (maior que 1
salário mínimo e menor que 360 salários); c) perda de bens e valores (art, 45, § 3o) que
é a perda de bens e valores do condenado em favor do Fundo Penínteciário Nacional; d)
interdição temporária de direitos (art. 47, CP), que consiste na proibição de exercer
cargo ou função pública, mandato eletivo, suspensão da carteira de habilitação e obri­

Sobrc Comportamento e Cognição 307


gação de não freqüentar determinados lugares; e) limitação de fim de semana (art. 48,
CP) que consiste na obrigatoriedade de permanecer aos sábados e domingos, pelo
período de 5 horas, em casa de albergado ou estabelecimento similar (Biscaia & Sou­
za, 2005).
A Suspensão Condicional da Pena (art. 77, CP), ou ‘ sursis’' é uma medida
alternativa que tem por finalidade permitir que o indivíduo não se sujeite à execução de
pena privativa de liberdade de pequena duração, ou seja, permite que, mesmo conde­
nada, uma pessoa não fique na cadeia. Ela é aplicada para casos em que a pena não
for superior a 2 anos e o sentenciado deve cumprir condições estabelecidas pelo juiz
(por ex: doação de cestas básicas, prestação de serviço à comunidade, etc.) (Biscaia &
Souza, 2005).
A Lei 9099/95 instituiu quatro medidas alternativas, ou seja. despenalizadoras.
São elas: a) composição civil (art. 74 da lei 9099/95) que consiste em reparar os danos
sofridos pela vítima da forma mais rápida e menos formal; b) transação penal (art. 76 da
Lei 9.99/95), que consiste em propor para o autor da infração a aplicação de pena restritiva
de direitos ou multa; c) suspensão condicional do processo (lei 9.099/95), na qual poderá
haver suspensão condicional do processo nos delitos com pena mínima igua! ou inferior
a 2 anos sem condenação e fazendo com que o acusado continue a ser réu primário,
porém, cumprindo as mesmas condições da "sursis" (Biscaia & Souza, 2005).
Suplícios, punições, prisões, e, atualmente, penas e medidas alternativas fo­
ram formas encontradas a fim de vingar ou punir aqueles que praticaram atos tidos
contra as normas sociais vigentes, é importante frisar que, com a influência da pena
mais humana e a passagem dos suplícios para as outras sanções, regras começaram
a serem pensadas no sentido do que seria legal ou ilegal de ser feito ao voltar o mal
para o indivíduo que fez um mal, desta forma, passou-se a punir de acordo com os
seguintes princípios: 1) Regra da quantidade mínima, na qual o proveito do crime deve*
ria ser menor que o proveito da punição para que ele não fosse desejado; 2) Regra da
idealidade suficiente, que versa que a punição não deveria trazer sofrimento físico, mas
sim, desprazer; 3) Regra dos efeitos colaterais, segundo a qual a pena deve ter efeitos
mais intensos naqueles que não haviam cometido o crime, servindo de modelo; 4)
Regra da certeza perfeita, em que a cada crime tem que haver uma sanção correspon­
dente e que se tenha certeza que a sanção virá (Foucault. 1997).
Desta forma, percebemos que, até se ter a Lei de Execuções Penais (LEP)
muitas idéias foram modificadas, muitas situações foram pensadas, pois como todo
conjunto de regras, o processo de contínua transformação é inevitável. Todavia, perce-
be-se que este conjunto de regras enfrenta grandes problemas ao tanger de maneira
insatisfatória a multiplicidade de contingências sociais sob as quais os comportamen­
tos dos sujeitos que as compõe é função, além da forma como é colocada em prática.

3. Sob a luz da Análise do Comportamento


Ao analisarmos a condição atual das regras que regem os sistemas prisionais
nos deparamos imediatamente com complexas interações e possibilidades de pena
(coimo as citadas anteriormente). O ponto de partida para esta análise é que o controle
social é fundamental (Skinner, 1953), porém, não é possivel uma definição pronta sobre
o método ideal que se deva empregar na "correção" dos sujeitos infratores. De fato,
parece que estamos longe de um consenso. Revela-se então pertinente uma análise
mais apurada sobre as contradições imediatas que surgem ao analisar o processo em
si. Para tanto, Bonamigo (2003) ressalta que no campo jurídico “o primeiro passo para

308 A nna B. C. H , Rodrigues, Fefipe de C. Pimenfel. Lucinéia Pesentc


o psicólogo iniciar seu trabalho é realizar uma análise funcional institucional e cultural'
(p. 369). Neste ponto, justifica-se a necessidade de compreensão dos processos de
controle coercitivo contrapondo-os com os objetivos sociais nas práticas penais
Em "Coerção e suas im plicações” (1989), Sidman analisou amplamente a
utilização de técnicas de punição para estabelecimento de controle da rualidado social.
Seguindo este raciocínio, o autor mostra alguns efeitos complexos que a punição tem
sobre o comportamento dos sujeitos sob tal prática. Numa análise comportamental,
segue-se a premissa de que a punição não produz comportamcnU», apenas o suprime
momentaneamente enquanto o agente punitivo está presente e favorece o aparecimen­
to de respostas alternativas (Skinner, 1989).
Como nos mostra Catania (1999). além tia supressão iniciai de respostas, a
punição apresenta uma série de efeitos colaterais, que podem ser enumerados da se­
guinte maneira: 1) eliciação de respostas emocionais - au entrar em contato com estímu­
los aversivos, é observada nos sujeitos uma série de respostas emocionais, como por
exemplo, palpitações, tremores e raiva: 2) emissão de respostas incompatíveis ao com­
portamento punido - uma vez em contato com a puniçào os organismos tendem a emitir
uma segunda resposta chamada de resposta incompatível ou resposta controladora que
tenta impossibilitar a repetição do comportamento punido; 3) Contracontrole - este prova­
velmente seja o efeito da punição mais indesejável, nele quem é controlado tende a emitir
uma resposta visando impedir que o agente controlador mantenha o controle. Em detri­
mento a todos esses efeitos indesejáveis causados pelo controle aversivo, este pode ser
percebido cotidianamente como o mais usado na tentativa de controle do comportamen­
to. A pena de prisão imposta por restrição de liberdade é claramente uma punição que visa
por intermédio de punição positiva e negativa a redução dos comportamentos que foram
considerados socialmente inadaptativus.
Para Sidman (1989) e Moreira & Medeiros (2007), essa postura perante os com­
portamentos considerados inapropriados é frequentemente repetida devido a alguns
fatores, tais como: a) imediaticidade da resposta - o agente punitivo ao suprimir um
comportamento, geralmente é de imediato negativamente reforçado; b) eficácia não de­
pende da privação - o organismo não precisa estar privado de reforçadores para a eficácia
de uma punição sobre o sujeito; c) facilidade no arranjo de contingências. Skinner (1972)
argumenta que por mais que as técnicas de tortura tenham sido deixadas de lado, as
técnicas punitivas não deixaram de ser empregadas, pois, como argumenta Sidman
(1989), a preferência pela utilização da coerção faz parte das interações humanas.
Com isso, não podemos desconsiderar o fato de que a punição, em primeira
instância, diminui a freqüência do comportamento de quem foi punido, um sistema de
justiça baseado apenas em punição mantém muitas pessoas “na linha” e satisfaz aque­
les que buscam vingança contra os transgressores; mas um código de íeis também gera
desobediência e a utilização da coerção em longo prazo está fadado ao fracasso à medi'
da que gera desengajamento pessoal, isolamento da sociedade, neurose, rigidez inte-
lectual, hostilidade e rebelião, e, para muitos que administram e fazem cumprir o sistema,
pode gerar brutalidade. A busca por um controle alternativo neste contexto é emergente.
Alternativas ao controle aversivo apesar de serem aconselháveis, acabam por
dar muito trabalho no manejo das contingências. Moreira & Medeiros (2007) enumeram
p o ssíve is alte rn a tiva s para o co n tro le do com p ortam e nto que e n vo lve m enos
aversividade, essas são mais indicadas por apresentarem meios positivos para o con­
trole do comportamento dos infratores. Dentre essas alternativas destacam-se: a) a
utilização do reforço positivo em lugar do negativo - ao ministrar o reforço positivo
também se obtém um aumento na freqüência de resposta e o sentimento que acompa­

Sobre Comportamento e Cognição 309


nhará essa conseqüência será prazer e satisfação e não alivio, com isso, espera-se o
desenvolvimento de repertório mais adaptativo como, por exemplo, a escolha pela rea­
lização de tarefas que abonem dias de prisão e ainda provêem renda para a família do
preso; b) realização inicial de procedimentos de extinção em vez do uso indiscriminado
da punição, tendo as respostas inadequadas ausência de reforçamento no contexto
penitenciário; c) reforçar diferencíalmente comportamentos adequados com benefícios
diretos e contingentes sobre tais respostas; e finalmente d) optar por um aumento da
densidade de reforços para respostas alternativas - esse procedimento consiste ern
não utilizar a extinção, mas reforçar com mais freqüência comportamentos alternativos
e com menos freqüência os indesejáveis. É necessário aqui avaliar o que é reforçador
para os detentos e então promover contingências de reforçamento que concorreriam
com as que controlam as respostas "criminosas" e anti-sociais.
Apesar destes procedimentos já conhecidos pela ciência do comportamento,
as penas e procedimentos corretivos que vêm sendo utilizados até o momento pare­
cem não ter acesso às informações da análise comportamental acerca dos efeitos
adversos da punição. Ora, se o objetivo declarado é o desenvolvimento pessoal e a
reabilitação do sujeito à comunidade, como esperar isso de um procedimento que se
respalda unicamente no estabelecimento de condições que suprimem respostas ina­
dequadas e desenvolvem respostas funcionalmente semelhantes em topografias dife­
rentes?
Em outras palavras, o sistema penal em voga está fadado ao fracasso, pois
tenta, por intermédio da punição “crua”, instalar ou desenvolver comportamentos mais
socialmente adaptativos em um ambiente que apresenta uma quantidade limítrofe ou
inexistente de reforçadores positivos para tais respostas. Chama a atenção tamanha
contradição: instalar comportamentos adaptativos por interm édio de punição, Para
Mameluque (2006) “A punição foi se tomando a parte mais velada do processo penal"
(p.624).
De fato, ainda não há tecnologia do comportamento que tenha respondido de
maneira satisfatória à problemática supracitada. Isso está provavelmente ligado tanto á
falta de inserção e de experiência da psicologia como um todo no âmbito jurídico como
também devido à pequena atenção que a área da análise aplicada do comportamento
tem direcionado ao problema (Bonamigo, 2003). É claro que não se pode ser ingênuo
ao negar a evolução do processo histórico cultural e pensar em uma sociedade não
punitiva, mas isso não invalida a necessidade de estudar sistematicamente as formas
em que as penas têm sido empregadas, os resultados de tais ações para então formu­
lar de maneira pragmática modelos de análise funcional criteriosa e verificar as variá­
veis de controle que geraram melhores resultados; isto tudo considerando as limita­
ções que naturalmente este trabalho irá enfrentar inicialmente. Sendo assim, deve-se
partir do pressuposto que o controle coercitivo é inegável, tanto como qualquer forma de
controle social, contudo, averiguar novas formas práticas de fazer com que este controle
seja mais eficaz e funcional faz-se então pertinente.
Holland (1978) defende que enquanto ficarmos preocupados em definir uma
‘ personalidade criminosa” e atuar nesta personalidade, por meio da correção, para que
ela deixe de ser criminosa, poucos avanços serão dados no campo jurídico. Levando
em conta o indivíduo como parte de seu meio, o autor prevê que enquanto nâo se atentar
para o fato de que o indivíduo também é controlado pelas contingências sociais, dife­
rentemente de uma intervenção clínica, continuará se reproduzindo indivíduos propen­
sos para o crime. Sendo o comportamento adaptável, ele se ajusta as contingências de
reforçamento ou punição. Poderíamos pensar que nas prisões, por exemplo, o sujeito

310 Anna B. C. H . Rodrigues, Felipe de C. Pimentel, Lticincia Pesente


deixa de ser influenciado peio meio que o reforçava (pela extinção cie respostas naquele
meio social anterior) e pode desenvolver um complexo repertório comportamental ligado
ao contexto da penitenciária ou casas de detenção {invariavelmente relacionadas ao
crime), ou se/a, na prisão é possivei que uma classe de respostas ‘ criminosa" seja
fortemente instalada por ambos reforçadores positivos e negativos, gerando ampla con­
corrência nas contingências entre a vida cotidiana (que thc provê poucos reforçadores
generalizados ou não) e a vida no erime (que estabelece amplo controle de estímulos e
operações estabelecedoras). Com isso, podemos pensar muito mais conscientemente
na questão da reincidência, que, diante de uma complexidade maior, pode tambern ser
considerada, visto que estamos falando de comportamento operante selecionado pelas
conseqüências que o seguiram no passado. Pensando desta forma, as penas alternati­
vas poderiam ser uma luz á medida que não tiram o indivíduo de seu meio social; a
punição amena pode funcionar como operação motivacíonal que evocaria um novo reper­
tório socialmente mais adaptativo, aumentando as expectativas de reinserção do sujeito
que pagou sua dívida com a sociedade.

4. Considerações Finais
Como abordado até o momento, a análise das contingências mais presentes
no cenário das punições utilizadas pelo sistema penal mostra que a area carece de
trabalhos mais voltados a uma desconstrução das formas de controle utilizadas de
maneira tão difundida até a atualidade. Os preceitos da análise do comportamento aqui
demonstrados se relacionam diretamente à construção de novas práticas respaldadas
em tecnologia com porta mental. Como afirma Bonamigo (2003) é preciso à experimen­
tação dos psicólogos neste carente cenário do trabalho para que então as contingênci­
as selecionem práticas mais eficazes.
Deve-se íevar em conta que em alguns meios jurídicos já há a noção de que a
criminalidade não será resolvida e combatida criando-se formas mais rígidas de supres­
são de direitos e benefícios legais, mas sim, com a adoção de políticas sociais (saúde,
educação, emprego, etc.) de caráter permanente e abrangente com programas que vi­
sem a geração de empregos, melhoria na escolarização, etc. Por outro lado, a inserção
da análise funcional aplicada do comportamento na promoção de novas contingências
de reforçamento que desenvolvam e selecionem comportamentos mais adaptativos atuaria
na urgência da problemática de quem está inserido neste momento na realidade penal.
Estes, não podem esperar o arranjo de políticas públicas de longa data que demorariam
a ser introjetadas nos meios políticos populares (por respostas de fuga-esquiva desta
complexa realidade, a população como um todo tende a não se envolver com os proble­
mas deste universo, è mais fácil excluir do que lidar com os sujeitos que não se compor­
tam como o esperado). Precisamos de um trabalho em rede. em conjunto, pois somente
com integração que as penas e medidas venham contribuir para uma sociedade menos
injusta (Amaral, 1997; Aguiar, 2005; Biscaia & Souza, 2005).
Nosso primeiro papel como psicóíogo neste campo seja o de dar sustentação
para a formação dessas redes e a criação de políticas públicas. De acordo com Aguiar
(2005), dentro dessa lógica o psicóíogo precisa confrontar racionalidades já construídas
e trabalhar com os direitos objetivos e subjetivos da cidadania, justiça, qualidade de
vida e autonomia. Podemos trabalhar com essa população promovendo possibilida­
des, ampliando repertórios mais adaptativos e conseqüentemente sujeitos mais segu­
ros, saindo do campo moralista e levando para o campo ético.

Sobre Comporta mento e Cognição 311


Eticamente, devemos intervir para a promoção de cidadania e autonomia e,
principalmente, tirar o foco do delito e colocá-lo no sujeito, não a fim de continuar ape­
nas culpabifizando-o. a fim, todavia de responsabilizá-lo de seus atos e torná-lo ator,
atuante em sua história, fazendo com que ele assuma suas escolhas e as conseqüên­
cias advindas das mesmas.
Concluindo de acordo com as idéias de Aguiar (2005)

"Somente a busca pela rcsolutividade nas ações do psicólogo permite am pliar o


olhar que a sociedade e o Estado tem sobre o seu exercício social. Ao contribuir
efetivamente com políticas e ações na diminuição da violência e no reibaxamento
das taxas de reincidência de delitos, o psicólogo passa a representar como um
interlocutor aiivo na sociedade. Deve-se pensar seriamente sobre sua reinserção
nas p o líticas p ú blicas de prom oçã o de ju s tiç a e cid a d a n ia , pois só assim ,
reinventando o que sc faz, é que se pode reco néctar contratos sociais de egressos
de presídios e penitenciárias por uma via que não seja 0 delito." (p.270/1)

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Sobre Comportamento e Cognição 313


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Capítulo 26
Função dos indicadores de
sustentabilidade para o
planejamento cultural e proces­
sos de Educação Ambiental*
I íclder Lim a Ç usso"
U I SC
A n d rc Luiz Freilas D ias'“
UFM Q

O que são Indicadores de Sustentabilidade? Que contribuições os diferentes


indicadores de sustentabilidade disponíveis oferecem ao planejamento de uma cultu­
ra? E como essas contríbuiçõcs podern repercutir sobre o comportamento das pesso­
as que constituem um grupo, comunidade ou nação? Quais as relações entre Indicado­
res de S u s te n ta b ilid a d e e co m p o rta m e n to hum ano? E e n tre In d ica d o re s de
Sustentabilidade e Educação Ambiental? Indicadores de sustentabilidade têm função
mais importante do que apenas assustar pessoas acerca de seus hábitos, condições
de vida e perspectivas de um futuro desastroso para a humanidade. Sua função princi­
pal é nortear o planejamento cultural dos diferentes grupos humanos de modo a garan­
tir melhores condições de vida no futuro e com o mínimo desgaste de recursos naturais.
Um dos aspectos nucleares envolvidos no desdobramento entre os dados evidencia­
dos pelos indicadores de sustentabilidade e o comportamento das pessoas, são os
p ro ce sso s de ensino no m e a d o s por "E d uca ção A m b ie n ta l” . In d ica d o re s de

'Texto referente às apresentações realizadas na mesa-redonda “Indicadores de sustentebilidade e desenvolvimento; Contribuições da


Anái&e do Comport3mentrr’ nc XVI E rrantro Amial da Associação Brasileira de Psbologia e Medicina Comportamental em setembro de
2007. Brasília-DF Os autores agradecem especialmente ao Praf. Dr, Alexandre Dittridi e a o Prof Dr J o ã o Basco pelos questionamentos e
contribuições realizados na ocasião da apresentação e ao psicólogo Gabriel Gtxnes de Lues pela leitura de urna versão prévia deste artigo
" Psicólogo (ORP: 12/06649),
Educador Ambiental e meslrando em Psicologia (Análise do Comportamento em organizações e a prendi zagern) pela Universidade Federal de
Sanfa Catarina. Professor do Cureo de Psicologia do IB ES/SOCIESC Contate:
helde rg us so@g m ail. com
" Psicólogo, E ou ca dor Ambiental, Professor da Universidade Federai de Minas Gerais. Doutorando
em Saúde Coletiva
no instituto de Pesquisas René Racf io u da Fundação Oswaldo Cruz. Contato: alfreitesdias@faficfi.ufmg.br

Sobre Comportamento c Cognição 315


sustentabilidade, ao ampliar a visibilidade sobre os aspectos do ambiente que precisa­
riam orientar as comportamentos dos indivíduos em um grupo, fornecem diretrizes para
nortear o^planejamento cultural e os processos de Educação Ambiental.
Para responder, em algum grau, as perguntas enunciadas no inicio deste arti­
go, será necessário (1) avaliar as relações entre as noções de sustentabiiidade e de
comportamento, (2) caracterizar a função de Indicadores de Sustentabiiidade e (3) ava­
liar como os Indicadores de Sustentabiiidade podem orientar o planejamento cultural e
os processos de Educação Ambiental.

1. Relações entre sustentabiiidade e comportamento


Para avaliar as relações entre sustentabiiidade e comportamento e, especial­
mente, o quanto a noção de comportamento contribui para identificar os aspectos im ­
portantes da noção de sustentabiiidade, é importante ter clareza sobre esses dois
conceitos.

A noção de comportamento1
“Comportamento” é o fenômeno com o qual os analistas do comportamento
lidam. Mas a noção de comportamento utilizada no âmbito da Análise do Comportamen­
to difere radicalmente da noção utilizada no senso-comum. Ainda assim, parece não
haver consenso mesmo entre os analistas do comportamento acerca da definição
desse fenômeno, visto que em muitas publicações ainda são utilizados os conceitos
"resposta” e “comportamento" ou ‘'comportamento” e "contingência de reforço" como
sinônimos, ignorando as contribuições de autores como Pavlov, Skinner e Catania
(Botomé, 2001).
Entre as características desse fenômeno, como entendido especialmente a par­
tir das contribuições de Skinner (1935/1975; 1953/1998; 1969/1984; 1981), duas delas
debatidas ao longo do último século são importantes de serem destacadas para ampliar
a visibilidade entre a noção de comportamento e a de sustentabiiidade2. A primeira delas
é que comportamento não é sinônimo de atividade (resposta) do organismo. ‘'Comporta­
mento” não é definido e nem é nomeado a partir apenas da atividade apresentada pelo
organismo. Por exemplo, se meu comportamento ao redigir esse texto for nomeado como
“escrever texto”, estaríamos nomeando apenas a atividade que estou desempenhando.
Ao identificar sob controle de que estímulos essa minha atividade está, logo identificaría­
mos que estou escrevendo texto para "explicitar as características de um conceito" ou,
ainda, ao analisar a classe mais ampla na qual essa atividade está inserida, logo identi­
ficaríamos que estou escrevendo um texto para "demonstrar, por meio de argumentos, as
relações entre comportamento e sustentabiiidade”. Ao nomear o comportamento em
exame apenas como “escrever texto", qualquer produto (estímulo conseqüente) seme­
lhante a um texto escrito seria um indicador de que me comportei apropriadamente,
mesmo que esse texto não contribuísse para “explicitar as características do conceito” ou
como meio para "demonstrar as relações entre comportamento e sustentabiiidade” , que
seriam formas mais apropriadas de nomear o comportamento que está ocorrendo. Defi-

' Ao leiloí interessado em examinar mais delalliadatuenle a história desse conceito na Ciência, Psicologia e, em especial, na Análise do
Comportamento, sugerimos a leitura de Botomè (2001 ) Os autores ainda agradecem aos professores e alunos do Programa de Pôs-
graduaçSo em Psicologia da UFSC pelos debates aceita da noção de comportamento realizados que permitiram ktentrliúer aspectos
importantes desse fenômeno.
JHá ui na terceira característica Importante para o contexto deste trabalho que são as diferentes furtjôes que as ciasses de esUmutos antecedentes
podem assumir: ftlwando respostas de uma dasse (estímulos Incondicionais e condicionais) sinalizando a ocasião cm que respostas de uma
classe produzirão certos tipos de conseqüência (eslJmulos discriminativos), e alterando estados molivacionais do organismo (operações
estabelecedwas). Essas funções sâo importantes de serem examinadas para o planejsmenlo cultural por meio da Educação Ambiental.

316 Hélder Lima Qusso, Andrc Luiz Freitas Dias


nir ou nomear comportamentos apenas pela atividade do organismo é, portanto, insufici­
ente para explicitar a relação que o organismo está estabelecendo com o meio em que se
encontra (Botomé, 2001).
Além da atividade do organismo, a definição de comportamento abrange ou­
tros dois componentes: os aspectos do meio no qual essa atividade ocorre e os aspec­
tos do meio que ocorrem após essa atividade (sejam eles produzidos ou apenas
subseqüentes). O que define, de modo mais preciso, o fenômeno comportamento é o
sistema de relações entre classes de estímulos antecedentes, classes de respostas
(atividade ou ação) apresentadas por um organismo e classes de estímulos conseqüen­
tes (Botomé, 2001). A Figura 1, com as setas destacando as relações entre esses três
componentes, iiustra essa definição É importante ter clareza de que o fenômeno que o
analista do comportamento lida não é a atividade do organismo, mas as relações entre
essas atividades com aspectos do meio antecedente e conseqüente.

Figura 1. representação do conceito "comportamento", definido pelas relações entre os


très componentes, (adaptado de Botomé, 2001)

A segunda característica importante a ser destacada refere-se à distinção entre


eventos produzidos pela atividade dos organismos e os eventos que alteram a probabi­
lidade de ocorrência do comportamento no futuro. Skinner (1953/1998; 1981) tornou
clara a idéia de que o comportamento é selecionado e mantido por suas conseqüênci­
as. Essa noção é nuclear para qualquer tipo de trabalho desempenhado por Analistas
do Comportamento. Mas é preciso ter visibilidade sobre o que são essas "conseqüên­
cias". Duas propriedades dos eventos que acontecem após a apresentação de uma
resposta por um organismo precisam ser identificadas:

a) O evento foi produzido pela resposta? Ou apenas aconteceu após a resposta?


b) O evento alterou a probabilidade de ocorrência de respostas dessa classe?

Essas duas questões explicitam que (a) nem tudo que acontece depois da
atividade de um organismo foi produzido (direta ou indiretamente) por essa atividade e
que (b) nem tudo que acontece depois da atividade de um organismo (tenha sido produ­
zida por esta ou não) altera a probabilidade de ocorrência de respostas da mesma
classe. Essa clareza é fundamental para a análise da noção de sustentabilidade e sua
relação com o fenômeno comportamento.

Sobre Comportamento t Cosinifão 3 1 7


A noção de sustentabilidade e sua relação com a noção de compor­
tamento
"Sustentabilidade", e sua derivação “desenvolvimento sustentável”, é um ter­
mo que começou a ser amplamente utilizado a partir da década de 1990, que hoje
figura em discursos nos meios políticos e empresariais. Para ter dimensão acerca de
quão recente são as preocupações em relação a sustentabilidade, especialmente no
Brasil, podemos ilustrar relembrando o discurso do Senador José Sarney na conferên­
cia da ONU em 1972, em que demonstra o grau de preocupação dos políticos brasilei­
ros em relação a sustentabilidade socioambiental de nossa nação: “Que venha a polui­
ção, desde que as fábricas venham com elas” (Tabacow, 2006).
Chamar uma atividade humana de sustentável “significa que ela pode ser
continuada ou repetida em um futuro previsívef (Townsend, Begon & Harper, 2006,
p.442). Essa definição emprega o termo futuro previsível porque ao descrever uma
atividade como sustentável, ela é baseada no conhecimento já disponível acerca dos
fenômenos e. muitas vezes, há variáveis que ainda são desconhecidas.
Como exemplos pra ilustrar essa noção, não podem os continuar a retirar
peixes do mar mais rápido do que a capacidade de os cardumes se reconstituírem se
quisermos ter peixes para comer no futuro. Ou não poderemos continuar a usar os
mesmos pesticidas sc os números crescentes de pragas se tornarem resistentes a
eles. Ou não podemos continuar a produzir CFC ou HCFC se a camada de ozônio e o
aquecimento global vão afetar nichos ecológicos no mundo inteiro. Em cada um des­
ses exemplos há a necessidade de mudanças comportamentaís para garantir que as
atividades humanas de valor social possam ser repetidas no futuro e petas próximas
gerações e, no caso do CFC, por exemplo, a necessidade de banir práticas incompatí­
veis com um futuro promissor e desenvolvimento de práticas substitutivas.
As decorrências futuras da pesca predatória não são facilmente identificáveis
por aqueles que estão a pescar. Os indícios de escassez de peixes só são percebidos
por quem pesca após intensa e constante atividade predatória, quando a quantidade
de peixes encontrada torna-se muito menor. Muitas vezes, quando esses sinais são
evidentes, já pode ser tarde para se fazer alguma coisa em relação à conservação da
biodiversidade. Como é possível identificar a quantidade de peixes apropriada para se
retirar do mar (e a forma de fazê-lo) sem que isso decorra em uma crise ambiental
antes de nos depararmos efetivamente com o probiema? E como o conhecimento
científico e as decorrentes tecnologias podem intervir sobre esse processo?
Críticos do movimento ambientalista por vezes criticam o fato de ambientalistas
se esforçarem para promover mudanças no padrão de vida das pessoas, por conside­
rar que é impossível prever o futuro, especialmente porque a tecnologia desenvolvida
pelo homem pode ser capaz de promover grandes mudanças repentinamente. Nessa
crítica há dois elementos que precisam ser examinados.
O primeiro é que atribuir imprevisibilidade ao futuro como justificativa para não
fazer previsões, é incoerente com o conhecimento científico já produzido. Afirmar que o
futuro pode ser totalmente previsível e controlado seria tão absurdo quanto afirmar que
é totalmente imprevisível e incontrolável. O método e o conhecimento científico já pro­
duzido fornecem condições para avaliar diversos aspectos das decorrências de muitas
das atividades humanas e nos perm ite avaliar as probabilidades de ocorrência de
diferentes tipos de fenômenos.
O segundo elemento, especificamente em relação ao desenvolvimento de Ci­
ência e Tecnologia, parece ser apropriado concordar com os criticos que a tecnologia,

318 Hélder Lima Qusso, André Lui? Freitas Dias


de fato, pode aumentar o grau de sustentabilidade de muitas atividades humanas. Mas
é perigoso “crer” que este desenvolvimento permitirá que continuemos a fazer as mes­
mas coisas que fazemos hoje. "As práticas insustentáveis não podem ser aceitas sim­
plesmente a partir da crença de que avanços científicos no futuro resolverão nossos
problemas.” (Townsend, Begon & Harper, 2006, p.442).
Um últim o a sp ecto a d e s ta c a r nesse co n te x to ace rca da no ção de
sustentabilidade é a diferenciação entre criar condições para que o mesmo organismo
continue a se comporíar (bem individual ou de um grupo restrito entre uma colctividacic
maior) e criar condições para que os organismos (da mesma e de outras gerações)
continuem a se comportar de maneira específica (bem da cultura). Diante de uma crise
energética, por exemplo, optar por elevar o custo dos combustiveis é uma decisão que
garante a "sustenfabifidade” (ou pseudo-sustentabilidade) energética dos indivíduos
com mais recursos, enquanto os menos abonados são privados do acesso à energia.
Outra opção, criar estratégias para reduzir o consumo energético de modo a garantir o
acesso à energia a todos os membros do grupo, é uma alternativa mais sustentável e
coerente. De qualquer forma é importante identificar que em qualquer situação a atividade
de um indivíduo tem repercussão sobre a sustentabilidade de todo o sistema ao qual
ele faz parte (seja a própria família, escola, bairro, cidade, estado, pais ou planeta).
Brüseke (2007) apresenta o exempío de aíguém que assume o risco de andar em alta
velocidade em seu carro, que pode decorrer em acidente, e que representa um perigo
para as atividades de locomoção de pedestres e outros motoristas. Nesse caso, além
de colocar em risco a sustentabilidade do próprio comportamento de dirigir (por colo
car-se em risco de morte), o motorista também coloca em risco a sustentabilidade de
comportamentos relacionados à locomoção de outros pedestres (pelo risco de matá-
los ou torná-los incapazes de realizar tais comportamentos).
Em síntese, sustentabilidade requer “um padrão de vida dentro dos limites im­
postos pela natureza" (Van Bellen, 2003, p.73) e das possibilidades de atuação dos
organismos que fazem parte de um sistema específico. Sustentabilidade envolve identi­
ficar as restrições ecológicas de nosso ambiente atual e futuro e, especialmente, agir em
função dessas restrições. É um conceito que implica em avaliar os fenômenos naturais e,
especialmente, as decorrências das atividades humanas em diferentes âmbitos e graus
de abrangência. Avaliar a sustentabilidade das atividades humanas é avaliar o impacto
(imediato e em longo prazo e em diferentes dimensões) daquilo que é produzido por
essas atividades em relação ao ambiente em que os indivíduos se comportam.

2. Função dos indicadores de sustentabilidade


A idéia de futuro pre visível, que tem im portância central para avaliar a
sustentabilidade de uma prática, implica em produzir conhecimento acerca das decor­
rências da atividade humana e das relações entre diferentes tipos de fenómenos rela­
cionados. As informações que possibilitam efetuar essa avaliação, em geral, não estão
disponíveis às pessoas que precisam ter suas condutas controTadas pelas decorrênci­
as daquilo que fazem. A quem cabe a função de descobrir e tornar acessíveis tais
informações? E a quem cabe a função de criar condições para que essas informações
repercutam no comportamento dos indivíduos do grupo? Brnseke (2007), por exemplo,
responde essa pergunta ao destacar que a "invisibilidade imediata dos riscos coloca
cientistas e políticos em posição chave."
A responsabilidade dos políticos, de modo gerai, é criar condições para que os
rumos dos grupos humanos sejam coerentes com os ideais e projetos de futuro que se

Sobre Comportamento e Cognifão 319


tem. Esses projetos, em geral, envolvem sobrevivência do grupo, como elemento mais
básico, qualidade de vida, acesso a recursos básicos, felicidade, amor, solidariedade e
os demais valores ou expectativas sociais de um futuro para a vida. A responsabilidade
por criar essas condições também é compartilhada com diversos outros agentes soci­
ais e isso será melhor examinado quando forem relacionadas as idéias de indicadores
de sustentabiiidade, planejamento cultural e processos de Educação Ambiental.
A responsabilidade dos cientistas é a de expficitar as decorrências das atividades
humanas e relações entre diferentes fenômenos naturais, aiérn de caracterizar as múl­
tiplas variáveis presentes nesses fenómenos. A Ciência não é o único processo de
conhecer disponível, mas já mostrou ser o mais efetivo em relação à possibilidade de
prever e controlar fenômenos naturais. Foi por meio da Ciência que os maiores avanços
para controlar o mundo em que vivemos foram encaminhados. Os impactos das ações
humanas começaram a se tornar evidentes na medida em que foram descobertas
relações entre fenômenos naturais (aumento da produção de CFC e aumento do bura­
co na camada de ozônio, por exemplo) e as múltiplas variáveis que constituem cada um
desses fenômenos. Um cuidado especial é não confundir a Ciência (processo de co­
nhecer) com aquilo que é conhecido (o conhecimento). O conhecimento é transitório, á
aperfeiçoado a cada avanço gradual e cumulativo. Já o processo de conhecer, é o que
garante o avanço das descobertas sobre os fenômenos naturais. O processo de conhe­
cer científico é hoje, talvez, o m aior patrimônio da humanidade.
A expressão “indicador de sustentabiiidade” refere-se a um meio de represen­
tar as decorrências de variadas atividades humanas de um grupo, bem como as rela­
ções entre essas decorrências. A função dessa representação é possibilitar avafiar
condições e tendências de um contexto em relação a objetivos definidos, comparar
diferentes lugares ou situações, prover informações de advertência ou antecipar futuras
condições e tendências (Van Bellen, 2006). Os “indicadores de sustentabiiidade" repre­
sentam o futuro previsível a partir do conhecimento disponível, considerando as variá­
veis do contexto no qual um grupo vive, as atividades desse grupo e as decorrências
dessas atividades para todo o sistema.
Os Indicadores de Sustentabiiidade mais utilizados por cientistas e políticos
desde o ano 2000 são a Pegada Ecológica (Ecological Footprint Method), o Painel da
Sustentabiiidade (Dashboard o f Sustainability) e o Barôm etro da Sustentabiiidade
(Barometer o f ■Sustainability)’. Esses indicadores representam informações relativas a
toda população global ou delimitar grupos como nações, estados, cidades, bairros,
organizações e mesmo o comportamento de um indivíduo (Van Bellen, 2006). Os dife­
rentes graus de abrangência possíveis de serem analisados auxiliam a identificar desi­
gualdades entre diferentes grupos e a identificar âmbitos de intervenção necessários
sobre cada aspecto avaliado.
Com o form a de id e n tifica r a im p ortân cia de re fin a r os in dica do res de
sustentabiiidade como forma de “prever o futuro” e alterar os cursos de nossas ações
antes que decorrências desastrosas aconteçam, vale a pena examinar debates acerca
de diferentes “previsões" sobre o futuro. Gusso (2005) realizou exame comparando a
previsão da demógrafa Catherine Rollet acerca dos problemas que o mundo enfrentará
e m '2050, especialmente em função do crescimento populacional na Terra, com o que
um dos Indicadores de Sustentabiiidade (a pegada ecológica) possibilita identificar.
Rollet afirmou que, segundo suas previsões (cujas variáveis que levou em considera­
ção não são apresentadas), o planeta pode suportar a previsão de 10 bilhões de huma-
5Ao leitor interessado em examir a r as características de cada um desses indicadores e as meios para obtê-los, sugere-se a lertura de Van
Bellen (2003) Nesse artigo o autor apresenta de modo murto dare as características gerais de cada um desses instrumentos.

320 Hélder Lima Qusso, André Luiz Freitas Dias


nos no planeta em 2050, pois há capacidade de produzir alimentos suficientes pnr;i
todo este contingente de pessoas. Afirma ainda que o principal problema que n h u m a ­
nidade terá que enfrentar será a má distribuição dos alimentos.
Gusso (2005) destaca que a previsão de Roltet deixa de considerar quo nom só
de alimentos vive o homem: precisamos de diversos outros bens de consumo no lo n g o
de nossas vidas, como vestuário, transporte, imóveis, materiais de consumo, água.
entre tantos outros, e tudo isso também vêm de recursos naturais do nosso planeta
Precisamos de muito mais do que áreas para produção de alimentos para garantir a
sobrevivência humana e das demais espécies em nosso planeta, com um mínimo de
qualidade e conforto. Além disso, é preciso considerar quo não são apenas os recursos
essenciais para a sobrevivência que são necessários: consumimos energia no lazer,
na diversão e mesmo no ócio. Outro aspecto importante de ser destacado é que o
consumo energético per capita tem aumentado em taxas muito mais elevadas do que o
crescimento populacional, que representa que as pessoas utilizam mais recursos na­
turais do que em gerações anteriores.
Nesse exemplo, o indicador pegada ecológica possibilita visualizar com mais
clareza as implicações disso ao transformar em hectares a área biológica produtiva ne­
cessária para manter os hábitos de vida de uma população ou de um indivíduo especifico.
É disponível, hoje, cerca de 1,8 hectare para cada habitante do planeta Terra. Mas só no
Brasil a média nacional de consumo já é de 2,39 hectares de área útil necessários para
cada brasileiro em função de seu padrão de vida. Nos Estados Unidos o famoso “American
Way of Life” consome 9,57 hectares por habitante. Isto quer dizer, que se todos os habitan­
tes do mundo tivessem um padrão de vida como o de um americano normal, já seriam
necessários mais quatro planetas Terra para suportar nossa população atual.
Analisar apenas uma variável, como área útil para produção de alimentes, não
possibilita projetar o futuro previsive! que deve nortear nossas ações aqui no presente. Os
indicadores de sustentabilidade visam analisar diversas variáveis importantes de serem
consideradas para que possam ser avaliadas as condições de nosso meio no futuro.
Isso não é visível sem recursos conceituais e instrumentos altamente desenvolvidos e
aqui, novamente, cabe aos cientistas auxiliarem no desenvolvimento desses recursos.

3. De que modo os indicadores de sustentabilidade controlam (ou


deveriam controlar...) o planejamento cultural e os processos de
Educação Ambiental?
De que modo o conhecimento acerca de nosso “futuro previsível" pode assumir
controle sobre as atividades humanas? Como criar condições para que nossas ações
não decorram em um futuro catastrófico? É função das Agências de Controle criar condi­
ções que promovam melhores condições de vida para os membros de um grupo e melho­
res condições no futuro para esses membros {Skinner, 1953/1998). Governo, Escola,
Igreja, Família e as demais agências devem ser capazes de fortalecer comportamentos
de valor sociai ou, em outras palavras, comportamentos sustentáveis. As decisões no
âmbito de cada uma das Agências de Controle devem levar em consideração o conheci­
mento disponível acerca das decorrências dos diferentes tipos de ações humanas se
tiverem objetivos relacionados â permanência e sustentabilidade. Um dos campos em
que é possível identificar o desdobramento do planejamento cultural em condições para
fortalecer condutas sustentáveis de modo ciaro é a Educação Ambiental.
A concretização de um planejamento cultural depende dos controles exercidos
pelas agências que atuam em um determinado contexto. Skinner (1987) denuncia que

Sobre Com portam ento c Cognição 321


muitas vezes as pessoas que governam as Agências Controladoras não agem em
função das necessidades sociais, mas apenas por interesses particulares e, especial­
mente, para sua própria manutenção no poder, isso cria. necessariamente, urn desvio de
função dessas agências, que deixam de servir ao fim pelo qual deveriam prezar.
Outra característica explicitada por Skinner (1987) acerca das Agências de Con­
trole é que comumente o controle exercido por diferentes agências é conflitante. Corno
exemplo, temos uma política econômica que preza pelo enriquecimento pessoal, dando
status e poder de consumo a quem tem dinheiro, em contraposição com os valores de
solidariedade e "partilha do pão" promovido por algumas Religiões. O fato de haverem
comportamentos incompatíveis sendo reforçados não é um problema em si. O ideal
lluminista de uma humanidade global evoluída e que prezasse pelos mesmos valores já
não e aceito como modelo ou objetivo dos diferentes grupos humanos. O problema não
está em exercer controles conflitantes (valorizar diferentes comportamentos), mas em
avaliar sobre o controle do quê estão as decisões encaminhadas peias diferentes Agên­
cias de Controle. As agências estão destacando diferentes aspectos para o desenvolvi­
mento de culturas mais sustentáveis? Ou apenas criando condições de manutenção das
atuais condições em favor daqueles que detém poder? O desafio aos cientistas
comportamentais nesse contexto é identificar e explicitar os controles escamoteados que
norteiam as decisões de quem determina o planejamento cultural.
Entre as várias Agências de Controle, uma que se destaca por sua abrangência
em transformar o planejamento cultural em condutas humanas é a Educação, Cabe à
Educação fortalecer comportamentos relevantes para o indivíduo atuar de modo a pro­
duzir decorrências de valor social ao grupo de que faz parte. Embora pudéssemos nos
referir a Educação de modo abrangente, vamos delimitar este exame aos processos
chamados de "Educação Ambiental”. O complemento ‘'ambiental” em "Educação" explicita
que o objetivo da educação é ensinar as pessoas a lidarem de maneira mais efetiva e
sustentável com os diferentes aspectos de seu meio. Nesse sentido, a Educação
Ambiental é um dos meios de concretização do planejamento cultural em efetivas con­
dutas humanas rumo a melhores condições de sustentabilidade,
A Educação Ambiental, como Campo de Atuação, tem uma longa história de
lutas, conquistas e desafios no Brasil. O aumento da expressividade dos movimentos
ambientalistas e a iminência de sucessivas crises sociais e ambientais tèm destacado
a importância desse Campo na mudança de hábitos de vida das pessoas e, especial­
mente, na preparação das gerações futuras para lidarem com as demandas e necessi­
dades ambientais.
O aumento de visibilidade sobre esse campo deve-se em muito as condições
ambientais precárias em muitos contextos, como os buracos na camada de ozônio que
já aumentaram a radiação no planeta, a extinção de espécies e nichos ecológicos
inteiros, o aumento da temperatura no planeta, entre tantos outros problemas ambientais
explícitos. Além disso, o futuro previsível indicado por cientistas assusta pelas propor­
ções catastróficas que são indicadas pelas análises disponíveis. Se por um lado o
planejamento cultural nos processos de Educação Ambiental precisa dar conta das
atuais demandas e necessidades, por outro também precisa dar conta das demandas
a médio e longo prazo.
A função da Educação Ambiental é (1) fortalecer discriminações de aspectos do
meio antecedente com os quais os indivíduos precisam estar aptos a lidar, (2) criar
condições para que aspectos do meio conseqüente as ações do indivíduo que são
relacionados a decorrências dessas ações em diferentes âmbitos assumam controle
sobre essas classes de ações e (3) fortalecer o grau de controle dessas classes de

322 Hélder Lima Qusso, André Luiz Freitas Dias


estímulos sobre os comportamentos das pessoas de modo a produzir desenvolvimen­
to mais sustentável e coerente com o projeto de desenvolvimento da comunidade.
Para isso, novamente, é preciso conhecer os aspectos do meio (antecedente e
conseqüente) que devem adquirir a função de classes de estimuíos, e isso implica em
produção de conhecimento e tecnologia. Os indicadores de sustentabilidade do desen­
volvimento são proposições que, em maior ou menor grau, oferecem condições para
que esses eventos ambientais sejam identificados e priorizados em cada contexto
social.
T ra n s fo rm a r as in fo rm a ç õ e s o b tid a s po r m eio de in d ic a d o re s de
sustentabilidade em aspectos a serem considerados pelos organismos em suas con­
dutas não é processo simples. Para que eventos ambientais sutis (previsões de futuro,
por exemplo) possam controlar as atividades dos indivíduos é necessário sofisticado
processo de aprendizagem. Alguns eventos ambientais como (a) “deliberação de polí­
ticos", (b) “tipos de rejeito sólido produzido em casa’1, (c) "consumo de energia de equi­
pamentos em stand by", etc. dependem de planejamento de processo para fortaleci­
mento de relações entre esses eventos e condutas humanas significativas. Alguns
desses eventos, como os exemplificados, devem ser estímulos discriminativos para a
atuação dos organismos (respectivamente: (a) questionar deliberação de políticos,
manifestar desagrado a políticos, influenciar decisões de políticos; (b) diferenciar tipos
de rejeito, embalar apropriadamente cada tipo de rejeito, encaminhar cada tipo de rejei­
to para fins apropriados; (c) identificar equipamentos que consomem energia mesmo
desligados, desligar equipamentos que consomem energia da tomada quando não
estão sendo utilizados etc.). Essas relações dependem de intensa aprendizagem por
meio de processos de ensino planejados para que possam produzir conseqüências de
valor sociai, compatíveis com os ideais de sustentabilidade, ou “bem da cultura". Não é
da "natureza humana” (no sentido biológico do termo), que as pessoas saibam como
lidar com políticos, residuos sólidos ou consumo de energia.
Há eventos ambientais do meio subseqüente as atividades do organismo que
precisam assumir controle sobre tais classes de atividades. Muitos dos produtos das
ações humanas são desconhecidos por aqueles que os produzem ou pelos que tem
que lidar com as decorrências desses produtos em diferentes níveis. Ao organizar um
evento como o Encontro anual da ABPMC, por exemplo, poucos sabem avaliar quanto
‘ carbono" foi liberado na atmosfera em decorrência dessa atividade e o que deveria ser
feito para reduzir o impacto causado. Poucos sabem avaliar o que representa o gasto
energético que equivale ir de carro para o trabalho ou para a faculdade ao invés de
utilizar sistema público de transporte, bicicleta ou ir a pé. Esses produtos (gastos
energéticos ou outras decorrências ambientais) usualmente não têm controle efetivo
sobre o comportamento de quem os produz. Skinner (1987) demonstrou que conseqü­
ências em longo prazo não controlam o com portamento dos organismos. Além de
c o n se q ü ê n cia s em longo p ra zo , po dem os tam bé m a firm a r que os e ve n to s
subseqüentes, sutis ou não, a atividade do organismo e que não é discriminada pelo
organismo, também não controlam seu comportamento. É função da Educação Ambienta!
criar condições para fortalecer as relações entre esses produtos e a atividade dos indiví­
duos.
Alguns tipos de evento ambientais já assumem função de estímulo em nossa
cultura “quase que naturalmente” por haverem conseqüências imediatas a comporta­
mentos a eles relacionados. Já são relações bem controladas em nosso meio, que
facilita a sua aprendizagem por novos indivíduos. Outros comportamentos dependem
de (1) serem identificados pelos planejadores da cultura (professores, políticos, cien-

Sobre Comportamento e Cognição 323


tistas), (2) de condições para que pessoas os aprendam e (3) uma cultura que controle
esses comportamentos.
Para efetivar processos de Educação Ambienta! relacionados ao planejamento
cultural é necessário clareza sobre os eventos que devem controlar as condutas huma­
nas e quais são as atividades humanas que produzirão decorrências compatíveis com
os ideais de sustentabiiidade. É nesse ponto que os indicadores de sustentabiiidade
efetuam sua contribuição ao explicitar quais são esses eventos que devem tornar-se
classes de estímulos. Com classes de estímulos e classes de respostas conhecidas
por aqueles que planejam a cultura, é necessário criar tecnologia para realizar a síntese
dos com portam entos tidos como "sustentáveis". Cabe aos educadores ambientais
transformarem esse insumo (classes de estímulos e classes de respostas) em objetivos
de ensino (comportamentos dos aprendizes) e efetivar condições para fortalecer e
manter tais comportamentos sustentáveis.
Obviamente essa não é função apenas da Educação Ambiental. Se as contin­
gências concorrentes foram mais fortes e incompatíveis com as aprendidas no proces­
so de ensino, a tendência é que esses comportamentos diminuam de freqüência e que
condutas não coerentes com os ideais de “bem da cultura" tomem-se mais fortalecidas.
A Educação depende das demais agências de controle para efetivar o projeto de
planejamento cultural.
Um problema explicito no campo da Educação é que ainda são raros os contex­
tos em que educadores ambientais têm clareza sobre o processo de ensinar compor­
tamentos. Muitas vezes suas práticas ficam restritas a palestras informativas ou m es­
mo atividades vivenciais que nem educadores, nem alunos e nem a sociedade tem
clareza sobre sua função e efetividade. As contribuições da Análise do Comportamento,
em especial da Programação de Ensino, para os processos de ensinar e aprender, e
para a avaliação desses processos, ainda são desconhecidos pelos educadores (e,
talvez, mesmo pelos próprios analistas do comportamento..,).

4. Considerações finais
O conhecimento produzido em Análise do Comportamento oferece contribui­
ções para a e la b o ra çã o , a p e rfe iç o a m e n to e a va lia çã o de In d ica d o re s de
Sustentabiiidade, utilizados para nortear planejamento cultural. Mas não temos noticias
de analistas do comportamento atuando neste campo.
O conhecimento produzido em Análise do Comportamento oferece contribui­
ções significativas para identificar comportamentos de valor social, ou comportamentos
sustentáveis, ou ainda comportamentos pró-ambientaís, importantes de serem ensi­
nados (objetivos de ensino). As descobertas de quais aspectos do meio precisam
adquirir a função de estímulo para as respostas dos organismos, aumenta a visibilida­
de acerca das condutas que há necessidade de serem ensinadas. Há necessidade de
ampliar o acesso à esse conhecimento para outros âmbitos da Educação, em Especial
à Educação Ambiental.
O conhecimento produzido em Análise do Comportamento oferece contribui­
ções para transformar objetivos de ensino em condutas efetivas das pessoas. Parece
haver necessidade de ampliar as contribuições da Análise do Comportamento na for­
mação dos profissionais responsáveis por ensinar comportamentos sustentáveis ou
pró-ambientais.
O campo de atuação profissional para o analistas do comportamento, seja no
desenvolvimento de indicadores de sustentabiiidade ou, especialmente, no desenvolvi-

324 Hélder Lima Qusso, André Luiz Freitas Diãs


nie n to d e te c n o lo g ia c o m p o rta m e n ta l p a ra tra n s fo rm a r a s in fo rm a ç õ e s o b tid a s p o r m o io
d e s s e s in d ic a d o re s e m c o m p o r ta m e n to s d e v a lo r s o c ia l no p la n e ja m e n to c u ltu ra l d o
o rg a n iz a ç õ e s , c o m u n id a d e s , c id a d e s , n a ç õ e s e do p la n e ta é vas to . H á p e r s p e c tiv a s d e
c o n trib u iç õ e s q u e p o d e m a u x ilia r m u ito no " d e s e n v o lv im e n to s u s te n tá v e l" d o n o s s o
p a ís . T e m o s c o n d iç õ e s d e e n fr e n ta r o d e s a fio d e s a ir d a s g e n e r a lid a d e s d o d is c u rs o
p ó s -m o d e rn o d e " d e s e n v o lv im e n to s u s te n tá v e l” e id e n tific a r a ç õ e s h u m a n a s , s e u s p r o ­
du tos e os c o n te x to s d e o c o rrê n c ia q u e c a ra c te riz a m e s s e c o n c o ito e tr a n s fo rm á -lo s ,
por m e io do e n s in o d e s s e s c o m p o rta m e n to s , e m c o n d u ta s e fe tiv a s

A escolha é clara: ou não fazemos nada e permitimos que um fuíuro miserável c


provavelmente catastrófico nos alcance, ou usamos nosso conhecim ento sobre u
comportamento humano para criar um ambiento sodal no qual poderemos viver vidas
produtivas e criativas, e fazemos isso, sem pôr em risco as chances de que aqueles
que se seguirão a nós serão capazes de fazer o mesmo. (Skinner, 1978, p.66)

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ministrado no sem inário Gestão A m biental no Estado de São Paulo: Políticas, plan ejam ento e
gerenciam ento em fevereiro de 2006.

Sobre Comportamento e Coçnifáo 325


i
Capítulo 27
O papel dos reforçadores sociais na
manutenção de crenças sobre
características entre homens e
mulheres: um estudo a partir do
software belief
Luciano de Sousa C unha'
Filipe M o re ira V asconcelos
Lui/a Cjeaquinto M ach ad o
Paola Porto C âm ara de Freitas
Paula N u n e s Lima
Priscila de A s s is N o g u e ira
Renan C/rilo de A lm e id a
Rosalína Barros Ç orn cs,
Sarah M u zi C ardoso
W agner Petri Travesani“
U W

Elizeu Batista B orloti” '


UFES

Introdução
Analistas do comportamento têm investido cada vez mais em estudos que
englobam assuntos das ciências sociais, descrevendo o processo psicossocial e tam­
bém gerando alternativas para seu controle e, conseqüentemente, para a sua mudança
(Sundberg & Partington, 1983; Oah, 1989; De Rose, 1994; Verplanck, 1955). Como
ocorre nos estudos das ciências sociais, a maior parte dos estudos dos analistas de
comportamento utilizam amplamente o relato verbal como fonte de dados, em entrevis­
tas pós-experimentais ou de outro tipo, em levantamentos e avaliações padronizadas,

' Mestre em Psicologia pelo Programa de Pós Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Espírito Santo, Professor do Curso de
Graduação cm Psiralogia do Centro Universitário Vila Velha Coordenador do Grupo de Estudos em Análise do Comportamento e Práticas
Culturais E-ryiaii para correspondência: ludano.ajiiiia@ o' coíH.tjr
Discentes do Curso de Graduação em Psicologia do Centro Universitário Vila Velha ( U W ) e membros do Grupo de Estudos em Anãiise do
Comportamento e Práticas Culturais
ProfcssorColabm adordoGrupoíteEsttKtoseni Análise do Comportamento e Práticas Culturais
Doutorem Psicologia oela P U C -SP Especialista em Terapia Comportamental e Cognitiva pela USP e em Terapia Comportamentaídc G aipos
peia P U C -S P Professor Pesquisador da Universidade Federal óo Espirito Santo e do Programa de Pás-Graduação em Psicologia da mesma
Universidade. E-moil: boroti@hotmail.oom

Sobre Comportamenlo c Cognição 327


dentre outros, isto confirma aquilo que constatou De Rose (1995/2001)1: a Psicologia (e
também as Ciências Sociais), está freqüentemente interessada no comportamento
verbal per se e também pelo comportamento verbal como um relato de comportamen­
tos. eventos ou estados, aos quais não se tem acesso fácil ou diroto. Assim; por exem­
plo, “ideologias" são analisadas em relatos verbais sobre atitudes diante de proprieda­
des do ambiente social ou político (Borloti, 2004).
Skinner (1989/2003) defende a importância da análise funcional do comporta­
mento operante “relatar”, enfatizando que os analistas do comportamento indaguem as
pessoas sobre o que estão sentindo ou pensando. Ao se estudar o que as pessoas
pensam ou sentem, certas perguntas feitas a elas próprias ou a pessoas de seu con­
vívio são formas eficazes de acessar processos psicossociais. Outras formas incluem
a análise de produtos do comportamento verbal (por exemplo, depoimentos em revis­
tas), mas, em qualquer forma, falar de uma investigação direta do processo psicossocial
é problemático. É por isso que, quase sempre, o processo psicossocial (ideologia,
crença, representação social, identidade social) tem sido inferido do comportamento
verbal ou do seu produto.
Skinner (1957) discutiu essa questão, concluindo que a observação do com­
portamento verbal permite a inferência das histórias {fiiogenética, ontogenética e cultu­
ral) que o determinam, ou seja, as relações funcionais entre essas histórias e o com­
portamento. Esta tese desencadeou uma série de pesquisas relativas ao comporta­
mento verbal, uma parte tendo como objetivo demonstrar que este era susceptível de
alterações em função de suas conseqüências (Matos & Tomanari, 2002; De Rose,
1994). Em algumas dessas pesquisas (por exemplo, os estudos dc Krasner, 1958;
Tomanari, Matos, Pavão & Benassi, 1999) pedia-se ao sujeito experimental que falasse
alguma coisa. Se sua fala se encaixasse dentro de um critério pré-estabelecido pelo
experimentador, era seguida por uma conseqüência específica; se excluída do critério,
não era conseqüenciada. Geralmente, essa conseqüência diferencial consistia em
alguma forma de interação social sinalizadora de aprovação, tais como um sorriso, um
“muito bem", ou outro comportamento. Os resultados dessas pesquisas mostravam
que conseqüenciando determinada resposta, a freqüência com que ela se repetia au­
mentava, sugerindo que a conseqüência funcionou como reforçador, independente de o
sujeito estar “consciente” ou não do fato de que aquilo que falava estava sendo reforça­
do com aprovação.
Apesar da quantidade de estudos empíricos {Sundberg & Partington, 1983;
Oah, 1989; De Rose. 1994; Verplanck, 1955) McPherson, Bonem, Green & Orborne
(19B4) consideram que ainda existem poucos estudos sobre esses temas, essa “timi­
dez" é possivelmente metodológica, dada a dificuldade de se isolarem os fatores envol­
vidos em episódios verbais em condições experimentalmente controladas.
Vencendo um pouco essa “timidez” , o presente estudo se insere na mesma
linha dos estudos citados por Matos & Tomanari (2002), e se faz relevante, à medida que
nos permite identificar algumas variáveis que possam estar determinando a manuten­
ção do aspecto '‘crença" do comportamento verbal. Desta maneira, o objetivo foi verificar
experimentalmente a função do reforçador (conseqüência) social na manutenção de
crenças sobre características fem ininas e masculinas. A verificação da eficácia do
software Belief 1.0 (Cunha & Borloti, 2005) em estudos experimentais acerca de proces­
sos psicossociais envolvendo o aspecto "crença" do comportamento verbal constitui o
objetivo específico do presente estudo.
O que se percebe, é que isolar variáveis para esses estudos pode se configurar
como uma opção viável, pois outra afirmação, freqüentemente utilizada, é de que os

' Todas as vezes que uma referência possuir duas calas, 8 primeira se refere àobra o rtg lnaleasegurd a se refere à obra consultada.

Lüciano de S. Cunha, Fdip* M . Vasconceios, Liriza Q. Machado. Taola P C de Frtitis, Paula N . Lima, Pri^íJd df A . Nogueira. Renan Ç.
328 d* Almeida, R o t in a B. Çorces, Sarah M . Cardoso, Wagner P. Travesarú tíceu fcatisto B w b fí“
analistas do comportamento não são classificados como pesquisadores em P s ic n lo
gia Social. Na verdade, é dito que a análise do comportamento tem negligenciado <>s
fenômenos sociais (Guerin, 1992). Isso se deriva de uma crítica freqüente, segundo a
qua! a Análise Experimental do Comportamento (AEG) explicaria apenas fe n ó m e n o s
simples, não abarcando a complexidade inerente aos fenómenos sociais.
O que se sabe é que a AEC investiga as relações organismo-ambiente, incluin­
do não somente os comportamentos individuais aprendidos por moio dc exposição
direta às contingências, instruções verbais ou modelação, mas também os comporta­
mentos emitidos pelos indivíduos em grupo (Guerin, 1992). A única diferença entre
essas contingências individuais e sociais seria, portanto, de cumplexidnde, tendo em
vista que as interações sociais são broves, são diferentes quando se relaciona com
diferentes indivíduos, a presença de novos indivíduos podom modificá-las, várias con­
tingências são disponibilizadas simultaneamente, ou seja, amplia se o nível de análise
das variáveis que afetam o comportamento.
Outro exemplo de que a Análise do Comportamento têm estudado essas rela­
ções de contingências complexas, deriva da introdução do conceito de metacontingôncias,
proposto por Glenn (1988), que descrevem relações funcionais no nível cultuial. E ssas
relações envolvem práticas culturais e seus produtos. As próprias práticas culturais sào
compostas de contingências comportamentais entrelaçadas (fala-se em contingências
comportamentais entrelaçadas quando o comportamento de um indivíduo tem duplo
papel: o papel de ação e o papel de ambiente comportamental para a ação dos outros).
Desta forma, o ecossistema comportamental de cada humano individual passa a ser
integrado em um sistema maior, algumas vezes chamado de “sistema social", que é
composto de contingências comportamentais entrelaçadas, ou contingências sociais.
Isso exige que se enfatize uma sensibilidade aos outros membros da espécie,

Comportamento verbal e crença


Um comportamento operante é controlado pelos estímulos antecedentes e
mantido pelas suas conseqüências. Uma vez que o comportamento verbal é um operante,
ele também é adquirido e mantido deste modo (Skinner, 1957) e o mesmo pode ser
afirmado para todos os aspectos que o compõem: ironia, ênfase, ideologia, crença e
assim por diante. Todos estes aspectos produzem um primeiro efeito sobre um outro
comportamento, seja do próprio falante ou de um ouvinte. Algumas das conseqüências
sobre o ouvinte ajudam a entender como um determinado aspecto do comportamento
verbal se modela e se mantém, caracterizando o uso da linguagem em uma dada
comunidade verbal (ou, como diriam os cientistas sociais, um grupo social).
Para começar, a linguagem tem um efeito emocional relacionado à maneira
como ela foi edificada numa dada comunidade. As condições associadas à emoção se
relacionam com o reforço e com as contingências de privação e de controle aversivo e
podem ser inferidas da ‘‘força" ou da ‘‘maneira" de emissão do comportamento verbal.
Assim, inferimos “seriedade”, “desibinição” , “calma”, “irritação’' e outros estados emoci­
onais do falante pela topografia do falar, baseados em uma história de reforçamento
prévia por uma comunidade verbal. As exclamações e interjeições são elementos im ­
portantes na análise de emoções e sua função pode ser analisada, também, a partir
das variáveis do contexto.
A análise da emoção que acompanha o comportamento verbal indica a impor­
tância que o faiante atribui à conseqüência de afetar o ouvinte. O grau de importância
deste efeito se relaciona diretamente ao controle de estímulo do comportamento verbal
e, por isso, o contexto do episódio verbal é o subsídio fundamental para essa análise.

Sobre Comportamento e Cognição 329


As descrições de estados emocionais ou a ênfase em condições descritas ajudam na
anáüse da função que o contexto tem no controle do comportamento ao longo do episó­
dio verba!: 1Eu discordo do que você disse. Aliás, eu discordo totalmente e fico triste de
saber que você pensa assim".
O comportamento do ouvinte depende, obviamente, da sua história de vida e
das condições desta história que o condicionaram enquanto ta!: pessoas que lhe são
interessantes ou não, pessoas com voz monótona ou energética, pessoas que falam o
que ele quer ou não quer ouvir, ou desafiam aquilo que ele fala. Nesta história única,
ouvir algumas pessoas foi mais reforçador que ouvir outras, e as primeiras tem maior
probabilidade de serem fontes de inspiração verbal, não só do que elas falam, mas do
como falam, e o comportamento verbal passa a gerar auto-reforço automático pelo uso
de palavras emprestadas dessas fontes admiradas.
Essas interações remetem a analise das combinações de variáveis que con­
duzem a noção de ’'crença" no que é dito. De acordo com Skinner (1957), se o ouvinte for
bem sucedido ao responder ao comportamento verbal do falante (ou já foi reforçado ao
responder comportamentos semelhantes) sua crença será forte; se o falante indica
claramente as propriedades que controlam seus tatos, "aceitamos as palavras dele";
caso contrário o cenário esta montado para um embate verbal de negociações diver­
gentes. Na tentativa de convencer o ouvinte, o falante pode adequar as características
formais do comportamento verbal ao ‘ sentido” que está querendo comunicar (por exemplo,
alterando o timbre para intensificar "perigo” no relato de uma situação). Ou seja, a ação
efetiva do falante dependerá de sua habilidade em convencer o ouvinte de que realmen­
te está tateando a realidade. Fica claro, então, que a crença dependerá do crivo das
práticas verbais das pessoas, e assim, "A freqüência relativa com a qual o ouvinte se
engaja numa ação eficiente ao responder ao comportamento na forma de tato depende­
rá da extensão e da precisão do controle do estimulo do comportamento do falante"
(p. 115). Variáveis adicionais da ocasião são consideradas pelo ouvinte na crença ao
que é dito pelo falante e, por este, no fortalecimento de seu poder de persuasão. Porém,
o reforço generalizado2 do tato pode desvinculá-lo da condição momentânea e, assim,
um intraverbaí pode ser reforçado como se fosse um tato. O falante acredita que "vale a
pena fa la f’ e o ouvinte "que vaie a pena ouvir” e poucas formas variadas de falar sobre
um assunto podem ocorrer. Portanto, é possível entender as variáveis que explicam o
"exagero" e a aceitação ou a punição do “exagero" na abordagem de um assunto: pela
análise da importância prática do que é dito e da sua função na manutenção do episó­
dio verbal.
Em síntese, ao falar o que acredita, o falante instrui o ouvinte a se comportar de
uma dada forma. Portanto, nos termos da Análise do Comportamento, uma crença pode
ser interpretada como uma regra para ação, ou seja, quando dizemos que uma pessoa
crê ou acredita em algo, estamos dizendo que efa provavelmente sabe indicar quais as
possíveis conseqüências para determinados comportamentos e em que situações
essas conseqüências têm maior probabilidade de ocorrência. De acordo com Guerin
(1994) o aspecto verbal de uma crença pode ser definido como uma certa combinação
de operantes verbais. O falante tateia situações e conseqüências comportamentais
nessas situações e instrui o ouvinte (que pode ser ele mesmo) a se comportar em uma
certa direção nessas situações, compelindo à crença a função operante do mando
indicar o reforçador específico do acreditar na crença.

3 “O reforço generalizado é a chavc do sucesso das discursos práücos e denlífioos £ * oolooa o comportamento do falante mais estreilamenlc
sebo controle do meto ambiente e permite que o oiMnte reajas esse oomportamerto com rnaissuoessoemlugarde um conta lo direlo com o .-nejo'.
(SWnnof, 1957.182}

Lucidno de Ç. Cunha. Filipe M . Vasconcclos, Luiza Q . M a:hadcf Paola P. C. dc frcíUs, Pauta N . Lima, Priscila dc A . Noç.ueln. Renati Q
330 He Aimelda, Rosaiína L/c^ev M , t jaíosü, Wagner P. T.^vrw ni Fatistd BíXioff
É desta forma que a crença poderá indicar uma pré-disposição para um deter­
minado comportamento, ou seja, uma pessoa saberia discriminar em que situações
ela deve se comportar e como ela deve se comportar para ter acesso a determinadas
conseqüências reforçadoras (isto pode ser explícito como em “Se estiver grávida, não
aborte ou vai se arrepender pelo resto da vida” ou implícito como em “Eu sou contra o
aborto”}.
Segundo a Análise do Comportamento, não basta descrever como uma crença
foi adquirida; é preciso explicar (e demonstrar) o que a mantém. Estes dois objetivos
permitem uma descrição das variáveis que explicam a crença, evitando assim o argu­
mento de que a crença ou o comportamento de acreditar em algo soja causa de um
outro comportamento, como ocorre como outros processos como ideologias ou repre­
sentações. Do ponto de vista comportamental, uma pessoa vai à igreja não porque
acredita em Deus, mas porque determinadas conseqüências - nesse caso específico,
reforçadores sociais - aumentam a probabilidade de ocorrência desse comportamen­
to. A crença pode atuar como regra no governo de outros comportamentos, entretanto, a
formação e manutenção tanto da crença quanto do comportamento social por ela gover­
nado tiveram origem nas contingências sociais. Este estudo simplifica algumas des­
sas contingências em episódios verbais simulados por um software.

Método
Participaram deste estudo 80 estudantes de ensino médio da Grande Vitória,
com idade variando entre 15 e 17 anos, de ambos os sexos (40 meninos e 40 meninas).
Os responsáveis pelos participantes eram solicitados a ler e assinar um Termo de
Consentimento Livre e Esclarecido e podendo desistir ou cancelar a sua autorização a
qualquer momento sem nenhum tipo de ônus.
O procedimento foi executado num ambiente livre de interferências externas,
equipado com um computador contendo o software Belief 1.0 (Cunha & Borloti, 2005).
Além do computador, era disponibilizado para os participantes um cartão com instrução
e dois questionários (para serem respondidos antes e depois do experimento).
O software apresenta em sua janela principal links para configuração do deli­
neamento experimental, onde podem ser configurados todos os estímulos a serem
apresentados, os procedimentos, as informações sobre todos os participantes.
Utilizou-se um delineamento ABA. Num primeiro momento, foi feita uma medi­
da de linha de base, na qual o participante deveria responder um questionário contendo
questões referentes à características femininas e masculinas, tendo duas (2) opções
de respostas; feminino ou masculino. Uma vez que o procedimento foi delineado para
reforçar, de forma invertida, características atribuídas pelo participante ao sexo oposto,
foram selecionados os primeiros quarenta (80) participantes que responderam de for­
ma esperada às questões do questionário, para que não houvesse necessidade de
mudanças na configuração do procedimento.
Após responderem o questionário, os participantes eram encaminhados até o
computador e recebiam a instrução para o procedimento: “Foi realizada na Universida­
de de Federal Brasileira3 uma pesquisa a respeito de características atribuídas ao sexo
feminino e ao masculino. Tal pesquisa revela que algumas das características relaciona­
das a determinado sexo podem na realidade estar ligadas ao outro. Sabemos que em
nossa cultura muitas crenças a respeito dos papéis de homens e mulheres são reforça­
das, a fim de atribuir a cada um determinadas funções. Desse modo esta pesquisa vem
contrariar algumas concepções errôneas acerca de tal assunto e desmentir mitos refor­

Sobre Comportamento c Cognição 331


çados socialmente. Este estudo tem por objetivo verificar quais das concepções que você
tem acerca das características femininas e masculinas são verdadeiras. Para isso, você
irá passar por um treinamento em um programa de computador em que iremos ensiná-
fo a identificar os mitos e as verdades a respeito das características femininas e mascu­
linas. O programa irá apresentar cada pergunta do questionário na parte superior centra]
da tela e duas (2) opções de resposta na parte inferior da tela. Ao clicar em uma das
opções de resposta o programa irá lhe informar se você acertou ou não. Para cada
resposta correta durante o treinamento, vocé irá receber um ponto, que será contabilizado
no canto superior direito da tela do programa. O participante com maior número de pontos
irá receber 20 reais corno bonificação. Tente acertar o maior número possível de ques­
tões. Se tiver dúvidas, pergunte ao responsável pelo treinamento, que estará ao seu lado.
Clique em iniciar para começar seu treinamento”.
A partir daí dava-se início a segunda fase do procedimento - fase de reforçamento
-n a quai quatro (4) das dez (10) “crenças” utilizadas na Medida da Linha de Base foram
se le cio n a s para serem re fo rça d a s e rro n e a m e n te , ou seja, nessas qu e stõ e s
selecionadas, era reforçado o comportamento de responder o contrário do respondido
durante a fase de linha de base. As características foram : vaidade (fem inina),
agressividade (m asculina), se n sib ilidad e (fem inina), racion alidad e (m asculina),
competitividade (masculina), falar muito (feminina), força física (masculina), generosi­
dade (feminina), praticidade (masculina) e afetividade (feminina), sendo as quatro pri­
meiras as que foram reforçadas erroneamente. A escolha dessas opções foi aleatória.
Cada uma das questões do questionário eram apresentadas 5 vezes e de maneira
aleatória para o participante.
A variável independente, aquela manipulada foi a aprovação social, um reforçador
natural que foi somado ao poder reforçador arbitrário de uma quantia em dinheiro, pois
em outras pesquisas (Critchfield, Paletz, MacAleese & Newland, 2003) foi verificado que
o dinheiro era um reforçador efetivo devido ao seu valorgeneralizado tomar mais efetivos
os efeitos de outras contingências. Desta forma, aprovação social e dinheiro foram
conseqüenciados à variável dependente "responder de modo errôneo as mesmas per­
guntas do questionário da linha de base” , que poderia, genericamente, de acordo com
a definição de Guerin (1994), ser a "crença em relação a características de homens e
mulheres".

Figura 1 - Descrição esquemática do procedimento adotado

í Mornefictfcio.

L u c ú ik ) do Cunha, Filipe M . Vdtconceto^ Lui^a Q. Machado, Paola P. C. de Freitas, PauLi N . Uma, PrisdU de A . NéçtLdra, Jknan Q.
d* Alm ada. Ro&aima B. Qornfs, Sarah M . Cardoso, Wagner P. Trâvcuru EJizeu Batisto BorJoti“
O software emite um relatório com todas as respostas dos participantes, o <|ue
permite a elaboração de um histograma em que podemos identificar quantas v f^c s olc
acertou cada questão ou quantas vezes ele afirmou uma determinada crença ou por
quantos reforça mentos ela se manteve ou foi modificada.
Após concluir a fase de reforçamento, os participantes eram solicitados a res
ponder a seguinte questão: “Agora que você passou pelo treinamento no software
responda as questões abaixo de acordo com os conhecimentos adquiridos sobre
características masculinas e femininas". Nessa fase eram apresentadas novamente
as dez (10) questões iniciais, para que pudessem ser comparadas as respostas da
fase Unha de Base e as respostas após a Fase de Reforçamento. Após o procedimen­
to, cada participante recebeu explicações sobre a pesquisa e foi esclarecido quais
eram as respostas corretas e quais as erradas.

Resultados:
A seguir, serão apresentadas as freqüências das respostas dos participantes
para as questões reforçadas erroneamente.

Frequência Relativa

■ Respostas para O pção H om em El Respostas para O pção M u lh e r

Freq uên cia R elativa das Respostas para o item V aid ade - Gráfico 1

Ao preencherem ao questionário de linha de base, todos participantes (N=80)


responderam que a característica vaidade era predominantemente relacionada ao sexo
feminino. Durante a primeira pergunta da fase de reforçamento 20% dos participantes
do sexo masculino (N=8) mudaram de opinião, enquanto não se observou essa m u­
dança em nenhuma das participantes do sexo feminino. Já na segunda pergunta da
fase de reforçamento, 70% dos participantes do sexo masculino (N=28) assinalaram
que vaidade è uma característica masculina, enquanto 50% das participantes do sexo
feminino (N= 20) passaram a compartilhar da mesma opinião. Na terceira pergunta da

Sobre Comportamento e Cognição 3 3 3


fase de reforçamento 90% dos participantes do sexo masculino (N=36) e 20% dos
participantes do sexo feminino (N=8) afirmaram que esta era uma característica femini­
na. Durante a quarta pergunta da fase de reforçamento, 85% do total de participantes
(N=68) assinalaram que vaidade era urna característica masculina. Na última fase de
reforçamento, 90% dos participantes do sexo masculino (N=36) indicaram ser a vaida­
de uma característica masculina, enquanto as respostas das participantes do sexo
feminino permaneceram com freqüência de 85% (N=34) o mesmo. Finalmente, no
questionário pós-experimental, observou-se que 75% dos participantes do sexo mas­
culino (N=30) e 80% dos participantes do sexo oposto (N=32), afirmaram que vaidade é
uma característica masculina.
Em relação à característica Vaidade, pode-se inferir que a idade dos participan­
tes pode ter contribuído para tamanha variação. Os participantes eram adolescentes,
fase na qual a preocupação com a estética é muito grande tanto em meninas como em
meninos. Dessa maneira, tais adolescentes podem ter levado em conta o fato de que
muitos meninos dessa idade cuidam de sua aparência, o que pode ser relacionado a
afirmação de Levisky et al. (1997) e Taquette (1997), que citam que durante a adolescên­
cia, o indivíduo se apresenta mais instável e vulnerável às influências externas, se
constituindo num momento oportuno para incorporação de valores. Isso se confirma ao
se levar em conta o momento atual. Atualmente a preocupação com o corpo, com a
aparência, está presente em ambos os sexos, o que pode ser ilustrado pelo surgimento
de cosméticos masculinos e com o aumento dos cuidados dos homens com o corpo,
essa visão sobre a vaidade possa ter sido tão efetivamente mudada não apenas pelos
reforçadores emitidos pelo software, mas também pelo contexto cultural.

Frequência Relativa

| M R esp o stas pa ra O pção H o m s m B Resp ostas p a ra O p ç S o M u lh e r |

F r e q u ê n c ia R e la tiv a d a s R esp o stas p a ra o ite m A g re s s iv id a d e - G rá fic o 2

Para o item agressividade, 100% dos participantes de ambos os sexos (N=80)


responderam no questionário de linhgÉIe base que este estava relacionado com o sexo
masculino. Na primeira pergunta-âépalíe de reforçamento 5% dos participantes do sexo
masculino (N=2) mudaram de opiníetò. Já na segunda pergunta da fase de reforçamento
observa-se um# mudança, em que 55% dos participantes masculinos (N=22) e 40% dos
participantes'do sexo oposto (N=16) responderam como fem inina a característica
agressividade. Na terceira fase de reforçamento, 45% dos participantes do sexo mascu-

334 LuctâftodeS. Cunha, Fttp* M . Vasconcelos, Luíza Q. Machádo, Paola P. C. d* Frrifds, Píuta N. Umd. friscild de A . Nogueird R^rtan Q<
dc Abneidd, Reclina B. Qomes, Sorâh M . P Trrivfsarti, E!iz?u Batiste Borlotí**
iino (N = 18) e 30% dos participantes do sexo feminino (N = 12) assinalaram como femininn
a mesma característica. Na quarta pergunta da fase de reforçamento 70% (N -28) o 50%
(N=20) dos participantes do sexo masculino e feminino. respectivamente, compartilha
ram da opinião de que o item em questão se reteria a uma característica comum ao
feminino. Na última pergunta da fase de reforçamento. 65% dos participanlos dn sexo
masculino (N -26) e 55% dos participantes do sexo feminino (N=22) indicaram corno
feminina a característica Agressividade. No questionário pos-expenrriental foi registrada
uma mudança no aspecto crença para 55% (N=22) dos participantes do sexo masculino,
enquanto 50% (N-20) das participantes do sexo feminino mudaram sua resposta
Para a questão agressividade, um fator que pode ter contribuído para a mudan­
ça do aspecto “crença", é a mudança na posição da mulher deritro da sociedade.
Atualmente as mulheres não são mais vistas como seres 'dóceis", “frágeis” e “indefe­
sos". Passaram a atuar no mercado de trabalho e a sc posicionar muito mais firme­
mente diante dos homens, isso pode ter feito com que as mulheres fossem considera­
das agressivas, por lutarem por seus direitos e não se colocarem numa posição inferior
diante dos homens. Com essa nova visão da mulher corn a qual os adolescentes têm
contato, essa característica pôde facilmente ser relacionada com o sexo feminino. Outra
possibilidade sobre este aspecto pode ser observada através das evidências de Cohen
(2004), de que homens e mulheres praticam agressão, só que existem formas diferen­
tes de demonstrá-la. Os homens geralmente praticam uma agressão mais direta, com
s o c o s e pontapés, enquanto que as mulheres praticam uma agressão indireta, que
acontece sem que as pessoas sg toquem, c o m o uma critica destrutiva, por exemplo.
Essa seria uma possível causa dessa mudança entre as respostas destes adolescen­
tes, d a d o s os efeitos produzidos pe la agressão indireta ou direta, podendo então, ser
uma característica relacionada à mulher.

Frequê ncia Relativa

■ Respostas para Opção Homem s! Respostas para Opção Mulher

Frequência Relativa das Respostas para o item Sensibilidade - Gráfico 3

Sobre Comportamento e Cognição 335


Quando questionados peta primeira vez (linha de base) em relação à Sensibili­
dade, iodos participantes de ambos os sexos (N=80) responderam que esta é uma
característica predominantemente feminina. Somente 5% dos participantes do sexo mas­
culino (N=2) mudaram sua resposta na primeira pergunta da fase de reforçamento. Na
segunda pergunta da fase de reforçamento esse número aumentou para 70% entre os
participantes masculinos (N=28) e 20% entre os participantes do sexo oposto (N=8). Na
terceira pergunta da fase de reforçamento o número de respostas da característica Sen­
sibilidade como pertencente ao sexo masculino foi de 65% (N=26) e 25% (N=10), para
participantes masculinos e femininos, respectivamente. Na quarta pergunta da fase de
reforçamento 60% dos participantes do sexo masculino (N=24) e 35% do sexo oposto
(N=14) consideraram a Sensibilidade como característica masculina. Na última pergunta
da fase de reforçamento as respostas dos participantes do sexo masculino se mantive­
ram como na fase anterior, enquanto o número de respostas dos participantes do sexo
feminino aumentou para 40% (N=16). No questionário pós-experimentai, a percentagem
masculina diminuiu para 55% (N=22) enquanto somente 5% dos participantes do sexo
feminino (N=2) consideraram como masculino o item Sensibilidade. Tai fato pode ser
atribuído à história de reforçamento cultural.
Culturalmente, é aprendido que mulheres choram mais que os homens, que são
mais amorosas e dóceis, comportamentos relacionados diretamente com a sensibilida­
de, que freqüentemente são emitidos pelas mulheres, já que as mesmas sofrem cobran­
ças sociais para que apresentem tais características. Na convenção masculina baseada
em um senso comum, o homem forte “não chora", nem deixa transparecer fragilidade.
Em contraposição, a mulher por ter menos força física passa a ser vista como o oposto de
tudo isto, ou seja, mole, fraca, insegura, chorona, inconsistente. Assim, além de “segundo
sexo”, as mulheres são identificadas como o “sexo frágil”.
O reforço disponibilizado pelo software, no presente trabalho, procurava refor­
çar exatamente o contrário do que a sociedade reforça normalmente, e a grande maioria
não conseguiu se desvincular dessa influência social, revelando que a história de
reforçamento corrompeu a aprendizagem promovida pelo software.

Fraquénela Rolatlva

■ R e sp o stas p ara O pçã o H om em O R espostas p a ra O p ç ã o M u lh e r

F re q u ê n c ia R elativa das R espostas pa ra o Ite m R a c io n a lid a d e - G ráfic o 4

L u a a n o de S. C u n h a , Filipe M . Vasconcelos Luiza L,. M a c h a d o , PacLj P. r . de F re iía i, Pauta N . I im a . P n srila de A . N o g u e ira , R enaíí Q-
de A h t í t d a . Rosa li na R. Ç o m « , Sa/ah M . C <y',k>si! W a g n e r P. TravesanC Elizeu B a ta ta B o rlo iP
Na fase de linha de base desse item, todos os participantes (N=80) responde­
ram que a Racionalidade e uma característica masculina. Na primeira pergunta da fase
de reforçamento 35% dos participantes do sexo masculino (N=14) e 20% dos partici­
pantes do sexo feminino (N -8) responderam de forma oposta à faso de linha de base
Na segunda pergunta fase de reforçamento. o número de participantes aumentou para
65% para o sexo masculino (N=26) e o número de participantes do sexo feminino
aumentou para 35% (N-14). Na terceira pergunta da fase dc reforçamento 50% dos
participantes de ambos os sexos (N-4Ü) responderam como sendo feminino o item em
questão. Na quarta pergunta da fase de reforçamento 65% dos participantes do sexo
masculino (N=26) e 60% das respostas assinaladas pelos participantes do sexo fem i­
nino (N -24) referiram-se à Racionalidade como uma característica feminina. Na quinta
pergunta da fase de reforçamento, 75% dos participantes do sexo masculino (N=30)
responderam como sendo feminino o item Racionalidade, enquanto 50% das partici­
pantes do sexo ferninino (N~20) consideraram desta forma.
Essa mudança pode ter sido ocasionada devido à mudança de atitude tanto de
mulheres quanto de homens na sociedade. Como já discutido acerca da agressividade,
também nessa característica, culturalmente o homem é sempre tido como o mais racional
e o que sempre privilegia a razão em detrimento da emoçao. Ao contrário da mulher, que
sempre se deixa influenciar pela emoção e não tem controle sobre seus sentimentos.
Agostinho, Bauer & Predebon (2002) afirmam que reconhecer que as emoções e os senti­
mentos fortes podem alterar comportamentos operantes, e isso habitualmente é atribuído
a uma racionalidade. Uma hipótese é que esse seja o motivo pelo qual os participantes na
linha de base atribuírem a característica racionalidade ao sexo masculino.
Outro aspecto relevante a ser ressaltado, é que foi possível percober nos resul­
tados obtidos que mesmo as características que não foram reforçadas erroneamente,
foram modificadas pelos participantes, no entanto, com freqüências reduzidas. Essa
mudança ocorreu principalmente durante as fases de reforçamento, visto que no ques­
tionário pós-experimental tal modificação não foi revelada.

Considerações Finais
Esses dados permitem afirmar que crenças são comportamentos sujeitos as
mesmas leis e princípios que qualquer outro comportamento e que os reforçadores
sociais aumentaram a freqüência de respostas de crenças errôneas, mesmo que uma
crença correta oposta tenha sido fortalecida anteriormente pela comunidade verbal do
“crente". Há algumas interpretações possíveis para este fato.
Um primeiro aspecto a se considerar é o poder do reforçamento social provido
pela situação experimental na qual o ouvinte (o experimentador ou o software produzido
pela equipe de uma Instituição Federal de Ensino Superior fictícia) supostamente per­
tencia a um grupo que sabia o que dizia acerca do tema proposto. Skinner (1957) diria
que, neste experimento, a crença inicial observada na linha de base do participante não
foi bem sucedida em responder ao comportamento verbal do ouvinte (o participante nêo
teve seu comportamento verbai inicial reforçado pelo software) e, portanto, sua crença
inicialmente “forte” tomou-se fraca. Parafraseando Skinner, os participantes “aceitaram
as palavras dele" (da suposta Instituição Federal de Ensino Superior). Resultados simi­
lares foram encontrados no estudo de Verplanck (1955), em que ele criou um procedi­
mento para reforçar opiniões.
Um segundo aspecto a ser interpretado é o como esse “poder” da suposta
Instituição Federal de Ensino Superior como interlocutora no reforçamento, mediado

Sobre Comportamento e Cognição


parece ser mais ou menos creditado em algumas crenças. Por exemplo, a crença
''Sensibilidade” obteve uma freqüência menor que as outras crenças. Em termos dos
operantes verbais (Skinner, 1957; Guerin, 1994), esta crença g um aspecto de um tato
impreciso, pois não descreve circunstâncias con;atadas pelos participantes como sen­
do possivelmente reais. As demais crenças, por outro lado, deram margem a dúvidas e,
assim, abalaram a história de reforçamento prévia dos participantes. Acreditar naquilo
que é dúvida pode estar sendo mantido pelo reforço generalizado da aprovação pela
precaução, pois ‘'vale a pena duvidar" de algumas crenças e não de outras (Skinner,
1957). Entretanto, não se pode esperar que, mesmo com uma metodologia adequada­
mente empregada na mudança de crenças, as pessoas passem a se comportar instru­
ídas por elas. É prcciso garantir as contingências que manterão comportamentos es­
perados. o que pode ser útil em situações que possam representar algum risco para o
participante, nas quais seja importante a emissão do comportamentos de esquiva ou
de fuga diynte de estimulação aversiva.
Embora cm alguns estudos sobre crenças (McGlinchey & Kcenan, 1997) os
procedimentos não tenham conseguido sobrepor a história de reforçamento aos parti­
cipantes. esse experimento alcançou resultados favoráveis ao reforçar crenças opos­
tas no repertório dos participantes. No entanto, estudos com novos temas e mais parti­
cipantes são indicados para possibilitar uma generalização dos resultados obtidos.
Entretanto, carente deste poder de generaiização, este trabalho permite identifi­
car que. mesmo com todas restrições em relação ao acesso dos estímulos que antece­
dem uma resposta verbal, um ambiente controlado ainda é mais adequado que o ambi­
ente cotidiano para identificação e manipulação das variáveis que afetam o relatar. Nesta
manipulação, o software se mostrou eficiente e adequado para novas pesquisas, possi­
bilitando correções, alterações e planejamentos de outros delineamentos experimentais,
Ainda assim, podemos dizer que, se esse procedimento pode ser utilizado para
reforçar crenças errôneas, ele também poderia servir ao propósito de reforçar crenças
que fossem relevantes para a nossa comunidade verbal, se configurando não apenas
como um recurso metodológico de pesquisa, mas como urn instrumento de divulgação
de informação, atendendo a novos objetivos, relevantes do ponto de vista social.

Referências

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opinion. J Abnorm Psychol. Nov: 51 (3): 668-676.

Sobre Comportamento e Cognição 3 3 9


f
Capítulo 28
Tempos modernos versus ansiedade:
aprenda a controlar sua
ansiedade

Q ína Nolcto Bueno *


Angeluci Reis Branquínho Ribeiro**
Iran Johnathan Silva O liveira***
Jéssica Cirqueira A lve s****
Roberta M a ia M a rc o n *****

Universidade Católica dc Qoiás

A tecnologia e a agitação da vida moderna trouxeram consigo competitividade,


instabilidade no emprego, viotência, trânsito, perspectivas futuras, diversas pressões
quanto a ser avaliado, ser aprovado, ser capaz, dar conta, alcançar o sucesso g mais
uma infinidade de possibilidades e ameaças abstratas e reais. Todas, portanto, com ­
preendendo estímulos às pessoas, independente de sua raça, credo, classe social ou
localização geográfica. Implicando, desta forma, no poder de gerarem respostas emo­
cionais - positivas ou negativas - naqueles indivíduos que, de uma forma ou de outra,
são colocados diante de tais contextos. Àqueles que as discriminam como estímulos
aversivos darão a elas a função de gerarem-lhes respostas emocionais negativas. E,
muito provavelmente, ao serem mantidos em contato com tais estímulos, percebendo-
os como negativos, poderá haver a aparição, em seus organismos, de respostas de
estresse e de ansiedade alterada.
Os diversos estudos sobre as respostas ansiosas, assim como sobre o de­
senvolvimento do estresse, relatam que, num primeiro momento, tanto a ansiedade
quanto o estresse são respostas que objetivam levar o organismo de quem as sente a

’ Mestra em Psicologia. Professora do Departamento de Psicologia e tio Programa de Pòs-Graríuaçáo em Psicologia Lato Sensuda
Universidade Católica de Goiás, membro do Núcleo de Pesquisa Aplicada em Intervenções Clinicas e Com unitárias-N U PA IC C E-mail
ginabuerxTpsigihotmail ccm
~ angelpsi80@yalioü.com br
irangyn@hotmail.com
~")cirqueira_psi@ hotm ailcom
“ ™ robertamalamarcon@hotmai!.coni

Sobre Comportamento c Cognição 341


enfrentar as contingências de ameaças, mesmo que implicando apenas num proces­
so evolutivo sócio-ambiental. Porém, a eficácia quando do enfrentamento das situa­
ções geradoras de ansiedade exacerbada e de estresse dependerá do repertório
assertivo para a ocorrência desse enfrentamento. Caso contrário, enfrentar tomar-se-á
em uma nova contingência que não favorecerá o controle dessas respostas, mas sim
sua exacerbação {Ballone, 2008; Lipp & Tanganelli, 2002).
Assim, é importante destacar que não apenas situações classificadas como
ruins têm a propriedade de favorecer a quebra da homeostase biológica do organismo.
Aqueles eventos muito prazeros podem produzir, também, alteração homeostática, visan­
do a adptação do organismo ao novo contexto (Pacanaro & Santos, 2007). Assim, quanto
menor for capacidade de adaptação, maior será a probabilidade do afetamento grave de
todas as respostas da pessoa: cognitivas, fisiológicas, emocionais e com porta mentais.
Como se vê, a qualidade de vida não está relacionada apenas à ausência da
doença, mas sim, a todo contexto que envolva o bem-estar profissional, físico, emocio­
nal e social do indivíduo {Lipp, 1997).
Sendo assim, o estresse e a ansiedade funcionam como respostas adaptativas
e essenciais ao ser humano que quando imediatas ou de curtos periodos permitirão
que o indivíduo se adapte ao ambiente (Craske & Barlow, 1993/1999). Porém, é impor­
tante compreender a diferença entre ambos e o que cada um pode ocasionar.

Estresse
Trata-se de uma condição dinâmica na qual uma pessoa é confrontada com
uma oportunidade, limitação, bem como com uma demanda em relação a algo deseja­
do e cujo resultado é percebido, simultaneamente, como importante e incerto (Robbins.
20 0 1 / 2 0 0 2 ).
Um ponto a considerar é que o processo de estresse será desencadeado e
desenvolvido de forma diferente para cada indivíduo, visto que a análise de cada evento
como aversivo ou não dependerá de como cada pessoa aprendeu a percebê-lo. Ou
seja, o processo de estresse está intimamente relacionado à história de vida do indiví­
duo (Sanzovo & Coelho, 2007).
De acordo com as autoras, sendo a análise de cada evento como aversivo ou
não dependente da história de aprendizagem de cada indivíduo, bem como sua reação
frente a determinado evento, deve-se considerar que, além de possuírem histórias de
vida diferentes, os indivíduos estão expostos a fontes estressoras diferentes, de forma
que alguns deles podem considerar um agente como estressor, enquanto outros não
consideram.
É importante ressaltar que o estresse aparece associado tanto aos limites quan­
to às demandas. Os limites impedem que o indivíduo faça o que deseja e as demandas
referem-se à perda de algo desejado. Assim, quando o indivíduo faz suas provas na
escola ou passa pelo processo de avaliação de desempenho em seu trabalho, sente o
estresse por estar confrontando oportunidades, limitações, bem como demandas. Um
bom desempenho pode levar a uma promoção, a maiores responsabilidades, além de
um salário mais alto. Já um mau desempenho pode impedi-lo de atingir a promoção. Se
a avaliação for muito ruim, pode significar até sua demissão (Robbins, 2001/2002).
Para que o estresse potencial se torne real são necessárias duas condições. É
preciso haver incerteza em relação ao resultado, e este deve ser importante. Indepen­
dentemente das condições, apenas acontece o estresse quando existe incerteza ou

342 Ç ina N . Bueno, Angeluci R. B. Ribeiro, Iran J. S. Oliveira, Jessica C. Alves, Roberta M . Marcon
dúvida a respeito de a oportunidade ser aproveitada, as limitações serem superadas nu
até mesmo a perda sor evitada. Sendo assim, o estresse é maior para as pessoas que
não conseguem saber se vão perder ou ganhar, e menor para aquelas que têm certeza
da perda ou do ganho. Mas a importância do resultado também é crítica, visto que sc
perder ou ganhar não for um aspecto relevante para o indivíduo, não haverá estresso
Porem, se manter seu emprego e/ou receber uma promoção forem contingências que
não produzirão muita diferença, então não haverá por que ficar estressado cm relação
à sua avaliação de desempenho (Kobbins, 2001/2002).
De acordo com o autor, o estresse não é necessariamente ruim, embora costu­
me ser discutido dentro de um contexto negativo. O estresse também tem seu lado
positivo, ou seja, deve ser percebido como uma oportunidade quando oferece um po­
tencial de ganho. Considere, por exemplo, o desempenho demonstrado por um atleta
quando exposto a uma situação limite. Geralmente o atleta utiliza o estresse para dar o
máximo de si.
Portanto, o estresse é essencial em nossas vidas para adaptação em situa­
ções novas (Nunes, 2003). A manifestação de estresse diante de situações verdadeira
mente ameaçadoras é adaptativa e necessária à sobrevivência, gerando um comporta­
mento apropriado para livrar o organismo do perigo e, portanto, não provocar dano
algum ao mesmo. Por outro lado, o estresse provocado por uma hipervalorização do
perigo e desvalorização dos recursos pessoais é Cesadaptativo, e yera comportamen­
tos que cronificam esse quadro físico (Falcone, 1997).
Reconhece-se que o estresse compreende algumas fases. A primeira fase é
conceituada como sendo Reação de Alerta. Também é chamada de Reação de Alarme.
Nela o organismo prepara-se para lutar ou para fugir. Caso o estressor tenha curta
duração essa fase termina em algumas horas (Martins, 2001). Sendo os estressores
aqueles estímulos ou eventos difíceis que desencadeiam um estado emocional forte
que exija adaptações de enfrentamento (Straub, 2002/2005).
Os estressores podem ser subdivididos em estressores internos e externos.
Os estressores internos sâo: (1) Frio; (2) Fome; e (3) Dor. Enquanto que os estressores
externos - psicossociais - referem-se, por exemplo, à: profissão, escola, relaciona­
mento, dentre outros.
A segunda fase do estresse é a de Resistência. Se o agente estressor perdura
e o organismo tenta restabelecer o equilíbrio interno, o organismo fica enfraquecido e
muito suscetível a doenças, Contudo, durante essa fase, o indivíduo utiliza técnicas
para controlar seu estresse e consegue diminuí-lo, saindo desse estágio de estresse
sem seqüelas. Assim, o equilíbrio é restabelecido (Lipp & Malagris, 1995).
Já a terceira fase é identificada como a de Quase-Exaustão. É um enfraqueci­
mento da pessoa que não mais está conseguindo adaptar-se ou resistir ao estressor.
As doenças começam a surgir, tais como: herpes simples, psoríase, picos de hiperten­
são e diabetes, mas ainda não são tão graves quanto às da próxima fase (Lipp, 2000).
Enquanto na quarta fase, que é a de Esgotamento ou_Exaustão, o estressor
perdura ainda mais. As psícopatologias e patologias m anifestam -se, com muita
freqüência, nos níveis psicológico e físico, respectivamente. Contudo, é importante res­
saltar que o estresse não trata-se do elemento patogênico das doenças, mas conduz a
um enfraquecimento das respostas psicológicas e fisiológicas. Desta forma, as patolo­
gias programadas geneticamente manifestam-se no indivíduo devido ao seu estado de
exaustão (Lipp & Malagris, 1995; Martins, 2001).
Um ponto a considerar é que em todas as fases do estresse estarão ocorrendo
problemas, de forma gradual, de acordo com a própria fase. Necessário, portanto,

Sobre Comportamento e C oflníçlo 343


salientar que podem ocorrer: (a) problem as físicos - músculos tensos ou rígidos,
vômitos, perda ou ganho de peso, bruxismo, cansaço, suores, dores de cabeça devido
à tensão, fragilidade, problemas estomacais, sensação de asfixia, tremores muscula­
res, náusea, erupções na pele, hipertensão, reações alérgicas, cicto menstrual doloro­
so, batimentos cardíacos rápidos ou irregulares; (b) problemas psicológicos - pensa­
mentos ansiosos, raiva, depressão, dificuldades de memória, fadiga, pouca concentra­
ção. ressentimento, incapacidade de relaxar; e (c) problemas comportamentais - inqui­
etação, choro, fuga de tarefas, problemas para dormir, punhos cerrados, consumo de
substâncias entorpecentes, mudanças em hábitos alimentares, temperamento agres­
sivo, fuga de relacionamentos (Straub, 2002/2005).
É importante ressaltar que tais condições não representam conseqüências
inevitáveis do estresse, tampouco a presença de várias respostas em níveis diferentes
necessariamente indica que o estresse seja a causa. Estas inúmeras respostas estão
correlacionadas, também, com a ansiedade.

Ansiedade
Staats (1996) adverte que a ansiedade é um estado emocional. Essa emoção
é normal, necessária à sobrevivência de todo ser vivo, pois o adverte ao cumprimento
ordenado das contingências da vida, seja para enfrentá-las, fugir ou esquivar-se detas.
Assim, Mundim e Bueno (2006) ressaltam que os estados emocionais podem
ser desregulados, assim como qualquer outra função do organismo. Quando isto ocor­
re, ou seja, quando a ansiedade torna-se intensa, exacerbada, ela pode estabelecer
riscos ao indivíduo que a vivência.
Desta forma, a função da ansiedade quando o indivíduo está frente a um estí­
mulo favorecedor de sua discriminação de que haja a possibilidade de perigo, de ame­
aça à sua vida, é a de protegê-lo, isto quando esta é mantida em níveis normais. E não
prejudicá-lo, o que ocorre quando em níveis intensos.
A ansiedade é definida também como reação de luta-e-fuga. É assim denomi­
nada porque todos os seus efeitos estão diretamente voltados para lutar ou fugir de um
perigo (Craske & Barlow, 1993/1999).
Quando alguma forma de perigo é percebida ou antecipada, o cérebro envia
mensagens a uma seção de nervos chamada de sistema nervoso autônomo, que
possui duas subsecções ou ramos: o sistema nervoso autônomo simpático - SNAS e o
sistema nervoso autônomo parassimpático - SNAP. O SNAS é o sistema da reação de
luta-e-fuga, tendo a função de liberar energia para colocar o corpo pronto para ação.
Tende muito a ser um sistema tudo-ou-nada. Isto é, quando ativado, todas as partes do
organismo vão reagir (Craske & Barlow, 1993/1999).
Nesse contexto, uma série de mudanças fisiológicas ocorre, quando o organis­
mo está diante de situações geradoras de ansiedade, como: aceleração dos batimentos
cardíacos, sudorese nas extremidades, tremores, calafrios, formigamentos, ânsia de
vômito, dificuldade para respirar, para concentrar-se, fraqueza física, etc.. E, caso as
situações se tornem freqüentes ou prolongadas, poderão provocar danos mais sérios
ao organismo, como úlceras gástricas e hipertensão arterial, sendo essas manifesta­
das na forma das doenças consideradas psicossomáticas (Alencar, 1977).
Em algum momento, o corpo cansará da reação de luta-e-fuga e ele próprio
ativará o SNAP para restaurar seu estado de relaxamento. Assim, o SNAP é um protetor
embutido que impede o SNAS de desgovernar-se (Craske & Barlow, 1993/1999).
É importante ressaltar que o efeito número um da reação de luta-e-fuga é alertar
o organismo para a possível existência do perigo. Portanto, há uma mudança automática

344 Qina N . Bueno, Angelucí R. E. Ribeiro, Iran J. S. Oliveira, Jessica C. Alves, Roberta M . Marcon
e imediata na atenção para pesquisar o ambiente em busca de ameaças em potencial.
Exatamente por isso, conccntrar-se em tarefas rotineiras torna-se muito difícil para al­
guém que está muito ansioso. Porém, muitas vezes uma ameaça óbvia não pode ser
encontrada. E, infelizmente, a maioria das pessoas não aceita o fato de não encontrar
uma explicação para alguma coisa. Assim, em muitos casos, quando as pessoas não
conseguem expiicar seus sentimentos, elas tendem a procurar em si próprias. Ncssc
caso, o cérebro inventa uma explicação como “Eu devo estar morrendo, perdendo contro­
le ou ficando louco". Como já mencionado, nada poderia ser menos verdadeiro, já quo a
função primordial da reação de iuta-e-fuga é a de proteger o organismo, o não de prejudicá-
lo. Por isso mesmo, são auto-falas compreensíveis (Craske & Barlow, 1993/1999).
Segundo Nardi (2000), medo é uma reação normal do indivíduo frente a uma
situação ou objeto específico que ofereça perigo, sendo esse real ou imaginário, fazen­
do com que o mesmo o evite.
Apesar de ser considerado como uma emoção, o medo produz uma gama de
comportamentos que podem ser mensuráveis, portanto, observáveis. Sendo assim,
tem-se que os medos podem ser saudáveis e adaptativos, uma vez que também exer­
cem a função de proteger o indivíduo das possíveis ameaças, tendo um valor do sobre­
vivência para perpetuação das espécies. Em geral, o medo é expressado por meio de
fuga em relação às pessoas, objetos ou situações que o eliciem (Harlow. McGaugh &
Thompson, 1971/1978).
O medo obsessivo gerado numa determinada situação pode, gradualmente,
ser generalizado para outras situações que, em principio, poderiam ser consideradas
secundárias, levando o indivíduo a um estado geral de apreensão ou ansiedade em
todas as circunstâncias (Harlow et al., 1978).
De acordo com uma grande quantidade de pesquisas, as pessoas aprendem a
experimentar medo, inclusive, das próprias sensações de reação de luta-e-fuga. Isto
ocorre graças a interpretações errôneas quanto ás respostas fisiológicas necessárias
nos momentos em que o indivíduo precise lutar ou fugir de algum evento (Craske &
Barlow, 1993/1999). Discriminar incorretamente que o funcionamento de seu corpo esta
fora de seu controle - nesse contexto de reação luta-e-fuga - acreditando que o que sente
é assustador, leva essas pessoas a aprenderem o medo das respostas corporais. De­
senvolvendo a partir daí uma nova classe de com portam ento-problema: pânico.
O transtorno de pânico ocorre quando uma pessoa discrimina suas respostas
fisiológicas como anormais e a partir daí foca toda sua atenção no monitoramento de
suas reações corporais, temendo a morte iminente e as próprias respostas sim páti­
cas. Assim, sem saber, constrói, ela própria, o ataque de pânico que recorrente produ­
zirá o transtorno de pânico. E, uma dessas respostas fisiológicas muito importantes
para a construção do ataque de pânico é a hiperventilação.

Hiperventilação e Controle Respiratório


A hiperventilação é uma respiração induzida pelo estado de estresse corporal,
experimentado por uma condição que a pessoa a discrimine como sendo de perigo
(Craske & Barlow, 1993/1999).
Ao hiperventilar, a pessoa faz com que a concentração de oxigênio em seu
cérebro diminua. Esse quadro é provocado em função de a pessoa inspirar e expirar o
ar rapidamente, o que favorece uma redução drástica de oxigenação corporal. E é justa­
mente essa diminuição na quantidade de oxigênio no organismo que provoca a ocor­
rência de respostas corporais desconfortáveis, por ser ativado o SNAS, e com ele todas
as funções fisiológicas que, por sua vez, tornam-se aceleradas.

Sobre Comportamento e Cognição 345


Contudo, a indução da hipen/entilação como técnica terapêutica tem a função
de levar o participante de um processo terapêutico psicológico, estressado e/ou em
estado de pânico, a observar que sempre que ocorrerem situações ás quais discriminá-
las como sendo aversivas e que ele permitir-se auto-falas negativas (pensamentos),
toda a sua musculatura será tensionada. obstruindo o funcionamento correto dos pul­
mões. O resultado será a alteração de sua respiração, agora curta e acelerada, com
posterior alteração total das demais funções fisiológicas e, finalmente, a ativação inten­
siva do SNAS, ocasionando o ataque de pânico.
Mas, ao ser aplicada a segunda técnica, controle respiratório, após a indução
da hiperventiiação no contexto clínico, o terapeuta levará essa pessoa a discriminar que
mesmo estando diante de uma contingência aversiva, em que seu SNAS com certeza é
ativado, a regularização de sua respiração favorecerá o controle das respostas simpá­
ticas, via a ativação do SNAP,
Ao contrário da hiperventiiação, o controle respiratório favorecerá uma adequada
oxigenação do organismo, o que favorecerá o equilíbrio das respostas corporais, cognitivas,
emocionais e coniportamentais. A conseqüência do controle respiratório será a cessação
da ansiedade exacerbada, portanto, a cessação das condições favoráveis ao ataque de
pânico, que ocorrendo agravará o estado de estresse do indivíduo.

Controle Respiratório
Esta é uma técnica simples e fácil de ser realizada.
Primeiro passo - A pessoa deve sentar-se em uma cadeira, deixando os pós apoi­
ados ao chão.
Segundo passo - Relaxar a musculatura do corpo o máximo possível.
Terceiro passo - Cerrar os lábios e inalar a maior quantidade de ar possível pelas
narinas, até encher os pulmões. Esse ar deve ficar retido por cerca de 4 segundos.
Quarto passo - Entreabrir a boca, deixando o ar escapulir, o mais lentamente pos­
sível, até o final.
Quinto passo - Voltar a respirar de forma norma!, por 4 segundos, sempre instruin­
do o corpo ao estado de relaxamento muscular.
Sexto passo - Repetir os 5 passos 6 vezes consecutivas, o que compreenderá uma
sessão de controle respiratório. O indicado a uma pessoa com nível de estresse
alto e/ou que esteja fazendo crises de ansiedade intensa, inclusive de ataques de
pânico, são pelo menos 10 sessões de controle respiratório por dia. Essas ses­
sões devem ser bem distribuídas ao longo do dia/noite quando a pessoa estiver em
estado vigil, Isto implica que seu estado de sono não deve ser interrompido para
realizar sessões de controle respiratório.
A fim de viabilizar a capacitação das pessoas para o alcance do autocontrole de
sua ansiedade, paralelamente ao controle respiratório faz-se necessária a educação
sobre esta resposta emocional.

Educação sobre a Ansiedade


Tal como for mencionado anteriormente, a ansiedade é um estado emocional
normal, básico, necessário à vida do ser humano. Staats (1996) ressalta que esta
resposta emocional ou emoção é eliciada por um estímulo - público ou privado - que
possui três funções: (1) eliciar uma resposta emocional, (2) atuar como estímulo
reforçador e (3) direcionar comportamentos de aproximação ou de fuga ou esquiva.

346 Qína N . Rueno, A n g elu d R. E, Ribeiro, Iran j. S. Oliveira, Jessica C. Alves. Roberta M . Murcon
Desta forma, se a resposta emocional provocada por um estímulo for positiva, o com ­
portamento esperado é de aproximação ao estimulo que a gerou. Mas, s r ao contrário
a resposta emocional evocada pelo estímulo for negativa, o comportamento será de
afastamento do estímulo que a gerou, discriminado como aversivo.
É necessário, portanto, salientar os processos cognitivos nesse contexto. Pro­
cessos cognitivos referem-se àquilo que compreende o mundo privado da pessoa; o
pensar, o sentir, o ouvir, o falar para si mesmo, o emocionar, o discriminar, o perceber,
etc.. Os processos cognitivos podem ocorrer de forma positiva e de forma negativa,
dependendo de algumas variáveis, entre elas: a historia de vida do indivíduo, bem como
seu estado de privação e/ou de saciedade.
A próxima etapa da educação sobre a ansiedade é levar a pessoa a compreen­
der os processos básicos de funcionamento do seu cérebro. O cérebro funciona à base
de energia cerebral. A energia cerebral é composta, entre tantos elementos químicos,
físicos e elétricos, por dois que são considerados essenciais: o oxigênio (O2, o ar que
respiramos) e a glicose (açúcar oriundo dos alimentos ingeridos).
No cérebro, entre outros sistemas nervosos há o sistema nervoso autônomo,
que é o sistema da vida das relações (interações sociais) Ele divide-se em dois
subsistem as: sistema nervoso autônom o sim pático e sistema nervoso autónom o
parassimpático, já descritos anteriormente.
Nesse sentido, delinear o processo de operacionalização do sistema nervoso
autônomo simpático e parassimpático é imprescindível para a compreensão dos efei­
tos fisiológicos dos estados emocionais negativos, assim como parece bastante salu­
tar a utilização de metáforas para explicações desse processo.

Efeitos Fisiológicos dos Estados Emocionais Negativos


Conhecer os efeitos dos estados emocionais negativos pode ser um recurso
muito importante àquele ou àquela que deles padecem, de forma exacerbada, bem como
àqueles profissionais que prestam serviços de assistência ao restabelecimento da saú­
de dessas pessoas.
Para favorecer o conhecimento desse procosso, o terapeuta pode utilizar-se da
metáfora de velocímetro (aparelho que mede a velocidade de um veiculo). O veículo dis­
põe de um velocímetro com a finalidade do orientar aquele que o dirige para práticas
corretas de velocidade. O mesmo procedimento ocorre com essa resposta emocional,
chamada ansiedade. Quando, graças à discriminação dos estímulos que a pessoa faz, a
ansiedade é evocada, sua intensidade será correta ou não. Se cometa, o indivíduo que a
sente ativa em si o SNAP e a conseqüência esperada de sua interação com o evento que
a antecedeu é positiva. Mas quando sua intensidade é verificada de forma exacerbada, a
conseqüência deverá ser negativa tanto à pessoa que a sente quanto ao meio ambiente
social desta.
Assim, a ansiedade em níveis normais deverá ser aquela na qual os SNAS e
SNAP serão adequadamente ativados, favorecendo à pessoa respostas assertivas de
enfrentamento ou de fuga ou de esquiva ao evento que ocorre.
Portanto, o repertório de habilidades sociais, bem como o repertório verbal que
uma pessoa dispõe será imprescindível para o controle ou não de suas respostas ansi­
osas.
Entretanto, quando o indivíduo percebe um estímulo como muito aversivo, suas
respostas cognitivas e emocionais são afetadas e, por conseguinte, serão afetadas

Sobre Comportamento c Cognição 34 7


também suas respostas fisiológicas e comportamentais. Esse é o momento que a
pessoa produz o clássico quadro de ansiedade exacerbada.
Exacerbados, os efeitos provocados pelos estímulos aversivos condicionados
afetam o SNAS que, por sua vez, acelera o funcionamento de todos os órgãos do corpo,
provocando: taquicardia; sudorese; palpitação; tremor; calafrios; dormências/formiga­
mentos; boca seca; ânsia de vômito; vertigem; sensações de sufocamento, de falta de
ar, de fraqueza física, de perda de contato com a realidade e de desmaio; pressão
cerebral, torácica, estomacal, intestinal; tontura; dilatação das pupilas, dentre outras.
Essas conseqüências produzirão estresse no organismo, deixando as pesso­
as que as sentem: fadigadas, cansadas, em estados de prostração. Por conseqüência
do estresse são esperadas: perda da atenção, da concentração, do lembrar, querer, do
fazer, da libido, da vontade; aumento da irritabilidade; alteração dos ciclos sono-vigília e
alimentar; e alteração dos esfíncteres, dentre outras.
Diante disto, a Figura 1, a seguir, demonstrará de forma macro os efeitos dos
estados emocionais negativos visando favorecer-lhe a compreensão sobre este pro­
cesso.

Figurai - Seqüências das ações do Sistema Nervoso Autônomo Simpático e


Parassimpático segundo Craske e Barlow (1993/1999).

3 4 8 C/ina N . Buerto, A n g e lu ti R. B. Ribeiro, Iran j. S. Oliveira, Jéssica C. Alves, Roberta M . Marcon


Portanto, a importância do controle respiratório agora se toma evidente: produ­
zir uma overdose de oxigênio no cérebro/organismo, visando a ativação imediata do
SNAP para a devolução ao corpo de seu estado de equilíbrio, de relaxamento
Percebe-se, assim, que o controle respiratório será apenas uma das técnicas
necessárias para o controle da ansiedade exacerbada, provocada pela discriminação
de um evento como aversivo. Outras técnicas imprescindíveis para a garantia desse
controle são necessárias, especialmente o treinamento de habilidades sociais (Caballo,
2002/2003; Del Prette & Del Prette. 1999/2001).
Assim, objetivando o autocontrole do estresse e da ansiedade, o terapeuta
deve proporcionar a seu cliente estratégias de intervenção, favorecendo-lhe melhor
qualidade de vida.

Manejo do Estresse e da Ansiedade


Todos os indivíduos possuem , em m aior ou m enor grau. habilidades de.*
enfrentamento que foram adquiridas ao longo dos anos. Entre elas, estão: (a) as estra
tégias que funcionaram no passado; (b) as técnicas sobre as quais lemos; e (c) os
comportamentos que observamos em outros indivíduos. Essas habilidades, na maio­
ria das situações, são provavelmente adequadas, por nos impedir de experim entar
estresse e ansiedade indevidos. Porém, em algumas vezes, as demandas de uma
situação podem exceder nossos recursos de enfrentamento (Straub, 2002/2005).
O terapeuta, com a finalidade de manejar o estresse e a ansiedade em seu
cliente, busca técnicas que o levem a ativar mais o SNAP e ativar o SNAS apenas em
niveis de proteção, e não de paralisação.
Entre um arsenal de técnicas com esta finalidade, destacam sc:
(1) Parada de Pensamento (PP) -
É um procedimento de autocontrole desenvolvido para interromper pensamen­
tos geradores de ansiedade (Raich, 1996/2007);
(2) A .C .A .L .M .E .-S .E . -
Essa técnica, segundo Rangé (1998), tem o intuito de levar o indivíduo a lidar
com seu estado de ansiedade e aceitá-lo totalmente. A fim de que este permaneça no
presente e aceite sua ansiedade, fazendo-a atingir niveis de controle. Sendo assim,
para desenvolver o autocontrole da ansiedade nos clientes, os terapeutas utilizam os
oito passos que a compreendem:
1o Passo - A - Aceite a ansiedade;
2° Passo - C - Contemple a natureza;
3o Passo - A - Aja com sua ansiedade (não deixe de comportar-se);
4o Passo - L - Libere o ar dos pulmões (faça o controle respiratório);
5o Passo - M -^Mantenha os passos anteriores;
6 ° Passo - E - Examine seus pensamentos (troque os pensamentos negati­
vos, por pensamentos positivos);
7o Passo - S - Somia, você venceu, você aprendeu a controlar a sua ansiedade e
8 o Passo - E - Espere o melhor do futuro, pois no presente, você é quem está
controlando a ansiedade, e não a ansiedade provocada por estímulos ambientais, é
que tem o controle sobre você;

Sobre Comportamento e Cognição 3 4 9


(3) Relaxamento -
Partindo-se do conceito de que o estresse é uma resposta biológica ante a
situações percebidas como ameaçadoras às quais o organismo não possui recursos
para enfrentá-las adequadamente, o relaxamento, por outro lado. é considerado “(...)
uma resposta biologicamente antagônica à resposta de stress, que pode ser aprendida
e convertida em um importante recurso pessoal para opor-se aos efeitos negativos do
stress." (Benson, 1975, citado por Vera & Vila, 1996/2007, p. 150).

Considerações Finais
Com os tempos modernos, a competitividade, a pressão, a tensão e uma bus­
ca continua por superação têm favorecido o desenvolvimento de quadros de estresse e
de ansiedade exacerbados aos indivíduos, em qualquer fase de suas vidas. Isto p o r­
que, desde criança, há a exigência do sucesso como marcador da quaiidade de vida e
da aceitação social, sem se avaliar a eficácia e eficiência do treinamento e da maturida­
de do repertório hábil da pessoa para apresentar o resultado social desejado.
O produto final disto está apresentado no próprio organismo das pessoas dos
tem pos m odernos, ou seja: desorganização em ocional, intelectual, fisiológica e
comportamental, conseqüenciando vários tipos de comportamentos-problema, como
os transtornos de pânico, ansiedade generalizada, depressão, além de diversas outras
formas de fobias, favorecedoras de quadros de estresse cada vez mais importantes,
Sendo esta cadeia ascendente, e quando nâo interrompida levará ao desenvolvimento
das mais variadas formas de enfermidades.
Diante do exposto, este estudo objetivou apresentar como as respostas de
ansiedade intensas sâo desencadeadas; além de definir os principais estím ulos
mantenedores da resposta emocional negativa; bem como propor treinamento de es­
tratégias de intervenção que viabilizem a capacitação das pessoas para o alcance do
autocontrole de suas respostas emocionais, ou seja, da ansiedade.
Assim, este estudo objetivou primeiramente favorecer aos terapeutas, e às
pessoas de uma forma geral, recursos para o processo de aprendizagem sobre o
desenvolvimento das respostas fisicas. cognitivas, emocionais e comportamentais da
ansiedade e do estresse. Secundariamente seu objetivo foi apresentar técnicas que,
bem aplicadas, podem favorecer o controle das respostas ansiosas e de estresse,
experimentadas pelo indivíduo. Por fim, buscou estabelecer um procedimento ordena­
do tanto para a educação quanto para a reeducação da ansiedade exacerbada bem
como do quadro de estresse, que se não controlados favorecem o desenvolvimento de
uma infinidade de psicopatologias e de patologias.
Porém, não foi seu objetivo aportar-se como um modelo pronto e acabado para
o controle de quaisquer respostas ansiosas ou estressantes. Posto que cada experiên­
cia com mesmo evento e/ou com eventos semelhantes ou mesmo diferentes leva o
indivíduo a comportar-se das mais variadas formas, isto è, idiossincraticamente, gra­
ças à sua história de aprendizagem anterior, bem como ao seu estado de saciedade ou
de privação anterior, dentre outras variáveis.

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3 5 2 Q ifw N . Bucno, A n g e luci R, B. Ribeiro, (ran J. S. O liveira, jéssica C.. A lves, Roberta M . Marcon
Capítulo 29
Psicologia da saúde:
comunicando informação e ensinando
comportamentos de saúde

Áderson Luiz Costa Junior


UnB
Rejane Soares Ferreira
UnB
Antonio Bento Alves de M oraes
U N 1C A M P
CJustavo Satollo Rolím
UFSCar

O texto eiaborado p o r Ferreira, Costa Junior, M oraes e R olim representa uma


importante contribuição á atuação em saúde por abordar a relevância da comuni­
cação entre profissionais de saúde e pacientes-fam iliares e ap resen tar técnicas
para efetivação da transmissão de informações.

Trata-se de uma revisão teórica atualizada, organizada em três seções: (a) a


importância da com unicação no contexto de saúde; (b) o processo de transm is­
são de inform ação: fator de interação social e de aprendizagem a pacientes e
familiares; e (c) a diversidade técnica na transmissão de inform ação a pacientes
e familiares. Desta combinação resulta o entendim ento da importância da com u­
nicação com o recurso para promoção de com portamentos de saúde e adesão a
tratam entos, com destaque para a atuação em oncologia. Ênfase é dada às
especificidades de atendimento à população infantil e necessidades de integração
desta abordagem às diferentes etapas do processo de tom ada de decisão em
saúde.

O artigo cumpre o desafio de levar à reflexão e questionamento de profissionais


que já atuam na ares e de contribuir para a form ação de novos profissionais,
cham ando a atenção para a necessidade de con tinua atu alização de form a a
fortalecer o modeio de atendimento biopsicossocial em saúde.
Dra. Elizabeth Queiroz (UnB)

* Doutor em Pstoalogia. Professor Adjunto cio Instituto de Psicdogia da U niversid ade de B ras íli a. Tel eía x: 6 1-33073069 / û 1118199. E- ma iI :
ad&soni&ijnb.bi
“ Mestre em Psicologia pela Universidade de Brasília
“ * Doulor em Psicologia. Professor Trular da Árcade Psicologia Aplicada òa F aajldad ede Odontologia de Piracicaba - Universidade Estadual
de Campinas
’ * '• M estre em Psicologia pela Líriivefsidade Federal de São Cartos

Sobre Comportamento e Cognição 353


Este texto aborda alguns mecanismos de comunicação, que têm sido adotados
em psicologia da saúde, com objetivo de facilitar a transmissão e compreensão de infor­
mações entre profissionais de saúde, pacientes em tratamento médico e seus familia­
res. O texto destaca a importância da comunicação, especialmente no contexto do trata­
mento oncológico e aborda o processo de transmissão de informação como fonte poten­
cial de interação social e de aprendizagem, variáveis relevantes ao desenvolvimento de
estratégias mais eficientes de enfrentamento da doença e de adesão ao tratamento.

A Importância da Comunicação no Contexto de Saúde


Acompanhando-se a evolução do conhecimento na área da saúde, verifica-se
que o espaço ocupado pela psicologia foi sendo ampliado à medida que avançava o
desenvolvim ento cie ntífico e tecnológico da m edicina. No entanto, a crescente
especificidade da atuação médica, centrada em indicadores e preditores biológicos,
tem apontado lacunas, não suficientemente abordadas pelo médico, e que passaram a
constituir objetos de interesse de pesquisadores em psicologia, entre os quais pode­
mos incluir: (a) os mecanismos de facilitação de transmissão e de compreensão de
informações de profissionais de saúde para pacientes e familiares; e (b) o desenvolvi­
mento de estratégias de preparação psicológica para tratam entos e procedimentos
médicos, especialmente de caráter invasivos.
O conhecimento atual sobre o processo de desenvolvimento humano permite
afirmar que as experiências de adoecimento, em qualquer faixa etária, incluem conse­
qüências estressantes que interferem não apenas sobre o funcionamento biológico,
mas, também, sobre o ajustamento psicossocial dos indivíduos. Também reconhece­
mos que muitos outros fatores interferem sobre a qualidade de vida dos pacientes, em
diferentes etapas do tratamento, entre os quais: (a) o acesso a informações médicas
complexas, nem sempre transmitidas de um modo compreensível a pacientes e fam i­
liares; (b) a necessidade de tomada de decisões sucessivas sobre o andamento do
tratamento, relacionadas funcionalmente às informações transmitidas; e (c) o estado
motivacional do paciente para enfrentar determinado tratamento (Fleck, 2008).
Considerando-se duas das premissas básicas da educação para a saúde: (a)
que promoção da saúde baseia-se na aceitação de que nosso comportamento, estilo de
vida e o contexto em que vivemos têm impacto sobre nossa saúde (Bennett, 1999); e (b)
que um dos objetivos essenciais dos profissionais de saúde é minimizar o impacto da
doença e do tratamento sobre o funcionamento biológico e psicossocial do paciente
(Arora, 2003), a comunicação de informação entre profissionais de saúde e pacientes
constitui um dos eventos mais relevantes à promoção da saúde, incentivando a constru­
ção de repertórios de comportamentos eficientes e recíprocos entre profissionais e usu­
ários.
Em oncologia, por exemplo, com o avanço do conhecimento em farmacologia e
biotecnologia e o gradativo aumento do percentual de sobreviventes de câncer, as pre­
m issas da educação para a saúde tornaram -se requisitos fundam entais para o
planejamento e acompanhamento dos tratamentos de qualquer tipo de neoplasia. Os
episódios de com unicação de diagnóstico e de transmissão e troca de informações
entre médicos, pacientes - inclusive crianças - e familiares passam a incluir novas
informações técnico-cientificas e novas perspectivas de sucesso. Certamente, é mais
fácil, atualmente, discorrer a uma criança, ou a um adolescente, sobre uma doença que
apresenta um tratamento potencialmente eficiente, com chances mais concretas de
sobrevida {Patenaude & Kupst, 2005), do que ocorria há algum tempo, quando as pers­
pectivas de cura eram limitadas a um reduzido percentual de casos.

354 Áderson L. Costa Junior. Rejane S Ferreira. A n to n io Bento A . de Moraes, Qustavo 5. Rnlim
Pesquisas apontam que a disponibilizaçâo de informações acerca da d o e n ç a
e do tratamento pode interferir na redução da dor e do tempo de recuperação do pacien
te. além de possibilitar um aumento na satisfação com os cuidados recebidos, na
adesão ao programa de tratamento e na qualidade de vida dos envolvidos (Phipps,
2005). Para Ramos (1999), por exemplo, a informação pode ser concGitiializadH como
uma forma de controle cognitivo, já que permite aumentar a habilidade do pacícnk; a
seu acompanhante em se prepararem para eventos aversivos. Uma informação adn
quadamente compreendida pode, ainda, aumentar o grau de autocontrolc <ln acompa­
nhante, possibilitando uma melhor avaliação de variáveis contextuais relacionadas á
situação de tratamento e refletindo-se em comportamentos do cuidados mais eficien­
tes com o paciente.
Dcstaca-se que a comunicação com o paciente c: seus familiares se faz neces­
sária em todas as fases dos cuidados em saúde. Na prática clinica das instituições
hospitalares, no entanto, observa se que a compreensão do diagnóstico/doença e o
entendimento sobre seu tratamenio ainda são pouco evocados. Muitas vezes, crianças,
adolescentes e fam iliares não recebem as inform ações m ínim as e necessárias
(Camargo & Kurashirna, 2007). Outras vezes, as próprias instituições pouco se organi­
zam para repassar as informações de maneira organizada. Percebe se, deste modo,
uma demanda pela elaboração de estratégias que melhor possibilitem a comunicação
com os profissionais de saúde e seus pacientes e familiares.

O Processo de Transmissão de Informação: Fator de Interação Soci­


al e de Aprendizagem a Pacientes e Familiares
Desde a década de 70 do século XX, segundo Albuquerque (2002). uma cres­
cente reflexão bioética vem pautando a atuação médica, observando-se maior preocu­
pação com as implicações do modo como se processa a transmissão de informação (e
a comunicação como um todo) entre médicos, pacientes e familiares e a população em
geral. Um exem plo desta preocu paçã o pode ser o aum ento da fre q ü ê n cia de
documentários, programas e matérias de televisão e de veículos impressos, que abor­
dam a transmissão de diversas informações de saúde, em linguagem simplificada,
diretamente dos profissionais de saúde para o público que tem acesso a estes meios
de comunicação. Alguns programas e matérias especificas têm privilegiado, inclusive,
a interatividade entre os profissionais de saúde e os expectadores, permitindo a troca
de informações em tempo real, por telefone ou mensagem eletrônica.
No que se refere especificamente à comunicação no contexto do tratamento
oncológico, estudos voltados à descrição e análise da transmissão de informações dos
profissionais de saúde para os usuários e vice-versa têm sido referidos há, pelo menos,
duas décadas (Baumann, 2006; Mendonça, 2007), destacando-se investigações sobre o
aproveitamento da informação disponibilizada ao paciente, representada pelo seguimen­
to de instruções ou prescrições médicas (Ford, Hall, Ratcliffe & Fallowfield, 2000).
No entanto, o processo, formal e informal, de comunicação entre o médico, o
paciente em tratamento e seus familiares, tem sido funcionalmente pouco explorado
pelas pesquisas, especialmente a transmissão das informações fornecidas por profis­
sionais de saúde e a avaliação do aproveitamento das mesmas por pacientes e famili­
ares (Arora, 2003). Destaca-se a necessidade de investigação mais pormenorizada
dos eventos que constituem situações estabelecedoras de melhor aproveitamento da
interação social durante as consultas médicas e, conseqüentemente, poderiam pro­
porcionar; (a) a adoção de estratégias mais eficientes de enfrentamento em situações

Sobre Comportamento c Cogniçüo 355


de hospitalização (Salander, 2002); (b) a redução da freqüência de comportamentos de
estresse e ansiedade durante momentos específicos do tratamento (Razavi & Delvaux,
1997; Christophersen, 1994); (c) a melhoria da percepção da qualidade de vida dos
pacientes (Epstein, 2004; Ford, Fallowfield Lewis, 1996); e (d) a maior memorização das
informações fornecidas por profissionais de saúde com conseqüente melhor aproveita­
mento das mesmas (Arora, 2003; Friis, Elverdam & Schmidt 2003).
Estudos recentes destacam que estar atento às preocupações e questionamentos
de paciontes e familiares, ao longo do tratamento do câncer, e assegurar que as informa­
ções transmitidas sejam compreendidas, é essencial ao desenvolvimento de uma pers­
pectiva didática, educacional, que privilegie a manutenção do processo dc desenvolvimen­
to humano enquanto crianças e familiares que são submetidos a contextos de tratamento
de patologias crónicas (Brown, Butow, Butt, Mo ore & Tattersall, 2004; Leydon & cols.. 2000;
Tates & Meeuwesen, 2001; Mendonça, 2007; Salander, 2002).
Embora os médicos sejam considerados uma das principais fontes de informa­
ção para indivíduos em tratamento de saúde (Arora, 2003): Brown e colaboradores (2004),
apontam que a compreensão das informações pelos pacientes não costuma ser verificada
em mais de 80% dos casos, nem durante e nem após as consultas. Durante as consultas
médicas, por exemplo, predomina a transmissão de informações de caráter biomédico
(cerca de quatro vezes mais do que qualquer outra categoria), em detrimento de informa­
ções psicossociais. Mesmo em situação de comunicação dc diagnóstico adverso, a pre­
ocupação do médico com a compreensão das informações, pelo paciente, não constitui
uma prática comum (Arora, 2003), sugerindo a necessidade de que os pais, e demais
familiares, sejam incentivados a expressar-se sobre questões biopsicossociais relacio­
nadas ao diagnóstico e ao tratamento de seus filhos (Razavi & Delvaux, 1997).
A reduzida preocupação de profissionais de saúde com a compreensão de
informações pelo paciente pode, parcialmente, ser creditada ao atendimento insuficien­
te de necessidades psicossociais (especialmente de natureza emocional), e mesmo
informativas, manifestadas por pacientes e familiares (Enskar & Essen, 2000), Algumas
variáveis interferem para a consolidação desta situação de carência: (a) os pacientes
tendem a receber grande quantidade de informação técnica em um curto espaço de
tempo e não são incentivados a elaborar questionamentos; (b) a duração das consultas
dificilmente permite que pacientes e familiares respondam, por completo, as perguntas
elaboradas pelo médico; e (c) por razões de suposta objetividade, os médicos tendem a
fazer perguntas fechadas ao invés de abertas, o que desencoraja, ainda mais, eventuais
questionamentos. Segundo Ford e colaboradores (1996), o aconselhamento psicológi­
co por parte dos médicos tende a ser muito baixo, especialmente quando se trata de
consultas para transmissão de diagnósticos desfavoráveis.
Mendonça (2007) aponta outras variáveis que interferem na reduzida preocupa­
ção dos profissionais de saúde com a compreensão das informações transmitidas a
pacientes e familiares: (a) reduzido tempo de contato visual direto, nas consultas, entre
o médico e o paciente, ou entre o médico e os familiares; (b) quando o paciente é uma
criança, raramente o médico se dirige diretamente a ela e transmite informação, em
finguagem acessível, sobre a doença e/ou o tratamento; (c) a maior probabilidade de
que o médico faça críticas ao comportamento de pacientes e familiares, em detrimento
de orientações educativas ou contextualizadas ao estilo de vida dos mesmos; e (d)
tendência do médico à transmissão de orientações clínicas utilizando-se de verbalizações
em tom imperativo.
Para Patenaude e Kupst (2005), é crescente a crença de que as crianças devam
receber tanta importância quanto seus pais no contexto médico, inclusive contribuindo

35 6 Áderson L. Costa Junior, Rejane S. Ferreira, A n ton io Bento A . de M oraes, Qustavo S. Rol im
para o processo dc tomada de decisão sobre seu tratamento. A negação da criança
como um participante ativo das consultas não é coerente com o desenvolvimento da
abordagem centrada no paciente (Tates & Meeuwesen, 2001), nem com as perspecti
vas teórico-filosóficas mais recentes em ciência do desenvolvimento humano. Segun­
do Arora (2003), crianças que recebem informação direta, considerando-se faixa otária
e grau de desenvolvimento cognitivo, tém maior probabilidade de adotar estratégias dc
enfrentamento mais eficientes (focalizadas no problema) quando expostas a procedi­
mentos médicos invasivos.
O atendimento insuficiente dos médicos às necessidades emocionais, e m es­
mo informativas, manifestadas por pacientes e familiares, aponta a necessidade de
estudos mais sistemáticos que possam investigar o processo dc comunicação esta­
belecido e mantido entre profissionais de saúde, pacientes e familiares, especialmente
no que se refere à possibilidade de otimização da comunicação e da avaliação da
compreensão, por pacientes e familiares, de informações transmitidas por médicos,
responsáveis diretos pelo tratamento da doença.
Observa-se que alguns comportamentos, tais como contato visual, atenção
incondicional positiva, escuta ativa, reafirmação, elaboração de resumos e empatia por
parte do médico podem ser propícios a esse contexto. Empregar um estilo de consulta
centrada no paciente (aquela em que o clinico se comporta de tal modo que facilita e
incentiva a expressão do paciente) pode encorajá-los a participar mais ativamente da
consulta como um todo.
Arkshey e Sioper (1999) também destacam a necessidade de que o médico usu­
frua ativamente da participação do paciente e acompanhante. No entanto, os autores reco­
nhecem que o que se observa é o oposto, isto e, um enorme desequilíbrio entre a posição
de autoridade do médico e a posição de submissão do paciente e acompanhante.
Assim, percebe-se a existência de uma dicotomia entre o desempenho real e o
esperado na interação entre médicos, pacientes e familiares em contexto de consulta.
Embora a literatura chame a atenção, particularmente, para o momento crítico da comu­
nicação de diagnósticos adversos, todo o período de tratamento do câncer inclui uma
complexa rede de intercomunicação entre profissionais e usuários do sistema de saú­
de ainda não suficientemente investigada. Assim, destaca-se a necessidade de se
investigar, mais sistematicamente, como está ocorrendo a comunicação entre profissi­
onais de saúde, pacientes e familiares, especialmente no que se refere: (a) aos m eca­
nismos que podem ser disponibilizados para facilitar a transmissão e a compreensão
de informações do médico ao paciente e seus familiares; e (b) em que medida a trans­
missão adequada de informação contribuí para o desenvolvimento de estratégias efici­
entes de enfrentamento do tratamento e em cuidados dispensados pelo acompanhan­
te ao paciente.
Um dos contextos nos quais se pode sugerir a implementação destas investi­
gações é o da psico-oncologia pediátrica. Crianças e adolescentes, embora submeti­
dos a tratamentos prolongados, episódios consecutivos de internação hospitalar, expo­
sição repetitiva a procedimentos médicos invasivos e diversas restrições ambientais,
nem sempre recebem informações suficientes sobre o tratamento e seus efeitos. Acom­
panhantes e familiares também não dispõem, necessariamente, de informações so ­
bre a doença, o tratamento e a evolução do quadro clínico e assim, não sabem como
atuar como participantes efetivos do processo de tratamento.
Para Cosnier, Grosjean, e Lacoste (1994), a comunicação interindividuai, face a
face, é multicanal, se faz através de trocas nas quais as produções verbais, as modula­
ções vocais, as mímicas, os gestos e os olhares se combinam em partes variáveis e de

Sobre Comportamento e Cognição 357


acordo com regras associativas e seqüenciais, para constituir um enunciado total. O
fato da não-inclusão de variáveis culturais, interpessoais e de personalidade, restringe
a comunicação a aspectos puramente racionais, informativos e de conhecimento, dei­
xando de fora aspectos mais internos e sociais da pessoa.
Sobre a comunicação no campo da saúde, Santos (2001) afirma que a troca de
informações se dá em um contexto que abrange: (a) a situação, caracterizada pela
organização temporal, local e papéis socialmente definidos por regras - hospitalares -
especificas; (b) os participantes, com suas características pessoais, como sexo. idade,
grupo étnico, tipo de doença e trajes que caracterizam a função; (c) a relação, definida
pela natureza do serviço prestado - tratar, curar, aüviar, prevenir, promover e educar; e (d)
a plataforma comunicativa comum, constituída pelos saberes partilhados. Para este
autor, quanto maior a coerência e a transparência na troca de informações, melhor é a
comunicação, embora, no campo da saude esta condição seja difícil ae obter.
Soar Filho (1998) relaciona a função comunicativa a urn ganho secundário, ou
seja, beneficia o paciente quando este está, na verdade, em uma tentativa de pedir
ajuda, ou de expressar sentimentos que não está tolerando, ou. ainda, de verbalizar seu
desamparo, inseguranças e carência afetiva. Soar Filho afirma, também, que é por
meio da comunicação em geral (que inclui a comunicação não-verbal) que construímos
a interação médico-pacíente.
Tradicionalmente, segundo Franco e colaboradores (2001), os programas de
educação para a saúde, apoiadas pela OMS, visam modificar significações distorcidas
sobre as representações dos conceitos de saúde e doença e suas respectivas ações,
mas. não se preocupam com a relação entre o conteúdo dos programas educativos ou
didáticos e o nível de desenvolvimento sócio-cognitivo das populações a que se diri­
gem. A ausência de coordenação entre o conteúdo dos programas e o nivel de desen­
volvimento e compreensão das pessoas tem como conseqüência uma menor adesão
e participação em sistemas preventivos de saúde, A comunicação deve, então, incidir
em variáveis de caráter social, cultural, biológico, emocional e comportamental, além de
somente se vincular ao aspecto cognitivo ao qual se propõe. Somente desta forma,
promove-se a verdadeira perspectiva educacional no contexto dos tratamentos de saú­
de e permite-se que a experiência de tratamento médico constitua uma oportunidade
real de aprendizagem de conhecimentos e comportamentos que se generalizam a
outros contextos de vida de pacientes e familiares.
Em estudo sobre a comunicação de diagnóstico oncológico com pacientes
adolescentes (Oliveira, Oliveira, Gomes & Gasperin, 2004), observou-se grande dificul­
dade dos médicos em disponibilizar orientação à clientela, ou seja, uma falta de habili­
dade para incluir, em um mesmo procedimento, o repasse de informações e a identifi­
cação das vontades e necessidades psicossociais de pacientes e familiares. Segundo
os autores, os médicos até se sensibilizam no contato com os adolescentes em trata­
mento médico, entretanto, não conseguem articular a técnica médica a uma linguagem
acessível e referem uma autopercepção de constrangimento ao transmitir uma noticia
ruim para uma pessoa tão jovem.
Embora esses profissionais da medicina provavelmente não tenham sido ade­
quadamente treinados para passar informações de diagnóstico, tratamento e prognós-
tico, e, apesar da comunicação médico-paciente continuar sendo aprendida por meio
da prática em si, expondo os médicos a um inegável desconforto, a retransmissão de
informações sobre a doença e o tratamento para os pacientes e seus familiares é
inevitável e recai nos preceitos éticos do atendimento em saúde. Assim, a elaboração
de estratégias de comunicação que facilitem o acesso do médico e de toda a equipe ao
paciente - independentemente de sua faixa etária - é assumir uma condição mais justa

358 Áderson I- t tista Junior, Rcjarte S. Ferreira, A n to n io Bcnlo A . de M o ra fí, tyustavo S, Rolim
e funcional da atuação profissional em saude.
Santos (2001) e Mendonça (2007) observam que muitos estudos têm destaca­
do a importância da comunicação adequada do diagnósticos e tratamentos aos paciert
tes, o que pode aumentar a percepção da necessidade de treinamento adequado para
sensibilizar o médico sobre formas menos estressantes de informar o diagnóstico.
Além disso, parece necessário que o médico abra um espaço para oferecer informa­
ções sobre os procedimentos dc tratamento e suas alternativas e. ainda, que cncorajc
a participação ativa do paciente em todas as etapas do tratamento.
A prática clínica revela que a maioria dos pacientes tem necessidade de grande
quantidade de informações e suporte emocional. Além disso, a ética profissional e
resoluções do Conselho Nacional de Saúde enfatizam a importância do consentimento
informado como um mecanismo de autonomia para o paciente. Em alguns hospitais,
antes do paciente receber os medicamentos, as informações são passadas por escri­
to, como um documento, assim como o consentimento é solicitado, também, por escri­
to. Nestes casos, a responsabilidade do tratamento se estende ao paciente e seus
familiares e, para que tal dinâmica se efetive, as informações devem ser passadas
adequadamente, de forma clara e em linguagem acessível.

A Diversidade Técnica na Transmissão de Informação a Pacientes e


Familiares
Pode-se afirmar que a necessidade de transmissão de informações dos pro­
fissionais de saúde para pacientes e familiares é essencial ao andamento do trata­
mento, díscutindo-se mais recentemente, na literatura, modalidades mais adequadas
de privilegiar a informação, destacar seu significado, avaliar quanto da informação foi
compreendida por pacientes e familiares e como se revertem em benefícios ou cuida­
dos ao paciente.
Motta (2001) defende que, em qualquer estratégia de intervenção com os usu­
ários dos serviços de saúde, se faz necessário um plano de desenvolvimento de ações,
onde, para cada objetivo, deve-se: (a) definir as atividades necessárias; (b) especificar
papéis, relações funcionais e responsabilidades; (c) estimar o tempo, o custo e os
recursos necessários a cada atividade; (d) estabelecer controle periódico por objetivos,
prazos e resultados; (e) definir normas (protocolos) e procedimentos de trabalho; e (f)
estabeiecer um sistema eficiente de avaliação.
Ainda que o planejamento, descrito por Motta (2001), destoe da realidade da
maioria dos atendimentos a usuários de saúde, descreve-se, a seguir, algumas expe­
riências que apontam alternativas no sentido de ampliar o repertório dos profissionais
de saúde no que se refere ao aspecto comunicacional e educacional com pacientes e
familiares. Embora a maior parte dos estudos seja internacional, seus resultados re­
presentam opções potencialmente interessantes para estimular o repasse de informa­
ções a pacientes e familiares e, ainda, poderiam ser utilizadas para treinamento de
habilidades sociais de profissionais que atuam em serviços de saúde brasileiros, pú­
blicos e privados.

Registro das consultas em audiotapes


Uma das estratégias que tende a facilitar a compreensão de pacientes e famili­
ares sobre a doença e o tratamento inclui o uso de registro em audiotapes durante as
consultas. Esta estratégia disponibiliza ao paciente e seus acompanhantes uma revisão

Sobre Comportamento e Cognifão 359


das informações compartilhadas, de modo que, sempre que acharem necessário po­
dem recorrer à{s) fita(s) de áudio das consultas. Uma alternativa complementar, também
utilizada, é habituar-se a efetuar um sumário da consulta, sintetizando as informações
mais relevantes. Alguns estudos apontam que pacientes e familiares se sentem mais
satisfeitos com a possibilidade de ter em mãos uma revisão das consultas e que tal
estratégia pode atuar como potencial redutor de ansiedade, especialmente durante trata­
mentos médicos prolongados (Tattersall, Buttow & Clayton, 2002).

Escrevendo cartas para o médico


Escrever cartas para o médico também constitui uma forma interessante de
comunicação. Tattersall e colaboradores (2002) observaram que a maior parte das 95
cartas de pacientes e/ou familiares analisadas fazia indagações e comentários sobre o
diagnóstico e os resultados dos exames, além de questionamentos sobre a necessida­
de de outros exames, opções de tratamento, recomendações, prognósticos, benefícios e
efeitos colaterais. Pouco mais da metade das cartas recebidas pelos médicos trazia
informações relevantes sobre a história de doença do paciente, sua relação com medica­
mentos e detalhes sobre sua vida pessoal. Percebe-se, assim, que a troca de informa­
ções pode também ocorrer por carta, pois, caso o paciente não consiga encontrar o
módico em determinado momento, ou não consiga elaborar perguntas ou fornecer infor­
mações suficientes durante as consultas, pode solicitá-las ou fornecê-las por meio de
texto, impresso ou eletrônico, encaminhado ao médico. Embora esta estratégia pressu­
ponha a necessidade de certa disponibilidade do médico para receber e responder às
cartas, tais médicos têm melhores condições de compreender crenças e estilos de vida
de seus pacientes, respondendo mais pontualmente a seus questionamentos.

Vídeos educativos
Sabe-se que, em crianças, a capacidade de perceber, interpretar, classificar e
integrar são elementos norteadores para a percepção de “estar doente". Bacron e cola­
boradores (1999) investigaram os efeitos da apresentação de um video educativo sobre
a percepção que crianças sadias elaboravam sobre o câncer. Os autores aplicaram, em
25 crianças de idade escolar, um questionário sobre a doença, aplicado antes e depois
da apresentação de um vídeo de um desenho animado que abordava questões relati­
vas ao diagnóstico, intervenção hospitalar, preconceito social e prognóstico do câncer
infantil. Após a apresentação do vídeo, e antes de responder o questionário novamente,
ocorreu um debate sobre o tema.
Após a apresentação do vídeo, observou-se uma mudança no padrão de res­
postas das crianças. Antes da apresentação do vídeo, 24% acreditavam que o câncer
era uma doença infecto-contagiosa contra apenas 4% após a apresentação. O vídeo
educativo modificou as crenças relacionadas ao câncer, indicando a possibilidade de
seu uso como um recurso pedagógico potencialmente eficiente.

Grupos informativos
Para avaliar a satisfação de pacientes com câncer no processo de receber infor­
mações sobre a radioterapia em grupo informativo, Hãggmark e colaboradores (2000),
estudaram 210 pacientes que foram divididos aleatoriamente em uma de três condições
de recebimento de informações antes de se iniciar o tratamento de radioterapia: Grupo 1
- recebeu informações verbais nas consultas médicas, mais reunião de grupo com pro­
fissionais de enfermagem e, ainda, mais informações repassadas individualmente (n =

360 Áderson L, Costa Junior, Rejanc S. Ferreira, A n to n io Bento A . de M oraes, Çustavo 5. Rolim
70); Grupo 2 - recebeu informações nas consultas c em folheio impresso (n - /O); c Gmpo
3 - recebeu apenas informações nas consultas médicas (n = 70). Os pacientes responde
ram a um questionário de auto-avaliação, que investigava satisfação e compreensão das
infon-tações recebidas sobre a radioterapia. Os pacientes do grupo que recebeu informa
ções nas consultas, mais reunião de grupo o, ainda mais sessões individuais para
repassar as informações, apresentaram-se, significativamente, mais satisfeitos com as
informações do que os pacientes dos outros dois grupos. O estudo aponta que reuniões
para discutir informações, em grupo ou individualmente, são significativamente importan
tes para preparar pacientes às sessões de radioterapia. Os resultados destacam que as
informações devem ser repassadas aos pacientes e seus familiares de maneira siste­
matizada. envolvendo toda equipe de profissionais e permitindo que os pacientes expres­
sem suas duvidas e dividam, com outros pacientes, suas expectativas, receios e dúvidas.

Programas de microcomputador
Dragone, Bush, Joncs, Rearison e Kamani (2002) desenvofveram um CD-Rom
para crianças com leucemia e seus fam iliares, investigando se este produto em
multimídia, nomeado Kiríz with Leukemia: A Space Adventure, era eficiente em: (a)
aumentar a compreensão dos pacientes e seus familiares sobre a doença; (b) fortale­
cer a percepção de controle do paciente sobre sua saúde; e (c) aumentar o nível de
satisfação do paciente e de seus familiares com os serviços de saúde disponibilizados.
O estudo avaliou dois grupos, sefecionados randomicamente, de pais e crianças com
leucemias. Ao primeiro grupo foi apresentado um livro, intitulado You and Leukemia, e
no segundo grupo foi utilizado o CD-Rom desenvolvido pelos autores. Os dados apon­
taram que o grupo que teve acesso ao CD-Rom apresentou niveis melhores de com­
preensão sobre a doença, maior percepção de controle na situação e maior satisfação
com o tratamento do que o grupo que teve acesso ao livro.
O trabalho de Agre, Dougherty e Pirone (2002) estudou os efeitos da utilização
de um programa psicoeducacional, em CD-Rom, com pacientes oncológicos e seus
familiares. Os dados obtidos também apontaram que a utilização de programas de
microcomputador pode ser mais efetiva do que o uso de folhetos, livros, manuais ou
viüeotapes, especialmente em termos da qualidade didática das informações sobre a
doença e o tratamento. Agre e colaboradores também ressaltam que uso do CD-Rom
possibilitou um maior intercâmbio de informações entre os diversos profissionais de
saúde que atendem crianças em tratamento de câncer.
Para Tetzlaff (2007), a tecnologia computacional e as informações médicas
podem ser convergidas em um programa de informações sobre os cuidados que o
paciente deve receber em casa. A autora estudou o suporte que um programa de
microcomputador poderia oferecer para os cuidadores de crianças com câncer. Consi­
derando que os cuidadores têm muitas responsabilidades na administração das de­
mandas relacionadas a uma doença crónica, foi desenvolvido um software que explora­
va as possibilidades de suporte que crianças, de 10 a 12 anos de idade, com LLA.
poderiam receber de seus pais. O vídeo abordava questões relacionadas aos cuidados
gerais com o paciente, procedimentos de identificação de sinais e sintomas, comunica­
ção entre cuidadores e equipe de saúde, com partilham ento de inform ações entre
cuidadores de diferentes famílias e aconselhamento em suporte emocional. Posterior­
mente, um questionário que abordava as preocupações e dúvidas dos cuidadores foi
administrado ao corpo médico do hospital e aos próprios cuidadores.
Tetzlaff observou que tanto os pacien tes quanto seus cuidadores apresenta­
ram alta satisfação sobre as informações recebidas, sendo que 97% dos pais afirma-

Sobre Comportamento c Cognição 361


ram ter recebido todas as inform ações que gostariam de ter sobre a doença e os
cuidados a serem disponibilizados. Apesar destes resultados, 31% dos pais afirmaram
que não queriam ter recebido notícias desagradáveis sobre a doença e seu prognósti­
co. Segundo a autora, 93% dos pais referiram se sentir confortáveis com os cuidados
que ofereceram às crianças em casa, sabendo descrever corretamente os procedi­
mentos de medir pressão, aplicar medicação, tomar decisões corretas em casos de
urgência, controlar os efeitos colaterais do tratamento e lidar com as reações emocio­
nais da criança. A possibilidade de troca de informações com a equipe médica e com
outras famílias também foi ressaltada como oportunidade essencial para aumentar a
compreensão da doença e o suporte necessário para enfrentá-la.

Organização do discurso do médico


Roberts (2002) descreve sobre como os oncologistas organizam seus discur­
sos para conversar com, o paciente e seus familiares ao longo do processo de trata­
mento. O estudo realizou.uma análise qualitativa de 21 audiotapes sobre a interação
modico-paciente erri/Consujl^s médicas, destacando-se a baixa participação do paci­
ente em processos de tornada de decisão sobre o tratamento. Dentre as fitas, duas
foram selecionadas para ilustrar como os oncologistas se diferenciam em termos do
processo de transm itir informações para o paciente. Na prim eira, ocorre uma boa
interação médico-paciente e um compartilhamento de informações, enquanto na se­
gunda fita, apenas o médico fornece informação (prioritariamente técnicas) e toma
decisões, sem que o paciente tenha oportunidade para formulação de questões práti­
cas do tratamento.
Quando o discurso do médico faz referência a aspectos da vida diária do paci­
ente. investiga aspectos práticos dos comportamentos do paciente, se dispõe a ofere­
cer literatura atualizada e possibilidades de busca de informações sobre a doença e os
tratamentos, explica adequadamente os procedimentos e exames médicos a que o
paciente será exposto e se dispõe a compartilhar as experiências emocionais peias
quais o paciente está passando, o médico está propiciando um maior vínculo com o
paciente e incentivando sua maior participação em processo de tomada de decisão
sobre o tratamento (Ferreira, 2005). A autora ainda ressalta a importância de que os
cursos de graduação em medicina incluam, em seus currículos, disciplinas e/ou con­
teúdos específicos para treinar a organização do discurso médico em função do perfil
sociodemográfico e cognitivo-comportamenta! de pacientes e familiares.

M an u ais ed u cativos
A maior parte das estratégias referidas até o momento requer determinada
condição socioeconômica e cultural de pacientes e familiares para acesso a recursos
tecnológicos de informática e outros equipamentos eletrônicos, além da capacidade de
elaboração e correspondência de cartas e comunicação escrita. Tais condições não
parecem compatíveis com a realidade da maior parte da população brasileira que de­
pende do Sistema Único de Saúde [SUS] para receber atendimento e tratamento médi-
co-hospitalar. Assim, a construção e uso de manuais educativos, com conteúdo
interativo, gráfico e simplificado, tem jconstituído uma estratégia cada vez mais adotada
por profissionais e instituições, de sáúde (Ferreira, 2005).
Franco e colaboradores (2001), por exemplo, ressaltam que nem sempre se
observa uma coordenação entre o conteúdo apresentado por profissionais de saúde e
o nível de desenvolvimento social e cognitivo da clientela atendida, resultando em uma
menor adesão aos programas de saúde. A utilização de manuais educativos, como

3 6 2 Áderson L. Costa Junior, Rejane 5. Ferreira, A n ton io Bento A . de M o raes, Qustavo S. Rclim
material informativo, pode ser considerada uma alternativa adequada, esponaiuionte
se elaborado em interface gráfica e permitindo acesso a pacientes o familiaros não
alfabetizados,
Albuquerque (2002) destaca, ainda, que a disponibilizado do informação na
forma de manuais educativos ò coerentc com o principio de autonomia do paciente e de
seu representante legal, de modo que tais materiais facilitam qu o pacientes c familia­
res tomem ciência da situação e dos riscos pelos quais ostã o passando.
Ferreira (2005) utilizou um manual educativo brasileiro para transmitir informa­
ção sobre a doença e o tratamento, bem como avaliar sua compreensão, por pais de
crianças com leucemia. Os resultados apontaram quo o Manual, apresentado em um
esquema de atenção individual sistematizada, constituiu uma eficiente estratégia de
transmissão de informações, proporcionando aumento na compreensão do acompa­
nhante sobre a doença e o tratamento e criando uma rede informal de transmissão de
informações entre acompanhantes participantes da pesquisas e outros que não parti
ciparam.
Deve-se destacar, ainda, a necessidade dc quo pesquisadores o profissionais
de saúde compartilhem esforços no sentido da construção, seleção e utilização comum
de manuais educativos em esquema de pesquisa multicêntrica, privilegiando a obten­
ção de dados mais consistentes e com maiores amostras.

Considerações Finais
Certamente, a oferta e a avaliação do uso de informações relevantes sobre a
doença, o tratamento e os cuidados que devem ser prestados aos pacientes constitui
uma das formas mais eficientes de incentivar o processe.) de interação entre profissionais
e usuários do sistema de saúde, consolidando um dos principais pressupostos da psi­
cologia da saúde, relacionado à priorização de estratégias educacionais como requisito
ao atendimento mais eficiente de indivíduos e grupos em tratamento de saúde.
A disponibíiização de informação constitui elemento essencial ao enfrentamento
de processos de adoecimento e hospitalização, no sentido de se constituir, para o
paciente e seus familiares, um facilitador potencial da compreensão de seu diagnósti­
co e tratamento (Ferreira, 2005), estimulando a aquisição e manutenção de um repertó­
rio de comportamentos que permita, a partir da compreensão das informações obtidas,
com patíveis à condição da doença e necessidades psicossociais, participarem
ativamente do processo de tratamento.
Uma necessidade prioritária de investimento de pesquisa se refere à dificulda­
de de médicos e outros profissionais de saúde, de modo geral, de transmitir informa­
ções acessíveis a pacientes e familiares, assim como a resistência dos acompanhan­
tes ern solicitar mais informações aos profissionais da equipe.
Enfim, destaca-se a necessidade de que os pesquisadores de todas as áreas
da saúde desenvolvam estudos que permitam: (a) construir um corpo sistemático de
conhecimentos sobre comunicação entre profissionais de saúde e pacientes/acompa­
nhantes; e (b) investigar os efeitos de ações integradas de comunicação da equipe de
saúde, possibilitando uma maior amplitude na qualificação dos serviços prestados em
oncologia (e outras áreas de especialização m édica), conforme as necessidades
psicossociais de pacientes e familiares.

Sobre Comportamento e Cognição 3 6 3


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Sobre Comportamento e Cognição 365


Capítulo 30
Uma introdução da perspectiva
comportamental sobre o
bruxismo e outras disfunções
temporomandibulares

Neyfsom Carlos Fernandes M atias*


Psicólogo Clínico (Consultório Particular)

1. Introdução

O Bruxismo, um tipo de Disfunção Temporomandibular (DTM) tem tido a aten­


ção de vários pesquisadores. No entanto, observa-se que o Bruxismo, sob a ótica do
senso comum, nem sempre é tido como uma DTM, mas sim, como algo descolado
desta. Neste sentido, o intuito deste texto é possibilitar ao leitor a compreensão de
algumas questões básicas que dizem respeito às DTMs e apresentar uma introdução
da visão Analítico Comportamental sobre tais Disfunções.
As Disfunções ou Distúrbios Temporomandibulares (DTMs), que também são
denominadas de Disfunções/Distúrbios craniomandibulares, dizem respeito a proble­
mas nos músculos da mastigação, na Articulação Temporomandibular e suas estrutu­
ras. É o conjunto de sintomas que podem afetar os músculos e as articulações respon­
sáveis pelo o movimento mandibular (Soares, 2005).
A dor nos músculos craniocen/icofaciais e articulação temporomandibular, ruí­
dos articulares, também conhecidos como estalidos da mandíbula, função irregular ou
limitada da articulação e hiperatividade dos músculos mastigatórios são característi­
cas das DTMs (Oliveira e cols. 2005; Okeson, 1992).
Destaca-se que, as DTMs não abarcam apenas questões isoladas das articu­
lações, mas contém todas as disfunções associadas com o sistema m astigatório
(Okeson, 1992), que possui dois tipos de função: O Funcional que diz respeito aos
comportamentos de mastigar, falar e deglutir; e Parafuncional, que também pode ser
nomeado de não funcional que são hábitos como o bruxismo, mastigar objetos como,
por exemplo, tampa de caneta, morder bochechas e língua, entre outros (Seraidarian,
Assunção, Jacob, 2001; Okeson, 1992).
Na atividade parafuncional, encontra-se o Bruxismo que é o comportamento
“involuntário" de apertar ou ranger os dentes, que pode acontecer quando se está acor­
dado ou dormindo, pode produzir sons ou não quando não há mastigação (Soares,
2005; Cestari & Camparis, 2002; Martinez & Biaggio, 1996; Okeson, 1992; Jacob, 1988).

neyfsom @yahoo com br

Sobre Comportamento c Cognição


É possível que o Bruxismo soja a DTM mais conhecida entre a população em
geral e de maior destaque. O número de pesquisas sobre DTM em relação so Bruxismo
é bem menor e aponta uma maior difusão do bruxismo (Matias. 2008).
Nota-se que, grande quantidade dc pessoas ao longo das atividades diárias
freqüentemente fecha os dentes e apertam (Soares, 2005; Okeson, 1992). Por exemplo,
quando se concentra em outras tarefas ou fazem trabalhos físicos extenuantes - dirigir,
ler, escrever, dentre outras.
Os dados endêmicos sobre as DTMs no Brasil são embrionários. Entretanto,
Venãncio e Camaparis (2002) avaliam que entre ‘ 50% a 60% das pessoas sofrem de
algum tipo de DTM" (p. 192). É possível que estes núrneros venham a ser superiores,
sobretudo, ao se considerar quo, quando se trata de DTMs é preciso ter consciência de
que estas não são permanentes e aparecem em períodos ao longo da vida. Além disso,
a etiologia destas disfunções está associada a uma série de variáveis.
Segundo Soares (2005); Venãncio e Camparis (2002); Jacob (1988); Okeson
(1992), a causa das DTMs é multifatoriai. Os fatores envolvidos podem ser de ordem
psicológica, fisiológica, anatómica e social. Jacob (1988) considera o bruxismo ‘ como
uma manifestação da alteração de equilíbrio biopsicossocial" (p.69),
Existe uma discussão ampla entre pesquisadores sobre a prevalência de algu­
mas variáveis em detrimento de outras na etiologia das DTMs. Como é o caso dos
fatores ligados à oclusão versus psicológicos, por exemplo.
A titulo de introdução ao tema, os fatores oclusais estão ligados aos comporta­
mentos de fechar e abrir os arcos dentários. Ou seja, são os diversos “movimentos
funcionais que ocorrem quando os dentes superiores e inferiores fazem contato" (Uma,
Souza, Monneral, 1997). Estes fatores estão relacionados tambóm à quantidade e
posicionamento dos dentes (Negreiros e cols. 2007).
É p o ssíve l que um mau fu n c io n a m e n to de algu m as destas variáve is,
concernentes à oclusão, estejam relacionadas à origem das DTMs. Contudo, Negrei­
ros e cois. (2007), Soares (2005), Seraidarian e cols. 2001, Greene (2001) e Okeson
(1992) apontam que as causas das DTMs ligadas à oclusão ainda é controvérsia. Pois,
para algumas pessoas “a melhora na condição oclusal traz alivio completo dos sinto­
mas. Para outros, o alívio é somente parcial, ou ainda as mudanças oclusais trazem
pouco ou nenhum alívio” (Okeson, 1992, p. 128).
Apesar da afirmação de Okeson (1992), sobre a intervenção na condição oclusai
resultar em alivio para algumas pessoas, este e outros autores destacam que já é uma
unanimidade entre os pesquisadores que uma má oclusão necessariamente não está
ligada à origem das DTMs. Do contrário, podia-se esperar que, quando sintomas rela­
cionados a estas disfunções surgissem, eles não se alterariam até a oclusão ser
modificada (Okeson, 1992). Observa-se que, "a terapia oclusal deve ser utilizada com
reserva porque não há evidência clara de que a variação morfológica oclusal natural
possa ser causa comum de DTM" (Soares, 2005, p. 55).
Quando se fala em intervenções na oclusão è preciso informar que isto quer
dizer a utilização de intervenções invasivas e há uma tendência a evitar este tipo de
tratamento. Além disso, o fato de se buscar uma oclusão ideal, no tratamento ortodôntico,
com vias a alcançar o encaixe perfeito dos dentes é um objetivo imaginário segundo
Lima e cols, (1997).
Em se tratando de DTMs é preciso que diversos fatores para além da condição
oclusal sejam levados em consideração. Ou seja, para se determinar a etiologia das

3 6 8 Neyfsom Carlos Fernandes Matias*


DTMs é preciso focar a atenção para aiém das condições dos padcntus (Cestari &
Camparis, 2002). Na literatura, principalmente da odontologia, encontra-se estudos
que destacam um número significativo de pesquisas que apontam as relações entre
DTM s e ansiedade, estresse, depressão e até mesmo com a qualidade de vida.
Jacob (1988) destaca que "não há nenhum sintoma diagnóstico tão claro de que
algo anda mal, como o do indivíduo que range e aperta os dentes" (p. 74). Neste sentido,
estudos quo investigaram a influência da ansiedade' sobro o bruxismo têm destacado a
sua associação com a dor muscular e articular (Hemandez, Abaío, Martin, 1999), Além
disso, estados de ansiedade podem desencadear o bruxismo (Duarte & Hübner, 1999,
Cestari & Camparis, 2002, Paludo e cols. 2003). Soares (199?) destaca que o ranger e
apertar os dentes, ou seja, o bruxismo pode aumentar de freqüência devido à ansiedade,
Jacob (1995), aponta que a ansiedade pode ser uma resposta ao estresse que
desencadeia as DTMs. O que destaca o entrelaçamento da ansiedade, estresse e
DTMs. Isto apresenta o quanto pode ser difícil delimitar a influência de uns sobre os
outros. Para alguns autores o Bruxismo, por exomplo, está intimamente ligado a
desequilíbrios emocionais e situações de estresses (Seraidarian e cols. 2001). Segun
do Cestari & Camparis (2002) a pessoa precisa saber se livrar da energia causada pelo
estresse, do contrário, o excesso desta “energia’’ no corpo poderá resultar em proble­
mas de saúde, como o bruxismo.
Os estudos de Lipp (1995, 1996) apresentam informações importantes para o
estudo sobre estresse. A autora destaca quo, pessoas em situações estressantes
podem ter a gengiva retraída (Lipp, 1996). Sendo esta retração uma das conseqüências
possíveis das DTMs, pode-se afirmar que o estresse desencadeia e até mesmo agrava
estes quadros. Sobretudo, ao se pensar que para a gengiva se retrair é preciso quo algo
aconteça e a simples “exposição” ao estresse não necessariamente causa algum
dano à gengiva. Mas, sim hábitos parafuncionais relacionados ao sistema mastigatório
é que resultam em retração gengival.
A contemporaneidade apresenta uma rotina que pode levar as pessoas a vive­
rem momentos de estresse. Cada vez mais se tem que correr contra o relógio na busca
de cumprir agendas. Isso acontece em diversas fases da vida. Crianças tèm jornadas
que vão para além da escola, adolescentes que devem decidir qual carreira seguir e
adultos com excesso de trabalho, são algumas das diversas situações que podem
conduzir ao estresse.
Uma das idéias contemporânea de destaque é a necessidade constante de se
buscar fazer alguma coisa, O resultado disso é que somente uma pequena parcela das
pessoas consegue se entregar à “tarefas" como não fazer nada. O comportamento de
relaxar só é alcançado com o auxílio de sedativos ou tranqüilizantes (Skinner, 1987).
Observa-se, principalmente nos grandes centros urbanos - onde a qualidade de vida
tem caído em função de fatores como a violência, trânsito cada vez mais intenso nas
ruas e ritmos acelerados de vida, dentre outros - que uma “boa qualidade" de vida já é
quase utopia. O que consequentemente pode interferir no aumento dos quadros de
DTMs na população em geral.
Paludo e cols. (2003) investigaram na cidade de Curitiba a relação das áreas de
violência urbana com o estabelecimento e/ou exacerbação da sintomatologia de DTM. Os
resultados encontrados por estes pesquisadores mostram claramente que a maioria
dos pacientes com DTMs provém da área de maior índice de violência. O que prova a
' Para uma consulte sobre a ansiedade e suas características uma opção Introdutória pode ser os estudos de Duarte e Hübner (1999),
Bis ggio (1999).

Sobre Comportamento c Cognição 3 6 9


hipótese dos autores "de que a violência urbana contribui para diminuir a qualidade de
vida através do aumento dos níveis de estresse, o que, por sua vez, culmina no aumento
do número de pacientes com DTM e dor orofacial" (Paludo e cois., 2003, p. 254).
Alguns pesquisadores têm destacado o bruxismo em suas pesquisas “tendo
em vista que ele é uma disfunção comum no cotidiano da vida moderna e se apresenta
tanto em crianças e quanto em adultos com sintomas de ansiedade a ele associados’
(Duarte & Hübner 1999, p. 44). É importante destacar que o Bruxismo é um tipo de DTM.
Isto faz-se necessário para que não haja confusões no que tange a este problema ser
separado destas disfunções que possuem diversas conseqüências como apresenta a
próxima seção.

2. Os danos das DTMs e o seu Diagnóstico


Em um quadro de DTM, Segundo Okeson (1992), Calrson e cols (2005) e Miranda
(2005) é possível que várias estruturas possam entrar em colapso causando sintomas
como: Pulpite, que é a inflamação da polpa do dente; Desgaste dental, que, em alguns
casos, pode ser percebido peia própria pessoa que está passando pelo problema;
mobilidade dental; dor nos músculos mastigatórios, na articulação temporomandibular,
no ouvido, cabeça e músculos do pescoço. Estes são algum as das conseqüências
mais comuns das DTMs.
Apesar de estes sintomas serem aparentes, o diag nóstico preciso desta
disfunção é de responsabilidade do profissional da área de Odontologia (Marcucci &
Corrêa, 2001; Okeson, 1992). Pois, é o Cirurgião Dentista que possui o conhecimento
necessário para um diagnóstico correto de DTM. Sobretudo, para verificar se a disfunção
é causada por algum problema da oclusão, mesmo com toda a discussão que permeia
a relação as causas oclusais nas DTMs.

3. Alteração Cognitiva dos Comportamentos Parafuncionais e Análi­


se Funcional do Comportamento
A partir de diversos estudos nota-se que é importante a atuação de diferentes
profissionais no tratamento e em questões como a educação e auto cuidado do pacien­
te com DTM. A introdução de noções sobre autocontrole, por exemplo, pode ser útil, no
sentido de contribuir para realização de determinadas tarefas, no reconhecimento de
hábitos que possam trazer prejuízos causados pelas DTMs, e na sua modificação
(Soares, 2005).
Atritar os dentes e pressioná-los lançando a língua para frente, má postura no
momento de dormir, morder determinados objetos, dentre outros comportamentos, são
prejudiciais e podem contribuir para o agravamento dos quadros de DTMs. No entanto,
para modificá-los é preciso que a pessoa observe a sua presença e tenha auxilio para
obter êxito nesta tarefa, Esta ajuda pode ser dada por Cirurgiões Dentistas, Psicólogos,
Fisioterapeutas, dentre outros profissionais.
S oa res (2005) realizou um estudo para v e rific a r o e fe ito da A lteração
Comportamental Cognitiva no tratamento de dores orofaciais e destaca que, a modifica­
ção do comportamento parafuncional pode ser alcançada quando o paciente torna-se
mais consciente dele e tem motivação para fazê-lo. Uma das condusões deste estudo é
que “a percepção dos hábitos pelo paciente portador de disfunção temporomandibular de
origem muscular tem efeito benéfico sobre sua sensibilidade” (Soares, 2005, p. 101).
No entanto, para uma profícua utilização desta percepção é importante a inter­
venção de um profissional que tenha, no mínimo, noções sobre o que são hábitos

370 Neyfsom Carlos Fernandes M atias*


parafuncionais da Articulação Temporomandibuiar. O que pode sor foito por profissio­
nais de áreas como a Psicologia, Fisioterapia e principalmente da Odontologia. Sendo
o assunto mais comumente tratado por esta, devido ao fato de que a origem das DTMs
ainda são associadas a problemas de oclusão (Venãncio & Campa ris, 2002).
Em relação à Análise dc Comportamento e outras abordagens psicológicas
faz-se necessário uma maior disseminação destas corno áreas importantes no trata­
mento das DTMs. A Análise do Comportamento pode contribuir na superação de proble­
mas como: dificuldades no trabalho, morte de alyum parente ou amigo, dificuldades
econômicas, desajustes na vida sentimental que, segundo Jacob (1988), são fatores
associados e envolvidos no aparecimento das DTMs.
Em se tratando especificamente d« um quadro dc DTM, o terapeuta pode pro­
por ao paciente a realização de técnicas para relaxar, evitar comportamentos prejudici­
ais, de autocontrole (Cruz, 2006), dentre outras. Um exercício de autocontrole, por exem­
plo, pode ser desenvolvido a partir do estabelecimento de estímulos discriminativos
(uma fita, um bip de relógio, a contagem de tempo de um cronômetro) que ao serem
percebidos, a um intervalo de tempo fixo 20 minutos, a pessoa deve notar a presença ou
não do comportamento parafuncional (a título de exemplo, morder o lábio). Caso o
comportamento esteja sendo realizado, o paciente deve parar imediatamente de emiti-
lo. do contrário, a pessoa deve se parabenizar como reforço positiva ou até mesmo
estabelecer algo que lhe recompensador (Por exemplo, estabelecer metas do tipo:
caso consiga ficar duas horas sem morder o lábio, a pessoa se permitir a parar a tarefa
que esta realizando para ver uma paisagem por 10 minutos).
Soares (2005) propôs aos sujeitos de seu estudo uma tarefa parecida e obteve
resultados satisfatórios. Este autor baseou-se nas pesquisas de Carlson e cols. (2001) e
outros autores para a elaboração da tarefa que foi realizada pelos sujeitos de sua pesquisa.
Observa-se neste e outros trabalhos o enfoque na 'Alteração Comportamental Cognitiva”
como ferramenta para o tratamento de DTMs (Soares, 2005; Negreiros e cols. 2007).
Consoante com a Alteração Comportamental Cognitiva, a Análise do Comporta­
mento mostra-se como uma teoria com conhecimentos sólidos no que tange à busca
de soluções em diversos contextos do comportamento humano. Em se tratando de
DTMs não seria diferente, sobretudo, devido ao fato de que as mesmas são originárias,
principalmente, de questões comportamentais.
A abordagem Comportamental Cognitiva, destacada nos estudos de Soares
(2005), Negreiros e cols. (2007), no tratamento de DTMs não apresenta uma interven­
ção para além do problema em si e é focada nas mudanças dos hábitos parafuncionais.
Tendo em vista os fatores psicológicos, sociais e comportamentais envolvidos
na gênese das DTMs, faz-se necessário uma intervenção mais "profunda” a fim de se
descobrir as causas do problema e traçar estratégias de intervenção. Isto pode ser
alcançado através da Análise Funcionai do Comportamento (Skinner, 1970).
Entende-se que, para o tratamento dos quadros de DTMs é preciso modificar
as contingências, sendo a Análise Funcional fundamental neste processo (Meyer, 1997).
Sua importância, sobretudo, sobre uma disfunção com causas tão diferentes como a
DTM, justifica-se pela possibilidade de identificar as variáveis essenciais na ocorrência
deste “fenômeno e, exatamente por isso, permitir intervenções futuras; ela possibilita o
planejamento de condições para a generalização e a manutenção" (Matos, 1999 p. 13)
dos acontecimentos envolvidos neste quadro.
A Análise Funcional do Comportamento (Skinner, 1970) do paciente com DTM é
útil para se usufruir das possibilidades que esta “ferramenta" possui. Pois, “fazer uma

Sobre Comportamento e Cognição 371


análise funcional é identificar a função, isto é, o valor de sobrevivência de um determina­
do comportamento (...) é uma análise das contingências responsáveis por um compor-
tamento ou por mudanças nesse com porta mento” (Matos, 1999 p. 11/14). Ou seja, ao
se debruçar sobre o problema o terapeuta pode contribuir, para a descoberta dos fenô­
menos envolvidos nas DTMs, traçar planos terapêuticos com vistas à sua eliminação e
fornecer informações importantes para outros profissionais como o Cirurgião Dentista.

4. Uma discussão sobre as DTMs a partir da Análise do Comporta­


mento
As DTMs têm sido tratadas e discutidas principalmente por Cirurgiões Dentis-
tas. A contribuição de outras áreas do conhecimento neste debate é recente e isto se
reflete na literatura sobre o tema que provém, em sua maioria, de profissionais ligados
ã Odontologia e das perspectivas deste campo do conhecimento. Complementando
esta idéia, tem-se o intuito de apresentar uma introdução da visão da Anáfíse do Com­
portamento sobre as DTMs e com isto contribuir para o debate sobre os mesmas a
partir de uma área distinta da Odontologia.
A literatura apresenta que as causas das DTMs são múltiplas e envolve diver­
sos fatores. No entanto, o fator etiológico multífatorial é motivo de controvérsias, pois,
torna-se im possível acessar todos os fatores como estresse, ansiedade, relações
interpessoais, hábitos orais, dentre outros (Greene, 2001), o que destaca a necessida­
de de cuidado ao se destacar o que causa as DTMs, não apontando apenas a possibi­
lidade de diversas influências.
Greene (2001), destaca que torna-se complexo assumir a opinião de causas
multifatoriais e que isto não contribui para a compreensão das DTMs e muito menos para
os pacientes. Causas múltiplas sugerem diversos olhares e o destaque da importância
de olhares diversos sobre o problema o que pode não ser possível ao se levar em
consideração a abordagem do problema apenas pelo Cirurgião Dentista. No mesmo
sentido, o fator de desequilíbrio biopsicosocial destaca a junção de três aspectos distin­
tos (o biológico, o psíquico e o social), que podem ser difíceis ou praticamente inatingíveis
para profissionais como Cirurgiões Dentistas, Psicólogos, Fisioterapeutas e outros.
Greene (2001), destaca que bons clínicos, cirurgiões dentistas, são sensíveis
para detectar ramificações psicológicas nas DTMs como, por exemplo, ansiedade e
depressão. O desenvolvimento desta consciência, segundo o autor, pode evitar erros.
No mesmo sentido, bons terapeutas, psicólogos, devem ser capazes de perceber que
os fatores psicológicos podem não ser os únicos causadores de DTMs e solicitar uma
avaliação odontológica.
Em relação às causas das DTMs, observa-se a necessidade de maior divulga­
ção das pesquisas que apontam a prevalência de fatores comportamentais em relação
ao fator oclusal no desenvolvim ento das mesmas (O keson, 1992; Soares, 2005,
Saraídarian e cols., 2001). Venancio & Camparis, (2002) destacam que muitos dentis­
tas consideram o fator oclusão como causa predominante de DTMs e que apenas
dentistas com formação recente consideram outros fatores como causadores das DTMs,
o que pode apontar o desconhecimento da Análise do Comportamento e da psicologia
como áreas que podem contribuir na cura das DTMs. Os autores destacam que, ‘ ainda
perduram controvérsias e inconsistências a respeito da etiologia e tratamento das DTMs”
(p. 200).
Dizer que estados de ansiedade provocam, estão associados, aumentam e
desencadeiam DTMs, pode não ser útil quanto informações como estas demonstram

372 Neyfçom Carlos Fernandes M atias*


ser. Pois, o estado de ansiedade já e a conseqüência de algo anterior a DTM. Ou seja,
cie já é urna causa do próprio estado que indica um conjunto de predisposições emo­
cionais atribuídas a utri especial tipo de circunstancias (Skinner 1970). A busca, através
da terapia, de diminuir as conseqüências dos "efeitos da ansiedade devem operar
sobre essas circunstâncias'' (Skinner 1970 p. 108). Skinner (1970) destaca que, não é
útil para a soiução de urri problema, como é o caso das DTMs, dizer que determinados
aspectos do comportamento se deve a ansiedade é preciso sabe saber como esta foi
induzida e como pode ser alterada.
Ou seja, a partir da Análise Funcional é feito uma investigação para observar
questões como: a pessoa està ansiosa por quê? O que vem causando esta ansiochi
de9 É preciso saber como a ansiedade foi induzida o como pode ser alterada (Skinner,
1970) e com isto contribuir no tratamento de DTMs.
No mesrno sentido encontra-se o estresse que pode estar associado, desen­
volve ou agrava quadros de DTMs. Afirmar a partir da equação FSTRESS—y DTMs, não
apresenta informações do ponto de vista clinico para o paciente. A questão é: como
fornecer subsídios para a resolução de questões anteriores às DTMs? Neste caso o
estresse também é uma conseqüência de algo anterior junto com a DTMs, sendo uma
manifestação de uma contingência já para além do estresse em si. É possível que o
estresse, a ansiedade e as DTMs sejam produtos de algo anterior e se apresentam
entrelaçadas.
No que tange a declarações do tipo: “estados de Ansiedade e/ou Estresse
—► DTMs" é preciso destacar que "é um hábito perigoso explicar uma afirmação em
termos de outra, porque sugere que já encontramos a causa e não é preciso mais
pesquisar" (Skinner, 1970, p. 26).
A questão é o que causou o estado de Ansiedade e/ou Estresse e não que
DTMs são resultados destes, pois. todos estão no mesmo nível e, é admissível que
suas causas sejam resultados da mesma contingência. Como apresenta a pesquisa
de Paludo e cols. (2003) que mostra a interferência de condições externas, a violência
urbana, que desencadeiam DTMs e não que os sujeitos das pesquisas estavam ansi­
osos ou estressados "simplesmente" e tinham DTMs.
Devido aos danos que as DTMs podem causar as técnicas utilizadas pela
Alteração Com porta mental Cognitiva apresenta possibilidades para melhora nos qua­
dros de DTMs como apontam os estudos de Soares (2005), Riley e cols. (2007), Carlson
e cols. (2001), a partir do próprio paciente que está passando por um episódio de DTM,
principalmente pelo caráter não invasivo que estas técnicas apresentam.
Mesmo com a informação de que o Cirurgião Dentista é o profissional indicado
para o diagnóstico de uma DTM, é possível que o terapeuta observe a possibilidade do
presença desta disfunção. O paciente pode levantar queixas de percepção do desgaste
de seus dentes, sintomas como dor orofacial, de cabeça, nos músculos do pescoço e
na articulação temporomandibular, dentre outros, que são estímulos discrim inativos
para as DTMs. Com isto, é notável a importância do terapeuta aconselhar a consulta
odontoíógica para que sejam tomadas medidas necessárias como, por exemplo, a
confecção de uma placa oclusal que pode evitar danos como a perda de um dente,
mobilidade dental dentre outros. Pois, além do prejuízo no sistema mastigatório isto
pode afetar diretamente a auto-estíma do paciente, caso este venha a perder um dente.
Um evento dessa natureza pode ter impactos drásticos na vida de uma pessoa, por
exemplo, em um quadro de depressão que pode desencadear um quadro de DTM,
segundo Cestari e Camparis (2002).
O Terapeuta pode contribuir para além da Alteração Comportamental Cognitiva

Sobre Comportamento e Cognição 373


no sentido de se investigar as causas de tais comportamentos e proporcionar uma
possibilidade de resolução de problemas que escapam da atuação desta alteração. O
que pode ser possívol através da Analise Funcional do Comportamento (Skinner, 1970).
Como exemplo, de complementação da Alteração Comportamental Cognitiva,
pode-se citar a questão do autocontrole (Cruz, 2006; Skinner 1970). A técnica de Soares
(2005), apresenta um exemplo de auto-monitoramento, pois, arranja um estímulo
discrim inativo para encorajar o com portam ento (Skinner, 1970) de evitar hábitos
parafuncionais, como é o caso do sinal descrito na técnica. Se houver uma explicação
de que isto que o sujeito irá fazer faz parte de um exercício de autocontrole e apresentar
informações relativas ao tema é possível que a técnica possa ser ainda mais profícua.
O terapeuta pode realizar uma análise funcional para detectar as possíveis
causas das DTMs e contribuir para a não reincidência do comportamento não funcional
após a utilização de uma técnica de autocontrole, por exemplo. Complementando a
in te rven ção, o A n a lista do C om po rta m ento poderá fo rn e c e r sub sídio s para o
autoconhecimento do paciente e fazer com que o rnesmo possa não mais responder ao
ambiente através de uma DTM. Pois, “as respostas discriminativas ao próprio compor­
tamento e às variáveis das quais o comportamento é função parecem ser produto
exclusivo do ambiente social" (Skinner, 1970 p. 237). No que tange às DTMs, arrisca-se
em dizer que estas são, salvo as de origens oclusal e fisiológicas, fruto das contingên­
cias sociais. Tendo como base o fato que Cirurgiões Dentistas ainda desconhecem
outras p o ssib ilid a d e s de tratam e nto das DTMs para afém do s procedim entos
odontológicos (Venãncio & Camparis, 2002), este campo apresenta-se como um uni­
verso a ser explorado pela Análise do Comportamento.

5. Considerações Finais
Nota-se que profissionais de distintas áreas podem contribuir para o tratamen­
to de DTMs como Cirurgiões Dentistas, Psicólogos e Fisioterapeutas, dentre outras.
Sabe-se que o tratamento para as DTMs pode e deve ser multidisciplinar. No entanto,
limitou-se aqui apenas a algumas considerações a partir da Análise do Comportamen­
to e informações a partir de estudos da Odontologia que se debruçaram sobre o tema.
Pode-se dizer que este trabalho diz respeito a uma introdução ao estudo das Disfunções
Temporomandibulares a partir da ótica da Análise do Comportamento.
Informações mais aprofundadas sobre a oclusão, placas oclusais e danos
causados pelas DTMs fazem-se necessárias. Sabe-se, por exemplo, que a placa oclusaí
é uma aliada importante no tratamento destas disfunções. No entanto, estes temas
serão tratados em uma outra oportunidade. Ressalta-se apenas que é de suma impor­
tância, para os profissionais com interesse em pesquisar as DTMs, estar atento tam­
bém a fatores ligados à oclusão e ao papel que a placa oclusão pode ter no tratamento
das DTMs.
É notável que a produção científica na área da psicologia sobre as DTMs no
Brasil é incipiente. Observa-se que os periódicos da Odontologia têm dado mais desta­
que sobre as questões psicológicas das DTMs do que os de Psicologia. É importante
que ambas áreas produzam conhecimento sobre o tema e que os seus profissionais
estejam atentos “a novos avanços e mudanças na prática clinica baseados em princípi­
os científicos’' (Venãncio e Camparis, 2002 p. 200). O que destaca a necessidade de
maior investimento de pesquisas sobre o tema.
Em relação à origem das DTMs, arrisca-se a dizer que o fator da causa
multifatorial não pode ser o substantivo da origem. Ou seja, há diversos fatores que

374 Neyfsom Carlos Fernandes M atias*


podem desencadear DTM. É preciso investigar se há interlocução destes com a vidn do
paciente com DTM, o que pode não ser comum a todas as pessoas. Ressalta-se quo o
fator multifatorial diz mais das possibilidades de causa do que destas em si
É inegável a contribuição da Análise do Comportamento e da Psicologia, do
uma maneira geral, para o tratamento das DTMs. No entanto, faz-se nccessario uma
divulgação desta possibilidade, principalmente, entre os Cirurgiões Dentistas. É preci­
so também que os Psicólogos conhoçam as funções do sistema mastiyatorio e um
pouco de questões ligadas à articulação temporomandibular, tsto pode sor importante
para que os terapeutas possarn ser capazes de perceber estímulos discrim inativos
que indiquem a presença de alguma DTM. É possível que diversos terapeutas atendam
inúmeros pacientes sem perceber que estes estão sofrendo devido a uma DTM.
Com vistas de que as pessoas não conseguem relaxar na contemporaneidade
e vivem em busca por algo a fazer, é possível que o estresse, a ansiedade, depressão
e as DTMs sejam as “doenças" de maior destaque e desafiantes para os profissionais
que lidam com o comportamento humano.
Espera-se que este texto contribua para a compreensão de algumas questões
re la tiva s à D isfunção Tem porom andibular e fom ente novas qu estõe s a scrcm
investigadas no futuro.

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376 Neyfsom C arlo; Fernande? M dliüs*


Capítulo 31
Estratégias de enfrentamento entre pais
de crianças com câncer:
contribuições teórico-metodológicas
M arin a Kohlsdorf*
UnB
Áderson Luiz Costa Junior**
Unl-Í

Neste capitulo, os autores apresentam suas reflexões críticas sobre 0 m odelo


teórico do enfrentamento, am plamente desenvolvido por Lazarus e Folkman desde
a década de 1980: destacando inicialm ente aspectos cognitivos conhecidos e
sistemas de categorízação divulgados. Apoiados em uma recente revisão de lite­
ratura, Kohlsdorf e Costa Junior propõem uma análise específica psra a área da
saúde ao focalizarem a noção de enfrentamento no contexto onco-hem atoiógicu
pediátrico.

Considerando a relevância da participação dos cuidadores parentais no acom pa­


nham ento do jovem paciente oncológico, os autores abordam alguns desafios
envolvidos na discussão sobre estratégias adaptativas versus não-adaptatives,
freqüentemente suscitada em pesquisas sobre o tema. A exemplo de Carolyn M.
Aldw in em seu livro Stress, Coping and Development (1994), prefaciado p o r Richard
Lazarus, os autores alertam quanto à necessidade de distinguir entre enfrentamento,
adaptação e ajustamento retomando importante debate.

Em suma, fundamentados em sua experiência profissional e investigativa no âm ­


bito da Psíco-Oncologia Pediátrica, Kohlsdorf e Costa Junior oferecem uma inte­
ressante exposição sobre questão centra! na área, subsidiando a elaboração de
futuros estudos destinados ao cam po assistencial.

Dra. Tereza Cristina Cavalcanti Ferreira de Araújo


UnB

O câncer na infância inclui um conjunto composto por mais de 200 patologias


cuja peculiaridade é a capacidade de divisão e multiplicação descontrolada de células

‘ Mestrsndado Programa de Pós-graduação erri Processos de Desenvolvimento Humano e Saúde UniversídadGdGBrasília Brasília. DF. E-mail.
marinakSlur,b.br
“ Doutorem Psicologia. Professor Adjuntodo Instituto de Psicologia da Universidade de Brasília. Brasília. DF. Tetefax: 61-33073069 / 61-81118199
E-mail: adfifson@ unh.br

Sobre Comportamento e Cognição 377


imaturas, que prejudicam o funcionamento de vários órgãos e sistemas corporais (Braga,
Tore & Loggetto. 2007). Por serem enfermidades relativamente raras na infância e ines­
peradas na dinâmica familiar, as neoplasias representam um grande desafio para a
família da criança diagnosticada, em especial aos pais ou cuidadores primários.
Apesar dos avanços decorrentes das modernas técnicas de diagnóstico, cres­
cente eficiência de campanhas de prevenção e detecção precoce, progressos na tera­
pêutica antincoplásica e em recursos cirúrgicos, o diagnóstico do câncer na infância
ainda representa um evento traumático a todos os envolvidos. O tratamento se caracteriza
pela repetição de procedimentos médicos invasivos dolorosos, alterações de rotina es­
colar. social e fam iliar, internações freqüentes, efeitos colatera is da m edicação
antineoplásica, possibilidades de cirurgias e recaídas, incertezas quanto ao futuro, altera­
ções em planejamentos pessoais e familiares, entre diversos outros desafios (Costa
Junior, 2005),
C onsiderando o contexto extrem am ente aversivo do tratam e nto onco-
hematolóqico pediátrico, é fundamental compreender como os pais enfrentam ou lidam
com as exigências do tratamento, a fim de planejar intervenções eficazes que possam
minimizar custos comportamentaís inerentes às contingências de tratamento e, desta
forma, melhorar a qualidade de vida e de adesão ao tratamento.
Este capítulo apresenta uma breve introdução a definições e concepções so­
bre o enfrentamento, bem como descreve os principais estudos que analisam o pro­
cesso de enfrentamento entre pais de crianças expostas a tratamento onco-hematológico
e discute alguns desafios á pesquisa nesta área.

Enfrentamento: definição
Em linguagem cotidiana, o termo genérico "enfrentar” significa confrontar, depa­
rar-se com uma situação, adaptar-se a uma condição. De fato, experiências que podem
ser percebidas como estressantes (tais como o início da experiência escolar, o diagnós­
tico de uma doença crónica, a perda de um familiar, entre outras) exigem adaptações
individuais e/ou coletivas (Cerqueira, 2000).
Já o conceito científico de enfrentamento foi gerado a partir de dois modelos
teóricos principais: (a) a tradição da experimentação anima!; e (b) a psicologia psicanalí-
tica do ego (Lazarus & Folkman, 1984). No modelo animal, o enfrentamento é caracteriza­
do pelas respostas do indivíduo para exercer algum controle sobre condições ambientais
aversivas. sendo monitorado a partir das modificações fisiológicas e hormonais que
evoca frente à condição {Munet-Vilaró, 1984; Lazanjs & Folkman, 1984). Na concepção
derivada da psicologia psicanalitica do ego, o enfrentamento é caracterizado pelos pen­
samentos e atos flexíveis que evitam o desenvolvimento da angústia e manejam o estresse,
que se expressam por meio de mecanismos de defesa (negação, isolamento afetivo,
racionalização, entre outros) hierarquicamente organizados (Lazarus & Folkman, 1984;
Cerqueira, 2000). Nesses dois modelos, o enfrentamento é descrito como estático e
imutável, na medida em que é concebido tanto como tendência biológica (em que deter­
minados indivíduos são mais vulneráveis a estimulações de caráter emocional) quanto
inerente a padrões típicos e rígidos de personalidade, derivados de estilos defensivos
inconscientes e psicopatológicos, concebidos como mais ou menos primitivos ou
adaptativos (Lazarus & Folkman, 1984; Costa Junior, 2001; Gimenes, 1997; Selye, 1977;
White, 1974; Lazarus, 1966; Antoniazzi, DelLAglio & Bandeira, 1998).
Em oposição à concepção de enfrentamento como um traço de personalidade,
padrão estável ou estiio, temos a concepção baseada no modelo interativo de estresse.

378 M arina Kohlsdorf, Áderson Luiz Coda Junior


Tradução para a língua portuguesa do termo inglês "coping", o enfrentamento e rlefmidn
por Lazarus e Folkman (1984, p. 141) como ‘ esforços cognitivos e cumportamontais em
continua mudança, com objetivo de manejar (minimizar, evitar ou toíerar) demandas
específicas internas e/ou externas que são avaliadas como sobrecarga ou excedendo
os recursos pessoais". O termo não se refere apenas aos comportamentos percebidos
como ameaçadores, mas também avaliados como potencialmente benéficos Nesta
concepção, o enfrentamento é caracterizado como um processo odaptativo o, desta
forma, fatores do ambiente que caracterizam contingências para emissão ou evocação
de respostas específicas podem ser modificados, a partir de alterações na configura­
ção de estímulos (a intervenção de uma equipe de saúde, por exemplo), concepção
extremamente relevante à psico-oncologia (Costa Junior. 2001)
Neste modelo, Folkman e Lazarus (1985) apontam alguns elementos funda­
mentais: (a) o encontro com o(s) evento(s) estressor(es) não ó imediato e estático, rrias
um processo de interação, relacional, multifacetado. especifico às demandas, e que
ocorre ao longo do tempo; (b) as estratégias dc enfrentamento podern ser aprendidas,
modeladas, descartadas e envolvem o que o indivíduo efetivamente faz, não o que usual
mente poderia fazer, Além disso, as diferenças individuais nas avaliações sobre a situa
ção refletem histórias de reforçamento distintas, valorizando diferenças individuais e
enfatizando resultados adaptativos em detrim ento de concepções patológicas ou
psicopatológicas (Foikman, Lazarus, Dunkel-Schetter. DeLonguis & Gruen, 1986).
O modelo ressalta, ainda, a relevância da mobilização voluntária de esforços,
com comportamentos intencionais para o manejo do estresse, envolvendo avaliações
contínuas da situação e diferenciando as estratégias de enfrentamento das respostas
automáticas ou espontâneas ao estresse (Lazarus & Folkman, 1984; Antoniazzi, DelIAglio
& Bandeira, 1998), geralmente de curta duração ou pouco eficientes ao longo do tempo.
Outro aspecto relevante se refere ao enfrentamento como um conjunto de es­
tratégias para lidar com exigências que são avaliadas como sobrecarga. Em outras
palavras, mais importante do que o evento estressor erri si é a vulnerabilidade do
organismo a ele, ou seja, o julgamento que o indivíduo faz dessa condição a partir de
avaliações cognitivas (Lazarus & Folkman, 1984; Folkman, Lazarus, Dunkel-Schetter,
DeLonguis & Gruen, 1986).

Avaliações cognitivas e enfrentamento


A avaliação cognitiva que o indivíduo faz de uma situação (ou seja, o processo
de categorizar um encontro com o estímulo e seus desdobramentos) é influenciada por
diversos fatores: história de reforçamento, natureza do evento, demandas específicas
impostas socialm ente, limitações individuais, disponibilidade de recursos, valores e
crenças, topografia e configurações do estimulo estressor, elementos contextuais, ha­
b ilid ad es so cia is, apoio dispo nível, recursos m ateriais e d ispo siçõe s cultu rais
(Cerqueira, 2000; Lazarus & Folkman, 1984; Lazarus, 1966; Gimenes, 1997: Folkman,
Lazarus, DunkeíSchetter, DeLonguis & Gruen, 1986; Fofkman & Lazarus, 1980; Folkman
& Lazarus, 1985; Munet-Vilaró, 1984). Didaticamente, a avaliação cognitiva divide-se em
primária e secundária.
A avaliação primária corresponde ao julgamento do evento como: (a) irrelevante
(o encontro com as contingências não mostra implicações para o bem-estar do indiví­
duo); (b) benéfico (o resultado do encontro preserva ou promove o bem-estar); ou (c)
estressor, que pode caracterizar-se como perda/dano (ern que o prejuízo já ocorreu ou
está acontecendo), ameaça (quando o prejuízo ou dano ainda não aconteceu, mas é

Sobre Comportamento e Cognição 379


antecipado) e/ou desafio (quando se refere a uma oportunidade potencial de ganho ou
beneficio que demanda esforço) (Folkman, 1984; Lazarus & Folkman. 1984; Lazarus,
1966; Folkman & Lazarus, 1985; Folkman, Lazarus. DunkeISchetter, DeLonguis & Gruen.
1986; Folkman & Lazarus, 1980).
Na avaliação secundária, recursos pessoais são mobilizados para a ação: o
indivíduo estima o que pode efetivam ente ser feito, em term os de estratégias de
enfrentamento, frente às características do encontro e recursos disponíveis. Contínuas
reavaliações são também realizadas, a partir de novas informações do ambiente, para
verificar necessidades de ajustes ou mudanças coinportam entais (Folkman, 1984:
Lazarus & Folkman, 1984; Lazarus, 1966; Folkman & Lazarus, 1985; Folkman, Lazarus.
DunkeISchetter, DeLonguis & Gruen, 1986; Folkman & Lazarus, 1980).
Cabe ressaltar no entanto, que tais nomenclaturas (primaria e secundária)
devem ser analisadas com cautela, pois implicam uma idéia incoerente de relevância
ou sucessão temporal; na prática, os dois processos se combinam, se sobrepõem
mutuamente e são interdependentes (Folkman, 1984; Lazarus & Folkman, 1984; Lazarus,
1966; Folkman & Lazarus, 1985).

Categorias de estratégias de enfrentamento


Inúmeras formas podem ser adotadas para definir operacionalmente as estra­
tégias de enfrentamento e classificar os comportamentos em categorias, de acordo
com objetivos do estudo e fundamentação teórico-filosófica. Destaca-se que as diver­
sas categorias de estratégia não devem ser excludentes entre si e devem ser utilizadas
de forma combinada e complementar (Gimenes, 1997; Lazarus & Folkman, 1984).
Inicialmente, duas categorias funcionais de enfrentamento foram evidenciadas
por Lazarus e Folkman, a partir de análises fa to riais: (a) estratégias com focafização na
alteração do problema (ocorrem mais freqüentemente quando as condições ambientais
podem ser modificadas, a partir de ações diretas ao problema, busca de informações,
negociações, redefinição do problema, entre outros); e (b) estratégias focalizadas na
emoção {envolvem esquiva, distanciamento, comparações a outras situações, uso de
substâncias como tabaco, álcool e drogas psicotrópicas, distração e desvio de aten­
ção), adotadas com mais freqüência quando não reduzida, ou nenhuma, possibilidade
de modificação das condições ambientais e o indivíduo procura regular respostas emo­
cionais, com estratégias dirigidas a um nível somático de tensão (Lazarus & Folkman,
1984; Folkman & Lazarus, 1980; Folkman, 1984; Folkman, Lazarus, Dunkel-Schetter,
DeLonguis & Gruen, 1986).
Em uma análise sobre mais de 100 indicadores de enfrentamento referidas
pela literatura, Skinner, Edge, Altman e Sherwood (2003) identificaram cerca de 400
tipos diferentes de estratégias. Os autores sugerem que as distinções mais comuns
(foco no problema ou foco na emoção, aproximação ou afastamento e enfrentamento
cognitivo ou comportamental) não sejam utilizadas, por acolherem estratégias funcio­
nalmente muito distintas e de ampla magnitude.
Neste sentido, várias outras formas de categorizar estratégias de enfrentamento
têm sido relatadas: aproximação e esquiva, foco no problema e foco na emoção,
enfrentamento de caráter comportamental e cognitivo, enfrentamento engajado ou não
engajado, busca de suporte social, uso de práticas religiosas e pensamento fantasioso,
enfrentamento de controle primário (resolução de problemas, expressão emocional) ou
secundário (aceitação, distração, reestruturação cognitiva, pensamento positivo), adapta­
ção à fonte de estresse e esquiva, confronto e afastamento, autocontrole e aceitação de

3 8 0 M a rin a KoMsdorf, Áder«on Luiz Costa ju n io r


responsabilidade, categorias relativas a autocontrole, busca de informações, resolução
de problemas e reavaliação positiva, comparação social, uso de relaxamento o medita­
ção, ações involuntarias relativas a estudos em psicobiologia (como mudanças hormonais
e fisiológicas), entre inúmeras outras (Gimenes, 1997; Costa Junior 2001; Grootonhuis &
La st, 1997; Seidl, Troccoli & Zannon, 2001; Folkman, Lazarus, Gruen & Delonguis, 198<r,
Blount, Simons, Devine, Jaaniste, Cohen, Cham bers & Hayutin, 2007). Variações
conceituais, no entanto, dificultam uma operacionalização destas categorias de modo a
constituírem um corpo organizado e coerente de conhecimento.

A literatura internacional sobre enfrentamento em contextos de tra­


tamento onco-hematológico
Na literatura internacional, diversas metodologias têm sido utilizadas para in­
vestigar estratégias de enfrentamento adotadas por pais de crianças e adolescentes
em tratamento onco-hematológico. Uma parte dos estudos focaliza, prioritariamente, a
investigação das estratégias relatadas peíos país, enquanto outros trabalhos investi­
gam certos processos psicológicos envolvidos na m anifestação de estratégias do
enfrentamento.
E ntre os estudos que descrevem as e stra té g ia s rnais ad otad as pelos
cuidadores, diversas categorias têm sido utilizadas e vários comportamentos têm sido
associados a resultados adaptativos e não-adaptativos. O trabalho de Munet-Vilaró
(1984), por exemplo, hierarquizou 14 estratégias de enfrentamento: expressão de ne­
cessidades e sentimentos (88%), cumprimento de recom endações médicas (20%),
busca de práticas reíigiosas (21%), busca de informações sobre o tratamento (20%),
m obilização de rede de suporte social (17%), mudanças no estilo de vida (13%),
redefinição cognitiva (8%), socialização (7%), aceitação da doença (4%), prática de
atividades físicas (4%) e conformidade com a situação (3%).
Goldbeck (1998) verificou, a partir de questionários, que os pais referiram maior
prevalência no uso de estratégias de enfrentamento focalizadas no problema (por exem­
plo, busca por informações sobre a doença e o tratamento), em combinação com práti­
cas religiosas. Indivíduos que adotaram minimização de atitudes frente ao tratamento
apresentavam, também, baixa coesão familiar, índices mais elevados de depressão e
de pensamento fantasioso, maior irritabilidade e menos manifestações de otimismo.
No estudo de James, KeeganWelIs, Hinds, Kelly, Bond, Hall, Mahan, Moore,
Roll e Speckhart (2002), os pais relataram que o conhecimento sobre o estado de
saúde da criança, a busca por informações e o suporte em ocional de fam iliares e
amigos foram as estratégias mais eficientes para lidar com o tratamento. Já o trabalho
de Enskar, Carlsson, Golsáter, Hamrin e Kreuger (1997) destaca o uso de estratégias
como pensar positivamente, comparar a situações piores, planejar metas e procurar
suporte social de amigos e familiares.
Rodrigues, Rosa, Moura e Baptista (2000) compararam pais de crianças em
tratam ento e pais de crianças já fora de tratam ento. Os relatos dos pais foram
categorizados em oito dimensões: envolvimento ativo com o cumprimento de recomen­
dações m édicas, busca de inform ações, dem onstração de confiança nos outros,
redefinição cognitiva do problema, uso de distração, resignação e isolamento social.
Freqüências de comportamentos relativos à redefinição cognitiva e demonstração de
confiança nos outros foram estatisticamente mais elevadas em pais de crianças recu­
peradas. Os relatos de cuidadores durante tratamento revelaram que as estratégias
apontadas como mais eficientes referiam-se è demonstração de confiança nos mem­

Sobre Comportamento e Cognição


bros da equipe de saúde, busca por suporte social, envolvimento ativo no tratamento
(por exemplo, uso de distração para a criança durante procedimentos médicos invasivos)
e busca de informações sobre a doença e tratamento.
No estudo de Felder-Puig, Gallo, Waldenmair, Gadner e Topf (2004), as estratégi­
as relatadas pelos pais como mais eficazes, ou benéficas, incluíram falar sobre a doença
e expressar vivências pessoais, buscar suporte social e informação, manter o equilíbrio
emocional e autocontrole e manter-se otimista. Estratégias referidas como ineficazes, ou
prejudiciais, caracterizaram-se como atitudes passivas e resignadas, isolamento social
ou falta de habilidades sociais de comunicação e repressão de emoções.
Tarr e Pickler (1999), em um estudo com famílias de crianças com leucemia,
apontaram que as famílias tentam viver a vida do modo mais normal possível, aceitando
que a vida não é mais a mesma e compreendendo o que deve ser feito no tratamento.
As estratégias adotadas pela família para lidar com o contexto incluíram uso de humor,
episódios de choro, assistir a filmes, conversar, ler sobre o câncer e usar antidepressivos.
O trabalho de Norberg, Líndblad e Boman (2005) teve como objetivo comparar
as estratégias de enfrentamento entre pais de crianças com câncer e pais de crianças
sem doenças crónicas, a partir de sete tipos de comportamentos: foco ativo no proble­
ma (organização da rotina, cumprimento de recomendações médicas), padrão de reação
paliativa (relaxamento, distração), comportamentos de esquiva e fuga em relação ao
tratamento, busca de suporte social, padrões de pensamentos fantasiosos e isola­
mento social, expressão de emoções ou protesto e ainda uso de redefinição cognitiva
(comparar a situações piores). Não foram encontradas diferenças significativas entre o
uso de estratégias de enfrentamento entre país de crianças com câncer e o grupo
referencial, nem em relação a tipos de diagnóstico ou etapas do tratamento. Entre pais
de crianças com câncer, o uso mais freqüente de estratégias focalizadas no problema
e menor uso de reações de esquiva foram associados a menores níveis de ansiedade
e depressão. Além disso, no mesmo grupo, reações paliativas estiveram positivamente
relacionadas a manifestações de ansiedade.
Patistea (2005) investigou as estratégias de enfrentamento relatadas como
eficazes pelos pais de crianças com leucemia. As estratégias rnais úteis foram aquelas
que mantinham a coesão familiar e uma visão otimista das condições. Neste estudo,
foram considerados três conjuntos de estratégias: (a) padrão 1 (integração familiar,
cooperação e otimismo); (b) padrão 2 (busca por suporte social, investimento em auto-
estim a e esta b ilid a d e ); e (c) padrão 3 (com unicação com eq uipe de saúde e
monitoramento do paciente). As estratégias do padrão 1 foram relatadas como mais
úteis, seguidas pelos padrões 2 e 3. Além disso, crenças de que a criança recebia o
melhor tratamento possível e pensamento positivo foram bastante relatadas e 83% dos
pais enfatizaram a importância do apego à fé.
O estudo de Eiser, Havertnans e Elser (1995) investigou as estratégias de
enfrentamento a partir de um inventário que categorizava as respostas em quatro di­
mensões: autonomia (proteger-se), cuidados médicos (confiança na equipe médica e
obediência às recomendações), suporte social e informação (aprender de outros em
situação similar) e suporte familiar (manter a coesão familiar). Não houve diferença
entre pais e mães nas pontuações e ambos priorizaram autonomia, seguida de suporte
familiar, cuidados médicos e, com escores relativamente mais baixos, suporte social e
informação. Também foi comumente relatada a atribuição de culpa a si mesmos, em
especial pelas mães.
A partir de entrevistas de acompanhamento, Clarke-Steffen (1997) investigou as
estratégias adotadas por familiares de crianças para lidar com o tratamento. O proces­

3 8 2 M arina Kohlsdorf, Áderson Luiz Costa Junior


so central no qual as famílias se engajaram toi reconstruir a realidade, reonjriní/at
papéis, avaliar e mudar prioridades, modificar planejamentos, atribim significado a
doença e manejar o regime terapêutico.
Em estudo de revisão, Klassen, Rairia, Reineking, Dix, Pritdm rd e O Donnell
(2007) destacaram estratégias importantes no enfrentamento das demandas em con­
texto onco-hernatológico pediátrico, destacando-se a coesão familiar, a obtenção dc
suporte sociai e a auto-administração do estresse. Uma baixa cocsão familiar o per
cepção de pouco suporte social, bem como a insatisfação com tal suporto, foram asso
ciadas a maiores perturbações psicológicas dos pais. Alóm disso, o distrcss psicológi­
co também esteve associado ao uso mais freqüente do estratégias focalizadas na
emoção e uso menos freqüente de estratégias focalizadas no problema.
O estudo de Patistea, Makrodimitri o Pantelli (2000) com pais de crianças
diagnosticadas com leucemia observou que os recursos apontados como mais úteis
para lidar com o tratamento incluíram uso dc otimismo e esperança, pensamento posi
tivo. suporte social, religiosidade e suporte marital. Além disso, os pais relataram a
necessidade de grande esforço intelectual para administrar a quantidade de inform a­
ções sobre a doença e de novos padrões de rotina familiar. Os autores destacam,
ainda, que três fontes de suporte apareceram como as mais significativas: apoio do
cônjuge, da equipe de saúde e de pais de outras crianças em tratam ento onco-
hematológico.
Holm Patterson e Gurney (2003) investigaram o modo como os pais participam
dos cuidados médico a seus filhos, destacando como estratégias eficientes a prepara­
ção da criança para exposição a procedimentos médicos invasivos, explicações à crian­
ça sobre sua condição de saúde, negociação com a equipe de enfermagem sobre as
melhores formas e momentos para execução de procedimentos médicos, além de
busca por informações sobre a doença e o tratamento.
O estudo de Trask, Paterson, Trask, Bares, Birt e Maan (2003) com pais de
adolescentes em tratamento de câncer apontou uma preferência por estratégias de
enfrentamento baseadas em comportamentos ativos e relacionados aos cuidados com
o tratamento, em detrimento de respostas de esquiva ou fuga. Não foram encontradas
diferenças significativas nas estratégias adotadas pelos pais cm função da fase de
tratamento, tempo decorrido desde diagnóstico e tipo de patologia. Observou-se uma
correlação significativa entre os poucos pais que adotaram estratégias de esquiva ou
fuga (referidas pelos autores como mal-adaptativas) e estratégias similares adotadas
pelos filhos. O uso de estratégias como pensamento fantasioso e autocrítica, por parte
dos pais, esteve positivamente associado à ocorrência de transtornos psicológicos,
tais como ansiedade e depressão.
Hoekstra-Weebers, Jaspers, Kamps e Klip (1998), bem como Sloper (2000),
investigaram as estratégias adotadas por pais de crianças ao longo do primeiro ano de
tratamento de câncer. Os resultados indicaram uma diminuição do uso de estratégias
focalizadas no problema, coerente com a melhora da condição clínica da criança e uma
associação de estratégias focalizadas na emoção com a manifestação de perturba­
ções psicológicas de ansiedade e medo. Sloper ainda destaca algumas diferenças
entre estratégias preferencialmente adotadas por mães e pais; atribuindo relação fun­
cional aos papéis culturais de gênero, os pais tendem a expressar menos emoções.
Outros autores, no entanto, não apontam resultados tão claramente diferenciados entre
pais e mães (McGrath, Paton & Huff. 2005; Svavarsdottir, 2005; Patistea, 2000).
Elkin, Jensen, McNeil, Gilbert, Pullen e McComb (2007) investigaram a relação

Sobre Comportamento e Cognição


entre o enfrentamento baseado em práticas religiosas e níveis de comportamentos
indicadores de depressão. Mães com níveis elevados de sintomas depressivos relata­
ram menores níveis de apego a crenças e práticas religiosas. As mães com altos
escoros em crenças religiosas relataram pontuações baixas e minimas em indicado­
res de depressão. Todas as mães relataram aumento na prática de comportamentos
religiosos. A relação inversa entre crenças religiosas e sintomatologia depressiva su­
gere uma importante relação entre perturbações psicológicas e práticas religiosas como
estratéyia de enfrentamento.
Já Steele. Long, Reddy, Luhr e Phipps (2003) destacam que as mães tendem a
referir, mais freqüentemente que os pais, que entre os comportamentos mais eficientes
para lidar com o tratamento da criança estão a continua vigilância sobre o estado de
saúde da criança e sobre os eventos do tratamento (adm inistração de medicação,
preparo para procedimentos médicos).
O estudo de Greening e Stoppelbeín (2007) investigou as estratégias de
enfrentamento adotadas pelos pais, a partir de seis fatores: (a) afeto negativo e auto-
culpabílização (estratégias de regulação emocional dirigidas á expressão de emoções);
(b) busca por suporte social ou conselhos (estratégias de regulação emocional); (c)
enfrentamento ativo (comportamentos focalizados no problema, como monitoramento
de cuidados); (d) enfrentamento religioso/otimismo (estratégia de avaliação do proble­
ma); (e) esquiva (estratégias características de esquiva e distanciamento); e (f) uso de
substâncias psicotrópicas (categorizada como estratégias de esquiva). Os resultados
apontaram que os sintomas diminuíram em função do uso de avaliação do problema e
uso de suporte social, mas aumentaram em função do uso de substâncias e presença
de auto-culpabilização. Perturbações psicológicas relativas à depressão, ansiedade e
estresse pós-tra um ático estiveram positivamente associadas com afeto negativo e auto-
culpabilização. além do consumo de substâncias psicotrópicas. Suporte social,
enfrentamento religioso/otimismo e estratégias de foco no problema estiveram positi­
vamente relacionados entre si. Auto-culpabilização e expressão afeto negativo estive­
ram relacionados a sintomas de ansiedade. O risco de sintomas de depressão, estresse
pós-traumático e ansiedade aumentaram em função da adoção de enfrentamento de
cunho emocional (auto-culpabilização) e o risco de ansiedade decresceu em função do
uso de práticas religiosas e otimismo.
Estudos com populações orientais apontam as estratégias mais adotadas por
pais de crianças em tratamento de câncer: buscar informação e suporte emocional,
garantir o cumprimento das recomendações médicas, usar negação, aumentar práti­
cas espiritualistas, utilizar práticas focalizadas no problema e recorrer a terapias com­
plementares, expressar emoções, pensar positivamente, aceitar a condição de trata­
mento, m onitorar continuam ente o paciente e utilizar crescente capacidade de
autocontrole (Wong & Chan, 2006; Ow; 2003; Han, 2003; Wills, 1999; Lou, 2006).
Yeh (2003), em estudo com pais chineses, apontou padrões de enfrentamento
em resposta à doença, baseados em cinco componentes distintos: (a) confrontar a
realidade (esforço diante do estado clínico, culpabilização e busca por causalidade); (b)
administrar demandas do tratamento (ações práticas relativas a cuidados com a crian­
ça, autocontrole e comportamento otimista, aprendizagem de informações sobre a do­
ença e procedimentos médicos); (c) mudanças cognitivo-afetivas (alterações entre per­
cepções de segurança e incerteza, relacionadas em grande parte à imprevisibilidade
inerente ao tratamento); (d) reconhecimento e avaliação da situação (procurar causas
para a doença, avaliar o impacto do tratamento sobre a vida familiar, buscar crenças
espiritualistas e atribuir a enfermidade ao destino da criança); e (e) ajustamento apropri­

3 8 4 M arina Koblsdorf, Áderson Luiz Cosia Junior


ado (lidar com a vida do modo mais natural possível) Neste estudo, a condição clinicn da
criança revelou um papel fundamental no proccsso do enfrentamento: para os pais cujos
filhos foram tratados com sucesso e com poucas intercorrencias durante o tratamento, os
componentes do enfrentamento seguiram um padrão seqüencial. Entretanto, para pais
de crianças com maiores intercorrências durante o tratamento, respostas emocionais
foram mais freqüentes e as estratégias de enfrentamento nâo seguiram uma seqüência
comum.
Pesquisas comparativas entre famílias caucasianas e chinesas revelam dite
renças importantes entre as estratégias de enfrentamento adotadas pelos dois grupos.
Entre famílias norte-americanas, foi enfatizado o cuidado emocional c suporto social,
negociação com a equipe de saude cm pro! da criança, busca por grupos de ajuda e
psicoterapia, preparação psicológica do filho para exposição a procedimentos m édi­
cos, expressão verbal de emoções e focalizaçâo na situação presente. Famílias chine­
sas, por outro lado, destacaram o uso de cuidados complementares (ervas medicinais
e terapias decorrentes da medicina tradicional chinesa), menor busca por suporte soci­
al, maior demonstração de autocontrole, monitoramento contínuo do paciente e uso de
práticas espiritualistas (Leavitt, Martinson, l.iu, Arrnstrong. Hornberger, Zhang & Han,
1999; Martinson, Leavitt, Liu, Arrnstrong, Hornberger, Zhang & Han, 1999).

Estudos nacionais sobre enfrentamento


Mais recentemente, a literatura nacional tern apresentado alguns estudos que
investigam as estratégias de enfrentamento adotadas por pais de crianças em trata­
mento de patologias onco-hematológicas, embora pouco tenha sido sistematizado sobre
este tema entre os pesquisadores brasileiros (Arruda, 2002).
O estudo de Herman (2007) teve como objetivo descrever as práticas parentais
e estratégias de enfrentamento adotadas por oito cuidadores de crianças com câncer
que participaram de um programa educativo, cognitivo-comportamental, comparados a
um grupo de controle. Para tanto, utilizou-se a Escala Modos de Enfrentamento de
Problemas - EMEP (Seidl, Tróccoli & Zannon. 2003), instrumento que categoriza as
estratégias em quatro fatores: (a) focalizaçâo no problema; (b) focalizaçâo na emoção;
(c) busca de práticas religiosas; e (d) pensamento fantasioso e busca de suporte soci­
al. A autora destaca que, no grupo experimental, as estratégias de enfrentamento mais
referidas na fase de pré-tntervenção foram as práticas religiosas e, na fase de pós-
intervenção, destacaram-se as estratégias focalizadas no problema. Na fase de pós-
intervenção, o grupo experimenta! também apresentou aumento pela busca de suporte
social e redução da adoção de estratégias focadas em emoção e religiosidade. Para o
grupo controle, na fase pós-intervenção. manteve-se a busca por suporte social e ob­
servou-se redução de estratégias focalizadas no problema e em práticas religiosas.
O estudo de Beltrão, Vasconcelos, Pontes e Albuquerque (2007) investigou as
estratégias de enfrentamento de mães imediatamente após a comunicação do diag­
nóstico. As estratégias relatadas pelas mães incluíram a busca de informações, forma­
ção de rede de apoio social (a partir da família, equipe de saúde, outras mães acompa­
nhantes e amigos) e apego a crenças religiosas. Um elemento significativamente rela­
tado pelas participantes foi a crescente aproximação entre os país, mesmo quando já
existiam transtornos conjugais pré-diagnóstico. Outro recurso social amplamente rela­
tado foi a obtenção de apoio de outras mães, que proporcionava maior convivência e
compartilhamento de experiências entre pessoas expostas a contingências semelhan­
tes. O apoio da equipe de saüde também foi relatado como ponto de apoio essencial o
enfrentamento dos efeitos colaterais do tratamento.

Sobre Comportamento c Cognição 385


Fernandes, Santos e Miyazaki (2006) realizaram pesquisa com 22 pais de cri­
anças dc até 12 anos, em tratamento onco-hematológico, utilizando a Escala Modos de
Enfrentamento de Problemas (EMEP). Os resultados apontaram que as estratégias
mais adotadas pelos pais concentraram-se em práticas religiosas, estrategias focali­
zadas na resolução de problemas, busca por suporte social e estratégias focalizadas
na emoção. Não foi observada correiação entre tipos de estratégias de enfrentamento.
dados demográficos e tempo de tratamento.

Considerações gerais sobre a pesquisa em enfrentamento em con­


textos de tratamento onco-hematológico
Embora muitos estudos indiquem a priori estratégias valorizadas como mais
ou menos adaptativas, não é possível apontar comportamentos adequados ou inade­
quados, em termos universais, dada a especificidade contextuai e a variabilidade teóri­
ca que subsidia os diversos conceitos de enfrentamento (Lazarus & Folkman. 1984;
Folkman & Lazarus, 1980; Last & Grootenhuis, 1998; Cerqueíra, 2000; Folkman, Lazarus,
Dunkel - Schetter, DeLonguis & Gruen, 1986). Destaca-se que o termo enfrentamento
indica o uso de esforços (comportamentais, cognitivos, personalógicos, entre outros)
para administrar demandas, independentemente de seus resultados, indicando que
não há estratégias intrinsecamente adaptativas.
Comportamentos com topografias semelhantes podem exercer efeitos funcio­
nalmente diferentes. Por exemplo, a busca por informações sobre uma doença grave
pode tanto reduzir quanto aumentar as manifestações de ansiedade, dependendo de
elementos contextuais como crenças sobre a doença, regras sobre responsabilidade,
percepção de controle sobre a situação, condição e evolução clinica do paciente e história
de reforçamento do indivíduo. Outro exemplo refere-se ao uso da distração, que pode
contribuir para diminuir níveis de adesão ao tratamento (com o monitoramento inadequa­
do do paciente) ou mesmo possibilitar a maior colaboração com o tratamento, em situa­
ções de procedimentos médicos invasivos. A prática religiosa ou espiritualista pode reia-
cionar-se tanto à esquiva do contato com a condição cíinica da criança quanto à busca por
métodos complementares ao tratamento. Portanto, somente uma análise funcional de
cada estratégia pode indicar, em cada contexto específico, quais comportamentos ocorre­
ram, que variáveis controlam tais respostas e que conseqüências foram obtidas.
Monat e Lazarus (1977) e Gimenes (1997) ainda ressaltam que comportamen­
tos eficazes do ponto de vista fisiológico podem ser extremamente não-adaptativos do
ponto de vista social ou psicológico, ou seja, é necessário o estabelecimento de critéri­
os con ceitu ais para a ava lia ção dos resu ltad os da adoção de estratégias de
enfrentamento. Todas as estratégias possíveis podem levar a conseqüências benéfi­
cas ou prejudiciais, logo qualquer avaliação sobre o enfrentamento precisa considerar
diversos níveis de análise (psicológica, fisiológica, sociológica), especificidades do
estressor e resultados a curto e longo prazo.
O uso intercambiável de termos como enfrentamento, adaptação e ajustamen­
to, como se sinônimos fossem, evidenciado em muitos estudos, também se constitui
um desafio à pesquisa. Considerando-se os modos como a literatura tem caracteriza­
do o termo enfrentamento, parece fundamental a necessidade de se distinguir entre o
processo de enfrentamento e seus resultados práticos para indivíduos e grupos expos­
tos a contingências estressantes (Last & Grootenhuis, 1998; Grootenhuis & Last, 1997).
O uso de enfrentamento e adaptação como conceitos semelhantes decorre, em grande
parte, da referência a modelos animais, que caracterizam a adaptação e o enfrentamento

3 86 M arina Kohlsdorf, Áderson l.uiz Costa Junior


como processos equivalentes; da mesma forma, a psicologia do ego equipara o
enfrentamento ao sucesso adaptativo (Lazarus & Folkman, 1984; Gimenes, 199/: Kupst.
1994). A tendência a igualar o processo de enfrentamento com seus resultados gora
raciocínios tautológicos e falhos, indicando a urgência da adoção dc definições
operacionais precisamente concebidas (Lazarus & Folkman, 1984; Lazarus, Hnl onguts.
Folkman & Gruen, 1985; Folkman & La/arus, 1980).
Destaca-se. ainda, que o ajustamento constitui um termo vasto, que dcscrcvc o
processo de acomodação a uma demanda ambiental ampla (cscola, casamento, do­
enças crónicas) e adaptação, termo derivado da biologia, designa o esforço individual
para sobreviver a um contexto ambiental que impede ou prejudica o processo de desen­
volvimento individual ou coletivo (Costa Junior, 2003; Kupst. 1994)
Além disso. Cerqueira (2000) e também Grootenhuis e Last (1997) já apontaram
algumas criticas à pesquisa sobre enfrentamento em psico-oncologia pediátrica: (a) fal­
tam detinições operacionais sobre o processo investigado; (b) há recorrente inclusão nas
amostras de diagnósticos distintos o diferentes estágios do tratamento; (c) variações na
condição clinica do paciente não são suficientemente consideradas; (d) há uso do medi­
das, metodologias e instrumentos inadequados, sem validação psicométrica satisfatória;
e (e) não há especificação suficiente de outras variáveis (tais como metas, compromis­
sos e recursos pessoais) que podem interferir sobre o processo de enfrentamento.
Coyne e Racioppo (2000) também destacaram alguns elementos que poderi­
am justificar resultados contraditórios de alguns estudos: (a) questões abstratas (e
distantes da realidade) presentes em instrumentos psicológicos e roteiros entrevistas;
(b) estressores secundários desconsiderados; (c) contextos amplos de desenvolvi­
mento e variáveis intervenientes não apropriadamente consideradas.
Concluindo, considerando-se o caráter dinâmico do enfrentamento, pesquisas
longitudinais e de acompanhamento tornam-se imprescindíveis, bem como estudos com
populações específicas, expostas a estressores comuns, e que utilizem instrumentos
validados à população brasileira. Destaca-se a necessidade de estudos de intervenção
que esclareçam as relações funcionais entre o ambiente de cuidados com o tratamento
e o processo de desenvolvimento de estratégias de enfrentamento entre pais de crianças
em tratamento de patologias onco-hematológicas (Antoniazzi. DelFAglio & Bandeira, 1998;
Cerqueira, 2000; Costa Junior, 2005; Grootenhuis & Last, 1997; Patistea, 2005).

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3 9 0 M arina Kohisúorf, Ádcrson Luiz Costa Junior


Capítulo 32
A inserção do analista do
comportamento no campo da
psicologia do esporte: um relato
de experiência.

Marcella Deinoner Borges Coutinho'


M aria Silvana Barbosa dos Santos"
Luciano dc Sousa Cunha“'
L /W

“Ser bem sucedido no mundo è sempre uma questão de esforço pessoal Todavia,
é um engano acreditar que alguém pode vencer sem a cooperação de outros

(Napoteon Hill)

O presente relato de experiência é um recorte das atividades realizadas durante


o último ano de graduação do curso de Psicologia, durante o Estágio Supervisionado:
“Projeto de Clínica Com porta mental e Psicologia do Esporte", junto a uma equipe de
basquete masculino profissional que realiza suas atividades na Vila Olímpica do Centro
Universitário Vila Velha (U W ).
O projeto oferecido pela primeira vez no curso propõe a entrada do analista do
comportamento no campo da Psicologia do Esporte. Assim, este trabalho apresenta uma
revisão teórica sobre o que é a Psicologia do Esporte, sua história, assim como a história
da Abordagem Comportamental nesse contexto, seguida de uma discussão sobre a
postura do psicólogo e uma reflexão sobre sua inserção no campo de atividade prática.
Este trabalho se torna relevante, uma vez que, apesar de existirem publicações
acadêmicas sobre a Psicologia do Esporte, nota-se a necessidade de mais produções
que ofereçam dados às pessoas envolvidas direta ou indiretamente com esse campo
do saber, por esta se tratar de uma área relativamente nova no Brasil, apresentando
poucos procedimentos descritos e documentados na literatura, principalmente no que
diz respeito a trabalhos realizados sob o enfoque da Análise do Comportamento.

' Fomtanda em Psicologia pelo Centro Universitário Vila Velha E-mail para correspondência: marcelb uoulinho@gmail.a>rri
" Formanda em Psicologia pek> Centro Universitário Vila Velha. E-mail para oorrespondêrtda: silvana.geo:ge@globo com
~M estnsem Psicologia pelo Programa de Pós Graduação em Psicologia da Universidade Federal do Espirito Santo Professor dr> curso de
graduação em Psicologia do Centro Universitário Vila Velha. E-mail para correspondência: ludano.cunha@oi com br

Sobre Com poria men ;o e Cognição


Psicologia do Esporte: História e Definição
A Psicologia do Esporte surge da necessidade de se adquirir conhecimentos
s o b re como fatores psicológicos podem afetar a prática esportiva. Segundo Weinbcrg &
Gould (2006). sua história inicia-se no final do século XIX e pode ser dividida em cinco
períodos, c o m características distintas c inter-relacionadas.
No primeiro período, datado do 1895 a 1920, foi realizada a primeira experiên­
cia em Psicologia do Esporte e Psicologia Sociai. mais precisamente no ano de 1897,
em que Normam Triplett estudou os efeitos de outros competidores sobre o desempe­
nho dos ciclistas, Neste estudo, ete verificava que na presença de outros atletas, o
rendimento individual de um ciclista aumentava, sugerindo que outras variáveis, alem
da própria habilidade do atleta poderiam afetar seu desempenho.
• O segundo período - e era Griffith, de 1921 a 1938, - foi marcado pela public
ção de artigos por Griffith e pelo estabelecimento do laboratório de pesquisa em espor­
tes físicos, na Universidade dc Illinois
O tcrceiro período: denominado por Weinberg & Gould (2006) como "prepara­
ção para o futuro”, culminou corri o primeiro Congresso Mundial de Psicologia do Espor­
te, organizado por Ferruccio Antonelli em 1965, na cidade de Roma, com o propósito de
unificar os estudos da Psicologia Esportiva, enfatizando os diferentes aspectos da Psi­
cologia do Esporte e da atividade física. A partir desse congresso, foi fundada a Socieda­
de Internacional de Psicologia do Esporte! - a fim de promover e disseminar informa­
ções sobre a Psicologia do Esporte.
O quarto período (1966-1977) marca o estabelecimento da Psicologia do Es­
porte como disciplina acadêmica, e apresenta fatos importantes como: a assessoria a
atletas e times pelos psicólogos clínicos Bruce Ogilvie e Thomas Tutko e; o lançamento
do primeiro periódico científico da área. o International Journal o f Sport Psychology,
possibilitando à psicologia do esporte ser institucionalizada como área de pesquisa e
aplicação (Figueiredo. 2001: Barreto, 2003; Weinberg & Gould, 2006).
Barreto (2003) observa que esse período foi determinante para que hoje, em
muitas universidades mundiais, existam disciplinas especializadas em Psicologia do
Esporte, bem como centros especializados em pesquisa e laboratórios experimentais
em faculdades oe Psicologia e Educação Física, além da fundação de sociedades
internacionais, nacionais e estaduais.
Machado (1997) ainda ressalta que com o aumento da circulação de boletins,
jornais, revistas e livros específicos, além de formação de sociedades de pesquisado­
res em Psicologia do Esporte, percebe-se uma consolidação desta especialidade em
vários países.
O quinto período, de 1978 até o presente, é nomeado como Psicologia do
Esporte e do Exercício Contemporânea. É nesse período que a Psicologia do Esporte
se firma como “profissão", pois além da presença e reconhecimento de psicólogos do
esporte no meio esportivo, há a fundação, em 1986, da Association for the Advancement
o f Applied Sport Psychology {AAASP); a elaboração da Divisão 47 (Psicologia do Espor­
te) da American Psychological Association (APA) e o estabelecimento da designação de
“consultor registrado2” em 1991.
Alguns autores discordam que o surgimento da Psicologia do Esporte esteja
ligado diretamente ao desenvolvimento da área nos Estados Unidos, apresentando

' Internacional Sodely of Sport Psychology - ISSP


3Maianes in fo rm a re s poetem sarcnconIradas diretamente ern fitfpv/appiiedsporípsycfi.orç

Marcella D e m o n c r Borges Coutinho, M a ria Siivana Barbosa dos Sanios, Luciano de Sousa Cunha
uma outra versão. Para Rubro {2007b, p.21). “(...) foi na antiga União Soviética que: a
Psicologia do Esporte experimentou unia grande acolhida e desenvolvimento ao longo
dos últimos 50 anos Segundo Machado (1997), os trabalhos realizados furam
pouco assimilados no mundo ocidental, enquanto os soviéticos desenvolviam suas
pesquisas na área.
No Brasil, a Psicologia do Esporte surgiu na década de 50, corri o psicólogo
João Carvalhaes:’, que no II Congresso Internacional de Psicologia do Fsporte, cm
Washington, apresentou o trabalho 'Correlação entre o estado psicológico e o rendt
mento do atleta do futebol".
Segundo Rubio (2007b), a década de 70 foi marcada pela ampliação do qua­
dro do psicólogos do esporte em clubes de futebol, sendo orn 1976, a abertura do
trabalho da Psicologia do Esporte para outras modalidades.
Ern 1979, com um aumento no numero de profissionais envolvidos no desen­
volvimento da Psicologia do Esporte no Brasil, foi fundada a Sociedade Brasileira de
Psicologia do Esporte (SOBRAPE), pelo psicólogo Benno Bccker Junior.
Para Rubio (2007b), a década de 80 foi marcada pela atuação de vários psicólo
gos nas diversas modalidades, e também peia criação de várias sociedades estaduais,
tais como a pernambucana, mineira, carioca, gaúcha c paulista. A autora cita que:

...a consolidação da Psicologia do Esporte no Brasil, enquanto área de conheci­


mento e campo de intervenção, tem seguido de peito os passos dados em outros
países, tendo como pano de fundo o embate entre a ênfase dada à aplicação no
contexto prático, com especial atenção ao alto rendimento, e a produção acadêm i­
ca com pesquisas, enfocando, além do alto rendimento, a atividade física, a recre­
ação e o lazer. (Rubio. 2007b, p 24)

A partir da década de 90. houve uma grande expansão da Psicologia do Espor­


te: aumento significativo de profissionais atuantes, a busca de formação especifica, a
publicação de literatura em português, conquista de espaços para atuação, a criação do
primeiro laboratório de Psicologia do Esporte na Universidade Federal de Minas Gerais
peio Prof. Dr. Dietmar Samulski, além da agregação de conhecimentos relacionados a
questões esportivas e de atividade física com conhecimentos da Sociologia, Antropolo­
gia, Pedagogia, Filosofia e Medicina, que têm contribuído para a interdisciplinaridade
dessa área.
Segundo Rose Junior (2007), a “profissionalização” e a circulação de informa­
ções produzidas no Brasil acerca da Psicologia do Esporte "Brasileira" gerou a necessi­
dade de formação específica, á medida que as faculdades de Psicologia não se interes­
savam em proporcionar aos alunos a oportunidade de conhecer e produzir algo sobre
esse assunto, o que pode ser observado pelo fato de que sequer eram oferecidas disci­
plinas sobre o tema, mesmo que optativas. Para o autor, isso se deve, em parte, pelo não
reconhecimento, por parte da Psicologia, do campo esportivo como campo de atuação.
Rubio (2007b) conta que a partir dessa "profissionalização”, observou-se uma
inclusão na grade curricular de alguns cursos, a disciplina de Psicologia do Esporte,
inicialmente como disciplina eletiva e, posteriormente, como obrigatória. Vale ressaltar,
que ainda hoje, em muitos cursos de Psicologia, não há a oferta dessa disciplina, e
alguns poucos que se interessam por essa área, desconhecem muitas vezes a atuação
do psicólogo.
* Atuou no Sâa Paulo por 19 anos e na Seleção Brasileira de Futebol, durante a Copa de 1958

Sobre Comportamento e Cognição


Barreto (2003) justifica que mesmo que a Psicologia Esportiva cresça muito no
Brasil, ainda haverá resistência por parte de psicólogos, treinadoros e profissionais afins
devido à desinformação, representada peia escassez no número de publicações sobre o
toma, e a falta de conhecimento sobre a função e atuação do profissional da Psicologia.
Uma hipótese para essa resistência pode ser formulada a partir do próprio
desenvolvimento histórico e também por conta das muitas abordagens que a Psicolo­
gia oferece. Esses vários olhares sobre o que os autores e estudiosos concordam ser
uma ciência, dificultam até mesmo conceituar Psicologia do Esporte, o que pode ser
uma tarefa árdua.
De maneira geral, entende-se por Psicologia do Esporte o estudo cientifico de
pessoas e seus comportamentos cm atividades esportivas e atividades fisicas e a
aplicação prática de seu conhecimento. Apresenta dois objetivos principais: entender
como fatores psicológicos afetam o desempenho de um indivíduo e; entender como a
participação ern esportes c exercícios afeta o desenvolvimento psicológico, a saúde e o
bom estar de uma pessoa (Weinberg & Gould, 2006).
A proposta dc que a Psicologia do Esporte investiga as causas e efeitos psíqui­
cos antes, durante e depois de uma atividade física, seja esportiva ou lazer é comparti­
lhada por vários autores (Thomas, 1983: Barreto, 2003; Rose Junior, 2007).
Williams e Straub (1991, p. 30) apud Rubio (2007a, p.305) descrevem a prática
da Psicologia do Esporte como a “(...) identificação e compreensão de teorias e técnicas
psicológicas que podem ser aplicadas ao esporte com o objetivo de maximizar o rendi­
mento e o desenvolvimento pessoal do atleta (...)".
Machado (1S97, p. 17) propõe uma definição baseada em uma abordagem
Comportamental: “{...) ciência que estuda as contingências a que estão submetidos
todos aqueles que se envolvem com o fenômeno esportivo, em quaisquer de suas
variações (...)", sejam atletas, treinadores e afins.
Portanto, percebe-se que a construção do conceito, assim como a construção
de linhas teóricas para embasar a prática da Psicologia do Esporte dá-se da mesma
maneira. Os profissionais tentam de alguma forma buscar especializações, referenciais
teóricos e pesquisas a fim de dar conta da demanda em seu campo de atuação, tais
como: Dinâm icas de Grupo, Psicodram a, Psicologia Social, Psicologia Cognitiva
Comportamental e o Behaviorismo (Lima, 2003).
Para este trabalho, portanto, a fim de produzir uma análise baseada em uma
perspectiva Comportamental, será apresentada a seguir uma breve revisão sobre a
atuação da Psicologia Comportamental no campo esportivo.

Uma abordagem Comportamental no Esporte


Assim como a psicologia do esporte, a Psicologia Comportamental do Esporte
nasceu nos EUA, iniciada por Brent Rushall e Daryl Siedentop em 1972 com a publica­
ção do livro The development and contro! o f behavior in sport and physicat education.
Todavia, a primeira pesquisa publicada, apareceu três anos antes, quando Rushall e
Pettinger (1969) descreveram a comparação de diferentes contingências de reforçamento
sobre a quantidade de nado realizado por membros de um time de natação (Martin &
Tkachuk, 2001).
Para Figueiredo (2001, p.113), a “(...) psicologia como ciência do comportamen­
to humano dispõe de um corpo de conhecimentos que pode contribuir para o desenvol­
vimento do esporte através da análise e previsão do comportamento do atleta” .

394 Marceila Demoner Borges Coutinho, M a ria Silvana Barbosa dos Sanios, Luciano de Sousa Cunha
A mensuração dos comportamentos de praticantes, técnicos e atletas o suas
respectivas variáveis controladoras, devem explicar tanto o comportamento individual
quanto coletivo, a partir de uma metodologia experimenta! para estudo do com porta­
mento aplicada ao esporte (Cillo, 2007).
A Psicologia Comportamenta! do Esporte é, portanto, baseada no o uso de
técnicas e princípios da Análise Experimental do Comportamento, com a finalidade do
melhorar o desempenho e satisfação de atletas e profissionais afins.
Segundo Scala (2004, p.310), “a psicologia com porta mental tem como objetivo
melhorar o repertório do cliente, aumentar sua discriminação do ambiente, para que ele
tenha mais condição de prever e controlar seu comportamento". No contexto esportivo,
o objetivo é “melhorar a qualidade do desempenho, da interação entre os envolvidos,
propiciando a pratica física um caráter mais reforçador" (Cillo, ?00/', p.90).
Desta forma, segundo Scala (1997), podemos delimitar dois objetivos primor­
diais para a Psicologia do Esporte com enfoque Comportamental: a) a promoção de
saúde, que no contexto do esporte, poderia ajudar o atleta a identificar porque escolheu
determinada prática e quais seus objetivos em relação a ela; e b) a melhora de rendi
mento esportivo, num nível pessoal ou de competições, a partir do trabalho baseado ern
aspectos como: planejamento, propriocepção e concentração em atividades individu­
ais, ou ainda, em esportes coletivos, atividades grupais que visem aspectos como:
comunicação, relações interpessoais e liderança.
Segundo Pereira (2003), a Psicologia Comportamental no Esporte não deveria
ser vista como novidade, uma vez que a Análise do Comportamento, com seu rigor
metodológico visa à compreensão, predição e controle do comportamenlu e investe ern
pesquisas a fim de fornecer contribuições para a Psicologia e seus campos de atuação.
De modo geral, segundo Delitti (2005), a preocupação e a proposta de Skinner eram que
a Anáiise do Comportamento deveria ser utilizada para planejar e estruturar uma socieda­
de de modo que os indivíduos pudessem viver em contingências mais reforçadoras.
Esses conhecimentos poderiam então, ser também aplicados ao contexto esportivo.

Relato de Experiência: da inserção à atuação do Analista do Com­


portamento
A proposta do Estágio Curricular Específico Supervisionado, de acordo com o
Manual do Estágio Supervisionado (2007), oferecido nos nono e décimo períodos do
curso de Psicologia do Centro Universitário Vila Velha (U W ), é permitir um contato mais
próximo com a realidade profissional, articulando e consolidando competências de­
senvolvidas ao longo do curso de graduação para a atuação do psicólogo.
A escolha do projeto deu-se devido à proposta de trabalhar tanto na Psicologia
do Esporte quanto na clínica, sob perspectiva Comportamental. A oportunidade de atuar
junto a uma equipe profissional se deu por conta de a Instituição Universitária ser uma
das patrocinadoras de um projeto de alto rendimento.
O inicio do trabalho se deu com o primeiro contato com o responsável pela
equipe masculina de basquete profissional. Nessa primeira reunião, expôs-se, com base
em Martin (2003). que o treinamento psicológico, no esporte de maneira geral, faz-se tão
importante quanto aos treinamentos técnico, fisico e tático. E, para tal tarefa, seria neces­
sário realizar uma avaliação a fim de possibilitar uma proposta adequada de trabalho.
Foi marcado então, um encontro com os atletas para a apresentação do grupo
de Psicologia - supervisor e estagiários.

Sobre Comportamento e Cognição 395


Estar diante dos atletas antes do primeiro contato direto pareceu fácil. Entretan­
to, tal tarefa mostrou-se mais complicada devido à necessidade de se estabelecer uma
relação com eles. isso pode ser ilustrado por uma frase emitida por um jogador no dia
da apresentação do grupo: "... quero ver quanto tempo vocês vão durar... não dou nem
três meses (sic)".
Os encontros posteriores foram marcados por uma demonstração de exigên­
cia por parte dos atletas de profissionalismo dos estudantes na realização do trabalho.
Os alunos eram questionados sobre o trabalho, assim como também eram solicitados
a responder questões que tinham como função avaliar se os mesmos conheciam o
esporte no quai escolheram intervir.
Percebe-se neste momento, segundo Scala (2006), que assim como ao entrar
no mercado de trabalho, todo profissional enfrenta desafios, tal como se deparar com
indagações sobre sua atuação, seja por parte do próprio profissional seja por parte de
quem vai utitizar o serviço. No campo da Psicologia do Esporte surgem outras ques­
tões, como, por exemplo, entrar e ser aceito no rneio de esportistas e profissionais
atuantes.
Por conta disso, alguns autores (Martin, 2003; Scala, 2006; Weinberg & Gould,
2006; Rose Junior, 2007) concordam que é preciso conhecer o esporte com o qual se
vai trabalhar, assim como observar os treinos; estudar sobre as regras; as habilidades
envolvidas, inclusive fisicas; o jargão utilizado, faiar a linguagem do esporte. O desen­
volvimento dessas habilidades pode ajudar a eliminar “barreiras” na inserção no cam­
po esportivo.
Sendo a presente equipe, a primeira turma a desenvolver um projeto de Psico­
logia do Esporte naquele contexto, o desafio não era, portanto, só o de se manter e atuar
no campo de estágio, e sim o de estabelecer vínculos e inserir-se como “integrantes”
dessa equipe.
O primeiro passo foi buscar em literatura informações sobre a prática esportiva
e de profissionais que trabalham ou trabalharam como psicólogos do esporte (tanto os
comporta mentais quanto os que adotaram outra abordagem) e também, o acompanha­
mento diário aos treinos por cerca de um mès, adotando uma postura profissional, defi­
nida por Scala (2006) como: vestir-se de maneira adequada; assistir aos treinos; conver­
sar com os treinadores; conhecer as regras, a linguagem e os atletas conhecidos da
modalidade; apresentar uma conduta adequada frente aos atfetas e demais integrantes
da comissão técnica (considerando os princípios éticos da profissão).
O segundo passo foi, a partir do conhecimento adquirido ao longo do curso
sobre grupos, investigar o funcionamento deste time, em especial os papéis de cada
atleta, quem era quem: lider, porta-voz, etc.
Nesse momento, foi aplicado um instrumento para avaliação comportamental
dos atletas: um questionário adaptado para equipe de basquete a partir de um modelo
proposto por Martin (2003), para verificar aspectos do desempenho nos treinos e em
competições, a fim de fornecer uma avaliação rápida das áreas em que os atletas e o
técnico gostariam de receber ajuda. A avaliação deu ênfase aos seguintes tópicos: 1.
Informações gerais sobre o atleta ou técnico; 2. Informações esportivas gerais; 3.Des~
crição do problema atual; 4, Conhecimento sobre Psicologia do Esporte; 5. Educação/
Ocupação; 6. Estado de saúde; 7. Sistema de apoio; 8. Programa atlético; 9. Avaliação
em relação aos treinos livres; 10. Avaliação em relação às competições; 11. Situação
que antecede o jogo; 12. Considerações gerais em dias de jogo; 13. Preparação mental
em dia de jogo, antes do jogo; 14. Preparação mental em dia de jogo, antes e durante o

396 Marcella Demoner Borges Coufinho, M aria Silvana Barbosa dos Santos, Luciano de Sousa Cunha
jogo; 15. Avaliação após o jogo.
Essa avaliação permitiu identificar pontos nos quais uma intervenção pudesse
ser planejada, tais como: aprimoramento de habilidades; concentração; c o m p ro m e ti
mento para com treinos; autoconfiança; relaxamento; avaliação de desempenho: re la çã o
interpessoal. E, no que diz respeito ao técnico, conhecer e aprimorar estrntégias a fim de:
utilizar melhor os recursos de vídeo; motivar e possibilitar tranqüilidade ao atleta; manter-
se positivo mesmo diante de erros; concentrar-se para roalizar as atividades
Ante as observações dos treinos, ações e falas do treinador e os resultados
das avaliações, notou-se a necessidade de uma parceria com o técnico, que como
define Rose Junior (2007) é o ponto central nessa estrutura
As observações dos treinos também perm itiram que fossem selecionados
comportamentos a serem registrados, analisados e trabalhados durante a intervenção,
como a fala do treinador nos jogos, um levantamento do tempo de passe de bola,
número de arremessos convertidos e não convertidos e, íambém dos comportamentos
dos atletas e dos técnicos para uma intervenção futura.
Para isso, eram elaborados gráficos; 1) Tempo médio de posse de bola para
cada ataque em cada quarto, em segundos, uma vez que foi observado que o treinador
insistia com os atletas para que segurassem um pouco rnais a posse de bola. utilizando
melhor o tempo e o arremesso 2) Número de arremessos convertidos por tempo de
posse de bola, 3) Gráficos com a evolução do placar minuto a minuto. O resultado encon­
trado na avaliação dos gráficos foi de que o número de acertos quando os atletas utiliza­
vam melhor os vinte e quatro (24) segundos aos quais tinham direito, ou seja, ataques
com mais de doze (12) segundos de posse de bola, eram mais bem-sucedidos em
termos de freqüência de acertos do que os ataques que tinham menos de doze (12)
segundos.
A análise dos gráficos era feita, primeiramente, pela própria equipe de Psicolo-
gia, durante a supervisão. Em seguida o técnico esclarecia alguns pontos técnicos e
táticos. Os encontros com os atletas e equipe técnica serviam, portanto para uma dis­
cussão sobre as análises dos gráficos e dos com porta mentos observados em quadra,
tanto em treinos quanto em jogos.
Dessa forma, já com os resultados das avaliações em mãos. uma devolutiva
foi feita ao técnico e a partir desta, também foi marcada uma com os jogadores. Durante
a devolutiva, apesar de nem todos terem comparecido, atentou-se para a mudança do
comportamento deles frente à equipe de Psicologia, mostrando-se mais receptivos.
Esse momento do trabalho culminou com o início do Campeonato Carioca de
Basquete, que seria disputado pela equipe4. Surgiu então, por parte de um dos alunos
do projeto, a idéia de ir assistir a estréia, no Rio de Janeiro, sem que os atletas soubes­
sem, Nesse caso, foi solicitada junto ao técnico uma autorização, como maneira de
fortalecer vínculos, Tal proposta foi bem aceita, e imediatamente foi oferecido um lugar
no ônibus para a viagem. Porém, achou-se mais sensato ir sem o conhecimento dos
atletas, uma vez que ainda não se pertencia de fato a essa equipe e também pela
possibilidade de observação do comportamento dos atletas em situação natural.
A viagem possibilitou a aceitação da equipe de Psicologia pelo grupo, como
profissionais da área, assim como o desenvolvimento das atividades, o que foi confir­
mado depois de alguns encontros pelos atletas, mesmo porque os mesmos acredita-

* Com o intuito de se preparai para o Campeonato Nacional de Basquotee, como no estado ào Espirito Santn existem apenas duas equipes
de alto rendimento e um campeonato estadual nulo, essa eq jip e dnfendeu a bandeira do time do Campos

Sobre Cmnportamcnfo e Cognição


vam que a turma tria desistir e ir embora, conforme já havia acontecido em outras
experiências com profissionais de outras áreas {Nutrição e Fisioterapia), que não con­
seguiram dar continuidade às propostas de trabalhos.
Um dos fatores a ser salientado para explicar a dificuldade de execução de
qualquer trabalho proposto, é a disponibilidade da equipe, que entre viagens, treinos e
descanso, encaixava a preparação psicológica. Acredita-se que isso pode ter sido
determinante para dificultar a inserção de outros profissionais.
Ao final do primeiro semestre de trabalho, foi agendado um encontro, no qual
fora analisado o comportamento em quadra de cada jogador e, numa devolutiva em
grupo, foi discutido o que aconteceu até aquele momento. Estavam presentes todos os
atletas, que participaram ativamente da discussão, avaliando também o trabalho da
Psicologia do Esporte.
Esse encontro foi realizado ern forma de "bate-papo”, sem apresentação de
gráficos. Pediu-se que eles avaliassem o que tinha mudado, bem como fora reforçado
o comportamento deles de atentarem para a fala do técnico quanto à posse de bola.
Quanto aos comportamentos durante as competições, foi analisado o que havia acon­
tecido nos jogos: postura de cada um frente ao time e os diferentes efeitos entre estar
concentrado e estar disperso, percebida durante a execução das jogadas.
O feedbackâ equipe de Psicologia se deu por meio de uma avaliação informal,
na qual os atletas qualificaram o trabalho, a inserção no campo e a confiança no traba­
lho desenvolvido pela equipe.
Por fim, pode-se dizer que, a partir daquele momento, segundo os próprios
atletas, que a equipe de Psicologia fazia parte daquele time, que tinham se inserido no
campo da Psicologia do Esporte, sendo reconhecida como parte integrante da equipe de
basquete, o que pode ser ilustrado por um torpedo SMS enviado pelo técnico a Equipe de
Psicologia após um trabalho feito antes de uma vitória importante no último campeonato
nacional: “obrigado continuamos na luta. parabéns a todos ves tbm. estamos juntos (sic)”.
Outros resultados também podem ser citados como produto parcia! da inter­
venção: contratação de um preparador físico (a partir do levantamento da necessidade
de um na avaliação inicial), economia de tempo na posse de bola, espaço de preleção
antes dos jogos, a designação de um dia exclusivo para o trabalho da equipe de Psico­
logia e até mesmo a classificação (pela primeira vez na história da equipe) para os
playoffs do campeonato nacional.
Contudo, para manter-se dentro desse time, é preciso combinar o conheci­
mento teórico adquirido em livros científicos e o conhecimento prático, adquirido a partir
da conquista do espaço, da confiança e do desenvolvimento de trabalhos junto aos
atletas e demais envolvidos (Weinberg & Gould, 2006), lembrando que a cobrança de
profissionalismo se mantém.

Considerações Finais
Inserir-se no campo prático da Psicologia do Esporte não é uma tarefa fácil, o
que muitas vezes só é percebido quando se encontra dentro deie, seja a pedido de uma
equipe ou, como neste caso, no cumprimento de atividades previstas na grade curricular.
Rose Junior (2007) levanta questionamentos acerca do lugar que a Psicologia
do Esporte ocupa diante do contexto de trabalho junto a uma comissão técnica e da
postura adotada pelas equipes frente ao psicólogo do esporte e do seu trabalho. Res-

398 M arcclía Demoner Borges C ovíinho, M a ria Silvana Barbosa dos Santos, Luciano de Sousa Cunha
salta que os profissionais ligados direta (atletas, técnicos, preparadores físicos, etc.) e
indiretamente (imprensa e outros) a área do esporte reconhecem a importância de se
conhecer e trabalhar aspectos psicológicos envolvidos na prática esportiva.
Entretanto, percebe-se que esse fato ainda está longe de ser realidade. Acon­
tece em um número reduzido de equipes, apesar de já se poder observar um aumento
considerável de esportes que consideram a psicologia como área integrante de seu
cotidiano (Rose Junior, 2007).
A falta de acesso a informações acerca da prática da Psicologia do Esporte;
durante a formação, pode fazer com que o psicólogo, não acostumado ao esporte, se
depare com uma grande resistência por parte dos técnicos e atletas, seja por não falar e
não entender a linguagem cotidiana das quadras, dos campos, das pistas e das pisci­
nas, seja por não atentar que o atleta não é como um cliente de consultório (Scala, 2006;
Rose Junior, 2007), ou ainda, por fundamentar sua prática em “achismo" teórico (Lima.
2003).
Pensar que se é psicólogo do esporte porque possui formação cm Psicologia
ou porque tivera algum contato anterior com a prática esportiva é um erro que muitos
cometem, caindo no descrédito como profissional perante aquele com quem, de algu
ma maneira, mantém um contrato de atuação.
É preciso que o psicólogo tenha conhecimentos prévios e delimitados sobre
seu papel. Compreender que, como descreve Scala (2004), é mais do que um mero
aplicador de técnicas, e sim um analista do comportamento, que deve também clarificar
essa função, assim como os princípíos que norteiam o comportam ento humano à
comissão técnica, atletas e demais envolvidos no esporte (Machado, 1997), possibili­
tando melhores entendimentos sobre sua prática, seus objetivos e os resultados al­
cançados pelo seu trabalho.
Para tal atividade, o profissional deve estar no meio esportivo, ou seja, além do
fato de que o trabalho deve ser feito no local de treinamento dos atletas (Scala, 2006),
deve-se compreender que o cronograma de atividades está sujeito a modificações para
então se adequar às viagens e competições.
Por fim, pertencer a uma equipe como psicólogo do esporte, assim como ser
reconhecido como tal é a maior gratificação que pode haver para um profissional que
encontrou obstáculos, na formação ou na própria equipe. Poderá este agora, sentar
para estruturar um trabalho diante de tantas informações, proporcionadas pelo acesso
mais direto aos atletas e a comissão técnica. Como resume Martin (2003):
Em nossa sociedade, ser considerado um profissionai implica em que o individuo
tenha conhecim ento especializado que o capacite a fornecer um determ inado
serviço. Numa perspectiva comportamental, o serviço fornecido p o r consultores
em psicologia com portamental do esporte envolve influenciar o comportamento de
atletas e treinadores (Martin, 2003, p. 279).

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Sobre Comportamento e Cognifão 3 9 9


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Porto Alegre, RS: Artmed.

400 Marcella Demoner Borges Coutínho, Man's 5i!vana Barbosa dos Santos, Luciano dc Sousa Cunha
Capítulo 33
Os distúrbios da imagem corporal e a
prática dc exercícios físicos

idiilti Lopes Marques*


Clínica Fqtiilíbrío
Denise Cerquetra Leite H e lie r**
Universidade Tuiuti do Paraná

1. Introdução
Nunca antes na história da humanidade as pessoas estiveram tão insatisfeitas
com sua imagem corporal. Essa insatisfação é um fenómeno sócio-cultural. decorrente
dos p a d rõ e s e s ta b e le c id o s pela so cie d a d e e nos qu ais seu s m e m b ro s são
indiretamente obrigados se adequar.

A cultura determina certos comportamentos e hábitos alimentares, assim como as


representações sobre o corpo e os padrões estéticos que o tom am socialm ente
aceito, ti nesse movim ento imprime sua marca nos indivíduos, an m esm o tempo
que define sua possível integração ou seu estigma social. (Nakamura, 2004, p. 21)

A cultura ocidental atua! preconiza o culto a um corpo inatingível que parece


padronizar expectativas irreais e comportamentos desadaptativos para atingi-lo. É bas­
tante curioso observar como as patologias mentais ou, no mínimo, os sintomas men­
tais evoluem e se transformam ao longo do tempo ou entre as diversas culturas, mos­
trando-se sensíveis às mudanças sócio-culturais. Observa-se que a prevalência das
doenças mentais está absolutamente associada a uma época determinada e a deter­
minados valores culturais.
Os transtornos mentais relacionados ao corpo (distúrbio da imagem corporal,
distúrbio dismórfico corporal e transtornos aiimentares) são patologias que refletem a
preocupação exagerada das pessoas em possuírem um corpo '‘perfeito" que atualmente,

'Graduada pela Universidade Tuiuti do Paraná (2004), formação em Terapia Cognitivo-comporta mental peto Centre de EsLudos de Terapia
Comporta mental e Cogrvtiva (CETfcCC-PR - 2005), Formação em Psicologia do Esporte pelo G2 Asscssona Esportiva (2005), licenciatura
no Programa RAFCAL (Reeducação Afeto-txjyriiliva do Comportamento Alimentar -200fi), Espedali 2ação em Intervenção Cognitiva/Teor«
da Aprendizagem Mediada pela ^acuMade Martinus e ICELP - Jerusalém (2007); Especialização em Transtomos Alimentares e Obesidade
pela Faculdade de Medidnado ABC (FMABC-2009) Contato1(/11) 9964-7700/84G2-9Ô30, talimarques@h0Un3il.com.
"Graduada pete Universidade Federal dfi Pa ranã, mestre em Psitxjijge Experimental peia USP, professora dos cursos de graduação e pótgraduaçáo
da Universidade Tuiuti do Paraná, Professora e coordenadora do Centro dc Estudos de Terapia Comporta menta !e Cognitiva (CETECC-PR)

Sobre Comportamento e Cognição 401


é sinônimo de magro. Embora haja relatos sobre casos de anorexia nervosa desde o
século XIV (Busse & Silva. 2004), a obsessão em cuidar do corpo e ter uma silhueta
perfeita tem aumentado nos últimos anos, afetando tanto homens quanto mulheres
desde a infância até a velhice. O aumento vertiginoso dos transtornos alimentares deu-
se no século XX. a partir da década de 60, com o aparecimento da modelo Twiggy, que
era anoréx/ca. Iniciava-se ai a apologia à magreza e os ditames da moda passaram a
atrelar beieza a corpos extremamente magros. (Heller, 2003).
Em nossa sociedade cada vez mais “os aspectos físicos são valorizados em
detrimento da moral e da ética coletiva, favorecendo a construção de estigmas c precon­
ceitos que submetem os indivíduos à ditadura dos padrões efêmeros e, na maioria das
vezes, inatingíveis da moda" (Nakamura, 2004, p. 27). Esse fenômeno progressivo de
inversão de valores e exploração dos limites do corpo humano está levando as pessoas
a buscar pertencer a sociedaae a qualquer custo e isso se traduz nos crescentes casos
de distúrbio mentais motivados pelos padrões rígidos de beleza que, atuaimente.
permeiam todas as esferas do indivíduo, desde sua aparência até seu posto profissional.
É sobre esses distúrbios mentais relacionados aos padrões de beleza que esse artigo
irá discorrer, além de explanar uma forma muito utilizada para a conquista do corpo
magro, que é a prática de exercícios físicos em academias de ginástica.

2. Imagem corporal e distúrbio de imagem corporal


A imagem corporal ou auto-imagem é a forma como enxergamos o nosso
corpo e envolve os seguintes componentes (Smolak & Levine, 2001): comportamental
(situações das quais a pessoa se esquiva devido ao desconforto com seu corpo),
cognitivo (o que pensa sobre sua aparência), perceptivo (precisão da percepção de sua
aparência física, envolvendo estimativa do tamanho e do peso do corpo) e subjetivo
(afeto, satisfação que desenvolvemos em relação ao corpo, associado também a preo
cupação e ansiedade relacionada a ele).
A imagem corporal é a figura que nossa mente forma do nosso próprio corpo
(Schiider. 1994), e. segundo Stice (2002, apud Saikali et a!., 2004) nossos comporta­
mentos em relação à imagem corporal são decorrentes do reforço social e da modela­
gem. O reforço social é o processo pelo qua! as pessoas internalizam atitudes e com-
portam-se mediante a aprovação dos outros. Já a modelagem é o processo de obser­
vação e imitação do comportamento dos outros. Além disso, nossa auto-imagem sofre
influências dos nossos desejos, emoções, é influenciada pelas informações obtidas
pelos órgãos dos sentidos (em especial o tato e a visão), peia interação com o meio e
consigo mesmo (Ferreira. Meier, 2004).
Para Castilho (2001) ela “tem o papel de mediador em todas as coisas, desde
uma escolha de vestimenta, passando por preferências estéticas, até a habilidade de
empatizar com as emoções dos outros". E pode ser positiva, que significa ter consciên­
cia de seu corpo e aceita-lo, buscando melhorias possíveis para ser feliz no corpo em
que se vive: ou pode ser negativa, que é a negação do seu corpo, estando ou não em
busca de melhorias e de padrões estéticos. Pessoas com auto-imagem negativa apre­
sentam baixa auto-estima, identidade sexual afetada (acreditam que não possuem
características para sentirem-se masculino / feminina), dificuldades interpessoais por
presumirem que os outros também não aceitam sua aparência, dificuldades no ato
sexua! (tentam esconder o corpo, evitam o contato do parceiro e reduzem a freqüência
do relacionamento sexual), depressão (que representa um ciclo vicioso entre o descon­
tentamento com a aparência e a baixa auto-estima) e propensão aos transtornos ali­
mentares (pois fazer dietas cronicamente pode levar a descontroles alimentares).

4 0 2 Talita Lopes Marquei, Denise Cerqueira Leite Heller


Na busca por resolver sua insatisfação com o corpo, essas pessoas ac.ibíirn
optando por soluções inadequadas como: dietas muito restritivas, jejum, comporta
mentos de purga, procedimentos estéticos / dermatológicos, cirurgia plástica ostetica e
exercícios físicos em excesso ou de forma incorreta, Essa busca para melhorar o corpo
pode resultar ou set motivada por um distúrbio de imagem corporal, transtorno distnorfico
corporal (principalmente a dismorfia muscular) e transtornos alimentares (em especial
anorexia, bulimia).
O distúrbio da im a yen corporal é representado pelo pavor de engordar quo
persiste como idéia invasiva c sob revaloriza d a e faz com que o paciento imponha para
si urn limiar de peso extremamente baixo (Busse & Silva, 2004) Fste distúrbio e mais
comum em adolescemcs e mulheres, consiste em distorcer a percepção corporal ge­
ralmente superestimando o peso, ou seja, perceber-se mais gordo do que realmente é,
e associando o baixo peso à felicidade. Esse distúrbio nào e físico, ê psicológico, o que
significa que o problema nào é o corpo em si, mas a necessidade de aprovação e
aceitação social que a pessoa sente com este eterno vazio a ser preenchido.
A percepção de Adams cm 1977 vigora ate hoje. segundo ele, as pessoas
juígada pelos padrões vigentes com atraentes parecem receber mais suporte e
encorajamento no desenvolvi mento de repertórios cognitivos socialmente seguros e
competentes, assim, indivíduos tidos corno não-atraentes, estão mais sujeitos a en­
con tra r am bientes sociais que variam do n ã o-re spon sivo ao re je ita d o r o que
desencorajam o desenvolvimento de habilidades sociais e de um autoconceito favorá­
vel.

3. Os padrões de beleza e sua influência na imagem corporal


A psicanalista Hilac Bruch, nos anos 70, estudando obesidade e transtornos
alimentares, foi uma das primeiras pesquisadoras a perceber a influência que os pa­
drões sociais de beleza e aparência exerccm sobre as pessoas. Ela afirma que a
distorção social sobre o corpo, típica da cultura ocidental, se traduz no culto à magreza
e na aversão à obesidade (Stenzel, 2006).
Os países com estila de vida ocidentalizado vivenciaram a seguinte mudança
de padrões de beleza desde o século passado (Araújo, 2004, Assumpção Jr., 2004):
nos anos 20, a beleza se traduzia pela ausência de características sexuais secundári­
as, as roupas deveriam achatar a silhueta do corpo e as mulheres faziam muito exercí­
cio aeróbico para parecerem mais magras e reduzirem a gordura que se acumula nos
quadris e seios. Nos anos 30 passou-se a valorizar as características sexuais secun­
dárias, cintura fina e seios fartos, completo oposto do que acontecia na década anterior.
Nos anos 40 valorizou-se a mulher magra de pernas longas, porém grossas e seios
fartos. Nos anos 50 o padrão social estabelecia que o belo era ter seios mais fartos que
na década anterior, quadril largo e as pernas grossas, essa beleza era traduzida pelas
pin ups e divas do cinema, entretanto, para que as mulheres da nata da sociedade se
distinguissem das divas do cinema e teatro, que tinham uma má reputação, a magreza
começou a ser vaforizada em meados dos anos 60. Além disso, surge no cenário da
moda a modelo Twiggy, chamada de graveto, pois era anoréxíca, e o biquíni de 2 peças,
que são fatores que corroboraram para o aparecimentos de diversos casos de transtor­
nos alimentares. A apologia da magreza perdurou durante os anos 70, com o movimen­
to hippie, contudo, com o surgimento da AIDS, na década de 80 passou-se a valorizar os
corpos musculosos, que refletiam saúde e se distinguiam da magreza dos portadores
de AIDS. As academias de ginástica e as revistas sobre dietas e exercícios se dissemi­
naram e as pessoas que representavam essa década foram denominadas “geração

Sobre Comportamento e Cognição 4 0 3


saúde” (Novaes, 2001). Na década de 90 o corpo “malhado” continuou a ser valorizado,
entretanto, houve urna dicotomização do padrão de beleza, sendo também valorizada a
magreza mais acentuada do que aquela da década de 60, havendo uma nova explosão
de casos de transtornos alimentares. Atualm ente, para as mulheres, defende-se a
magreza extrema e os corpos definidos em academias de ginástica ou por cirurgias
plásticas e, para os homens, há o culto a hipertrofia, conquistada com a musculação,
suplementos alimentares e anabolizantes. Ambos os padrões de beleza, masculino e
feminino, são praticamente impossíveis de serem conquistados com saude, ou seja,
cada vez mais a imagem corporal das pessoas está muito longe daquela considerada
ideal, além disso, o padrão de beleza preconizado atualmente dissemina distúrbios
psiquiátricos como a dismorfia muscular, anorexia, bulimia, compulsões e obsessões
e tantos outros que ainda serão verificados cm pesquisas futuras.
Confirmam essa hipótese os resultados de pesquisas da socióloga Susan
Haworth-Hoeppner, que mostram que tanto grupos clínicos de transtornos alimentares
quanto não-clínicos apresentam tendências a superestimar o peso e medo intenso de
engordar (Stenzel, 2006), confirmando que as pessoas estão cada vez mais insatisfei­
tas com sua aparência corporal, em decorrência dos padrões socialmente estabeleci­
dos. Leone et al. (2005) complementam essa idéia afirmando que a sociedade bom­
bardeia jovens e crianças com imagens de como o corpo deve ser e isso é perceptível
no aumento dos distúrbios da imagem corporal em grande parte do mundo.

4. Prática de exercícios físicos


De acordo com Araújo (2004) a prática regular de exercícios físicos promove
benefícios fisiológicos (reduz a incidência de doenças coronarianas, acidente vascular
cerebral, hipertensão arterial, diabetes tipo II, obesidade e alguns tipos de câncer) e
psicológicos (o foco da atenção da pessoa muda, sai do estresse do cotidiano, esque­
ce de problemas diários, emoções negativas e foca no desempenho, na execução dos
movimentos do exercício; aumenta a sensação de controle: produz sentimentos de
auto-cficácia e competência; há o apoio social por meio da interação, do relacionamen­
to com outras pessoas; melhora o autoconceito e auto-estima, além de melhorar consi­
deravelmente sintomas depressivos e ansiosos, sendo adotados por muitos em detri­
mento da medicação, Weinberg & Gould, 2001).
Apesar dos diversos benefícios físicos e emocionais que a prática de exercícios
regulares proporcionam, no ambiente da academia de ginástica, por exemplo, pode-se
perceber muitas patologias decorrentes do culto ao corpo. Com o padrão de beleza atual
é comum verificar nas academias que os homens buscam ficar cada vez mais fortes e as
mulheres cada vez com o percentual de gordura menos (Leone et al., 2005). Quando
essas buscas são exageradas podem tomar-se patológicas, levando esses praticantes
aos distúrbios psiquiátricos descritos acima e que serão explanados a seguir.

5. Transtornos alimentares
Os transtornos alimentares são caracterizados por uma grave perturbação do
comportamento alimentar (preocupação exagerada com a qualidade do alimento ou,
consumo exacerbado ou limitado de alimento) e uma preocupação excessiva com o
peso e o corpo. São compreendidos pela Anorexia Nervosa, Bulimia Nervosa, Transtor­
no do Comer Compulsivo e Ortorexia (Duchesne, 2001, Heller, 2003, Ferreira, Meier,
2004).
A década de 60 foi um marco na história dos transtornos alimentares, pois

4 0 4 Talita Lopes Marques, Denise Cerqueira Leife I leüer


houve um crescimento do interesse pela anorexia e bulimia por parte da c o m u n id a d e
científica e da sociedade. Isso decorreu da maior divulgação de tais transtornos pela
mídia, casos de celcbridades sofrendo com essas doenças e ao aumento da valoriza­
ção da aparência física magra por parte da sociedade. Então, teve inicio a apologia da
magreza, o anseio pelo corpo "perfeito", a equivalência do termo “beleza" a “corpo ma­
gro" e, conseqüentemente, o aumento vertiginoso dos casos de transtornos alimenta­
res (Duchesne, 2001, Heller. 2003).
Segundo Duchesne (2001), não se pode ter certeza da incidência dos transtor­
nos alimentares, pois, além de muitos pacientes não se considerarem doentes ou
terem vergonha de mostrar seus sintomas, estudos com esse objetivo são realizados,
geralmente, com população estudantil. Mesmo assim, estima-se que 0,5% a 1% da
população adolescente feminina preencha totalmente os critérios do DSM-IV para a
anorexia e 1% a 3% para a bulimia. Estima-se também que a incidência seja maior para
o sexo feminino (acima de 90%). Entretanto, estudos recentes indicam que a prevalência
desses transtornos tem aumentado no sexo masculino: acomete 50% de heterossexu­
ais e 50% de homossexuais ou assexuados (Azevedo, 2004). Além disso, a busca por
um corpo extremamente magro ou a busca pelo corpo do tipo atlético, faz com que
homens desenvolvam além dos transtornos alimentares, a Vigorexia (Heller, 2003).
Os transtornos alimentares são multi-determinados e eclodem da interação de
fa to re s b io ló g ico s, psico ló g ico s, fa m ilia re s , sócio-cuH urais e a co n te c im e n to s
estressantes. Nos fatores biológicos, existem alguns fatores genéticos que parecem
predispor pessoas da mesma família (parentes em primeiro grau) a anorexia e a bulimia
(Duchesne, 2001, Heller, 2003). Micci (2004) corrobora e acrescenta a presença de
familiares com problemas como alcoolismo e depressão.
Nos fatores psicológicos, fica evidente que, na maioria dos casos, anoréxicos e
buíímícos são muito autocríticos, perfeccionistas e sensíveis a críticas (o que os torna
vulneráveis às pressões sociais), apresentam baixa auto-estima, muita ansiedade
interpessoal, se vêem como inadequado em vários aspectos pessoais e sociais, se
julgam incapazes de resolver problemas de qualquer natureza (o que vem a dificultar
sua conquista da independência), geralmente se avaliam pelo julgamento dos outros,
seus comportamentos são, muitas vezes controlados por outras pessoas, percebem
que tem pouco domínio sobre sua vida então, reduzem a alimentação, pois isto lhes
proporciona uma sensação de controle e mestria (DUCHESNE, 2001).
Quanto aos fatores familiares, Heller (2001, 2003), descreve que, em geral, a
família dá muita importância ao corpo e ao sucesso, tendendo a atrelar, de forma erra­
da. essas duas variáveis, fazendo com que o corpo seja visto como uma porta para o
sucesso. Corrobora Duchesne (2001), afirmando que a família quer parecer bem-suce-
dida o tempo todo, através de comportamentos como estar sempre na moda, exigir
boas notas dos filhos na escoía e ter aparência saudável e atraente, ou seja, "magra”. A
famífia apresenta comunicação disfuncional, com dificuldade de expressão de senti­
mentos e incapacidade de estabelecer vínculo afetivo; rigidez, com grau de exigência
bastante elevado, aplicado a todos os membros da família e tendo o sucesso um valor
extremo; os pais são superprotetores, o que dificulta a aquisição da autonomia por
parte dos filhos; preocupação com a estética corporal, manutenção de peso, podendo
os pais, em geral a mãe, praticar exercícios físicos em demasia, fazer dietas e cirurgias
plásticas (Cordás, 2000, Heller, 2003). Segundo Duchesne (2001), é comum que pelo
menos um dos pais seja muito exigente e crítico quanto a aparência do filho que sofre
de transtorno alimentar. A família tende a evitar perceber a doença, chegando até mes­
mo a elogiar o emagrecimento do filho (no caso de anorexia nervosa) e, no caso da
bulimia nervosa esperam que o problema se resolva com o “tempo” (Heller, 2003).

Sobre Comportamento e Cognição 405


Em relação aos fatores sócio-culturais, em Duchesne (2001), tem-se que o
contexto cultural influencia os modelos e ideais individuais, criando pressões para que
as pessoas tentem se adequar a determinados padrões”. A mídia é uma grande res­
ponsável pelo aumento da incidência, pois passa a idéia de que a beleza, felicidade e
autovalor estão diretamente ligados à um corpo magro, então as mulheres buscam se
adequar a este padrão para serem aceitas e respeitadas socialmente. O padrão de
beleza vigente, de formas “ideais" serem as formas muito esguias, que estão tão lon-
ges das formas reais da maioria da população, faz com que aumente a angústia em
relação a aparência e torna as pessoas, em especial as mulheres, muito inseguras
com seu próprio corpo. Heller (2003) traz exemplos da apologia a magreza que a soci­
edade faz de forma direta ou indireta: em um realityshow. exibido em horário nobre, uma
bulímica aparecia provocando vômitos, ingerindo laxantes, incentivando outros partici­
pantes a tomarem laxantes e a rede televisiva parece ter achado tais comportamentos
"normais’’, afinal, a moça continuou no programa; roupas de grife dispõem de numera­
ções pequenas (até 44); novelas e filmes mostram, em sua maioria, atores magros,
sobrando aos “gordos" papéis “engraçados” ; propagandas de remédios para emagre­
cer fazem uma propaganda enganosa de um produto que promete emagrecimento
rápido e indolor; a indústria dos produtos light, diet e dos suplementos alimentares
vendem corpos magros e saudáveis; além disso, muitas m odelos são anoréticas:
Twiggy (década de 60), Kate Moss (década de 80); Naomí Campbell (década de 90).

5.1. Anorexia nervosa


Para diagnosticar a Anorexia Nervosa é preciso que a pessoa apresente, se­
gundo o DSM-IV: recusa em manter o peso mínimo normal adequado á idade e à altura,
ou acima deste; medo intenso de ganhar peso ou de se tornar gordo, mesmo apresen­
tando peso inferior ao normal; perturbação na maneira de vivencíar o peso corporal, o
tamanho ou a forma e nas mulheres pós-menarcas, amenorréia por no minimo 3 ciclos
menstruais consecutivos (Duchesne, 2001, Duchesne & Appolinário, 2001, Hefler, 2003).
A anorexia pode ser de tipo restritivo, onde geralmente a perda de peso tem
inicio com a restrição de certos alimentos, podendo chegar ao jejum completo, ou do
tipo purgativo, fazendo-se uso abusivo de laxantes, diuréticos, enemas, anorexígenos,
indução do vômito c exercícios físicos em excesso (Heller, 2001, 2003, Duchesne, 2001,
Duchesne & Appolinário, 2001),
Outras características relevantes da anorexia são: inicia-se entre 13 e 18 anos,
a pessoa apresenta preferência pela magreza extrema, o medo intenso de engordar
ocorre como idéia fixa e intrusiva; preocupação excessiva com regimes e estratégias
para perder peso; percepção corporal distorcida; rara perda de apetite; distúrbios
comportamentais (transtorno obsessivo-compulsivo e depressão são as comorbidades
mais freqüentes); hipotermia; cefaféia; perda do interesse sexual; letargia; cabelos e
unhas quebradiços; pele seca e amarelada recoberta de pelugem; arritmia cardíaca;
anem ia; tontura; pouca tolerância ao frio; distúrbios de coa gu laçã o - sintom as
neurofisiológicos decorrentes do desequilíbrio neurolítico (Duchesne, 2001, Duchesne
& Appolinário, 2001, Heller, 2001, 2003).
Dalgalarrondo (2000) afirma que o que caracteriza a anorexia, segundo a
psicopatologia, é o distúrbio da imagem corporal, que faz a pessoa ver seu corpo gordo
por inteiro ou apenas em certas partes, geralmente a barriga, o quadril e as coxas. O pavor
de engordar é constante, mesmo que a pessoa esteja muito magra ou emagrecendo.
Segundo Heller (2001, 2003) e Cordás (2000), a pessoa que sofre de anorexia

4 0 6 Taliía Lopes Marques, Denise Cerqueira Leiíe H eller


apresenta auto-estima rebaixada, perfeccionismo, insegurança, falta de habilidade so­
cial, repertório comportamental limitado, tendência a se auto-avaliar através do julga­
mento dos outros, tendência a atribuir os insucessos de sua vida à sua forma corporal,
sensação de falta de controle sobre sua vida, parecendo que a única coisa capaz de ser
controlada por ela e seu comportamento alimentar, o que passa a ser muito reforçador
para a anoréxica.

5.2. Bulimia nervosa


Para diagnosticar a bulimia nervosa, segundo o DSM-IV, é preciso que a pes­
soa apresente as seguintes características, episódios de binge-eating (superalimentív
ção) recorrentes; freqüentes comportamentos compensatórios inadequados (vomito
auto-induzido, uso abusivo do laxantes, diuréticos, anorexígenos e pratica de exercícios
físicos em excesso) para prevenir o ganho de peso; auto-avaliaçao inadequada, influen­
ciada pelo peso o formato corporal; episódios de bingc-cuttng c comportamentos pur­
gativos acontecendo, em média, 2 vezes por semana, por 3 meses consecutivos. O
episódio de binge-eating ou hiperfagia é caracterizado pela pessoa comer durante no
máximo 2 horas uma quantidade de alimento que a maioria das pessoas não comeria
se estivesse em uma situação semelhante e sentimento de falta de controle sobre o
comportamento alimentar (Duchesne, 2001, Duchesne & Appolinário, 2001).
A bulimia ner/osa pode ser do tipo purgativo, quando a pessoa induz o vómito,
faz uso abusivo de laxantes, diuréticos ou anorexígenos, ou do tipo náo-purgativo. quan­
do a pessoa se submete ao jejum ou a exercícios físicos ern excesso (Cordãs, 2000).
Outras características relevantes da bulimia: inicia-se ontre 13 c 17 anos: o
episódio de hiperfagia é normalmente desencadeado por estados de humor disfóricos
e ansiosos ou fome intensa; distúrbio de imagem corporal, peso dentro do esperado
para seus peso e altura, podendo estar levemente acima ou abaixo do ideal; alterações
cardiovasculares, gastrintestinais, hidroeletrolíticas e metabólicas, causadas pela do­
ença; desgaste do esmalte dentário, hipertrofia das glândulas salivares e Sinai de
Russeí {Cordás, 2000) que são as cicatrizes encontradas no dorso da mão, ocasiona­
das pelo contato com os dentes ao provocar o vômito (Dalgalarrondo, 2000, Duchesne,
2001, Duchesne & Appoünário, 2001).
Para Cordás (2000) a pessoa que sofre de bulimia apresenta atenção voltada
para magreza e dietas, preocupação excessiva com o corpo, evita se pesar, evita ir a
eventos sociais devido à compulsão alimentar e por acreditar que engordou, passa
muito tempo do seu dia lendo revistas sobre corpo, dietas e assistindo videos de ginás­
tica, o que acabada derivando um isolamento social.

6. Distúrbio dismórfico corporal


É também encontrado na literatura como transtorno dismórfico corporal ou
dísmorfofobia, palavra de origem grega, que significa dis - anormal, morfos = forma e
fobos - medo. Atinge tanto homens quanto mulheres de aparência normal e é caracte­
rizada pela preocupação irreal de que alguma parte do corpo é feia, desproporcional,
pouco atraente, enfim, que há algo errado com determinada parte do corpo (Nezíroglu et
a!., 2001). São comuns preocupação com o nariz ser feio, com a barriga ser grande, com
as orelhas serem pequenas etc. Nesse espectro, a dismorfia muscular é um subtipo de
distúrbio dismórfico corporal, pois relaciona-se especificamente à musculatura (Pope
eta l., 2000).

Sobre Comportamento c Cognição 40 7


De acordo com o DSM-IV. o distúrbio dismórfico corporal é geralmente visto
como uma subcategoria do transtorno obsessivo compulsivo com um critério mais
específico, que é o corpo (Leone et al., 2005). Caracteriza-se por preocupação com um
defeito imaginário na aparência (se uma leve anomalia física está presente, a preocu­
pação da pessoa é acentuadamente excessiva), sendo que a preocupação acarreta
distúrbio clinicamente significativo ou prejuízo nas áreas social, ocupacional ou outras
áreas importantes de atividade, além disso, a preocupação não é mais bem explicada
por outro distúrbio mental, por exemplo, insatisfação com a forma e a dimensão corpo­
ral na anorexia nervosa (Thompson & Smolak, 2001).
Não se sabe ao certo a incidência dessa patologia pois a busca por ajuda
psicológica acontece quando essas pessoas experimentam sintomas de depressão,
baixa auto-estima, isolamento social e quando suas preocupações com determinada
parte do corpo tornam-se obsessões e compulsões, impedindo a realização de tarefas
diárias. Sendo assim, pessoas acometidas pelo distúrbio dismórfico corporal são mais
freqúentes em consultorios de dermatologistas e cirurgiões plásticos, com vistas a
resolver seus "defeitos" (Neziroglu et al., 2001).

6.1. Dismorfia muscular ou Vigorexia


A vigorexia, em inglês bigorexia, é uma especificidade do distúrbio dismórfico
corporal, pois a distorção corporal se destina exclusivamente aos músculos e à magre­
za representada pelo tônus muscular (Leone et al., 2005) e pode ser encontrado na
literatura descrito como (Pope, et al., 2000) anorexia nervosa reversa, Complexo de
Adónis ou dismorfia muscular. Esse transtorno atinge desde atletas até praticantes de
exercícios físicos, sendo mais prevalente entre homens, praticantes de alterofilismo, do
que entre mulheres e estima-se que mais de 100.000 pessoas preencham totalmente
os critérios para tal transtorno (Leone et al., 2005). Pope e colegas (2001, p. 114) afir­
mam que a dismorfia muscular ‘ é um alarme do que nossa sociedade está fazendo
aus homens contemporâneos quando pensam em seus corpos" devido aos padrões
dc beleza vigente que são extremamente rigorosos e inviáveis para o copo humano.
Nesse contexto, a vigorexia está nascendo no seio de uma sociedade consumista,
competitiva, frívola até certo ponto e onde o culto à imagem acaba adquirindo, pratica­
mente, a categoria de religião. Essa patologia exemplifica bem a influência sócio-cultu-
ral na incidência de alguns transtornos emocionais. Com toda certeza, a vigorexia é
uma das mais recentes patologias emocionais estimuladas pela cultura.
Pope e colegas (2000) foram os primeiros pesquisadores a estudar essa
síndrome. No início de suas pesquisas, a nomearam “bigorexia’’ e no primeiro artigo
que escreveram sobre ela denominaram “anorexia nervosa reversa", tendo em vista o
fato dos homens estarem extremamente musculosos e se verem franzinos, o oposto do
que acontece na anorexia nervosa, quando as mulheres estão extremamente magras e
se vêem obesas. Contudo, após aprofundarem seus estudos e perceberem que essa
è uma síndrome que atinge muito mais homens do que eles inicialmente pensavam,
optaram por designar essa patologia de “dismorfia muscular”. Contribuiu com a m u­
dança o fato de perceberem que não se trata de um transtorno alimentar, como é o caso
da anorexia nervosa. A dismorfia muscular está relacionada a alterações de percepção
ou obsessões relativas à musculatura. Assim, o termo “dismorfia muscular" é mais
adequado è síndrome, tendo em vista que “esses homens parecem representar um
caso especial de uma condição mais genérica, já conhecida em psiquiatria, denomina­
da transtorno dismórfico corporal” (p. 116).
Segundo Pope e colegas (2000) a pessoa que sofre com a vigorexia se olha no

4 0 8 Talita l.opes Marques, Denise Ccrqucira Leite H eller


espelho e, embora com muito custo se conscientize do que é forte, musculoso e gran­
de. se sente pequeno e fraco. É comum terem sua vida social extremamente prejudica­
da pela doença, pois podem evitar situações sociais por medo dos outros o acharem
pequeno, evitando eventos sociais, praia, piscina, trocar-se em vestiários de academi­
as; podem evitar usar roupas mais justas ou mangas curtas que evidenciem suas
formas musculosas que, para eles, são franzinas, ou o oposto, podem usar roupas
justas para dar a impressão de serem maiores, mais fortes; é freqüente que os ho­
mens vigoréxicos dediquem muita parte de seu tempo a observar e se comparar a
outros homens, persistentemente acreditam que todos os outros homens sao muito
maiores do que eies, o que geralmente rião é verdade. Todos esses comportamentos
denotam uma fragilidade emocional grande, sendo que a auto-estima e autoconceito
são diretamente influenciados pela sua percepção da imagem c o rp o ra l, ou seja, se
estão se vendo magros, pequenos e fracos, ficam depressivos, so sentem desvaloriza­
dos e com medo da rejeição dos outros.
A dismorfia muscular ou vigorexia desencadeia diversos aspectos psicológi­
cos peculiares em seus portadores, que muito lembram comportamentos obsessivo-
compulsivos: os homens vigoréxicos procuram passar todo o tempo que podem se
exercitando, de forma que podem preferir perder o emprego a parar de se exercitar,
muitos acabam desistindo de suas carreiras e tornam-se personal trainers, pois a
possibilidade de se exercitar aumenta bastante; desenvolvem rituais em relação à ali­
mentação, com horários rígidos para a ingesta de alimentos ou suplementos que vão
lhes dar melhores resultados no treino ou na aparência; a vida social é extremamente
afetada pois muitos não viajam para lugares que não tenham academias ou desistem
das férias pois não malham sem que seja no seu próprio equipamento, além da preo­
cupação com a dieta. A obsessão vai muito mais além e atinge a vida afetiva e sexual
dos seus portadores. Pope e colegas (2000) relatam casos de homens que evitavam
gastar energia com o sexo para poupá-la para o exercício; outro caso retrata um
fisiculturista que evitava beijar a namorada durante as 2 semanas que antecedessem
uma competição por medo que ela pudesse lhe passar calorias pela saliva; podem
passar mais de 5 horas por dia presos a pensamentos de serem muito pequenos, não
serem muito grandes ou em estratégias para se tornarem maiores; muitos fazem uso
de anabolizantes e treinam mesmo lesionados.
Leone et al. (2005) descrevem os critérios diagnósticos para a dismorfia mus­
cular, inclusa no OSM-IV, versão revisada de 2000, que são os critérios sugeridos por
Pope e colegas em 2000:

A. Preocupação com a idéia de que o corpo não é suficientemente magro e


musculoso. Condutas associadas características incluem longas horas levantando
peso e excessiva atenção para a dieta.
B. A preocupação é manifestada pelo menos por 2 dos seguintes 4 critérios:

1. O indivíduo freqüentem ente abandona im portantes atividades sociais,


ocupacionais ou recreativas por causa de uma compulsiva necessidade de manter seu
esquema de exercício e dieta.
2. O indivíduo evita situações em que seu corpo é exposto a outros ou enfrenta
tais situações apenas com acentuado desconforto ou intensa ansiedade.
3. A preocupação com a inadequação do tamanho ou da musculatura corporal
causa desconforto clinicamente significativo ou prejuízo a áreas de atividade social,
ocupacional ou outras áreas importantes.

Sobre Comportamento e Cognivâi' 4 0 9


4. O indivíduo continua a exercitar-se, a fazer dieta ou utilizar substân
ergogênicas (destinadas a melhorar o desempenho) apesar de saber as conseqüênci­
as adversas do ponto de vista físico ou psicológico.
C. O foco primário da atenção e da conduta concentra-se em ser muito pequ
ou inadequadamente musculoso, distinguindo-se do medo de estar gordo como ocorre
na anorexia nervosa, ou uma preocupação primária apenas com outros aspectos da
aparência tal como em outras formas de distúrbio dismórfico corporal.

7. Resultados de pesquisas sobre imagem corporal


A preocupação e supervalorização da imagem corporal é perceptível em diver­
sas pesquisas como por exemplo, Goldenberg (2005) que realizou uma cnquete via
internet a fim de saber se adolescentes pudessem, por uma mágica, mudar aigo em
seu corpo e a maioria dos meninos (5.487 meninos) votaram que gostariam de ter o
corpo mais forte, malhado, já a rnaioria das meninas (3.515 meninas) gostariam de ter
o corpo mais magro e malhado, confirmando que o padrão estabelecido nos dias de
hoje é almejado pelos adolescentes e possivelmente pelas crianças também.
Em parceria com o Datafolha, a MTV perguntou aos entrevistados, por exemplo,
se trocariam 25% de inteligência pefa mesma proporção de beleza. Como resultado
obteve-se que 15% dos participantes admitiram que fariam a troca. Nem se preocupa­
ram com o fato óbvio de que a beleza física passa rapidamente, mas a inteligência fica.
Trata-se de um mal que afeta parte expressiva de uma geração das classes A, B e C, ou
seja, da fatia da sociedade em que se inclui a elite. O principal resultado desse perfil é
ter detectado até que ponto vai a reverência exacerbada à beleza física. Convidados a
definir os traços que melhor definem a atual geração, os entrevistados colocaram em
primeiro lugar a vaidade. Depois, aparecem o consumismo, o individualismo e o como­
dismo. Esses resultados confirmam que está havendo uma "epidemia da beleza".
Em 2006 uma das autoras desse artigo (Talita L. Marques) a fim de melhorar a
imagem corporal de mulheres que praticam exercícios físicos regularmente em uma
academia de ginástica da cidade de Curitiba, criou um programa de conscientização
corporal. Este programa teve por objetivo aumentar a consciência e a aceitação corporal
de mulheres que praticam exercícios físicos regularmente, bem como implementar a
relação delas com sua imagem corporal. Participaram 20 mulheres, com idades entre
16 e 45 anos, das quais 15 participaram do programa completo. Foram realizados 10
encontros semanais, com temas, objetivo e metodologia pré-estabelecidos. Foram
trabalhados os seguintes temas: percepção e conscientização corporal, aceitação do
corpo, estabelecimento de metas e planejamento de mudanças viáveis, o ideal de
beleza através dos tempos, distúrbio de imagem corporal, a importância da comida na
nossa sociedade, distúrbios do comportamento alimentar, emoções relacionadas ao
comportamento alimentar, auto-estima, autoconfiança, desenvolvimento de imagem
corporal positiva, qualidade de vida e avaliação das mudanças propostas.
Os resultados mostraram que a maioria das participantes (80%) apresentou
imagem distorcida de seu corpo, buscando mudanças corporais inatingíveis devido ao
seu biotipo, etnia, etc. 26,66% apresentaram padrão alimentar disfuncional com predis­
posição a Anorexia e Bulimia. A imagem corporal permaneceu inalterada ao finai do
programa possivelmente porque não houve mudanças significativas no corpo das par­
ticipantes com o programa e porque a adaptação a uma nova imagem corporai demora
a acontecer. Ao longo do trabalho, foi constatada uma melhora significativa no autoconceito
das participantes, diminuição das preocupações com os ‘ defeitos” do corpo, culminan­

410 Íalíta Lopes Marques, Denise Cerqueira Leite H e lle r


do na aceitação e satisfação com seu corpo, além de estabelecimento o conquista de
metas plausíveis e planejamento de mudanças possíveis dc serem reali/adas Traba­
lhos como este devem ser realizados, pois aumentam a aceitação t; satisfação com o
próprio corpo, auxiliando a pessoa a aderir ao programa de cxeiacios físicos bem como
conquistar mudanças de estilo de vida que visem a prevenção do sedentarismo e
sobrepeso, que são os maiores problemas da sociedade atual. Além disso, è possível
que programas como esse previnam o aparecimento de distúrbios relacionados ao
corpo, como a dismorfia muscular a anorexia e a bulimia pois volta a valorização do ser
humano não pela sua aparência, mas pelo o que cie realmente é.

8. Conclusão
Todas essas patologias tem um eixo central que é a preocupação exacerbada
com o corpo, estando presente em todas elas uma forma distorcida de vivenciar seu
tamanho, peso e formas. Essas patologias têm em sua gênese diversas causas, sendo
uma delas a valorização social cio corpo cm detrimento de outras qualidades como o
caráter. A sociedade e a mídia tem preconizado nas ultimas 2 décadas padrões de beleza
claros, rígidos e inatingíveis tanto para homens quanto para mulheres, e é perceptível que
a busca por se enquadram nesses padrões está disparando esses transtornos.
É imprescindiveí que os profissionais da saúde compreendam e desenvolvam
pesquisas sobre esses transtornos para o diagnóstico preciso, delineamento de trata­
mento eficaz e principalmente para que estrategias de prevenção possam ser desen­
volvidas. Tudo isso somado ao poder público e a vontade de se criar políticas públicas
de prevenção e tratamento dessas doenças pode ser capaz de coibir o alastramento
desses transtornos de tal forma que eles não se disseminem na sociedade. Além
disso, é necessário que a população perceba a inversão dos valores humanos que
está acontecendo para que as famílias, instituições de ensino, etc. não corroborem com
esse quadro.

R eferências

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41 2 Talita Lopes Marques, Denise Cerqueira Leite H d ie r


Capítulo 34
Avaliação do comportamento do
treinador de uma equipe de
basquete pela visão do atleta.

M a r ia Silvana Barbosa dos Santos*


l/W
M arc e lla Pem on erB o ro es C o u tín h o **
UVV
Lucíano de Sousa C u n h a ***
UFES, W V

Introdução
A função de um treinador junto a uma equipe demonstra ser extremamente
relevante e abrangente, considerando que a sua ação implica no ensino c no aperfeiço­
amento de habilidades físicas, técnicas e motoras, assim como na produção de conse­
qüências para o comportamento dos atfetas em ocasiões cotidianas, situações de
treino ou de competição.
Levando-se em consideração que o atleta de alto rendimento, para estar inse­
rido no contexto de competição de alto nívo! necessita ser um competidor ativo e regular,
esto deveria ser orientado por um treinador de modo a roalizar um trabalho intensifica­
do, planejado e organizado, num processo de treinamento focalizado para o aperfeiço­
amento físico, técnico, tático e psicológico com a função de alcançar objetivos delimita­
dos para o seu trabalho.
Nesse sentido, o presente trabalho pretende discutir o papel do treinador de
uma equipe de basquete de alto rendimento a partir de uma analogia entre a sua função
e as funções exercidas por um professor em uma perspectiva comportamental, basea­
do na aplicação do instrumento Escala do Comportamento do Treinador - Visão Atleta
(ECT-A), utilizado para verificar a percepção sobre o comportamento do treinador pelo
atleta, a partir de alguns aspectos relevantes para o treinamento esportivo.
Partindo do pressuposto de que os aspectos psicológicos podem contribuir
para o desempenho do atleta, espera-se que a Análise do Comportamento aplicada ao
contexto esportivo possa oferecer às pessoas envolvidas direta ou indiretamente com a
área do esporte e da psicologia maiores informações para uma com preensão mais
ampla não somente sobre o comportamento do treinador, ou da relação treinador/atleta,

‘ Fonnanda em Psicologia peto Cenlro UriivsrsUário Vila Valh? E-mail pars correspondência: silvana.gaotgefêjgkibo.co/n
** Fofmanda em Psicologia peta Centro U niversilário Vila Velha. E-mail para correspondência rr^rœ llA cnitlirihiy^grrtsil.com
Mestre em Psicologia pela Programa do Pôs Graduação e;n Psicologia da Universidade Federal do Espírikj Sanlo. Prufessor do a jrso de
gradi.açãuem Psicologia do Centro Universitário Vila Velha E-mai' pai'a correspondência: luda'^o.conha@OLCom.t>r

Sobre Comportamento e Cognição 4 1 3


mas também sobre os efeitos que os comportamentos de cada um possam produzir, e
çom isso, trabalhar para a melhoria do desempenho tanto individual quanto coletivo de
cada um dos membros da equipe, promovendo um maior reconhecimento da Análise
do Comportamento aplicada ao contexto esportivo, considerando a escassez de traba­
lhos realizados neste enfoque. Alm eja-se também que os resultados deste estudo
sejam úteis para a comunidade académica, á medida que o instrumento utilizado, a
Escala de Comportamento do Treinador - Visão Atleta (ECT-A) encontra-se em proces­
so de validação para Língua Portuguesa por Lôbo & Moraes, além de possibilitar uma
associação dos resultados com as observações realizadas e os princípios básicos da
Análise do Comportamento.
Para tanto, o presente artigo foi organizado da seguinte maneira: inicialmente
será apresentado um breve olhar sobre Análise Comportamental aplicada ao esporte.
Em seguida, será discutida a função do treinador como uma analogia à função de um
professor. A seção seguinte descreve o método aplicado à pesquisa: o delineamento
experimental e o procedimento de tratamento e análise dos dados. Por fim, são apre­
sentados e discutidos os resultados quantitativos e qualitativos do experimento. Se-
guem-se, então, as conclusões em função dos objetivos propostos.

Análise do comportamento aplicada ao contexto esportivo


Segundo Martin & Tkachuk (2001), a Análise do Comportamento aplicada ao
contexto esportivo constituiu-se nos EUA no início da década de 70, com a publicação do
livro The development and control ofbehavior in sport and physical educaíion, por Brent
Rushall e Daryl Siedentop, que apresentaram estratégias de modelagem de habilida­
des esportivas, desenvolvimento e aprimoramento de habilidades existentes assim
como a transferência das habilidades e desempenhos em am biente de treino para
ambientes de competição. Os autores citam que Rushall concentrou seus estudos no
esporte, enquanto Siedentop deu início ao primeiro programa de pesquisa em Análise
do Comportamento aplicada à Educação Física.
Segundo Scala (1997), a Análise do Comportamento aplicada ao contexto es­
portivo apresenta dois objetivos principais: a promoção de saúde e a melhora de rendi­
mento esportivo, a partir de um trabalho voltado para o planejamento, propriocepção,
concentração, comunicação, relações interpessoais e liderança.
Desta forma, de acordo com Martin (2003), à medida que a Análise do Compor­
tamento tem como seu objeto de estudo, os comportamentos do homem numa relação
de interação com o ambiente, a proposta comportamental propõe definir os problemas
em termos de comportamentos que possam ser classificados como déficits ou exces­
sos comportamentais, sejam estes emitidos por treinadores, atletas ou membros de
uma comissão técnica, e a partir dai criar estratégias baseadas em procedimentos que
possam ser aplicados durante os treinos, a fim de produzir resultados que possam ser
generalizados para situações de competição.
A u to re s com o M artin (20 03 ) e G u ilh a rd i (2004) d e fin e m um d é fic it
comportamental como a uma classe de respostas descrita como problemática, pois
deixa de ocorrer com suficiente freqüência, intensidade, duração ou sob condições
socialmente adequadas, por exemplo: os esportistas que não chegam ao treino no
horário ou um técnico que raramente elogia os atletas após boas jogadas. Já um
excesso comportamental refere-se a uma classe de comportamentos relacionados a
um problema devido ao excesso considerando a sua freqüência, intensidade, duração
ou porque acontece sob condições nas quais sua freqüência socialmente aceita é
próxima a zero, por exemplo: um treinador que com freqüência demonstra favoritismo

414 M a ria Silvana Barbosa dos Santos, Marcella D cm oncr Borges Coutinho Luciano de Sousa Cunha
por um determinado atleta ou que freqüentemente grita com seus jogadores em s itu a ­
ção de competição.
Assim, dc acordo com Guilhardi (2004), um Analista do Comportamento b u sca
trabalhar as reservas comportamentais do sujeito, que se referem a comportamentos
socialmente adequados, habilidades já desenvolvidas que a pessoa emite natural­
mente e que servem ao analista do comportamento como pontos de partida para aqui­
sição de novas habilidades e comportamentos no repertório do sujeito possibilitando o
cumprimento de objetivos previamente definidos,
Segundo Martin (2003), para uma identificação adequada dos excessos, déficits
e reservas com portam entais, torna-se necessária a realização de uma avaliação
comportamental através de instrumentos e recursos especialmente desenvolvidos paro
essa tarefa, associados à observação dos comportamentos de interesse do pesquisa­
dor, assim como uma avaliação sistemática das variáveis que possam estar afetando
esses comportamentos.
Para isso. Martin (2003) destaca algumas características de uma Abordagem
Comportamental no esporte, como por exemplo: a ênfase em demonstrar os proble
mas em termos de comportamentos que possam scr observados c mensurados, pos­
sibilitando avaliar o grau da modificação do comportamento ao longo de uma interven­
ção; a utilização de técnicas e procedimentos como formas de reorganizar o ambiente
para ajudar o atleta a alcançar um desempenho máximo; a identificação de variáveis
especifica que possam interferir no comportamento do atleta (torcida, técnico, stress,
ansiedade, atletas adversários, favoritismo, entre outros); a importância da psicologia
da aprendizagem e da utilização dos princípios do condicionam ento operante e
pavlovrano; a interpretação comportamental de técnicas cognitivas aplicadas para um
aprimoramento dc habilidades dos atletas e; a validação social como estratégia para
garantir que as técnicas utilizadas encontrem-se de acordo com os objetivos propostos,
assim como a atribuição de responsabilidade a todos os envolvidos no planejamento,
execução e avaliação de um programa de Psicologia do Esporte.

A função do “professor-treinador”
No esporte, a função do treinador se reveia como um determinante para o
desenvolvimento das habilidades dos atletas, sendo este o principal responsável pelo
desempenho máximo de uma equipe, visto que é ele - o treinador - quem planeja,
organiza, motiva, orienta, ensina a maior parte dos aspectos do treinamento e de situa­
ções de competição. Essas funções atribuídas ao treinador podem ser percebidas não
só pelos seus comportamentos, mas também pela maneira como são chamados por
atletas de diferentes modalidades esportivas: “professor", o que permite estabelecer
uma analogia entre os papéis de um treinador e de um professor.
Na proposta da Análise do Comportamento, é necessário que o “professor-
treinador" tenha uma compreensão dos princípios básicos da aprendizagem para que
possa analisar as contingências que influenciam e reforçam os comportamentos do
"aluno-atleta", tanto positiva, quanto negativamente, assim como entender que tais con­
tingências também explicam o comportamento do “professor-treinador”, pois "[...] é na
interação com o aluno, e em função do efeito de seu comportamento sobre o comporta­
mento do aluno, que os comportamentos do professor são alterados ou mantidos".
(Zanotto, 2000. p.133).
Skinner (1968/1972)1 parte da proposição de que o domínio do conhecimento
especializado não garante a qualidade do ensino, e defende a posição de que os
problemas educacionais ocorrem devido a uma negligência aos métodos utilizados

Sobre Comportamento e Cognição 4 1 5


para o ensino e manutenção de habilidades comportameniais. Contudo, o "professor-
treinador" podo utilizar os conhecimentos da Análise do Comportamento, a partir da
intervenção de um Psicólogo do Esporte, com a finalidade de minimizar a dificuldade de
definição dos objetivos de ensino em termos comportamentais. a fim de produzir uma
melhora na relação ensino-aprendizagem em contextos ‘ educacionais-esportivos”.
O que se observa, é que um treinador pode “levar" para a quadra um repertório
comportamental adquirido e explicado por regras elaboradas ao longo de sua história
de vida, pessoal e profissional, o que muitas vezes da a entender uma dificuldade na
compreensão das contingências.
Assirn, para se alcançar mud3nças nos repertórios de todos os membros que
compõem a equipe, a presença efetiva de um Analista do Comportamento pode ser útil
para a compreensão de que problemas que ocorrcm om quadra, nem sempre podem
ser atribuídos a características cognitivas do ”aluno-atleta!’ ou mesmo traços de persona­
lidade, mas que a cognição pode ser vista como produto dc ensino através do arranjo
planejado de contingências reforçadoras na interação entre o indivíduo e o ambiente.
Para a Análise do Comportamento, esse arranjo planejado de contingências
deveria ser baseado em técnicas de "modificação de comportamento”, que descrevem
como se processa a aquisição de habilidades através de contingências de reforço. O que
proporciona um oihar não apenas para o indivíduo, mas para a relação entre este e o
ambiente, atribuindo ao “professor-treinador’1 um papel ativo, permitindo a revisão de
suas ações, levando-se em consideração os efeitos produzidos por elas, de modo a
possibilitar uma melhor reiação e por conseqüência, uma melhora no desempenho da
equipe como um todo. Percebe-se, portanto, que o processo de treinamento não se dá
num nivel mecânico, exigindo do "aluno-atleta” certo nivel de conhecimento técnico, tático,
físico e psicológico, os quais devem {ou pelo menos deveriam) ser ensinados por al­
guém. que nesse caso, seria representado peias funções habitualmente atribuídas ao
“professor-treinador” .
Nesse sentido, o treinador esportivo deve ser visto como um educador e nâo
como um mero transmissor de conhecimentos técnicos ou táticos, pois, sua ação con­
siste na aplicação adequada de princípios críticos, pedagógicos e científicos, a fim de
contribuir para o desenvolvimento integral do "aluno-atleta” e de sua equipe,
Para Zanotto (2000), a posição da Análise do Comportamento, em um enfoque
Behaviorista Radical sobre o aprender, revela que cada sujeito caminha em um ritmo
próprio, em que contingências de reforçamento podem e devem ser programadas para
levar a emitir comportamentos mais próximos do esperado. Assim, o ensino passa a ter
um caráter intencional, a partir do planejamento de contingências, que envolve a observa­
ção da relação entre as condições em que o comportamento ocorre, o próprio comporta­
mento e as conseqüências por ele produzidas.
Desta form a, o “p ro fe sso r-tre in a d o r", con he cen do as po ssib ilidad es
comportamentais do "aluno-atleta”, leva-as em consideração para planejar as melhores
condições para uma aprendizagem mais eficiente, minimizando situações de eno. Para
isso, realizar uma avaliação dos processos de ensino e de aprendizagem é tão importan­
te quanto mencionar os objetivos em termos comportamentais, do planejamento, organi­
zação e realização de procedimentos nesses contextos. No e n t a n t o . c a b e ao profes­
sor a lte rar seus com p ortam e ntos com o con dição para p ro d u z ir m udanças
comportamentais no aluno. Skínner defende a necessidade de que o professor estabele­
ça quais são as mudanças relevantes a obter no comportamento do aprendiz” (Zanotto,
2000, p.123).
1Todas as vezes em que uma referênda apresentar duas datas, a primeira se refere a publicação da ofcraííriohal .e a segunda, a obra
oonsultada

4 1 6 M aria Silvana Barbosa dos Santos, Marcella Demoner Borges Couíinho, Luciano dc Sousa Cunha
Zanotto (2000) chama atenção para a reciprocidade no uso de contingências de
reforço ou no uso de controle aversivo. Segundo a autora, freqüentemente, quando um
"professor-treinador não se utiliza desses princípios, pocfe-se registrar a ocorrência do um
clima hostil nas situações de ensino-aprendizagem. provavelmente polo predomínio do
contingências aversivas. Por exemplo, um treinador que atua com mais freqüência sob
controle dos comportamentos inadequados, utiliza possivelmente um controle aversivo,
desconsiderando a ocorrência de acertos, ou até mesmo de comportamentos adequados.
Desta forma, o efeito do uso dc contingências aversivas como estratégia para
controlar o modo de ação dos “alunos-atletas”, também passa a controlar o comporta­
mento do "professor-treinador”, modoiando-o a atuar coercitivamcntc, o que pode produ­
zir efeitos também aversivos, urna vez que todos passam a trabalhar sob coerção, sentin­
do-se insatisfeitos, desmotivados, desacreditados, o que reforça alternativas de fuga ou
de esquiva, chegando algumas vezes a desistirem definitivamente de se comportarem
sob aquelas condições.
Assim, para produzir mudanças extraordinárias, é indispensável propiciar o uso
de c o n tin g ê n c ia s de reforçamento positivo que caracterizam e x p e riê n c ia s re fo rç a d o ra s
para um bom desempenho. Para isso, é necessário que tanto o "profcssoi-tre in a d o r"
quanto para o “aluno-atleta” conheçam as contingências que e x p lic a m seus comporta­
mentos, o que no caso deste estudo, poderá ser feito a partir da aplicação de um instru­
mento, para então, possibilitar o enfrentamento dos problemas encontrados ao iongo
dos treinos e permitir a revisão e o (rG )plan ejam ento das contingências de reforço, quan­
do necessário.

Método
Participantes:
Participaram do estudo treze atletas de uma equipe de basquete de alto rendi­
mento que realiza suas atividades na Vifa Olímpica do Centro Universitário Vila Velha
(U W ), distribuídos em dois grupos:
• Grupo A: Constituído por 7 atletas de idades entre 21 e 35 anos, que apresen­
tavam tempo de convívio com o treinador mais de um ano.
• Grupo B: Constituído por 6 atletas de idades entre 21 e 32 anos, que apresen­
tavam tempo de convívio com o treinador abaixo de um ano.

Instrumento:
Utilizou-se a Escala de Comportamento do Treinador - Visão Atleta (ECT-A).
que é um instrumento que se encontra em processo de adaptação para a Língua Portu­
guesa no Brasil, por Lobo & Moraes, no Centro de Excelência Esportiva - CENESP/
UFMG. O ECT-A é uma escala proveniente da versão canadense do questionário
Coaching Behamor Scaie for Sport (CBS-S) desenvolvido por Côté et. ai (1999). Esta
escala possibilita avaliar, na visão dos atletas, o comportamento do treinador em diferen­
tes situações do treinamento. Com isso fornecem dados aos treinadores, sobre as per­
cepções dos atletas em relação ao comportamento desempenhado por eles, permitindo
adaptação no treinamento e contribuindo para a melhoria do desempenho dos atletas.
O ECT-A (versão brasileira) que procede do CBS-S (versão canadense) apresen­
tava 48 questões iniciais. A escala foi adaptada para 41 questões, distribuídas em seis
dimensões: Treinamento Físico - fornecimento pelos treinadores do planejamento e trei­
namento físico para o treinos e competições (sete questões); Treinamento Técnico -
feedback do treinador, demonstrações visuais e verbais e aconselhamentos (oito ques­

Sobre Comportamento e Cognição 417


tões); Treinamento Mental - envolvimento do treinador em ajudar os atletas a serem mais
resistentes, manterem-se focalizados e autoconfiantes (seis questões); Estabelecimen­
to de Objetivos - o envolvimento do treinador na identificação, desenvolvimento e
monitoramento dos objetivos dos atletas (seis questões); Reforço Positivo - a proximida­
de, disponibilidade e compreensão do treinador (seis questões) e Reforço Negativo -
atitu d e s do tre in a d o r com o o uso do m edo, g rito s quando está com raiva e
desconsideração das opiniões dos atletas (oito questões). (Lôbo, 2005)
As pontuações de cada item seguem a escala Likert de 7 pontos: “nunca” (1),
“pouquíssimas vezes” (2), “poucas vezes” (3), “metade das vezes” (4) e “muitas vezes”
(5), "muitíssimas vezes” (6), “sempre" (7). Os “scores” de cada dimensão são calcula­
dos através da soma dos itens correspondentes a cada questão, dividindo depois esse
valor pelo número total de itens. Os valores mais altos em cada sub-escala significam
maiores freqüências de comportamentos por parte do treinador, em cada uma das
áreas de ação descritas.

Ambiente:
O instrumento foi aplicado em uma sala climatizada com boa iluminação, me­
diante apresentação do objetivo do estudo e assinatura de um termo de consentimento
livre e esclarecido, podendo o atleta deixar de participar em qualquer momento sem que
tenha qualquer ônus pessoal.

Resultados e Discussão
A análise dos resultados foi realizada através do total de pontos atribuídos em
cada item para cada dimensão por atleta. Em seguida foram comparados os resultados
da média de valores entre os grupos (A e B), chegando-se assim aos resultados pertinen­
tes, o que resulta em itens favoráveis e desfavoráveis a cada item por dimensão para a
maioria dos atletas. Assim, são apresentadas nos resultados as médias das freqüências
que os atletas relataram ter vivenciado cada um dos comportamentos do treinador.
A dimensão “Treinamento e Condicionamento Físico” avalia a percepção dos
atletas sobre o programa fornecido pelo treinador em aspectos como: confiança, desa­
fio, detalhamento de um programa individual e plano de preparação física, instalações
e organização dos equipamentos, estrutura da sessão de treinamento e plano anual de
treinamento.

Avaliação dos participantes para a dimensão “Treinamento e Condicionamento


Físico".

Observa-se na Figura 1 que as maiores discrepâncias entre os grupos A e B


foram referidas para as seguintes questões: 1)Confiança no programa de condiciona­
mento físico (A=3,3; B=5,5); 3)Detalhes ao atleta sobre o seu programa de condiciona­
mento físico (A=3,0; B=4,7); 4)Um plano para preparação física (A=3,1; B=5,0); 6) Pro-

418 M a ria Silvana Barbosa dos Santos, M arcella Demoner Borges C outinho, Luciano de Sousa Cunha
porcionar aos atletas uma sessão de treinamento estruturada (A=3,9; B=5,2); 7)Fome-
cer aos atletas um programa anual de treinamento (A=2,9; B=3,5).
Considerando a dimensão como um todo, o resultado indica diferenças signifi­
cativas entre as respostas do grupo A (média=3,4) e do grupo B (média=4,8). Essa dife­
rença pode estar relacionada à inclusão de um treinador físico na comissão técnica, que
coincidiu com o mesmo período da chegada do grupo B. No entanto, nove atletas (A=5;
B=4) pontuaram abaixo da média a questão 7) Fornecer aos atletas um programa anual
de treinamento. E cinco (5) atletas do grupo A (71,7%) relataram que o oferecimento de
detalhes sobre o programa de condicionamento físico individual ocorre poucas vezes. É
importante ressaltar que durante o acompanhamento das sessões de treinamento não
foi identificado um programa de preparação física estruturada e individualizado. Isso pode
produzir como efeito um excesso de jogadores lesionados ou acima do peso, reduzindo
o número de atletas que podem ser aproveitados durante o jogo.
Em espaços destinados a com entários pessoais referidos à dim ensão de
treinamento físico, os atletas registraram frases como: “É preciso ter um planejamento
(sic)”; “Pouca estrutura para um time que chegou a nível nacional (sic)”; “Por ser apenas
um (referindo-se ao preparador físico)1, é bem complicado (sic)”. A partir da fala dos
atletas se torna importante ressaltar que contingências arbitrárias são estabelecidas
de modo que o comportamento do treinador encontra-se submetido a uma hierarquia
social mais ampla que controla as condições ambientais. Logo, a estrutura física como
um espaço compartilhado nem sempre possibilita a equipe estruturar um horário fixo
para treinamentos, por conta da liberação das instalações e equipamentos. Segundo
Martin (2003), deve-se considerar que a falta de um plano de sessão ou um programa
anual de atuação pode causar resultados que afetam diretamente o trabalho a ser
desenvolvido com os atletas.
Entre outros fatores que afetam o resultado da equipe encontra-se o fator tem­
po, que pode ser gerenciado para aumentar o tempo trabalhado, pois segundo Martin
(2003) é comum ocorrer um desperdício do tempo, quando não se tem uma sessão de
treinamento físico estruturada ou quando tem que se esperar por alguém que está
atrasado, exercendo assim efeitos negativos no desenvolvimento de um programa indi­
vidualizado, assim como também no estabelecimento de objetivos e metas.
A dimensão “Treinamento de Habilidades Técnicas” avalia a percepção dos
atletas sobre o com portam ento do treinador considerando os seguintes aspectos:
aconselhamento durante a execução da habilidade técnica; feedback para correção de
erros; reforço para as técnicas corretas; feedback para melhorar a técnica; exemplos
visuais sobre o movimento; exempios verbais sobre o movimento; certifica-se sobre o
entendimento; resposta imediata sobre o desempenho.

Figura 2. Avaliação dos participantes para a dimensão “Treinamento de Habilida­


des Técnicas”.

'G rifo nosso.

Sobre Comportamento e Cognição 419


Na Figura 2 nota-se que as maiores diferenças entre os grupos A e B foram
registradas para as seguintes questões: 8)Aconselhamento durante a execução da
habilidade técnica (A=5,7; B=4,3); 9 )Feedback para correção de erros (A=5,6; B=4,7);
W)Feedback para m elhorar a técnica (A=5,3; B=4,8); 12)Exemplos visuais sobre o
movimento (A=4,3; B=5,5). A questão 7)Exemplos verbais sobre o movimento (A=5,1;
B=5,3) apresenta resultados parecidos para os dois grupos.
O resultado indica uma similaridade de respostas entre o grupo A (média=4,9) e
o grupo B (média=4,8) sinalizando não haver comprometimento na qualidade técnica
percebida por ambos os grupos. Porém, seis atletas (A=3; B=3) pontuaram abaixo da
média para o fornecimento de respostas imediatas (informações) sobre o desempenho
individual do atleta. Entretanto, foram registrados os seguintes comentários para as habi­
lidades técnicas do treinador: "Ex-jogador onde ainda busca diferenciar o que ele faria
como jogador e o que deve fazer como treinador (sic)”; “A respeito das habilidades técni­
cas são de ótima qualidade a respeito da carreira (sic)”. Logo, observa-se que a referên­
cia feita pelos atletas ao comportamento do treinador não se baseia somente em sua
habilidade como técnico, mas também se levando em consideração sua carreira como
atleta, já que o mesmo foi um jogador reconhecido por suas habilidades profissionais
esportivas, tendo integrado a seleção brasileira por aproximadamente 12 anos.
Outra observação pode ser feita a partir da afirmação de Martin (2003), de que
os técnicos, em algumas vezes, não se dão ao trabalho de esquematizar visualmente a
descrição das jogadas e as conseqüências do desempenho para equipe. Para a Abor­
dagem Comportamental, a forma de ensinar passa por procedimentos de mostrar e
descrever os comportamentos pretendidos e as habilidades corretas de forma clara e
específica, se possível sinalizando os possíveis efeitos para a emissão destes com­
portamentos e as situações nas quais devem ocorrer.
Martin (2003) também cita que os elogios descritivos apresentam -se como
uma forma de resposta imediata (feedback) sobre o desempenho individual do atleta.
Demonstra ser propício para os treinadores que querem encorajar o atleta a se concen­
trar em um determinado elemento de sua habilidade. Depois que um comportamento
torna-se bem modelado, o técnico deve fornecer reforçadores para pequenas melhorias
a fim de obter um alto potencial. Esses comportamentos não eram observados com
uma freqüência de emissão adequada pelo treinador em questão, sendo dado um
feedback sobre essa habilidade em algumas ocasiões pela equipe de Psicologia.
A dimensão “Treinamento Mental” apresenta a avaliação dos atletas consideran­
do seis aspectos que se referem ao envolvimento do treinador no aconselhamento dos
atletas sobre como: desempenhar sobre pressão; preparar-se mentalmente; confiar nas
habilidades; ser positivo consigo mesmo; permanecer concentrado; e alegar-lhes que é
da responsabilidade dos atletas manterem-se motivados.

Figura 3. Avaliação dos participantes para a dimensão “Treinamento de Prepara­


ção Mental”.

4 2 0 Maria SUvana Barbosa dos Santos, Marcella Demoner Borges Coutinho, Luciano de Sousa Cunha
Na Figura 3, as maiores diferenças entre os grupos A e B foram encontradas
para as seguintes questões: 18)Como ter confiança nas habilidades (A=3,6; B=4,8);
19)Ser positivo consigo mesmo (A=3,4; B=4,5);17)Preparar-se mentalmente (A=3,6;
B=4,3); 21)Alegar-lhes que é da responsabilidade dos atletas manterem-se motivados
(A=5,0; B=4,2). A questão 20) permanecer concentrado (A=4,3; B=4,7) apresenta resul­
tados mais parecidos entre os dois grupos.
O resultado da dimensão revela uma diferença nas respostas entre o grupo A
(média=3,9) e o grupo B (média=4,5). Nota-se que nove atletas (A=5; B=4) pontuaram
para acima da metade das vezes para situação de treino mental em que o comporta­
mento do treinador alega que se manter motivado para a prática, é da responsabilidade
do atleta. Destacam-se alguns comentários em que fazem menção à questão acima
como: “Ainda não temos um treinamento regular (sic)”; “Ele expõe só o necessário
dizendo: que estamos preparados para o jogo (sic)”; “Nunca foi feito, a responsabilida­
de é passada para o atleta (sic)”.
Na Psicologia do Esporte há um alerta para o fato de que “[...] o treinamento de
habilidades psicológicas seja freqüentemente negligenciado devido à falta de conheci­
mento, à percepção de falta de tempo ou a crença de que habilidades psicológicas são
inatas e não podem ser ensinadas” (Weinberg & Gould, 2006, p.250). Entende-se que
muitos treinadores reservam trinta horas semanais para o treinamento físico, tático e
técnico e nenhum tempo para o treinamento psicológico. No entanto, manter-se con­
centrado, aumentar a confiança, controlar a ansiedade ou manter-se motivado em situ­
ação de competição requer das habilidades psicológicas que também precisam ser
sistematicamente treinadas para tornarem-se instrumentos efetivos na situação de
competição.
A dimensão “Estabelecimento de Objetivos (metas)” apresenta a avaliação dos
atletas em seis questões que se referem à ajuda do treinador para: identificar caminhos
para os objetivos; progresso em direção aos objetivos; objetivos a curto prazo; datas
alvo para alcançar os objetivos; objetivos a longo prazo; compromisso com os objetivos
do atleta.

Figura 4. Avaliação dos participantes para a dimensão “Estabelecimento de


Objetivos". R B G H G -5' 36

Na Figura 4 as maiores diferenças entre os grupos A e B se referem às seguin­


tes questões: 22)ldentificar caminhos para os objetivos (A=4,7; B=3,8); 24)Objetivos a
curto prazo (A=4,6; B=3,7); 26)Objetivos a longo prazo(A=4,3; B=3,3). Revela-se maior
concordância para a questão: 23)Progresso em direção aos objetivos (A=4,3; B=3,8).
O resultado indica uma similaridade entre as respostas para a dimensão entre
o grupo A (média=4,2) e o grupo B (média=3,9). Observa-se que cinco atletas (A=3; B=2)
advertem que poucas vezes há um compromisso com os objetivos dos atletas. Isso

Sobre Comportamento e Cognição 421


pode demonstrar que há uma dificuldade em priorizar metas especificas de desempe­
nho com p rom e tido com os ob je tivos dos a tle ta s, id e n tifica n d o um cam inho e
monitorando o progresso em direção aos objetivos por meio de feedback. Observa-se
que alguns treinadores preocupam-se em estabelecer metas de resultado, por exem­
plo: “fazer o melhor para se classificar para os playoffs do campeonato, nacional”. Essa
meta revela-se de maneira vaga. Nesse caso, seria mais adequada a definição de
várias metas de desempenho e de processo que levassem a esse resultado, pois “[...]
metas específicas influenciam mudanças comportamentais mais efetivamente do que
metas gerais de ‘fazer o melhor’ ou do que não ter nenhuma meta” (Weinberg & Gould.
2006, p.334).
Desta forma, um objetivo especifico deve ser mensurável dentro de um tempo
especifico, por exemplo: um treinador de basquete que determina como objetivo especí­
fico como melhorar o lance-livre dos atletas deveria especificar esse comportamento,
identificando o caminho para alcançar o objetivo proposto. Assim, definindo que a meta
seria aumentar o índice de acertos de lance-livre 40% para 50 %, a partir de um treinamen­
to estruturado, no qual cada atleta faria 100 lances livres todos os dias monitorando o
percentual de acertos e recebendo feedback sobre a técnica utilizada, e fatores relaciona­
dos a ela que podem estar influenciando o número de acertos ou erros.
Vale ressaltar ainda, que treinadores devem promover o compromisso com a
meta de seus atletas. No entanto, o que se observa é que nem sempre ocorre o estabe­
lecimento de metas individuais ou apoio à meta da equipe. Treinadores deveriam ter
claros os objetivos individuais dos atletas para monitorar, perguntar sobre seus progres­
sos, incentivar fornecendo feedback sobre o progresso dos atletas em diferentes áreas
incluindo habilidades: individuais, de equipe, física, técnica, motoras e psicológicas.
A dimensão “Reforço Positivo” fornece a percepção dos atletas sobre o compor­
tamento do treinador para os seguintes aspectos: entender o atleta como pessoa; dispo­
nível para ouvir o atleta; entender problemas pessoais do atleta; preocupação com a vida
de maneira geral; digno de confiança em relação aos problemas; mantém sigilo sobre a
vida pessoal.

Figura 5. Avaliação dos participantes para a dimensão “Reforço Positivo”.

Na Figura 5 nota-se que as maiores diferenças entre os grupos A e B foram


registradas para a seguinte questão: 29)Disponível para ouvir o atleta (A=4,0; B=5,8) e
revelando maior concordância para as questões: 31)Preocupação com a vida de ma­
neira geral (A=3,7; B=3,8); 32)Digno de confiança em relação aos problemas (A=3,9;
B=4,0); 33)Mantém sigilo sobre a vida pessoal A=4,7; B=4,7).
O resultado geral da dimensão entre o grupo A (média=4,1) e o grupo B (mé-
dia=4,6) sinaliza haver discrepância de comportamento na relação grupai, consideran­
do que três (3) atletas do grupo A indicam que o treinador “nunca” encontra-se disponível
para ouvir o atleta.

4 2 2 Maria Sílvana Barbosa dos Santos, Marcella Demoner Borges Coutinho, Luciano de Sousa Cunha
É preciso salientar que o desenvolvim ento do potencial da equipe também
depende da habilidade de comunicação. Segundo Weinberg & Gould (2006) mesmo
diante de membros com alta habilidade técnica, a comunicação é um elemento critico
no ambiente esportivo, o que demonstra a existência de lacunas na relação treinador/
atleta em um espaço de aprendizagem e treino. Percebe-se que essa fenda na comu­
nicação pode ser propiciada pela comunicação não verbal, que pode transmitir mensa­
gens contraditórias.
Qualquer meio utilizado por um treinador para expressar ao atleta as instruções,
pensamentos e sentimentos envolve a comunicação, a qual contém elem entos não
verbais de impacto para a relação treinador/atleta. Um técnico pode falar que está aber­
to para comunicação, embora seus gestos expressem o contrário, produzindo uma
comunicação inconsistente que gera insegurança e ansiedade na equipe.
A dimensão “Reforço Negativo" apresenta a percepção dos atletas em relação
ao comportamento do treinador em oito questões: usa o medo em seus métodos de
instrução: grita quando está com raiva; ignora a opinião do atleta; demonstra favoritis-
mos; intimida o atleta fisicamente; usa o poder para manipular o atleta; faz comentários
pessoais desagradáveis; gasta muito tempo treinando os melhores atletas.

Figura 6. Avaliação dos participantes para a dimensão “Reforçador Negativo".


Na Figura 6 as maiores diferenças entre os grupos A e B foram referidas para as
seguintes questões: 34) usa o medo em seus métodos de instrução (A=2,0; B=3,0);
36)lgnora a opinião do atleta (A=5,0; B=4,2); 37)Demonstra favoritismos (A=4,0; B=4,8).
No entanto, revela maior concordância para as questões: 35)Grita quando está com
raiva (A=3,4; B=3,7); 40)Faz comentários pessoais desagradáveis (A=2,3; B=2,0). 41)Gas-
ta muito tempo treinando os melhores atletas (A=2,6; B=2,8).
O resultado sinaliza uma concordância entre os dois grupos para essa dimen­
são, apresentando uma média de 3,1 pontos. Com isso, nota-se que nove atletas (A=4;
B=5) pontuaram, entre poucas vezes e sempre, a questão que faz menção ao uso do
medo em métodos de instrução. Do total de treze atletas, onze atletas (A=6; B=5) pontu­
aram, entre poucas vezes e sempre, as questões referidas como, ignorar a opinião dos
atletas em alguns momentos; e demonstra favoritismo por Outros atletas. Uma hipóte­
se pode ser formulada a partir da informação de que dois (2) membros da equipe são
parentes em primeiro grau do treinador.
Observa-se que treinadores, baseados num repertório comportamental adqui­
rido ao longo de sua vida, buscam agir punitivamente usando a retirada de reforçadores
a rim de parar uma ação ou evitá-la. Tem-se como exemplo: quando o jogador é manda­
do para o banco depois de emitir um erro. Outras vezes, tenta-se parar o que está errado
aplicando reforçadores negativos: uso do medo, gritos, comentários desagradáveis ou
ignorando a opinião do atleta.
Assim, observa-se em um ambiente aversivo, diante de ameaça de punição
sinalizada por palavras ou ações, existe um aumento na freqüência de comportamen-

Sobre Comportamento e Cognição 4 23


tos de fuga e esquiva, reduzindo consideravelmente a variabilidade de comportamentos
de um atleta, diminuindo a probabilidade de emissão não só de comportamentos inade­
quados, mas também de comportamentos considerados adequados que poderiam ser
úteis nesse contexto. O treinador que usa o medo como ferramenta de ensino pode correr
o risco de produzir nos atletas um "bloqueio” no processo de aprendizagem.

Figura 7. Avaliação dos participantes para as seis dimensões da ECT - A.


Destaca-se na figura 7 o resultado para as seis dimensões, em que se perce­
be uma diferença mais acentuada para a dimensão de condicionamento físico (A=3.4;
B=4,8; AB=4,1). As dimensões referidas para: habilidades técnicas (A=4,9 B=4,8; AB
4,8); estabelecimento de objetivos (A=4,2; B=3,9; AB=4,0); preparação mental (A-3,9;
B=4,5; AB=4,2); reforço positivo (A=4,1; B=4,6; AB=4,3); e reforço negativo (A=3,1; B=3,1;
AB=3,1) não revelam diferenças significativas na média entre os grupos.
O resultado da média das seis dimensões analisadas indica não haver discre-
pâncias significativas, entre os grupos A e B, quanto ao comportamento do treinador, o
qual na percepção dos atletas apresenta-se como um treinador em nível médio (de
uma escala de 1 a 7). Assim, presumi-se que um fator determinante para eventuais
dificuldades enfrentadas pelo treinador da equipe em questão pode ser identificado
pelo acumulo de funções exercidas, como as de proprietário, treinador, gerenciador,
entre outras.

Considerações Finais
Segundo Weinberg & Gould (2006), há formas positivas e negativas de ensinar
e treinar. A Abordagem Comportamental focaliza-se nos princípios de reforçamento por
meio de procedimentos que possibilitam reorganizar o ambiente ajudando tanto o trei­
nador quanto aos atletas a obterem um maior desempenho. Assim, buscou-se neste
trabalho dar importância ao processo de ensinar por meio dos princípios da Análise do
Comportamento a partir de uma avaliação feita por atletas sobre o comportamento de
um treinador.
Estes conhecimentos podem ser fundamentais para compreender o compor­
tamento dos sujeitos e identificar variáveis que podem exercer influência nos seus
desempenhos, fornecendo “dicas” importantes para o planejamento de intervenções
mais eficazes, contribuindo na melhoria do desempenho da equipe, e ressaltando que
a função do treinador precisa ir além de transmitir habilidades em treinamentos cons­
tantes, e sim compreender, que como treinador, a identificação de seus próprios com­
portamentos é parte importante para uma explicação sobre os comportamentos dos
atletas, proporcionando assim, a chance de modificar o próprio comportamento e pro­
duzir alterações nos comportamentos dos atletas.

4 2 4 Maria Silvana Barbosa dos Santos, Marcella Demoner Borges Coutinho, Luciano de Sousa Cunha
Zanotto (2000) indica que o "professor-treinador” necessita adquirir conheci­
mento sobre o comportamento humano que o habilite planejar as contingências ade­
quadas tanto para ensinar quanto para se autogovernar. Para isso, a autora sugere que
o “professor-treinador” seja ensinado a ensinar com base nos pressupostos científicos
e conceitos da Análise Comportamental sobre os processos de ensino e de aprendiza­
gem, para não correr o risco de estabelecer um longo e difícil caminho permeado de
tentativas e erros.
Contudo, não cabe apenas conduzir o treinador a identificar os comportamen­
tos e as relações destes com o ambiente, mas é necessário levá-lo a conhecer os
recursos da Análise do Comportamento, para que ele aprenda a ajustar seu comporta­
mento em função do comportamento do atleta.
Parafraseando Skinner (1968/1972), “ensinar é simplesmente arranjar contin­
gências de reforçamento” .

R eferências

Guilhardi, H. J. (2004). Terapia por contingências de reforçamento. In Abreu, C. N. & Guilhardi, H. J.


Terapia comportamental e cognitivo-comportamental - Práticas clínicas, (pp. 3-40). São Paulo,
SP: Roca.
Lôbo, I. L. B.; Moraes, Luiz C. C. A. & Nascimento; E. (2005). Processo de validação da escala de
comportamento do treinador - visão atleta (ECT-A). Revista Brasileira de Educação Física e
Esporte. São Paulo, v.19, n. 3, (pp.255-65).
Martin, G. (2003) Consultoria em psicologia do esporte: orientações práticas em análise do
comportamento. Campinas, SP: Instituto de Análise do Comportamento.
Martin, G. & Tkachuk, G. A. (2001) Psicologia comportamental do esporte. In Guilhardi, H. J. & Cols
(Org); Sobre Comportamento e Cognição: expondo a variabilidade, v.8, (pp.313-336), Santo André,
SP: ESETec Editores Associados.
Scala, C. T. O que é análise comportamental no esporte? (1997). In: Delitti, M. (Org), Sobre
comportamento e cognição: A prática da análise do comportamento e da terapia cognitivo-
comportamental. v.2, (pp.339-343). Santo André, SP: ESETec.
Skinner, B. F. (1972). Tecnologia de ensino.(Tradução de Rodolpho Azzi). São Paulo: Herder/ Edusp.
(Obra originalmente publicada em 1968).
Weinberg, R. S. & Gould, D. (2006). Fundamentos da psicologia do esporte e do exercício. 2.ed.,
Porto Alegre, RS: Artmed Editora.
Zanotto, Maria de Lourdes Bara. (2000). Formação de professores: a contribuição da análise do
comportamento. São Paulo, SP: EDUC.

Sobre Comportamento e Cognição 425


Capítulo 35
Análise do comportamento no contexto
esportivo: intervenções em uma
equipe de basquetebol

Luciano de Sousa Cunh.r


U f FS, V/VV
Filipe M o re ira Vasconcelos
Paola Porto Câmara de Freitas
Paula Nunes Lima
Kenan Q rilo de A lm eid a8
UW

Introdução
A Psicologia vem sendo aplicada nas mais diversas áreas. Seu desenvolvi­
mento tecnológico e conceituai tem permitido a inserção do psicólogo em contextos
bem diferentes que o da clínica tradicional. Um exemplo corrente dessa inserção dife­
renciada, é sua atuação dentro do contexto esportivo, realizando atividades que contri­
buem para o crescimento profissional de atletas de alto rendimento e de suas respec­
tivas equipes.
Nessa perspectiva, a Psicologia em geral, e a Análise do Comportamento em
particular, vêm assumindo um papel ativo no contexto esportivo, preocupando-se com
fatores emocionais, cognitivos e motivacionais dos atletas, e objetivando compreender
como tais fatores influenciam no desempenho da prática esportiva.
O presente trabalho visa ilustrar, a partir de um relato de experiência, uma
intervenção com base na perspectiva Analítico-Comportamental e discutir os efeitos
dessa intervenção no desempenho de uma equipe de basquetebol do Centro de Trei­
namento Arremessando para o Futuro (CETAF), que realiza suas atividades na Vila
Olímpica do Centro Universitário Vila Velha, no estado do Espírito Santo.
Para isso, o texto apresentará uma breve história do basquetebol, seguida por
uma revisão teórica sobre como a Análise do Comportamento se aplica ao contexto
esportivo, o método desenvolvido para o trabalho e os seus referidos resultados.

' Mestre em Psicologia peto Programa de Pés firaduação em Psicologia ds Universidade FPd era! do Espirito Sarrto, Professor do Curso de
Graduavãotím Psicologia do Centro UnivereilàricVita Velhe. E-rnail para corrcspondSncta: luciano cunba@oi com br
: Discentes do Curso de Graduação em Psicologia do C e n to Universitário Vila Velha (U W )

Sobre Comportamento e Cognição 427


Breve histórico do basquetebol
De acordo com Coutinho (2001). o basquetebol surgiu em 1891, em
Massachusetts, Estados Unidos da América (EUA). Atendendo ao pedido do diretor
do Colégio de Springfietd. Luther GullickTo professor de Educação Física da escola,
James Naismith, tinha o desafio de fazer uma aula em que a atividade não envolves
se violência e que os alunos pudessem praticar tanto no verão quanto no inverno.
Desde então o basquete foi inserido como uma prática da Educação Física. Passa­
dos três anos, o basquetebol chega ao Brasil.
Com o tempo o basquete foi evoluindo e as suas regras sofreram altera­
ções. Pensando em melhorar a jogabilidade desse esporte, cestas foram adapta­
das como se fossem uma espécie de alvo fixo, impondo certo grau de dificuldade e
também, a utilização de uma bola maior que a de futebol, para que pudesse oferecer
uma melhor condição do jogo e transformá-lo em um esporte mais dinâmico, con­
seqüentemente, mais atraente ao público (Coutinho, 2001).
Os efeitos dessa evolução do basquete corno esporte profissional, podem
ser percebidos desde o ano de 1936, no qual a modalidade foi inserida nos Jogos
Olímpicos. A Federação Internacional de Basquetebol (FIBA), instituição que rege o
esporte desde 1932, reuniu cerca de 190 países e é sediada em Munique, na Alema­
nha. A FIBA é o órgão responsável pela direção e execução de eventos com seieções
O Brasil possui sua própria confederação que é a Confederação Brasileira de Bas­
quetebol (CBB), órgão fundado em 1933.
Esses efeitos repercutem também no estado do Espírito Santo, onde se
encontram duas equipes profissionais de basquetebol, o Saldanha da Gama e o
Centro de Treinamento Arremessando para o Futuro (CETAF), equipe com a qual o
presente trabalho foi realizado.

Psicologia do esporte e a análise do comportamento


Para Martin (2001), a mais importante característica de uma abordagem
comportamental é sua forte ênfase na definição dos problemas em termos de com­
portamento que possa ser mensurado de alguma maneira. E c usando as altera­
ções dessas medidas com porta menta is que se pode investigar o grau com que o
problema vem sendo superado. Além da observação, o feedback passa a ser então
uma das estratégias que o Analista do Comportamento freqüentemente utiliza para
realizar essas medidas.
É de se notar que as abordagens que privilegiam a utilização de feedback
positivo como instrumento de intervenção tendem a colaborar com a melhora das
condições de desempenho dos atletas, afinal, de acordo com Martin (2001), se em
determinada situação, alguém faz alguma coisa que é imediatamente seguida de
reforço positivo, então essa pessoa tem m aior probabilidade de fazer a mesma
coisa novamente, quando encontrar uma situação semelhante, sendo portanto, útil
quando é necessário que uma determinada classe de respostas emitidas por um
atleta aumente sua freqüência.
Além disso, através desses feedbacks ‘'positivos’’ é possível contribuir para
a constituição de uma equipe mais entrosada e comunicativa, visando a melhora da
dinâmica interpessoal do grupo e conseqüentemente a evolução de sua atuação
em quadra, o que confirma a afirmação de Weinberg & Gould (2001), de que boas
habilidades de comunicação estão entre os ingredientes mais im portantes que

Lucíano de Sousa Cunha,- Filipe M oreira Vasconcelos; Pàota Porto C.Smara de Freitas,- Paula
Nunes Lima e Renan Q rilo de A lm eida
contribuem para melhorar o desempenho e o crescimento pessoal dos praticantes
do esporte.
Martin (2001) destaca nesse contexto que existem comportamentos que
podem ser classificados como públicos ou privados, e que essa distinção torna-se
necessária quando formos trabalhar no contexto esportivo. Comportamentos públi­
cos são aqueles que podem ser percebidos por outros, como gritar com o juiz.
passar agressivamente a bola para o companheiro, ou seja, eles são observáveis
não só para o indivíduo que os emite, mas também para as pessoas que estão a
sua voita. Já o comportamento privado é um tipo de comportamento o quat quem
tem acesso é apenas o sujeito que os emite, sendo inacessível a outros observado­
res (a não ser que o sujeito faça um relato verbal)-*. Exemplos de comportamentos
privados são a autocobrança, na qual o atleta exige de si mesmo uma performance
perfeita, o pensar e o sentir entre outros. Assim, no contexto esportivo pode-se afir­
mar que o efeito do comportamento privado exerce influência principalmente no
próprio sujeito (ou em seu desempenho), quando se fala em 'treinamento mental'
ou ‘ emoções”, como por exemplo, quando um atleta pensa: "Tomara que eu não
fique em ultimo lugar. E sc eu for mal?" É provável que esses pensamentos façam
com esse atleta se sinta ansioso e sinta os ombros e braços tensos. Essas reações
tèm grande probabilidade de interferir em sua capacidade de executar os seus
movimentos e usar todo seu potencial. Já os efeitos do comportamento público não
se limitam apenas àquele que o emite, podendo produzir alterações no ambiente
físico e social (comportamentos e desem penho4 de colegas de equipe, técnico,
membros da comissão técnica e torcida).
O analista do comportamento deve, portanto, buscar identificar que rela­
ções esses comportamentos estabelecem com seu ambiente imediato, verificando
em que contexto eles são emitidos e quais as conseqüências que produzem. Desta
forma, a partir de uma avaliação comportamental (através de questionários padroni­
zados, entrevistas semí-estruturadas, entre outros), pode-se fazer um levantamento
de déficits e excessos comportamentais (sejam eles públicos ou privados), com o
objetivo de avaliar o desempenho dos atletas, buscando maneiras possíveis de
rearranjar o ambiente para que eles possam alcançar um melhor rendimento e
atuação dentro de quadra.
Para Guilhardi (2004), déficits comportamentais podem ser definidos como
uma classe de respostas que é descrita como problemática por que: deixa de ocor­
rer com suficiente freqüência, com intensidade adequada, da maneira apropriada,
ou sob condições socialmente previstas, como por exemplo: quando um jogador
não chega ao treino no horário e não termina os exercícios propostos, ou mesmo
quando um técnico raramente elogia os atletas após boas jogadas. Entende-se
então como déficit comportamental a falta de habilidades que sejam fundamentais
para a prática esportiva, habilidades que ele não possui, ou que não ocorrem em
freqüência adequada
Em contra partida, os excessos com portamentais podem ser descritos
como uma classe de comportamentos que ocorre e é descrita como problemática
devido a: excesso em freqüência, intensidade, duração, ou ocorrência sob condi­
ções em que sua freqüência socialmente aceita é próxima a zero, como por exem-

’ Uma diAftiifisio sobre a corres por ccnc ia entre o relato vftfbal e evenioá privados podo scrcncontrada c n Cunha & ôorlolí (2005)
* A paJavra deser open ho nesse caso t.;jti lizad a com o sinônimo de rentíime nto, atu ação o u performance. tenu os com uns ao ja rgão
esportivo.

Sobre Comportamento e Cognição 4 2 9


pio. quando um jogador oe beisebol freqüentemente xinga o juiz e joga longe o
bastão, quando uma jovem jogadora de futebol freqüentemente agarra a bola com
as mãos, ou quando um jogador sempre tem pensamentos negativos (ex.: 'se eu
errar esta, vou perder”) logo antes de jogadas importantes.
Em so tratando de intervenção comportameníal. um dos concoitos utiliza­
dos na área do esporte c o que G uilhardi (2004) classificou como reservas
comportamentais. Tais reservas são comportamentos não problemáticos, ou seja,
o que o sujeito faz de melhor, seus comportamentos sociais adequados, seus talen­
tos especiais, mais precisamente, o conteúdo de experiências de vida que pode ser
u tiliz a d o para um program a de tra b a ih o pr omi ssor . São essas reservas
comportamentais que o psicólogo do esporte deve estar atento, identificando-as e
estabelecendo maneiras de reforçá-las, como numa modelagem, citada por Martin
(2001). visando ensinar indivíduos comportamentos ainda não presentes em seu
repertório, a partir da identificação de um comportamento final desejado, a identifica­
ção de um comportamento inicial emitido pelo indivíduo (reserva comportamentaí) e
a partir daí reforçar aproximações sucessivas, do comportamento iniciai ao compor­
tamento final desejado.
Outro conceito a ser ressaltado (e bastante utilizado), é o de condiciona­
mento respondente, no qual procura-se fazer um pareamento de estímulos neutros
com estímulos incondicionados, com o intuito de produzir respostas similares àque­
las eliciadas pelos estímulos incondicionados, a partir de um estímulo classificado
agora como condicionado (e anteriormente neutro). Esse tipo de condicionamento
pode ser relevante, quando se busca eliciar determinadas emoções durante um
jogo, ou mesmo para eliminar certas emoções indesejadas, a partir de um procedi­
mento inverso (contracondicionamento).

Metodologia
Os dados foram coietados a partir da observação direta dos treinamentos e
jogos da equipe de basquetebol Centro de Treinamento Arremessando para o Futu­
ro (CETAF). em Vila Velha, ES. Esse tipo de prática é importante ao passo que ela
procede á observação de fatos e fenômenos exatamente como ocorrem no reaí, à
coleta de dados referentes aos mesmos e, finalmente, à análise e interpretação
desses dados, com base em uma fundamentação teórica consistente, objetivando
compreender e expiicar o problema pesquisado.
Além dessas observações, foram coletadas informações estatísticas do
desempenho da equipe CETAF no campeonato brasileiro de basquetebol na cate­
goria adulto, nos anos de 2006-7 e 2007-8, para servirem como elemento compara­
tivo entre seu desempenho antes e depois da intervenção psicológica. Os dados
contemplados foram os núrneros de vitórias e derrotas, a percentagem dos mes­
mos e o desempenho da equipe dentro e fora de casa. Essas informações foram
obtidas através do site da Confederação Brasileira de Basquetebol (CBB), respon­
sável pela organização do campeonato e pelas estatísticas dos jogos.
As intervenções em campo consistiram em registros sistemáticos acerca
do comportamento dos integrantes do time durante seus jogos. Os registros foram
subdivididos em: registro minuto ~ a - minuto, no qual foi registrada a pontuação da
equipe e do seu adversário, buscando identificar em quais momentos a equipe do
CETAF e adversários apresentaram aumento na pontuação e em quais situações
esse aumento cessava; registro de erros e acertos dos arremessos à cesta: no qual

4 3 0 Luciano de S'ousa Cunha,- Filipe M oreira Vasconcelos. Paola Porto Câmara dc Freitas; Paula
Nunes l.in ií e Renan C/rilo de A lm eida
computou-se o quanto cada jogador acertou e errou durante as partidas; registro do
comportamento do técnico, investigando se ele consequenciava de maneira ade
quada ou não cada jogador e: por fim, o registro de feedback entre os jogadores, uns
para com os outros, buscando identificar situações conflituosas entre os mesmos.
Os registros acima foram todos computados, analisados e repassados
para a equipe em reuniões programadas. Cada registro era apresentado isolada
mente, requisitando aos jogadores que interpretassem os dados e fizessem apon­
tamentos sobre do que deveria ser mudado para o próximo jogo. Esses registros
também possibilitaram reflexões sobre como o time se organizava em quadra, corno
o relacionamento interpessoal dos membros da equipe se desenvolvia e quais
eram as expectativas de cada jogador para os próximos jogos do campeonato.

Resultados
A primeira reunião foi marcada por uma tentativa de definição de objetivos
individuais e coletivos, a partir de diretrizes para o estabelecimento eficaz de objetivos,
sugeridas por Martin (2001). O autor cita que um objetivo descreve um nível de
desempenho em direção ao qual um indivíduo ou um grupo deve trabalhar.
Entre as diretrizes citadas por Martin (2001), pode-se destacar: objetivos
específicos são mais eficientes do que objetivos vagos; objetivos relacionados ao
aprendizado de habilidades especificas devem incluir criténos de proficiência (rotei­
ro de atividades); objetivos devem identificar as circunstâncias em que o comporta­
mento deve ocorrer; objetivos realistas e desafiadores são mais eficientes do que
objetivos do tipo: “faça o melhor que puder”; objetivos públicos geralmente são mais
eficazes do que objetivos privados; o estabelecimento de objetivos é mais eficaz
quando estão incluídos prazos; o estabelecimento de objetivos com feedback é
mais eficaz do que o estabelecimento de objetivos apenas; o estabelecimento de
objetivos é mais eficaz quando os indivíduos se comprometem com esses objetivos.
Oesta forma, o objetivo estabelecido pela equipe era se classificar para os
Playoffs do Campeonato Nacional, o que significava se classificar em oitavo lugar, o
que nunca havia acontecido na história da equipe, se configurando como um objetivo
que não estava além da capacidade atual dos jogadores, dado seu desempenho
nos treinos e em alguns jogos.
Além desses objetivos, após algumas reuniões com o técnico e com os
atletas da equipe CETAF, observou-se o cumprimento das metas estabelecidas no
início das intervenções, onde os jogadores foram requisitados a apresentar feedback
positivo durante os jogos para com seus companheiros. As observações apontaram
que os jogadores passaram a conseqüenciar com maior freqüência os comporta­
mentos adequados de seus companheiros, sendo importante ressaltar que alguns
apresentavam feedback mais freqüentemente que outros. Esse dado demonstrou
uma assimilação apropriada para com as atividades propostas pela psicologia, no
entanto em uma freqüência ainda abaixo da esperada.
Nas reuniões, pode-se observar também os efeitos importantes que a apre­
sentação dos gráficos de registro minuto - a - minuto provocaram nos integrantes
da equipe, inclusive no comportamento do técnico. Através desses gráficos, de-
monstrou-se que a equipe CETAF apresentava sérias dificuldades ein aumentar
sua pontuação no terceiro quarto, momento do jogo que procedia a volta do vestiário.
Após a interpretação desse dado, levou-se para o técnico que, possivelmente, o que
ocorria durante as conversas no vestiário produzia um efeito negativo no desempe­

Sobre Comportamento e Cognição 4 3 1


nho da equipe, o que era observado pela incidência de períodos durante o terceiro
quarto do jogo em que os jogadores não pontuavam. !nferiu-se, no entanto, que
alguma mudança foi realizada, pelo fato de que a equipe passou a pontuar mais
durante esse período do jogo, se levado em consideração o rendimento nos jogos
anteriores, o que pode também ser explicado pelo que será exposto logo a seguir.
Durante o período de intervenção, o técnico da equipe concedeu a equipe
da psicologia a possibilidade de realizar as preleções dos jogos, ou seja, nos minu­
tos anteriores a cada partida, a equipe CETAF se reunia com a equipe da psicologia.
Para essas reuniões, eram preparados vídeos contendo as fotos de cada jogador
da equipe, seguida de mensagens de incentivo escritas pela própria equipe da
psicologia ou por seus familiares. Além disso, a música que acompanhava a apre­
sentação do vídeo era tocada durante os intervalos de cada quarto do jogo, com a
função de manter os jogadores focados na partida, elevando assim, seu grau de
concentração e motivação, a partir do paradigma do condicionamento respondente,
citado anteriormente. As músicas, antes estímulos neutros, passaram a ser estímu­
los condicionados, com a função de eficiar respondentes similares aos eliciados
pela exibição dos vídeos. A fala de um dos jogadores após a partida, durante uma
reunião para feedback deve ser citada: "Eu falei com todo mundo... olha a música...
concentra... olha a música (sic)".
Outro ponto importante a se ressaltar é a contratação de um preparador
físico pela equipe. Acredita-se que a contratação desse profissional, que ainda não
existia como parte integrante da comissão técnica do CETAF, resultou do aponta­
mento dado pelos integrantes da psicologia que realizou os trabalhos no período de
Junho de 2006 à Maio de 2007, através de um relatório, acerca da necessidade de
um profissional dessa área para acompanhar a condição física dos atletas.
Além dessas intervenções, foi apontado para o técnico que a organização
da tabela de jogos do CETAF poderia ter prejudicado o rendimento da equipe, dado
que os cinco primeiros jogos na temporada 2006-7 foram realizados fora de casa,
contra equipes teoricamente mais fortes para a disputa do titulo de campeão, Isso
resultou em um início de temporada com sete derrotas, o que provavelmente pode
ter produzido uma desmotivação na disputa das partidas seguintes. Para a tempo­
rada 2007-8. tal fato não se repetiu, e os resultados foram mais satisfatórios, como
pode ser observado nas tabeias a seguir.
Ao analisarmos a participação da equipe do CETAF no campeonato nacio­
nal de 2007, ano anterior a intervenção comportamental, pode-se registrar sua
classificação em décimo primeiro lugar (11°), salientando que o torneio contava
com a participação de 13 equipes. Num total de 23 jogos disputados, o time do
CETAF venceu 6 jogos e perdeu 17, tendo um total de 1.507 pontos a seu favor, e
1.694 contra. Dos 6 jogos que a equipe venceu, 5 foram em casa e apenas 1 fora,
enquanto que das 17 derrotas, 7 foram em casa e 10 foram fora de casa.
Já no ano de 2008, o qual as intervenções comportamentais começaram, a
mesma equipe obteve sua colocação em oitavo lugar (8°), classificando-se para os
playoffs, sendo que 12 equipes participaram do torneio. Em 22 jogos disputados, a
equipe venceu 9 e perdeu 13 vezes, marcando 1.694 pontos e sofrendo 1.754. Dos
9 jogos que a equipe venceu, 6 foram em casa e 3 foram fora, enquanto que das 13
derrotas. 5 foram em casa e 8 foram fora de casa.
A percentagem de aproveitamento dos jogos da equipe CETAF no tomeio do
ano de 2007 foi de 26,6%, sendo que no ano de 2008 sua percentagem subiu para

4 3 2 1 uciatio de Sousa Cunha,- Filipe M oreira Vasconcelos,. Paola Porto Câmara de Freilas,- Pauia
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Sobre Comportamento e Cognição 4 3 3


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40.9%. Enquanto em 2007 sua media de pontos próprios por jogo era de 65,5
pontos, em 2008 essa média subiu para 77 pontos por partida. No entanto, a módia
de pontos sofridos pelo CETAF em 2007 foi de 77 pontos, e essa média subiu para
79.7 pontos por partida no ano de 2008.
Na figura abaixo seguem comparados os resultados obtidos polo CETAF no
Campeonato Nacional nos anos de 2007 e 2008, contemplando o número de Vitóri­
as e Derrotas dentro e fora de casa. a percentagem de Aproveitamento dos Jogos e
a média de pontos próprios e contras apresentados pela equipe no torneio em cada
ano.

Figura 1 - Estatísticas Gerais do CETAF duran:e o Campeonato Nacional de Basquetebol 2007 e 2008

Considerações Finais
Através do relato de experiência apontado acima, pode-se concluir que a
Análise do Comportamento tem apresentado ferramentas importantes a serem apli­
cadas no contexto esportivo. Sua ênfase dada à relação funcional entre o comporta­
mento c o ambiente possibilita um modelo de intervenção que favorece a investiga­
ção de fatores externos que possam estar dificultando o bom desenvolvimento dos
atletas e, conseqüentemente, de suas respectivas equipes, assim como eventos
privados e seus efeitos sobre o próprio sujeito.
Não se pretende, no entanto, atribuir os resultados apenas ao trabalho da
Psicologia, à medida que outras variáveis podem ser identificadas para explicar a
melhora de rendimento da equipe, como: contratação de jogadores; aumento de
verbas de patrocínio, fundamentais para o investimento em equipamentos, estrutu­
ra. uniformes, viagens, salários, membros para comissão técnica; a qualidade das
equipes adversárias; organização do calendário (feita pela CBB); situação familiar,
entre outras.
Assim, no contexto esportivo, pode-se citar aspectos relevantes para uma
abordagem com porta mental: técnicas e procedimentos de tratamento são formas
de reorganizar o ambiente de um indivíduo: dá-se grande importância à psicologia
da aprendizagem em geral e aos princípios do condicionamento operante e pavloviano
em particular; utiliza-se dos mesmos princípios para mudar e promover modifica-

Sobre Comportamento e Cognição 435


ções cognitivas; dá-se grande valor à responsabilidade de todos os envolvidos no
planejamento, implementação e avaliação de um programa de psicologia do espor­
te; obtém-se validação social através de mensuração e feedback pelos integrantes
de uma equipe.
Os dados apresentados pennitem afirmar que a prática esportiva pode se
b e n e ficia r d ire ta m e n te do conhecim ento sobre P sicologia, em um enfoque
Comportamental, a partir de intervenções que visam trabalhar os relacionamentos
interpessoais, a motivação e a emoção, que certamente são fatores importantes
que estão presentes em qualquer modalidade esportiva.

Referências

Confederação Brasileira de Basketbai. Recuperado em 31 mai. 2008: httn://www, cbb.com. br/

Coutinho, N. F. (2001). Basquetebol na escola Rio de Janeiro: Sprint.

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Enumo & M. Ribeiro (Orgs.) A nálise do Comportamento: Teorias e Práticas, (pp 47-57). Santo
André: ESETec.

Guilhardi, H. J (2004). Terapia por contingências de reíorçamento. In Abreu, C. N. & Guilhardi, H.


J. Terapia com portam ental e cognitivo-com portam entai - Práticas clinicas, (pp. 3-40), São
Paulo. SP: Roca.

Martin, G. (2003). Consultoria em Psicologia do Esporte: Orientações práticas em análise do


comportamento Campinas, SP: Instituto de Análise do Comportamento

Weinberg, R. S. & Gouíd, D (2006). Fundamentos da psicologia do esporte e do exercício.


2.ed., Porto Alegre, RS: Artmed Editora.

Luciano de Sousa C.imhd; Filipe M oreira Vasconcelos; Paola Porto Câmara dc Freiías, Paula
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ções cognitivas: dá-se grande valor à responsabilidade de todos os envolvidos no
planejamento, implementação e avaliação de um programa de psicologia do espor­
te; obtém-se validação social através de mensuração e feedback pelos integrantes
de uma equipe.
Os dados apresentados permitem afirmar que a prática esportiva pode se
be ne ficiar dire ta m e n te do con he cim en to sobre P sicologia, em um enfoque
Comportamental, a partir de intervenções que visam trabalhar os relacionamentos
interpessoais, a motivação e a emoção, que certamente são fatores importantes
que estão presentes em qualquer modalidade esportiva.

Referências

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Guilhardi, H. J (2004). Terapia por contingências de reforçamento. In Abreu, C. N. & Guilhardi, H


J. Terapia com portam ental e cognitivo-comportam ental - Práticas clínicas (pp, 3-40). São
Paulo, SP: Roca.

Martin, G. (2003). Consultoria em Psicologia do Esporte: Orientações práticas em análise do


comportamento Campinas, SP: Instituto de Análise do Comportamento

Weinberg, R. S. & Gould. D. (2006). Fundamentos da psicologia do esporte e do exercício.


2.ed., Porto Alegre, RS: Arímed Editora.

Luciano de Sousa Cunha,- Filipe M oreira Vasconcelos,- Paola Porto Câmara de Freitas,- Paula
Nunes Lima e Renan C/rílo de A lm eida

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