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20 ANTONIO LANCETTI Nao iriamos utilizar nenhum dos dispositivos conhecidi como consulta psiquidtrica, psicolégica ou visita domiciliar. Essa opsao tinha o intuito de evitar, pela raiz, 0 processo de tratamento da demanda que acaba na cronificagao dos pacien- tes e dos proprios recursos terapéuticos. Comesariamos capacitando as equipes de satide mental e as de satide da familia intervindo nas familias em maior dificul- dade. A responsabilidade pelo andamento do processo tera- péutico recairia em ambas as equipes. Iniciamos propositadamente sem psiquiatra. A idéia era evitar desaida o proceso de geracio de demanda, que comega na consulta e termina no hospicio. Convencemos a tinica psicéloga locada em uma unidade de satide de Sapopemba, uma assistente social e as duas psicslo- {gas que faziam psicoterapia individual, cada uma numa uni- dade da zona norte, a participarem do novo trabalho. Depois de umas poucas reuniées, fomos a campo. OS PRIMEIROS PASSOS DADOS NO TERRITORIO Organizamos a capacitagao inicial com os agentes comunita- rios de satide. Em todas as unidades ocozreram trés reunides intensivas de trés horas cada ume. Na primeiza era feito um sociodrama. Depois de um aquecimento, as pessoas cons- traiam dramaticamente uma familia que tivesse problemas que considerassem ser de satide mental, as visitavam e as ajudavam. Nas cenas, ji passévamos as primeiras e principais nogdes de postura. Fazfamos e refaziamosas visitas e implicavamos a todos nas possiveis solugSes que os agentes comunitarios de savide encontravam, para inaugurar um vinculo que iria ser 0 fio condutor do processo terapéutico. No final desse primeiro encontro entregavamos um guia de saiide mental, uma espécie de manval que se propunha a SAUDE MENTAL NAS ENTRANHAS DA METROPOLE 21 orientar posturas, fortalecer a nogao de equipe e transmitir as idéias principais. Tudo isso com o objetivo de habilité-los para operarem futuramente como amigos qualificades.? No segundo encontro, processévamos as cenas acont na primeira reuniao, ¢ as relacionévamos com o texto. No terceiro encontro, os agentes apresentavam as familias que consideravam mais probleméticas. Posteriormente, esco- lnjamos quais seriam as primeiras nas quais irfamos intervir. O guia era o seguinte: jas Guta De SAUDE Menrat po Acente Conmunirénio ve Saupe miTRODUGAO. Tradicionalmente, a Psiqulatria acuava nas fa sofrimento mental retirando os membros mais frdgels e recolhen- do-os em hospicios, sanatorios ou hospitals psiquiitricos. Em alguns desses estabelecimentos, os familiares eram impedi- dos de ver o interno durante os primeiros dias e até meses de internagio. Essa maneira de tratar os doentes mentais, além de cirar os direitos de cidadania dessas pessoas — pols na condicio de doentes nio podem administrar seus bens nem exercer ne- nhum direito —, mostrou-se produtora de doeng2, ¢ nio de saide. De fato, os velhos manicémios encontram-se lotados de homens e mulheres que a cada dia estdo menos habilitados para vida. . Quelquer um de nés que passasse uma curta temporada viven- do num desses lugares sairia de li mais angustindo e desagregado do que antes de entrar. com maior to deamigo qualiicado, que deurorigem’ profs n ANTONIO LANCETTI © psiquiatra e psicanalista Pichén Riviére, estudando familias de pacientes psiquidcricos, descobriu que essas pessoas so os membros mais fortes — e nio os mais frigeis — pois sto depositirios da loucura de todos os outros familiares. E por isso que todos os programas de reabilitagao desses doentes mentais so obrigados a trabalhar com a familia, com a vida social profissional. A velha psiquiatria pretendia ajudar a familia retirando seus membros mais adoentados ou destoantes do convivio familiar e comunitati © Programa de Sade Mental do Projeto Qu: retirar 0 membro mai poe-se a ajudara fa necessitados. Esta 6 a primeira idéta que norceia o Programa de Setide Mental do Qualis: tratar © grupo familiar para que este posse lidar de maneira mais salutar com seu membro mais doente. Endo retirar em vez de para que esta ajude seus membros mais A segunda é que a responsabllidade pelo cuidado dessas familios 4 da equipe de sate da familia e dz equipe de satide mental. ‘A terceira é que sera dada prioridade as familias que se encon- tram em maior diffculdade. ‘A quarta é que, quando a equipe de saiide mental incervém, elabora uma programacio para cada familia, Esse programa & monitorado, isto &, acompanhado paso a passo, la adia, semana a semana, més a més. ‘A equipe de saiide mental & volante, nic esté locada em nenhuma das unidades do Projeto Quilis e sempre atua em parceria com as equipes de sade de famflia, Nzo esti prevista consulta psiquigtrica nem consulta psicologica. Por iltimo, a quinta idéia que norteia © Programa de Saiide Mental do Qualis @ que as familias serao atendidas preferen- cialmente na hora em que todos ou a maloria dos familiares cestejam em casa. Em muitas oportunidades vamos ao encontro de surpreso. A estratégia de aproximagio sera sempre decidida pre- SAUDE MENTAL NAS ENTRANHAS DA METROPOLE 23 viamente pelas equipes de satide da familia e de saide mental, mesmo nos casos de emergéncia.. SEIS ATITUDES DO AGENTE COMUNITARIO DE SAUDE 1. Consideramos famtia todo grupo de pessoas que coabitam e desenvolvem entre si as mois variados formas de porentesco. Este é 0 conceito de familia com o qual trabalhamos. Todos cemos uma idéia de familia que aprendemos convivendo com nossa fami Porém, no trabalho, encontramos os mals variados tipos de grupos familiares. 2. Suspenséo proviséria da opiniéo. Toda pessoa possui uma teoria para compreender a vida e, diante do desespero, cende a ajudara outra sugerindo que faga 0 que ela faria. Todas as pessoas tém crengas e praticam religides: codas devem ser aceltas. Deve- mos procurar nos relacionar sem dar conselhos Todas as pessoas, loucas ou nio, mantém um dilogo com um interlocutor invisivel e a mancira que escolheremos para incervir rnesse diilogo é algo muito delicado e seri resolvido na discussio de casos que ocorreram sistematicamente entre as equipes. 3. 0 agente comunitério de satide é membro de uma equipe. E ‘comum que o agente comunitirio de satide se encontre diante ce problemas de dificil solugao. A toda hora deve lembrar que ele pode escutar, conhecer, relacionar-se, mas que nao precisa dar respostas imediatas, pois ele faz parte de um grupo de trabalho que verd como pode ajudar. 4, Prestar atencdo ao grupo familiar todo, Quando ha um louco, um drogado ou um violentado numa familia tende-se a observer somente esse membro do grupo. Nosso paciente é 9 fomilia toda. E fundamental olhar para todos e para a maneira como se tratam entre si. € fundamental evitar os problemas causados por n3o observar uma pessoa com graves problemas de satide, como doengas cardiovasculares, por exemplo. ialmente. 24 ANTONIO LANCETTI S.A programasio elaborada para cada famfia deve ser seguide basso a passo, com maior zelo. Muitas das pessoas que atendemo estiveram por um periodo de sua vida internados em hospit Psiquiatricos ou na Febem. Nesses lugares, elas acostumaram-se a ndo serem levadas a sério. Algumas so muito desconfiadas ov estabelecem relagdes extremamente {régeis com os outros, Quando tragamos um plano ou prometemos passar em algum dia e hora combinados, para acompanhar alguém ao grupo de caminhada, @ escols, para levar uma medicagio, marcar ume consulta, etc., devemos ser muito cuidadosos no cumprimento da palavra, Uma minima falha pode ser grave e pér do a perder. 6. O agente comunitério, assim como todos profissionais que trabalham no Projeto QualisiPSF, é um agente de sade. Por essa Fazio, ele buscard ajudar 2 todos independentemence do credo que a pessoa professe e do que ela faz para sobreviver. Nunca fizemos dentincia a policia, pois nosso objetivo 6 cuidar da sade de todos, sejam traficantes de drogas ou policisis, Somente dessa maneira, conquistaremos 0 respeito e a confianga de toda 2 comunidade, QUATRO APRENDIZADOS PARA Con I. Aprender a ndo se agredi 2. Aprender a cuidar de si. 3. Aprender a dor valor ds reatzacées e saberes coletivos. 4. Aprender a conhecer e cceitor as pessoas da maneira como eles so. Esses aprendizados para convivencia, aparentemente simples, sio nortes de nossa ago de sade e de satide mental. Eles foram inspirados num escrito de um educador colombiano chamado José Bernardo Toro.!* Como agentes de saide optamos pela vida e esta opsio fundamento de nossa ética. SAUDE MENTAL NAS ENTRANHAS DA METROPOLE 25 AS PRIMEIRAS INTERVENCOES Durante as primeiras reunides de capacitagao, uma agente comunitéria de satide contou que, ao cheger pela primeira vez a umbarraco da favela do Boi Malhado, no bairro de Vila Nova Cachoeirinha, onde Joao morava sozinho, estabeleceu-se o s2- guinte didlogo: — Eu vou lhe responder o questionario mas, antes, quero passar no banheiro. Vocé nao quer ir ao banheiro comigo? — perguntou Joio. — Nao! Vou Ihe esperar aqui. Esteja a vontade que eu the aguardo— respondia a agente. ‘Ohomem saiu dobanheiro de disse: — Agora, pode comegar. Ela tinha acabado de ler o guia de satide mental e af dizia que deveria aceitar as pessoas como elas sio mas 0 preceito nao diminufa a sua perplexidade. Dias depois, Joao" buscou a agente na unidade de satide para the dizer que j& nao suportava mais a sua situagao. Ele jé tinha percorrido diversos hospitais e servigos de saiide e nin- guém resolvia seu problema, Ele queria tirar 0 pénis, pois afirmava que este nao lhe servia para nada. E se, em dois meses, ele nao conseguisse realizar a cinurgia, iria suicidar-se. Umna tarde, fomos & casa de Joso com a agente comunitéria ¢ uma psicéloga da equipe. Fle nos contou novamenie que 0 que tinhaentreas pernag nao lhe servia paranadae que queria o“berimbau”. Sua fala reiterativa dificullava a compreensi ia, peruca, batom passadoe 26 ANTONIO LANCETTI O trejeito homossexual misturava-se aos tragos de deficiéncia mental. Isolado dos varios irmaos e da irma, Jogo nfo se dava com ninguém da favela e nao tinha relagdes sexuais hé anos. O tinico amigo era um travesti do centro da cidade, que também © aconselhava a no fazer a operagao. Somente apés entender que Joao estava em pleno isolamen- toe com muitos questionamentos acerca da anguistia, lhe disse: —Ja sei o que lhe acontece. E que vocé tem corpo de homem e alma de mulher —, disse a ele. Pela primeira vez Joao parou de falar e se dispds a escutar. —Mes mulher que se preze nao vive num barraco sujo desse jeito. Veja como esta seu fogao... Se vocé quiser fazer parte do Programa de Satide Mental nés vamos lhe propor uma manei- rade lhe ajudar, pois sabemos que esta sofrendo. Em primeiro lugar, vamos Ihe dar duas semanas para que vocé possa arra- mar seu barraco cotio uma mulher arrumaria, Vamos voltar em quinze dias e ver como é que vocé esté cuidando de sua casa. Em segundo lugar, voce esta tZ0 preocupado com 0 “berimbau” que nao cuida de sua satide. A Dada (agente) vai :marcar uma consulta médica e passaré por aqui para lhe avisar quando sera. Por tiltimo, vamos lhe convidar para ir ao posto duas vezes por semana, para que vocé fazer caminhadas junto com o grupo de hipertensos — sugeri. O clima tinha mudado, Joao estava vinculado e aceitou nossa proposta com confortoafetivo. Comecou a participar das caminhadas ¢ exatamente quinze dias depois fomos a sua casa novamente. O barraco estava um brinco. O fogio, antes engordurado, completamente limpo. As panelas brilhavam. Os méveis fo- ram mudados de lugar e, agora, havia uma poltrona onde nos sentamos para continuar o didlogo. Para completar nossa sur presa, um pequeno buqué de flores decorava a foto de Celso Pitta na parede. SAUDE MENTAL NAS ENTRANHAS DA METROPOLE Nao conseguindo segurar minha curiosidade, pergunt Joao pela fotografia. Ele respondeu que “Celso Pitta & grande prefeito”. Contente, pensei que tinha finalmente encontrado alguma figura identificatoria. “Tempos depois, Joao disse no grupo da Unidade que iriasair dele, pois tinha arrumado um trabalho de jardineiro. Mas nao queria deixar de se despedir das pessoas. eee Oprimeiro caso queatendemos no Parque Sio Lucas foi oda familia Coleggi: Dona Fenicia morava com 0 neto Alfredo numa casa de classe média do bairro, Af, o neto tinha instalaco um “Centro de Convivéncia’, espécie de sebo onde alguns jovens se reuniam para jogar sinuca e beber cerveja. Regina Aparecida Lemos Valarini, agente comunitaria, nao conseguia cadastrar a familia, pois o neto tinha viajado ha dias e deixado a av6 trancafiada e sem comida. Os vizinhos achavam que nessa casa se praticavam rituais satanicos e ameagavam cha- mara policia. Na avenida onde fica a casa dos Coleggi passam muitos carros.¢ caminhées. O portio de grades da garagem estava fechado com chave. Do portdo, dava para apreciar as estantes de livros usados e os discos de vinil velhos misturados com as carrancas, as miscaras, as inscrig6es e a mesa de bilhar. No fundo do saléo havia uma porta metalica com uma janela também de grades. Daf, apareceu dona Fenicia, com cabelos brancos ericaiios, um rosto belo, pele clara. Os olhos azulclaros pareciam estar conectados a algum cosmos, fitl- guranies. —Ele foi embora para Santos — disse e virou de lado para conversar com os espiritos. Perguntei com quem conversavi. — 0 grande Java. Todos tm capo. Todos sao unigente. 28 ANTONIO LANCETTI Parece um chafariz. Todas as coisas sio feitas de semente de gente. Matam muilas pessoas para fazerem, hum! Aquela copa bonita que voces t8m Id também ¢ feita de semente de gente, humm! Eu sou a mae de todos. Tenho dois ventres, de um gerei minha mie e Jesus Cristo, JA pari varios Jesus Cristos... —di- zia ela. E passow 0 primeiro caminhao. Que raiva! Nao conseguia ouvir direito dona Fenfcia, que continuava conversando com 0s espiritos. Entre caminhdo e caminhio, acompanhévamos como podiamos. Fla fechou os olhiose disse que Regina era um passaro, Vera era outro péssaro e eu, um gato. Lisonjeado, senti que havia- mos avangado bastanie e continuei o diflogo como pude. Cer- ca de noventa por cento de conversa era com os deuses que a acompanhavam e a quem havia engendrado. Em meio a esse discurso, por algumas referéncias mundanas, ficamos sabendo que o neto lhe pegava o dinheiro da pensio. Prometemos voltar no dia seguinte, Despedimo-nos com a promessa de ajudé-la e fomos conversar coma vizinha do lado. Ela se prontificou a passar alimentos por cima do muro e a procurara filha de Dona Fenicia. A filha néo tinha telefone, ea vizinha no sabia o nome nem o niimero da rua, mas sabia chegar la. Por meio dos vizinhos, conseguimos identificar nao s6 a filha (também psicotica) mas também o irmao de Dona Fenicia, ‘que posteriormente ajudou muito no proceso terapéutico. Contatamos também um promotor de justia de um setor recentemente inaugurado do Ministério Piiblico dedicado a pessoas deficientes e de terceira idade. A tudo custo, tentamos evitar a intervengio da policia. A agente comunitéria passava duas vezes por dia para apoiar a alimentagio que era passada pela vizinha e saber quando chegaria Alberto, o neto. ‘Tres dias depois, chegou Alberto. A situagio era tensa, pois ele tinha brigado com varios vizinhos e nossa presenga tinha SAUDE MENTAL NAS ENTRANHAS DA METROPOLE B aumentado a ira pela prisio domiciliar de dona Fen diziam que ela devia estar com alguma infec¢ao vaginal softia maus-tratos doneto. Dei a mao a Alberto e disse que era da equipe de satide mental do Qualis, que jé tinhamos conversado com a sua avi 2 que gostarfamos de conhecer a familia. —Da Rota da Satide Mental? — ele perguatou. —Isso mesmo! — disse, contendo meus pensamentos sobre © problema do tremendo poder que se exerce 2o intervir no espaco familiar, e comas lembrancas do texto de Deleuze sobre a sociedade de controle. Alberto foi mostrando os livros e falando do valor de tecos 0s objetos que possufa, e 0 didlogo foi nascendo. — Veja. Nés lhe propomos uma negociagao. Evidentemente, voces tém muitos problemas e nés podemos ajudar mas é preciso cuidar da sua avd. Ela precisa ir ao posto de satide, e vocé também. — Gostei da palavra negociagao — disse, e desandou a falar da loucura da av6. — Queremos conversar com os dois. Alberto abriu a porta entortada com um pontapé. Dona Fenfcia apareceu e disse que ele era um invasor: “o meu neto tem olhos azuis”, os dele sao verdes. “E um impostor. Sao mais de mil por dia que dao entrada neste moleque, tem que saber qual € 0 som, para ver se da para conversar, hum.” Alberto ficavaenfurecido quando ouvia ahistéria do impos- tore comecou a gritar com sua av6, Fomos acolhedores quanto a0 desespero de Alberto e combinamos uma ida dos dois ao postode saide, Fenicia continuava fechando os olhos e nos introduzindo em seu discurso abundante: de novo os passaros e 0 gato e ji estdvamos navegando na transferéncia. Acordamos com Marcio Ghiu, médico de familia, que iria atendé-la quando pudéssemos levé-la & unidade de satide. 30 ANTONIO LANCETTI Numa manha, chegamos como combinado. Dona Fenicia aceitou relutante, pois ela nfo precisava de médico, como toda pessoa que conversa com Deus. Vestiu um turbante e saiu conosco para o ambulat6rio do Jardim Guairacé. Marcio, que atendia seu primeirissimo caso, abriua porta do consult6rio e Dona Fenicia, logo apés cumprimenté-Io, levan- touas longas saias e tirou uma face que guardava na calcinha, Fez varios movimentos em cruz aindando pelo consultério e depois de matar todos os maus espiritos entregou a faca e disse: agora pode me examinar. Nao constatando nenhuma das suspeitas dos vizinhos, 0 médico pediu alguns exames de rotina e marcou retorno. De- pois entrou Alberto para consulta e fez um vinculo de confian- ¢@, contou-lhe que fumava maconha eo convidou para fumar um depois do trabalho, Ele agradeceu 0 convite e ressaltou a necessidade de a avd exercer seu direito de ire vir. Lembrou o programa que tinha- mos tragado, que incluia visitas e passeios com a psicéloga Vera e com a agente comunitéria Regina. Tudo foi desenvolvendo-se com algumas resisténcias de Alberto até que dona Fenicia nos mostrou o desastreem que se encontravaa casa. As tomeiras das pias sem 4guae o banheiro fedendo. Alberto tinha contratado um vizinho que era pedrei- 10, que moraya ao lado, para arrumar 0 esgoto mas brigaram e no meio do trabalho o homem abandonou o servigo, deixando © esgoto aberto. ia disse que se nao arrumassem a casa ndo iria participar mais do programa. Diante dessa reivindicagao e do desastre sanitario nos propusemos a fazer uma reforma no domicilio e organizamos uma jornada que denominamos de “ajutério”. Previamente fomos & casa do pedreiro. Escutamos a familia de evangélicos assustada com o movimento e as atitudes ex- céntricas de Alberto. Dissemos, entre outras coisas, que eles interpretavam erroneamente os ensinamentos de Jesus de Na- SAUDE MENTAL NAS ENTRANHAS DA METROPOLE 31 zaré, que qualquer um podia perdoar. Depois de nossa saida, o homem foi 4 rua, deu a mao a Alberto em sinal de paz e se disp6s a cooperar. Com 0 apoio dos arte-educadores, de varios usuarios, que j participavam do Programa de Satide Mental, e de Alberto fizemos um mutirao. Conseguimos, assim, arrumar 0 esgoto, & porta que impedia a livre circulagao, algumas telhas e ainda fizemos chaves para todas as fechaduras da casa de dona Fenicia. Os passeios continuaram mas um dia dona Fenicia propds mudar o percurso e visitar uma amiga que nao via hé mais de dez anos. Com o tempo, conseguiu cuidar de suas contas fazer suas compras. As equipes conseguiram marcar reuniées de familia com a filha e 0 irmao de Dona Fenicia; este financiou mais uma reforma. Depois de varias tentativas malsucedidas de incluir Alberto em oficinas de educagao earte, ele comegou a ir com freqiiéncia casa do pai, no litoral, e acabamos perdendo contato. ete Chegamos casa de Fabiana com cautela. Diziam que era uma bocada de crack. Alexandre Miguel e Andréa dos Santos respectivamente médico e enfermeira de familia, troca- rama agente comunitaria, pois a agente que cuidava da area anteriormente era muito religiosa. Angela Campos, agente que passou a atender a familia, conhecia melhor Fabiana e Marco Anténio. Sabjamos, também, que ha pouco Fal tinha provocado um aborto com Citotec, no hospital da Ca- choeirinha, Além do casal morava na casa Claudia, filha deles, de dez anos. Acasa era da mie e da tia de Fabiana. Dona Maria, a mie, 32 ANTONIO LANCETTI softia de cancer de ovério e estava em estado terminal. A tia, dona Margarida, padecia de artiose degenerativa e de outras complicagées. Flas moravam na casa com uma irma de Fabiana e seu filho de onze anos. Porém cansadas do caos em que se havia trans- formado a vida da familia, mudaram-se para outro domicilio, Segundo a vizinhanga, elas tinham sido expulsas e, de fato, Marco Anténio vendeu todos os méveis da casa para comprar cocaina e crack, Era meio-dia ¢ eles jAestavam acordados. Angela ja me tinha alertado que Fabiana nio iria querer conversar conosco se Marco AntGnio estivesse presente. Fomos descendo as escadas — era uma casa construida abaixo do nfvel da rua, Fabiana demorou uns minutos para aparecer desarrumada, magrissima, suja e com o abdémen alarmantemente inflamado. Minutes depois, apareceu Marco Antonio, Ummulato forte, sorridente e confuso. Olhou-me fulminante. Sustentei firme seu olhar e 0 convidei para converser. Ele disse que nao pode ria naquele momento, pois teria de trabalhar. E foi fazer carre: tos, usando para isso um carrinho de mao. ‘Antes de passar pela portinhola que dava acesso A rua, virou-se de costas ¢ disse-me: —Cuide bem dela, doutor. Fra agosto de 1998. © Brasil acordava da ressaca da final Copa do Mundo: Franca 3x Brasil 0. Fabiana derramou ligrimas dilacerantes e disse: —0 Marco Antonio jé venden todo o que tinha, até o bujao de gis e a caixa-d’agua, Ele fica queimando pedra e se mete embaixo da cama porque diz que esta passando o exército do outro lado do muro. Mete-se embaixo da cama, fica olhando revistas de sacanagem e me obriga a transar. Ele nao pode saber que estou com aids porque me mata. Perdi tudo. Minha filha, que mora em Santos com a madrinha, nao quer me ver. SAUDE MENTAL NAS ENTRANHAS DA METROPOLE 35 Os outros dois filhos eu também perdi. Estou com aids e nao posso comer. Vornito tudo ea toda hora pinia pectra nesta casa. Nao agiiento mais. Vou morrer. Quero parar com a pedra e com 0 pé. Ajude-me. — Fabiana, vocé nio vai conseguir. Vocé ¢ como a selegao brasileira: s6 vive grandes derrotas. Se vocé quiser parar de vez, vai viver mais uma derrota. Nés lhe propomios um peque- no tranfo: escolha o dia mais fécil da semana e fume maconha. Ela disse nao gostar mais de maconha mas aceitou, relutan- te, o convite e as camisinhas que entreguei em sua mao. Aler- tow-me que seria dificil convencer 0 parceiro a usé-las mas se despediu afetuosamente de nés. Na semana seguinte, fumou numa manha um baseado e apareceu na casa da agente comunitéria de satide de banho tomado e arrumada. Fazia tr@s meses que nao tomava banho. ‘As duas foram para unidade de satide Ilza Hutzlere iniciou-se um perfodo de cuidados e de substituigio progressiva de cra por maconha. Provavelmente pelo efeito antiemético da cana- bis, ela comesou a se alimentar. O processo continuou com periodos altemados de recaidas, substituigdo e até de abstinéncia, que fizeram com que se mantivesse viv “Tempo depois, a irma —corretora de seguros, as duas velhi- nhas acamadas, e seu filho, de onze anos, voltaram. Além de organizarmos um cuidado especial paraelas, conseguimos que Cléudia freqtientasse a escola mais assiduamente. oe Subimos o morro do Boi Malhado para encontrar a familia de Rafael. © menino, segundo a agente comunitaria Dada, dormia na casa do cachorro. Maria da Ajuda Santos Aguiar 34 ANTONIO LANCETTI Chegamos a0 barraco, que impressionava pela ordem e limpeza. As panelas brilhavam. Dona Cristina era uma baia~ na matriarcal que morava com dois filhos bem comportados, de treze e catorze anos. O marido, catador de papel, homem apequenado e submisso. Também estavam o irmioe o sobrinho, Rafael. Este era causa de todos os problemas da familia, Rafacl desafiava e xingava dona Cristina, além de andar sempre com um isqueiro no bolso, o que a deixava furiosa. Escutamos dona Cristina e incitamos os outros a falar. Sou- bemos que a mae de Rafael tinha-se perdido de tantas interna- Bes psiquistricas e que nao sabiam se estava viva ou morta. A filha Luciana casoucom um traficante emoravam numa favela préxima. Rafael j4 tinha comesado a freqiientar o cemitério eo Largo do Paigandu, porta de entrada dos meninos do Morro da Esperanga para a vida nas ruas. ‘A favela do Boi Malhado ¢ um ndicleo de barracos situados no Morro da Esperanga 20 lado do cemitério da Vila Nova Cachoeirinha. A favela avangava no cemitério e 0 cemitério na favela, As criangzs empinavam pipas por entre as tumbas oubrincavam de escorregador com tabuas improvisadas, cain- do nas covas ainda nao ocupadas. As flores singelas ofertadas 205 mortos combinavam com as cores dos papagaios com cerol ‘Andando peles bordas da parte alta do morro se podia avistar um bode, as galinhas, os cavalos e até uma bandeirinha de plistico do Brasil Uma das familias que aterdiamos habitava com dois cava- Jos que dormiam na sala do barraco. A filha adolescent tinha muais citimes dos cavalos que do irmio. Encravada entre o cemilério e um bairro, mescla de operatios npens ticos, a favela era visitada assiduamente amos num barraco e vimos 0 pobres com pela policia. Numa tarde, e: SAUDE MENTAL NAS ENTRANHAS DA METROPOLE 35 rosto das pessoas se transformarem de dar medo. Chegou os les mos contaram que, poraqueles dias, a policia colocou um 38 na boca de um menino, de uns seis anos, para que ele dissesse onde estavao traficante mais popular do luger. Je morro barulhento, todo mundo sabe fazer silén« Disse a dona Cristina que ela se preocupava muito por todo mundo, que cuidava de todos, mas que nao sabia cuidar de Convidamo-la para passar pela unidade de saide e combina. ‘mos que vollarfamos quando Rafael estivesse em cas Na segunda reuniao, Silvia Rocha e Luisa Franco, p cassistente social daequipe, negociaramoretorno de barraco para dormire que deveria chegar mais cedo. Combi ram, também, que vollaria & escola, depois de convencer e ent siasmar a diretora, a coordenadora pedagégica e a professora. Dada iria passar as sete horas da manha, no primeiro di aula, do segundo semestre. Na segunda-feira cedo, Dada bateu na porta do barraco ea Ihe contou que Rafael nao voltara desde sexta-feira Fomos & entrada do cemitério onde Rafael cuidava de ros, Ligamos para o SOS Crianca e nada. Ja de tarde, Li Franco se inspirou e ligou para a escola, Ele tinha assistido aula ends, que agiamos de surpresa, fomos surpreendidos mais na vez. QUESTOES CONCEITUAIS — PROBLEMAS METODOLOGICOS Havia aprendido com os meninos crackeiros e com a exp rigncia analitica que o que cura é a surpresa, mas oefeito in’ de nossas intervengdes nos langava no imprevisivel. Como era possivel que as pessoas aderissem tanto a nossas programacées? Era impressionante o poder da escuta. Dava a sensag: que nunca ninguém se havia interessado pela pessoas, por suas histérias e pelo seu sofrimento. de ja dessas 36 ANTONIO LANCETTI Percebi, também, que todos os que atendiamos pos: alguma teoria sobre 0 softimento e jé tinhamos nelas dizendo, por exemplo, que nosso interlocutor interpreta- va erroneamente a missio que deveria cumprir ou que Omoly era 0 orixé da doenga mas também da satide. Foi quando Peter Pal Pelbart nos apresentou a Tobie Ne- than 3 Oetnopsiquiatra, seguidor de Devereux, afirmava que mais de noventa por cento do sofrimento psiquico é atendido pelo queele chama de pensamento negro (pajés, pastores, padres) 2 86 dez por cento, ou menos, pelo pensamento branco. Afirma- va, também, que uma consulta psiquidtrica ou psicolégica & um combate epistemolégico— um dizendo que é um trabalho de macumba e © outro que é uma psicose parandica — ¢ que (0 dialoga com algum interlocutor invisivel Percebemos que para que houvesse adesio 20 programa elaborado para cada familia era preciso transitar por esses territérios existenciais. Em primeiro lugar, configuravamos a situagao de maneira tal que considerasse paciente ou usuario do Programa de Sat- de Mental todo © grupo familiar. Escuter nio era somente capiar as tradicionais formagdes do inconsciente, os falhos, as piadas, mas conhecer a estrutura ou sistema que organiza a vida desses grupos aniropol6gicos e 05 seus interlocutores Para nds nao existia familia desestruturada. Nés queriamos e queremos captar 0 equilibrio e a configuracao de cada grupo. Nossa aggo visava romper essa “estratura” e gerar outra mais solidéria, mais tolerante e incitadora do deser soal e social de cada crianga e adolescente implicado. Pichonianamente, propiciévamos a elaboragio coletiva da loucura depositada em um membro des familias. Paris: aie Jacob, 14, SAUDE MENTAL NAS ENTRANHAS DA METROPOLE 37 os liberdade. Dizi wres, pois ningw Surgia para nés 0 problema 1e faziamos nao eram visitas dot tinha convidado. Questiondvamo-nos pelo poder que exerciamos nessas in- tervensées realizadas nos domicilios. Foucault disse, antes de morrer, que a sociedade disci estava com os dias contados ¢ Deleuze nos deixou dois textos primorosos"* sobre o que chamou de sociedade de controle. O controle nao se exerce no manicémio mas sim no domicilio. ‘Assim como em 1989 apostamos na cidadela da disciplin 10 6, no hospicio, estivamos agora surfando no Controle: tre os submetidos A dependéncia abjeta da cocaina e do entre seres autist mente pelo embrutecimento e a infantilizagao capitalisticos por isso, apesar dos rubores éticos, é que a experiéncia es quase fascinantes mas sabfamos que iriam rep tar a agredir-se, a surtar-se. Era premente produzir agenciamentos que conectassem as pessoas com as redes trangadas pela organizagao sanitaria, ¢ com 0 que Benedetto Saraceno chama de recursos escondidos da comunidade. A operacionalizagao desses agenciamentos era vital para liberagao de uma clinica cartogréfica um entremeado de percursos, um deslocamento entre um mapa e outro. Nao desprezamos o saber psicanalitico. Porém, para nés, 0 pai ou a mae nao era, segundo a concepgao arqueolégi inconsciente, coordenada de tudo, mas esiava “em posi¢io num mundo que nao deriva deles”, 38 ANTONIO LANCETTI Também no abdicamos da psiquiatria clinica mas nao a adscrevemos a concep¢ao meta! 10 de desejo é a unidade minima para produ- lades cidadas. Mas nossa cidade estava mise- ravel em politicas piblicas: a escola nao ensinava e precisava de muita sedugio para aceitar 0 convite ao desafio quea toda hora the fazfamos quando levamos um adolescente com dificil paraas salas de aula. Os programas de assisténcia social m e nem se fale do es- da cultura. Jia do Boi Malhado estava sendo realizado 0 Projeto durante 0 tempo em que desenvolvemos nosso trabalho. Acompanhamos a situagao de todas as famflias e 10s que a mudanga para os apartamentos nao imp! cou aumento de cidadania. Ao contrario, a violencia comunité- ria parece ter aumentado. Nao foi realizado nenhum trabalho educativo. Nao foiconstrufda uma 4rea ptiblica. A Area vizinha a0 cemitério jé estava sendo ocupada novamente. Para dizé-lo de alguma maneira, havia de se inventar tudo. No referente a0 Projeto, o centro de nossas preocupacOes era o médico de familia, Na época em que comegamos, as coorde- nadoras regionais conduziam o trabalho de modo que centras- se 0 processo de satide na equipe e nao no médico. Elas convocatam 0s diretores de unidades, apresentaram 0 Programa de Satide Mental e organizaram uma agenda de capacitacao. Jé nas primeiras capacitagées apareceram resisténcias de que eram absoluta minoris. disse numa aula que nao era possivel cuidar de pacientes psiquidtricos, 0 que ele faria se o procurasse wm catatOnico? Tranqiilizei-o respondendo que nao se preocupas- se, pois nenhum catatGnico iria procuré-lo, Coincidentemente, 10s poucos que resistiam frontalmente ao programa de satide mental se demitiram logo. SAUDE MENTAL NAS ENTRANHAS DA METROPOLE 39 No Programa de Saride da Familia nao é possivel passar os casos, Mesmo quando se indica uma intemagao, uma ou tratamento de maior complexidade, o paciente contin: serda equipe, enquanto morar no mesmo bairro.O continuidade exigem lidar com o sofrimento humano, proces 30 para o qual os técnicos nao estdo preparados. Para pessoas criadas em regides de classe média da cidade & um choque cultural a convivéncia com favelados da periferia relacdo com o familiar, tertitério onde radica 0 que Freud chamou de sinistro, experiéncias 20 mesmo tempo familiares ou de produgao de narcisismos ou o que chamamos de social-sinistro, ‘Tudo isso exige dos profissionais um trabalho psiquico e uma capacitagao continuada e penosa. Muitos nao agiten- taram. Em setembro de 1998, fizemos uma selegio de psicélogos dispostos a trabalhar em ambiente nao protegido, que vessem boa experiéncia institucional e a vivacidade dos gosiam de trabalhar com psicdticos, drogadictos e criancas vitimizadas. A capacitasao foi feita no trabalho, intervindo juntos, disci tindo casos e lendo uma bibliografia escolhida a dedo. Logonos primeiros meses, estabelecemos reunides ticas de discussao de casos, com as coordenadoras region: que sempre acompanhavam de perto nossas a;ées. Essa foi fato, a capacitagao continuada que pos o programa em anda- mento. Antes de ierminar o primeiro semestre, elaboramos dois cursos: um de Formacio em Satide Mental e outro de Uso Racional de Psicofarmacos. Esses cursos esto servindo de base para capacitagio de equipes do PSF desenvolvidos em i fitudes do Brasil, mas munca conseguimos que a Fundagio Zerbini os financiasse. Com o passar dos meses, muitas familias comegaram a ser ue ma versas 40 ANTONIO LANCETTI alendidas sem a participagio direta das equipes volantes de satide mental. Proposiladamente, deixamos a setegao de psiquiatras para ‘umsegundo momento, Temfasnos que as equipesencaminnas- Sem indiscriminadamente, Fomos explicando que o psiquiatra nize irja fazer atendimento direto, que seria um membro da equipe e que teria a fungio adicional de consulter. 'A experiencia de Santos tambémmnos demonstroua importane cia de criar um pélo artistico (0 Niicleo de Artes Tan Tan) que propicie, napravs, 0 denominado paradigm tico-esttico Que pensione e se combine com o paradigma técnico cientifico. ‘Por essa razio de safda foi contratada uma equipe de arte- edueadores para desenvolver oficinas produtivas que inicial rente aconteciam num local alugado pela Associagao Pau Paw — Crianga de Cidadania, em Sapopemba. CO cbjetivoera incitar atividades culturais,artisticas.e prod sivas com eriangasadolescentes e adultas, inserindo no seio de experiéncia uma ago poiética.* Em fovereiro de 1998, o Projeto Qualis adquiria visibilidade ecomegou uma série de manobras que dificultava sistematicr mente a implementagio do Projete: seteciondvamos (éenicos ¢ 1 Fandacio Zerbini nfo os contratava, Cada compra e cada ato ‘administrativo era obstado. Realizamosa selecao de psiquiatras e néo conseguimos con tratd-los. Com isso, passamos mais de um anosem psiquiatras ‘Nossa equipe da zona sudeste tinha quatro psicblogos Pars atender A demanda de quinze equipes de satide da familia. A equipe da zona norieera composta por quatro psicéloges, wane sesistente social e uma médica sem experiencia psiquidtrica Nesta repito acabavam de formar-se dezenove equipes de PSF. Cada equipe cuidava de mil familias. Os geeges tinham das palivrespara se Spire pols que €a ago de fabrics. A obra arabada 60 poem: e€ agi0 ds SAUDE MENTALNAS ENTRANHAS DA METROPOLE 41 Atensio entre Paolo Bellotti, presidente da Fundagio Zerbi sije oscoordenadores do Projeto cresciaacacia dia issocr Ataondade beatos ¢ uma instabilidade emocional eoperative que nos ensinaram a viver na incerteza. ‘As equipes (volantes) financiavam o transporte para ir de wn pairro a outro, muitas vezes distantes, usando para isso carres proprios eem muitas ocasies adquirindo medicamentos. Nunca se sabia com que se podia contar e até quando per- maneceria a Coordenagio. Foram tantos os documentos ce waliagao e justificativas para completar a equipe que no se traduziram em medidas concretas! ANTIMANICOMIAIS ATE O ULTIMO FIO DE CABELO ‘A nfio-contratagio dos psiquiatras foi um paradoxo. Se de um lado dificultava severamente 0 processo de implementa~ Gio, do outro nos punha, a cada dia, em situagBes que nos Sbrigavam a pensar nas mais diversas solucées, @ a viver em estado de aventura. ‘Um sébado, Vera Amorim e Paulo Goncalves estavam aten- dendo algumas familias que nao conseguiam encontrar duran te a semana. Andando por Sapopemba, os psicélogos foram chamades para intervir numa casa, onde wma mulher em agi- tagdo psicomotora destrufa tudo 0 que estava ao aleance de suas macs. Eles agruparam a famflia ¢ alguns vizinhos deram as maos Iniciaram uma reza e cantaram hinos protestantes até que a mulher vomitou satands, Um farmacéutico da vizinhanga « sedou e, depois de um acolhimento coletivo, as mulheres en- traram no domicflio para Ihe dar um banho depurativo. Os psicélogos foram atender outra familia ¢ no retomo insistiram no pedido da ambulancia, pois consideraram que poderia haver algum isco clinico. A senhora, que jé estava melhor, foi conduzida ao pronto-socorro, onde permanecet 42 ANTONIO LANCETTI dois dias, Posteriormente continuou o tratamento,que se Pro- longou por alguns meses. ‘Na semana seguinte, durante a reuniio de equipe, ouvi de Giane Carvalho, que conversava com Ivone Estrela Dias e ou: tros companheiros, esta frase: “eu sou antimanicomial até © tiltimo fio de cabelo”. CRESCENDO NA CONTRADIGAO Em meados de 1999, substituimos a médica da equipe da zona norte por um psiquiatra para trabalhat vinte horas se xis e, depois de uma intervencio enérgica do Professor A Jatene, uma psiquiatra para trabalhar quarenta horas semanais nna zona sudeste. ‘As equipes da zona norte ja eram 22 e as equipes da zona gudeste 33. A pressdo pela diminuicéo do custo per capita nos levoua aumentar o ntimero de familias atendidas por equips, de 1.000 para 1.200 familias. A demanda aumentava vertigino= samente ¢ o conflito institucional também. ‘0 coordenador adjunto, Elei Pimenta Freire, questionow os niimeros e o presidente da Fundacao Zerbini o demit vom outras duas coordenadoras. Depois da intervengao de as demiss6es, menos com a Professor Jatene, voltou atras com de 1s estavam afinadas transitando ‘Ao mesmo tempo, as equipe ndo cade entre a violencia, a psicose, a drogadicsao e associan ppasso a agio das equipes de satide da fam (Os agentes comunitérios aprendiam a ser continen| conversar com as pessoas mais dificeis e a acompanher c zelo cada passo dos processos terapeuticos. Os recursos comunitarios apareciam a cada hora. Um bebé, filho de wma senhora que estava internada no hospital psiquiftrico Borda do Campo, ficou sendo cuidado por uma agente comunitéria, com guarda proviséria expedids SAUDE MENTAL NAS ENTRANHAS DA NETROPOLE 43 al, retorno a pelo juiz. A equipe buscou a mulher no ho: vou a tanga para que encontrasse a mde e preparou. comunidade. Posteriormente, uma familia de padrinhos sociais se encar- regou de apoiar a familia com cuidados, alimentagio ¢ roupas. Na pratica, passou a dividir a criagao da menina que ganhow peso e melhorou sersivelmente seu desenvolvimento. ‘Coma parceria do Centro de Defesa dos Direitos da Crianca e do Adolescente de Sapopemba — Cedeca — conseguimos o aborto legal de uma menina de doze anos gravida do padrasto. Para isso, foi necessério, pela primeira vez, denunciar o padrasto e esconder as criangas ea mae na casa de amigos. (Os hospitais psiquidtricos e os prontos-socorros nos abriam as portas quando famos buscar pacientes intemados. A Coo: denadoria de Saiide Mental da Secretaria de Estado da S: fez um acordo conosco que nos permitia internar, quando imprescindivel, sem passar pelo pronto-socorro. Percorremos unidades da Febem, abrigos para criangas, zadlos, igrejas, centros espiritas e as mais diversas ONGs em busca de nossos pacientes e de agenciamentos para organiza- ga0 da rede de sustentagao da real ‘Até 05 médicos e enfermeiros mais resistent metodologia foram se implicando, gozando dos é quistados e do balsamo que produz 0 contato de normais com loucos. Apesar das dificuldades cotidianas e da permanente incerte- 2a, a grande maioria dos profissionais foi incorporando a me- todologia A Associagao Pau Pau, que funcionou no inicio apoiando o trabalho comcriangas e adultos, foi faléncia por absoh de apoio financeiro e as oficinas que atendiam a centenas de criangas foram fechadas. A equipe de arte-educadores se tomou volante desei vendo oficinas de capacitagdo de agentes comunitarios de 1 44 ANTONIO LANCETTI de e de producto de brinquedos, reciclagem de lixo e papel, etc. em todas as unidades da zona sudeste. Alguns pacientes se vincularam as oficinas, A duras penas e diante das necessidades apresentadas pelas equipes de satide da familia fomosmantendo a capacitagio em satide mental. Elevando nossa capacidade operativa ao limite e com a agéo coordenada das dirigentes regionais e da coordenadora de recursos humanos, estvamos pondo a metodologia em fun- cionamento quando as sombras se estenderam sobre o Projeto Qualis/PSF. © COMEGO DO FIM Em 1939, uma equipe de satide da familia entrou em confli to: 0 médico e a enfermeira brigavam nos corredores do ambu- latério da Vila Espanhola. Como sempre, fomos convocados para pensar em uma solugao. Sempre que havia alguém em conilito sério, éramos chama- dos. JA tinhamos intervindo no caso de dois médicos que entraram em crise psic6tica e alendemos com sucesso duas agentes comunitarias de satide. Uma delas,com diagnéstico de distixbio bipolar, parou de ser internada a cada quatro ou cinco meses e, hoje, desenvolve seu trabalho normalmente. Outra agente comunitiria foi transferida para outra unidade de satide realizando tarefas de limpeza e continua evoluindo favoravelmente, sem mais episédios de crise psicdtica. A enfermeira era uma jovem extremamente responsavel, que se ressentia dos comportamentos “autoritérios do médi- co”. Este era muito popular na regio e conduzia um grupo de idosos onde se fazia catarse. O protagonista era o proprio médico. Optamos por uma solugao de compromisso, transferindo + enfermeira para outra unidade de satide da regiio, SAUDE MENTAL NAS ENTRANHAS DA METROPOLE 45, Omédico, apresentando sérios tragos de imaturidade, conti- you no local mas, tempo depois, insurgiu-se contra a diretora eas coordenadoras, Certa vez, nos reunimos com o Professor Adib Jatene para fazer uma anélise dos ébitos. Cada equipe apreseniou seus niimeros € narrou as circunstancias em que aconteceram os casos de maior complexidade, para constatar o grau de acom- panhamento e de cuidado da equipe. Reunidos no auditério do Hospital da Vila Nova Cachoeri- nha, vimos que em algumas unidades de satide a causa extema eraa principal causa mortis. Quando chegou a vez da equipe do médico em questio, o professor perguntou, como em todas as apresentacées, se ha algum caso que queriam comentar. Uma agente comunitaria se fevantou e narrou o caso de uma senhora que pedia ajuda, pois seumarido ameacava suicidar-se, Disse ainda que tinha levado opedido ao médico varias vezes e que este se negou a atender. Dias depois, na visita domiciliar, a mulher Ihe disse: néo precisa se preocupar mais, ele se ateou fogoe se matou, Dai em diante © homer comegou uma guerra sistematica, ligando toda hora para Fundagao Zerbini para contar quem tinha chegado atrasado ao trabalho e para manipular a popu- lagi. Todo mundo estava se sentindo perseguido e a critica au- mentava a cada dia, a ponto de todos os médicos ameagarem pedir demissao, caso permanecesse a situagao. Certa vez, por ocasiao da visita do vice-governadore candi- datoa prefeito Geraldo Alckmina Unidade, Paolo Bellotti, que acompanhava a comitiva, abragou 0 médico e a partir dat criou-se um clima persecutério no posto. Ninguém podia demiti-lo. Os funcionarios assistiam aos seus coordenadores perderem o poder e ao médico ameacan- do de demissao a equipe coordenadora. Lembro de t@-lo vis- ‘ entrar na unidade de satide com os olhos desencaixados, 46 ANTONIO LANCETTI A patologia institucional exacerbava'se. Em feverviro de 2000, foi celebrado 0 aniversdrio de dois anos do Qualis 2e de quatro do Qualis 1 com uma grande festa, realizeda no Gindsio do Ibirapuera. (0 Professor Jatene disse no seu discurso que 0 Projeto era extraordinario ¢ que nao devia ser feito uso eleitoral dele. © FIM DO COMECO Pouco tempo depois, chegaram as demissdes de quase tods a equipe diretiva: Socorro Matos ¢ Carmen Sueli Geanezini coordenadoras da regiio sudeste; Lidia Tobias e Lane Valente, coordenadores da area norte; Marcia Freitas, coordenadora de saiide bueal; Isamara Gouveia, de recursos humanos; e David Capistrano, coordenador-geral do Projeto. Todos menos 0 de saiide mental. Segundo Milton Pacifico de Araiijo, coordenador executive, a razao da demissio foi administrativa, ¢ os procedimentes administrativos eram conduzidos por ele e pelo engenheirs Paolo Bellotti. © Govemador Mario Covas também negou que a razao fosse politica. © discurso institucional esquizofrenizante alcangava seu Apice. Foram feitas varias manifestagdes coletivas de apoio & coor denagao demitida e organizada uma resisténcia que durou alguns meses. A equipe de satide mental, porque volante, ers ‘uma das pouces que colhiam informagio durante aquele peri odo marcado pela mobilizagao. ‘Nunca se soube a razio da minha permanéneia, Mas a a;30 coordenada de um trabalho tio complexo e rico, que é aesteins que sustenta a reabilitagdo psicossocial,estava definitivamen te ameacada. SAUDE MENTAL NAS ENTRANHAS DA METROPOLE <7 A DESNATURAGAO DO PROJETO. Quando a coordenagao foi deposta nao havia ainda substi- tutos e seus administradores avisaram que nfo haveria mais coordenacao regional. Durante um bom perfodo, o Projeto ficou sem coordenagio técnica e a perda do entusiasmo foi o primeiro efeito. Pararam de chamar-nos para opinar sobre qualquer assun- to. A Fundagao Zerbini nao apresentou proposta a Secretar: de Satide do Estado para completar a equipe de satide mental. Desde maiode 2000 até o momento, intensificou-se o proces- so de desnaturacao do Projeto. Os profissionais sao incitados a se reunir por categoria. A nogdo de equipe comegou a degenerar em corporativismo, Todas as questdes comegaram a ser tratadas administrative mente. Asenfermeiras foram proibidas de prescrever qualquer me- dicagao e ameagadas. Isso gerou conflito com os médicos e por todas as partes brigas internas, silencio, medo de perder 0 emprego. A diregao administrativa nao tomava atitude como médico que vinha sabotando o trabalho e as unidades da zona norte ameagaram fazer greve. Varios atos de desagravo eram realizados na Escola de Sati- de Publica, em igrejas e centros comunitérios de Sapopemba... Muita gente se manifestou a respeito dessas demissoes. Ascriticas no Conselho Estadual de Satide aumentavam pelo fato de a Fundacio Zerbini nao prestar contas a esse Conseiho, Omédico da discérdia foi finalmente ascendido a um cargo de consultor, ou a algo que o valha, na sede da Fun integrar a equipe de coordenagao. A descoordenagao aumentava, Jeana Azevedo, nova coordenadora de recursos humancs, 48 ANTONIO LANCETTI chamava para capacitagdes que discordavam da metodologia implementada. As pessoas consideravam a retirada do traba- Iho “perda de tempo”. Rapidamente, os novos coordenadores comegeram a brigar entre si. O ASSASSINATO DE MARCO AURELIO GUALBERTO Marco Autélio era tim agente comunitirio de 22 anos, mula- to claro, jeito de garotao, que trabalhava na Unidade de Satide da Vila Penteado. No dia da demissio da coordenagio, o médico de familia da equipe de Marco Aurélio avisou a coordenadora regional que ‘um agente de satide tinha socorrido uma pessoa baleada, mo- rador de sua érea e que, por essa razao, estava ameagado de morte. Lidia Tobias indicou que procuresse uma forma de retirar rapidamente 0 agente comunitério da regizo mas, minutos depois, chegou a demissio ¢ 0 caso foi tratado diretamente com a coordenasao executive. ‘A questio foi tratada em sigilo. Nés que sempre tinhamos intervindo em casos de ameasa de linchamento, ameagas de traficantes e outras situagies de risco, s6 soubemos do acontecido depois do assassinato de Marco Aurélio. Ele {oi afastado por quinze dias — sempre cbservando 0 permitido administrativamente, e depois voltou a trabalhar no posto de satide. Durante a noite, ele dormia em Osasco, na casa de parentes. Confiado, uma noite, foi dormir na sua casa, Chamado & porta, saiu para ver quem era ¢ alguém lhe disparou varios tiros 4 queima-roupa. No dia 19 de julho de 2000, foi demitido. Depois de morto, readmitido. SAUDE MENTAL NAS ENTRANHAS DA METROPOLE 49 Na sexta-feira, 21 de julho, acompanhamos o enterro com um grupo de funcionérios do Qualis, vizinhos e familiares. De volta a unidade, reunimos as equipes para ajudar a falar sobre o assunto e para elaborar o luto pela perda do companheiro. Eram onze e meia da manha. Bles receberam a ordem de abrir a unidade ao meio-dia. Uma agente de satide disse que “quando Montoro faleceu pudemos fazer luto mas hoje néo...”, outra funciondria acres- centou que “quando roubaram o ventilador também nao trabe- Uma médica falou que as pessoas estavam perdendo o entusiasmo e a relagao de confianca com a populagio e que isso era muito perigoso. Atendemos as pessoas mais necessitadas. Explicamos que quem nao estava em situagao de urgéncia seria atendido na segunda-feira. A diretora da unidade tinha ido a uma reuniZo chamada pela nova coordenacao e nio estava presente. Fechamosa unidade afixando um cartaz que explicava que um compankeiro tinha sido assassinado por cumprir com sua obriga- G#oe que estavamos de luto, Todo mundo entendeue respeitou. Nao conhecemos os meandros da hist6ria mas se falava que anamorada de Marco Aurélio havia prestado queixa a policia Soubemios também que um grande jomnal enviou um repér- teri unidade, mas nada veio a piiblico, 0 Projeto se tornava cada dia mais privado. Evidentemente, nao acusamos ninguém. Provavelmente, o triste desfecho nao poderia ter sido evitado mas, tantas vezes, conversamos com traficantes ¢ ladrdes até mesmo para que devolvessem aparelhos furtades. Nossas unidades nao tém outra seguranga além da protecio dos vizinhos. Ocestilo “administrativo” estava vigorando. Nossa atu na equipe foi criticada e nos afastamos do caso. 22 ANTONIO LANCETT! | dios, de drogas. Esses sioos itens que inicialmente deveriam ser quan tificados para aveliagdo do impacto. L ‘Também nao temos acesso as finangas da Fundagao Zerbini para saber qual é o custo do Programa, Masjésabemos que nio| passa de RS1,00 per capita e que o paciente que entra no sistems ico custa em tomo de R§700,00 por més. nicomiais em Sao Paulo e, de fat dos a internar alguém em hospi ; Nosso caminhar pelas regides norte e sudeste de Sio Paula nos permite encontrar intimeras pessoas que nao receba nenhuma atencao. ‘A cidade tem 1,270 leitos no SUS" e o interior do possui 18,602 — sempre insuficientes — dada a nao-exis de qualquer continuidade terapéutica para os que chegam aos prontos-socorros. i Quem porventura entra em crise psicética ou chega a ums urgéncia comoverdosede crack, cocaina o ‘ondens- do a ser internado em algum leito da cay ou, simplesmente, ser entregue ao abandono ou a0 linchamento. Nosso Programa é um analisador da situagao de injustisa, de falta de acesso A assisténcia e de caos que vive a Cidade. Mes ele também é uma contribuigéo para o futuro da satide mental e para 0 retormo do SUS & maior cidade brasileira ‘Muito nos custou gestar esia metodologia mas confessamos com orgulho que, entre uma inseguranga ¢ outre, navegando entre tormentas institucionais nas éguas do sofrimento e da loucura, sempre mantivemos elevado o humor ¢ atigado o senso incomum, 1 Dados fomecides pala Coordensdoria de Plarajamento de Sudde da Sevretariade Estado da Saude. SOLANGE APARECIDA FREITAS MATTOS ENTRE A LOUCURA E A LIBERDADE: A EXPERIENCIA DE UMA AGENTE COMUNITARIA DE SAUDE de satide, hd vinte anos, Ele ficava em cima da laje da casa dele mexendo com todo mundo. Acho que me lenbro bem desta época porque sempre que eu passava, ele d — Olha! Voce é muito bonita, Fu queria casar com vocé... ‘Agora, eu vou relatar a minha experiéncia com esse prciente muito especial que 6 0 Leio: 57 anos, 1,88 metros de que pesa perto de noventa quilos. As orelhas dele sie como daqueles bichinhos do filme Grenilins, ¢ ele tem como caracte- ristica principal uma voz rouca e muito alta. No principio, relutei em fazer o cadastro dele por medoe por achar que nao teria nada que fazer por ele aqui no Posto de Satide. Mesmo assim, no dia 20 de margo de 1998, eu fi cadastro com informagées dadas pelo pai de Leao. Ele explicou os problemas do filho, os temédios que tomava ¢, cada vez mais, eu me convencia de que a Equipe néo podia fazer nada porele. ‘Aos poucos, fui me aproximando mais por insi do que por vontade prépria. Nesse primeiro momento, ¢ para mim assustador e eu tinhaa impressao de que, inuto, ele iria me atacar. Fui conhecendo um outr durante as reunides com a Equipe de Satide Mental (52 E: conheci Leo antes de ser agente comun ae

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