Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões – URI –
Campus de Santo Ângelo
Curso de Direito Programa de pós-graduação em Direito - Mestrado em Direito Disciplina: Multiculturalismo: Identidade e Diversidade Professor: Vicente de Paulo Barreto
Ficha de leitura RADBRUCH, Gustav. Filosofia do direito. Coimbra: Armênio Amado Editor. 1974. p. 97-113.
Aluno: Joel Saueressig
Santo Ângelo, 30 de outubro de 2006.
Direito e Moral Gustav Radbruch, citando em nota de rodapé o pensamento de Strindberg sobre o tema do direito e da moral, coloca de forma introdutória (p. 97): Tem-se sempre querido manter as leis morais tão indefinidas quanto possível. Porque não se fixam e imprimem, como se faz para as leis divinas e civis? Talvez porque a lei moral, se fosse honestamente redigida, viria a conter também os direitos do homem.
Estabelecida está a diferenciação entre os diversos conceitos de
lei, mesmo que peremptoriamente. Uma diferenciação que reside no que mais se assemelha ao direito: a moral e os bons costumes (p. 98). Evoluindo na conceitualização abordada pelo autor, se chega ao ponto de avaliação de que “o direito é um conceito cultural, e a ética um conceito de valor” (p. 98). Logo, estabelece a ética uma ponte para com a moral. Há a formação da antítese, como o próprio autor se refere do binômio “exterioridade-interioridade”. Enquanto o direito atua na esfera externa dos relacionamentos dos homens, a moral está calcada na sua interioridade. Entretanto, apesar de uma interpretação sistêmica de que há universos separados nos conceitos abordados, Radbruch coloca que a moral enquanto conduta interior é, muitas vezes, juridicamente relevante, ou seja, há uma comunicação intersistêmica (p. 99): Por conseguinte, há que reconhecer que tanto a conduta exterior é susceptível de ser objeto de valorações morais, como a interior ser objeto de valorações jurídicas. Não há, pode dizer-se, um único domínio da conduta humana, quer interior, quer exterior, que não seja susceptível de ser ao mesmo tempo objeto de apreciações morais e jurídicas.
Este relacionamento entre os conceitos é mais bem explorado pelo
autor quando o mesmo exemplifica que no campo jurídico, quando existem “direitos e obrigações”, ou “créditos e débitos”. Na moral este comparativo com o jurídico coloca que o chamado dever moral não se constitui como um débito, mas sim um “dever”, apenas e tão somente (p.102). Retomando o binômio “exterioridade-interioridade”, traz Radbruch (p.103): A moral exige que cumpramos os nossos deveres pelo sentimento puro do dever. O direito admite outros móbeis no cumprimento dos nossos deveres jurídicos. A moral não se satisfaz sem a consciência harmônica com a norma. O direito é menos exigente e requer apenas a conduta conforme ao preceito. Como dizia KANT, a moral reclama “moralidade” (espírito de moralidade); o direito apenas “legalidade” (observância exterior).
Indo além, mas sem se distanciar do interior e do exterior, coloca o
autor (p. 100): Isto é: a conduta exterior só interessa à moral na medida em que exprime uma conduta interior; a conduta interior só interessa ao direito na medida em que anuncia ou deixa esperar uma conduta exterior.
O exemplo traçado diz respeito à amizade. O direito, por sua vez
em nada tem a ver com a amizade entre os homens, pois se trata a amizade de uma conduta que exprime uma “atitude afectiva interior”. Neste viés, os verbos “anunciar” e “exprimir” ganham relevante diferenciação. Enquanto o primeiro denota o direito e suas ramificações, o segundo dá à amizade algo interior, de conteúdo moral, irrelevante para o direito em si (p. 100). Chega-se, inevitavelmente, a uma diferenciação entre “moralidade” e “legalidade”. Estes dois diferentes conceitos caracterizam pela diferenciação entre os substratos (p. 104): Tal distinção não pode significar, por outras palavras, senão o facto de que só a moral tem por objecto o homem individual com todos os seus móbeis de acção, ao passo que o direito tem apenas como objecto a vida dos homens em comum na qual somente a conduta exterior destes interessa (a interior apenas indirectamente).
Mais a frente, o autor coloca lado a lado “norma” e “imperativo” (p.
105-106): Podemos compreender melhor esta distinção, se tomarmos em consideração qualquer preceito em que uma norma aparece associada a um imperativo, ou em que um certo conteúdo normativo reveste uma forma imperativa (3). Por exemplo este: “cumpre o teu dever!” Se separarmos neste preceito o seu sentido do próprio preceito que lhe serve de suporte – isto é, o que nele se acha expresso, abstraindo da própria expressão em si mesma – obteremos, por um lado, um “ser” (o suporte, a expressão, o preceito em si), como alguma coisa que se acha delimitada no tempo e no espaço, causalmente determinada e determinante – como seja, por exemplo, uma série de sons que se ouvem agora, aqui, produzidos pelo processo psico- fisiológico de quem os emitiu e que dão origem a um processo idêntico naquele que os escuta.
Mais adiante, esta distinção é perfeitamente compreendida quando
o autor menciona que “A norma é uma não-realidade que deve realizar-se. O imperativo, esse, é sempre já uma realidade”. Fica evidenciado por Radbruch que o imperativo tal qual classifica o autor é um meio para se alcançar a norma, isto é, o fim (p. 106). Conceitos como de “heteronomia” e “autonomia” também são levantados pelo autor. Seria o direito heterônomo enquanto a moral autônoma (p. 107). O autor coloca, também, que, embora haja diferenciações entre o direito e a moral, igualmente existe uma estreiteza nas relações entre ambos. E esta relação consiste no plano coincidente do conteúdo das exigências, “causal e parcialmente” (p. 109). Ademais, em outros termos comparativos, traz Radbruch (p. 110): A moral não faz mais que submeter-se aqui a uma legislação estranha, abandonando-se à dialéctica específica dum outro domínio da razão e assinando, por assim dizer, numa letra em branco, a aceitação dum dever, cujo conteúdo exacto há de vir a fixar-se depois num outro domínio normativo.
A referência é, portanto, quanto ao interlace entre direito e moral, e
a ação de um frente e dentro do outro. Evidentemente que este raciocínio desembarca na “norma moral” (p. 111). Ou, em outras palavras, a norma consagra um espírito, um momento ético, que está, indubitavelmente, relacionado à moral. Desta forma, coaduna o direito para com o que se tem de ser cumprido através dele de forma moral. Ou, o direito comporta de forma precípua o dever moral. Logo, este dever moral consubstancia o dever de defesa do direito, do direito de quem o possui (p. 112). Esta vertente de pensamento é apenas uma hipótese. Radbruch ao final do seu raciocínio em que aponta vários autores (Jehring, Kohlhaas, Shylock), coloca que “O direito é apenas a possibilidade da moral e por isso mesmo também a possibilidade da imoralidade” (p. 112-113). O direito acaba tornando possível a moral. Entretanto também torna possível a negação expressa desta mesma moral (p. 113). Conclusivamente, “O direito começa por se encontrar ao lado da moral, mas estranho a ela, diferente dela e até, possivelmente, oposto a ela, como acontece com os ‘meios’ colocados ao lado dos ‘fins’”. Inegável que fica estabelecida uma diferenciação entre um e outro. Mas inegável, no mesmo sentido, que existe uma relação muito íntima entre ambos.
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