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ção de todos os valores e do além-do-
Departamento de Metodologia de Ensino,
Universidade Federal de São Carlos. mora- homem, o übermensche, como projé-
es_moncaio@yahoo.com.br.
corpo/subjetividade na escola.
A retomada do exercício da
Um viés pedagógico do projeto
leitura de Friedrich Nietzsche e o
filosófico de Nietzsche, o projeto do
deslocamento conceitual para o
übermensche, do além-do-homem,
campo da educação demonstram-se,
como resultado de um processo de
como dissemos, uma urgência. A
educação para a intuição artística,
configuração das paisagens
afigura-se, portanto, como um destino
existenciais, sua multiplicidade
irrecusável. Arte, educação e corpo
inerente, requer daqueles que se
assumem, aqui, um papel
aventuram na pesquisa em educação
importantíssimo.
um olhar fino para as questões
Para além de educar para a
nietzschianas.
liberdade, sempre ficcional e
Sobre o desafio nietzschiano aos
falaciosa, é preciso reformular o
“homens de conhecimento”, as
conjunto dos valores sobre os quais
palavras de Silvio Gallo parecem
repousa a mentalidade do homem
esclarecer profundamente: “é o
contemporâneo. É preciso reconstruir
desafio da multiplicidade [...] a
o sentido mesmo das vivências no
multiplicidade de olhares, a
ambiente social. Nos termos de
multiplicidade de afetos sobre um
Nietzsche.
mesmo objeto” (GALLO, 2006, p.
561).
Quanto ao homem singular, a
tarefa da educação é a seguinte: O tema do ensino de Filosofia,
torna-lo tão firme e seguro que
sobretudo quando imerso no espaço
ele como um todo não possa
mais ser desviado de sua rota. da obrigatoriedade curricular, exige
Em seguida, porém, o educador
deve causar-lhe ferimentos, ou um caráter múltiplo e multifocal,
utilizar os ferimentos que o
alicerçado na capacidade de adotar,
Número 21: novembro/2013-abril/2014
Revista Sul-Americana de Filosofia e Educação – RESAFE
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no trajeto, muitas perspectivas. Alojar intranquilo, com o incerto. Vislumbrar
essa temática sem correlacioná-la a questão da subjetividade e do cor-
com a urgência do corpo como po, a partir de Nietzsche, pressupõe
instrumento do pensamento é travar uma inquietude própria.
com a Filosofia um debate desonesto A experiência com as institui-
e infrutífero. O ensino da Filosofia ções de ensino nos tem conduzido a
deve proporcionar o cultivo do determinados pontos de interrogação.
espírito livre e os questionamentos Apregoar estabilidades, oriundas de
advindos de seu caráter mais íntimo. um excessivo racionalismo com a vi-
da, repatriadas na educação moral
Nietzsche, subjetividade e ensino de para o trabalho, profundamente con-
filosofia temporânea, como elemento constitu-
Compreender os processos de tivo, deve ser necessariamente a ênfa-
subjetivação que circulam na escola, se da educação dos sujeitos? Que
a partir da filosofia de Friedrich Ni- modelos existenciais são aqui consi-
etzsche, implica a audácia de sua derados? Da fortitute? Da decadence?
questão mais dura: a partir da ótica Da potência? Da miséria? Essas são
do valor, que tipo-homem tem produ- as questões dos escritos nietzschianos.
zido nossas instituições de ensino? Para um leitor atento, as inquie-
No Assim Falava Zaratustra, de tações diante das linhas de Nietzsche
1886, Nietzsche parece vivenciar a serão pequenos demônios. Nietzsche
potência de um fastio diante do ho- é o filósofo do “martelo” (NIETZS-
mem, da “caricatura de homem” CHE, 2006, p.8), das “perguntas fei-
(2006, p.50). tas com o martelo” (NIETZSCHE,
Neste sentido, adotar o referen- 2006, p.7). O martelo, entendido co-
cial de Friedrich Nietzsche nos remete mo o doloroso exercício do questio-
à ousadia da dureza do questiona- namento, faz-se então necessário. A
mento. Scarlett Marton adverte sobre filosofia nietzschiana, neste sentido, é
a urgência de “abandonar comodida- um estado permanente de
des, renunciar a segurança” (2008, [r]evolução. A atitude filosófica, em
p.18). É preciso habilidade com o Nietzsche, portanto, é a atitude bélica,
Referências
DELEUZE, Gilles. Conversações. Tradução de Peter Pál Pelbart. São Paulo: Edito-
ra 34, 1992.
DIAS, Rosa Maria. Nietzsche educador. São Paulo: Editora Scipione, 2003.
MARTON, Scarlett. Claustros vão se fazer outra vez necessários. In: AZEREDO,
Vânia Dutra (org). Nietzsche: filosofia e educação. Ijuí: Ed. Unijuí, 2008.
NIETZSCHE, Friedrich. Assim falava Zaratustra: Um livro para todos e para nin-
guém. Tradução de Paulo Osório de Castro. Lisboa: Relógio D’Água Editores,
1998.
Recebido em 27/02/2013
Aprovado em 17/10/2013