Vous êtes sur la page 1sur 6

Exercício do cap.

14 - Espaços Mentais, do livro “Language, Mind and Culture”


(KÖVECSES, 2006)

Por Morgana Leal

Exercício 3 (adaptado), p. 269.

Retire um trecho de um livro (5 ou 6 frases) e analise-o em termos de espaços


mentais. Diagrame suas análises, mas também escreva um texto justificando-as.

A Teoria dos Espaços Mentais, inicialmente proposta por Fauconnier na


década de 90, propõe que o significado e interpretação do discurso é construído on-
line, à medida que o discurso se desenvolve, a partir de espaços mentais, ou
domínios conceituais, que “contêm representações parciais de entidades e relações
em um cenário percebido, imaginado ou lembrado” (FERRARI, 2011, p. 109). Os
espaços mentais criam possibilidades de interpretação através de correspondências,
ou mapeamentos, entre domínios. Temos o espaço base, que é a realidade
presente, a situação comunicativa imediata, e outros espaços podem ser inseridos,
inclusive através de construtores de espaços, como advérbios, tempos verbais etc.,
que nos ajudam a criar espaços mentais específicos.
Kövecses (2006, p. 266) argumenta que um dos usos da Teoria dos Espaços
Mentais é a compreensão de obras literárias, pois os espaços mentais construídos
no discurso literário podem ser os responsáveis pelo efeito estético-literário de uma
obra. Minha proposta é identificar, assim como Stockwell (2002, apud Kövecses,
2006) fez com Utopia, de Thomas More, os espaços mentais de O Vilarejo, de
Raphael Montes, e depois analisar um trecho específico da mesma obra literária, de
acordo com a proposta do exercício.
Já no prefácio de O Vilarejo, o autor se põe como um tradutor dos cadernos
ilustrados de uma senhora estrangeira que os havia deixado junto com a herança
quando faleceu. Sua neta vendeu toda a coleção de livros a um sebo, que por fim
ofereceu esses cadernos ao “tradutor”-autor. Trata-se de um universo fictício, no
qual o autor do livro se coloca como tradutor e, portanto, personagem. O Raphael
Montes tradutor é contraparte do Raphael Montes autor. Já temos, até aqui, dois
espaços mentais, representados no mapeamento 1:
Raphael Montes → Autor de O Vilarejo.

Raphael Montes → Tradutor dos cadernos ilustrados, que darão


origem ao livro.
Mapeamento 1

O “tradutor”, então, estabelece um diálogo com o leitor e abre um novo


espaço mental: diz que descobriu que a narrativa dos cadernos se dava em sete
capítulos, e que havia encontrado uma nota na capa de um dos cadernos que
mencionava um famoso demonologista do século XVI, que havia classificados sete
demônios de acordo com os seus pecados capitais. O leitor é induzido a um espaço
mental do pecado de acordo com a tradição católica. Logo a seguir, ele menciona
que entrou em contato com o único professor que estudava a língua ciméria, na qual
foram escritos os textos, e que o professor se recusara a ajudá-lo, recomendando
que os cadernos fossem descartados. Esse contexto abre um espaço mental de que
os cadernos seriam, de algum modo, amaldiçoados. Os mapeamentos estão
representados no mapeamento 2.

Cadernos ilustrados → Dão origem a 7 histórias

7 histórias → Cada uma de um demônio/pecado capital

Cadernos ilustrados → Escrito em contexto religioso, católico

Cadernos ilustrados → Cadernos amaldiçoados

Mapeamento 2

Ao finalizar o prefácio, o tradutor agora abre o espaço mental do medo, por


meio de afirmações sobre as sete histórias que levam o leitor a um universo ficcional
de “maldade, terror e frieza estilística” (MONTES, 2015, p. 9). O vilarejo pode ser
qualquer um, em qualquer lugar do mundo, em qualquer época da humanidade, e o
tradutor deixa isso claro em seu prefácio. Isso aumenta a expectativa pelo medo
estético, aquela emoção que a obra da literatura do medo pretende alcançar, pois
todos estaríamos sujeitos às situações apresentadas na narrativa. Para a tese com a
qual trabalho, é importante observar que a linguagem e o sequenciamento dos
espaços mentais que são construídos no discurso literário podem contribuir para o
efeito estético desejado: o medo.

7 histórias → Apresentam terror, maldade, situações


extremas em um vilarejo

7 histórias → Proporcionam o medo

Mapeamento 3

Temos, assim, uma narrativa de terror estabelecida em um modelo cognitivo


idealizado, o vilarejo, no qual as situações se desenvolverão. O MCI de vilarejo nos
remete a um local pequeno, com várias casas e onde as pessoas se conhecem, pois
são vizinhos próximos. Pressupõe-se também uma atitude cooperativa, no qual os
membros da comunidade lutam pelo bem comum.
O autor-tradutor explica, em seu prefácio, que o leitor pode ler as histórias na
ordem em que desejar, sem prejuízo de compreensão. Descobrimos, à medida que
lemos, que as histórias estão interligadas por um ou mais elementos e personagens,
mas que a ordem, realmente, não interfere na interpretação nem no efeito estético.
Escolho, portanto, o primeiro trecho da primeira história para ilustrar o que pede o
enunciado do exercício.
Felika manda que as crianças comam depressa, antes que alguém
nos arredores sinta o cheiro da comida. Depois de tanto tempo sem
alimento, a família vizinha pode estar com o olfato aguçado e perceber que,
ao contrário de todos, eles ainda têm o que comer. As casas no vilarejo são
perigosamente próximas. (MONTES, 2015, p. 11).

Muitos espaços mentais são ativados ao lermos o trecho, mas, para ilustrar
como os domínios trabalham na organização de nossa compreensão, separo as
frases do trecho e explico alguns aspectos da teoria dos espaços mentais, de acordo
com o que expõe Kövecses (2006).
(1) Felika manda que as crianças comam depressa, antes que alguém nos arredores
sinta o cheiro da comida.
(2) Depois de tanto tempo sem alimento, a família vizinha pode estar com o olfato
aguçado e perceber que, ao contrário de todos, eles ainda têm o que comer.
(3) As casas no vilarejo são perigosamente próximas.

Um dos aspectos mais importantes da teoria dos espaços mentais é o que


chamamos de construtores de espaço. O advérbio “depressa”, na frase (1), sinaliza
a maneira como a qual Felika deseja que as crianças comam. Da mesma maneira,
mas abrindo outro espaço mental, a expressão “antes que” complementa o espaço
mental de URGÊNCIA na ação tomada na frase (1), levando o leitor a interpretar que,
seja o que estiver acontecendo, é matéria urgente. As expressões atuam como
construtores de espaços mentais, introduzindo espaços alternativos e contribuindo
para a interpretação da enunciação.
Outro aspecto da teoria dos espaços mentais é que eles são cognitivamente
reais. Mesmo que saibamos que o texto é um universo ficcional, os espaços mentais
representam modelos cognitivos de uma situação possível. Os mapeamentos entre
os espaços nos permitem compreender o texto ficcional, nos transportar para ele,
interpretá-lo e continuar com o nosso mundo real acontecendo em paralelo, sem
muito esforço cognitivo. Nos exemplos (1), (2) e (3), mesmo que tenhamos
consciência de que estamos em uma ficção, somos transportados pela história a um
momento no qual as pessoas do vilarejo estão passando fome, com exceção de
Felika e suas crianças. Aliás, o texto do autor abre espaços mentais tão eficazes que
convencem alguns leitores a acreditarem que ele realmente traduziu o livro, que o
prefácio é verdadeiro1.
A teoria dos espaços mentais tem por princípio fundamental o “princípio do
acesso”. Fauconnier (1997, apud Kövecses, 2006) explica que “uma expressão que
nomeia ou descreve um elemento em um espaço mental pode ser usada para
acessar uma contraparte daquele elemento em outro espaço mental”. Um exemplo
disso está no mapeamento 1: o Raphael Montes autor tem como contraparte o
Raphael Montes tradutor, que é também narrador do prefácio e voltará depois, no
posfácio, para encerrar a história da Sra. Elfrida, quem supostamente escreveu os
cadernos ilustrados.

1
O escritor Raphael Montes declarou em uma palestra realizada em 12 de junho de 2016, na Feira
Literária de Resende/RJ, que alguns leitores acreditam que ele mesmo tenha traduzido os livros. Essa
informação foi confirmada pelo autor através de contato pessoal na rede social Facebook.
Para finalizar a breve apresentação da teoria de espaços mentais, vamos
observar os diagramas de espaços mentais dos exemplos (1) a (3), conforme fez
Kövecses (2006) a respeito de Fauconnier (1997).
Considerando que a história é estruturada pelo MCI de NARRATIVA (ficcional), e
que outros espaços mentais já foram abertos dentro da narrativa para a montagem
de um universo próprio da história narrada, o exemplo (1) é considerado um espaço
base:
(1) Felika manda que as crianças comam depressa, antes que alguém nos arredores
sinta o cheiro da comida.

Espaço Base
 F
 C F = Felika
C = Crianças
MANDAR COMER F C

Figura 1 - Espaço
aberto pelo
exemplo (1)

Então, o espaço base é estruturado internamente pelo MCI de ALIMENTAÇÃO


HUMANA, no qual entendemos o valor de Felika enquanto mãe e organizadora do
momento de comer, porque ela “manda comer depressa”. Às crianças cabe o papel
de obedecerem. Por se tratar de uma narrativa ficcional, presumimos que Felika e as
crianças são personagens cuja história conheceremos mais adiante, conforme a
narrativa se desenrola.
Já na sentença (2) temos o espaço mental de possibilidade:
(2) Depois de tanto tempo sem alimento, a família vizinha pode estar com o olfato
aguçado e perceber que, ao contrário de todos, eles ainda têm o que comer.

Espaço Hipotético
 V
 O V = vizinhos
O = olfato
V PODE ESTAR O AGUÇADO

Figura 2 - Espaço
aberto pelo
exemplo (2) em
negrito
O verbo “pode” atuar como um construtor de espaços mentais, nesse caso
abrindo o espaço de possibilidade, que, por sua vez, está relacionado à ação do
espaço base (comer depressa, antes que os vizinhos percebam). Muitos espaços
mentais são abertos com os exemplos (1), (2) e (3) apenas. Entendemos, com a
leitura dessas 3 frases, independentemente dos espaços abertos pelo prefácio, que
Felika e sua família estão em uma situação difícil, no qual têm pouca comida e os
vizinhos talvez não tenham nenhuma. Isto posto, a vizinhança se torna perigosa
(exemplo (3)), pois pode estar com o olfato aguçado devido ao tempo que estão sem
comer. Toda essa informação está condensada em apenas 3 sentenças da
narrativa. O processamento cognitivo acontece on-line, à medida que se entra em
contato com a história. A teoria de espaços mentais dá conta de nos mostrar como
vários espaços conceptuais atuam em conjunto e ao mesmo tempo para
construirmos os significados dentro da narrativa.

REFERÊNCIAS

FERRARI, L. Introdução à Linguística Cognitiva. São Paulo: Contexto, 2011.

KÖVECSES, Z. Language, mind and culture: a practical introduction. New York:


Oxford University Press, 2006.

MONTES, R. O Vilarejo. Rio de Janeiro: Objetiva, 2015.

Vous aimerez peut-être aussi