2.

º LIVRO GRÁTIS ABRE-TE ComooMPconfrontouZeinalBava

CÉREBRO! MAIS 96 PÁGINAS TODOOINTERROGATÓRIO
DE QUEBRA-CABEÇAS AOEX-PRESIDENTEDAPT

GRÁTIS
O6
FASCÍCUL
DA LAGOA
DE ST.ºANDRÉ
A SAGRES
www.sabado.pt N.º 691 – SEMANAL – 27 DE JULHO A 2 DE AGOSTO DE 2017 – €3,20 (CONT.)

ALGARVE
LONGE DAS
MULTIDÕES
Lagoas silenciosas, praias com espaço,
rios calmos, paisagens belas. Refúgios
que se mantêm quase intactos mesmo
nos meses da invasão de turistas

PedrodeAlmeida, 72 anos
Vida e negócios do homem
que quer a Comporta
 Sumário 27 JULHO 2017
www.sabado.pt

Entrevista
Sociedade
CathrynRamin Ela tem a solução para as dores nas costas 30

Destaque
Algarve Três oásis longe do turismo de massas 34
Crónica Nuno Júdice escreve sobre o Barlavento 40
Descanso Santa Luzia e as ilhas da ria Formosa 42
Crónica Leonor Pinhão escreve sobre o Sotavento 48

Portugal

FOTOS GONÇALO F. SANTOS

76
Exclusivo O interrogatório a Zeinal Bava no caso Sócrates 51
Pedrógão Dinheiro não chegou ao fundo de reconstrução 58

DESDE A DÉCADA DE 70, O QUE MUDOU Nuclear Preso por exportar material proibido para o Irão 60
História O Verão Quente de 75 visto pela CIA 64
NOS NADADORES-SALVADORES
Mundo
Albino salvava os veraneantes, em Santa Cruz, com uma corda. André Iraque O novo dia-a-dia em Mossul 68
usa um cinto no Guincho. Histórias de quem passa a vida na praia
Dinheiro
Perfil Pedro de Almeida, o novo dono da Comporta 72
Destaque GPS Sociedade

34 Verão pede vinhos frescos

A nossa selecção (e de dois
Reportagem O que mudou na vida dos nadadores-salvadores
Criatividade A fórmula de sucesso inclui sestas e passeios
Turismo À boleia da digressão dos urban sketchers
76
82
84
sommeliers) de brancos, tintos,
rosés e espumantes. E ainda: Saúde A amoxicilina sabe a chiclete e as crianças adoram 87
entrevista a Família
Ahmad Ja- Livro Confissões de um mimado que não sabia fazer nada 88
mal e os
O ALGARVE QUE regressos Social
de Luc Moda Os sete estilistas que desenharam para a Dior 90
ESCAPA ÀS MASSAS
Besson
Desporto
Odeceixe, Estômbar e Fóia no (cinema)
CarlaCouto Ela foi a primeira portuguesa a marcar a Inglaterra 92
Barlavento; Santa Luzia e as ilhas e Bolaño
da ria Formosa no Sotavento (livros) Opinião

Foto de capa: Getty Images

E mais...
José Nuno João
6 Bastidores 14 Ângela Marques 94 Rui Miguel Tovar
Pacheco Rogeiro Pereira
8 Editorial 21 Pedro Marta Santos 96 Do Leitor
Pereira 70 Coutinho
9 A Abrir 27 Octávio Ribeiro
16 98
12 Nuno Costa Santos 28 Obituário

www.sabado.pt

Saúde 20 A 26 DE
10 sinais de que está + LIDAS JULHO
stressado
01. VIDA EM ÁFRICA
O corpo envia sinais –
Aera dourada para osportu-
físicos e psicológicos – guesesantesda independência
que devem ser ouvidos.
Descubra quais
02. CHESTER BENNINGTON
Amortedovocalista dosLinkin
Park
Ar condicionado
O frio é prejudicial 03. CÃES E GATOS
A temperatura no local Venda deanimaisem montras
de trabalho é essencial Oclubedelutapara tem osdiascontados
para produzir bem órfãosnaChina

4
 Opinião 27 JULHO 2017
www.sabado.pt

BASTIDORES
Procurámos, através do
que os locais sabem, desco-
briraquilo que, nestaaltura
do ano, é extremamente di-
fícil: um Algarve que não
esteja a abarrotar de pes-
soas. E conseguimos
B
As dicas
dos locais
poeta e professor Nuno Júdi-
O ce nasceu na Mexilhoeira
Grande, Portimão. O jornalis-
ta Carlos Filipe tem mãe algarvia, de
Santa Luzia, e por lá andou sempre.
A jornalista Leonor Pinhão é lisboeta,
mas Cacela é há longos anos, para
ela, uma espécie de segunda terra.
Para Gonçalo Correia, que é bem
mais novo do que todos eles e tem
feito férias na zona de Portimão,
“mas sem sair muito dali”, é que o
trabalho de capa desta semana foi
mais uma descoberta – as dicas de
locais levaram-no a sítios de cuja
existência, em alguns casos, não sus-
peitava. A contrastar com a tranqui-
lidade dos lugares que ia descobrin-
do, foi uma aprendizagem acelera-
da, feita ao longo de muitas dezenas

FOTOS RICARDO PEREIRA

de quilómetros em dois dias e meio.
Isso incluiu andar largos quilómetros
de noite (ia a fotógrafa Marisa Car-
doso ao volante) com as luzes apa-
gadas, por distracção, ao pé de La-
gos, para desespero e muitos sinais
de faróis de outros condutores. E in-
cluiu um regresso à infância: há mui-
tos anos, Gonçalo tinha ido com os
pais ao restaurante O Charneco, em
Estômbar. Agora já não encontrou o
patriarca (é a filha que está aos co-
mandos), mas foi com satisfação que
percebeu que o sítio está pratica-
mente igual àquilo de que se lembra-
va no que é essencial: a qualidade.
É do encontro entre descobertas re-
centes, memórias e o que se sabe há
muitos anos que se faz o tema de capa
desta semana, em que procurámos,
através do que sabem os locais, in-
cluindo chefsque lá trabalham, desco-
brir aquilo que, nesta altura do ano, é
extremamente difícil: um Algarve que
não esteja a abarrotar de pessoas. Mas
conseguimos: do Alto da Fóia às praias
dailhade Tavira, de EstômbaraCacela,
convidamo-lo a seguir-nos num per-
curso onde a tranquilidade e o silêncio
continuam aimperar(às vezes, é preci-
B so dizê-lo, dentro do possível, e reque-
Director Adjunto rendo um extrade paciêncianahorade
João Carlos Silva encontrarumamesa, porexemplo).
B g
Com fato e com equipamento Lis Watkins e
José Louro
Carla Couto prefere vestir-se de uma andaram sem-
maneira mais informal, mas para a pre agarrados
SÁBADO aceitou posar de fato com- às aguarelas: até
no carro dese-
pleto para um artigo sobre a selec- nharam Ricardo,
ção nacional feminina de futebol. António e
Com total disponibilidade, a ex-fute- Raquel
bolista fez uma primeira parte da
sessão com bola (meio vazia, quei-
xou-se) num parque ao pé de onde
mora, em Vialonga, e depois foi a
casa, num instante, trocar de roupa.
Apareceu vestida a rigor com um
equipamento da selecção para posar
outra vez para a fotógrafa Raquel
Wise. Veja as fotos e leia a entrevista
nas páginas 92 a 94.
B
Desenhos
Lis Watkins e José Louro, do projecto
Urban Sketchers, desenham mesmo
tudo: até a jornalista, o fotógrafo e o
motorista, no carro, a caminho da Ar-
rábida, uma reportagem para ler nas
páginas 84 a 86. W

6
 Do director
E
EDITORIAL
O mesmo Estado que há
quase 40 anos viu morrer
O Estado
um primeiro-ministro, sem
nunca ter apurado se foi
que nunca
atentado ou acidente,
não consegue agora
mais se
guardar as armas do seu
Exército ou determinar
levantou
com precisão o número
de mortos numa tragédia discussão bizantina sobre a
A lista de mortos do incêndio de
Pedrógão é uma poderosa
metáfora do estado a que chegou o
nosso Estado. O mesmo Estado que
há quase 40 anos viu morrer um pri-
meiro-ministro e um ministro da
Defesa, sem nunca ter apurado com
segurança se foi um acidente ou um
atentado, não consegue agora guar-
dar as armas do seu Exército e nem
sequer consegue determinar com
precisão número de mortos numa
tragédia.
Um Estado destes é sinónimo de
muitas coisas más: desperdiça os im-
postos que os portugueses pagam, é
permeável à corrupção, alberga ní-
veis de incompetência inaceitáveis,
não está habituado a prestar contas.
É um Estado dominado por cliente-
las corporativas e políticas, que con-
ta com a óbvia cumplicidade dos
partidos e dos governos que o toma-
ram de assalto e espalharam as res-
pectivas fidelidades por todo o lado,
incluindo as delicadas áreas onde
classicamente se exerce o chamado
poder do Estado, como a Justiça, Ad-
ministração Interna, Defesa e Negó-
cios Estrangeiros. Os critérios de
lealdade e confiança, essenciais para
o exercício de cargos públicos,
confundem-se hoje com vassalagem
e compadrio perante a complacên-
cia geral, resvalando esta para uma
cumplicidade insalubre no actual
quadro da maioria parlamentar.
Não se negam vantagens a algu-
mas das mudanças operadas pela
geringonça após a passagem trau-
mática da troika e um governo que
revelou um inaceitável fanatismo
ideológico em relação à austeridade.
Mas isso já lá vai. Agora, seria muito
E mais saudável para a vida pública e
Director política se as forças mais à esquerda
Eduardo Dâmaso cumprissem a função parlamentar
8
27 JULHO 2017
www.sabado.pt
com maior independência em rela-
ção ao PS e que este, por outro lado,
não ficasse refém de todas as agen-
das de BE e PCP. Se uns e outros fos-
sem mais autênticos talvez a política
não estivesse transformada no pân-
tano em que está. O PCP, em parti-
cular, entra já numa dimensão de
anedotário político. Não há nada de
mal que aconteça no País cuja culpa
não seja da União Europeia e das po-
líticas de direita impostas por Bruxe-
las. Cassete por cassete, a de Álvaro
Cunhal era muito melhor.
E
O regime de Ricardo Salgado
O ex-banqueiro foi brindado por
uma entrevista em dois jornais diá-
rios que merece ficar nos anais da
pouca vergonha. Os jornais que têm
como patrão o seu próprio advogado
– sem que as habituais carpideiras
das redes sociais rasguem as vestes
– destacam as suas brilhantes expli-
cações para a queda do clã: a culpa
foi do governador do Banco de Por-
tugal e de Passos Coelho, cujo gover-
no não salvou a família Espírito San-
to da desgraça.
Ricardo Salgado e os seus cúmpli-
ces ainda não compreenderam que
já não é possível tratar as pessoas e
as instituições com a soberba e a ar-
rogância próprias de quem mandava
em tudo. Como se vê nesta edição,
em mais um notável trabalho do jor-
nalista António José Vilela, Salgado
era o alfa e o ómega de uma casta de
gestores como Zeinal Bava e Henri-
que Granadeiro, punha e dispunha
de ministros e empresários, construía
maiorias societárias em empresas
como a PT na base do puro tráfico de
influências. Esse foi um mundo que
ruiu em 2014 e das poucas coisas que
tanto Carlos Costa como Passos Coe-
lho fizeram bem foi não ser coniven-
tes com essa podridão que minou os
alicerces do Estado português. O di-
nheiro que vai para a banca falida
não vai para o Serviço Nacional de
Saúde, para a Educação, para a pre-
venção e o combate a incêndios ou
mesmo para combater o crime. Sim,
porque Salgado e os seus amigos
gostam do Estado. Mas só quando é
grande e vampirizável através de ne-
gócios como o SIRESP. W
 27 JULHO 2017
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Asemana
A POLÉMICA
A “VIOLENTA” EXUMAÇÃO
DE SALVADOR DALÍ
Depois da extracção de ossos, dentes e unhas do artista, a Fundação Dalí diz que a ordem judicial é “um erro”

ESPANHA de Dalí, no Teatro-Museu Dalí, em rou cerca de hora e meia.

“Um acto de violência”, “improce-
dente”, “sem fundamento” e um
“erro judicial” é como os respon-
sáveis da Fundação Gala Salvador
Dalí classificam, em comunicado,
a polémica exumação do corpo
do pintor espanhol, que ocorreu
no passado dia 20, quase 30
anos depois da sua morte. Os
restos mortais foram exu-
mados por ordem de um
tribunal de Madrid para
um exame de determi-
nação de paternidade,
reclamada por Pilar
Abel Martínez, uma
vidente de 61 anos,
que assegura ser
filha do génio do
surrealismo.
Apenas 13 pessoas
– a quem foram re-
tirados telemóveis
para que ninguém
pudesse fotografar
– estiveram na sala
onde está sepultado
o corpo embalsamado
Figueras, na Catalunha, onde nas-
ceram tanto o artista como a sua
suposta filha. Depois de levanta-
rem a lápide de 1,5 toneladas, com
uma grua, foram extraídas amos-
tras de ossos, dentes, unhas e
cabelo – um processo que demo-
Depois de analisados pelo Insti-
tuto Nacional de Toxicologia de
Madrid, tutelada pelo Ministério
da Justiça, a fundação, que gere o
legado do pintor em nome do Es-
tado, exige a devolução dos restos
de Dalí para que o corpo conserve
a sua integridade.
Ao longo da história, houve
muitos mais mortos que
não descansaram em paz.
Reza a lenda que no sé-
culo XIV, D. Pedro I de
Portugal desenterrou D.
Inês de Castro, a sua
amante que foi assassi-
nada, e sentou-a no
trono, que não chegou
a ocupar em vida, para
uma cerimónia de
beija-mão.
A Igreja Católica, no
tempo da Inquisição,
tinha o hábito de de-
senterrar quem tivesse
escapado da fogueira
para lhes queimar os ossos.
Sónia Bento

GETTYIMAGES
AHISTÓRIA

Outras personalidades cujos cadáveres não descansaram em paz...

Quando o corpo de Dois meses depois de Em 2006, 220 anos
Napoleão Bonaparte ter morrido, a 25 de depois da morte do
chegou a França, em Dezembro de 1977, o famoso cantor de
1841 – 20 anos após a corpo de Charlie Cha- ópera italiano Carlo
sua morte, na ilha de plin foi roubado. Os Broschi, conhecido
Santa Helena – foi au- ladrões pediam um como Farinelli, os
topsiado. O pénis do im- resgate de €600 mil à seus restos mortais
perador desapareceu. viúva do comediante foram exumados. O
Em 1927, surgiu numa britânico, mas foram resultado foi descon-
exposição, em Nova apanhados ao fim de certante: Farinelli era
Iorque. Media 3,8 cm. cinco semanas. uma mulher.

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 27 JULHO 2017
Asemana www.sabado.pt

SÓNIA BENTO

A ENTREVISTA RenatoLeite
OdirectordaGlobalBlue, amaioropera-
doradomundodetax free (permiteaos
turistasextracomunitáriosfazercompras
com reembolsodoIVA), revelaquaissão
osestrangeirosquemaiscompram em
Portugal, ondeofazem eoquepreferem
O que tem atraído os norte-americanos a Portugal?
Tem a ver com o facto de Portugal estar a ser bem promovi-
do como destino turístico – pelo bom clima e boa gastrono-
mia – e com a criação de rotas directas de Boston e Nova
Iorque para Lisboa e Porto. Os EUA são um mercado que
nos últimos dois anos, e sobretudo em 2016, apresentou ta-
xas de crescimento acima de 50%.

Quais são as marcas portuguesas favoritas dos turistas?

A Boutique dos Relógios é uma das mais procuradas, assim como
a Perfumes & Companhia, a Fashion Clinic e a Worten.

De onde vêm os principais globeshoppers

de artigos de luxo em Portugal?
Os maiores compradores de tax free em Por-
tugal vêm de Angola – que continua com O que é que os angolanos
destacada liderança, com 36% do mercado –, compram?
Brasil, China, EUA e Moçambique. Em 2016, A procura é diversificada: tanto
houve uma alteração no top 5: entraram os compram na Primark ou na
EUA e Moçambique e saiu a Rússia. Zara, como na Louis Vuitton.
Ou seja, compram o barato e o
caro, mas o luxo tem mais
preponderância.

Quais são os turistas com mais

potencial de crescimento?
Os chineses, que são os que mais
compram e gostam do produto ca-
racterístico made in Portugal. Ape-
sar de em 2016 ter havido um au-
mento de 19% destes turistas em
Portugal, ainda não é um número
expressivo – são cerca de 183 mil.
Qual é a marca de luxo pre-
ferida dos globeshoppers?
A Louis Vuitton. Em Portugal
e em qualquer outro país.

Qual é o local mais procurado para compras em Lisboa?

A Avenida da Liberdade, depois o Colombo e o Freeport. A cidade do
Porto também tem crescido, com a abertura de marcas de luxo.

10
 27 JULHO 2017
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O marginal ameno

A PIRATARIA
O ANO A GuerradosTronos: 90
milhões de downloads

2030
A série da TV é a mais pirateada do
mundo. O primeiro episódio da sé-
tima temporada, que estreou a 16
O de Julho, foi alvo de 90 milhões de
Nuno Costa Santos downloads. Por países, os EUA do-
Escritor
A ALTURA EM QUE PORTUGAL minam (15,1 milhões), seguindo-se
Reino Unido (6,2 milhões), Alema-
Estamos a tratar PRETENDE ACABAR COM A SIDA nha (4,9) e Índia e Indonésia (4,3).
do assunto?
O ambiente político e me-
diático ainda está concen-
trado em Pedrógão Grande.
A SARDINHA
Porquê? Antes de mais, por
causa do Governo, que tem
gerido desastrosamente o
caso. Há relatos, publicados,
de pessoas que tudo perderam
e ainda esperam um apoio
concreto, material, palpável,
não a resposta tão tuga do “es-
tamos a tratar do assunto”. Por
causa da crítica violenta da
oposição, justificada em boa
parte pela forma arrogante
como o Governo a tem tratado
desde o início, mas que traz
consigo algumas fragilidades
evidentes. A primeira é ter co-
meçado demasiado cedo,
quando havia pouca informa-
ção disponível, revelando-se
um ataque furioso e de ética
questionável. A segunda é es-
quecer que o desastre tem raiz
antiga, com múltiplos executi-
vos e parlamentares com cul-
pas no cartório. Querer vender
a ideia de que tudo começou
agora é não ser sério.
Em ambiente de gente politi-
zada à direita, cheguei a ques-
tionar algum do armamento
crítico usado após uma catás-
A CAMISOLA
trofe com um número de mor-
tos suficiente para preocupar Froome ganha sem ganhar
qualquer pessoa com decência. Em 104 edições da Volta a (2006). Froome limitou-se
Agora já não há compreensão França, é a sétima vez que a ser regular depois de con-
nem moderação possíveis. A isto acontece: ganhar a pro- quistar a amarela na 5ª
conversa do “estamos a tratar va sem vencer uma única etapa, na Alta Sabóia, na
do assunto” não basta e torna- etapa. O britânico Chris qual ficou em 3º, e ven-
se ofensiva. Se o Estado não Froome sucede assim a Fir- ceu o Tour pela quarta
ressarcir quem de direito com min Lambot (1922), Roger vez. À sua frente, com
eficácia e rapidez estará a ser o Walkowiak (1956), Gastone cinco triunfos, estão
incendiário de si próprio. W Nencini (1960), Lucien Ai- Jacques Anquetil, Eddy
mar (1966), Greg LeMond Merckx, Bernard Hi-
(1990) e Óscar Pereiro nault e Miguel Indurain.

12
 PT Empresas, uma marca do grupo

A REDE QUE É PARCEIRA PARA

P
PARCERIA

CRIAÇÃO
NEGÓCIOS

Há projetos e há projetos que, em parceria com a PT Empresas, saem do papel

e se tornam realidade. A PT Empresas é a rede que apoia os empreendedores
portugueses com um conjunto de soluções para a criação e para o crescimento
 
   
   

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 27 JULHO 2017
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Bom gosto, mau feitio

A VACA
Qatar resolve a falta de leite OTALENTO
No início de Junho, o chegam de países
Qatar foi alvo de um como Hungria, EUA, Desde 2001, a
bloqueio por parte de Austrália e Holanda. percentagem de
quatro países vizi- chineses que
nhos, que acusaram o
O emirado de apoiar
estudaram no
Ângela Marques grupos extremistas e estrangeiro e
Jornalista
terroristas. Um dos voltaram a casa
problemas criados foi subiu de 15% para
Os campeões a falta de leite fresco,
da pré-época que era importado da
80%. O plano Mil
Arábia Saudita. Para Talentos quer
Quando o dérbi da maré baixa co- acabar com essa si- reverterafugade
meçoueunãoconseguiaverbalizas tuação, um grupo cérebros e ajudar
aocampomas játinhao meu lugarna de empresas do Qatar
central. Num sistema táctico de 1-1- decidiu agora impor-
ao crescimento
-logo-se-vê, aequipados miúdos en- tar 4 mil vacas, que económico.
frentavaos experientes “tio Arnaldo” e
“pai, é falta, pai”. Com dois avançados,
zero defesas e muita manha, os mais
velhos apontavam àgoleada.
Enquanto recebia o troco da bola-
A DROGA
-de-berlim, vi o primeiro golo. A Canábis vendida em farmácias
bola bateu no montinho de areia e O governo uruguaio tor- no Instituto de Controlo de
conquilhas antes de entrar e, acto nou-se o único do mundo Canábis. Cada um deles
contínuo, um dos miúdos correu a plantar, produzir e ven- pode comprar no máximo
atrás do esférico que já corria para der marijuana (uma deci- cinco gramas, no valor de
o mar. Tio Arnaldo 1, Sport Clube são que pretende comba- 187 pesos (6 euros). Estão
Ingenuidade zero. ter o narcotráfico). A medi- ainda registados 6.929 cul-
De drible adolescente, o Afonso e da entrou em vigor a 19 de tivadores (podem ter seis
o primo faziam o que podiam – re- Julho, em apenas 16 farmá- plantas) e 63 clubes (onde
clamavam de cada toque como se cias, e abarca 4.959 cida- cada membro pode consu-
do outro lado estivessem caceteiros dãos uruguaios registados mir 480 gramas por ano).
e alegavam irregularidades a cada
golo sofrido. Os mais velhos sor-
A CIRURGIA

Americanos são os
riam, puxavam dos galões da anti-
guidade e aumentavam a diferença.
Em três jogadas bem conseguidas,
O NÚMERO campeões das plásticas
Os EUA registaram 4.042.610 ci-
contudo, os miúdos empataram.
Numa jogada de mestres, pediram
que o golo seguinte decidisse os
vencedores. Decidiu: o primo do
Afonso fintou o pai, pôs a bola no
Afonso, este rematou do meio da
praia e marcou. Com a cara a en-
675,5
MILHÕES DE EUROS GASTOS POR
PORTUGAL NA IMPORTAÇÃO DE
rurgias plásticas em 2015, o
maior número a nível mundial.
Essas operações levaram a in-
vestir 13,7 mil milhões de euros,
quase tanto como o PIB da Islân-
dia. Em 2º lugar surge o Brasil
(2.324.245 cirurgias), seguindo-se
cher-se de espanto e o peito a en- FRUTA, CITRINOS E MELÕES, EM 2016 a Coreia do Sul (1.156.234).
cher-se de ar, o Afonso correu para
o mar de braços abertos, devolven-
do para terra o grito dos campeões.
Da toalha, vi tudo: a alegria do
miúdo vinha da surpresa de ganhar.
O RESISTENTE
O bicho que aguenta com um asteróide
Ele ganhara ao pai e ao tio, futebo-
listas de tantos Verões, donos da Não medem mais de 0,5 mi- asteróide como o que aca-
bola, heróis. Ele não contava com límetros, mas são os animais bou com os dinossauros. Um
aquilo porque não sabe que a pré- mais resistentes do mundo. estudo feito por um grupo
-época dele já acabou. Agora pode Os tardígrados, ou ursos de de astrofísicos, e publicado
jogar de igual para igual e ganhar. W água, podem sobreviver a na revista Scientific Reports,
272 graus negativos, supor- concluiu que só a morte do
tar 1.200 atmosferas e até um sol acabaria com eles.

14
www.edp.pt

ANÚNCIO AOS INVESTIDORES

DA EDP RENOVÁVEIS
EDP lança Oferta Pública geral e voluntária de Aquisição
sobre o capital da EDP Renováveis

PRAZO LIMITE PARA ACEITAÇÃO DA OFERTA

Os accionistas da EDP Renováveis poderão vender as suas
acções na Oferta até às 15h00 do dia 3 de Agosto de 2017

TERMOS DA OFERTA
• Objecto: Todas as acções da EDP Renováveis não detidas pela EDP
– Energias de Portugal, S.A.
• Preço por acção: €6,75 em numerário (€6,80 no dia do anúncio preliminar
da Oferta já deduzido do dividendo de €0,05 por acção disponibilizado
para pagamento pela EDP Renováveis no dia 8 de Maio de 2017)
• A liquidação da Oferta deverá ocorrer no dia 8 de Agosto de 2017
• A EDP admite requerer a exclusão de negociação das acções da EDP
Renováveis do mercado Euronext Lisbon by Euronext Lisbon caso a EDP
venha a deter, em resultado da Oferta, mais de 90% dos direitos de
voto da EDP Renováveis

Consulte o seu banco para mais informações e para dar as suas ordens de venda.
Não dispensa a consulta do prospecto e da demais documentação da Oferta, disponíveis em
www.cmvm.pt e www.edp.pt
 Opinião
ALAGARTIXA
E O JACARÉ
Sem futebol, o espaço que é
preciso encher nas televi-
sões é um drama. Sem par-
lamento e com os políticos a
banhos, não há política, as
fontes estão a secar ao sol.
Sem tragédias, espera-se, o
exercício da masturbação
da dor, a que se entrega ar-
dorosamente a comunica-
ção social até ao espasmo
final, ficapenoso
O
Professor
José Pacheco Pereira
16
O
Sem futebol, o espaço que é preci-
so encher nas televisões é um drama.
A época tola Sem parlamento e com os políticos a
banhos, não há política, as fontes es-
tão a secar ao sol. Sem tragédias, es-
Lá vamos entrar mais uma vez na pera-se, o exercício da masturbação
silly season, a época tola, ou melhor da dor, a que se entrega ardorosa-
a época mais tola na sequência de mente a comunicação social até ao
muitas outras épocas tolas. E o me- espasmo final, fica penoso.
lhor da época tola é a parte que não A estação tola tem pelo menos um
esconde o que é: o Quim Barreiros, a mérito, que é mostrar a vacuidade
Rosinha, a Ruth Marlene, e os múlti- que existe todo o ano e que fica dis-
plos clones de cada um deles. Aquilo farçada. W
ainda é Portugal, a manha campo-
nesa, a lascívia rural e do subúrbio, a
grosseria e o plebeísmo, a graça do O
trocadilho fácil, a juventude da cer-
veja, uma certa boçalidade e bruta-
lidade, aquilo ainda é nosso, porque
Elogio
Portugal ainda é muito assim. Isso
suporta-se razoavelmente e o título
das eleições
destas crónicas veio da habitual re-
ciclagem anual na música pimba,
autárquicas
com o refrão de “quem nasceu para Eu tenho respeito pelas eleições au-
lagartixa nunca chega a jacaré”. tárquicas, tidas por muita gente
Pode merecer uma reflexão sobre o como eleições secundárias em que
que ainda somos, nós e muitos ou- participam uns grunhos que fazem
tros europeus que vêm para o Algar- cartazes a que chamam “tesourinhos
ve, ou Torremolinos, mas não mere- deprimentes”. São as mais democrá-
ce desdém. ticas das eleições, em que participam
Mas o que é insuportável é a silly como candidatos dezenas de milha-
season comunicacional, feita da res de portugueses, muitos dos quais
mais completa falta de imaginação, têm aqui a sua única experiência
os mesmos inquéritos, as mesmas
imagens das praias, a procura dos
famosos em fato-de-banho, as equi-
pas cor-de-rosa atrás dos amores de
Verão, “assumidos” e não “assumi-
dos”, a moda da comida e dos res-
taurantes, o reino das fotos no Insta-
gram e no Facebook , as opiniões e
os comentários raivosos que nunca
vão para férias parecem explodir de
intensidade no Verão. Pensam que
descansam? Engano, a época tola faz
imenso mal à cabeça e a cabeça nos
mamíferos superiores ainda manda
um pouco no corpo. Um pouco, no
Verão menos.
SUSANA VILLAR

pessoal e subjectiva da vida demo-
crática. Tem todos os defeitos das
outras eleições, clubite, partidarite,
compadrio, corrupção, tráfico de in-
fluências, promoção de incompeten-
tes e carreiristas, falta de imaginação,
mas só o número de pessoas envol-
vidas já mostra o seu mérito. E de-
pois, são muito menos controladas
pelos aparelhos partidários dos gran-
des partidos que estão todos, PS e
PSD, dominados por oligarquias.
Candidatos mudam de partido de
uma para outra eleição, ou concor-
rem como independentes se o parti-
do não os quis candidatar, ou são ge-
nuínos candidatos à margem do sis-
tema partidário. Seja como for, há
um movimento mais profundo e di-
nâmico de representação, que per-
mite ao eleitor escolher quem quer
com mais liberdade do que nas listas
legislativas fechadas à participação
independente, e com os lugares de
eleição segura já definidos. Isto signi-
fica que de eleição para eleição há
cada vez mais listas e mais “produ-
tos” eleitorais, cartazes, programas,
panfletos, contrariando a escassez
cada vez maior do discurso político
nas legislativas que não seja de puro
marketing. W
27 JULHO 2017
www.sabado.pt
O
Trump
e o tradutor
da Google
…estão feitos um para o outro. O
@realDonaldTrump enviou mais
uma série de tweets enfurecidos
com os alvos habituais. Aqui vai um
exemplo:
“It’s very sad thatRepublicans, even
some thatwere carried overthe line
on my back, do very little to protect
theirPresident.”
É muito triste que os republicanos,
mesmo alguns que foram levados
pela linha das minhas costas, fazem
muito pouco para proteger seu pre-
sidente.
Mais:
Os republicanos, de facto, já mostra-
ram que não têm vergonha nenhuma
e deixam-se, assim, humilhar. Salvo
uma ou duas excepções, e uma delas
é McCain que está bastante doente,
engolem estes insultos e pressões e
vão lá a correr dar-lhe o que ele quer.
Até agora ainda não correram bas-
tante, mas quanto mais Trump se es-
força para os humilhar, mais correm.
Não, este não é o Partido Republicano
de Reagan nem de Bush, é o Partido
Republicano que foi quebrado na sua
“linha de costas” pelo Tea Party e que
Trump tomou de assalto. W
17
 Asemana

AS FRASES F
Ricardo Salgado, banqueiro, Dinheiro Vivo/DN
“Na primeira vezque foram a minha casa vinham
à procura dos iates, em Monte Carlo. Não há iates,
nunca houve. Ah, e não há castelos na Escócia, também
foi outra coisa que disseram que eu tinha”

F F F
José Soeiro André Ventura Katherine Waterston
“O governo pode e deve intervir “Sem mais PSP, farei um Actriz, uma das protagonistas
de Alien: Covenant,
para travar este comportamento exército com a polícia municipal” The Guardian
abutre da Altice” Candidato do PSD à Câmara
Deputado do Bloco de Esquerda, ARTV de Loures, Sol “Vivemos numa
época hiper-
F F sexualizada
Luís Marques Mendes
Guilherme d’Oliveira Martins mas de grande
“A intervenção do Estado numa “Quem tem de aplicar as leis
empresa privada restringe-se ao são as autoridades e quem puritanismo”
cumprimento das leis” prevarica, evidentemente,
Secretário de Estado das Infra-estruturas, tem de ser punido, seja cigano,
ARTV seja muçulmano, seja um
português qualquer normal”

F
Adão Silva
“Foram vocês, socialistas, que
usaram e abusaram de todos nós,
em actos de marialvismo
económico que hoje estamos
todos a pagar, que desbarataram
uma empresa num caldo de
negócios obscuros”
Deputado do PSD, ARTV
F William Oldroyd
Nuno Miranda
“Morre-se mal em Portugal. Os
hospitais estão mal preparados
para a fase final”
Médico do IPO de Lisboa, Diário de Notícias
F Simone de Oliveira
Miguel Esteves Cardoso
“Passeando de carro por Lisboa
divirto-me a brincar com a Maria
João ao ‘onde está o lisboeta?’
São tantos os turistas que é
difícil encontrar figuras
estereotipicamente alfacinhas”
Cronista e escritor, Público
Comentador, ex-líder do PSD, SIC
F F
Dane DeHaan
“Quando vesti o fato especial pela
primeira vez senti-me um herói.
Quando acendi as luzes foi ainda
mais especial”
Actor de Valerian, msn.com
D.R.
GETTYIMAGES
Ildefonso Falcones
“Hoje, não se aceita que um filho
morra e a mãe não sofra”
Escritor, autor do bestseller A Catedral
do Mar, Diário de Notícias
F
“Talvez as mulheres do século XIX
não fossem assim tão diferentes
das de hoje”
Realizador do filme Lady Macbeth, i
F
“Hoje é mais aflitivo eu andar
na rua do que era nessa altura
[anos 70], por muito estranho que
pareça. Às vezes, só de burca”
Cantora, i
F
Ney Matogrosso
“Que gay o caralho. Eu sou
um ser humano”
Cantor, Folha de São Paulo

20
 27 JULHO 2017
www.sabado.pt

O moralista
F F
Amy Schumer, actriz, Wayne Shorter
The David Letterman Show “Para mim, nem a Nona
Sinfonia de Beethoven
“A minha mãe está terminada”
dá-me péssimos Saxofonista, El País
O
conselhos. F Pedro Marta Santos
Jornalista e argumentista
Mariana Pacheco
Parecem frases “Gosto muito pouco de redes Os louros de César
tiradas de sociais”
Actriz, BI
Ementrevistanopassadosábado
autocolantes. ao Expresso, Carlos César, o me-
lhorservidorda causa pública que
F
Depois de me Maya
este País já conheceu, recusou-se a
comentar os cargos por nomeação
separar “Precisei de me casar ou eleição políticade metade dapo-
várias vezes para pulação açoriana, perdão, de 73,5%
disse-me: perceber que o dasuafamília. “Paramim, o assunto
casamento não era
‘Ama para mim”
está encerrado”, respondeu na cos-
tumeiraprobidade institucional.
como se Taróloga e apresentadora,
TV Guia
Para mim também, não fosse a
coincidênciade terjantado, hácoisa
nunca te de 15 dias, em frente ao presidente
F do PS no balcão do Galeto, o restau-
tivessem Jordi Mestre rante lisboeta de tradição familiar
magoado!’ “Neymar não vai sair este
Verão. Posso garanti-lo
quase tão remotaquanto ade César.
Como o balcão do Galeto dá para
Ou então é: a 200 por cento”
Vice-presidente do Barcelona,
umas boas dezenas de clientes,
lembro-me de me ter posto a pen-
‘Dança como a negar uma suposta oferta
de 222 milhões do PSG pelo
sar na beleza democrática que seria
ver todas essas cadeiras ocupadas
se ninguém jogador, El País
pela família de César, exemplo de
estivesse F
dedicação ao Estado e à felicidade
das populações.
a ver!’” Ricardinho
“Foi lamentável ter sido
De uma Ponta Delgada à outra, o
balcão seria como uma tela viva da
ameaçado no hotel por alegria lusitana, um Malhoa com
adeptos do Sporting, horas pronúncia de Nemésio, feito de
antes da final [da UEFA], brindes à militância cívica entre a
para tentarem intimidar-me” mulher Luísa, ex-líder da missão
Jogador de futsal da equipa para a Casa da Autonomia, o filho
espanhola Inter Movistar, i
Francisco, deputado regional, a
nora Rafaela, chefe de gabinete da
F secretária regional adjunta para os
Octávio Machado Assuntos da Presidência, o irmão
“Bruno de Carvalho Horácio, ex-assessor de Jaime
tem ciúmes do que ganham Gama e ex-adjunto de João Soares,
os jogadores” a sobrinha Inês, técnica da empresa
Ex-director do Sporting, CMTV municipal Gebalis e ex-assessora
da gestão socialista da Junta de
F Freguesia de Alcântara, com Carlos
Bruno de Carvalho ao centro, o sorriso de gato de
“O Octávio foi a terceira escolha” Cheshire emoldurado pela Grã-
Presidente do Sporting, Sporting TV Cruz da Ordem Militar de Cristo
que recebeu em 2013. Desfeita a
GETTYIMAGES

festa, por favor, deixem-no traba-

lhar, que a Nação precisa. W

21
A FOTOGRAFIA

Predadores também na água

Um jaguar persegue um peixe num aquário do Jardim Zoológico de
Pessac, nos arredores de Bordéus, na quinta-feira, dia 20. Dois jovens
felinos, chamados Catalina e Mato, com dois e um ano, respectivamente,
são as novidades do zoo e o seu habitatartificial inclui uma piscina com
cerca de 100 metros cúbicos onde os visitantes podem ver como as suas
capacidades predatórias não ficam diminuídas num ambiente aquático.
FOTO MEHDI FEDOUACH/AFP/GETTY IMGES
www.sabado.pt
 27 JULHO 2017
Asemana www.sabado.pt

DINA ARSÉNIO

INSÓLITO !

Gato de 14 kg faz sucesso

Quando o sr. Bonito – como foi apelidado – chegou
ao abrigo de animais de Chatham County, em Pitts-
boro, nos Estados Unidos, os funcionários não acre-
ditaram que pudesse ter sido abandonado. Razão:
pesava 14 kg. Para tentar encontrar o dono partilha-
ram uma foto do animal no Facebook – que acu-
mulou mais de 14 mil partilhas e 3 milhões de gos-
tos. Fez tanto sucesso que os internautas até pensa-
ram que a imagem tivesse sido editada.

! ! !
Morto reencarna Salsichasnotelhado UM FÃ DA SÉRIE GUERRA DOSTRO-
num bezerro Em Deerfield Beach, na Flórida
NOS, JIM HAMPSHIRE, VESTIU-
Todos os dias, cerca de (EUA), uma família acordou às
100 pessoas visitam 4h da manhã com barulho. Di- -SE A RIGOR COMO WHITE
um bezerro em Kratie, rigiram-se ao exterior da casa e WALKER, UMA PERSONA-
no Camboja. Khim encontraram dois pacotes de GEM MALÉFICA, NA ABER-
Hang, de 74 anos, salsichas de porco italianas.
acredita que o animal Mas havia mais: no telhado es-
TURA DO FESTIVAL COMIC
seja a reencarnação do tavam três pacotes de salsichas. CON, EM SAN DIEGO, EUA.
marido. “Ele faz tudo Ao todo, eram 15 kg – da marca VÁRIAS PESSOAS JUNTAM-
exactamente igual ao William Land Service, uma em- -SE NO EVENTO IMITANDO AS
que o meu marido presa em Alabama. É um mis-
fazia”, conta. tério como ali apareceram.
SUAS PERSONAGENS PREFERIDAS.

! !
€857.000 Destroem carro da mãe Mulhertraídapõe
Walter Fisher, de 36 anos, Um miúdo de 5 anos conduziu o pimentanavagina
jogador profissional de carro da mãe, com o irmão de 2
póquer, pesava mais de 110 anos ao lado. Queriam chegar a ca- 1. Grávida, Ly Chanel, de
quilos. Os colegas desafia- sa dos avós, mas despistaram-se. 23 anos, descobriu que o
ram-no para reduzir em marido, Chien Keo, de 24,
10% a gordura corporal – estava a ter um caso com
em apenas seis meses. A ! outra num motel de Thai
aposta inicial era de 515 mil Marijuana para limpar ruas Nguyen, no Vietname.
! euros, mas depressa subiu Um empresário de drogas medicinais 2. Furiosa, decidiu vin-
Homem cai no lixo para 857 mil euros. Walter criou o programa do “dia da limpeza”: gar-se. Introduziu, com lu-
Os bombeiros de Wa- conseguiu e perdeu mesmo oferece, por cada saco de lixo, marijua- vas de látex, malaguetas
shington DC, nos EUA, 30 quilos. na – que é legal em Maine (EUA). no interior da vagina da
receberam uma chamada amante com a ajuda de
de um homem que se en- mais três amigas, que a
contrava dentro da calha ! agarraram.
de lixo do prédio onde Concurso para avós em biquíni 3. As imagens da tortura
mora. O incidente ocor- Na cidade de Tianjin, na China, realizou-se o terceiro foram publicadas online e
reu quando o homem concurso anual Grandbikini, que juntou mais de 400 geraram indignação junto
deitou acidentalmente o mulheres, com idade superior a 55 anos. Apresenta- dos internautas. Porém,
seu telémovel juntamente ram-se em biquíni e fato-de-banho e foram avaliadas até ao momento não foi
com o lixo. Ao inclinar-se pela presença em palco, sorriso e gestos. A partici- apresentada nenhuma
para o procurar, caiu. pante mais velha, Ma Jin, tem 78 anos. queixa na polícia.

24
FOR THE SERIOUS TRAVELLER

Yanin,
Fashion Blogger

LISBOA - Avenida da Liberdade LEVE E ROBUSTA, VERDADEIRAMENTE.

PORTO - Clérigos
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 Asemana

INDISCRETOS

A incrível pele
do doutor Coelho
k de Manuel Pinto Coelho e acabou
“REI DAS HORMONAS”
O diário britânico Daily Mail apre-
sentou-o como “guru do antienve-
lhecimento” na reportagem de três
páginas baseada na experiência
pessoal de Jane Fryer. A jornalista
de 48 anos fez um tratamento hor-
monal de uma semana na clínica
O CARTOON
impressionada com o aspecto do
médico de 69 anos: “Bronzeado de
mogno, pele elástica, olhos bri-
lhantes, relógio enorme e as mãos
mais bem tratadas que já vi.” E
mais uma coisa: realça a “impossi-
bly smooth skin” – pele impossi-
velmente lisa.

k
Presidente de volta
e uma velha paixão
“O presidente está de tazes. Mas não nos
volta.” É este o lema equivoquemos: o ca-
sob o qual Valentim rismático ex-presiden-
Loureiro regressa aos te da Liga de Clubes k k
combates autárquicos,
24 anos depois da sua
mantém a velha fixa-
ção por outras tonali-
Com o Algarve Um indicativo
primeira vez. O antigo dades. Basta, aliás, re-
cheio de políti- inadequado
autarca de Gondomar parar no nome que es- cos, muitos “Por uma Lisboa onde se pode cir-
já tem página no Face- colheu para a candida- artistas prefe- cular” – reza um cartaz da candi-
book e adoptou o ver- tura em 2017: “Valen- rem o Alentejo. data do PSD a Lisboa.
de (da esperança?) tim Loureiro – Cora- Há dias, Tim, Não seria melhor “Por
para o fundo dos car- ção de Ouro”. uma Lisboa onde se
dos Xutos, mui- possa circular”? Afinal,
to discreto, o indicativo, diz o
saboreava uns prontuário, “apre-
percebes no senta a acção ou
estado como
Rocamar, para real”. E o con-
os lados do juntivo “apre-
cabo Sardão. senta a acção
ou estado como
possibilidade”.

26
 27 JULHO 2017
www.sabado.pt

Sobe&Desce

Octávio Ribeiro
Jornalista

g
Nádia Piazza
Mãe do Luís, de cinco anos
A morte do fi-
lho é dor conti-
da pela causa
que está a abra-
çar. Breve sota-
que brasileiro,
olhos profundos,
macerados, pa-
lavra justa, pode
tornar-se um símbolo da re-
volta dos cidadãos contra a
opacidade e insensibilidade
do Estado após a tragédia
de Pedrógão Grande. E pode
apontar-nos a todos o indi-
cador. Depois das mortes de
dezenas de concidadãos te-
mos o dever de exigir me-
lhores respostas aos eleitos.

k k
Mota in, Júlio
out(para já)
José Lopes da Mota, o ex-repre-
sentante português na Eurojust,
foi o procurador mais bem clas-
sificado no concurso de acesso
ao Supremo Tribunal de Justiça
(STJ) e vai ocupar uma das pri-
meiras vagas de juiz do STJ. Por
sua vez, Júlio Pereira, o ainda se-
cretário-geral do Sistema de In-
formações, ficou em quarto lugar
entre os procuradores. E como
em cada cinco vagas de juiz só
uma será para procuradores,
Júlio Pereira só chegará ao STJ
à 19ª vaga.
Galhofa
na Caparica
Na passada terça-feira, a
secretária-geral adjunta dos
socialistas e coordenadora
autárquica, Ana Catarina
Mendes, e um grupo de cole-
gas parlamentares almoça-
vam no restaurante Cabana
do Pescador, na Costa de Ca-
parica. Muito animados, tira-
ram fotografias e publicaram
nas redes sociais. Um deles
disse: “Cuidado, não ponham
a localização. É escusado
saber-se que viemos almo-
çar à praia.” E todos se riram.
i
António Costa
Primeiro-ministro
À deriva com
os seus dois cal-
canhares de
Aquiles quebra-
dos. Está um lí-
der frágil a vo-
gar nas ondas
sem rumo. A
economia sus-
tenta-o à tona? Sim. Mas o
resto mostra-se mau de mais
para ser verdade. Verdade, a
palavra-chave. Costa está a
fugir dela desde que se ba-
nhou no Mediterrâneo no
meio da crise de autoridade.
Inaceitável que o segredo de
justiça tenha abrangido os
nomes das vítimas mortais
do fogo. Cheira a Fidel.

27

Asemana
OBITUÁRIO
Chester Bennington (1976-2017)
Tornou-se uma das maiores vozes
da sua geração ao cantar sobre os
seus traumas de adolescência.
Arrastou milhares e ganhou
prémios, mas nunca largou os
seus fantasmas. Um dia, cedeu
m 2000, aos 24 anos, Ches-
E ter Bennington tinha chega-
do ao topo do mundo. Pouco
mais de um ano depois de entrar
nos Linkin Park, a banda califor-
niana havia atingido o sucesso glo-
bal com o seu disco de estreia,
Hybrid Theory. O álbum entrou di-
rectamente para o pódio das tabe-
las norte-americanas e um ano de-
pois de ser editado já tinham sido
vendidas mais de cinco milhões
de cópias – é, ainda hoje, o disco
de estreia mais rentável do século
XXI. Além disso, o single Crawling
venceu um Grammy em 2002 e
os poderosos berros de Bennin-
gton tornaram-se um dos símbo-
los maiores do movimento nu-
-metal, género que mistura o
heavy metal e o rap.
Ninguém diria que em 1998, dois
anos antes da estreia dos Linkin
Park, Bennington esteve prestes a
desistir da música, frustrado com o
insucesso das bandas por onde
passara. Vivia com a mãe e traba-
lhava num Burger King. Mas Ches-
ter precisava da música e da sua
poesia, locais de refúgio dos trau-
mas que desenvolvera durante a
infância e adolescência, marcadas
pela toxicodependência, pela rejei-
ção do pai e por abusos sexuais.
“Crescer foi, para mim, muito as-
sustador e muito solitário”, afirmou
em 2014 à revista Metal Hammer.
Filho de Susan Elaine Johnson,
uma enfermeira, e Lee Russell
Bennington, um detective que se-
guia casos de pedofilia, o vocalista
dos Linkin Park nasceu e cresceu
em Phoenix, Arizona, onde viveu o
início da deterioração emocional
quando, aos 7 anos, um adulto co-
meçou a abusar dele sexualmente.
28
“Isso destruiu totalmente a minha
autoconfiança”, confessou em
2008 à revista Kerrang! Com me-
do de represálias, acabou por não
dizer a ninguém que estava a ser
vítima de violação, e os abusos
continuaram até aos seus 13 anos.
Para piorar tudo, aos 11 anos atra-
vessou um violento processo de se-
paração dos pais. Ficou sob custó-
dia do pai, que o deixava muitas
vezes sozinho em casa
para ir trabalhar dois
turnos. Foi nessa al-
tura, quando estava
entregue a si pró-
prio, que desenvol-
veu vícios de mari-
juana, álcool,
ópio, cocaí-
na, metan-
fetaminas
e LSD. À re-
vista Metal
Hammer, Ben-
nington explicou a
rotina que criara em
casa do pai: “Costuma-
va fumar crack ali, para
depois meter metanfetami-
nas acolá. Sentava-me e
entrava em pânico. Depois,
acalmava-me com ópio”.
Curar demónios
No meio de tudo isto, escrevia
poesia e desenhava. Também
ouvia muita música, e era espe-
cialmente obcecado pelos De-
peche Mode e os Stone Temple
Pilots. Em 1993, aos 17 anos, foi
viver com a mãe e começou a
ter as primeiras bandas. Os ver-
sos que escrevera sobre as suas
dores de crescimento transfor-
maram-se em canções. Acabou
por perceber que queria viver
da música.
A vida de Chester Bennington
mudou quando enviou uma casse-
te para Mike Shinoda, Brad Delson
e Rob Bourdon, que procuravam
um vocalista. Acabou por ser con-
27 JULHO 2017
www.sabado.pt
ALEXANDRE R. MALHADO
AOS 7 ANOS vidado para uma audição. De um
COMEÇOU dia para o outro, o rapaz de Phoe-
A SER nix voou quase 1.000 quilómetros
VÍTIMA DE até à Califórnia e, em frente aos
VIOLAÇÃO. seus futuros colegas de banda, can-
OS ABUSOS tou aos berros, sem medos, intimi-
CONTINUA- dando os outros candidatos à vaga.
RAM ATÉ Assim nasceram os Linkin Park.
AOS 13 ANOS Sete discos depois, com mais de
70 milhões de cópias vendidas, os
Linkin Park conseguiram levar “a
colisão do hard rock e do hip-hop
ao seu auge comercial e estético”
– palavras de Jon Caramani-
ca do The New York Times.
Se a história da adoles-
cência de Bennington
conta o nascimento dos
seus traumas, a trajec-
tória dos Linkin Park
narra a sua batalha.
Através da sua voz
rouca, que tanto tem
de doce como de agres-
siva, cantou para afastar
os seus males – mas aca-
bava por curar os demónios de
quem o ouvia. “Se eu não cantar
abertamente sobre os meus as-
suntos, a minha mente não é um
lugar seguro”, disse à revista Rock
Sound. “Sabe bem deitar tudo cá
para fora”, acrescentou.
No dia 21 de Julho, Chester Ben-
nington morreu por enforcamento
auto-infligido, confirmou o Depar-
tamento Médico-Legal de Los An-
geles. Tinha 41 anos. Além de seis
filhos e uma mulher, a voz dos
Linkin Park deixou um legado
de compreensão: não só foi o
frontman de uma das bandas
mais determinantes da sua ge-
ração, como também foi o
porta-voz de legiões de fãs
que se identificavam com o
que ele escrevia.
Tristeza, solidão, insegu-
ranças, isolamento, depres-
são... Bennington cantou so-
bre todos esses demónios
– afinal viveu-os a todos
intensamente. W
LUIS GRAÑENA
PORTO.
UMA COLEÇÃO INVICTA,
REPLETA DE CHARME.

Pendente 49€ | Brincos S 29€ | Anel 39€

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 Entrevista
Escreveu o primeiro livro aos 40, preocupadacom o que acontece ao cérebro
nameiaidade. Dez anos depois, em Maio de 2017, publicou o segundo,
Crooked, OutwittingtheBackPain IndustryandGettingon theRoadto
Recovery, inspirado nasuaexperiênciacom dor nas costas. Por LucíliaGalha
CATHRYN JAKOBSON RAMIN
“Cuidardeum cão
éboaterapiapara
asdoresnascostas”
e 7 em cada 10 pessoas so-
S frem de dores nas costas
em Portugal, é bem prová-
vel que seja esse o seu caso.
Existem boas e más notícias. As
más: “Há um número enorme de
agentes nesta indústria e todos eles
querem um pedaço de ti para man-
ter viva a indústria e as portas
abertas”, diz, sem rodeios, Cathryn
Ramin. A autora e jornalista de in-
vestigação americana, que falou
com a SÁBADO ao telefone a partir
da sua casa, na Califórnia, refere-se
a cirurgiões, farmacêuticas e tam-
bém aos quiropráticos – que, neste
caso, não são a solução, diz. Inves-
tigou o assunto durante seis anos,
falou com 600 pessoas (entre pro-
fissionais e pacientes) e descobriu
que a solução para a dor nas costas
é mais simples do que parece. “A
dor não significa dano e é possível
recuperar.” Saiba como.
Porque é que as pessoas com
dores são más a tomar decisões?
Os estudos científicos mais recentes
mostram que, em pessoas com dor
crónica, há regiões do cérebro que
são afectadas. Como o córtex pré-
30
F -frontal, responsável pela função
“Muitas
pessoas têm
excesso de
trabalho e
desequilíbrio
executiva, e o núcleo accumbens,
que tem a ver com a motivação e
com o sistema de recompensa. O
que significa que estas pessoas,
além de terem dificuldade em to-
muscular, mar boas decisões, também têm di-
não fazem ficuldade em recuperar. Não se
exercício que conseguem lembrar do tempo em
as fortaleça” que eram funcionantes e falta-lhes
a motivação para mudarem.
A dor nas costas é uma das 10
principais causas de incapacida-
de ao nível mundial. O que explica
a dimensão do problema?
Tornámo-nos uma sociedade
sedentária, com falta de exercício,
maus hábitos (especialmente na for-
ma e no tempo em que estamos sen-
tados) e uma má postura. Muitas
pessoas têm excesso de trabalho e
Back desequilíbrio muscular, não fazem
whisperer nenhum tipo de exercício que os
É alguém que fortaleça. Temos a ideia de que
compreende podemos ir ao ginásio duas ou três
como o corpo vezes por semana e que isso vai
funciona, em parti-
cular a estrutura
resolver o problema, mas não.
das costas, e faz a
reabilitação atra- Quando e por que razão come-
vés do exercício çou a investigar este assunto?
Comecei a ter dores nas costas aos
16 anos, caí de cavalo – era uma óp-
tima cavaleira –, e essa lesão nunca
se resolveu totalmente. Comecei a
ter dores nas costas e espasmos e
experimentei várias terapias: fui a
quiropráticos, fiz ioga, Pilates, fisio-
terapia, etc. Tudo sem sucesso. Em
2008, fiz uma ressonância magnéti-
ca e uma pequena cirurgia que não
foi bem-sucedida. Depois da cirurgia
procurei outro fisioterapeuta, espe-
cialista em problemas ortopédicos, e
ele pôs-me finalmente no caminho
certo: indicou-me um especialista
em exercício que equilibrou o meu
sistema musculoesquelético.
Como?
Fortalecendo os músculos que es-
tavam enfraquecidos e libertando
aqueles que estavam tensos. Resul-
tou, e eu continuei a ver esse espe-
cialista e a treinar regularmente:
nado duas vezes por semana, faço
passeios todos os dias com o meu

cão – recomendo vivamente que
pessoas com dores nas costas, que
tenham meios para cuidar de um
cão, vão a um abrigo, adoptem, e
dêem um passeio com ele várias
vezes por semana. É uma boa
terapia para as dores nas costas, e é
bom para o cão também.
No seu livro diz que existem pelo
menos 22 formas de tratar as do-
res nas costas, mas poucas são
realmente eficazes.
A artrodese [imobilização da coluna
através de qualquer forma de fusão],
por exemplo. As pessoas que fazem
esta cirurgia continuam a ter dores
nas costas. Frequentar um quiroprá-
tico durante meses, ou anos, tam-
bém não é eficaz: não há evidência
de que a manipulação quiroprática
previna as dores nas costas ou que
resolva as dores crónicas. Se a pes-
soa tiver um problema de início re-
cente, por vezes, uma visita pode
resolver e relaxar os espasmos dos
músculos, mas não é com isso que
eles ganham a vida. Também as in-
jecções de esteróides epidurais não
têm evidência científica. Qualquer
abordagem que envolva mãos (acu-
punctura, massagens, etc.), sem o
acompanhamento de um programa
de exercício supervisionado, não vai
resolver o problema, é um remendo.
A medicação para a dor também
não é uma boa solução?
A medicação permite um alívio
imediato da dor, mas hoje sabe-se
que o uso de altas doses de opiói-
des no tratamento da dor crónica
conduz a uma hiperalgesia induzi-
da por opióides, ou seja, estes me-
dicamentos, em vez de tirarem as
dores ainda as aumentam.
Fez um inquérito a 100 médicos,
com a pergunta: “Faria uma ci-
rurgia à coluna?”
Foi uma questão dirigida só a cirur-
giões que operam a coluna, em re-
www.sabado.pt
g lação à questão da dor. Todos res-
Cathryn Ramin é ponderam que não, excepto um.
casada e tem dois
filhos. Divide o Isso diz muito sobre aquilo que é
seu tempo entre preciso saber sobre este assunto.
a Califórnia e
Nova Iorque
Como foi o processo de investi-
gação para este livro?
Foi exaustivo, a maioria das entre-
vistas foram feitas pessoalmente.
Implicou muitas viagens (Polónia,
Inglaterra, Espanha, Coreia do Sul,
etc.), o que não é fácil para uma
pessoa com dores de costas, mas
durante o processo de escrita fui-me
apercebendo melhor da mecânica
do corpo e consegui controlar a dor
fazendo exercício regularmente.
Tecnologias
O uso excessivo Houve histórias de doentes que
de telemóveis, em a marcaram?
vez das idas ao No livro descrevo a história de uma
parque infantil, mulher de 60 anos que fez uma in-
pode ter como
consequência
jecção epidural de esteróides [uma
uma fraca das terapêuticas para a dor lombar]
estrutura muscu- para aliviar uma dor ciática.
loesquelética Quando a dor voltou, pensou que Q
31

Entrevista
Q seria útil fazer outra. Não estava
incapacitada, era uma mulher activa,
andava 8 quilómetros por dia, mas
estava a chegar o Natal e os netos e
ela queria garantir que se sentia bem.
Depois da nova injecção, ficou para-
lisada da cintura para baixo. Pensa-
mos que estas terapias são seguras,
mas não é bem assim. Estas situa-
ções são extremas. A maioria são
pessoas que já experimentaram
muita coisa e não melhoraram ou
aquelas que estão confusas sobre o
que devem fazer. Escrevi este livro
para as ajudar.
Conte-me alguns episódios
importantes nestes seis anos.
A minha viagem a Espanha, em No-
vembro de 2009, para conhecer
Francisco Kovacs, que tem um pro-
grama bem-sucedido e financiado
pelo Governo que trata as dores nas
costas sem medicamentos e sem ci-
rurgia. Fui a Maiorca, onde fica uma
das suas clínicas. Passei o dia a ver
pacientes. Um deles era um homem
muito velho, que trabalhou ardua-
mente toda a vida. Quando entrou,
mal conseguia andar. Foi tratado
com uma terapia chamada neurore-
flexologia – um tipo de acupunctura.
Envolve colocar grampos, como os
de um agrafador, nas costas ao lon-
go de certos pontos nervosos. Curio-
samente, apesar de parecer que dói
muito, não é bem o caso: este ho-
mem, que mal conseguia andar
quando entrou, saiu pelo seu próprio
pé. Fiquei muito bem impressionada.
Diz que “não há ninguém que
nos vá consertar, cada pessoa é
que se conserta a si própria”. O
que é que isso quer dizer?
Cuidarmos de nós é essencial, de-
senvolver um programa de exercí-
cio e mantê-lo e não ser ingénuo
pensando que se pode viver sem
ele. A rapidez com que se resolve o
problema depende de muitas coi-
sas mas, segundo a minha expe-
riência, mais do que quatro dias
sem fazer exercício significam vol-
tar a ter dores nas costas. A dor nas
costas não é algo que se cure, é
uma condição crónica e episódica
que nos vai afectar sempre, de uma
maneira ou de outra.
32
g Pensa que o exercício pode
O primeiro livro resolver a maioria das situações
que publicou,
Carved in Sand de dor nas costas?
(2007) tornou-se Sim, e talvez se deva deixar de
um bestseller do pensar neste problema como uma
New York Times
condição médica e começar a tra-
tá-lo como um problema de falta
de mobilidade, em que há uma
progressiva falta de cuidado com
os músculos e com a estrutura es-
quelética.
Como se faz a distinção entre
uma dor nas costas comum, que
pode ser tratada sem ajuda
médica, e um problema grave?
As situações de dores nas costas
que realmente exigem ajuda médi-
ca são fraqueza progressiva, como
o foot drop [quando uma pessoa
arrasta o pé ao caminhar e com-
pensa levantando o joelho mais
alto do que o costume], falta de
sensibilidade que se vai agravando,
um trauma (causado por um aci-
dente), infecção, um cancro ou um
Limitação problema chamado síndroma da
Mais de 400 mil cauda equina, que é uma compres-
portugueses
faltam ao trabalho,
são de nervos na medula e que
pelo menos uma pode causar disfunções na bexiga e
vez ao ano, por nos intestinos. É uma emergência
sofrerem de médica. O resto tem de ser visto
dores nas costas caso a caso mas, se depois de sair à
27 JULHO 2017
www.sabado.pt
rua para passear o seu cão come-
çar a sentir uma dor nas costas, o
mais provável é que não tenha um
problema médico.
Como é que o design de um es-
paço, como um local de trabalho,
pode intervir positivamente
neste problema?
A ideia é movimentarmo-nos tanto
quanto possível e, quando nos sen-
tamos, adoptarmos uma posição
intermédia, entre o sentado e o le-
vantado, para que o peso passe
para as pernas e faça menos pres-
são sobre a coluna. Em Sillicon
Valley, as empresas estão determi-
nadas em aumentar a mobilidade
dos seus trabalhadores. Em alguns
casos, construíram-se trilhos pe-
destres e as pessoas têm reuniões
enquanto dão um passeio com os
seus chefes. Também há empresas
que construíram uma espécie de
balcões, cantinhos onde se pode
estar de pé e apoiar o portátil, e
noutras já nem é preciso usar o
computador porque há monitores
por todo o lado.
Como está agora?
Estou bem, tenho um sério com-
promisso em não me sentar por
períodos muito longos ou ir mu-
dando de posição, porque a melhor
posição é sempre a próxima.
Mesmo quando está sentada?
Sim. Tenho uma cadeira ergonómi-
ca Herman Miller e uma secretária
que se adapta ao meu corpo, tem
uma abertura que permite muita
flexibilidade na forma como me
sento. É uma embody desk. Tam-
bém tenho uma coisa chamada
backmax, que consiste em três col-
chões em forma de triângulo que
me permitem reclinar e trabalhar
ao mesmo tempo. Tenho o cão, que
resgatei, e que insiste que o leve a
passear a cada três horas, aconteça
o que acontecer, e também faço
exercício quatro vezes por semana.
Outra coisa que uso é um backjoy,
uma espécie de assento ergonómi-
co que levo comigo sempre que
saio de casa. Ajuda-me a ter uma
boa postura esteja onde estiver e a
não sentir dores nas costas. W
Todos os dias 700 novos clientes
escolhem o Banco CTT
O Banco que começou do zero, não pára de crescer e já conquistou 200.000
clientes. Os portugueses perceberam que um banco jovem, com ideias novas,
pode ser mais competitivo. Por isso agradecemos a confiança que diariamente
depositam no Banco CTT e assumimos o compromisso de continuar a fazer
a diferença com produtos e serviços simples, transparentes e sempre próximos
da vontade dos nossos clientes.
Porque o que nos move é o que move os portugueses.

Valor apurado com base na média diária de novos

clientes, entre 1 de janeiro e 13 de julho de 2017.
Destaque

h
Odeceixe,
mesmo
na fronteira
com o Alentejo

ALGARVE. O QUE AINDA ESCAPA À GRANDE VAGA DO TURISMO
TRÊS OÁSIS A
BARLAVENTO
Odeceixe, Estômbar, Fóia. Três nomes que não rimam com o Algarve
tomado de assalto pela grande migração de Julho e Agosto. Aqui ainda
é possível estar longe da multidão. PorGonçalo Correia (texto) e Marisa Cardoso (fotos)
A
estatística é esmagadora: a popu-
lação do Algarve, perto de 500 mil
pessoas, triplica nos meses de Ju-
lho e Agosto. Passa a milhão e
meio, ou mais. Sendo assim, pare-
ce que o sossego se torna impossí-
vel. Mas, na verdade, não. Há oásis.
Siga-nos em três viagens a um “outro Algarve”, calmo
e com espaço: na fronteira com o Alentejo, num re-
canto fluvial semiescondido e mesmo no alto da serra
de Monchique. E, a rematar, uma crónica do poeta
Nuno Júdice, sobre o Algarve que faz parte dele.
1 ODECEIXE, APRIMEIRA
VILADO ALGARVE
sto é óptimo para famílias. É lindo, muito calmo e
“
I as pessoas são extremamente simpáticas. A foz
do rio, que desagua no mar, é óptima para as
crianças brincarem, para estar em família. Foi tam-
bém por isso que quisemos vir para cá.” Felix e
Kathrin, 41 e 40 anos, estão entre os muitos turistas
que, de Verão, trocam os países do Norte da Europa
por Portugal. Vindos de Colónia, Alemanha, voltaram
este ano – “pela quarta ou quinta vez” – a passar fé-
rias em Portugal. Escolheram a primeira vila costeira
do Algarve, Odeceixe, que faz fronteira com Odemira
e o Alentejo, para trazerem o filho mais novo, ainda
bebé, com quem passeiam depois de almoço, no
27 JULHO 2017
www.sabado.pt
O MUSEU DA centro da vila, quando o tempo começa a descobrir,
BATATA- após os habituais inícios de manhã nublados.
-DOCE, QUE Pequeno paraíso balnear, afastado da azáfama das
É TUDO ME- grandes cidades algarvias, a freguesia do concelho de
NOS MUSEU, Aljezur ganha turistas no Verão – de famílias a surfis-
É UMA DAS tas e bodyboarders que procuram a beleza natural das
ATRACÇÕES praias do concelho, como as de Odeceixe (considera-
LOCAIS da uma das sete maravilhas balneares de Portugal e
melhor praia de arriba portuguesa), Arrifana, Monte
Clérigo ou Amado. Muitos destes turistas ficam nas
Casas do Moinho, conjunto de habitações típicas e re-
cuperadas, situadas ao lado do Moinho de Vento da
vila, que dinamizam o turismo rural na freguesia.
É no Verão, aliás, que muitos dos locais “fazem o
seu pé de meia para o Inverno”, conta Fábio Glória,
Qualoproduto
pescador e bodyboarder, 31 anos, que fornece peixe
a alguns restaurantes da região e com quem a SÁBA-
algarviodeque DO conversou. Há muito conhecedor de Odeceixe –
maisgosta? “uma vila muito calma”, onde nasceu, cresceu e se
O meu ingre- tornou pescador, primeiro a acompanhar o pai, de-
diente favorito
este ano é o ou-
riço-do-mar.
pois sozinho –, Fábio quis seguir a paixão pelo mar:
“Ia com o meu pai e já gostava. Depois acabei os
estudos, o 12º, e ou ia para a faculdade ou seguia a
Encontra-se em pesca…”, conta.
quase todos os
mercados locais. Do amendoim à batata-doce
O pescador-bodyboarder, que se tornou conhecido
Hans Neuner, fora da vila por ter ajudado a salvar duas crianças in-
chef do Ocean, glesas do mar, na praia de Odeceixe, em 2015 (“estava
duas estrelas cá fora, com um amigo, e vi-as em dificuldades. Fui
Michelin buscar a prancha e os pés de pato e fui auxiliá-las”),
passa ali os Invernos e os Verões e conhece bem a Q
35
 Destaque
Q diferença entre as duas estações: “De Inverno Ode-
ceixe fica muito envelhecida e com muito poucas pes-
soas. Já não é a vila de há 20 anos, com negócios pró-
prios. Hoje vive-se do turismo no Verão. E isso tem um
lado bom e um lado mau”, acrescenta.
“De Inverno vive-se muito da agricultura e da pesca,
não há muita gente”, corrobora Raul Gonçalves, dono
do restaurante Dorita, cujo terraço-esplanada fica
mesmo sobre a praia de Odeceixe, por entre as casas
de praia, sobretudo brancas e azuis, muitas com flores
à entrada, e já a alguma distância da vila. Lá, junto ao
mercado, entre o Largo do Povo e a Rua Estrada Na-
cional, vêem-se muitas crianças a brincar, à hora de
almoço. Uma delas canta, ininterruptamente, Cindere-
la de Carlos Paião.
Raul vive ali desde pequeno, altura em que o pai de-
cidiu rumar a Odeceixe para abrir um restaurante, que
já não existe, junto à praia também. E tem boas me-
mórias da região: “Lembro-me de ir ajudar o pai da
minha namorada na apanha do amendoim”, recorda,
sorridente. Um produto outrora “muito conceituado”
na região, hoje mais conhecida por ser a capital da
batata-doce, cuja variedade local (lyra), produzida
PÃO DO ROGIL
-DOCE LYRA,
Na freguesia do Rogil, Aljezur, está um dos me-
lhores segredos do Algarve: a padaria-pastela-
ria Pão do Rogil. Fica junto à EN 120, a meio ca-
minho entre Odeceixe e Aljezur, a escassos EM ALJEZUR,
metros do quiosque Já Disse, local de afama-
dos percebes. Quem gere o espaço é Anabela
Claro, filha dos pioneiros Manuel e Isabel, que
abriram uma padaria no Rogil em 1965 – quan-
do os sacos de farinha ainda vinham “em bur-
ros, do moinho”, conta a actual dona.
Além de muitos produtos de venda para fora
– que distribuem já para todo o País –, há pão
artesanal cozido em forno de lenha, de vários
sabores (aveia, batata-doce e batata-doce com
noz); empadas (de espinafres e mozarela, de
alheira de caça e grelos e de cozido algarvio) e
ainda pastéis de nata de batata-doce, alfarroba
e beterraba.
Restaurante Mi-
gu’s, em Tavira.
São deliciosos.
36
h
No Sítio das
Fontes, junto
a Estômbar, os
passeios de caia-
que são gratuitos
até 25 de Agosto
A BATATA- entre Odemira e Aljezur, tem fama internacional.
Tal como o amendoim, também a batata-doce che-
VARIEDADE gou, contudo, a estar ameaçada. Alvo de muitas imi-
QUE SÓ SE tações e falsificações, foi com a formação da Associa-
ENCONTRA ção de Produtores de Batata-doce de Aljezur que o
produto, sazonal (colhido após o Verão, preferencial-
TEM FAMA mente entre Setembro e fim de Outubro ou início de
INTERNA- Novembro) e regional (o clima ameno e a proximida-
CIONAL de do mar favorecem a produção), conseguiu ganhar
a Indicação Geográfica Protegida (IGP), atribuída pela
União Europeia.
Podendo acompanhar pratos de carne e de peixe e
sendo usada em pastelaria e padaria (ver caixa ao
lado), a batata-doce de Aljezur é um ingrediente que
muitos locais não dispensam e com que muitos turis-
tas se deparam em cafés e restaurantes, como o Cha-
parro ou a Taberna do Gabão, mas também no Mu-
seu da Batata-Doce, localizado na freguesia do Rogil
e que, na verdade, é mais café, restaurante, pastelaria
e loja de produtos do que museu. Também o festival
anual celebra o produto. Decorre em Novembro, em
Aljezur, e recebe mais de 30 mil visitantes por edi-
ção, sendo ali vendidas, em média, mais de 20 tone-
Melhor sítio ladas de batata-doce lyra por ano.
paracomer
umxerém?
2 UM PARAÍSO FLUVIAL
EM ESTÔMBAR
ste é um outro Algarve.” Sentados em cadeiras
Albano
Lourenço,
chef do Vistas
“
E de praia, sobre a relva, com um grupo de ami-
gos, Carlos Martins e Ana Paula, 65 e 55 anos,
respectivamente, apreciam a paisagem do Parque Mu-

nicipal do Sítio das Fontes, um paraíso natural semies-
condido (ver foto acima), que fica a 5 km de Estômbar,
concelho de Lagoa, e junta uma paisagem idílica a um
ambiente familiar.
O cenário é de fim de manhã e vêem-se já muitas
famílias e grupos de amigos a preparar o almoço –
uns de cerveja e sanduíches na mão, junto às mesas e
aos bancos de madeira do parque, outros perto do
churrasco, disponível para quem preferir um pique-
nique mais elaborado. Um pouco abaixo, junto a uma
pequena lagoa, que parece uma piscina natural, há
quem aproveite para dar os últimos mergulhos matu-
tinos enquanto outros aproveitam para fazer um pas-
seio, gratuito, de caiaque (até 25 de Agosto, a câmara
de Lagoa garante o material e os monitores) pela
margem do rio Arade, que se cruza com a lagoa.
O espaço amplo, com cerca de 18 hectares, tem aco-
lhido múltiplos acontecimentos, exposições (montadas
num antigo edifício rural ali existente, hoje restaura-
do), concertos (há um anfiteatro ao ar livre que aco-
lheu, recentemente, um festival de música, o Lagoa
Jazz Fest) e eventos de actividade física (o espaço in-
clui um percurso com vários pontos para exercícios),
além dos já referidos, e mais mundanos, piqueniques e
excursões de banhistas.
“Arriscar a vida” em Ferragudo
Enquanto algumas crianças brincam no parque infantil
ali existente – sob o cuidado dos pais, que vão toman-
do banhos de sol, sentados ou deitados na relva –,
ouve-se, a interromper a tranquilidade, um cântico:
“Mão direita, mão direita, é penálti.” Com sotaque al-
garvio, pois claro.
27 JULHO 2017
www.sabado.pt
O CHARNECO
Restaurante pequeno, familiar
e sem ementa (o cliente não
escolhe os pratos, só se deli-
cia com eles), o Charneco ser-
ve um dos melhores menus
de degustação do Algarve,
por €25 e composição variá-
vel, consoante a estação.
Fundado pelo patriarca ho-
mónimo, que tem pelas pare-
des desenhos e fotografias
suas ao lado de alguns famo-
sos que por ali passaram (de Rosa Mota a Paulo Portas e a Álvaro
Cunhal) –, o espaço mudou há três anos para as mãos da filha, Mar-
ta, quando o pai sofreu um acidente que o incapacitou.
“Só podia ser eu a assumir, porque cresci aqui: conheço o vende-
dor de peixe, o produtor de tomate…”, explica Marta Charneco, 36
anos. Em Estômbar, Lagoa (a 2 km do Sítio das Fontes), e só ao jan-
tar, é provável que ali encontre patanisca de raia, carapaus alima-
dos ou ovas de choco. No Inverno, chegarão “os enchidos ou o co-
zido de couve”.
Cenário bem diferente vive-se a oito quilómetros
dali, em Ferragudo, uma vila do concelho de Lagoa,
onde fica a Única – Adega Cooperativa do Algarve,
que tem vindo a reposicionar a região como zona vi-
Qualo melhor nhateira, ganhando prémios com vinhos como Por-
sítio para ches Rosé 2013 e Reserva Lagoa Branco 2013, e que
comprar pão inclui uma galeria artística com mais de 3 mil metros
no Algarve? quadrados, no piso superior da adega, que também
No restaurante, justifica a visita. Além, claro, das mais de 40 praias
temos produção do concelho (entre balneares, naturais e selvagens) e
própria de pão,
do Algar de Benagil. Esta imponente gruta está situa-
mas para casa
compramos da numa pequena praia de água azulíssima, em Be-
sempre na Casa nagil, também no concelho de Lagoa, apenas acessí-
do Pão, em Faro. vel por barco e com uma vista arrebatadora.
Mal se entra na vila piscatória, os barcos e as muitas
gaivotas, a voar ou a repousar na água, ocupam a pai-
Leonel Pereira,
sagem. As embarcações turísticas transportam pes-
chef do São
soas à marina de Portimão, a Silves e às rochas e gru-
Gabriel, uma
estrela Michelin
tas próximas. As pequenas embarcações de pesca re-
gressam a terra depois de uma manhã de trabalho.
Como aconteceu com Paulo Ventura, 27 anos, que,
quase de sardinha na mão, conta que a pesca é “o ne-
gócio que sustém a zona”, onde se apanha muito “sa-
fio, também salmonetes mas um pouco de tudo” e
que a actividade no Inverno é “para arriscar a vida. O
NO ALGAR mar está sempre revolto, passa-se mais tempo em
DE BENAGIL terra do que em mar”.
ENCONTRA- Vítor, 56 anos, ainda a mexer no anzol e no peixe
-SE UMA DAS apanhado, tem outra ideia: “No Inverno apanha-se
PAISAGENS mais peixe, vende-se é menos. No Verão o peixe vale
MAIS o dobro; no Inverno somos roubados”, queixa-se.
BONITAS DO Na zona ribeirinha da vila – que, afirma Luís Alber-
ALGARVE to (presidente da junta de freguesia eleito pelo PS Q
37

Destaque
Q e a cumprir o terceiro, e último, mandato), tem “sa-
bido manter as suas tradições”, apostando “na pesca,
no turismo e no comércio” como sectores centrais –,
os restaurantes começam a encher, à hora de almo-
ço. Desde logo o A Ria ou o Sueste, onde se come um
óptimo xerém, prato típico algarvio.
3 O CUME DO ALGARVE
ainda mal amanheceu, é cedo, avistam-se
A poucos turistas, mas num dos pontos de
subida para a Fóia, o ponto mais alto do
Algarve, bem no cimo da serra de Monchique, José
António Florenço, de 86 anos e boné na cabeça,
monta o seu estaminé de produtos regionais para
venda – dos licores à fruta, bolos, potes de mel
e bolachas de amendoim.
“Daqui a pouco não há aí sítio para estacionar”, dirá,
falando dos muitos turistas que sobem aos 902 me-
tros de altitude e param no caminho, para fotografar a
imperdível vista, onde o verde dos montes de serra
substitui o azul e o creme tipicamente algarvios – e
balneares. E voltará ao assunto: “Se o turismo acabas-
se morria aí tudo à fome.”
Antes, porém, José António Florenço começará por
olhar os montes: “Moravam aí dezenas de pessoas…
desapareceu tudo. Não se vê ninguém. Uma pessoa até
38
27 JULHO 2017
www.sabado.pt
100% HAPPY
Dizem que são filhas da laranja algarvia e que
foi ela que lhes mudou a vida. Mara Santos e
Miriam Ferreira, 35 e 36 anos, respectivamente,
estavam “com muita vontade de mudar, cansa-
das dos trabalhos”. Formadas em Psicologia e
efectivamente “filhas da laranja” – o pai da pri-
meira é produtor, o da segunda dirige a Coope-
rativa Agrícola de Citricultores do Algarve –, co-
meçaram a desenhar a 100% Happy em 2016.
Idealizaram um quiosque, mas acabaram por
desenhar uma carrinha móvel, onde vendem
os seus sumos de laranja (a €1,50 o copo, de
250 ml) mas também de limão, além de outras
bebidas, como os granizados, os gins e os chás.
g tem medo de andar aí pelo campo.” Antigamente, con-
Fóia é o ponto ta, “as pessoas viviam do campo e da agricultura. De-
mais alto da serra
de Monchique e pois, para vender, passaram a ter de estar colectadas.
do Algarve. Fica Iam-se colectar para vender duas sacas de batatas e
a 902 metros três quilos de feijão?”, pergunta, retoricamente.
de altitude
Mágoas portuguesas, encantos estrangeiros
Há 23 anos que Florenço ali vende produtos – o que
consegue arranjar, a julgar pelo aspecto pouco sofis-
ticado da banca. “Comecei na altura em que tive um
Ondecomprar
produtos
acidente que me deixou com 80% de incapacidade.
Trabalhei 46 anos e descontei 42 anos – mas o meu
patrão ficou-me com o dinheiro de uma data de
anos de desconto. É assim…”, acrescenta, ressentido.
típicos?
No mercado de Stefan, 53 anos, e Ingrid, 54, não parariam ali. Se-
Portimão, há o guiram directos para o cume da Fóia e para o mira-
melhor peixe de douro cimeiro, situado mesmo à frente do snack-
Sagres, fruta do bar/cafetaria Planalto, onde alguns turistas repousam
Sotavento, legu- na esplanada. Vieram da Bélgica e passam férias em
mes do Barla- Portugal há quatro anos. “Já fomos à Madeira, a
vento, enchidos, Coimbra, ao Porto e a Lisboa”, contam.
milhos e outros Desta vez, quiseram descer ao Algarve e subir à ser-
grãos da serra. ra. “É o ponto mais alto, é único. Tem uma vista lin-
da”, diz Stefan. No País e na região, uma das galinhas
Rui Silvestre, chef dos ovos de ouro do turismo nacional, só vêem coi-
do Bon Bon, uma sas boas: “É bom para andar de bicicleta, jogar golfe,
estrela Michelin fazer caminhadas, nadar… para tudo.” W
Watch Planet SA - 21 342 83 08

MODELO COLAR SIN

MODELO PULSEIRA SERPENT
MODELO RELÓGIO MATCHCORD STYLE
# POLICELIFESTYLE
 Opinião
CONVIDADO
Não sou dos que dizem mal de tudo: o
tempo tem as suas consequências, boas e
más, e muito se aprendeu com o mau para
restituir qualidade à vida que continua. O
que não muda, porém, é a natureza e a
paisagem deste Barlavento; e quanto mais
se avança para oeste, ou se sobe para o in-
terior, mais o intocado nos surge
Este é
o Algarve
que faz parte
de mim
O Barlavento estende-se de Albu-
feira a Sagres, passando pela mi-
nha cidade, que é Portimão. Era aí
que eu ia, nas férias de Lisboa dos
anos 60, ver cinema, jogar bilhar e
esperar pelos jornais da manhã
que só chegavam no comboio da
tarde, trazendo as inaugurações do
venerando. O mundo é outro, hoje,
e o turismo transformou muita coi-
sa, a começar pelo mercado que
deixou de ser um belo edifício da
arquitectura regional do século XX
para se deslocar para um novo lo-
cal, mas onde se continua a sentir
a vida do campo e da pesca nas
bancas de fruta e legumes e no es-
paço do peixe e dos mariscos, a ver
de terça a sábado, quando chegam
frescos dos barcos ou da pesca ar-
tesanal. Não sou dos que dizem
mal de tudo: o tempo tem as suas
consequências, boas e más, e mui-
to se aprendeu com o mau para
restituir qualidade à vida que con-
tinua. O que não muda, porém, é a
natureza e a paisagem deste Barla-
vento; e quanto mais se avança
para oeste, ou se sobe para o inte-
O rior, mais o intocado nos surge,
Poeta apesar dos indispensáveis parques
Nuno Júdice eólicos e das residências de foras-
teiros construídas, com maior ou
40
menor gosto, sobre antigos casais
do tempo em que havia agricultura
e quinteiros.
Duas direcções se podem tomar:
a que sobe até Monchique, poden-
do seguir-se a estrada que vai da
Penina até à Senhora do Verde,
passando pelos túmulos pré-histó-
ricos de Alcalar, hoje bem recupe-
rados, mas onde ainda entrei ras-
tejando até ao interior. Eram aven-
turas que se faziam a partir da Me-
xilhoeira Grande, onde mantenho
a casa do meu bisavô, construída
em 1902. A partir da Senhora do
Verde, onde havia uma capela ar-
ruinada da época manuelina,
abre-se uma estrada por vezes ín-
greme, levando aos Casais e daí às
Caldas e a Monchique. São terras
que a interioridade conservou,
cruzando a arquitectura algarvia
de muros de cal e platibandas
mouriscas com vivendas que lem-
bram chalés suíços, aparentemen-
te contrários à imagem de um Al-
garve quente: mas o Inverno des-
ses tempos em que se procurava
cura nas águas vulcânicas das Cal-
das era bem frio, o que explica
essa importação arquitectónica; a
outra direcção é que nos leva de
Lagos que é, com Silves, uma das
mais bem preservadas cidades do
Barlavento, embora quase só se
ouça falar estrangeiro nas suas
ruas, lojas e restaurantes, até Sa-
gres. Mas não podemos ir sem pa-
rar em Vila do Bispo com um te-
souro barroco nos azulejos da
igreja quase sempre fechada e, de-
pois do almoço na Pensão Correia,
apanhar a estrada para o Castelejo.
A paisagem faz-nos sair deste
mundo, como se uma natureza
que tenta resistir ao vento nos im-
pedisse de avançar. Ali havia fi-
gueiras quase deitadas, com os
troncos dobrados pela força das
nortadas; hoje é uma vegetação
rasteira, e arbustos que mal saem
do chão. Antes do Castelejo, com
as suas falésias e pedras de ardósia
a evocar o princípio do mundo,
podemos virar por uma estrada de
terra até atingir um miradouro so-
bre longas extensões de areia e ro-
chedos quase virgens, ao longo de
um oceano que nos desafia com a
imponência de ondas que atraem
os surfistas e os apanhadores de
percebes: os primeiros resistem à
água, os outros vão caindo, de vez
em quando, e nem a memória se
lhes aproveita, mas talvez fosse

VIRGÍLIO RODRIGUES
bom lembrar a habilidade que é
preciso para apanhar esse marisco
que nos faz sentir o sabor primitivo
do oceano.
Em Sagres começa-se por uma
fortaleza cujas muralhas, outrora
de pedra, foram restauradas há
umas décadas como se de uma
vulgar parede se tratasse, e pode-
mos vagamente evocar um Infante
cuja lenda ali ficou colada, embora
nos lembre com mais certeza o pi-
rata Francis Drake que, em 1587, a
tomou e destruiu tudo o que ali es-
tava. O que vale a pena é avançar
até ao farol do cabo de São Vicente
e, aí, olhar para as falésias a pique,
onde começa a costa vicentina, e
para as aves que nos desafiam,
num voo que lhes permite ver cada
recanto dessas rochas cortadas por
um escultor de precipícios, e bre-
vemente acompanham alguns ia-
tes ou traineiras que por ali do-
bram o cabo. No farol, a sul, olhan-
do para o cimo das falésias, pode-
mos ver pescadores lançando as
suas linhas praticamente no limite
do rochedo, talvez tentando adivi-
nhar com os olhos o sítio preciso
em que o peixe espera a queda do
anzol, e nos leva a recear, quando
27 JULHO 2017
www.sabado.pt
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j
Meia Praia,
Lagos
lançam a cana, a queda de algum
mais ousado.
Se o regresso for a horas de jan-
tar, pode optar-se pela Comidinha,
à entrada de Lagos, ou pelo São
Roque, onde começa a baía de La-
gos. Nesta, já sem as cubatas onde
se alojava, antes do 25 de abril,
uma comunidade desses que só
sobrevivem na canção de Zeca
Afonso chamada Os Índios da
Meia Praia, falando uma língua
própria e vivendo do que lhes vi-
nha à rede, ainda se pode ir a pé
até onde se abre a ria de Alvor,
cortando a meio a baía com o que
já foi uma linha de água que, na
maré baixa, dava para passar qua-
se a pé de um lado ao outro. Hoje
são dois molhes, um de cada lado,
que permitem a passagem dos
barcos do mar até à ria e ao anco-
radouro de Alvor, com o que feliz-
mente resta do que foi o seu mer-
cado, mas apagaram da memória
essa paisagem de areia e água que,
de um e outro lado da baía, evoca-
va um cenário de origem da Terra
aonde acompanhei, em muitos
verões, os longos passeios diários
de Maria Barroso e Mário Soares
que ali encontrava essa energia vi-
tal que fazia parte da sua persona-
lidade. E, apesar desses molhes,
ainda vale a pena fazer esse pas-
seio, a partir da Restinga, do lado
de Alvor, e enquanto se caminha à
beira da rebentação ver como, em
cada dia, as cores do mar e do céu
encontram novas tonalidades,
numa renovação surpreendente.
E é este o Algarve que faz parte
de mim, e ao qual volto sempre
que posso. W
41
 Destaque

ALGARVE. O QUE AINDA ESCAPA À GRANDE VAGA DO TURISMO

SEGREDOS DO SOTA
Com epicentro em Santa Luzia, uma deambulação pela ria, numa zona a que investidores
também como “o segredo mais bem guardado” da região. Ainda que no auge do Verão já se

H
á luz e sol com fartura e o sino da
igreja paroquial, que honra a sicilia- Na época alta, a
travessia de Santa
na Santa Luzia, protectora dos doen- Luzia para a Terra
tes dos olhos, anuncia as 10 horas. Estreita faz-se de
Sibila um motociclo eléctrico e sen- 15 em 15 minutos
te-se uma fresca brandura na espla-
nada sombreada do Café da Vila que
lhe fica na lateral. O lugar de estacionamento para a viatu-
ra do pároco é o único que permanece vago. A mais pe-
quena e recente freguesia do concelho de Tavira tem
1.400 residentes, mas no Verão a população duplica. (O Umbar para
beber umcopo
povo será agradecido e fará uma festa que a todos con-
ao fimdo dia?
tentará – haverá o pau de sebo, e os moços depois ati- O Mezzanine –
ram-se à ria para apanhar leitões que nadam.) Bar & Vinoteca,
Fala-se muito de estrangeiros e da sua incessante procu- em Faro. Ópti-
ra de casas – e, em surdina, sobre o valor a cobrar. No mas tapas, uma
Café da Vila, há sorrisos holandeses, franceses, ingleses, boa selecção de
simpáticos, na maioria jovens casais que chegam com um vinhos, e fica
bebé no carrinho. Já andaram pelas ruas frescas, já se mis- num prédio
turaram com os locais, compraram fruta e água no mini- com mais de
mercado. Sem montras para distrair a atenção, aprecia- 200 anos.
ram as portas de reixas, mas torceram o nariz às novas
“arquitecturas”. Eumbombar
de praia?
Neste dia está quente e faz sueste, há Levante no Sota-
O Havana, na
vento (para onde sopra o vento), fenómeno meteorológico Praia de Faro.
vulgar no Algarve, que pode ocorrer uma ou duas vezes
por mês, razão pela qual os pescadores não têm ido ao Depois de uma
mar – o que significa menos dinheiro para o orçamento saídaànoite,
familiar. A sirene da lota voltou a não tocar. O polvo é a onde se pode ir
alma da terra e o povo de Santa Luzia diz, apropriada- comer qual-
mente, que é a sua “capital”. A população que está ligada à quer coisa?
faina compensa-o, nos meses de Verão, com o aluguer de A Padaria Lisbo-
casas aos turistas. É uma necessidade. Para outros, sem li- nense (Faro) é
gação à terra, tem sido um investimento. Um imóvel à um clássico que
venda muda de dono rapidamente e as agências imobiliá- nunca falha. Óp-
rias mexem. Tanto que na festa de Agosto até marcam timo sítio para
comer uma fatia
presença com standes de promoção. O valor de um T2
de pizza ou um
novo oscilará entre os 200 e os 250 mil euros. pão com chouri-
“Não tenho medo de descaracterização de Santa Luzia, ço acabado de
pois a pesca nunca se perderá e o turismo faz falta. Neste fazer.
momento, andamos pelos 50/50, mas não perderemos a
pesca, que é a alma e a história desta terra, temos 40 em- Diogo Piçarra,
barcações e não podemos voltar ao tempo dos subsídios músico e cantor

42
 27 JULHO 2017
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+ 30 ARTISTAS
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PRAÇ CULTURA URBANA

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AVENTO
e agentes turísticos se referem como “sem brilho”, mas
exija alguma paciência. PorCarlos Filipe (texto)eMarisa Cardoso (fotos)
AGOSTO
A
AG
GOSTO
O
10
0 QUINTA-FEIRA
QUINTA-FEIRA

para abate de barcos, como aconteceu nos anos 80 e 90”,

diz Carlos Belhy, presidente da junta de Freguesia vai para
12 anos.
“Eh, Norberto!”, grita-se e acena-se de terra ao homem
que vai à roda do leme do Terra Estreita, uma das em-
barcações da carreira da praia. Desde o início de Maio
que leva os banhistas de hora a hora para a ilha. Agora,
em Julho e Agosto, faz isso de 15 em 15 minutos, com re- AGOSTO
forço de uma segunda embarcação. Do outro lado está a
Terra Estreita. 11 SEXTA-FEIRA

Poluição rigorosamente zero

A praia da ilha de Tavira fica a este da Terra Estreita e a do
Barril a oeste, sensivelmente equidistantes, 1.500 metros
de caminhada. À de Tavira acede-se de barco, tem parque
de campismo e grande área de restauração. O programa
Polis da Ria Formosa anda com uns anos de atraso, mas já
tratou da requalificação da estrada de acesso ao embar-
que nas Quatro Águas e prepara agora os procedimentos
para a empreitada do novo cais do lado da ilha.
Já a do Barril, que serve o aldeamento de Pedras d’el Rei,
tem o canal da ria tão estreito que dispõe de ponte pedo-
nal (uma nova estrutura, assente em estacaria de aço,
AGOSTO
12
substitui a velha passadeira sobre flutuadores), e depois os SÁBADO
turistas são levados por uma locomotiva de mina que
atrela duas carruagens. Ali funcionou, durante a primeira
metade do século passado, uma armação para a captura
do atum. Os edifícios foram readaptados para áreas de
restauração. O cemitério de âncoras cravadas na areia,
que ajudam a fortalecer o cordão dunar, e uma barca (ca-
noa) usada para o copejo do atum, ainda ali presente, são
já considerados legados arqueológicos.
“Gosto de dizer aos clientes que isto não tem nada, mas
que tem tudo. Acima de tudo, sossego. Não há barulho,
apenas o do mar, não há motos de água a incomodar,
mas quilómetros de areal e água de qualidade”, diz Eduar-
do Marques, concessionário da praia da Terra Estreita. www.osoldacaparica-festival.pt osoldacaparica
A associação ambientalista ZERO dá-lhe razão, quan-
Bilhetes à venda e locais habituais
do aponta que cinco daquelas praias do Sotavento – PROMOTOR

Fuzeta e Armona, Terra Estreita, ilha de Tavira e Caba-

nas – estão entre as 31 zonas balneares costeiras e duas PARCEIROS MEDIA

interiores do País que nos últimos três anos não tiveram

qualquer registo de poluição das águas, segundo da- Q APOIO

PARCEIROS INSTITUCIONAIS
43
 Destaque
1 2
A VIDA CONTINUA BELA
Na Terra Estreita, a travessia da língua de areia é
mesmo a mais estreita, não mais que 200 metros.
Eduardo Marques anda por ali há 12 anos. É reco-
nhecível à distância: uma pele tão curtida será resul-
tado de quase um ano de praia. É verdade: “Estou
aqui de Maio a 15 de Outubro, e pouco depois co-
meça a época de Verão no Brasil”, explica o empre-
sário, de 53 anos. A praia está concessionada à Jun-
ta de Freguesia de Santa Luzia, a quem faltavam os
meios para a explorar. António Quina, fundador de
A Vida É Bela (marca de vouchers de experiências
que colapsou em 2012), tinha esses meios e fez do
deserto da Terra Estreita uma praia de glamour.
Para ali levou a beach experience, das massagens à
prática de desportos aquáticos não motorizados,
até às tão faladas travessas de ostras acompanha-
das de champanhe para degustação ao pôr-do-sol.
Com ele estava Eduardo Marques. “Estive e
estou. Sou sócio dele no Brasil. Em Angra dos Reis
temos um bar flutuante, o sea lounge, chama-se
Terra Estreita e um dos portos de acesso chama-se
Santa Luzia.”
44
1 Q dos da Agência Portuguesa do Ambiente.
O cais de embar- Depois do Barril há muito mais areal até à barra da Fu-
que na maré baixa
em Santa Luzia zeta, e de caminho a praia do Homem Nu, que faz jus ao
nome, pois ali é autorizado o naturismo. Esta ainda menos
2 tem, sem bar, concessão ou nadador-salvador, mas para
Uma pista à beira
da ria, no caminho evitar a longa caminhada também pode aceder-se de bar-
do aldeamento de co, às suas costas, através da ria e pelo canal da Fuzeta.
Pedras d’El Rey Idênticos percursos são feitos para outras praias já no con-
até Santa Luzia
celho de Olhão – Ilha, Barras Nova, Barra Velha e Armona.
Na Fuzeta assa-se peixe no carvão pela tarde dentro, ob-
serva-se a frota de pesca artesanal e joga-se petanca ao
entardecer diante do parque de campismo. E se há “bou-
les”, há sempre franceses a jogar.
“Os franceses surgem há cinco anos através das imobi-
liárias. Dois ou três casais compraram casas na avenida
marginal. Atrás desses vieram outros. Passaram palavra.
Hoje, há entre 40 a 50 casais a viver aqui permanente-
mente”, diz o presidente da junta de Santa Luzia, Carlos
Belhy, também ele já tentado a vender o seu tecto. “Há
gente a vender as suas casas, uma minoria. E quando ven-
de aplica o dinheiro em nova habitação, mas em Santa
Luzia, na nova urbanização a norte da freguesia, ganhan-
do algum dinheiro no negócio”, diz o autarca. Segundo
Carlos Belhy, a empresa Royal Ibéria, de Luís Filipe Vieira
[presidente do Benfica], tem licenças para construir à saí-
da de Santa Luzia, no lugar do Pinheirinho, e que todos
os anos tem renovado tais autorizações. Com essas cons-
truções e com dois novos loteamentos já aprovados, no
caminho para as Pedras d’El Rei (um bloco de apartamen-
tos e outro para vivendas), a médio prazo haverá mais
2.000 fogos na vila.
JOGA-SE “Acaba de abrir mais um restaurante de franceses, o Ba-
PETANCA AO rouf”, anuncia Carlos Belhy, antecipando uma nova vaga
ENTARDE- de interesse do Norte da Europa: “Os suecos estão a abrir
CER, AO PÔR- o apetite e desde que têm um consulado em Tavira que
-DO-SOL. começaram a mexer-se por aqui.”
E ONDE HÁ Há anos já abrira um outro restaurante francês, o Vin-
PETANCA HÁ cent, numa lateral adjacente ao portuguesíssimo Cape-
FRANCESES lo, há muito considerado uma instituição de Santa Luzia

e do Algarve, e diante da esplanada do único cocktail
bar, o Meia Pipa, gerido desde 1985 por Álvaro Reguei-
ra. Outra instituição. Há música ao vivo e ecrã gigante
para as soirées de desporto. O Vincent só abre para jan-
Nasua
tar tal como o spot dos ingleses (Canto Azul), porventura
opinião, qualé
com a localização mais aprazível da terra, diante da ria o melhor sítio
e num primeiro andar em açoteia. paracomer
Carine e Gilbert não frequentam os muitos restauran- umatípica
tes de Santa Luzia. Autocaravanistas que são, de longa cataplana
data, fazem o jantar no fogão do veículo. Ambos fran- algarvia?
ceses e reformados, há anos que conhecem o local, in- Na Eira do Mel,
dicado por outro companheiro de estrada. Antes do em Vila do Bis-
Verão parqueavam sempre diante da ria junto ao al- po… com batata-
deamento Pedras d’El Rei e ali ficavam uma semana. -doce, uma
“Um dia chegámos e era um estacionamento interdito delícia!
a caravanas”, diz ele, lamentando a ausência de par-
ques apropriados no Algarve. Daí terem ocupado um Dieter Koschina,
lugar, informal, à saída da vila, ao lado de outros cara- chef do Vila Joya,
vanistas, quase todos franceses. “O que importa é que duas estrelas
gostamos disto. Há sítios de luxo no Algarve, mas tam- Michelin
bém muita ostentação e vaidade. Aqui, tudo é simples
e calmo. E tem as aves da ria”, diz Carine, viajante ex-
perimentada e birdwatcher. Carine certamente não foi
beber às expressões utilizadas pelo Financial Times,
a MINHA série preferida
e um pacote de confiança.
PRODUTOS CONTINENTE
É À CONFIANÇA
27 JULHO 2017
www.sabado.pt
que ainda recentemente considerou o Sotavento algar-
vio como uma região “sem brilho”, mas com “mais va-
lor para investimento”.
O jornal cor-de-rosa referiu a prática do golfe na re-
gião mais calma e rural do Algarve como atractivo extra
para o potencial investidor, que poderá encontrar resi-
dências nas redondezas a partir de 250 mil euros. No
concelho de Tavira existe um campo (Benamor, em Ca-
banas), mas há outros cinco não muito distantes: Quinta
da Ria, Quinta de Cima, Monte Rei (Vila Nova de Cacela)
e Castro Marim Golf & Country Club e Quinta do Vale
(Castro Marim).
Dormirna escola,subiraocerro,moldarobarro
Andreia é educadora de infância, Jorge é estudante de
Engenharia Civil na Universidade do Algarve, são ainda
muito jovens mas suficientemente maduros para sabe-
rem como andar na crista da vaga de turismo. Recolhe-
ram fundos familiares, pegaram em poupanças, procu-
raram o resto no banco compraram uma antiga escola
primária (inaugurada em 1961, obra do Estado Novo).
Mantiveram grande parte da estrutura, a placa com o
ano e o suporte do pau da bandeira e adaptaram o edi-
fício com arquitectura discreta e térrea. Perto de Si- Q
PUB
45
 Destaque
Q nagoga, algures entre Tavira e a Luz, no lugar de Ber-
nardinheiro, nasceu há um ano o Tavira Monte, uma
country house a dois passos da praia, na franja entre o
litoral e o barrocal. Ali, o maior desassossego são os
voos rasantes das andorinhas. Há cheiro a laranjal, al-
farrobeiras e oliveiras frondosas. (Não longe, no aldea-
mento de Pedras d’El Rei, pode ser visitada uma famosa
oliveira bimilenar.) Com apenas 10 quartos, amplos e
climatizados, não prepara refeições, apenas o pequeno-
almoço. De lá se pode partir para passeios de fim de
tarde, a começar pelo litoral, acompanhando a ria. Tor-
re de Aires, à saída da Luz de Tavira, é um hino à calma.
É ali que também se encontra o Fialho, restaurante bas-
tante informal que honra o peixe fresco grelhado no
carvão. Quase sempre cheio.
De novo na EN 125, flectir-se-á para o interior na di-
recção de Moncarapacho para aceder ao Cerro de São
NEGÓCIO PÃO-DE-FORMA
Para passeios pelas serras, um casal inglês tem
uma proposta diferente. Lloyd e Claire, originá-
rios da chuvosa Brighton, ele, designer gráfico,
ela, professora, chegaram a Santa Catarina da
Fonte do Bispo no fim da última década e insta-
laram-se com dois filhos pequenos. Foi depois
de uma viagem de campismo à Cornualha,
onde em sete dias caiu toda a água do mundo,
que se decidiram mudar para o calor da serra, e
montaram a Siesta Campers. Partiram em bus-
ca das Volkswagen pão-de-forma do fim dos
anos 60 e até foi de Nova Iorque que chegou a
primeira. Após longo trabalho de recuperação,
equiparam-na para alugar. Deram nomes às
carrinhas que se sucederam – Fern, Apple,
Martha e The Bubble. Sete anos depois, os escri-
tórios de S. Brás de Alportel e de Lisboa agitam-
-se muito nesta altura. “Apostámos nos T5/6
[modelos actuais], mais confortáveis e fiáveis de
mecânica. Mas o nosso público-alvo não mu-
dou. Continuam a ser famílias da classe média,
que tanto se interessam pelo surf como pelas
viagens culturais”, explicam Lloyd e Claire.
46
www.sabado.pt
g Miguel, de onde se avista quase todo o Sotavento. Com
As artes da pesca, uma altitude máxima de 410 metros, no cume encon-
bem visíveis, lem-
bram que Santa tram-se inúmeras antenas de telecomunicações, radares
Luzia é uma aldeia militares e meteorológicos, e retransmissores da RDP e
de pescadores PT. Toda a costa é visível, do farol de Vila Real de Santo
António à pista do aeroporto de Faro, tal como o intrin-
cado sistema lagunar da ria e a planura da paisagem
agrícola. Nas costas, o acidentado contraste serrano das
serras de Tavira e do Caldeirão.
E agora, as bolas-de-berlim do Carlos...
Depois, também há espaço para um momento de com-
pleta decadência – as bolas-de-berlim do Carlos. Gran-
des e com muito creme, até mesmo de alfarroba. Só fa-
brica de Junho a Setembro e fica no Laranjeiro. Depois
do doce, um refresco, na Praça da República, em Mon-
Umalivraria carapacho, nas esplanadas frescas da lateral da igreja,
que aconselhe: bem no centro. Ou então, se de regresso à cidade, no
A Caravana, em Tavira Lounge, junto à estação de camionagem, na es-
Loulé, e a Pape- planada sobre o rio Gilão, à esquerda mesmo antes da
laria Aleixo, em
ponte romana. O melhor gin da terra.
Quarteira.
O sector agrícola, com tecido muito envelhecido, de-
Onde se pode senvolve-se no barrocal e pelos sopés da serra e é no
comer bons meio desta que o vasto barreiro de São Brás de Alportel
doces típicos? e Santa Catarina potencia uma indústria transformadora
Na pastelaria em desenvolvimento. É aqui que encontramos parte da
Amendoal, em cultura local, visível nos telhados de tesoura e quatro
Loulé. Aconse- águas do casario algarvio e pelos pavimentos que se
lho os Dom Ro- adaptam às grandes assimetrias térmicas, do extremo
drigos e o touci- calor no Verão ao frio no Inverno.
nho-do-céu. “Somos regularmente visitados por estrangeiros que
pretendem inteirar-se das características dos nossos pro-
Ideiadepas- dutos para utilizarem nas suas casas. E a exportação já co-
seiobonito?
meça a ser uma realidade, principalmente para França,
A viagem entre
Messines, a al- Alemanha e Reino Unido”, explica Ângelo Martins, sócio-
deia de Alte (lin- gerente da Terracota do Algarve, em São Brás de Alportel.
díssima) e Salir. Da argila se faz o barro, extraído e preparado com o au-
Em Messines, xílio de maquinaria, sendo artesanal o posterior processo
pergunte pelo de fabrico, incluindo a cozedura, em forno a lenha. “Já os
Azeite Guerrei- antigos romanos sabiam das vantagens das telhas e dos
ro: é delicioso, pavimentos de terracota em termos de longevidade. A ter-
puríssimo, e racota é resistente à luz solar, mantendo a sua cor inalte-
só se encontra rada com o passar dos anos, mesmo em locais de grande
por lá. exposição. É resistente ao choque e às mudanças de tem-
peratura e à prova de fogo”, assegura. W
Lídia Jorge,
escritora Depoimentos recolhidos por DiogoLopes
Crédito Pessoal
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O valor inclui comissão de processamento de prestação de 1,50€. Seguro
de crédito facultativo de 7,23€ não refletido no MTIC e na TAEG. Montante
Total Imputado ao Consumidor para o exemplo apresentado: 6.690,36€.
Crédito sujeito a aprovação pelo Cetelem – marca do Banco BNP Paribas Marktest Reputation Index. Este prémio
Personal Finance, S.A. é da exclusiva responsabilidade da entidade que o atribuiu.

Opinião
CONVIDADO
Quando chega o calor logo desperta o odor
áspero-enebriantedaestevaeporaquidiz-se
que, finalmente, estáo Verão instalado. Não é
o calendário que define a estação. É o cheiro
daesteva
Bolos na
serra e
mouros
na costa
Há quem vá do mar que o petisco
pode ser uma “iguaria que se serve
antes do prato principal de uma re-
feição; acepipe, aperitivo” – o que o
aproxima daquilo a que a “nova cozi-
nha” chama amuse-bouche, ou seja,
pequenas porções de comida geral-
mente não pedida pelos comensais,
mas que dão uma ideia do mundo
em que estamos: o da invenção culi-
nária em que é necessária uma lupa
para nos sentarmos à mesa.
Há quem vá do mar à serra só para
comer bolos no Azinhal. Só e não só,
convenhamos, porque o passeio é
bonito e a estrada é boa. Os 30 quiló-
metros do IC 27, que liga Castro Ma-
rim a Alcoutim, fazem-se num virote
cruzando aquela mancha ondulante
de cerros paralelos à linha da costa, a
paisagem única do barrocal algarvio.
Quando chega o calor logo desperta
o odor áspero-enebriante da esteva
e por aqui diz-se que, finalmente,
está o Verão instalado. Não é o ca-
lendário que define a estação. É o
cheiro da esteva. O Azinhal é uma al-
deia na serra. Tem igreja matriz, tem
casa do povo, tem escola de acor-
O deão, tem centro hospitalar (de cui-
Jornalista dados continuados) e tem A Prova,
Leonor uma pastelaria que desde 1991 impôs
Pinhão o Azinhal como lugar de referência
48
da doçaria tradicional do Algarve.
Bolos de amêndoa, de alfarroba, de
figo, bolos do que a terra dá fizeram
do Azinhal um local de peregrinação
para desmandos de açúcar. Não dei-
xa de ser incrível como um cafezinho
num lugar perdido nos confins da
barragem de Odeleite consegue ser
um marco gastronómico e um su-
cesso de público e de crítica há qua-
se 30 anos. No último fim-de-sema-
na do mês que passou, o Azinhal
montou a sua feira anual, Terra de
Maio, e a aldeia veio para a rua co-
mer e beber, bailar até às tantas e
vender de tudo um pouco. E, tam-
bém, ensinar diligentemente aos fo-
rasteiros as maravilhas do “produto”
animal mais único e mais amado da
região, a lindíssima cabra algarvia. O
queijo está visto que nunca falta na
Terra de Maio. Aliás, nada lhe falta.
Nem sequer uma carripana a vender
farturas à porta do recinto da festa. À
hora que lá passei não estavam com
muita saída, o que não admira por-
que ainda era cedo para tudo, espe-
cialmente para fritos. FAMÍLIA NA-
PIER, podia-se ler em letras bem de-
senhadas, no topo da carripana. Tra-
ta-se de uma empresa familiar que
percorre todas as festas e arraiais do
Sotavento com o seu negócio ambu-
27 JULHO 2017
www.sabado.pt
STILLS
lante. Muito me deu uma vontade de
perguntar à senhora imaculadamen-
te fardada que me vendeu meia dú-
zia de churros se a família Napier era
porventura descendente do almiran-
te Napier, o mercenário inglês que se
pôs do lado da causa liberal contri-
buindo para o retumbante êxito que
foi o desembarque na praia de Cace-
la do duque da Terceira à frente de
um contingente de 2.500 homens
no dia 24 de Junho de 1833. Mas
achei por bem não perguntar e foi
melhor assim.
Numamanhãdestas, um forasteiro
vindo do Norte da Europa fotografa-
va cerimoniosamente a placa da Rua
Abû Al-Abdarî em Cacela Velha. Rua
Abû Al-Abdarî, poeta do século XI
nascido em Cacela, é basicamente o
que lá está escrito contra um esplen-
doroso fundo de cal. Feita a fotogra-
fia o homem juntou-se à mulher que
o aguardava na esplanada do café da
Isabel, sentaram-se a uma mesa,
pediram sumos de laranja que não
demoraram a chegar. Mas demorou
algum tempo até que os forasteiros
se interessassem minimamente pe-
los sumos de laranja que encomen-
daram tendo em conta que nem
um nem outro tiravam os olhos do Q
Coca-Cola, Coca-Cola Zero, Coca-Cola Light e a garrafa contour são marcas registadas de The Coca-Cola Company

Produzida e apreciada
em Portugal desde 1977.
A Coca-Cola em Portugal contribui para a criação de mais de 5 mil postos de trabalho diretos e indiretos
e participa ativamente na cultura e junto da comunidade.
As nossas bebidas não só fazem parte do dia-a-dia dos portugueses há décadas como também criam
valor local: 90% destas bebidas são produzidas na nossa fábrica, localizada em Setúbal.

www.cocacolaportugal.pt

Opinião
Q visor da máquina onde, diligente-
mente, o fotógrafo fazia desfilar para
a sua cara-metade o rol de imagens
de uma manhã de feitios arabizados
no Sul da Ibéria.
Notando o interesse que eu via no
interesse deles, a mulher perguntou-
-me sem rodeios:
– Não têm medo?
– Medo de quê?
E, apontando para a placa toponí-
mica de homenagem ao poeta Abû
Al-Abdarî, explicou-se melhor:
– Dos árabes. Não têm medo de
que tentem voltar? É que estão tão
perto… – e, dito isto, apontou com
veemência para o outro lado do mar.
Era uma sueca bem aprumada que
trabalhara na organização Médicos
Sem Fronteiras, disse-me depois.
Parecia uma mulher do vasto mun-
do, sem falhas na educação e sabe-
dora de muitos assuntos ponderosos
porém, naquela precisa manhã, pos-
ta pelas circunstâncias num lugar
exótico da “pobre e desgraçada” Eu-
ropa viu-se tomada de medo de que
os “árabes” desembarcassem ali em
baixo na Ria Formosa e reclamas-
sem o que já fora seu.
– Não tenha medo, os árabes so-
mos nós… – respondi-lhe cheia de
uma boa vontade pró-turística que
a divertiu sobretudo quando,
olhando pela primeira vez em re-
dor, teve finalmente o ensejo de ob-
servar cara a cara a tipologia domi-
nante dos homens nativos que, na-
quele momento, enchiam ruidosa-
STILLS
50
mente a esplanada porque era a
hora do mata-bicho.
Entre 1998 e 2007, foram realiza-
das escavações arqueológicas que
trouxeram à luz do dia estruturas
habitacionais de uma antiga e es-
plendorosa Cacela islâmica. O que
hoje é uma aldeia com meia dúzia
de habitantes foi, há mais de mil
anos, um importante centro da ocu-
pação árabe no Al-Gharb andaluz,
tal como já tinha sido da ocupação
romana. Cacela foi tomada pela co-
roa portuguesa em 1240, foi perdida
e depois recuperada por Paio Peres
Correia em 1242 e, em 1283, recebeu
foral do Rei D. Dinis outorgando a
todos os seus habitantes e comer-
ciantes as mesmas regalias concedi-
das à cidade de Lisboa. Cacela foi
brutalmente danificada pelo terra-
moto de 1755 e, em ruínas, perderia
todos os seus poderes e regalias
para Vila Real de Santo António,
acabada de construir pelo Marquês
de Pombal segundo o modelo revo-
lucionário que viria a inspirar a pos-
terior edificação da nova cidade de
Lisboa.
No seu primeiro século já como
parte integrante do território portu-
guês, Cacela foi inúmeras vezes ata-
cada por mar por “piratas” vindos
do Norte de África, certamente in-
consoláveis com a sua perda. No seu
poema A Conquista de Cacela, Sofia
de Mello Breyner (1919-2004) diz-
nos que, ao contrário de outras
“praças-fortes” e “cidades do mar”
que foram conquistadas pelo seu
poder e pela sua “riqueza”, Cacela
“foi desejada só pela beleza”. Opi-
nião bem diferente teve da paisa-
gem da Ria Formosa o jornalista e
escritor Raul Proença (1884-1941)
quando a visitou nos anos 20 do sé-
culo passado: “Oferecem muito
pouco interesse as praias do Sota-
vento, separadas do mar por uma
cortina de ilhas arenosas e banha-
das por uma água azul-cobalto a
que falta o rebentar das ondas e o
babujar da espuma.” A “cortina”
monótona a que Proença se referia,
com algum desdém, na sua obra
Guia de Portugal publicada em 1927
pela Imprensa Nacional, está nesta
segunda década do século XXI em
27 JULHO 2017
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risco de colapso levando na sua ruí-
na a extensão final da Ria Formosa
que hoje tem o seu termo na Manta
Rota mas que num passado não
muito distante se prolongaria até
Huelva em plena orla andaluza.
“A reabilitação do cordão dunar é
fulcral para a preservação dos domí-
nios da Ria Formosa tal como a Natu-
reza a impôs ao longo de séculos no
quadro natural da costa marítima”,
diz-nos Teresa Patrício que foi fun-
dadora da ADRIP-Associação de De-
fesa, Reabilitação, Investigação e
Promoção do Património Natural e
Cultural de Cacela. Assim, actual-
mente, a ameaça maior a Cacela não
vem dos “mouros na costa”, como te-
mia a nossa simpática turista sueca
sugestionada pelos traços arabizados
da aldeia e pela conjuntura global,
mas da acção destruidora da mão do
homem moderno portucalense. Em
2003, a abertura de uma barra artifi-
cial em frente ao forte de Castela “de-
cidida sem estudos de impacto e sem
jurisdição que a suportasse” não só
matou a maior parte dos viveiros de
ostras como transformou lamenta-
velmente aquilo que era uma sólida
língua de areia escorada num exten-
so cordão de dunas num inóspito
areal imenso que, na maré baixa, se
atravessa pacatamente caminhando
sobre o leito da ria que, neste estado,
se apresenta extraordinariamente
convidativo para “um turismo de
massas com o seu imparável cortejo
de agressões ambientais”, prossegue
Teresa Patrício.
Defronte a Cacela, a Ria está hoje
entregue aos cuidados de uns quan-
tos indefectíveis seus defensores
que, sazonalmente, se organizam
romanticamente para recolher ma-
nualmente o lixo que os seus visi-
tantes deixam a céu aberto e sem
pinga de remorsos. Cacela transfor-
mou-se num êxito de multidões,
num tema apelativo para as revistas
especializadas em lazer e em via-
gens exóticas e num ponto turístico
excitante para os seus autarcas. Mas,
na realidade, Cacela e a sua Ria For-
mosa olham com pavor não para os
berberes do outro lado do mar, mas
para mais um Verão que se apresta a
chegar trazendo consigo as suas
hordas fatais. W
Portugal 27 JULHO 2017
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OPERAÇÃO MARQUÊS. ZEINAL BAVA DIZ QUE VAI DEVOLVER O DINHEIRO

20 de Fevereiro deste

BAVA, A ano, o Ministério Público

(MP) contactou por tele-
fone e por fax o advoga-
do José António Barrei-
ros. O objectivo era avisá-lo que o
cliente, o “suspeito” Zeinal Bava, anti-

AMARIONETA
go administrador e presidente da Co-
missão Executiva da Portugal Telecom
(PT), SGPS, estava notificado para ser
interrogado como arguido no âmbito
da Operação Marquês. A data anuncia-
da pelo MP não deixava margem para

DE SALGADO dúvidas sobre a urgência do acto judi-

No interrogatório, o Ministério Público acusou o antigo
gestor da PT de se deixar instrumentalizar por Ricardo
Salgado e de receber 25,2 milhões de euros. Para dar
muitos milhões a ganhar ao BES. Por António José Vilela
ZEINAL BAVA
“Não é pagar! Sr. procurador,
permita-me corrigir o termo.”
ROSÁRIO TEIXEIRA
“É outro termo que a gente
tem de perceber.”
O EX-GESTOR A RESPONDER AO PROCURADOR SOBRE
A TRANSFERÊNCIA DE 6,7 MILHÕES DE EUROS RECEBIDA
DE RICARDO SALGADO EM DEZEMBRO DE 2007
cial a realizar nas instalações do De-
partamento Central de Investigação e
Acção Penal (DCIAP) em Lisboa: 24 de
Fevereiro, a partir das 10h.
Nesse dia da notificação de Bava, o
procurador Rosário Teixeira fez duas
outras diligências: convocou também
Henrique Granadeiro, tendo especifi-
cado que o antigo chairman e presi-
dente-executivo da PT seria interroga-
do também quatro dias depois, mas da
parte da tarde; e mandou pedir várias
informações e documentação à PT
Prestações, nomeadamente os dados
sobre as participações detidas ou geri-
das por aquela entidade no ex-BES e
as aquisições realizadas nos aumentos
de capital social daquele banco, “com
datas e montantes de subscrição”.
Após receber a notificação, o advo-
gado contactou Bava em Londres –
o gestor de 51 anos, e natural de Mo-
çambique, vivia em Hyde Park, em
South Kensington – e respondeu
logo na tarde do dia seguinte. Fê-lo
também através de um fax e por car-
ta entregue pessoalmente no DCIAP,
tendo informado o procurador Rosá-
rio Teixeira que o cliente, apesar de
viver no estrangeiro, iria comparecer
“voluntariamente na data fixada”. E
foi isso que sucedeu, tendo o gestor
sido constituído arguido por crimes
de corrupção passiva para acto con-
trário aos deveres do cargo, bran-
queamento de capitais e fraude fis-
cal qualificada. Na altura, Bava foi
interrogado por cinco investigado-
res: os procuradores Rosário Teixei-
ra, Inês Bonina e Filipe Costa e os
inspectores tributários Paulo Silva e
António Ferreira. Foi um confronto
explosivo, que durou mais de quatro
horas e que SÁBADO resume nas pá-
ginas seguintes. W

51
 Portugal
C omo já se tornou habitual nos inter-
rogatórios da Operação Marquês, o
procurador Rosário Teixeira sentou-
-se em frente ao novo arguido e
anunciou que ia começar por lhe “ler
os factos”. Mas à indiciação judicial,
que continha a referência a inúmeros
actos suspeitos do visado e a enume-
ração da eventual prática de três ti-
pos de crimes, o magistrado do Mi-
nistério Público (MP) começou por
chamar apenas um “resumo da ma-
téria que a gente aqui tem” e uma
“definição do objecto da nossa con-
versa e não uma posição final nossa
relativamente aos factos”.
A estratégia do MP era que Zeinal
Abedin Mahomed Bava, o antigo po-
deroso presidente e administrador
do grupo Portugal Telecom (PT),
aceitasse falar sobre os intervenien-
tes e as conversas de bastidores de
vários negócios polémicos da PT e
que também pudesse defender-se,
sobretudo de uma suspeita principal:
que teria aceitado ser instrumentali-
zado pelo banqueiro Ricardo Salgado
a troco de um pagamento total de
25,2 milhões de euros.
Em troca, o gestor terá ajudado o
BES a ganhar centenas de milhões de
euros entre 2006 e 2012 (no interro-
gatório a que a SÁBADO teve acesso,
o MP não quantificou com exactidão
estes valores). Precisamente quando
decorreu a OPA falhada da Sonae à
PT, a cisão da PT Multimédia (depois
intitulada Zon e actualmente Nos) e
os negócios de compra e venda das
operadoras de telecomunicações
brasileiras, respectivamente, a Tele-
mar/Oi e a Vivo.
De resto, para o MP, o domínio da
PT pelo BES/GES será até bem mais
antigo, tendo começado com um
acordo assinado em 2000, uma par-
ceria usada pelo “arguido Ricardo
Salgado, em representação do accio-
nista BES”, para “instrumentalizar a
PT em benefício do Grupo BES”.
Através disto, Salgado terá consegui-
do “implementar na PT uma política
de aplicações financeiras da PT no
Grupo BES, que beneficiou financei-
ramente este accionista, por ser con-
trária à gestão racional das disponi-
bilidades financeiras da PT e não as-
sentar na concretização dos interes-
ses deste grupo”.
52
Segundo esta tese que está a ser in-
g vestigada há longos meses na Opera-
O antigo
banqueiro Ricardo
ção Marquês, são vários os alvos sus-
Salgado é suspei- peitos da prática de crimes: a come-
to de corromper çar pelo próprio Ricardo Salgado,
Zeinal Bava e
José Sócrates
que terá também corrompido o en-
na Operação tão primeiro-ministro José Sócrates
Marquês para que este autorizasse em 2010 a
venda da Vivo à operadora espanho-
la Telefónica, gerando dividendos
milionários para os accionistas da PT,
que detinham metade da empresa
brasileira. Ao mesmo tempo que ale-
gadamente subornava Sócrates, Sal-
gado terá distribuído milhões de eu-
ros a Bava e a Henrique Granadeiro,
os homens que mandavam na PT.
No interrogatório de 24 de Feverei-
O MINISTÉ- ro passado, o MP centrou-se apenas
RIO PÚBLICO num destes antigos gestores: “Os
INDICIOU montante recebidos em 2007 e 2011
ZEINAL BAVA pelo arguido Zeinal Bava com ori-
POR COR- gem na ES Entreprises, depois desi-
RUPÇÃO, gnada Entreprises Management Ser-
FRAUDE FIS- vices, num total de 25,2 milhões de
CAL E BRAN- euros, não lhe eram legitimamente
QUEAMENTO devidos destinando-se a compensar
a sua actuação indevida em adesão
aos interesses do BES na administra-
O ANTIGO ção da PT e em oposição aos seus
GESTOR DA deveres profissionais, designada-
PT É SUSPEI- mente à defesa dos interesses co-
TO DE RECE- merciais e financeiros do Grupo PT.”
BER 25,2 Depois de especificar que os indí-
MILHÕES DE cios contra o gestor resultavam de
EUROS DO várias apreensões de documentos ao
BES ENTRE próprio arguido, à PT e ao BESI [o
2007/11 banco de investimento que acompa-
nhou os negócios Vivo/Oi], bem
como devido a depoimentos incrimi-
natórios de testemunhas e documen-
tos de contas bancárias suíças, o MP
reservou-se no direito de não apre-
sentar a listagem exacta das provas
durante o interrogatório. Mas revelou
a Bava o que pensava: “(…) aquilo que
está aqui em causa é a proximidade
entre determinados actos e o accio-
nista BES, que coincide com uma sé-
rie de pagamentos que vão ser rece-
bidos por si em diversas contas, entre
estes anos 2007 e 2012 (…)”
Já no fim da indiciação, Rosário
Teixeira acrescentou mais um dado
em tom informal: “(…) aquilo que está
aqui em causa é a ligação entre uma
coisa e a outra e daí a imputação que
lhe é feita. Penso que terá mais ou
menos percebido.” O procurador re-
feriu-se aos já citados negócios da
PT e a três transferências recebidas
por um offshore de Bava com contas
na Suíça e em Singapura. O primeiro
pagamento aconteceu a 5 de De-
zembro de 2007: 6,7 milhões de eu-
ros. Outro, de 8,5 milhões de euros,
ocorreu a 19 de Janeiro de 2011. O úl-
timo foi a 20 de Setembro de 2011 –
10 milhões de euros. O remetente foi
sempre uma entidade que não surgia
no organograma oficial do grupo
BES/GES: a ES Entreprises, com conta
no Banque Privée Espírito Santo.
Depois de uma pausa para Bava
reunir com o advogado José António
Barreiros, o interrogatório recome-
çou praticamente com uma declara-
ção do arguido: “(…) do vosso docu-
mento e que do meu ponto de vista
precisa de vários esclarecimentos,
porque acho que há inverdades, há
pressupostos que, face àquilo que eu
posso dizer, podem-vos levar a pen-
sar as coisas de outra forma. OK?”
A frase fazia supor que a sessão de
perguntas e respostas decorreria por
temas ou seguindo uma linha tempo-
ral, mas isso acabou por não suceder.
Durante as cerca de quatro horas de
interrogatório, foram muitos os saltos
temporais e as tentativas do MP de
retomar os assuntos mais polémicos:
Salgado, Sócrates e o dinheiro.
RosárioTeixeira (RT): “Pronto? Pri-
meiro pagamento?”
Zeinal Bava (ZB): “OK, o que é que

“Tal como o dr. Ricardo me
disse que tinha convidado
pessoas, não é? Antes de eu ser
presidente da PT (...), por isso
não me estava a dar nada que NO INTER-
não tinha oferecido a outros!” ROGATÓRIO,
ZEINAL BAVA
ZEINAL BAVA SOBRE OS MAIS DE 25 MILHÕES DE EUROS RESPONDEU
QUE RICARDO SALGADO LHE TERÁ MANDADO TRANSFERIR A TODAS AS
PARA CONTAS DE UM OFFSHORE
PERGUNTAS
DOS CINCO
acontece? Nós, em 2007, a OPA [ten- achou uma boa escolha e nos con- INVESTIGA-
tativa de compra da PT pela Sonae- tactos que eu mantive com o dr. Ri- DORES
com] fica resolvida e, nessa altura, cardo Salgado (...) disse que via com
coloca-se a questão de se eu vou fi- bons olhos que eu – e quem eu es-
car na PT Multimédia, se eu vou ficar colhesse – pudesse ficar mais com-
na PT (…) E o dr. Henrique Granadei- prometido com o projecto (…) Eu E GARANTIU
ro, nessa altura, convida-me… ah… não fui a primeira escolha, não sei QUE TINHA
para ficar como vice-presidente da quem foram as outras pessoas, mas INTENÇÃO
PT, com a vontade que eu passasse a aparentemente houve outros convi- DE
ser presidente [no ano seguinte], até tes que tinham sido feitos e essa DEVOLVER
porque, como disse, foi uma exigên- questão de dar a hipótese às pes- O RESTO DO
cia física e pessoal muito grande p’ra soas de poderem ter uma participa- DINHEIRO
ele acumular as funções (…) Ah, natu- ção na PT já tinha sido aflorada e, RECEBIDO
ralmente, o dr. Ricardo Salgado… ah… então, eu disse ‘olhe, vamos fazer DO BES/GES
DE MANHÃ, BEBO SEMPRE
UMA DOSE DE CONFIANÇA.
PRODUTOS
OS É À CONFIANÇA
CONTINENTE
TE
27 JULHO 2017
www.sabado.pt
isso, então, faz essa transferência’.
Essa transferência não foi dinheiro
que me foi dado, essa transferência
era dinheiro [os primeiros 6,7 mi-
lhões de euros], se quiser, confiado,
era dinheiro que tinha um propósito
específico, que era comprar e criar
uma participação na PT, quando a
empresa ficasse privatizada (...)”.
Nessa altura, segundo Bava, o di-
nheiro foi-lhe transferido pelo
BES/GES sem qualquer contrato es-
crito, com o gestor a garantir ao MP
que nunca se sentiu bem com a si-
tuação e que sempre insistiu com
Salgado para que tudo ficasse regis-
tado no papel. O que só terá aconte-
cido vários anos depois e com outras
transferências. O procurador Rosário
Teixeira vincou: “Este dinheiro está
na sua posse desde 2007! Os 6,7 mi-
lhões de euros.”
ZB: “Sr. Procurador, eu acabei de lhe
dizer a si, que eu fiquei desconfortá-
vel, pedi p’ra formalizar e p’ra Q
PUB
53
 Portugal

Q mim a formalização englobava, se h

você quiser o relacionamento (...)” José Sócrates era
o líder do Governo
RT:“Compreenderá que é diferente quando a PT, lide-
pagar uma remuneração por fora a rada por Zeinal
um funcionário, que não deixará de Bava e Henrique
Granadeiro, ven-
ser grave, a um qualquer colaborador deu a operadora
do BES, do que pagar a um CEO brasileira Vivo
duma empresa...”
ZB: “Não é pagar!”
RT:“... participada.”
ZB: “Não é pagar! Sr.
Procurador, permita-
-me corrigir o termo.”
RT: “É outro termo que
“E só houve essa
a gente tem de perce- reunião em S. Bento?
ber.”
ZB: “Não é pagar!”
Não houve uma outra
RT:“O que é que era em que tenha ido a casa
p’ra ser feito com este
dinheiro?”
do eng.º José Sócrates?”
ZB: “É exactamente PERGUNTA DO PROCURADOR ROSÁRIO TEIXEIRA
aquilo que está no A QUE ZEINAL BAVA RESPONDEU “JAMAIS”
contrato! Que era eu,
num determinado mo-
mento...”
RT: “Fica como fiduciário...”
ZB: “Eu, num determinado momen-
to, iria transformar isto num investi-
mento na PT, OK? E iria agregar à ZB: “Sim.” FilipeCosta (FC): “Telefonou-lhe,
minha volta um grupo de pessoas e IB: “Antes disso não […]” na altura, a perguntar...”
nós iríamos ter exposição através de ZB: “Mas eu não recebi o dinheiro. O ZB: “O dr. Ricardo, naquela altura,
derivativos [um derivativo é um con- dinheiro foi-me confiado” [...] você já... você, veja lá, quando é que
trato entre várias partes, que se pode IB: “Mas como é que tem um contra- estamos: estamos em Outubro de
transaccionar e cujo preço está de- to com um accionista sobre a PT?” 2014 [Salgado já tinha sido afastado
pendente do valor de um ou mais ZB: “Foi-me confiado! (...) Tal como o pelo Banco de Portugal da liderança
activos], tal como acontece em múl- dr. Ricardo me disse que tinha convi- do BES].”
tiplas outras situações no mundo...” dado pessoas, não é? Antes de eu ser FC: “Mandou-lhe a carta p’ra onde?”
InêsBonina (IB): “Porque é que não presidente (...), por isso não me esta- ZB:“Mandei-lhe... acho que foi p’ro
fizeram isto claramente?” BAVA va... não me estava a dar nada que banco [sede do BES], também.”
ZB: “Diga?” REVELOU AO não tinha oferecido a outros!” FC: “P’ro banco?”
IB: “Em empresas normais, sem ser FISCO QUE IB: “Mas o facto de ter oferecido a ZB: “Mandei p’ro banco. Como já lhe
em offshores, e às claras? Porque é TINHA MAIS outros não torna a conduta lícita, an- disse a si, a casa dele eu só fui o quê?!
que isto foi uma coisa escondida?” DE 11 tes pelo contrário...” Uma, duas vezes ou três.”
ZB: “Não é uma coisa escondida!” MILHÕES De seguida, Zeinal Bava garantiu
IB: “Então, porque é que o sr. recebe ESCONDIDOS OsencontrosdeBava eSalgado várias vezes que sempre teve a in-
este dinheiro numa conta e o titular é NO ESTRAN- No interrogatório, Zeinal não se can- tenção de devolver todo o dinheiro,
uma empresa, que nem sequer ‘tá li- GEIRO sou de dizer que era inocente, insistiu tal como acabou por fazer com os
gada a si?” que lhe tinham dado a “confiança” 18,5 milhões de euros também rece-
ZB: “Eu declarei desde logo... assim de um “valor” e optou por entrar nas bidos do BES/GES. Os investigadores
que levantaram o tema, eu disse que tentativas que terá feito para devol- aproveitaram e voltaram à carga.
era o beneficiário único da empresa.” O DINHEIRO ver os milhões a Ricardo Salgado: “Mas se é esse o propósito, se era de-
IB: “Assim que levantaram o tema DECLARADO “Tentei devolver! ‘Tou-lhe a dizer volver tudo, porque é que o sr. engº.,
[Bava fez uma regularização fiscal ex- NA REGULA- que, em 2013, eu mandei uma carta a sabendo que tem seis ponto sete [mi-
traordinária em Maio de 2012, tendo RIZAÇÃO FIS- dizer...” E ainda salientou que fez lhões de euros] em Singapura...”, co-
declarado que escondera no estran- CAL DE 2012 nova tentativa, mas quando concluiu meçou a perguntar-lhe Paulo Silva.
geiro €11.545.860 e, em 2016, devol- NÃO INCLUIU a explicação, os investigadores pare- Mas o advogado José António Barrei-
veu outros 18,5 milhões de euros, que OS MILHÕES ceram ainda mais desconfiados. ros reagiu de imediato e cortou a fra-
tinha nas contas de um offshore, à SUSPEITOS ZB: “A minha carta p’ra ele? [Salgado] se ao inspector tributário – “Não!
massa insolvente do GES].” DO BES/GES Sim, foi a título privado. Não foi...” Não!”, disse. Paulo Silva insistiu:

54
 UM MUNDO DE ESPETÁCULOS 27 JULHO 2017

A PENSAR EM SI!
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M/6 M/6

“O eng.º Sócrates, a
mim, nunca me
transmitiu nada.
Nada! Porque eu
não falava com o 17 AGOSTO
eng.º Sócrates.” COLISEU LISBOA
BENHARPER.COM
DURANTE O INTERROGATÓRIO,
ZEINAL BAVA DISSE QUE
M/6
O INTERLOCUTOR DO PRIMEIRO-MINISTRO
NA PT ERA HENRIQUE GRANADEIRO

“Porque é que não os entregou?” [...]

JoséAntónioBarreiros(JAB): “Isso
são duas coisas completamente dis-
tintas. Uma é o vosso ponto de vista e
é ‘porque é que tu só pagas isto e não M/6

pagas y?’”
Como Bava regressou por breves
instantes à conversa, isso foi aprovei-
tado pelos investigadores para cana-
lizarem as perguntas para o gestor.
“O dinheiro que tinha de devolver
não eram 18 milhões, o dinheiro que
tinha de devolver eram 24 milhões”,
afirmou o procurador Filipe Costa. O
advogado de Bava insistiu nos 18 mi-
lhões, mas o magistrado de Coimbra M/6 M/6

não desistiu e, mais adiante, insistiu

na questão: “O que eu queria ouvir,
até da boca do arguido, era porque é
que resolveu devolver apenas 18,5
milhões quando sabia que tinha 24,5
milhões?” O inspector Paulo Silva
corrigiu de imediato: “25,2.” E Zeinal
Bava lá acabou por responder: “Pelas COLISEUS
mesmas razões... pelas mesmas ra- 13 NOV PORTO
zões que eu não devolvi o dinheiro
em Maio [2015], porque não tinha a 14 NOV LISBOA
segurança jurídica para.”
PauloSilva (PS): “Ai, teve segurança
p’ra 18 e meio e não tinha p’ros 25 e M/6
meio?” […]
ZB:“O valor foi pago... uh... manteve-
-se... o diálogo está em aberto, não é?
Ou seja, não é um processo que se
encerrou, é um diálogo que está em
aberto (…)”
FC:“O sr. engº nunca lhes disse [aos
gestores da insolvência do GES]
‘olhe, mas eu não tenho 18 mi-
lhões e meio, tenho 20, 20 e tal’. Q
SAIBA MAIS SOBRE ESTE E OUTROS ESPETÁCULOS EM EVERYTHINGISNEW.PT
BILHETES: FNAC, WORTEN, EL CORTE INGLÉS E WWW.EVERYTHINGISNEW.PT 55
 Portugal

Q Eles provavelmente diziam ‘então,

dê-nos cá os 25’” […]
ZB: “Eu devolvi aquilo que eu, legal-
mente, senti que fazia sentido devol-
ver com as garantias que tinha. Se
me disser ‘está disposto a devolver o
resto?’, absolutamente disposto a re-
solver... a devolver o resto.” […]
JAB:“Esta resposta é um bocado...
convinha sublinhá-la. A última frase.
Estou disposto a devolver mais...”
ZB:“Exactamente! Não tenho pro-
blema nenhum!”
JAB: “Isso é importante. Esse
princípio.” […]
ZB:“Provavelmente voltaremos a fa-
lar, mas de qualquer maneira, eu di-
ria o seguinte e queria deixar isso
muito claro: entendo que isto pode
ter interpretações, mas eu devolvi o
dinheiro. Eu devolvi os juros. Eu te-
nho um recibo. Eu ‘tou aberto a re-
solver o resto (…)”
RT: “Sr. engº, diga-me só uma coisa?
(…) tem conhecimento de algum ou-
tro elemento da Administração da PT
que recebeu igual proposta por parte
do investidor...”
ZB: “Não, não tenho. Não tenho.”
O procurador Rosário Teixeira conti-
nuou a insistir na relação financeira
entre Bava e Salgado. O inspector tri-
butário Silva ajudou-o a dar o passo
seguinte: “O seu presidente daquela
altura [Henrique Granadeiro] ficou a
conhecer este acordo seu...”
ZB: “Não! Não, porque o contrato
era confidencial. Eu não tinha, não
tinha autorização p’ra falar com
ninguém (...)”
RT: “O dr. Henrique Granadeiro não
sabia disto?”
ZB: “Não! Nem o Granadeiro, nem
ninguém (…)”
A questão do segredo manteve-se
durante algum tempo nos diálogos,
com Zeinal a salvaguardar-se no
que estaria previsto nos contratos
assinados com o BES/GES. Paulo
Silva não ficou convencido e lem-
brou-lhe que em 2007 não havia
qualquer contrato sobre os 6,7 mi-
lhões de euros. Zeinal não hesitou
na resposta: “O compromisso de
confidencialidade é independente
de a gente assinar o papel ou não.
Se você me disse assim ‘isto é con-
fidencial’, é confidencial! (...)”
PS:“Isto foi directamente sem mais
g
Os procuradores
Carlos Filipe e “Sr. eng.º, diga-me só uma
Rosário Teixeira
(ao centro) e o coisa? (...) Tem conhecimento
inspector Paulo
Silva (à dir.ª) que de algum outro elemento
integram a equipa
da Operação da Administração da PT
Marquês
que recebeu igual proposta
do investidor...”
PROCURADOR ROSÁRIO TEIXEIRA A QUESTIONAR
ZEINAL BAVA SOBRE O DINHEIRO RECEBIDO DO BES/GES.
O GESTOR DISSE “NÃO”
nenhuma intervenção, o sr. engº com
o dr. Ricardo Salgado?”
ZB: “Sim, senhora.”
AintervençãodeSócrates
Durante a atribulada sessão nas ins-
talações do DCIAP, Zeinal Bava falou
ZEINAL BAVA de forma pormenorizada de inúme-
RECONHE- ros encontros confidenciais verifica-
CEU QUE dos durante o complexo processo de
RECEBEU 6,7 venda da operadora de telecomuni-
MILHÕES DE cações brasileira Vivo. Por exemplo,
EUROS SEM contou um jantar “desagradável”
QUALQUER ocorrido em 2010 no Hotel da Lapa
CONTRATO com o homem-forte da espanhola
ESCRITO Telefónica, César Alierta, em que os
espanhóis lhe fizeram uma oferta
inicial pela Vivo: 5 mil milhões de
euros. Esta terá sido a primeira licita-
O GESTOR ção, tendo depois ocorrido novas
GARANTIU propostas em discretos encontros
QUE ESCRE- realizados em Marrocos e em Lisboa,
VEU PARA A numa luxuosa suíte do Hotel Ritz. “E
SEDE DO BES dessa reunião, o que é que sai? Nós
A DIZER QUE vamos aumentar o preço para seis bi
QUERIA e meio e vocês obrigam-se a convo-
DEVOLVER car uma Assembleia-Geral porque a
OS MILHÕES posição do Conselho da PT, tal como
na OPA, foi: ‘esta decisão tem de ser
dos accionistas’”, recordou Bava
alertando que a decisão final da ven-
da tinha de ser dos donos da PT.
O negócio não avançou e a Telefó-
nica chegou a uma oferta de 7,050
biliões de euros. Bava garantiu aos
investigadores que a empresa tinha
pareceres jurídicos a dizer que na-
quele caso a golden share do Estado
não se aplicava e que também julgou
que o Governo não teria qualquer re-
serva sobre aquela matéria. Só que o
negócio não passou por vontade do
Governo. “(…) saímos de lá completa-
mente estarrecidos, a pensar ‘mas e
agora?’, não é?”, disse Bava com o
inspector Paulo Silva a lembrar-lhe
que, porventura, a decisão até iria ao
encontro daquilo que o antigo gestor
da PT dizia que defendia: a Vivo não
deveria ser vendida.
ZB: “Vou-lhe dizer uma coisa! A mi-
nha posição era, se quer que lhe diga,
essa – não vamos vender! Mas a de-
cisão é dos accionistas! Uma coisa é
o que eu acho, outra coisa é quem
manda. ‘Tá? E quem manda não é

56
 27 JULHO 2017
www.sabado.pt

um accionista, desculpe lá! São os
accionistas (…) A partir daí cai o Car-
mo e a Trindade. Como é que a gente
vai tratar deste assunto? A Telefónica
dá-nos 15 dias…”
A conversa sobre o tema prometia
alongar-se, mas Rosário Teixeira
estava mais interessado em voltar à
questão da golden share e a uma
eventual reunião que o gestor teria
tido com o Governo e José Sócrates.
Bava pareceu protelar a resposta,
disse que não, antes da golden share
de 2010, não. O procurador insistiu e
quis saber se teria estado logo depois.
E Bava confirmou que tinha ido com
Henrique Granadeiro ao Palácio de S.
Bento, para uma reunião com Sócra-
tes e o ministro Pedro Silva Pereira.
“O que é que se passou , então, nessa
reunião?”, perguntou o procurador.
As explicações do gestor foram
confusas, quase atabalhoadas, com
os dois inspectores tributários e os
três procuradores a insistirem sobre
o conteúdo da conversa com o pri-
meiro-ministro. “(…) o tema é o se-
guinte… o tema… o tema… o tema da
conversa com o sr. primeiro-ministro
foi dizer como é que estavam as coi-
ZEINAL BAVA sas e agora ‘tou-lhe a falar de memó-
SALIENTOU ria. Ah… quer dizer, os espanhóis ti-
AOS PROCU- nham de pagar mais…”, disse por fim
RADORES Bava com Rosário Teixeira a insistir
QUE NÃO SE se Sócrates teria realmente insistido
ARREPENDE num aumento do preço da venda da
DE NADA DO Vivo e na eventual sugestão da com-
QUE FEZ pra da Oi. “O engº Sócrates, a mim,
NA PT nunca me transmitiu nada. Nada!
Porque eu não falava com o engº Só-
crates”, disse Bava.
NO FIM DO Durante longos minutos, os inves-
INTERROGA- tigadores não se deram por satisfei-
TÓRIO, FOI tos com as respostas e ficaram im-
DITO A BAVA pacientes quando julgaram que o
QUE AINDA gestor era pouco ou nada claro. A
PODERÁ SER mesma pergunta, com variações,
NOVAMENTE sucedeu-se: “Qual foi o objectivo da
CHAMADO reunião com o primeiro-ministro…”
AO MP Bava chegou até a ser questionado
se tinha tido outras reuniões com
Sócrates, algumas semanais e uma
delas na casa do líder do Governo:
“E só houve essa reunião em S.
Bento? Não houve outra em que te-
nha ido a casa do engº José Sócra-
tes?”, perguntou Rosário Teixeira.
“Jamais”, respondeu Bava e garan-
tiu que nem sequer sabia exacta-
mente onde morava Sócrates e que
nem tivera “grande intervenção” no
encontro em S. Bento.
O inspector Paulo Silva impacien-
tou-se – “Ó sr. dr…” Muitos minutos
depois, Bava concluiu o testemunho:
“(...) mas queria deixar claro que, em
relação a tudo que a gente falou so-
bre decisões da OPA, na venda da
Vivo, no reajustamento da Vivo, etc,
em nada, em nada eu faria diferente
do que aquilo que fiz. OK? Em nada.”
Rosário Teixeira fechou a sessão
anunciando que era provável que
Bava fosse de novo interrogado.
“Para continuarmos”, concluiu. W
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Noronha
da Costa
modos
do olhar
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DE CASCAIS
15 DE JULHO A
10 DE SETEMBRO ‘17
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 Portugal
PEDRÓGÃO GRANDE. UM MÊS APÓS OS FOGOS
O DINHEIRO QUE
TARDAACHEGAR
AQUEM PRECISA
As misericórdias e a Gulbenkian assumem a primeira fase de
reabilitação de casas. O fundo do Estado ainda aguarda por
donativos recolhidos pelos bancos. Por Octávio Lousada Oliveira
a pergunta que muitos fa-
É zem: porque é que o dinhei-
ro para a reconstrução e
reabilitação tarda a chegar a
Pedrógão Grande, Castanheira de
Pêra e Figueiró dos Vinhos, os con-
celhos mais afectados pelo incêndio
de 17 de Junho? A resposta é um
misto de burocracia, incumprimento
de promessas e falta de vontade.
O Instituto da Habitação e da Rea-
bilitação Urbana (IHRU) e a Comis-
são de Coordenação e Desenvolvi-
mento Regional (CCDR) do Centro
concluíram o levantamento das ha-
bitações atingidas, mas muitas vão
ter de esperar que donativos avul-
tados cheguem ao fundo criado
pelo Governo, o Revita. E não só.
O presidente do Revita, Rui Fio-
lhais, esclarece que serão necessá-
rios 8 milhões de euros para obras
58
LUSA
g de reconstrução e cerca de 2,5 mi-
Segundo Rui lhões para reabilitação, isto é, para
Fiolhais, 185
casas de primeira intervenções mais simples. Porém,
residência foram ainda existe uma diferença subs-
atingidas pelas tancial entre os valores dos donati-
chamas
vos anunciados publicamente por
várias instituições e os que entra-
ram nas contas do Revita e dos
parceiros, como a União das Mise-
ricórdias Portuguesas (UMP) e a
Fundação Calouste Gulbenkian.
Veja-se o caso do fundo público.
“Temos uma conta aberta com 1
O REVITA milhão em depósitos. Mas a minha
TEM NESTE expectativa é que ultrapassem os
MOMENTO 4 milhões nas próximas duas se-
1 MILHÃO DE manas”, adianta Rui Fiolhais, sem
EUROS PARA detalhar as entidades que envia-
APLICAR NAS ram verbas nem os prazos para
CASAS ATIN- que a ajuda esteja no terreno.
GIDAS PE- No entanto, a SÁBADO apurou
LOS FOGOS que ainda está por chegar o dinhei-
ro angariado pelo Millennium bcp
(420.000 euros), o Santander Totta
(500.000) e o apoio anunciado
pelo Governo de Timor Leste (1,3
milhões). Sem que assinem os ter-
mos de adesão com o Revita, esses
montantes não poderão ser desblo-
queados. No caso da Fundação Aga
Khan, a doação de 500.000 euros
destina-se à atribuição de bolsas
para estudantes.
A este problema ainda se somam
as burocracias. O regulamento do
Revita prevê que a concessão do
apoio careça da apresentação de
um requerimento num formulário
próprio devidamente preenchido e
assinado pelo proprietário ou pelo
usufrutuário. E ainda mais papela-
da variável em função do tipo de
intervenção: comprovativos de ti-
tularidade da casa, orçamentos (um
para obras até 5.000 euros; três
para as que excedam essa quantia),
memórias descritivas, prazos de
execução e alvarás de licença.
A resposta imediata no terreno
Para que o dinheiro chegue mais
rápido a quem precisa, foi assinado
a 17 de Julho um protocolo entre o
Instituto da Segurança Social (cujo
representante, Rui Fiolhais, preside
ao Revita), a UMP e a Gulbenkian
para que as necessidades imediatas
de reabilitação e apetrechamento
das casas (mobiliário, electrodo-
mésticos, utensílios) sejam assegu-
radas, bem como aquelas que se-
jam consideradas indispensáveis à
subsistência das famílias, como al-
faias agrícolas. O presidente da
UMP, Manuel Lemos, explica à SÁ-
BADO a metodologia de interven-
ção adoptada: “Combinámos que
nós e a Gulbenkian fazíamos as
pequenas e médias intervenções e
o Revita fazia as grandes.”
O processo, sustenta, torna-se
mais simples: agiliza-se a parte bu-
rocrática e o pagamento. Basta, re-
fere, “que a factura-recibo seja
emitida em nome da União”. “A
nossa fiscalização [a consultora
Galbilec] diz ‘sim, senhor’ e paga-
mos de imediato”, indica Lemos,
que nota ainda que as 24 habita-
ções – das 209 inventariadas pelo
IHRU e pela CCDR Centro – atingi-
 27 JULHO 2017
www.sabado.pt

segue, contudo, precisar o dinheiro anunciou que vai reconstruir 66

Estatística polémica
Incerteza no número de
mortos domina debate político
Numa altura em que a morte
da 65.ª pessoa – atropelada en-
quanto fugia do incêndio de
Pedrógão – está a ser investi-
gada, a Procuradoria-Geral
da República foi ao encontro
das pretensões de PSD e CDS-
-PP e divulgou a lista (que o
Governo recusava revelar, ale-
gando estar em segredo de
justiça) das 64 vítimas mortais.
das pelas chamas nos concelhos de
Sertã, Góis, Pampilhosa da Serra e
Penela serão reparadas pela UMP e
Gulbenkian.
O responsável pela UMP não con-
que já foi gasto. Dos 1,8 milhões
que diz ter arrecadado (1,1 milhões
foram conseguidos graças ao con-
certo Juntos porTodos, em Lisboa)
especificamente em donativos,
nada foi gasto.
Do lado da Gulbenkian, uma fon-
te oficial realça que “só esta sema-
na” a instituição recebeu a infor-
mação sobre as obras a financiar,
pelo que ainda não tem estimativas
do que possa vir a desembolsar.
“De imediato, temos previstas as
primeiras intervenções ao nível
mais superficial e estamos a anali-
sar as propostas de reabilitação
mais profunda”, sublinha. Quanto a
donativos, a Gulbenkian avançou
com 500.000 euros próprios e tem
em sua posse igual valor oriundo
da Altri e da Navigator. A CGD
transferiu 2,3 milhões.
A Cáritas de Coimbra, que já
casas, revela no seu último reporte
que as doações ascenderam a
Rui 1.695.455 euros, embora desse
montante ainda só tenha recebido
Fiolhais 427.681 – a parcela mais expressi-
diz que vai ser va, 191.953 euros, chegou do Novo
criada uma bol- Banco. E há ainda a Santa Casa da
sa de arquitec- Misericórdia de Lisboa: a institui-
tos e engenhei- ção liderada por Pedro Santana Lo-
ros para traba- pes vai construir casas, mas os par-
lharem na ceiros não têm indicações de quan-
recuperação to será aplicado.
de Pedrógão Rui Fiolhais mostra-se “convicto”
de que o objectivo geral dos 10,5
MISERICÓR- milhões para obras “seja largamen-
DIAS E GUL- te ultrapassado” e considera que
BENKIAN dificilmente o Estado será chama-
VÃO RE- do a entrar com mais dinheiro. No
CONSTRUIR entanto, não exclui em absoluto
CASAS DOS esse cenário: “Se essas necessida-
CONCELHOS des não forem satisfeitas, o Gover-
MENOS no já assumiu publicamente que
AFECTADOS intervirá para as assegurar.” W

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59
 Portugal

NEGÓCIO. ENGENHEIRO ESTÁ PRESO NOS ESTADOS UNIDOS

DOS EUAPARAO IRÃO, VIA

Uma firma portuguesa terá recebido milhares de euros para contornar o embargo americano ao

Q
uando João Fonseca ater-
rou no aeroporto de Min-
neapolis, nos Estados Uni-
dos, a 26 de Março de
2016, não estranhou ser chamado
para uma entrevista adicional. Como
não viajava sozinho, pediu aos agen-
tes que estavam à sua frente para o
funcionário com quem viajava, S.R.,
se juntar à conversa. Eles não se
opuseram. Queriam deixá-lo des-
contraído para responder a pergun-
tas aparentemente banais: o que es-
tava a fazer nos EUA, o que fazia ou
por que países tinha viajado.
O português disse ser engenheiro
electromecânico e trabalhar como
consultor para a Firstfield – Enge-
nharia e Sistemas de Segurança, de
cujo dono, Paulo Vicente, era amigo.
Estava ali para testar uma máquina
de “meio milhão de dólares” produ-
zida pela Ideal Aerosmith, uma firma
do Dakota do Norte, que podia ser
usada em aviões, mas que eles iam
usar para fabricar uma câmara com
lentes múltiplas. g terá sido através dessa busca elec-
Perante essa resposta, o agente O português foi trónica que as autoridades recolhe-
preso em Abril Várias empresas
lembrou-o que os EUA têm em vigor de 2016 por Das quatro firmas de João ram provas para acusar o engenhei-
embargos que impedem que esse conspirar para
Fonseca, só uma está activa ro português – mencionando outros
tipo de material chegue a países enviar tecnologia cúmplices –, de conspirar para ex-
dos EUA para
como a Síria, Sudão ou o Irão. João o Irão O engenheiro preso nos portar tecnologia para o Irão. Essas
Fonseca disse que compreendia. Tal EUA tem quatro empresas. provas serviram de base à detenção
como garantiu não ter viajado nos Uma está insolvente, outra de João Fonseca, a 3 de Abril de
cinco anos anteriores para os mes- extinta e uma terceira inactiva. 2016, e levaram-no, a 17 de Julho
mos países – o que o impediria de A única que ainda funciona, passado, a assinar um acordo em
entrar nos EUA sem um visto. a Tratoscope, tem sede em que confessou os factos e aceitou
No fim, João Fonseca entrou nos ENQUANTO Condeixa-a-Nova e uma uma pena de 20 meses e deportação
EUA. Não fazia ideia, mas há meses CONVERSA- sócia que a SÁBADO não para Portugal. A 7 de Setembro sa-
que os seus passos eram seguidos VA, O COM- conseguiu contactar. berá se o juiz ratifica o acordo.
pelo agente especial Robert Pinches. PUTADOR DE Em 2016 teve resultados A SÁBADO tentou contactar o ad-
Nem que, enquanto conversavam, o JOÃO FONSE- líquidos negativos vogado americano de João Fonseca,
seu computador e telemóvel esta- CA FOI VAS- de 13.500 euros. mas não obteve resposta até ao fe-
vam a ser vasculhados. CULHADO cho desta edição.
De acordo com os documentos ju- PELAS AUTO- Segundo a documentação judicial
diciais a que a SÁBADO teve acesso, RIDADES americana, para contornar o em-

60
 27 JULHO 2017
www.sabado.pt

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PORTUGAL
país do Médio Oriente. Por NunoTiagoPinto

bargo de mercadorias para o Irão,

as empresas tentam exportar bens
dos EUA para países terceiros sem
embargo ou onde é mais fácil obter
licenças de exportação – como é o
caso de Portugal.

Treinocom câmarasocultas
A informação encontrada no com-
putador pessoal de João Fonseca
serviu para o Departamento de Se-
gurança Interna concluir que, através
deste plano, ainda em 2014, a em-
presa portuguesa concordou em ad-
quirir material de alta tecnologia que
terá sido enviado através da China
ou da Turquia para uma empresa
iraniana, com sede em Isfahan, iden-
tificada apenas por KSP. João Fonse-
ca tinha uma missão essencial: rece-
bia formação no fabricante para
usar, instalar e calibrar as máquinas
e depois instalava-as no Irão e dava
formação aos utilizadores finais.
A primeira operação terá envolvido
a compra de cinco máquinas. As
duas primeiras, destinadas a produ-
zir lentes de alta tecnologia, foram
adquiridas à firma alemã Optotech. E
entre 15 e 19 de Junho de 2014 João
Fonseca esteve em Isfahan a instalar
os aparelhos. No seu email foram
encontradas a carta convite para ob-
ter um visto junto da embaixada ira-
niana em Lisboa, bem como os bi-
lhetes de avião para o Irão.
A terceira máquina foi adquirida à
PARA CON- empresa de tecnologia de ultrapreci-
TORNAR O são, Taylor Hobson. Ao contrário do
EMBARGO que sucedeu anteriormente, os en-
PARA O IRÃO, genheiros americanos instalaram o
AS EMPRE- aparelho no armazém da Firstfield e
SAS TENTAM deram a formação em Portugal. No
EXPORTAR entanto, segundo os documentos
PARA PAÍSES judiciais, a empresa portuguesa, a
TERCEIROS pedido da iraniana, instalou câma- Q

61

Portugal
Q ras ocultas no armazém para fil-
mar todos os passos do treino. A 2 de
Fevereiro de 2015, o vídeo dessa for-
mação foi colocado numa cloud para
ser visto pelos iranianos.
OscrimesnosEUA
A tentativa de aquisição da quarta
máquina terá sido a primeira infrac-
ção cometida por João Fonseca nos
EUA. A 17 de Outubro de 2015 entrou
nos EUA pelo aeroporto de Boston.
Iria passar duas semanas em Swan-
zey, no New Hampshire, a visitar a
Moore Nanotechnology Systems
(MNS) onde ia testar uma máquina e
receber formação sobre o seu uso no
fabrico de lentes de alta precisão.
As negociações para a compra
desse aparelho por parte da First-
field decorriam há meses. A 31 de
Março, segundo as autoridades,
Paulo Vicente enviou à MNS uma
carta a confirmar a compra, por
352 mil euros, e a 6 de Maio uma
outra em que certificava que o mes-
mo “não seria vendido, transferi-
do ou exportado de Portugal”, ex-
cepto para os EUA, e que não seria
3 via de intermediária.
1 tos judiciais como “co-conspirador”
2
62
27 JULHO 2017
www.sabado.pt
O PROPRIE- usado em “actividades nucleares”.
TÁRIO DA Provas em tribunal Após a formação, João Fonseca re-
FIRSTFIELD Os documentos revelam gressou a Portugal. Os emails indi-
NEGA a investigação e a confissão cam que nessa altura a firma irania-
QUALQUER na já tinha pago 788 mil euros pelo
EXPORTA- 1 aparelho. No entanto, a maquinaria
ÇÃO PARA Queixa não saiu dos EUA: em Fevereiro de
O IRÃO Apresentada a 25 de Abril de 2016 foi retida em Nova Iorque.
2016, enumera os passos do Sem saber dessa apreensão, João
agente especial Robert Pinches Fonseca voltou aos EUA a 26 de
Março de 2016 para testar um novo
O plano 2 aparelho na Ideal Aerosmith. Duran-
Segundo as au- Acusação te a formação, o português assinou
toridades ameri- Deduzida em Maio de 2016, uma carta a certificar que o equipa-
canas, a empre- enumera os crimes de conspi- mento seria usado nas instalações da
sa portuguesa ração, violação do embargo ao Firsfield em Portugal, não seria usa-
adquiria a ma- Irão e de mentir ao Governo do para aplicações nucleares, nem
quinaria por um desviado, exportado ou revendido a
valor e revendia 3 um utilizador proibido pelos EUA.
por muito mais Proposta A 3 de Abril de 2016, João Fonseca
O acordo proposto a João e o seu funcionário foram abordados
Fonseca tinha 15 de Julho como pelo agente especial Robert Pinches
data limite para a sua aceitação no aeroporto de Minneapolis. Às
i 9h35 leram-lhes os direitos. O portu-
O conjunto de 4 guês começou por negar ter estado
documentos Declaração no Médio Oriente ou que a maquina-
judiciais obtidos Assinada por João Fonseca, ria tivesse como destino final o Irão.
pela SÁBADO
enumera os passos reconhece os crimes cometidos Mas perante as provas encontradas
da investigação no seu computador e telemóvel con-
fessou e admitiu que a Firstfield ser-
Confrontado pela SÁBADO, o pro-
prietário da Firstfield, Paulo Vicente
– que é apresentado nos documen-
–, nega esta versão e garante não ter
clientes no Irão: “Exportamos para
vários sítios, mas para esse não.” O
4
responsável começou por se mani-
festar surpreendido pelo contacto e
disse não querer “falar no assunto.”
No entanto, admitiu que João Fonse-
ca foi, através da sua empresa, “sub-
contratado para fazer um serviço”,
que conhece a situação dele e que o
tentou ajudar. “O advogado dele veio
cá, clarificou-se o que era preciso.
Até enviámos carta para a embaixa-
da para esclarecer a situação. Mas
não sei o que ele andou a dizer”, diz.
A SÁBADO apurou que ao longo da
investigação a justiça americana re-
cebeu a colaboração informal das au-
toridades portuguesas. A Procurado-
ria-Geral da República não esclareceu
à SÁBADO até ao fecho desta edição
se foi aberto em Portugal algum in-
quérito às actividades do português
e da firma para a qual trabalhava. W
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 Portugal

Segredos da CIA
sss

A SÁBADO publica o último de três artigos com revelações de Portugal Visto pela CIA, do jornalista Luís Naves.
O livro, que a Bertrand editará em Setembro, revela documentos inéditos sobre a actividade dos espiões
americanos em Portugal. Os relatórios da agência dedicados à revolução e ao Verão Quente sugerem que
esta falhou em momentos cruciais, provavelmente em consequência da pior crise da sua história

ACIAE
AREVOLUÇÃO
Os políticos americanos dividiram-se sobre o que fazer em
1975: no ano anterior, tinham abandonado Spínola, no auge
do Verão Quente esperavam uma guerra civil. Por LuísNaves

agência de espionagem são são pouco claras, mas podem

A americana levou algum

tempo a compreender
que o golpe militar de 25
de Abril de 1974 era na realidade
controlado por oficiais de patente
intermédia, cujas intenções os es-
piões americanos aparentemente
desconheciam. Apesar de haver in-
dícios de instabilidade política em
Portugal nos meses anteriores ao
golpe, a CIA foi apanhada de surpre-
sa e continuou a julgar que se trata-
va de um movimento liderado por
generais. Como sugerem os relató-
rios desclassificados da agência, os
espiões americanos levaram sema-
nas a compreender que o general
António de Spínola estava longe de
controlar a situação e que a sua
eventual queda daria origem à radi-
calização inevitável do País. Os Es-
tados Unidos tiveram oportunidade
de ajudar o Presidente Spínola, mas
nunca o fizeram. As razões da omis-
EDUARDO GAGEIRO
27
de Abril
Os espiões nor-
te-americanos
estar ligadas ao calendário do es-
cândalo Watergate, à incompreen-
são do problema por parte do Presi-
dente Richard Nixon e do seu secre-
tário de Estado, Henry Kissinger, ou
redigem um ex- à profunda crise interna na própria
tenso relatório agência de espionagem, que um
em que o MFA pouco antes do golpe em Portugal
apenas é referi- tinha sido alvo de uma purga em
do uma vez larga escala.
Se a revolução portuguesa tivesse
acontecido no ano anterior, a actua-
ção de Washington teria sido prova-
velmente diferente e a radicalização
PORTUGAL do Verão Quente de 1975 talvez
CAÍA NO nunca tivesse acontecido, como não
CAOS E A CIA, teria acontecido se a revolução
IMPOTENTE ocorresse um pouco depois, a exem-
PARA INTER- plo da relativamente tranquila tran-
FERIR, PRO- sição espanhola. A mudança em
DUZIA RELA- Portugal surgiu no pior momento mendações de acção política.
TÓRIOS COM possível. Washington limitou-se a Além dos telegramas com os factos
PREVISÕES observar com estupefacção o agra- iniciais emitidos nos dias 25 e 26 de
SOMBRIAS vamento da situação e os seus su- Abril, a agência de espionagem
cessivos episódios: o 28 de Setem- americana produziu no dia 27 de
bro, o 11 de Março, a descolonização. Abril de 1974 um extenso relatório
Portugal caía no caos e a CIA, impo- secreto, The Coup in Portugal, no
tente para interferir ou com as mãos qual os espiões explicavam as ra-
atadas, produzia relatórios com pre- zões da acção militar e as perspecti-
visões sombrias e escassas reco- vas imediatas do novo regime: “A
subida [do general António] de Spí-
nola ao poder é uma notável de-
j monstração do poder, em simultâ-
As razões neo, da caneta e da espada. O herói
1974 de guerra mais condecorado do País
Os espiões da CIA reconheciam foi também autor de um livro que se

como motivações para o golpe a atreveu a dizer que é impossível

guerra colonial e o fracasso de uma solução militar para o proble-
Caetano em liberalizar o regime ma da insurreição em África e que é

64

preciso encontrar uma solução polí-
tica”, podia ler-se no documento. O
MFA era citado apenas uma vez, e os
seus líderes eram “praticamente
desconhecidos, quase de certeza ofi-
ciais de patente intermédia devota-
dos a Spínola”.
Neste memorando, a CIA contava
detalhadamente a história da crise
política dos meses anteriores, com
os problemas entre Marcello Caeta-
no e os generais Spínola e Costa Go-
mes, que tinham sido demitidos dos
seus cargos, respectivamente, de
vice e chefe do Estado-Maior. Spí-
nola publicara entretanto o livro ci-
tado no relatório, Portugal e o Futu-
ro, que na altura abalou o regime.
“Muitos jovens oficiais de patente in-
j numa futura abertura à Europa. Um
A revolução
1974
O golpe militar conduzido por
oficiais de patente intermédia
apanhou a CIA de surpresa:
a agência pensou que este
fora liderado pelos generais
termédia apoiam as ideias de Spíno-
la. Alguns ficaram ainda mais des-
contentes com o seu afastamento e
Vacina com a demissão dos seus apoiantes”,
Visto de Wa- podia ainda ler-se no documento
shington, o Ve- secreto, que atribuía o golpe militar
rão Quente de a este descontentamento, mas sem
1975 parecia o nunca perceber que os generais que
início de uma pareciam estar no poder eram, na
guerra civil que realidade, figuras de proa de um
alastraria a Es- movimento mais vasto e complexo
panha. O secre- que incluía dezenas de oficiais muito
tário de Estado mais novos. No resumo inicial (nos
Henry Kissinger documentos de espionagem as con-
defendia a tese clusões estão no início), Spínola era
da vacina: isolar elogiado e os espiões americanos
Portugal consideravam que o novo líder por-
tuguês poderia manter as clivagens
militares sob controlo. Estas não ti-
nham a ver com as facções políticas
que viriam a criar-se dentro do MFA,
mas a CIA estava neste caso a refe-
rir-se ao conflito entre conservado-
res e liberais.
Além da guerra colonial que esta-
va a consumir os recursos do País,
os espiões da CIA reconheciam que
as razões do golpe remontavam ao
fracasso de Marcello Caetano de
proceder a uma liberalização do re-
gime, algo que estivera em cima da
mesa entre 1969 e 1971, mas que os
sectores mais conservadores ti-
nham vetado.
A leitura do relatório de dia 27 de
Abril, que tem ainda parágrafos ra-
surados, coloca vários problemas,
por exemplo na parte sobre análise
WASHING- da economia portuguesa ou da Igre-
TON ja Católica. Os espiões americanos
LIMITOU-SE descreviam o regime português
A OBSERVAR como tendo uma economia fechada
COM ESTU- e pobre, controlada por um pequeno
PEFACÇÃO conjunto de famílias. Segundo a CIA,
O AGRAVA- que não adiantava uma boa explica-
MENTO DA ção neste ponto, os grupos econó-
SITUAÇÃO micos portugueses controlavam os
EM negócios africanos, mas podiam
PORTUGAL eventualmente estar interessados
27 JULHO 2017
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dos subtítulos é sobre “a oligarquia”,
mas todas as referências a essa pala-
vra foram rasuradas pelos censores,
por motivos desconhecidos, embora
a palavra oligarquia se mantivesse
no sumário, com o elenco dos temas
e das respectivas páginas. O relató-
rio dava ainda conta do desconten-
tamento entre muitos sacerdotes ou
entre a juventude, mas não conse-
guia grandes conclusões sobre o que
se iria passar nas colónias, nomea-
damente com a população branca.
No plano económico, não constava
neste primeiro memorando da CIA
qualquer referência ao papel que
Portugal tivera na ajuda de emer-
gência ao governo de Israel, durante
a Guerra de Outubro de 1973, que
valera a Lisboa um boicote de forne-
cimento de petróleo: as dificuldades
de abastecimento, o aumento do
custo da energia e a inflação daí re-
sultantes tiveram sério impacto na
instabilidade que antecipou o 25 de
Abril, mas o assunto é totalmente
ignorado.
Àbeira da guerra civil
A informação parecia relativamente
pobre ou até incompleta, como se o
relatório de 27 de Abril de 1974
tivesse sido preparado um pouco à
pressa. Como interpretar a total au-
sência de informação sobre os mili-
tares que tinham executado o golpe,
nenhuma explicação sobre o MFA
ou sobre as consequências em Áfri-
ca? O facto é que a perplexidade da
CIA continuou nos meses seguintes,
como mostram alguns dos docu-
mentos da época, retirados de uma
vasta colecção de relatórios da
agência de espionagem e do Depar-
tamento de Estado (diplomacia
americana), material analisado com
mais detalhe no livro Portugal Visto
pela CIA, que a Bertrand publicará
em Setembro.
A falta de espaço obriga-nos a dar
um pequeno salto no tempo, sem
entrar no período de radicalização
revolucionária que levou ao chama-
do Verão Quente, um período de
oito meses, entre Março e Novembro
de 1975, em que Portugal mergulhou
numa crise política e social profunda
que, vista da América, parecia o iní-Q
65
 Portugal
Q cio de uma guerra civil capaz de
alastrar a Espanha. A administração
Ford estava dividida em relação ao
que fazer: o secretário de Estado
Henry Kissinger (que durante algum
tempo teve imenso poder) defendia
a tese da vacina, que implicava o
isolamento de Portugal, enquanto o
embaixador em Lisboa, Frank Car-
lucci, subordinado de Kissinger,
apostava no apoio às forças mode-
radas. Carlucci acabou por vencer o
debate, provavelmente com ajuda
da CIA, como parece sugerir o con-
teúdo de um extraordinário memo-
rando da agência de espionagem,
datado de 29 de Agosto de 1975,
Portugal: A Step Closerto Civil War,
assinado pelo tenente-general Ver-
non Walters, que fora enviado a
Portugal para observar o que se pas-
sava. Referindo-se à substituição do
primeiro-ministro-general Vasco
Gonçalves pelo almirante Pinheiro
de Azevedo, o então director em
exercício da CIA considerava que
Portugal acabara de dar um passo
adicional na direcção de uma guerra
civil, mas considerava que era possí-
vel gerir a situação: “A facção [mili-
tar] anticomunista de Melo Antunes
terá agora de decidir se derruba a
nova situação, como anteriormente
disse que ia fazer, ou se perde a
oportunidade de mudar a direcção
para que o País se encaminha.”
Vasco Gonçalves fora elevado a
chefe do Estado-Maior e estava
agora em condições de afastar to-
dos os oficiais que se opunham à
radicalização, mas isso não era ine-
vitável, apesar de Walters ter ava-
liado mal a posição do almirante
que chefiava o governo, apontado
no relatório como provavelmente
próximo dos radicais, mas que se
revelou democrata.
O memorando da CIA enunciava
uma recomendação geral de apoio
aos oficiais anticomunistas do MFA,
que semanas antes tinham feito um
ultimato à facção radical do movi-
mento das forças armadas. Os mo-
derados teriam apoio de unidades
militares no Centro e no Norte do
País e queriam que a revolução se
mantivesse democrática. Isto não
estava explicado no memorando,
mas o chamado Grupo dos Nove
66
PARA A CIA, exigia que fosse respeitada a Assem-
A SUBSTITUI- bleia Constituinte, que resultara das
ÇÃO DE VAS- primeiras eleições livres, em Abril de
CO GONÇAL- 1975, e que os comunistas preten-
VES POR diam substituir por assembleias po-
PINHEIRO pulares, ao estilo dos sovietes que ti-
DE AZEVEDO nham sufocado a primeira república
ERA MAIS UM russa. A analogia, aliás, não escapara
PASSO PARA a Henry Kissinger, que considerava
A GUERRA Mário Soares o equivalente portu-
CIVIL guês de Alexander Kerensky (chefe
de governo derrubado pelos bolche-
viques em Novembro de 1917). Muito
em resumo, o memorando de 29 de
Agosto contava que o embaixador
Carlucci tivera contactos regulares
com os moderados e que alguém
nesse grupo, cujo nome não era re-
ferido, teria garantido que os demo-
cratas estavam dispostos a avançar
sobre Lisboa e a “empurrar os co-
munistas para o mar”, frase que no
documento aparecia entre aspas, dos oficiais moderados “afirma ter o
tendo pois sido pronunciada por al- apoio do general Carvalho, chefe
guém ligado aos moderados do MFA das forças de segurança interna”. A
e que os americanos consideravam referência só pode ser a Otelo Sarai-
uma fonte credível. va de Carvalho, na altura um dos
É Otelo? Existia outro grande mistério neste membros do triunvirato de generais
Um memoran- memorando, o ponto 3, onde se di- que dominava a política portuguesa
do de Agosto zia, preto no branco, que o grupo (formado pelo Presidente Costa Go-
de 1975 referia mes, por Vasco Gonçalves e o pró-
que os oficiais prio Otelo). No fim de Agosto, Otelo
moderados i estava à frente do Comando Opera-
tinham o apoio Descrença cional do Continente (Copcon) e era
do “general 1975 considerado um dos oficiais mais ra-
Carvalho”, consi- O embaixador Carlucci com Soares: dicais do MFA. O facto é que a radi-
derado um dos Henry Kissinger equiparava-o a Ke- calização continuou por mais três
mais radicais rensky, o chefe de governo derruba- meses, até 25 de Novembro, quando
do pelos bolcheviques em 1917 ocorreu uma movimentação militar
“OS DEMO-
CRATAS ES-
TÃO DISPO-
NÍVEIS PARA
‘EMPURRAR
OS COMU-
NISTAS PARA
JORGE PAULA/CM
O MAR’”,
DIZIA FONTE
DO MFA

que, dispondo do pleno apoio dos
partidos democráticos, travou o fre-
nesim em que caíra a sociedade
portuguesa, permitindo a criação,
sem mais violência, de uma demo-
cracia de tipo europeu.
O espiãoincendiário
O memorando de Vernon Walters
de 29 de Agosto de 1975 foi prova-
velmente decisivo para mudar a
opinião de Kissinger (e do Presidente
Gerald Ford) sobre o rumo da revo-
lução portuguesa, mas o próprio do-
cumento reconhecia que o embaixa-
dor em Lisboa era o americano que
melhor compreendia a situação.
Nesta altura, a CIA esteve sob inten-
so escrutínio do Congresso e da opi-
nião pública e, em 1975, tudo correu
mal aos espiões americanos. Um dos
grandes símbolos do descalabro é a
história de um agente chamado Phi-
lip Agee, que abandonara a agência
no início dos anos 70 e que ajudou a
desbaratar as operações da CIA em
Portugal. Foi, aliás, a maior denúncia
colectiva da história da espionagem
americana, com a divulgação de
operações e agentes.
A 8 de Agosto de 1975, (três sema-
nas antes do relatório de Walters), o
Diário de Lisboa publicou, com des-
taque de primeira página, a história
de uma denúncia feita em Londres
pelo ex-agente da CIA, Philip Agee:
tratava-se da lista, com 16 nomes,
g criação de um clima ainda mais pa-
O general
1974
É pouco claro porque é que os EUA
não ajudaram Spínola. Foi o Water-
gate, a crise na CIA ou a incom-
preensão do que se passava por cá?
dos agentes da CIA em Lisboa, inse-
rida num panfleto, Carta ao Povo
Português, publicado por Agee
numa revista britânica de extrema-
-esquerda, e que o jornal português
citava abundantemente.
Por razões desconhecidas, a notí-
cia do DL não teve sequência, talvez
por surgir num momento de enorme
delicadeza política, mas as opera-
ções da CIA foram completamente
queimadas. O panfleto Carta ao
Povo Português seria mais tarde tra-
duzido e publicado na íntegra, como
aliás foi publicado, dois anos depois,
o livro de Agee, Diário de um Agente
da CIA, grande êxito de vendas
mundial, ainda hoje considerado um
dos melhores manuais da actividade
de espionagem.
As revelações de Agee em Agosto
de 1975 afectaram as operações da
agência de espionagem americana
um pouco por todo o mundo. Em
Portugal, o efeito das denúncias foi
sobretudo o criar a convicção, na
extrema-esquerda, de que a estraté-
gia americana seria aqui muito se-
27 JULHO 2017
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melhante à seguida no Chile. O ex-
-agente trabalhara 15 anos na CIA,
16
espiões
mas fizera toda a sua carreira em
países da América Latina. Desiludi-
da CIA em do com aquilo que vira no Uruguai
Lisboa viram e no México, abandonou a agência
os seus nomes e decidiu escrever um livro onde
revelados pelo denunciava os abusos da espiona-
antigo agente gem. Depois, transformou as de-
Philip Agee núncias em campanha política, mas
numa revista foi acusado pelo antigo empregador
britânica de ser agente duplo. O facto é que a
estratégia americana em relação a
Portugal foi diferente da seguida no
Chile, como demonstra o resultado:
a radicalização chilena foi inter-
rompida em 1973 por um golpe mi-
litar que instalou uma ditadura fe-
roz, mas no caso português o resul-
tado foi um regime democrático. As
acusações de Carta ao Povo Portu-
guês podem ter contribuído para a
Livro ranóico e perigoso nas clivagens in-
Portugal ternas da sociedade portuguesa. Se-
Visto Pela CIA gundo a denúncia de Agosto de
1975, a CIA tinha duas dezenas de
Autor agentes em Portugal, mas muitos
Luís Naves outros que se dedicavam, em várias
Editora capitais europeias, a difamar e de-
Bertrand sestabilizar “a revolução popular”.
Havia também dinheiro para os
partidos e para a Igreja, infiltrações
nas instituições revolucionárias e
operações que visavam agitar a po-
pulação, dividir os militares e inti-
midar as forças progressistas. A car-
ta defendia o abandono da via elei-
toral, que o ex-espião considerava
ter sido manipulada, e a defesa de
órgãos populares que substituíssem
os eleitos.
Philip Agee acabaria por ser desa-
creditado. Perseguido até ao obituá-
rio pela CIA, como alguém escreveu,
viria a morrer no exílio em Cuba, em
2008, com 73 anos e fama de trai-
PARA OS dor. Embora esteja hoje esquecido, o
ESPIÕES, ex-espião lançou gasolina para a fo-
PORTUGAL gueira da revolução portuguesa, difi-
TINHA UMA cultou o olhar da espionagem ame-
ECONOMIA ricana sobre Portugal, mas é difícil
FECHADA E perceber se teve impacto: até que
POBRE, ponto o medo de um cenário chile-
CONTROLA- no aconselhou prudência aos revo-
DA POR UM lucionários no momento decisivo? E
PEQUENO talvez as dificuldades da CIA tenham
CONJUNTO dado uma oportunidade inesperada
DE FAMÍLIAS aos diplomatas. W
67
 Mundo
IRAQUE. O DIA-A-DIA APÓS A DERROTA DO ESTADO ISLÂMICO
VINGANÇA,
IMPUNIDADE
E CORRUPÇÃO
EM MOSSUL
Na segunda maior cidade iraquiana, as leis da guerra não
estarão a ser cumpridas: supostos jihadistas são atirados de
prédios ou executados por soldados iraquianos. Por Sara Capelo
ra de noite quando o lojis-
E ta ouviu múltiplos tiros
num edifício abandonado.
Se em qualquer cidade do
mundo este som não passaria des-
percebido, em Mossul, onde a paz
fora alcançada dias antes, ainda
menos. O primeiro-ministro Haider
al-Abadi anunciara a 10 de Julho a
expulsão do Estado Islâmico (EI) e
o fim dos combates depois de oito
meses e meio. As ruas da segunda
maior cidade do Iraque eram agora
território controlado por soldados,
como os da 16ª divisão que o lojista
por ali vira horas antes dos dispa-
ros. O que teria acontecido?
Quatro dias depois, o mesmo
lojista conduziu um grupo de ob-
servadores internacionais até aos
17 cadáveres dispostos em fila e ro-
deados por poças de sangue no in-
terior do edifício. Tinham sido exe-
cutados, possivelmente pelos mili-
tares da 16ª divisão, por suspeita de
filiação ao EI. Estavam vestidos à
civil, a maioria deles vendados e
com as mãos atadas atrás das cos-
tas. O caso foi reportado pela Hu-
man Rights Watch (HRW), organi-
zação a que têm chegado outros
relatos de tortura e assassinatos
68
AMINA, QUE por militares iraquianos: de cinco
APARENTA
TER 3 ANOS E
FALA RUSSO,
EXPLICA
QUE A MÃE
homens amarrados ao capô de um
Humvee num dia de 48 oC a outros
atirados do topo de prédios.
Num vídeo, posto no Facebook por
um alegado habitante de Mossul,
E O PAI SÃO vêem-se homens vestidos com ca-
“MÁRTIRES” muflados (que a HRW diz serem
membros do Serviço de Contraterro-
rismo Iraquiano) a baterem num ou-
tro; alguns segundos depois, esse ho-
i mem está inerte no chão, três ou
Os soldados “têm quatro andares abaixo do local onde
lutado por tanto os soldados disparam sobre ele e um
tempo, estão outro cadáver. Não se viu ninguém a
exaustos e querem
vingança”, diz empurrá-lo, mas a organização que
uma observadora monitoriza os direitos humanos
pressupõe que foi o que aconteceu.
São três os motivos por que as
leis da guerra não estão a ser cum-
pridas, afirma à SÁBADO Belkis
Wille, investigadora da HRW para
o Iraque e Qatar: a certeza de im-
punidade, um desejo de vingança e
o medo da corrupção vigente no
país. “Parte deve-se à ideia de que,
assim que foi possível dizer que a
operação tinha terminado, a aten-
ção [internacional] mudou e o sen-
timento é que ‘nós soldados decidi-
mos como limpar porque ninguém
está a ver’.” Por outro lado, “estes
homens têm lutado por tanto tem-
po, estão exaustos, zangados e
querem vingança”. Por fim, os ira-
quianos temem a existência de cé-
lulas adormecidas do Estado Islâ-
mico em Mossul ou a fuga dos seus
soldados dos campos-prisão em
troca de dinheiro.
O ex-ministro das Finanças ira-
quiano, Hoshyar Zebari, um curdo
nascido em Mossul e ele próprio
destituído em Setembro de 2016 por
suspeitas de corrupção, revelava há
dias que um jihadista consegue pas-
sar os postos de controlo pagando
855 euros e que por 1.283 euros pode
levar o carro.

Estes militantes do EI fogem de
uma cidade que funciona a dois
tempos. Mossul Este, a zona mais
moderna, que sofreu menos ata-
ques aéreos e foi conquistada no
início do ano, tem negócios a fun-
cionar e escolas abertas, onde as
crianças têm aulas apesar de os
professores não receberem salários
há três anos. Mas na Cidade Velha,
conquistada no início de Julho ao
Estado Islâmico, falta tudo. Quando
ali esteve, Melany Markham, porta-
-voz do Norwegian Refugee Coun-
cil (NRC), não encontrou crianças a
brincar nas ruas ou mulheres às
compras. Nem podia: “Não há es-
colas, hospitais, energia e a única
água que têm é a do [rio] Tigre”,
descreve à SÁBADO. Três quartos
das estradas foram destruídas, qua-
se todas as pontes desapareceram.
A NRC e outras organizações já es-
tão no terreno para lhes devolver
as infra-estruturas básicas. A água
é uma das primeiras para ajudar os
habitantes a suportarem os dias de
45 oC. Só para estas obras, calculam
as Nações Unidas, serão necessá-
rios mil milhões de dólares (855
milhões de euros). A NRC ainda
não conseguiu entrar na totalidade
27 JULHO 2017
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lenço creme e preto empoeirado
(tal como a sua roupa escura com-
prida e a pele) cobria a cabeça da
adolescente que fugiu de casa, em
Pulsnitz, na Saxónia, há um ano,
depois de se radicalizar nas redes
sociais.
As noivas e os filhos do Daesh
Casadas ou noivas de jihadistas, os
serviços de inteligência iraquianos
acreditam, segundo revelaram três
fontes à AP, que estas mulheres de
origens tão variadas como Cheché-
nia, Síria e Bélgica fariam trabalho
de secretariado no departamento
policial do EI. Além de Linda, há
outra cidadã alemã detida, confir-
mou à SÁBADO o Ministério dos
Negócios Estrangeiros germânico.
Com o olhar vazio e uma ferida
FOTOS GETTYIMAGES
de bala na perna, Linda – que per-
deu o marido numa batalha pouco
depois de chegar – pediu para re-
gressar: “Quero ir-me embora da
guerra, das muitas armas, do baru-
lho.” Por ser menor, o seu desejo
g até poderá ser concedido. À SÁBA-
A ONU necessita DO, o Ministério de Sigmar Gabriel
de mil milhões Comida? Só lá fora
de dólares (€855 remeteu uma resposta sobre um
O governo já paga os salários
milhões) para eventual pedido de extradição para
reconstruir infra- aos funcionários públicos
o procurador-geral do país. Mas se,
-estruturas básicas
Desde Outubro de 2016, 940 pelo contrário, Linda e as outras
mil civis abandonaram Mossul. mulheres forem julgadas sob a lei
Um terço viverão em campos. antiterrorismo iraquiana, está-lhes
Entre os que ficaram, 40 mil destinada uma de duas sentenças:
foram mortos em ataques de a vida na prisão ou a morte.
ambos os lados do conflito. As crianças encontradas a va-
Os que sobreviveram e ainda guear sujas e nuas (algumas a ali-
não têm fontes de rendimento mentarem-se de carne crua) nas
Quem é saem da cidade à procura de ruínas de Mossul são um outro pro-
Linda W.? comida dada pelas ONG e re- blema. A Unicef já conseguiu iden-
Cresceu numa gressam, conta Melany Markham. tificar a família de 1.300. Mas mui-
família protes- tas outras continuam sem saber o
tante, mas as que aconteceu aos pais. Não é o
conversas onli- caso de Amina, uma criança que
ne com um jiha- do território conquistado e teme as aparenta ter 3 anos: em russo, e
dista do Estado bombas colocadas nas escolas. E com algumas palavras em árabe,
Islâmico motiva- em 15 distritos residenciais 32 mil consegue explicar que a mãe e o
ram-na a con- casas foram reduzidas quase a pó. pai são “mártires”. Ou o de Khadija,
verter-se ao is- A reconstrução civil – e o regresso cujo pai morreu em batalha e a
lão: vestia-se de da totalidade dos 940 mil desloca- mãe se fez explodir junto a milita-
forma conserva- dos – demorará muitos anos, prevê res. Os soldados iraquianos cha-
dora, levava o Belkis Wille. mam-lhes “filhas do EI”. Não é cla-
Corão para a es- Linda W., uma alemã de 16 anos, ro o que lhes sucederá, mas os
cola e aprendeu estava escondida com dezena e meios de comunicação internacio-
árabe. Aos 15 meia de mulheres numa cave nes- nais apontam para a hipótese de
anos, fugiu para sa parte da cidade. Junto a elas ti- serem devolvidas aos países de
o Iraque nham armas e cintos-bomba. Um origem dos pais. W
69
 Opinião

O tra o Estado português, ou a descober-

RELATÓRIO ta de uma rede delituosa extensa, ou a

MINORITÁRIO A pré- ineficácia ou inconclusividade das in-

vestigações perturbaráo idílio.
Depois da desgraça, parece
que o governo caminha
-campanha Ninguém bem formado querviverde
desgraças, ou vinganças.
outra vez em estado de Mas qualquer indício de negligên-

graça. Ou será que a luz ao
fundo do túnel é um
comboio? E como se gere a
incerteza, em descarada
pré-campanha autárquica?
A
ntónio Costaregressade férias,
e parece que, com asua“coor-
denação” modelar, acabam os
problemas do governo.
Mas é um falso ambiente de tran-
quilidade.
Naverdade, só aquase total boavon-
tade de Belém, aquase total timidez do
PCP, aquase total domesticação do BE,
a quase total incompetência do PSD e
aquase total irrelevânciado CDS criam
esse climaparadisíaco.
O que mostra que tudo está colado
com cuspo, alicerçado na mera “co-
municação” e “imagem”, ou no instinto
de sobrevivência.
Ninguém de bem quermal àPátria.
Mas o mínimo uso de armas de Tan-
cos, ou qualqueracção de vítimas con-
cia, incompetência funcional ou des-
coordenação culposas, no inquérito
judicial à tragédia de Pedrógão, alte-
rará o ar pacífico do oceano que ba-
nha o governo.
Estes dados podem influenciar, claro,
as eleições autárquicas de Outubro.
Mas há grandes linhas já traçadas, e
que dificilmente mudam.
Umadelas relaciona-se com apéssi-
maescolhado PSD em cidades funda-
mentais.
Unido ao CDS no Porto, mas em tor-
no de umacandidaturacinzentae ron-
ceira, desavindo com o CDS em Lis-
boa, numa altura em que precisava de
coligação antifulanista, e de arrepiar
caminho, o partido de Passos pode ca-
minharparaum desastre.
No Porto, o PSD devia ter-se enten-
dido com o actual presidente, ou Q

O j
Trabalhos
de Hércules
Ou a FAP substitui seis C-130, ou Por-
tugal fica sem capacidade táctico-es-
tratégica de transporte. O ideal seria
um avião multiuso, para a paz, para a
guerra e para a incerteza. Isto é, da
vigilância ao reconhecimento, da pa-
trulha marítima à retirada médica, da
largada de pára-quedistas e forças
especiais ao combate pesado aos fo-
gos, do reabastecimento ao apoio ar-
mado terrestre.
As hipóteses são o brasileiro da
Embraer, o KC-390, que custa 85
milhões, o Atlas (Airbus A400 M) de
152 milhões, e o Super Hercules (C-
130J) de 60.
O primeiro é o projecto mais avan-
çado, mas menos provado. O último
JORGE GODINHO

O
Politólogo é o mais testado e popular, mas mais
Nuno Rogeiro antigo. O Airbus é platina, mas patina.
nrogeiro@gmail.com Cabeça precisa-se. W

70

Q combatero seu “justicialismo edifi-
cador” com um fenómeno igual.
Não quis: parte para a ofensiva an-
dando paratrás. Face aPéron, o Conse-
lheiro Acácio. Não só pode seresmaga-
do, como sofrero ridículo, o que é pior.
Uma recomendação: desistam a fa-
vor de Moreira, ou demonstrem que
este se limitou aadministrarbem ahe-
rançajacente de Rio.
Ou surjam mais papistas do que o
Papa, e sejam realistas, pedindo o im-
possível: que o Porto se torne, em defi-
nitivo, 50% da capital, em instituições
públicas e sedes de governo.
O h
As duas verdades
Os dados sobre a economia dos EUA
são excelentes. As sondagens mos-
tram-no, ao contrário das desastrosas
(para Trump) amostras sobre política.
Face à Rússia, Washington treina,
arma e equipa os ucranianos, envia o
Global Hawk para o Donbass, exerci-
ta manobras anfíbias junto à Crimeia,
D.R.
reforça as sanções.
Mas o que fica nos ouvidos são os
apartes e os tweets do Presidente, as
questiúnculas pessoais e partidárias, e
as intermináveis batalhas no Congres-
so sobre a “cumplicidade” Trump-
-Putin.
Anthony Scaramucci (na foto), o
novo director de comunicações da
Casa Branca, é suposto ser o super-
homem que vai racionalizar tudo isto.
Mas nem Clark Kent conseguiria.
REUTERS
A esquizofrenia está para ficar.
É a marca. W
Em Lisboa, o PSD diz que não se coli-
gou, porque Cristas avançou primeiro.
Conversas de recreio infantil. O que é
que isso interessaao bem comum?
E o principal fardo do partido, na ca-
pital, foi o total silêncio, cumplicidade e
capitulação com a parte de Medina
que resultou em desgoverno. E a inca-
pacidade de elogiar o que naquela
houve de bom senso.
Conselhos: desistam a favor de Cris-
tas, se não conseguirem que Cristas
desistaem favordo PSD.
Ou façam penitência pela omissão
de explicar aos lisboetas que a cidade
cresceu para o turismo, e bem, mas foi
encurtadaparaos nativos, e mal.
Pela omissão em pedir contas pelas
obras monumentais, mas supérfluas
(como se demonstrará), e em exigir
verdadeiras zonas pedonais onde elas
não existem, por exemplo, na Rua São
Pedro de Alcântara.
Pela omissão em perguntar porque
não se fez do início da Avenida de
Brasília ao fim do Cais do Sodré a
grande, continuada e arborizada ci-
clovia da cidade, em vez da floresta e
j acústica (1), Dave Douglas electrifica-
27 JULHO 2017
www.sabado.pt
patéticacicloviaabochechos, no meio
da 24 de Julho.
Pela omissão em denunciar a nova
degradação do Intendente, que leva
cada vez mais tolerantes a pedir um
PinaManique.
Pelo silêncio face ao empobrecimen-
to dos locais, à sujidade crescente e à
degradação do trânsito, face à cobar-
dia em não o proibir em períodos se-
manais, ou em investir realmente em
transportes públicos dimensionados,
suficientes, racionais e eficazes.
No resto do País, o PS pode ter pro-
blemas catastróficos, face acandidatos
independentes, populistas, ou desloca-
dos das lideranças tradicionais. Em
muitos sítios, o que vale ainda é a pro-
ximidade àterra, não o favordo minis-
tro-barão-patrão-protector.
Quanto ao PCP e ao BE, pagarão
muito provavelmente pelo silêncio
face ao triunfo do capital no Terreiro
do Paço, que pode ser menos tolerado
naperiferiado que no centro.
É apré-campanha.
Que avança, ora envergonhada ora
desavergonhada. W
O
Concertos
desconcertantes
Agosto é jazz na Gulbenkian, em Lis-
boa. Como sempre. Começa neste
fim de Julho: Steve Lehman (28/29,
na foto) experimenta o rap, a guitarra
torna-se vulcão com David Torn (29),
e há ambiental inteligente com a
franca Coax Orchestra (30).
Depois, dois trompetistas brancos,
aventurosos, Susana Santos Silva
do (6), o pseudogospel irónico do
magnífico Starlite Motel (3), música
marcial de câmara pelos Human
Feel, e o sopro surpresa de Phil Ochs.
E quem queira subir ao mítico Mar-
vão pode escutar a Idade Média por-
tuguesa na voz de Sofia Vitória, com
as grandes cordas de José e Luís Pei-
xoto e Carlos Barretto. Dia 29, já sá-
bado, num entardecer glorioso. W
71
 Dinheiro

j inha 16 anos quando se

T
Pedro de Almeida, ajeitou à moda da tropa
72 anos, vive em
Portugal desde (farda e cabelo curto)
o dia 28 de Maio – para entrar na escola na-
mudou-se para cá val e deixar de dar des-
para gerir o dossiê
da Comporta pesa à mãe – o pai, médico, morre-
ra subitamente e eram sete filhos
para sustentar, o mais novo com 5
anos. Como ainda não havia ricos
na família, só o salário de uma ana-
lista química, Pedro de Almeida foi
improvisando, vendeu enciclopé-
dias, andou a bater à porta de donas
de casa para saber que detergentes
usavam (e quantas vezes por dia),
arranjou cama e estudos pagos na
Marinha e uma vida militar que o le-
vou à improvisação seguinte: sair
80
accionistas
dela. “Para se ser militar é preciso
ter o chamado espírito militar e ele
Pedro de Almei- odiava aquilo. Foi um calvário”, diz
da assinou um um amigo. “Convenceu o médico
acordo por 59% que o tipo de vida que tinha ali não
do capital; era compatível com a maneira de
a família Espírito ser dele e que, se continuasse, aca-
Santo tem, ain- baria por enlouquecer.” Depois de
da, 26% do capi- várias semanas no hospital, interca-
tal, divididos por ladas com longos períodos em casa
cerca de 80 e com outras tantas conversas com
pessoas o médico (que por sorte estudara
Medicina com o seu pai), o esperado
relatório ficou finalmente pronto:
serviço militar cumprido, baixa por
incapacidade física.
Seriam precisos mais 56 anos e
muitas outras improvisações para
que o empresário, agora com 72 e
ainda workaholic convicto, chegasse
onde está hoje – em Setembro de
TEM GABINE- 2015 montou uma equipa nova (seis
TE JUNTO AO a sete pessoas em permanência); em
CHIADO, Maio do ano seguinte mudou-se
UMA CASA A para Portugal depois de 38 anos a vi-
20 METROS ver fora; já este mês assinou o con-
DALI, OUTRA trato de compra e venda de 59% do
NO ESTORIL. fundo que gere a área imobiliária da
MARISA CARDOSO

ANDA A Comporta. Tem, agora, até Outubro

CAVALO NA para negociar as cláusulas que fal-
COMPORTA tam – a conclusão do negócio de-

PERFIL. PEDRO DE ALMEIDA, O HOMEM QUE CONCORREU SOZINHO AO RETIRO DOS ESPÍRITO SANTO

ELE QUERACOMPO
Não nasceu empresário, nem rico, mas fez-se ambos. Antes disso viveu no campo (odiou), estudou
72
 27 JULHO 2017
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pende de autorizações do Luxem-

burgo, Suíça e Portugal, e de acordos Perfil
com grandes credores como a Caixa Nasceu
Geral de Depósitos (reclama uma dí- em Coimbra,
vida de mais de 100 milhões de eu- viveu em Santa-
ros ao fundo que gere o antigo retiro rém. Odiava o
dos Espírito Santo), e ainda deve de- campo
morar pelo menos dois meses.
Entrou na tro-
A mudança para Portugal pa aos 16 anos
Desde que vive em Portugal, o em- porque não pa-
presário divide-se entre o escritório gava estudos
da R. Vítor Cordon, em Lisboa, onde nem quarto
trabalha em open space, a casa que
tem a 20 metros dali (“é muito pre- Aos
guiçoso”, diz o mesmo amigo, por
isso “raramente fica no seu aparta- 32
mento do Estoril, onde tem serviço foi trabalhar
de hotel”), e a segunda casa que fez para Paris. De-
na Comporta, há um ano, com a ter- pois Genebra.
ceira mulher (já tinha deixado outra Esteve fora de
à segunda ex-mulher) – é ali que Portugal 38
gosta de andar a cavalo pelas dunas anos
e praias da região. “Quem vê a fase
final pensa, eh pá, este tipo é um Casoutrês ve-
milionário do petróleo, viveu em zes: aos 23 anos,
Paris, em Genebra, tem casas em aos 34 e há qua-
todo o lado, fácil não é? Mas essa é tro anos
só a parte mais visível”, acrescenta
outro amigo. Uma parte visível que
nem sempre agrada à família – “Oh,
pai, que vergonha, já viu? Discreto e
multimilionário. O pai nem é discre-
to e que eu saiba também não é
multimilionário”, atirou uma das
duas filhas (tem três, um rapaz do
primeiro casamento, duas raparigas
do segundo) quando viu as notícias
sobre a venda da Comporta. E uma
parte visível que esconde o resto. CONVENCEU
Pedro de Almeida, que quis con- O MÉDICO DA
correr sozinho à compra da Com- MARINHA
porta para ter mais liberdade, não QUE SE CON-
teve daquelas vidas planeadas, TINUASSE A
como os amigos que sabiam desde TER VIDA MI-
miúdos que curso iam tirar, o que LITAR IA EN-
queriam ser, com quem iam casar. LOUQUECER.
Depois da Marinha achou que di- SAIU COM A
plomata era a carreira certa para Q TROPA FEITA

RTA SÓ PARA ELE

na Marinha (detestou ainda mais), guardou o pequeno-almoço para almoço e jantar. PorAnaTaborda
73
 Dinheiro

Q quem gostava de viajar e apren-

dia línguas facilmente. Licenciou-se
em Ciência Política e “apaixonou-
se” de tal forma pelo professor
Adriano Moreira que continuou a ir
às aulas mesmo depois de acabar a
cadeira. Quando se casou, vendeu-
se ao capital. Depois de uma investi-
gação de seis meses no departa-
mento de marketing da Nielsen, em
Zurique, voltou a Portugal e respon-
deu a um anúncio de emprego na
Sociedade Central de Cervejas, a
empresa onde o sogro era accionista
e administrador. A entrada para a
área comercial, aquilo que sempre
lhe deu mais prazer, foi quase tão
rápida quanto a saída. “Foi posto na
rua no dia em que se separou. Ele e
o sogro nunca se deram muito bem.
O sogro não mexeu uma palha para
o Pedro entrar, mas garantiu que ele
saía”, diz outra fonte próxima.
Um dia depois de deixar a Central,
enquanto tomava o pequeno-almo-
ço na Pastelaria Suíça, outro anún-
cio de jornal chamou a atenção do
jovem que tinha ficado sem empre-
go e sem casa – vivia já há algum
tempo com os sogros porque o 6º
andar em Belém, para onde se mu-
dou depois de casar, deixou de con-
vencer o pai da noiva com o sismo
de 1968: se houvesse um novo tre-
mor de terra, a filha não teria eleva-
dor para descer. Desta vez era a Sa-
cor (hoje Galp) que procurava um
economista para liderar a área de
transportes. Pedro não era econo-
mista, mas era doutor, o que naque-
la altura era parecido, também não
tinha experiência a dirigir transpor-
tes, mas o seu curriculum, que cozi-
nhou à medida do anúncio, incluía o
serviço militar feito na Marinha.
Mais uma vez, improvisou. E nunca
mais largou os petróleos.
Demasiado à direita nos anos 70
Voltou a sair do País com o 11 de
Março de 1975, depois de um traba-
lhador da Sacor, militante do Partido
Comunista, o ter denunciado por
alegadamente estar próximo do
Exército de Libertação de Portugal
(ELP). Quem o conhece garante que
sim, é de direita, mas não de extre-
ma-direita. Nunca teve actividade
política, mas achava piada àquilo a
Osoutrosnegóciose...
...os que vendeu para
ir à Comporta sem sócios
Doisactivos imobiliários em
Portugal e uma empresa de dis-
tribuição de produtos de petró-
leo nos Camarões, que vendeu
a um francês. Foi com estas
operações que Pedro de Almeida
garantiu capital para concorrer
sozinho à Comporta. Em Portu-
gal, investiu, além disso, na rede
Prego Gourmet e foi um dos ac-
cionistas fundadores do Observa-
dor. Escolheu o nome da sua pri-
meira empresa, Addax (uma ga-
zela africana), à medida do conti-
nente onde queria investir;
Admar e Ardma são parecidas
porque a primeira correu bem –
gosta que comecem pela letra a,
para ser mais fácil encontrá-las.
que chama o “folclore” e à desorga-
nização da direita, por isso, aplaudiu
de longe o golpe de Estado do ma-
rechal Spínola – parecia-lhe conde-
nado ao insucesso. Um dia, um ad-
ministrador da Sacor pediu-lhe que
entregasse o passaporte e avisou-o:
g não podia viajar mais ao serviço da
Quando não está empresa porque tinha contactos
no seu escritório
de Lisboa é prová- com a extrema-direita. Horas depois
vel que o encon- saiu de Portugal para Madrid, em
trem a brincar com seguida para o Rio de Janeiro. Insta-
os netos. Costuma
dizer que se não lou-se no quarto dos fundos de um
fosse o seu próprio hotel de Ipanema, junto ao Country
patrão, já o tinham Club, onde jogava ténis enquanto
posto na rua
esperava pelo resultado da candida-
tura a uma nova empresa, a Texaco.
A selecção, com cerca de mil candi-
datos, durou mais de dois meses.
“Nessa altura, guardava o fiambre
do pequeno-almoço e fazia do
buffetas três refeições do dia”, lem-
bra o primeiro amigo. Ganhou o lu-
gar, mas não ficou muito tempo
como director comercial da petrolí-
fera para todo o Brasil. Depois do 25
de Novembro, quando a situação
política em Portugal acalmou, deci-
diu voltar: despediu o funcionário
que o tinha denunciado e manteve-
FOI PARA -se na Sacor até 1979, quando um
O BRASIL convite de Patrick Monteiro de Bar-
COM O 25 DE
ABRIL. DU-
RANTE DOIS
MESES, FEZ Segunda casa
DO PEQUE- Quer fazer da Comporta
NO-ALMOÇO a segunda residência
DO HOTEL de estrangeiros ricos. Para
ALMOÇO isso, vai construir e vender
E JANTAR casas de luxo

74

ros o levou para Paris e para a me-
lhor escola de trading que havia en-
tão, a Philipp Brothers.
Foi nessa altura que começou a
fazer negócios em África e que en-
trou e saiu do Gabão sem passa-
porte, para não cancelar as reu-
niões que já tinha marcado. “Quan-
do ia entrar no avião que o levaria
dos Camarões [que visitara primei-
ro] ao Gabão, percebeu que tinha
perdido o passaporte.” Teve sorte.
Duas vezes. Primeiro porque no
Gabão o controlo de passaportes se
fazia numa cabana de madeira,
com um funcionário sentado numa
cadeira muito alta – Pedro de Al-
meida, que viajava com mais pes-
soas, fingiu que lhe tinha caído
qualquer coisa ao chão, baixou-se
e atravessou para o outro lado. O
pior foi sair de Libreville, a capital,
para Genebra. Dessa vez não havia
cabana e a improvisação teve de
subir de nível. Foi ao balcão de in-
formações e, alegando que havia
um problema com um passageiro,
pediu que fosse chamado com ur-
gência o cônsul da Suíça no Gabão.
Depois fingiu ser ele o próprio côn-
sul e apanhou o avião. Nessa altura
já tinha dinheiro para comprar
um avião privado e um barco. Não
quer: todos os anos aluga um bar-
co, quando vai até África ou à
América voa em executiva, na Eu-
ropa tanto lhe faz, usa as low-cost
quando o horário é melhor.
Foi também em África que fez o
melhor negócio da sua vida. Mas
isso só aconteceria depois de se
afastar de Patrick Monteiro de Bar-
ros e de criar as suas próprias em-
presas (primeiro a Addax, depois a
Admar, agora a Ardma). Primeira
zanga? Aquela vez em que Patrick
lhe emprestou uma casa em Miami
e deixou um livro com instruções
Comporta
São 12 km de praia, a uma
hora de Lisboa, que têm
atraído estrelas como
Madonna, que este mês
andou por lá a cavalo
27 JULHO 2017
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que o sócio desrespeitou a ponto
Natal de organizar um baile de máscaras
Acabou com os – os convidados disfarçaram-se
presentes num com as roupas de Patrick e da sua
dia 24 de De- mulher, Arlette.
zembro, quando
se lembrou de As demissões e o FBI
oferecer a cada Ameaçaria demitir-se várias vezes,
um dos sobri- até o fazer de facto. No livro Uma
nhos uma pós- vida à bolina, Patrick diz que Pedro
-graduação fora. de Almeida anunciou a sua saída no
Se chumbas- dia em que a mãe do chefe morreu;
sem, reservava- já Pedro fez saber que nem sabia
-se o direito de que a mãe de Patrick era viva.
continuar ou Quando a biografia foi lançada, vol-
não a pagar taram a falar, depois de anos afas-
tados: Pedro enviou-lhe um SMS,
disse ter gostado de recordar episó-
dios de que já não se lembrava (foi
com Patrick que aprendeu a manter
um arquivo do que ia acontecendo,
um arquivo que chegou a ceder ao
FBI durante uma investigação aos
poços de petróleo de várias compa-
nhias no Iraque, incluindo a sua),
Patrick estranhou o gesto, mas ficou
EM ÁFRICA sensibilizado.
QUASE Até fazer o tal negócio em África,
FALIU. TAM- que rendeu perto de 6 mil milhões
BÉM FINGIU de euros, as empresas de Pedro de
SER CÔNSUL Almeida compravam e vendiam pe-
PARA CON- tróleo, mas nunca tinham estado
SEGUIR EN- envolvidas na produção. Entrar na
TRAR E SAIR exploração era mais ou menos o
DO GABÃO mesmo que passar directamente do
SEM PASSA- Carcavelinhos Football Club para a
PORTE Liga dos Campeões – só consegui-
ram subir de campeonato com um
empréstimo agressivo do BNP Pari-
bas que, desconfiado, exigiu os acti-
vos da empresa como garantia.
Quase os executou: com a queda do
barril de petróleo para 9 dólares, a
falência esteve por um triz. Mas a
maior improvisação da vida do em-
presário acabaria por correr bem: o
petróleo voltou a subir, primeiro
para os 13 dólares, depois para os
20 e a Addax multiplicou por cinco
Agricultura a capacidade de produção. Resulta-
Pedro de Almei- do: em 2006, a empresa foi coloca-
da também da na bolsa de Toronto e, três anos
quer concorrer depois, vendida aos chineses da Si-
aos 12.500 km nopec por 7,3 mil milhões de dóla-
de área agríco- res (os tais 6 mil milhões de euros).
la, uma das Foi o melhor negócio que fez? “É
maiores do País, impossível fazer outro igual”, disse
famosa pelo várias vezes. E acrescentou: “O me-
cultivo de arroz lhor é nem tentar.” W
75
 Sociedade

Albino Martins
68 anos
Cresceu em Santa Cruz,
Torres Vedras. O pai
e o avô também eram
banheiros. Costumava
usar uma corda para tirar
pessoas da água

REPORTAGEM. VIGIAR A PRAIA HOJE E NA DÉCADA DE 70

SÓPRECISEIDEUM
Albino passou por baixo de uma traineira. André fez um curso de 150 horas. Dois nadadores-

lbino Martins tinha 16 traineira. ‘Não me digas que és ca- “Cresci na praia. O meu avô era ba-

A anos quando se tornou

nadador-salvador. “Na-
quela altura (1965) tí-
nhamos de ir a Peniche.
Fazíamos uma demonstração no cais
e o capitão do porto ou um subordi-
nado dizia-nos se estávamos aptos”,
APRENDER A
NADAR, O PAI
recorda Albino, hoje com 68 anos.
“Dei umas braçadas e perguntei-lhe
se podia passar por baixo de uma
PARA
DE ALBINO
ATIRAVA-O
PARA UMA
BAÍA PARA
paz.’ Então mergulhei e ele disse-me.
‘Vai-te embora que já sabes muito.’”
Em menos de 15 minutos, tornava-se
nadador-salvador.
Durante mais de 30 anos vigiou a
praia de Santa Helena, em Santa
Cruz, concelho de Torres Vedras, e
nheiro, o meu pai também e eu se-
gui-lhes as pisadas. Fiz a minha vida
toda aqui.” Aos 7 anos, já sabia atar
às estruturas de madeira os cordões
dos panos das barracas, feitos pela
mãe. Fez a quarta classe e depois
dedicou-se ao areal.
VER SE SE apesar de ter deixado a profissão há Não sabe ao certo quantas pessoas
DESENRAS- 18 anos, em 1999, ainda se mantém tirou da água. “Foram umas deze-
CAVA como concessionário daquela zona. nas”, diz. Já não se lembra de to- Q

76
 www.sabado.pt

André Costa
24 anos
É bombeiro. Trabalha
no Guincho, como
nadador-salvador,
desde 2016. Já ficou
preso na corrente

MERGULHO.ETU?
salvadores, um reformado e outro no activo, mostram o que mudou. Por Ana Catarina André

ndré Costa era nada- vítima de volta à praia – tinha le- em terra. “Temos de aprender

A dor-salvador há pou-
cos meses, quando
durante um resgate,
na praia do Guincho,
ficou preso na corrente. “Tinha pé,
mas assim que tentava dar um
passo era puxado pelo mar”, conta
o jovem de 24 anos, que também
é bombeiro. “Como tinha ido com
um colega, ele conseguiu trazer a
vado pés de pato [barbatanas]; e
eu não. Então, tentei manter-me
calmo e deixei-me levar pelo mar
até à zona das rochas, antes da
praia do Abano.”
Nessa zona, e já com o mar me-
nos violento, conseguiu sair da
NAS PRAIAS
PORTUGUE-
SAS EXISTEM
5.422 NADA-
DORES-SAL-
VADORES,
com os erros.”
Em menos de dois anos – es-
treou-se em 2016 – salvou seis
pessoas das águas turbulentas do
Guincho, em Cascais. “Um dos as-
pectos mais importantes é saber ler
a corrente para perceber quais são
água. Depois deste “auto-salva- COM IDADE as escapatórias possíveis”, explica
mento”, como lhe chama, não MÉDIA DE André, que tirou o curso de nada-
voltou a deixar o equipamento 25 ANOS dor o ano passado. Neste mo- Q

77
 Sociedade
Q das, mas não esquece a primeira:
uma senhora com uma cicatriz no
pescoço, natural de Ponte do Rol,
uma freguesia do mesmo concelho.
Albino tinha 13 anos, quando a so-
correu na praia Formosa, em Santa
Cruz também. “Ela estava aflita e pu-
xei-a por um braço. Só gritava: ‘Ai a
minha mãe, ai a minha mãe.’”
Foi o pai que o “ensinou” a nadar,
muito pequeno. “Atirava-me ali para
uma pequena baía, que se formava à
beira-mar, para ver se eu conseguia
desenrascar-me. Eu chorava sempre.
Neste aspecto o meu pai era um bo-
cado bruto”, diz.
Nessa altura, o pai de Albino não se
limitava a tomar conta do mar e das
barracas. Alugava fatos-de-banho,
“com folhos tipo saia para as senho-
ras” e “peitilho para os homens”, e
bancos e mesas para piqueniques.
“As pessoas traziam os tachos com
comida e enterravam restos de co-
mida – ossos, por exemplo – e cas-
cas de melão na areia.” Muitas não
Cursos e material
A primeira formação
aconteceu há 61 anos
90
alunos participaram no
primeiro curso de nadador-
-salvador, que ocorreu em 1956
€180
é o valor mínimo do curso.
Dependendo da entidade for-
madora pode chegar aos 300
3
anos é a validade de cada cur-
so. Passado esse tempo os nada-
dores têm de fazer novo exame
11
objectos (mala de primeiros
socorros, prancha de salvamen-
to e bóias, etc.) compõem o kit
obrigatório por cada 100 m de
área concessionada
78
tomavam banhos sozinhas. Iam de
braço dado com o banheiro, duas a
duas. “O meu pai até fez um capote
para não passar tanto frio.”
Petiscos junto às arribas
Quando Albino ficou à frente da
praia, na década de 70, já ninguém
precisava de ajuda para ir ao banho.
Ainda assim, “convivia-se muito”.
“Eu ia apanhar mexilhão, fazia uma
fogueira ali junto às arribas e chama-
va toda a gente para comer. Em tro-
ca eles davam-me fruta e legumes
que traziam de casa [a maioria tinha
terras de cultivo]”, afirma.
Apesar de o primeiro curso do Q
2
1 Q mento há 5.422 nadadores-sal-
António vadores a vigiar as praias portu-
Gonçalves Ribeiro,
o nadador-salva- guesas, segundo dados do Instituto
dor conhecido de Socorros a Náufragos. A maioria
por Tarzan, traba- é jovem – a idade média é 25 anos
lhava na Costa de
Caparica – e do sexo masculino.
André fez o primeiro salvamento
2 sozinho, poucas semanas após ter
A praia do
Tamariz, no sido contratado pelo concessioná-
Estoril, sempre foi rio da praia, em Junho de 2016.
uma das com mais “Fui buscar uma criança de 6 anos
procura, por isso
sempre teve que estava a ser puxada pela cor-
banheiros rente, junto às rochas. Foi só rebo-
3 cá-la.” E explica: “Normalmente há
Os cursos de dois nadadores envolvidos em
nadadores-salva- cada resgate, mas esta era uma si-
dores surgiram tuação simples.”
na década de 50
para proteger No Guincho, as ondas chegam
os veraneantes muitas vezes aos dois metros e os
ventos atingem velocidades eleva-
das. Há muitas pessoas a praticar
desportos aquáticos (surf, windsurf
“AS PESSOAS e kitesurf) e muitos turistas afoitos.
TRAZIAM O ano passado, em Outubro, já no
TACHOS prolongamento da época balnear,
E ENTERRA- André estava com um colega a fa-
VAM RESTOS zer vigilância na esplanada – ponto
DE COMIDA mais elevado do areal –, quando se
- OSSOS, POR apercebeu que um surfista partira a
EXEMPLO prancha. “A mãe estava à beira-
– E CASCAS -mar e entrou logo em pânico. Só
DE MELÃO gritava por ajuda.” E acrescenta:
NA AREIA” “As ondas eram muito grandes e
 UM MUNDO DE ESPETÁCULOS 27 JULHO 2017

A PENSAR EM SI!
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PUB
M/6
3

M/6 M/6

transportavam uma massa de água

muito forte – foi muito duro tentar
furar a rebentação, muito desgas-
tante fisicamente. No fim, saí
exausto, mas a vítima não sofreu
lesões.” Tift Merritt
Sempre que há uma situação de 19 NOVEMBRO
perigo, André sabe que além dos MUSICBOX LISBOA
pés-de-pato (barbatanas), que aju-
dam a uma deslocação mais rápida
na água, tem de escolher outro
M/6
meio de salvamento: bóia torpedo,
cinto de salvamento, bóia circular
ou vara de salvamento, por exem-
plo. “No Guincho, como há muito
vento, a bóia circular é pouco útil
porque voa. Também não costumo
usar a torpedo (bóia), porque com a
rebentação forte pode bater na ca-
beça da vítima e deixá-la incons-
ciente”, diz à SÁBADO, acrescen-
tando que o cinto de salvamento
lhe parece o meio mais adequado
naquele contexto. E deixa uma críti- M/3
ca: “Aqui não há motas de água,
nem lanchas como existe na zona
das praias de Cascais e Carcavelos.”

Trêssemanasdecurso
Para se tornar nadador-salvador,
André teve de fazer um curso de
150 horas. Em menos de um mês,
aperfeiçoou técnicas de natação e
aprendeu técnicas de resgate e sal-
vamento na praia. “Treinávamos
em piscina e só fomos uma vez à
praia. Isso até pode ser suficiente
para trabalhar em zonas calmas,
mas no Guincho não.” Foi graças à
ajuda de dois colegas brasileiros,
com quem trabalha actualmente,
que melhorou a sua capacidade
de “ler o mar” e adquiriu novos Q
SAIBA MAIS SOBRE ESTE E OUTROS ESPETÁCULOS EM EVERYTHINGISNEW.PT
BILHETES: FNAC, WORTEN, EL CORTE INGLÉS E WWW.EVERYTHINGISNEW.PT 79

Sociedade
Q Instituto de Socorros a Náufragos
ter ocorrido em 1956, Albino só se
inscreveu em 1977. “Treinámos no
mar e aprendemos algumas coisas
sobre suporte básico de vida.” Nessa
época um dos nadadores-salvadores
mais famosos do País era António
Ribeiro, conhecido por Tarzan: tra-
balhava na Costa de Caparica, onde
terá salvo mais de 400 pessoas.
“Hoje é muito mais exigente”, con-
sidera. Durante anos, conciliou a ac-
tividade na praia com as actuações
no grupo musical Abel Alves, que
animava os bailes. “Tocava de noite
e estava na praia de dia. Dormia nos
intervalos – na praia nunca.”
Ao contrário da diversidade de
equipamento existente actualmente,
o nadador tinha apenas uma bóia
circular e uma corda, que usava para
se manter preso a terra quando en-
trava na água. Para Albino, o resgate
mais difícil foi em 1968. “Fui buscar
um senhor aí a uns 200 metros. O
outro nadador-salvador que tínha-
mos aqui era velhote e escondeu-se
atrás de uma barraca para não ir lá.
Quando cheguei perto do náufrago já
estava bastante cansado. Ele ora
aparecia, ora desaparecia no meio
das vagas. Quando já só lhe via o ca-
belo, fiz uma última tentativa e agar-
rei-o pelos cabelos.” Conseguiu e
trouxe-o para o areal. “Houve um
jornalista que publicou uma notícia
cujo título era Ao menos obrigado,
porque o homem nem me agrade-
ceu.” Em mais de 60 anos na praia só
morreu uma pessoa: um homem en-
trou no mar com bandeira vermelha
três vezes no mesmo dia e da última
foi engolido pelas ondas. Albino não
estava de serviço e um banhista ten-
tou salvá-lo, sem sucesso.
Apraia deAlbino
Ao longo de várias décadas teve vá-
rias fardas: primeiro calções azuis e
camisola branca, com palavra ba-
nheiro; depois a mesma roupa mas
com a palavra nadador-salvador; e
por fim calções vermelhos e camiso-
la branca – Albino não chegou a
vestir os actuais calções laranja.
“Usava sempre um panamá branco.”
Há 20 anos, Albino deu nome ao
areal. “No tempo do meu pai, era a
praia do centro, mas depois esse
80
A novata do Estoril
A brasileira ainda não fez
resgates na praia
Com19 anos, Brenda Silva
estreou-se como nadadora-salva-
dora este Verão, na praia do Ta-
mariz, Estoril. Terminou o curso
no início da época balnear e ain-
da não fez salvamentos no mar.
Na piscina, situada junto ao areal,
socorreu uma criança de 2
anos. “Começou a descer pela
rampa e quando vi já estava a
engolir água. Fui lá e puxei-a. Foi
só um susto”, diz a brasileira que
vive em Portugal desde os 10
anos e que antes trabalhava no
bar da praia. É a única mulher
no areal do Tamariz. Segundo
o Instituto de Socorros a Náufra-
gos, só 20% dos nadadores são
do sexo feminino.
nome passou para outra zona.
Quando fui tirar as licenças anuais
da concessão, o comandante da ca-
pitania chamou-me e pediu-me aju-
da para baptizar a praia”, conta.
“Lembrei-me da capela de Santa
Helena que há aqui em cima e de
uma rocha com esse nome e assim
ficou: praia de Santa Helena.” W
27 JULHO 2017
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Q métodos de trabalho. “Nesta área
o Brasil está mais evoluído. Eles
trabalhavam numa praia com uma
torre de vigia de três andares e
uma equipa de 15 nadadores – aqui
somos três”, afirma. “Ensinaram-
-me, por exemplo, uma técnica de
reboque que consiste em mover as
pernas, como se fosse uma tesoura.
Isso permite contornar a pessoa de
forma mais eficaz”, afirma.
André é bombeiro a tempo inteiro
na corporação de Algueirão-Mem
Martins, e dedica-se à praia nas fé-
rias e nas folgas. “É também uma
forma de aumentar o orçamento”,
diz. No Guincho, o dia começa an-
tes das 9h da manhã, com o hastear
da bandeira (muitas vezes verme-
lha) e a colocação da sinalização.
“Passamos muito tempo no posto
de vigia para termos uma perspec-
tiva global do que se passa na
g água.” Terminam por volta das 19h.
Brenda Silva tirou
o curso este ano
e é uma das Asurfista tailandesa
nadadoras mais Apesar de trabalhar numa praia di-
novas no Tamariz
fícil, André nunca teve de reanimar
ninguém. Apenas socorreu pessoas
com lesões ligeiras, como foi o caso
da surfista tailandesa que entrou
no mar e foi atirada, pela rebenta-
ção, para as rochas. “Há muitas tu-
ristas aqui que se aventuram. Essa
rapariga ainda deu umas camba-
Os salários lhotas na água, antes de chegarmos
dos nadadores- a ela. Acabou por fazer uma luxa-
-salvadores ção no tornozelo, mas nada mais.
dependem dos Certificámo-nos que não tinha ba-
concessionários tido com a cabeça e aconselhamo-
– chegam a -la a procurar uma unidade hospi-
1.000 euros. talar.” Habituado a ter uma profis-
Em geral, os são de risco, assume com tranquili-
do Algarve dade que o perigo faz parte do
são os que quotidiano. “Há coisas que não
ganham mais conto à minha mãe para ela não
me prender em casa.”
Ser nadador-salvador sempre foi
uma ambição. “Aprendi a nadar
ANDRÉ aos 3 anos e cresci perto do mar na
COSTA zona do Guincho, de Sintra e da
APRENDEU A Costa de Caparica”, diz, contando
NADAR AOS que na adolescência praticava surf.
3 ANOS. VIA “Sempre quis salvar pessoas”, de-
A SÉRIE clara. E a mítica série de televisão
BAYWATCH norte-americana Baywatch teve
E SEMPRE alguma coisa a ver com a escolha?
QUIS SALVAR “Sim”, admite. “Era empolgante
PESSOAS ver aquilo.” W
 Seu Jorge agir marco paulo fábia rebordão savanna diogo piçarra
12 de agosto 14 de agosto 15 de agosto 16 de agosto 17 de agosto 18 de agosto
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 Sociedade
CRIATIVIDADE. QUATRO A CINCO HORAS POR DIA CHEGAM
OS GRANDES TRABALH
Sestas, pausas e passeios. Um autor americano estudou a rotina de grandes génios e líderes
lex Soojung-Kim Pang
A não tem dúvidas. A sua
personalidade preferida,
aquela que melhor per-
sonifica os seus ideais de produtivi-
dade e criatividade, é Charles
Darwin. Num artigo que escreveu
em Março para a revista americana
de ciência Nautilus colocou o se-
guinte título: “Darwin era um pre-
guiçoso e você também devia ser.”
À SÁBADO, por email, explica esta
admiração pelo naturalista inglês:
“É provavelmente a mais importan-
te figura na história da ciência, mas
só trabalhava 4 ou 5 horas por dia.
Eu nunca escreverei algo como A
Origem das Espécies, mas posso
aprender com ele como equilibrar
trabalho e repouso. Tal como nunca
conseguirei correr como Usain Bolt,
mas posso aprender qualquer coisa
pela forma como ele treina.”
E a rotina de Darwin sabia-se:
“Após o seu passeio matinal e o pe-
queno-almoço, ia para o gabinete às
8h e trabalhava uma hora e meia.
Às 9h30 lia o correio da manhã e
escrevia cartas. Às 10h30, re-
gressava ao trabalho, indo por
vezes ao viveiro, à estufa ou a
outro edifício onde realizava as
suas experiências. Ao meio-dia
declarava: ‘Fiz um bom dia de
trabalho’ e iniciava um longo pas-
seio. Almoçava e escrevia mais car-
tas. Às 15h, retirava-se para uma
sesta; uma hora mais tarde, dava
mais um passeio e depois regressa-
va ao gabinete até às 17h30, quan-
do se juntava à família para jantar.
Com este horário escreveu 19 livros,
incluindo o mais famoso livro da
história da ciência.”
Alex Soojung-Kim Pang é profes-
sor convidado da Universidade de
Stanford, nos Estados Unidos, mas a
sua principal actividade é a consul-
82
Descanso toria. Tem uma empresa chamada
Livro
Descansar
Autor
Alex Soojung-
-Kim Pang
No seu bunker em plena II
Guerra, Churchill tinha um
quarto onde dormia a sesta,
que considerava essencial
The Restful Company e trabalha em
Silicon Valley, EUA. Falou com a
SÁBADO a propósito do seu novo li-
vro, Descansar– A Razão pela Qual
Conseguimos Fazermais Quando
Editora Trabalhamos Menos, lançado agora
Temas em Portugal.
& Debates “A tese central é que o descanso
desempenhou um papel inesperado,
mas essencial, nas vidas de algumas
das pessoas mais criativas e produ-
tivas da história”, diz. O livro está
repleto de exemplos de personali-
dades e do seu método de criação.
O nome de Darwin aparece no
subcapítulo Quatro Horas [de traba-
lho por dia], ao lado de grandes no-
mes da literatura (quase todos No-
bel): Thomas Mann, Alice Mun-
ro, Mahfouz, Dickens, He-
mingway, García Márquez,
Bellow, Le Carré, Ballard,
Somerset Maugham ou
Stephen King. Também
há realizadores, argu-
mentistas, políticos e
matemáticos.
Andara pé
“Para muitas pes-
soas criativas, é es-
sencial ter uma roti-
na, que deve incluir
uma paragem, ou
fazer coisas que
dêem ao subcons-
ciente tempo e liberdade
para explorar ideias e resolver
os problemas. O mais incrível é
que toda a gente pode fazer
isto, é uma competência que
se adquire, como aprender
uma língua”, diz Pang. “Muitas
vezes vemos a rotina como
inimiga da criatividade, por-
que a criatividade é caótica e
desregulada. Na verdade, a ro-

AM POUCO, MAS BEM
mundiais, de Churchill a Darwin e Hemingway, de John F. Kennedy a Steve Jobs. Por Marco Alves
tina ajuda muito. As pessoas muito
produtivas não têm uma súbita inspi-
ração e vão a correr para a secretá-
ria; elas começam a trabalhar e ficam
inspiradas. Como Pablo Picasso dis-
se, a inspiração existe, mas tem de te
encontrar quando estás a trabalhar.”
O autor diz que há mais segredos.
Como as sestas. A lista de adeptos é
respeitosa: Churchill, MacArthur,
Kennedy, Tolkien, Jonathan Fran-
zen, Murakami, Niemeyer, Edison,
Allan Poe ou Salvador Dalí.
LAVEI A ROUPA TODA
COM CONFIANÇA.
PRODUTOS
CONTINENTE
E andar a pé: Darwin, Kierke-
gaard, Thomas Jefferson, Dickens,
Steve Jobs, Tchaikovsky, Beetho-
ven. “O princípio da incerteza sur-
giu a Werner Heisenberg durante
um passeio nocturno em Copenha-
“A ROTINA ga, em 1927”, diz o autor na pág.
NÃO É 119. “E Erno Rubik chegou à crucial
INIMIGA DA inovação do design que resultou no
CRIATIVIDA- cubo de Rubik enquanto caminhava
DE. NA VER- pela margem do rio Danúbio.”
DADE, AJUDA O grande ponto do autor é o com-
MUITO” bate à ideia de que “mais horas tra-
É À CONFIANÇA
27 JULHO 2017
www.sabado.pt
duz-se em mais produtividade,
quando na verdade o excesso de tra-
balho é uma fonte de ineficiência e
de erros”. “Recentemente falei com o
criador de uma startup e estava a
implementar a semana de trabalho
de 4 dias porque sabia que os seus
engenheiros, se fossem deixados
sozinhos, iriam trabalhar demais e
estoirar. Ele quer grandes resultados
deles, por isso organiza as coisas
para que trabalhem menos, pensem
mais, tenham mais energia.” W
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83
 Sociedade
REPORTAGEM. ANDÁMOS UM DIA À BOLEIA DA SKETCH TOUR
VOLTA
APORTUGAL
EMPOSTAIS
ILUSTRADOS
A nova aposta do Turismo de Portugal
faz-se com tintas, papel e 24 artistas.
Lis Watkins e José Louro são uma das duplas
que já fizeram 1.000 quilómetros para
desenhar a Grande Lisboa. Por Raquel Lito
om o caderno A5 pousado
C nos joelhos, José Louro
(prefere que o tratem por
Zé) recomeça os desenhos
de observação no terreno. Vale
tudo: enganos, sobreposições e es-
boços mais ou menos inacabados a
partir de uma carrinha-ateliê em
andamento. “Ao mesmo tempo que
me divirto, tento pôr as proporções
que existem à minha volta numa
coisa plana [o caderno]. Os objec-
Lis Watkins
55 anos
A ilustradora profis-
sional de Londres
nunca tinha estado
em Portugal
84
tos próximos são desenhados com
cores mais fortes e densas.” Des-
contraído, vai rabiscando o que vê
à volta da viatura de nove lugares
em que viaja. Pode ser uma paisa-
gem com os contornos da janela ou
outra coisa qualquer, inclusive os
repórteres da SÁBADO, sentados
no banco à sua frente. A caixa de
aguarelas está prestes a cair, devi-
do à trepidação, mas o professor de
Artes Visuais de um colégio em Be-
José Louro
52 anos
O professor de
Artes Visuais em
Lisboa prefere o
desenho quase abs-
tracto; desenha sem-
pre no caderno A5
g
O desenho à beira
da estrada da
serra da Arrábida,
lém não desiste. O lápis heliográfi-
co – que escreve em todas as su-
perfícies – é o melhor aliado.
com vista para
o convento, foi
Ao lado de Zé, a ilustradora pro-
fissional britânica Lis Watkins en-
um dos momentos
marcantes saia o último capítulo da sua pas-
de dia 12 sagem pela Sketch Tour Portugal –
uma parceria entre a associação
sem fins lucrativos Urban Sketchers
(comunidade internacional de ilus-
tradores) e o Turismo de Portugal
(TP), onde durante uma semana
um sketcher português recebe o
homólogo estrangeiro e pintam
uma das sete regiões turísticas.
7
horas
diárias
dedicadas a
Seis desenhos por dia
Os postais ilustrados da Grande
Lisboa ficaram terminados ao fim
do dia 12 de Julho e são a terceira
desenhar para incursão deste projecto, que arran-
a Sketch Tour. cou com outro grupo de quatro em
Lis e Zé Fátima, no mês de Maio. A marato-
descobriram na vai continuar até 2018, com ar-
este anúncio tistas portugueses e estrangeiros e
no centro histó- com novas paragens: Porto e Dou-
rico de Setúbal ro (Agosto), os campos de golfe de
Lisboa e do Algarve (Setembro), o
surfna Costa Alentejana e em Pe-
niche (Outubro), Madeira (Dezem-
bro), Algarve (Fevereiro), Alentejo
(Março), trilhos ainda a definir
(Abril) e a zona Centro (Maio).
“Cada uma destas regiões será
O SKETCH explorada através de temas rela-
TOUR cionados com o património, a na-
PORTUGAL tureza, a gastronomia e os vinhos.
COBRE SETE Se o resultado final for o esperado
REGIÕES em termos de originalidade e de
TURÍSTICAS. gerar mais visibilidade e visitas,
EM AGOSTO será uma parceria para continuar”,
SEGUE PARA explica à SÁBADO Luís Araújo, pre-
O DOURO sidente do TP e também conhece-

dor da área. “Comecei a desenhar
em criança, prefiro caderno e
aguarela.”
Numa quarta-feira de manhã atra-
vessamos a Ponte 25 de Abril em di-
recção a Palmela, onde supostamen-
te irá decorrer, no castelo, o primeiro
desenho do dia. O terraço da fortifi-
27 JULHO 2017
www.sabado.pt
cação iniciada no século VIII abre-se
para os estuários do Tejo e do Sado.
Mas não vai acontecer. Para come-
çar, Lis tem medo de alturas. Depois,
tanto um como outro consideram
que a paisagem carregada de ele-
mentos visuais implicaria horas de Petiscos
desenho. Desenho de José Louro à mesa: o couvert, os tre-
moços e a sangria de tinto no restaurante típico
Há metas a cumprir: seis ilustra- D’Bacalhau, no Parque das Nações, 11 de Julho
ções por dia; cerca de uma hora
FOTOS RICARDO PEREIRA
dedicada a cada; e uma exposição
prometida para Julho de 2018, em
local a definir. “É um projecto ino-
vador. Tem raízes nas Grand Tours
que artistas, pensadores e escrito-
res começaram a fazer desde o sé-
Igreja de culo XVII, mas abre um novo capí-
São Julião tulo sobre o modo como se pensa e
A última aguarela de
Lis Watkins para o se quer mostrar Portugal”, contex-
projecto Sketch Tour tualiza à SÁBADO Mário Linhares,
Portugal, ao fim da tar- director de educação dos Urban
de de dia 12. A britânica
pintou-a numa esplana-
Sketchers em Portugal.
da do centro histórico A propósito do décimo aniversá-
de Setúbal rio da comunidade, fundada no Q
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85

Sociedade
Q site Flickr por um espanhol a
residir nos Estados Unidos (Gabi
Campanario), Mário desafiou o
Turismo de Portugal a promover o
País através de desenhos. A fase
das negociações, iniciada em De-
zembro de 2016, acabou em Abril
de 2017 com a perspectiva do de-
senho de observação ganhar visi-
bilidade. O grupo português – e
sobretudo o pólo de Lisboa – é um
dos mais dinâmicos ao nível mun-
dial (tem mais de 500 membros,
232 deles sócios registados).
“Como em Lisboa havia um foco
de interesse nos festivais de Verão,
o país escolhido foi Inglaterra. Era
importante escolher sketchers que
se sentissem à vontade para dese-
nhar pessoas”, diz Mário Linhares.
A viagem de Zé e Lis continua
para a serra da Arrábida: luz ideal,
estrada com pouco trânsito e nova
varanda deslumbrante. Desta vez, a
guia-intérprete Paula Colaço Al-
meida – contratada pelo TP para
ajudar a dupla a chegar aos ex-lí-
bris e a uns quantos paraísos es-
condidos – é bem-sucedida.
O miradouro da reserva natural
com vista para o convento fran-
ciscano de Nossa Senhora da Ar-
rábida agrada a ambos. Lis abs-
trai-se do medo das alturas. As-
senta arraiais à beira da estrada,
abrindo o banco de campismo ar-
ticulado e o estojo de pintura. Zé
prende as folhas do caderno com
molas da roupa porque o vento é
o seu maior inimigo. Nem se dão
conta de um turista suíço que os
interpela – nada de especial para
quem passou a última edição do
NOS Alive, no Passeio Marítimo de
Algés, a ser sistematicamente in-
terrompido por festivaleiros intri-
86
h
A perspectiva de
uma piscina do
empreendimento
turístico de Tróia,
por José Louro
gados. “A malta parava, olhava
PATRIMÓNIO, para nós e perguntava o que está-
NATUREZA, vamos a fazer. Até tiraram fotos”,
GASTRONO- conta Zé.
MIA E A escassos metros dos artistas, a
VINHOS SÃO guia e o motorista desfrutam dos 30
OS TEMAS A graus à sombra. Paula espanta-se
DESENHAR, com a rapidez do desenho: meia
EXPLICA hora depois já estão a caminho. Mas
O PRESIDEN- logo a seguir mais uma espera na
TE DO travessia do Sado atrasa o almoço
TURISMO DE em Tróia. O ferryboat está cheio, é
PORTUGAL preciso esperar pelo próximo. Lis
instala-se junto a um múpi publici-
tário, Zé prefere a palmeira. Reto-
mam os desenhos, com o professor
a admitir algumas dificuldades de
escala, lançada pelo primeiro traço.
“Estou a tentar safar-me. Vai correr
NOS Alive mal. Comecei ao contrário, da direi-
Entre a agitação do ta para a esquerda. Teria sido me-
festival, Lis Watkins lhor começar pela esquerda porque
mantinha-se tranqui-
la a desenhar o agora tapo com a mão o que já está
público. Decorria o feito. Todos os erros estão aqui
concerto da banda concentrados [aponta para o esbo-
norte-americana Foo ço do frontão de um edifício do
Fighters (dia 7 de
Julho) e os curiosos centro de Setúbal].”
tiravam fotos da O ferry está prestes a desembar-
dupla de sketchers car para uma península marcada
Casa das Azenhas do Mar
A obra de Raul Lino, construída em
1920, é mantida pelos descenden-
tes. Continua sem electricidade
nem água corrente para manter a
memória do arquitecto. José Louro
desenhou-a a 10 de Julho
27 JULHO 2017
www.sabado.pt
pela ascensão e queda da Torralta
– um dos empreendimentos turís-
ticos mais in da Europa nos anos
70, falido no pós-Revolução. A So-
nae viria a recuperá-lo a partir de
1997. Agora retoma o glamour de
outros tempos. Lis e Zé estão en-
tretidos a pintar, quase não tocam
no buffet do restaurante Aqualuz.
A britânica destaca o azul do céu,
oposto da neblina de Londres,
onde vive com dois filhos, de 22 e
19 anos. “É a primeira vez que ve-
nho a Portugal. O Mário Linhares
convidou-me, tive muita sorte. Em
cada sítio que estive aqui podia
desenhar o dia todo.”
Onde está a Lis?
Nos últimos momentos da marato-
na, no centro histórico de Setúbal,
dá-se o inesperado. A sketcher
afasta-se do grupo. Zé detém-se
numa santa da igreja do Convento
de Jesus, a Nossa Senhora do Am-
paro vestida de noiva. “As devotas
ofereciam-lhe os vestidos depois
de casadas”, explica à SÁBADO a
funcionária Donzília Peixoto, que
regista as entradas e as saídas de
visitantes – em média 80 por dia.
De Lis nem sinal.
Paula, a guia, começa a ficar preo-
cupada. Procura-a pelos cafés junto
ao convento – e nada. Uma hora
depois, encontra-a umas ruas à
frente. A sketcherestá calmamente
sentada numa esplanada da Praça
do Bocage, acompanhada por um
café e um pastel de nata, enquanto
desenha. Diz que avisara Zé que iria
pintar outra igreja, a de São Julião,
de fachada branca. É o seu desenho
de despedida do Sketch Tour Portu-
gal, que deu a volta à Grande Lisboa
com um número redondo: 1.000
quilómetros de estrada. W

SAÚDE. O ANTIBIÓTICO MAIS PRESCRITO A CRIANÇAS
O DOCE SABOR
DE ESTARDOENTE
Aamoxicilinaserve paracurarquase todas as infecções e é a
mais indicadaparacrianças pequenas. Mas averdadeirarazão
porque se gostatanto delaé o saborachiclete. PorLucíliaGalha
ual é a melhor parte de ficar
Q doente? Hipóteses de res-
posta: a) Faltar ao traba-
lho/escola; b) Poder passar o dia no
sofá a ver séries em loop; c) Aquele
delicioso antibiótico com sabor a
chiclete. Se nasceu antes do segun-
do milénio e ainda não tem filhos
talvez tenha de apelar às suas recor-
dações de infância. E ao tempo em
que, em vez de comprimidos, toma-
va xaropes. Pode até parecer estra-
nho mas o sabor da amoxicilina – o
antibiótico mais prescrito a crianças
– é tão memorável que se tornou
assunto de discussão (e de nostalgia)
nas redes sociais e nos fóruns da In-
ternet. No Reddit, num grupo dedi-
cado à nostalgia, há um postsobre o
“medicamento com sabor a pasti-
lha” com mais de 14 mil upvotes
(uma espécie de gostos); e já em Ju-
nho deste ano, o BuzzFeed fez uma
lista de memorabilia dos anos 90
em que a amoxicilina (que chegou
ao mercado em 1972) é uma das 45
recordações em destaque.
A amoxicilina é um antibiótico da
família da penicilina que é usado no
tratamento de várias infecções cau-
sadas por bactérias, nomeadamente
respiratórias (como sinusites), diges-
tivas (amigdalites), urinárias e tam-
bém na pele. É a primeira escolha
dos pediatras, sobretudo para as
crianças mais pequenas, porque
além de ser eficaz para quase tudo, a
probabilidade de causar efeitos se-
cundários é menor do que com ou-
tros antibióticos. Também há uma
razão para o gosto a chiclete: a peni-
cilina tem um sabor muito amargo.
Tornar os medicamentos “saboro-
sos” faz com que a experiência de
estar doente se torne menos trauma-
27 JULHO 2017
www.sabado.pt
Laranja
O Ibuprofeno
tem aroma de
fruta e sabor
adocicado,
pode ler-se
na bula Odor de fruta
O paracetamol é um líquido
viscoso, de cor vermelha,
com odor de fruta e sabor
adocicado
tizante para as crianças – e também
para os pais. Mas também pode ser
perigoso: se forem muito bons, as
crianças podem querer tomá-los
quando não precisam, às escondi-
das, e há o risco de intoxicação.
Não é um doce, é aspirina
Foi o que aconteceu no fim dos
anos 40, quando chegou ao merca-
do a chamada aspirina infantil. A
Saint Joseph for Children, lançada
em 1947, era cor de laranja, tam-
bém sabia a laranja e foi anunciada
como “uma aspirina doce”. “Pou-
cos anos mais tarde, a incidência
de intoxicações por aspirina au-
mentou drasticamente, quase
500%”, disse Cynthia Connoly, que
estuda a história dos cuidados de
saúde pediátricos, ao The Atlantic.
Depois disso, foi criada uma tampa
de segurança e a companhia farma-
ISTOCKPHOTO
NO REDDIT cêutica deixou de publicitar o medi-
HÁ UM GRU- camento como um doce. “Nos anos
PO DEDICA- 80, o anúncio à aspirina mostrava
DO AO “ME- uns comprimidos a cantar ‘We’re not
DICAMENTO Chiclete candy, even though we lookso fine
COM SABOR A amoxicilina tem odor e sa- and dandy. Too much ofus is dan-
A PASTILHA” bor a pastilha elástica. O me- gerous’ [Não somos doces, embora
COM 14 MIL dicamento em xarope con- pareçamos tão bons. Tomar muitos é
GOSTOS tém açúcar, avisa a bula perigoso]”, lembra a especialista. W
87
 Família

ma das minhas memórias h

U mais queridas é acordar,

nas manhãs de Inverno,
com o aroma a fatias
douradas. A minha avó, no perpé-
tuo pavor de que o neto passasse
Renato Rocha
fotografado
na cozinha
Kiss The Cook,
esta segunda-
-feira (dia 24).
Trouxe os
frio, preparava-me um pequeno-al- ovos da terra
moço reforçado, que incluía a sua da avó, no
Alentejo
especialidade: fatias de pão alente-
jano mergulhadas em gemas de
ovos caseiros, das galinhas da vizi-
nha, fritas durante alguns minutos,
e depois polvilhadas com açúcar
amarelo que, claro, derretia com o
calor, transformando-se numa cal-
da deliciosa. Lambuzava-me com
gosto e ia para a escola de barriga e
alma cheias. Mais tarde tentei conti-
nuar a tradição familiar e repetir a
maravilha. O pão não era o indica-
do, deixei queimar o óleo e o açú-
car espalhou-se pelo chão da cozi-
nha; o resultado final tinha pouco

FOTO MARISA CARDOSO, AGRADECIMENTO KISS THE COOK

de fatia e ainda menos de dourado.
Reduzido à minha insignificância,
liguei à minha avó a perguntar o
que tinha corrido mal. Com o seu
carinho e diplomacia habituais, res-
pondeu-me: “Tudo.”
Claro que a minha avó não ficou
surpreendida. Quando fui viver so-
zinho apercebi-me rapidamente
que o ratinho de biblioteca que
nunca tivera jeito para os trabalhos
manuais também não chegara a
desenvolver o senso comum quoti- LIVRO. GUIA DE UM FILHO MIMADO QUE NÃO SABIA FAZER NADA
diano exigido a qualquer dono de
casa. O leitor pode sorrir com a in-
competência alheia, mas tenho a
certeza de que também conhece al-
guém assim. Um dia típico de uma
pessoa desorganizada, como eu,
CONFISSÕES
DE UM
começa com meia hora de atraso,
uma camisa por passar a ferro, um
pequeno-almoço apressado, um
carro na reserva e um sapato que
pisou materiais biológicos indesejá-
veis. A confusão começa sorrateira,
multiplica-se, arrasta tudo consigo,
distrai-nos do essencial e transfor-
ma o aparentemente secundário
num problema devorador.
ENRASCADO
Como é que um devorador de livros sobrevive na cozinha? O autor
Esta entropia caseira, descobri, é a
verdadeira textura da vida. Viver so- de Desenrasca-te! faz-nos o relato dos seus acidentes. PorRenato Rocha
88

zinho, e ainda por cima a trabalhar
em casa, não é a sequência de ma- Estreia aos 25 anos
ravilhas prometidas, muito menos O guionista estrelou o
sinónimo de liberdade: nada nos primeiro ovo tardiamente
prende como a rotina. No meu caso
em particular o universo hostil não Plano B NasceuemLisboa há 26
se preocupava com o guião que ti- para anos, mas só aos 25 estrelou um
nha de entregar até às oito da noite, engomar ovo pela primeira vez. Assume
muito menos com aquela ideia para Problema: não ter mais queda para letras do que
um conto que precisava de ser tra- ter uma camisa para tarefas domésticas. Licen-
balhada: os acidentes domésticos, engomada para ciado em Cinema, no ramo
mesquinhos e egoístas, rasteiravam- ir trabalhar. Argumento, pela Escola Superior
-me sempre. Afinal, como viver a Solução: seca- de Teatro e Cinema, do Instituto
vida, e vivê-la a sério, se um copo dor do cabelo Politécnico de Lisboa, fez parte
entornado em cima das únicas cal- das equipas de guionismo de
ças lavadas pode sabotar um dia três telenovelas da TVI: Belmonte
prometedor? De uma nódoa inespe- (2014), Massa Fresca (2016) e
rada ao niilismo filosófico vai uma Santa Bárbara (2016). Prepara
curta distância. As fatias douradas outra para a estação de Queluz e
perfeitas que a minha avó fazia – “AS SESSÕES escreve oito horas diárias. Tem
sem qualquer dificuldade – deixa- DE ESCRITA um romance concluído na gave-
ram de ser apenas um sabor de in- E DE TRABA- ta e “45 milhões” de ideias de
fância e tomaram, na minha cabeça, LHO CONTI- narrativas. Desenrasca-te! é a sua
os contornos de um verdadeiro mi- NUAM A SER primeira obra, lançada pela Ofici-
lagre. Seria eu um caso perdido? INTERROM- na do Livro no passado dia 19.
PIDAS POR
Como reduzir os danos ACIDENTES
Há duas abordagens típicas para QUE NÃO
lidar com este problema: ou LEMBRAM isso, dizemos que alguém é “desen-
aprender a ser uma pessoa estru- AO DIABO” rascado” apenas quando o quere-
turada e organizada (impossível, mos elogiar.
no meu caso) ou fazer aquilo a Ora, de criatividade e ideias paler-
que nós, portugueses, chamamos mas percebo eu. Arranquei o botão
“desenrascar”. Além de ser uma das calças? Venha o alfinete de
das palavras mais feias da língua dama. Não tenho facas lavadas?
portuguesa, trata-se de um verbo Venha o fio dentário. Entornei água
ILUSTRAÇÕES DO LIVRO: TAMARA ALVES
difícil de analisar. em cima do telemóvel? Venha o
A definição no dicionário é curta e pacote de arroz. Desligo o desper-
certeira, mas não faz justiça ao seu tador e viro-me na cama sem acor-
potencial expressivo. Informalmen- dar? Escondo-o do outro lado do
te, usamos o verbo “desenrascar” quarto. E, entretanto, envernizei
em muitas situações diferentes, móveis com vinagre e azeite, passei
com um sentido que é mais ou a ferro com secadores, habituei-me
menos este: algo que podia ter sido a técnicas para memorizar listas de
evitado correu mal e, agora, é pre- compras e aprendi, finalmente, a
ciso encontrar uma solução desele- Puré de fazer um arroz que não fica nem
gante, puramente prática e que dê improviso uma sopa, nem um pedregulho.
muitíssimo pouco trabalho. Para Não há crise se Lidar com o stress diário e os aci-
quê prevenir se podemos remediar? os legumes co- dentes domésticos transformou-se
Apesar disso, um “desenrascado” zerem demais. num exercício constante de desco-
não é visto nem como um negligen- Vão à varinha berta destes pequenos truques; e,
te, nem como um incompetente. As mágica e con- muitas vezes, claro, reencontrei vá-
suas ideias palermas são, no fundo, vertem-se num rios bocadinhos de informação que
exercícios de criatividade e, por delicioso creme a minha avó tentou transmitir-me
27 JULHO 2017
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em pequeno e que, na altura, igno-
rei, para minha tragédia pessoal. O
neto desorganizado não se trans-
formou numa pessoa organizada,
mas pelo menos aprendeu a de-
senrascar-se.
E agora, está tudo bem? Será que
consegui reduzir o caos e, final-
mente, concentrar-me apenas e só
naquilo a que, tipicamente, chama-
mos “vida”? Nem por isso. As ses-
sões de escrita e de trabalho conti-
nuam a ser interrompidas por aci-
dentes que não lembram ao diabo e
a casa arrumada acaba sempre por
ficar desarrumada (juro que a culpa
não é minha; acontece). Para al-
guém que, como eu, tem o poder de
acelerar essa desarrumação, resta
apenas rir-se da desgraça e tentar
transformá-la em algo diferente. A
vida de um enrascado pode ser
mais caótica, mas é, sem dúvida,
mais divertida.
Há uns tempos, pedi ajuda à mi-
nha avó para fazer fatias douradas:
queria descobrir se tinha ignorado
algum segredo oculto. Estávamos a
meio da preparação dos ovos e
lembrei-me:
– Avó, sabes como é que se
separa a gema das claras?
– Com as mãos.
– Então vou ensinar-te um
truque.
Todo pimpão e orgulhoso muni-
me de uma garrafa de plástico va-
zia, apertei-a ligeiramente, encostei
o gargalo da garrafa à gema, aliviei
a pressão na garrafa e a gema foi
chupada para dentro, perfeitamente
inteira e solitária.
– Essa eu não conhecia — respon-
deu a minha avó, divertida.
– Pois é.
– Mas para esta receita não é pre-
ciso separar a gema das claras.
– Pois não — respondi, desapon-
tado. Continuámos com a recei-
ta. No fim, provei as fatias doura-
das. Estavam iguais às da minha
infância, impossíveis de imitar.
Há coisas que não podemos mes-
mo desenrascar. W
89
 Social

MODA. OS ESTILISTAS DA MAIS FAMOSA MAISON DE COUTURE

O
DIOR
primeiro desfile de moda
“moderno”, com modelos
em vez de cabides, acon-
teceu em 1858, em Paris,
ideia de um inglês, Charles Worth.
Também nasceu aí o termo haute
couture, alta-costura, que os anos e a
indústria transformaram numa espé-
cie de “denominação de origem”,
com protecção legal e tudo. É um clu-
be: não há hoje mais de uma dezena
e meia de maisons e 2017 marca um
ano especial para uma das mais
especiais: a Casa Dior faz 70 anos.
Foi criada em 1947 por Christian
Dior, que tinha então 42 anos e have-
7
4
0 ANOS
CRIADORES
Seis estilistas sucederam ao fundador que dá nome à casa,
criada para uma “clientela realmente elegante”. Foi em 1947,
quando a França emergia da Segunda Guerra Mundial

4
Gianfranco Ferrè (1989-1997)
O italiano com um curso de
ria de morrer precocemente, apenas Arquitectura e conhecido como
10 anos depois. A linha de sucessores O Arquitecto projectou criações
(vai em seis) tem procurado guiar-se diáfanas em materiais de luxo.
pelas suas grandes linhas de pensa-
mento, como arriscar, criar diferente,
fazer sonhar. Claro que a evolução da 5
moda ditou que tivessem de abando- John Galliano
nar outros mandamentos, como (1997-2011)
aquele que dizia que um vestido nun- O polémico britânico
ca poderia ter menos de 20 metros de mostrou ao que ia com
tecido. Eis os sete criadores Dior. W o choque da primeira
colecção, inspirada
3
na tribo Masai.

3
Marc Bohan
(1960-1989)
Rejeitando as ex-
centricidades da
moda contempo-
rânea, o francês
criou modelos
clássicos que hoje
representam a
Dior em museus
de todo o mundo.
Detém o recorde
de longevidade à
frente da casa.

90
 27 JULHO 2017
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1
Christian Dior (1947-1957)
O estilista tornou-se especialmente admira-
do pelas formas e silhuetas e dizia ter cria-
do o conceito de “mulher-flor”. Morreu de
súbito, numas férias em Itália, com 52 anos.

2
Yves Saint Laurent (1957-1960)
Viu-se à frente da casa com 21 anos
e foi despedido quando foi chamado
1
para a tropa. Na foto, de 1959, está
com a dançarina Tessa Beaumont

6
Raf Simons (2011-2015) Negócio
O belga sucedeu a Galliano e nunca assumiu No primeiro tri-
as colecções masculinas. Com ele a marca mestre de 2017
regressou ao romantismo e à delicadeza. as vendas atingi-
ram 10.400 mi-
6 lhões de euros,
mais 15% que
no ano anterior

7
Maria Grazia
Chiuri (2016-?)
A italiana de 53
anos trocou
FOI ABANDO- Valentino pela
NADO O Dior e na sua
MANDAMEN- primeira colecção
TO QUE DIZIA completa, este
QUE UM VES- ano, regressou a
TIDO NÃO modelos de 1947.
FOTOS GETTYIMAGES

PODIA TER
MENOS DE
20 METROS
DE TECIDO

91
 Desporto
CARLACOUTO
É a mulher-maravilha do futebol português, com 145 jogos pela selecção
(um recorde) e 11 títulos de campeã nacional (outro recorde). Foi também a
primeira a marcar a Inglaterra, que este dia 27 é o adversário de Portugal no
Europeu feminino, a decorrer na Holanda. PorRuiMiguelTovareRaquelWise(fotos)
“Omeupai
pagava-mepara
jogarnoSporting”
arla Sofia Basílio Couto, 43
C anos. Uma figura nacional.
É a futebolista mais inter-
nacional de sempre (145
jogos), à frente de Cristiano Ronaldo
(143), e é ainda a autora do primeiro
golo de sempre da selecção femini-
na à Inglaterra, última adversária de
Portugal na fase de grupos do Euro-
peu. Começamos por aí.
Sabias que foste a primeira joga-
dora a marcar à Inglaterra, em
Abril de 2000 [empate 1-1]?
A sério? Não fazia a mínima ideia.
Não te lembras?
Assim de repente, nem por isso.
Lembro-me é da minha estreia ofi-
cial, a 11 de Dezembro de 1993. Foi
no Estádio de São Luís, em Faro, e
perdemos 1-0 com a França.
Jogavas em que clube?
Espera aí, já jogava no 1º Dezembro,
de Sintra.
E só tinhas 19 anos...
Comecei cedo, aos 16, no Sporting.
Porquê o Sporting?
Um dia, o meu pai pergunta-me:
“Não queres ir lá?”
Onde?
Aos treinos de captação do Spor-
ting, estávamos em 1990 e eu joga-
92
Entrevista
h va andebol no Passos Manuel. Ado-
Carla Couto,
43 anos, fotogra-
fada num jardim
em Vialonga, onde
vive. Jogava sem-
pre com o n.º 9 na
rava aquilo e disse que não ao meu
pai. Aquilo foi como uma facada,
porque a família é toda sportinguis-
ta. Em conversa com amigos, a
pressãozinha veio naturalmente.
camisola
Coisas do género: “vai lá treinar”,
“não faças isso ao teu pai”, “é o
Sporting, o clube do pai, tenta lá”.
E foste?
Claro. Ao intervalo do treino, o mister,
Mário Romeu, pediu-me para assinar.
E o teu pai?
Olhava para mim e dizia-me que
era o dia mais feliz da vida dele. Fui Qual?
uma sortuda. Ver o meu pai assim Era o único clube do País com um
enchia-me o coração. E ele paga- campo relvado.
va-me. O do Estádio José Alvalade?
A ti? Não, aquele em frente, onde a equipa
Dava-me dinheiro no final do mês masculina treinava diariamente.
porque estava a jogar no Sporting. Ias ver os jogos do Sporting em
O teu pai era mesmo Sporting. Alvalade?
F Daqueles ferrenhos. Levava-me Claro, íamos todas. Recebíamos pas-
“Fizmuita sempre a Alvalade. ses livres para a bancada nova.
coisa Para ver futebol? E eles iam ver os vossos?
enquanto Sim, sim. Lembro-me dos 7-1 ao Isso já era pedir demais, não? [risos].
jogava: fui Benfica. É o jogo mais marcante, Nunca treinaste com os jogado-
carteira, porque não é normal haver muitos res do Sporting?
jardineira, golos e tanto desnível num dérbi. Isso só virou moda mais recente-
tipógrafa, Sporting para sempre, portanto? mente. No 1º Dezembro, aí sim,
vogalna Junta Há aqui um outro ponto importante treinávamos com os mais jovens
dosOlivais” na decisão de jogar no Sporting. para nos ajudar a melhorar. O as-

pecto físico dos homens dá-nos
outro preparo.
Jogavas com que número no
Sporting?
Primeiro o 10, depois o 9 em definiti-
vo. Fosse clube ou selecção, sempre
o9
Saíste do Sporting por opção?
Não, o Trajouce chegou-se à frente.
E depois?
Seguiu-se a aventura no 1º De-
zembro.
Vocês eram campeãs a torto e a
direito, qual era a motivação?
A nossa pica era bater o recorde dos
10 títulos seguidos do Boavista.
E?
Conseguimos, ganhámos 11. Sem
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esquecer as seis Taças de Portugal Como é que se concilia tudo
[e as quatro dobradinhas]. isso?
Alguma memória mais presente? Com vontade e paixão, as duas ar-
Há um jogo mais memorável, sim. mas para combater a monotonia
Uma final da Taça, a primeira de do dia-a-dia [volta a rir-se]. Tens
todas no Estádio Nacional, com o de criar etapas. Por exemplo, na
Boavista. Foi em 2010 e ganhámos selecção, a minha maior motiva-
6-0, com quatro golos meus. Foi ção era chegar às 50 internaciona-
imediatamente após a morte do F lizações, depois às 75, a seguir aos
meu pai e tinha de o homenagear “Lembro-me 100 jogos.
na justa medida. da primeira Paraste nas 145.
O futebol feminino é amador, o vitória contra Queria chegar às 150, paciência.
que fazias na vida? a Itália, em Ao todo, 29 golos. Lembras-te do
Uiiiii, fui tanta coisa: carteira, jardi- Carrara. primeiro?
neira, tipógrafa, vogal do assessor Ganhámos Sim, senhor, 2-0 à Finlândia, na
do desporto na Junta dos Olivais. 2-1 e marquei Quarteira, para o Mundialito.
Entretive-me com muita coisa um golo. Foi Dos jogos mais emblemáticos,
enquanto jogava futebol. em 1994” vejo aqui uma derrota 13-0 Q
93

Desporto
Q com a Alemanha.
Que impotência, pá. Quando os mais
fortes são realmente mais fortes pa-
rece que um comboio passou por
nós. Ainda por cima, essa Alemanha
tinha sido campeã mundial e estava
cheia de moral.
E vitórias de encher o País de
orgulho?
Lembro-me muito bem de um 2-1
em Carrara. Primeira vitória à Itália.
Marquei um golo e tudo. Foi em 1994.
Por falar em Itália, jogaste lá.
Na Lazio, uma época.
Que tal?
Bem melhor do que a experiência
anterior, na China.
Quando é que foi essa?
Em 2001, estive lá três meses. Foi
muito complicado e pensava cons-
tantemente em voltar para Portugal.
Então?
Aquilo era um contexto especial:
nunca tinha saído de Portugal, a di-
ferença horária era de nove horas,
um tratado para quem quer falar
para o outro lado do mundo, e não
estava à espera de encontrar um
país ainda fechado, em que não os
entendia. Nem eles a mim. Só que
ganhava três mil dólares por mês,
tinha sido contratada pela federa-
ção da China e eram só três meses.
Onde?
Em Quandong, no Sul da China. Na
94
primeira semana, só comi arroz. E
passava o tempo a ligar à minha
mãe a queixar-me. Ela é que me
dava força.
Nem um benefício?
Há a experiência, claro. E o dinhei-
ro. Desportivamente, acabámos em
terceiro lugar. A campeã foi a equi-
pa da Edite Fernandes [outra inter-
nacional portuguesa]. No ano se-
guinte, a federação chinesa voltou a
contactar-nos para outro período de
três meses, só que aí apareceu a gri-
pe das aves e anulou-se o acordo.
E depois?
Apareceu-me uma proposta do Ar-
senal, um clube conceituado na
Europa. O convite era fazer a pré-
época. Fui lá e gostaram de mim,
até queriam que ficasse.
E nada?
O contrato do Arsenal era diferente
do da China. Em Londres, aquilo
era por objectivos e tinha de pagar
g casa. Voltei para Portugal.
Actualmente, E só voltaste a sair para Itália?
Carla é delegada
no Sindicatos dos Um moço meu conhecido colocou-
Jogadores Profis- -me essa hipótese da Lazio e apro-
sionais de Futebol veitei, aos 37 anos.
Vivias mesmo em Roma?
Perto do aeroporto Fiumicino, adorei
aquilo: as pessoas, a língua, a comida.
E o futebol?
O futebol mesmo, sim. O resto, não.
O quê?
Salários em atraso, um assunto só
resolvido pelo Sindicato dos Jogado-
res em Portugal.
E o resto?
Olha, vi o Lazio-Sporting para a Liga
Europa. E vi o voo da águia.
A águia?
A irmã da águia Vitória do Benfica.
A Lazio contratou-a. No primeiro
jogo dela, com o Milan, ela aterrou
no relvado em vez de em cima do
símbolo. Foi divertido passar o ano
a vê-la a actuar porque o público
deixa-se enfeitiçar por aquele mo-
F mento pré-jogo.
“Fuipara E vocês, jogavam no Olímpico?
aChinae Não, não. Só em estádios espalhados
ganhava pela cidade de Roma.
3.000dólares E há adesão popular?
pormês. Só tivemos uma boa assistência no
Passavao dérbi Lazio-Roma. De resto, é
tempoaligar como em Portugal: os familiares
àminhamãe, das jogadoras e alguns amigos.
aqueixar-me” Nada mais. W
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Cantinho do Tovar
O
Rui Miguel Tovar
Jornalista
Cozido à
portuguesa
no Verão
E então, qual é o problema?
Não brinquem com coisas sé-
rias, se faz favor.
Jota é cá dos nossos. “Porque é
que não há cozido à portuguesa
no Verão? Só porque está calor?
Por favor, não faz sentido chegar
a um restaurante no dia tradicio-
nal do cozido [quinta-feira?] e o
dono encolher os ombros como
se fosse uma verdade universal:
ah e tal o cozido enche muito, ah
e tal o cozido é indigesto no Ve-
rão, ah e tal o cozido isto, ah e tal
o cozido aquilo.” Está lançado o
debate. Finalmente, conheço al-
guém que também é contra esse
movimento natura, o das comi-
das leves, o das comidas de Ve-
rão, o das quiches, o das saladas
com rúcula, o do salmão, o do
queijo feta, o do tomate-cereja,
o das courgettes. É caricato,
ponto. Parágrafo.
Querem mesmo fazer-nos
acreditar que um cozido no Ve-
rão não é tão bom como no In-
verno? Não dá para imaginar
esse cenário, essa distinção
temporal. É como os bares das
praias estarem fechados na
pré-época de banhos e sol, é
como o futebol da pré-época
abrir as portas ao entreteni-
mento. Um cozido é bom em
qualquer altura, chova ou faça
sol, porque a carne não é sazo-
nal. Era só o que faltava agora a
vaca meter uma semana de fé-
rias em Agosto e o porco inven-
tar dias de folga em atraso para
juntar aos feriados de Junho.
Repetimos, é caricato, ponto.
Final. Bom apetite. W
 1. BRINCAR AOS
COZINHEIROS.

2. DEIXAR O
FORNO A LIMPAR.

3. PASSAR A TARDE
COM A AVÓ.

FORNOS WISH
SISTEMA DUALCLEAN
LIMPEZA MAIS FÁCIL
20 R E C E I T A S P R É - P R O G R A M A DA S
 Do leitor
Américo Amorim, o implacável
L Ilustração Luis Grañena, Rui Ricardo, Susana Villar
Mário Tojal
Porto
Muito há ainda que dizer sobre a vida de Américo Amorim, um homem
que viveu sempre à frente do seu tempo – que não gostava da mentalida-
de do caldo-verde - e que se tornou no mais rico do País. (...). A personali-
dade invulgar e implacável e o empreendedorismo do rei da cortiça, como
era conhecido, destacaram-se desde cedo. Nunca quis ouvir falar em re-
forma nem tão-pouco deixar de trabalhar. (...).
L L
Maria Teresa Campos
Setúbal
Posições radicais
Agradeço à SÁBADO a entrevista
com Manuel Pinto Coelho. Permi-
te perceber como o ego pode dar
cabo de alguém que tinha feito
um trabalho notável junto de tan-
ta gente que precisava. A sua ati-
tude como clínico jamais deveria
ser “vender” posições radicais
como o jejum e a toma de suple-
mentos em larga escala. Não ad-
mira o descrédito junto da classe
médica e os processos da Ordem.
Correcção
No artigo Ter uma cor diferen-
te ainda é difícil?, que saiu na
SÁBADO n.º 690, as idades
dos dois intervenientes não es-
tão correctas. A cirurgiã Hele-
na Lopes da Silva tem 68 anos
e o deputado do CDS, Hélder
Amaral, tem 50 anos. Pedimos
desculpa pelos lapsos.
96
leitores@sabado.cofina.pt
Luísa B. Afonso
Leça da Palmeira
Desassombro
A entrevista com Manuel Pinto
Coelho mostra uma vez mais
como a classe médica se protege
e procura amordaçar quem ousa
contrariar os princípios em que
assentam os seus privilégios. De
um clínico também se exige isto –
desassombro. É por isso que tanta
gente o lê e segue.
L 1549–023 LISBOA Telefone +351 213 185 200 – Fax +351 210 493 144
Vítor Colaço Santos
São João das Lampas
Árvores “bombeiras”
Não podemos controlar as altera-
ções, mas podemos controlar o
ordenamento florestal, eliminando
a excessiva mancha de eucaliptal
e a lei que a subsidiou, emitida
pelo executivo anterior. Devemos
apostar mais em árvores “bombei-
ras”, como castanheiros, sobrei-
ros, azinheiras e carvalhos. W
Conselho de Administração Paulo Fernandes (Presidente),
João Borges de Oliveira, Luís Santana e Alda Delgado
Directora Geral de Marketing Isabel Rodrigues
Director Geral Comercial Hernani Gomes
Directora Administrativa e Financeira Alda Delgado
Director de Circulação e Assinaturas João Ferreira de Almeida
Director de Informática Rui Taveira
Director de Recursos Humanos Nuno Jerónimo
Directora de Research Ondina Lourenço
Director Eduardo Dâmaso (eduardodamaso@sabado.cofina.pt)
Director Adjunto João Carlos Silva (joaosilva@sabado.cofina.pt)
Editores Ana Taborda (anataborda@sabado.cofina.pt)
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ditam o vestuário de Verão.

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T resposta para es-

tas charadas: É
possível subir três de-
Manuela Vidal – reúnem
charadas simples, testes
de raciocínio lógico,
graus, sempre de pé, de exercícios matemáticos,
quatro maneiras dife- sequências, anagramas,
rentes. Quais são?; enigmas e variados pas-
Qual é o parentesco do satempos para a exerci-
Fernando com o pai do tar a sua mente de forma
irmão gémeo da filha descontraída.
do Fernando; ou Quan- Abre-te Cérebro!
tas voltas dá um cão vol. 3 Mais livros até
GRÁTIS ,
antes de se deitar? Es- 3 de Agosto 17 de Agosto
tes são alguns dos de-
safios que vai encon-
Os livros, em formato de
bolso, que distribuiremos Sandálias
trar no terceiro volume da colec-
ção Abre-te Cérebro!, que distri-
com as próximas edições, até 17 de
Agosto, têm 96 páginas. Como a Rockport
buiremos gratuitamente com reflectir também se brinca e
a SÁBADO da próxima semana aprende, pegue neste novo Abre-te
Para um estilo casual,
– 3 de Agosto. Cérebro! e tente encontrar resposta sem descurar um andar
Tal como nas duas séries anterio- para os diversos enigmas ou adivi- confortável, estas são as
res de Abre-te Cérebro!, que publi- nhas populares. Se não os conse- sandálias de eleição para
cámos em 2014 e 2015, estes novos guir resolver, pode descobrir as
cinco volumes – elaborados pelo respostas nas soluções – que se
este Verão. €109,90.
arquitecto José Ribeiro Gonçalves e encontram no fim do livro. W A colecção de Verão da Rockport, marca
americana pioneira em calçado cosmopolita
com tecnologia desportiva integrada, aposta
nos tons terra, brilhantes e metalizados,
Outras iniciativas privilegiando os neutros. Estas sandálias
As praias algarvias e os filmes de Velocidade Furiosa transformam a silhueta caged num modelo
mais feminino, mas nem por isso menos
prático ou confortável. A marca tem também
A partir de 3 de Agosto uma linha de homem que privilegia os por-
pode começar a completar a menores.
colecção da saga Velocidade
Furiosa. Primeiro lançamos
o oitavo filme, de 2017, por
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com a SÁBADO, estará à
Mini-bar
venda Velocidade Furiosa 7,
Carlsberg
o filme que falta, por €4,95.
Napróxima semana, o fascí- Este minibar é exclusivo
culo 7 do Guia das Praias Portu- para o mercado portu-
Velocidade
guesas abarca grande parte da Furiosa 8 e 7 guês. Basta pôr o gelo no
região algarvia, incluindo algu- €12,95 e €4,95 interior para refrescar as
Dias 3 e 10 cervejas em meia hora.
mas das mais famosas praias, de Agosto
como a Dona Ana, Marinha ou Está disponível em
Ponta da Piedade. Ficam a faltar embalagens de 20
apenas Açores e Madeira. garrafas. €16,59.

97
 Crónica
CUIDADOS
INTENSIVOS
Qualquer tentativa de manipular os nú-
meros, ou até de os “tratar” com critérios
bizarros(mortesdirectas, mortesindirec-
tas) esbarra com coisas básicas, como in-
demnizaçõesdevidas(enãorecebidas)
C Esta“doença”, se merece o nome, ali-
Mortos
e vivos
NOSDIAS SEGUINTESà tragédia de
Pedrógão Grande, um amigo jornalista,
que andou pelo terreno, dizia-me que o
número final e oficial de mortos – 64 –
não correspondiaàverdade. Pelos seus
cálculos, o horroratingiaoutras propor-
ções. “Três dígitos”, suspeitavaele.
Lembro-me de rir. E de pensar: em
ditadura, é fácil controlar a realidade.
Basta ter uma polícia política e uma
máquinaeficaz de censuraparamanter
o rebanho nalinha.
Em democracia, a dificuldade au-
menta. As pessoas falam. E, ponto cru-
cial, as famílias sabem quem perderam.
Qualquertentativade manipularos nú-
meros, ou até de os “tratar” com crité-
rios bizarros (mortes directas, mortes
indirectas) esbarra com coisas básicas,
como indemnizações devidas (e não
recebidas). Para usar as palavras de
Talleyrand, ocultar a verdade de uma
tragédia como Pedrógão não é apenas
um crime; é um erro. E uma confissão
de estupidez que está para lá do meu
entendimento.
Aliás, continuaaestar. Mas as notícias
dos últimos dias têm provocado tremo-
res no meu optimismo antropológico.
Tudo começou com a 65ª vítima: uma
senhoraque fugiado inferno e foi mor-
talmente atropelada. Não está na lista.
Porquê? Segundo os “critérios”, não
morreu queimadanem asfixiada(pala-
vra de honra). O meu coração parou:
querem verque eu sobrestimei ainteli-
C gênciados nossos governantes?
Politólogo, escritor
João Pereira ESPEROQUENÃO.Mas, atítulo de hi-
Coutinho pótese, o que poderia levar um gover-
98
no, qualquer governo, em qualquer
parte do mundo civilizado, a cometer
semelhante torpeza?
A falta de inteligência não explica
tudo. O poderexplicamuito mais. Li há
tempos, e escrevi algures, que estudos
recentes nas áreas da Psicologia e das
neurociências defendiam que o efeito
do poderno cérebro humano eramuito
semelhante acertos tipos de lesão cere-
bral. Para Dacher Keltner (psicólogo) e
SukhvinderObhi (neurocientista), o po-
dertende ainibiros circuitos empáticos.
Moral dahistória?
mentano político, e sobretudo no líder,
umafalsaconfiançanas suas capacida-
des para entender e moldar o universo
em volta. Com o poder, háumaparte da
massacinzentaque tende adiminuir. A
única coisa que cresce é o sentimento
de impunidade.
ESTE GOVERNO NÃO DESCONHE-
CE ESSE SENTIMENTO. Leio na im-
prensa nativa que há um antes e um
depois de Pedrógão Grande. Antes de
Pedrógão, o Governo caminhava so-
bre as águas, iluminado pelainteligên-
cia de António Costa e os milagres da
economia. Depois de Pedrógão, co-
meçou o naufrágio: Costa, afinal, não é
o “gestor político” que se imagina e
nem os sucessos económicos escon-
dem afalênciado Estado.
Entendo que estahistóriafaçaas de-
lícias de muitas crianças. Infelizmente,
já não sou criança. O Governo que te-
mos depois de Pedrógão é o mesmo
que tivemos antes. Paraserexacto, é o
mesmo que nasceu no dia de uma
derrota eleitoral. Para os sábios co-
mentadeiros, perderas eleições e con-
seguirformarGoverno eraaprovade-
finitiva de um António Costa tocado
pelo génio.
27 JULHO 2017
www.sabado.pt
Acontece que não era. O gesto podia
serconstitucionalmente impoluto. Mas
revelava um desprezo pela nossa tra-
dição democrática – quem ganha,
mesmo em minoria, tem oportunidade
de governar– que não auguravanada
de bom. Se juntarmos ao cenário cer-
tos traços de carácter – como, por
exemplo, enviarmensagens ajornalis-
tas com ameaças directas – o retrato
do cavalheiro não era propriamente
inspirador. O País que ainda pensa,
confrontado com tal novidade, per-
guntou: “Será que, a partir de agora,
vale tudo?”
SIM,ASTRAGÉDIASACONTECEM.
Nos dias seguintes, governos dignos
desse nome começam afazerpergun-
tas simples. Como foi possível? O que
falhou? E, já agora, quantas pessoas
morreram – e quantas ficaram feridas?
As respostas chegam pararestabelecer
o elo de confiança entre os cidadãos e
o Estado.
No Portugal de 2017, temos esta ori-
ginalidade: uma catástrofe sem pre-
cedentes – e ninguém sabe nada de
nada. Não existe uma explicação. Um
número fiável de mortos. Um número
fiável de feridos. Aliás, sobre os feri-
dos, ninguém sabe em que estado es-
tão: se melhoraram, se pioraram, se
morreram entretanto. E o dinheiro
das ajudas? Ainda não chegou. Por-
quê? Não sabemos. Quanto é ao cer-
to? Também não.
No topo do bolo, existe agora a sus-
peita de encobrimento do número de
vítimas e relatos dispersos de “pres-
sões” e “ameaças” aos sobreviventes.
Paranão falarem demais.
O sr. Presidente da República que
esteja descansado: é apenas o regular
funcionamento das instituições no
seu melhor. W
NUNO ANDRÉ FERREIRA
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 10
MÚSICA
Ahmad Jamal
interrompe a reforma
e fala do novo disco

16
CINEMA
Luc Besson volta aos
ambientes espaciais
de O 5.º Elemento

g GOURMET
Número 126 — 27 de Julho a 2 de Agosto de 2017. Este suplemento faz parte integrante da edição n.º 691 da revista SÁBADO e não pode ser vendido separadamente

p PALCO & PLATEIA

S STYLE

4 A SELECÇÃO NACIONAL DE VERÃO

VINHOS QUE
REFRESCAM
ISTOCK
 g
9 4 VINHOS
GOURMET

Aos vinhos pede-se muita frescura

no Verão. Estas são as escolhas
do GPS e de dois sommeliers
9 JÁ ABRIU
Este é o novo spot ribeirinho
de Lisboa – o SUD Lisboa não é só
um restaurante. Tem também um bar,
EDITORIAL
ÂNGELA MARQUES EDITORA
uma esplanada e uma piscina infinita

p PALCO E PLATEIA

10 MÚSICA
COPOS DE TRÊS Ahmad Jamal está reformado, mas editou

E WINE GURUS
agora Marseille. O GPS aproveitou o pre-
texto para falar com esta lenda do jazz
16 CINEMA
20
Já ninguém no GPS se lembra do tempo em Luc Besson volta aos cinemas com
que a palavra sommelier entrou no seu dicioná- Valerian e a Cidade dos Mil Planetas.
rio – não sendo assim tão antigos, somos ópti- Conheça os detalhes deste filme
intergaláctico
mos para línguas. Nenhum de nós esquecerá,
contudo, este tempo em que a expressão wine 20 LIVROS
guru decidiu sair das caves e entrar para a His- No livro Putas Assassinas, do chileno
tória. Temos estado atentos: vimos os rótulos Roberto Bolaño confluem uma série
das garrafas ganharem tiques de mural de de histórias de personagens de outros
livros seus
street art, fomos a centenas de jantares com
milhares de pratos harmonizados com vinhos e
até encontrámos literatura especializada à boca
de estações de serviço. Durante todo este tem-
po fomos escrevendo sobre vinhos. Nunca an-
22 TEATRO & DANÇA
O grupo Byfurcação está a fazer
agora os seus conhecidos espectáculos
de Verão ao ar livre
22
tes, contudo, dedicámos um tema de capa aos 24 ARTES PLÁSTICAS
vinhos mal-amados – os de Verão. Para o fazer- A Culturgest, no Porto, recebe uma das
mos com a seriedade que o tema merecia, ou- instalações-chave de Alberto Carneiro,
vimos vários wine gurus. Um deles, António Lo- artista que morreu em Abril passado
pes, do grupo hoteleiro Anantara, em Vilamoura,
disse-nos uma coisa que nos ia partindo o co-
ração: que essa identidade vinhos de Verão
“não é bem real” (já o suspeitávamos, mas ado-
ramos um bom título). O que existem, continuou
S STYLE
o wine guru, são comidas mais leves, que ten-
dencialmente se comem mais no Verão – os vi-
nhos que melhor pairing fazem com elas é que
costumam ser mais frescos, ácidos e frutados.
28 27 SHOPPING
Estes são os acessórios que vai querer
levar consigo para a praia – alguns de
Percebemos a ideia – ao mesmo tempo que assinatura portuguesa
servimos mais um copo a cada um. 28 FÉRIAS
Passear de burro ou marcar presença
na festa da ria Formosa são algumas
das sugestões do GPS para esta semana
30 PROVADOR
Para sobreviver tem de resolver todos
os enigmas deste Escape Dinner

Director Eduardo Dâmaso Director adjunto João Carlos Silva Editor de fecho Carlos Torres Editora Ângela Marques Editora adjunta Rita Bertrand Redactores Ágata Xavier, Diogo Lopes,
Gonçalo Correia, Inês Mendes Oliveira e Markus Almeida Colaboradores Filipa Teixeira e João Tomé Críticos Ana Maria Henriques e Célia Pedroso (Restaurantes); Carlos Vidal (Artes Plásticas), André Santos,
Eduardo Pitta e Miguel Morgado (Livros), Filipe Lamelas e Pedro Salgado (Música), Gisela Pissarra (Teatro), Tiago R. Santos e Pedro Marta Santos (Cinema) Secretária da Direcção Catarina Gonçalves
Infografia Rúben Sarmento Fotografia Guilherme Venâncio (editor), Alexandre Azevedo (subeditor) Grafismo Nuno Silva (coordenador), Ana Soares (designer sénior) e Marta Cristiano Tratamento de Imagem
João Cruz, Ricardo Coelho e Ricardo Valente Consultoria Linguística Manuela Gonzaga Documentalista Anabela Meneses

Este suplemento faz parte integrante da revista SÁBADO e não pode ser vendido separadamente
 g GOURMET
PLANALTO
RESERVA 2016
De rótulo renovado,
para que melhor se
perceba que vem da
mesma Casa Ferrei-
rinha que o colossal
Barca Velha, é um
clássico da frescura
do Alto Douro. Viva-
ço e elegante nesta
colheita de 2016, é
ideal para marisco.
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QUINTA DOS
CARVALHAIS
COLHEITA
BRANCO 2016
Feito de Encruzado e
Gouveio, com aroma
a lima e limão, é o sa-
bor do Dão todo, den-
tro da garrafa – e en-
velhece bem: pode
guardá-la para o pró-
ximo Verão.
€6,49

DAS VINHAS
PARA A
VINHOS BEIRA DA
PISCINA
O que é um vinho de Verão? Aquele
4
cuja frescura vai bem com pratos
leves e churrascos ou... sozinho,
como aperitivo. Aqui fica a nossa
selecção e a de dois sommeliers
TEXTOS RITA BERTRAND E DIOGO LOPES MAGMA MAMORÉ DE
Os enólogos Diogo BORBA RESERVA
Fonseca Lopes e Correu bem a ideia
Anselmo Mendes do enólogo António
descrevem esta sua Ventura de criar este
empos houve em que os rosés eram con-

T
criação como a branco reserva (em
siderados vinhos menores em Portugal, expressão mais pura tempos, parecia que
sendo quase só consumidos por turistas, do terroir de Biscoi- só os tintos eram
tos, na ilha Terceira, dignos de estágio)
olhados com condescendência por quem Açores. É um mono- para a Sovibor.
só descortina nobreza nos tintos. Até os casta (Verdelho) Denso, mas fresco,
muito salino e vai bem com queijos.
brancos eram mal amados, mas foram mineral. €17
ganhando respeito, sobretudo a acompa- €15
nhar peixes grelhados, no caso dos ma-
duros, e a impor-se como parceiro de mariscadas, nos
verdes. Quanto aos espumantes, a cantilena enaltecia
os franceses e relegava os nossos, na Bairrada excelen-
tes, para as mesas de leitão – de onde só saíam entre o
Natal e o Ano Novo, convocados para brindes festivos.
Os tempos mudam – como cantou o Nobel Dylan e
escreveu o lírico Camões –, o que no mundo vinhateiro
se traduziu no resgate de castas autóctones (do Antão
Vaz alentejano ao Encruzado do Dão, passando pelo
Viosinho do Douro) e deu origem a uma maior diversi-
dade (e qualidade) na oferta.
O problema é que os produtores põem marcas dife-
rente no mercado a toda a hora e o consumidor não
sabe como escolher o mais adequado a cada época ou
situação. Para lhe facilitar a vida o GPS provou e elegeu
os melhores vinhos deste Verão, ideais para tardes pre-
guiçosas à beira da piscina, em terraços e esplanadas vi-
radas ao mar, como aperitivo ou companhia de saladas,
mariscos e churrascos – e para todas as carteiras. v
 BRANCOS
LYBRA BRANCO QUINTA DE TITULAR: SOALHEIRO 9% RESERVA DO
– QUINTA DO GOLÃES 2015 É no Dão que nasce
Um vinho perigoso. COMENDADOR
MONTE D’OIRO O produtor chama- este fresquíssimo
De tão elegante e BRANCO 2015
Nos arredores de -lhe “o vinho da quin- Titular:, um monocas-
doce, este Alvarinho Maravilhoso branco
Lisboa mora a ta da avó” porque ta de Encruzado (tão
– que, como o nome da Adega Mayor,
quinta vínica de José esta combinação característica da área
indica, tem baixa difícil de encontrar
Bento dos Santos, de equilibrada de Alvari- de onde vem este
graduação alcoólica deste que ganhou
onde vem este bran- nho, Trajadura e Lou- vinho) que é “dese-
– escorrega bem, a medalha de Ouro
co fresco e mineral, reiro é feita segundo nhado” pelos enólo-
graças à sua acidez no Mundus Vini,
que resulta da com- as tradições minho- gos Carlos Magalhães
subtil (muitas notas concurso de prestí-
binação das castas tas. Muito fresco, e Manuel Vieira.
cítricas e tropicais) e gio na Alemanha,
Arinto e Viognier. com notas florais, é €10,90
à intensa doçura. sabe a fruta madura.
€9 óptimo com marisco. €11 €14,90
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VINHOS

QM – BRANCO DA PROCURA 2015 MERUGE 2015 DONA PAULETTE

VINHAS VELHAS GAIVOSA GRANDE Não foi por acaso Branco de luxo, que Do Dão, este delicio-
Medalha de prata que a edição de Ju- até no Inverno apete- so monocasta (En-
RESERVA 2014 ce, este monocasta cruzado) da Quinta
no Wines of Portugal Apenas lançado em lho da revista Wine
Challenge, este Alva- Spectator deu 91 de Viosinho com de Lemos, criação do
anos de qualidade ex-
rinho das Quintas de pontos (em 100), estágio em barrica enólogo Hugo Cha-
cepcional, este branco
Melgaço, feito com a este branco alen- (da Lavradores de ves, é complexo,
do Douro, à base de
uvas colhidas ma- tejano da serra de Feitoria, Douro), foi gastronómico e de
Gouveio, Avesso,
nualmente de uma São Mamede, criado elogiado pela revista nariz delicado e flo-
Malvasia Fina e Arinto
parcela única de pela enóloga Susana inglesa Decanter. É ral. Na boca sente-se
(de vinhas com mais
vinhas com mais de Esteban. Elegante complexo, harmonio- o equilíbrio perfeito
de 20 anos), pede
30 anos, tem notas e complexo. so e vale a pena guar- de doçura e amargor.
peixes gordos.
cítricas e de ameixa. €20 dar. €25,90
Convém decantar.
€17,50 €20
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h
 ESPUMANTES E ROSÉS
h MARQUÊS QUINTA DO SOALHEIRO QUINTA VÉRTICE ELPÍDIO 80
DE MARIALVA ORTIGÃO CUVÉE BRUTO 2015 DOS ABIBES MILLÉSIME Nos 80 anos das
No concurso Vinhos Esta garrafa resume Caves São Domingos,
BLANC DE NOIR SUBLIME BRUTO 2010 expoente dos espu-
Espumante à base da de Portugal, este toda as qualidades Vem da Bairrada, Vem da mesma casa
Cuvée de 2012, feito das jovens e frescas mantes da Bairrada,
casta tinta (e mágica), este espumante mo- do Douro e tem as
de uvas tintas Baga uvas Alvarinho, espe- nasceu (à base de
típica da Bairrada, a nocasta (Arinto) de mesmas castas (Gou-
(as mais famosas cialmente selecciona- Pinot, branco e tinto,
Baga, este bruto da nariz interessante, veio, Malvasia Fina,
da Bairrada) e bran- das das vinhas de colheita de 2011) este
Adega de Cantanhe- onde predominam Rabigato, Viosinho e
cas Bical, Chardon- Melgaço para este Elpídio – nome que
de, de cor salmonada, notas de fruta tropi- Touriga Franca) que
nay e Arinto, foi espumante clássico, homenageia o seu
é cremoso e muito cal. Na boca sente-se o popular Vértice Cu-
eleito o melhor aperitivo perfeito, de fundador – em edição
gastronómico. a bolha fina e uma vée, mas o Millésime
espumante do ano. bolha fina e sabor limitada. Um luxo.
€5,50 frescura intensa. ganha – é reserva.
Vitória merecida. persistente. €28,50
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VINHOS

POUCA ROUPA LAVRADORES MAR DA PALHA MONT’ALEGRE ASSOBIO VALLE DE

ROSÉ 2016 DE FEITORIA ROSÉ 2016 CLARETE ROSÉ 2016 PASSOS 2016
Aragonez, Touriga Este rosé de 2016 da O Clarete é caracte- De tom salmão e aci- Manuel Vieira e
ROSÉ 2016 rístico da zona de
Nacional e Cabernet Para rosé, é pálido, o Quinta de Chocapa- dez certeira, o mais Carloto Magalhães
Sauvignon dão cor- lha, Alenquer (região Bordéus, França, novo Assobio rosé do são os enólogos
que não equivale a
po a este rosé bem Tejo), feito de Touri- mas este é bem por- Esporão tem vivaci- responsáveis por
insípido: as notas de
doce e fresco da ga Nacional e Tinta tuguês – vem de dade de sobra, com- este excelente rosé
morango e cítricas
casa João Portugal Roriz, recompensa os Trás-os-Montes. É binando Touriga Na- seco, com travo a
deste Lavradores de
Ramos, que perma- cuidados da sua enó- um blend de castas cional, Tinta Roriz e frutos vermelhos,
Feitoria com Touriga
nece demoradamen- loga, Sandra Tavares tintas, tem um travo Cão de vinhas novas, feito à base de
Franca do Douro im-
te na boca. Aperitivo da Silva: revela um a frutos vermelhos e com Rufete de uma Touriga Franca,
põem-se, refrescan-
perfeito, bom preço. equilíbrio perfeito de é uma óptima opção cepa velha da Quinta Tinta Amarela e
do, mais do que o pa-
€3,99 aromas e frescura. para aperitivo. dos Murças, Douro. Touriga Nacional.
lato, a própria alma.
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 TINTOS
TERRAS CONTOS PAPA FIGOS DISCÓRDIA FAZER AS ONZE
DE ERVIDEIRA DA TERRA Este é um vinho po- Este tinto da Herdade É um tinto versátil e
Quem procura con- Da Quinta do Pôpa e pular, talvez por ser Vale de Évora, vizi- elegante, com notas
tenção de custos nas com nova imagem, dos mais equilibra- nha de Mértola, é o minerais, criado pelo
férias, vai encontrar este tinto sabe a Dou- dos na relação quali- que se chama um vi- enólogo António
um amigo neste tinto ro. Torna-se fresco de dade-preço. Para vi- nho de raça, silvestre Ventura em homena-
jovem e aveludado tão frutado, mas exi- nho do Douro que é, e floral, nunca redon- gem a uma tradição
do Alentejo. A colhei- be também robustez tem perfil muito sua- do, tipicamente alen- de Borba, de onde
ta de 2015 foi meda- no seu blend de Tinta ve e é bastante fru- tejano. Feito de Touri- vem: às 11 da manhã,
lha de ouro no con- Roriz e Barroca, Tou- tado. Acompanha ga Nacional e Franca, o povo junta-se nas
curso italiano La Sele- riga Nacional e Fran- tanto pratos de car- Alicante Bouschet e tascas “para tirar um
zione del Sindaco. ca. Pede grelhados. ne como bacalhau. Syrah, é vibrante com petisco e beber um
€4,80 €5,55 €6,49 enchidos no carvão. copo de vinho”.
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VINHOS

BASTARDO ENCONTRO HERDADE QUINTA CHOCAPALHA

Tem o nome de uma BAGA DAS SERVAS DE VALBOM VINHA MÃE 2012
misteriosa casta do Monocasta Baga, da Luís Duarte, o enólo- Distinguido no Mun-
Douro que integra a RESERVA 2013
Quinta do Encontro, Medalha de ouro no go responsável pelo dus Vini, na Alema-
sua composição. com o seu aroma sucesso da Herdade nha, este tinto reser-
Tinto irreverente da grande concurso
intenso a frutos ver- alemão Mundus Vini, dos Grous, no va vem de uma única
marca Conceito, da melhos bem madu- Alentejo, assina este parcela de vinhas
enóloga Rita Mar- é um blend com
ros e ligeiras notas estágio, de Alicante novo tinto do Douro, velhas da Quinta
ques, não é afável, balsâmicas e tosta- com aroma a fruta de Chocapalha,
mas seduz pelo aro- Bouschet, Cabernet
das, sabe a Bairrada Sauvignon, Alfro- vermelha, madura, Alenquer, combinan-
ma e frescura. Quer e pede queijo curado com notas florais, a do Touriga Nacional,
queijo e enchidos. cheiro e Aragonez.
e carnes vermelhas. Festivo hoje, subli- pedir churrascos. Syrah e Tinta Roriz.
€17 €17,80 €18 Inesquecível.
me se o guardar.
€18 €23,25

h
 A ESCOLHA DOS SOMMELIERS

h
GARRAFEIRAS
ONDE COMPRAR
QUINTA DA QUINTA
PALMIRINHA DO POÇO DO
“É um vinho
biológico branco
LOBO BAGA LISBOA
com acidez
BAIRRADA
“Um monocasta
elevadíssima, muito
de Baga muito
GARRAFEIRA NACIONAL
fresco e aromático, R. de Santa Justa, 18, Lisboa
fresco”
ANTÓNIO LOPES quase sem açúcar
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O percurso deste nenhum”
€3,70 (fecha domingo)
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Guru do grupo hoteleiro
GARRAFEIRA ESTADO D’ALMA
Anantara – começou na
R. João de Oliveira Miguens, 3B,
cozinha do Vila Vita, em Lisboa • 213 621 639 • 10h-20h
2003. A paixão pelos vi- (fecha domingo)
nhos foi crescendo e em
2008 decidiu dedicar-se OS GOLIARDOS
em exclusivo a esse uni- R. General Taborda, 91,
verso. Antes COVELA ROSÉ MERUGE TINTO Campolide
“Os vinhos que mais “É um grande vinho,
VINHOS
de chegar ao gosto de dar a beber • 213 462 156 • 5.ª e 6.ª, 17h-20h
muito elegante,
grupo tailan- no Verão costumam fresco, que fica bem
dês onde ago- ter sempre uma boa
acidez. Com este
tanto com peixe
como com carne.
PORTO
ra trabalha, foi somme- Covela, do Douro, E não só – sozinho
lier principal no Gusto acontece precisa- também funciona GARRAFEIRA TIO PEPE
by Heinz Beck, no Con- mente isso” muito bem”
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rad Algarve, onde esteve • 226 184 656 • 10h30-13h30h
quatro anos e meio. e 15h-20; sáb. 10h-13h
(fecha domingo)

GARRAFEIRA DO CARMO
R. do Carmo, 17-18, Porto
• 222 003 285 • 9h-13h e 14h-19h;
sáb. 9h-13h (fecha domingo)

VINHA
R. Pedro Homem de Melo,
ANTHEA QUINTA DA 244C, Porto • 22 616 0129
ALVARINHO MURTA ROSÉ • 10h30-14h e 15h-19h30
“Escolho este vinho “É óptimo para acom- (fecha domingo e 2.ª)
pela sua casta, que é panhar uma degusta-
Alvarinho, uma das ção de petiscos lisboe-
melhores de Portu-
gal. É floral no nariz e
tas. É um vinho fresco
e frutado, fácil de
ALGARVE
RODOLFO TRISTÃO tem um sabor seco e degustar. Tem um
O actual sommelier do refrescante. Acompa- sabor intenso, com GARRAFEIRA SOARES
Belcanto (duas estrelas nha pratos de peixe” bolha fina e final Parque Comercial Vale Santa
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Michelin) e presidente €8
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dos Escanções Portu- • 289 510 460 • 8h-18h
gueses despertou para o (fecha sábado e domingo)
mundo da restauração
quando era pequeno, no GARRAFEIRA SANTOS
café dos avós, no Carta- R. Diogo Lobo Pereira, 2, Loulé
xo. Deixou de lado uma • 289 417 454 • 10h-19h30
NINFA FITA PRETA
carreira de médico e fu- “Destaco este vinho (fecha domingo)
por ser de uma “TRINCADEIRA
tebolista para se dedi- região [Tejo] que PRETA”
car ao vinho e já soma “Um vinho bastante
ADEGA ALGARVIA – ÁLVARO
tem vindo a recupe-
uma série de estágios rar estatuto no mun- versátil. É um tinto de ABRANTES, LDA.
do dos vinhos. Ele é Verão frutado, com R. Cristóvão Pires Norte, Loulé
em restaurantes de frutado, com um notas de especiarias,
• 289 398 966 • 9h-19h
prestígio, como o famo- ligeiro toque floral, e sabor seco e frescura
so Celler de Can Roca, no sabor prima pela invulgar para um tin- (fecha sábado e domingo)
frescura e pela to. Acompanha carnes
em Girona, por exemplo. acidez” grelhadas e petiscos” * Preços indicativos de venda
€7,95 €9,42 ao público, não vinculativos
JÁ ABRIU!
ge, uma esplanada (coberta ou não, conforme o
tempo) com um jardim suspenso, uma piscina infini-
ta, um pool bar & shisha lounge e um quiosque com
serviço de take-away – e isto apenas no Pavilhão

SUD Lisboa: Poente, identificado como SUD Lisboa Terrazza. O

SUD Lisboa Hall complementa o primeiro, mas rece-
be apenas eventos privados e festas.

todo o sabor Com detalhes em cobre e elementos marítimos, a

mediterrânico
à beira do Tejo
q INÊS MENDES OLIVEIRA
“Ouço dizer muitas vezes que aqui só faltam mesmo
os quartos”, afirmava, na apresentação da novidade
à imprensa, Salomé Gorgiladze, administradora dele-
gada do SUD Lisboa, o novo espaço gastronómico
(e não só) da capital. Explicou depois que este é o pri-
meiro projecto do grupo SANA que não é um hotel –
o que justifica o comentário. De facto, pondo de par-
te o alojamento, o SUD Lisboa (dividido entre dois
SUD LISBOA
TERRAZZA pavilhões, o Hall e o Terrazza), na zona ribeirinha de
AV. BRASÍLIA, Belém, tem de tudo, a começar pela vista desimpedi-
PAVILHÃO POENTE, da para o Tejo. Redutor seria dizer que é um restau-
LISBOA
8h-2h (todos os dias) rante. É mais do que isso – serve pequenos-almoços,
• €25 (preço médio) almoços, lanches e jantares; é também um bar loun-
inspiração para a decoração do espaço não deixa
margem para dúvidas: os Descobrimentos estive-
ram na base do trabalho do arquitecto português
António Pinto, que assinou o projecto do SUD Lis-
boa. À noite, o espaço ganha nova luz através de pai-
néis acrílicos com padrões de algas marinhas que
vão mudando de cor.
Ao leme da cozinha está o chefexecutivo italiano
Carlo Di Nunzio, que já trabalhou em várias cadeias
hoteleiras e restaurantes independentes, na Holanda,
Roménia, Inglaterra, França, Luxemburgo
e Suíça. Do seu currículo destaca-se o res- RESTAURANTES
taurante Club Coconut Rimini, em Itália,
com uma estrela Michelin. É às suas ori-
gens – coincidentes com as da cozinha portuguesa –
e à comida da própria mãe que o chefvai buscar ins-
piração para este restaurante mediterrânico com en-
9
foque nos sabores italianos. A esta cozinha chegam
três vezes por semana ingredientes de produtores
da Apúlia (região do Sul, ou, como costuma dizer-se,
no “salto da bota”). Um exemplo é a burrata, servida
com azeite e tomate-cherry.
Para quem gosta de partilhar pratos, há opção de
food sharing ao almoço e ao jantar, podendo esco-
lher-se especialidades italianas, como risoto com la-
gostins, ou outros pratos de carne ou peixe. Para
animar, há ainda uma dupla feminina de música ao
vivo, DJ residente e um saxofonista. v

O SUD Lisboa
deve o nome
à palavra
south, aqui
FOTOS ANTÓNIO NASCIMENTO

usada para
designar a
cultura des-
contraída dos
países do Sul
da Europa
e a comida
mediterrânea
 pPALCO &PLATEIA

MARSEILLE
Jazz
• Ed. Jazzbook
Records
€8,99 (iTunes)

MÚSICA

10

FOTOS GETTY IMAGES

os últimos momentos da conver-

N
sa telefónica com Ahmad Jamal –
lendário pianista de jazz que aca-
ba de lançar Marseille, um novo
álbum de originais –, os papéis de
entrevistado e entrevistador alte-
raram-se. “Como é a música tradi-
cional portuguesa?”, “O que gos-
tas mais de ouvir?”, “Quem são os músicos portu-

AHMAD JAMAL: gueses que mais têm dado que falar? O que tocam
eles?” Quase de rajada, este octogenário (celebrou
87 anos a 2 de Julho), que falava de Nova Iorque,

O MOZART comprovava aquilo que uns vinte minutos antes

havia dito: “Sou muito curioso, sabes?”
Depois de lhe serem apresentadas algumas refe-

DE PITTSBURGH rências – do incontornável fado ao mais recente fe-

Aos três anos, este norte-americano já tocava
piano. Com o tempo, tornou-se uma lenda do jazz
e recentemente saiu da “reforma” para editar
Marseille, pretexto para esta entrevista
TEXTO DIOGO LOPES
nómeno Salvador Sobral (que muito o interessou)
–, Jamal despediu-se afirmando que “tecnicamente”
já está reformado. Lançou agora este Marseille por-
que amigos seus insistiram que o fizesse e só toca
ao vivo “em ocasiões especiais”. Prefere estar em
casa, “a tratar de outras coisas”.
Não é por causa desta suposta reforma, porém,
que a sua carreira deve ser esquecida. Muito pelo
contrário. “Comecei a tocar aos três anos”, conta,
explicando que o seu tio, irmão da mãe, foi o cul-
pado de tudo o que se haveria de seguir – “Foi ele
que descobriu o meu talento [...], costumava sen-
tar-se ao piano, tocava umas coisas e depois per-
 acérrimo da minha música”, conta.
O seu nome foi fazendo virar cabeças, de tal for-
ma que em 1952, com apenas 22 anos, Ahmad foi
convidado a participar naquele que descreve
como “o concerto mais memorável” da sua vida:
“Dei por mim em palco com o Duke Ellington, a
Billie Holiday, o Charlie Parker, o Dizzy Gillespie e o
Em 1942, Jamal
tinha 12 anos Stan Getz. Eu tinha 22 anos! Foi muito intimidante,
e já tocava ao acho que qualquer jovem artista sentiria o mesmo.”
vivo – quase
sempre num
Ahmad’s Blues (1951) foi o seu primeiro disco, o úni-
trio. Nesta co que editou pela Okeh: em 1955 trocava de eti-
foto da altura, queta, passando a fazer parte da Argo, a recém-cria-
actuava em
Pittsburgh, a sua da sucursal de Chicago da mítica Chess Records. “O
cidade natal Leonard Chess disse-me várias vezes que o suces-
so da sua editora foi cimentado por quatro grandes
artistas: eu, o Chuck Berry, o Bo Diddley e o Muddy
Waters”, sublinha, a propósito.
Aí editou o primeiro grande sucesso de vendas,
At The Pershing: But Not For Me (o terceiro álbum
para a Argo, uma gravação ao vivo no Pershing
Lounge, em Chicago), “um dos discos mais piratea-
dos de sempre”, segundo o próprio, e ál-
bum que cimentou a sua posição entre os MÚSICA
grandes do jazz.
A partir daí, as vitórias sucederam-se e
para trás foi ficando um património musical tão
11
rico que ainda hoje anda nas bocas do mundo –
Snowfall, por exemplo, foi gravada em 1961 e re-
centemente usada na campanha de lançamento
do iPhone 7. Sobre esta intemporalidade da sua
música, Jamal diz que “não existe música velha,
Jamal (à dir.)
no programa ela ou é boa ou é má” e atira com um exemplo:
Dial M for “Olha o Mozart... Há milhares de estações de rádio
Music, em pelo mundo fora que ainda hoje tocam as músi-
1968, com
B.B. King cas dele. Todos os dias, até!”
(esq.) Será que, quando começou a brincar com um
piano, ainda na sua cidade natal de Pittsburgh,
nos EUA, Jamal sonhava chegar onde chegou? A
guntava-me se conseguia replicar. Eu conseguia, resposta é assertiva. “Sempre senti que haveria
nota por nota, nota por nota!” de ter mais que um ouvinte”, diz, concluindo, em
Assim, de repente, a mãe de Frederick Russell Jo- jeito de piada, que acabou “por ter milhões de-
nes (nome original de Ahmad, mudou-o aos 20 les.” Arrogância? Nem por isso: confiança, muita,
anos, quando se converteu ao Islão) viu o seu pia- atitude que sempre pautou o seu percurso artís-
no vertical, que tinha comprado para aprender ela
AHMAD tico, mesmo quando optou seguir caminhos me-
própria a tocar, passar a ser propriedade do filho, JAMAL JÁ nos óbvios – como, por exemplo, quando decidiu
que desde então nunca mais o largou. CONTA COM fazer uma tournée no Norte de África em 1959,
A história de que tocava de porta aberta, para que MAIS DE 60 algo inédito na altura.
uma editora o descobrisse, é verdadeira? “É, sim”, Actualmente passa muito tempo em França, ape-
responde prontamente. “E para estarmos aqui a fa-
ANOS DE sar de chamar casa a Nova Iorque. A (pouca) músi-
lar, é porque funcionou”, acrescentou, entre risos. CARREIRA ca que ainda faz – como a que está em Marseille – é
De facto, a carreira de Jamal é das mais prolíficas E ACABA editada pela gaulesa Jazzbook Records (“há 15
da história do jazz e começou a florescer muito ce- DE LANÇAR anos que gravo apenas em editoras francesas”, afir-
do e depressa. Já com vários concertos em peque- ma). Apesar desta redução de ritmo, Ahmad diz
nos bares e salas de espectáculo debaixo do cinto, UM NOVO que tenta tocar todos os dias, mas que muitas ve-
Jamal assinou o seu primeiro contrato discográfico DISCO, zes não consegue “sequer chegar perto do piano,
no início da década de 50. A Okeh, uma subsidiária MARSEILLE por estar tão ocupado com outras coisas” Quais?
da gigante Columbia, foi a sua primeira casa, e Ouve “milhares de músicas, todos os dias”. São elas
John Hammond, o homem que “descobriu” Bob que o inspiram e, quando sente que quer compor,
Dylan, foi quem lhe abriu a porta da profissionaliza- anota tudo numa pauta, à mão: “Faço à antiga, com
ção enquanto músico: “Ele era uma pessoa espec- um lápis e uma folha.” Como sempre fez e – diz –
tacular, um verdadeiro patrono das artes e um fã como sempre continuará a fazer. v

o TENHO DITO
Foi a primeira confirmaçãodoEDP
Cool Jazz,festival ondeactuou em
2014,noestádiodeOeirasa quevolta
nosábado.Na véspera,JamieCullum
vai aoPorto.Antes,falou com oGPS
“
Esta vai ser a primeira vez
que vou actuar em Portugal
com os palcos cheios.
Vou ter muita gente à minha
volta e do meu piano
“
Lembro-me de ir a Portugal em
2005, com o álbum The Pursuit.
Tinha acabado uma tournée
no Reino Unido e o público
português fez mais barulho
numa só noite, a bater palmas
e a gritar, do que os ingleses
em dezenas de datas. Não
há plateia mais generosa
MÚSICA
12 “
O meu novo álbum é o mais
autobiográfico de sempre.
Ainda não está pronto, mas
estou ansioso por mostrar aos
fãs as músicas mais pessoais.
Quanto às outras, costumo
decidir os alinhamentos no
momento, conforme me sinto
quando começo a tocar
“
Tenho um projecto de gravação
de covers e adoro interpretar
canções de outros, incluindo
rock. Não é uma coisa
pensada, simplesmente adoro
rock, cresci a ouvir os Nirvana
D.R.
A CONVERSA FOI de manhã, an-
tes das 10h, e Jamie Cullum já
estava fresquíssimo, a falar ao te-
lefone com a desenvoltura de
quem está habituado a levantar-
-se cedo. Confirmou-o, a rir, justi-
ficando-se com as duas filhas pe-
quenas e resumindo o seu dia-a-
-dia ao GPS – que contraria a
ideia do músico boémio, a tocar
noite fora em caves esconsas,
JARDINS DE SERRALVES, PORTO
– ESTÁDIO MUNICIPAL DE OEIRAS
Sáb., 29/7, 21h30 (com a portuguesa
romances. Fiquei felicíssimo
quando vi o novo calhamaço
como o que Ryan Gosling inter-
pretou em La La Land – Melodia
do Amor. A propósito, quisemos
saber o que achou: “Ia ser uma
desilusão, se visse alguém a to-
car piano como ele num concer-
to, mas o filme é bonito e pôs jazz
no cinema, o que é raro.”
Jazz com abordagem pop é, de
resto, o que traz aos Jardins de
Serralves, no Porto, e ao Parque
“
JAMIE CULLUM
6.ª., 28/7, 22h
• €20 a €50
PARQUE DOS POETAS
Beatriz Pessoa na 1.ª parte)
• €23 a €65
“
Embora eu seja do jazz,
adoraria ter escrito muitos
dos grandes clássicos do
pop-rock. Acima de tudo,
gostaria de ter sido eu a
compor Jealous Guy... Que
inveja tenho, nesse aspecto,
do talento de John Lennon!
“
Sou um tipo pacato
e caseiro, sempre que não
estou em digressão. Acordo
às 6h, faço café e preparo
o pequeno-almoço, que
gosto de tomar com
as minhas filhas. Depois
levo-as, cada uma à sua
escola, volto, vou para
o estúdio tocar e compor
e almoço com a minha
mulher [Sophie Dahl,
modelo e escritora]. Vou
buscar os miúdos ao fim
da tarde e fazemos jogos
ao ar livre. À noite, gosto
de tequila e conversa
“
Sou um leitor ávido de
de Paul Auster, 4, 3, 2, 1.
Comecei a lê-lo um dia
depois de sair
dos Poetas, em Oeiras – sejam êxi-
tos tirados de Twentysomething,
Interlude ou The Pursuit, sejam co-
vers ou temas novos, como Work
of Art, single de Março, a incluir no
novo álbum, quase a sair.Antes
dos concertos, conheça melhor
o músico inglês, vencedor de um
Grammy – em discurso directo. v
TEXTO RITA BERTRAND

FESTIVAL
JAZZ EM AGOSTO ARRANCA
EM JULHO NA GULBENKIAN
O festival que tantas ve-
zes obriga os fãs de jazz a
fazer conciliações malu-
cas com a agenda de fé-
rias, de modo a não fa-
lharem os momentos épi-
cos que se vivem no Anfi-
teatro ao Ar Livre da Fun-
dação Gulbenkian, come-
ça, este ano, ainda em
Julho, mas não é por isso
que muda de nome: a
34.ª edição do Jazz em
Agosto arranca esta sex-
ta-feira, 28, com Sélé-
béyone, projecto revolu-
cionário que junta o saxo-
fonista Steve Lehman e
os rappers HPrizm/High
Priest (dos Antipop Con-
sortium) e Gaston Bandi-
mic (estrela do hip-hop
do Senegal), prolongan-
do-se até dia 6, data de
encerramento com outra
proposta arrojada: High
Risk, com o trompetista
Dave Douglas a abraçar a
electrónica.
Pelo meio, há muita mú-
sica aventureira, a derru-
bar fronteiras geográficas
e estilísticas, como dita o
jazz contemporâneo. Dois
guitarristas encarnam
essa ideia na Gulbenkian:
David Torn no projeto Sun
of Goldfinger, com os in-
contornáveis Tim Berne e
Ches Smith, e o francês
Julien Desprez, como
membro da Coax Orches-
tra e a solo, na perfor-
mance Acapulco Redux.
O contrabaixista Pascal
Niggenkemper também se
apresenta a solo, explo-
rando os limites do instru-
mento, e o saxofone de
Peter Brötzmann “contra-
cena” com a pedal steel
guitar de Heather Leigh.
Mais? Life and Other Tran-
sient Storms, o quinteto
da trompetista Susana
Santos Silva, e Sudo
Quartet, que junta impro-
visadores europeus de re-
nome, como o violinista
Carlos Zíngaro, a contra-
baixista Joëlle Léandre e o
baterista Paul Lovens. Ora
espreite o cartaz. v RB
CARTAZ
FUNDAÇÃO GULBENKIAN
ANFITEATRO AO AR LIVRE
6.ª,28/7,21h30Sélébéyone
– Steve Lehman • Sáb.,29/7,
21h30Sun of Goldfinger
– David Torn • Dom.,30/7,
21h30Coax Orchestra • 2.ª,
31/7,21h30Peter Brötzmann
& Heather Leigh• 3.ª,1/8,
21h30Life and Other Tran-
sient Storms – Susana Santos
Silva • 4.ª,2/8,21h30Sudo
Quartet • 5.ª,3/8,21h30Star-
lite Motel • 6.ª,4/8,21h30
Dave Douglas The Fictive Five – Larry Ochs
• Sáb.,5/8,21h30Human
Feel • Dom.,6/8,21h30High
Risk – Dave Douglas
EDIFÍCIO COL. MODERNA
Sáb.,29/7,18h30Steve
Lehman • Dom.,30/7,18h30
Acapulco Redux – Julien Des-
prez • Sáb.,5/8,18h30EITR–
Pedro Sousa & Pedro Lopes
EDIFÍCIO SEDE – AUD. 2
6.ª,4/8,18h30Pascal
Niggenkemper
Bilhetes: €12 a €20
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Steve
Lehman 13
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 CONCERTOS FESTIVAL

VOZ ENORME DE GREGORY PORTER FAMALICÃO

EM BRAGA E MATOSINHOS
q FILIPA TEIXEIRA
Cruza soul, jazz, blues e
gospel com aquela le-
veza que está apenas
ao alcance dos grandes
intérpretes e, nos dias
28 e 29 de Julho, vem a
Portugal novamente
mostrar que a música,
mesmo que tardiamen-
te revelada, sempre lhe
correu na alma.
MÚSICA
14
COM ROCK
O heavy metal e o rock al-
Gregory Porter está anos – que esteve qua- Jazz Hat – mostrará, ternativo voltam a tomar
de regresso depois de se a fazer carreira pro- com a sua banda, no conta da freguesia de
ter ido ao Cool Jazz de fissional no futebol Theatro Circo, o mais Louro nos dias 28 e 29.
Oeiras em 2014 e de ter americano, não fosse recente trabalho, Take A terceira edição do Lau-
passado por Lisboa e uma lesão grave a ditar Me to the Alley (2016), rus Nobilis, que abre a 27
Porto em 2015, com o o touchdown final – o segundo com selo com um programa gratui-
então recente Liquid vem a Braga e a Mato- da Blue Note e que, à to de boas-vindas, junta
Spirit (2014), um álbum sinhos para dois con- semelhança do ante- várias bandas de peso do
que deixou meio mun- certos com característi- cessor, arrecadou o panorama nacional e in-
do de boca aberta. cas bem distintas. Grammy de Melhor ternacional.
Desta vez, o músico Na sexta, 28, Porter – Álbum de Jazz Vocal. Quase a completar 30
norte-americano de 45 inseparável do seu No sábado, 29, o en- anos de carreira, os finlan-
redo adensa-se, com deses Amorphis são os
a voz enorme de Por- mais aguardados do car-
ter a encontrar-se taz, que conta, entre ou-
com Orquestra Sinfó- tros, com os londrinos
GREGORY PORTER nica do Porto, num Neon Animal e os portu-
THEATRO CIRCO, BRAGA
6.ª, 28/7 • 21h30 espectáculo especial, gueses Killimanjaro, Holo-
• €30 que pretende enterrar causto Canibal, PAUS e
PÇ. GUILHERMINA
as memórias do mau Linda Martini. Fora do re-
SUGGIA, MATOSINHOS
Sáb., 29/7 • 22h tempo que em 2015 cinto, haverá ainda activi-
(com orquestra) obrigou a organiza- dades lúdicas. v FT
• Grátis
ção a passar o con-
certo, com direcção FESTIVAL LAURUS
de Pedro Neves, da NOBILIS
R. COMENDADOR COSTA E SÁ
Praça Guilhermina – LOURO, V. N. FAMALICÃO
Suggia, em Matosi- De 27 a 29/7 • 5.ª, 16h-4h
• 6.ª e sáb., 16h30-4h
nhos, para a Casa da • €15/dia; passe: €25 (com
Música. v campismo); dia 27: €Grátis

FESTIVAL

À NOITE, NO CHOUPAL FESTIVAL FOLK

CELTA
PONTE DA BARCA
É já no sábado, 29, que têm início as Noites do Par- De 27 a 29/7
que, em Torres Vedras. O concerto inaugural é com • 5ª, 22h30-1h
Suzie’s Velvet (na foto), grupo com o dedo de Bruno • 6.ª e sáb., 21h-1h30
• €10/dia;
Pernadas que recupera a música americana das dé- €15/2 dias; passe: €20
cadas de 30 e de 40, do swing aos blues. A 5 de
Agosto será a vez de André Miguel Santos & MOB
Ensemble subir ao palco do Parque do Choupal para e Quique Escamilla (na fo-
um concerto onde a improvisação é rainha. A finalizar to), mexicano em ascensão
o cartaz, a 12 de Agosto, chega o grupo Chão da Fei- na world music, que funde
CONCERTOS
ra, uma banda que mistura as raízes tradicionais por- ritmos tradicionais do seu
tuguesas com sons de todo o mundo. v FT FOLK À BEIRA DO LIMA país com o rock.
Outra das grandes atrac-
De 27 a 29 de Julho, volta- aguardados estão os por- ções – associada à ampla
rá a realizar-se o Festival tugueses Kumpania Alga- área destinada a produto-
NOITES DO Folk Celta em Ponte da zarra, que fazem de cada res da região –, é o cenário
PARQUE Barca, numa edição alar- concerto uma verdadeira que envolve o recinto deste
PARQUE
DO CHOUPAL, gada de três dias a marcar folia, os escoceses Rura, festival com dois palcos, em
TORRES as comemorações do apontados como um dos plena Reserva Mundial da
VEDRAS
Sáb., 29/7 • 22h 10.º aniversário do evento. grupos mais promissores Biosfera, nas margens do
• Grátis Entre os artistas mais do panorama folk escocês, rio Lima. v FT

CINEMA
Quem
16
vê caras
também vê
corações
Drama intergaláctico de Luc Besson
sobre o amor e a capacidade de
perdoar junta Dane DeHaan
e Cara Delevingne no grande ecrã.
Valerian ea CidadedosMilPlanetas
estreia-se esta quinta-feira, 27
TEXTO ÁGATA XAVIER
uas das frases mais relevantes são ditas
D por uma personagem improvável, a prin-
cesa do R&B, Rhianna. Primeira: “É um
amor pobre, aquele que se pode medir” (a
legendagem dirá “Pobre é o amor que pode ser me-
dido”), retirada a António e Cleópatra, de William
Shakespeare. Segunda: “O que é a liberdade quan-
do se é um imigrante ilegal longe de casa?” – um
pensamento na ordem do dia, mostrando que Bes-
son, mesmo inventando mundos paralelos, conti-
nua atento ao nosso, carregado de injustiças. Rhian-
na de aparição fugaz é uma das muitas aliadas de
Valerian, o herói, e de Laureline, a co-heroína em Va-
lerian e a Cidade dos Mil Planetas.
O clássico da banda desenhada escrito por Pierre
Cara
Delevingne
e Dane
DeHaan
são o par
romântico
da ópera
espacial
Christin e desenhado por Jean-Claude Mézières
cativou Luc Besson (mestre de filmes de acção e
de ficção científica), sobretudo o sexto álbum da
série, L’Ambassadeur des Ombres, publicado em
1975. Depois de já ter ido buscar Milla Jovovich às
passarelas (5.º Elemento e Joana D’Arc), fá-lo ago-
ra com Cara Delevingne, modelo que desde 2015
procura um lugar na indústria cinematográfica. No
papel da Sargenta Laureline, faz parelha com o
Major Valerian para, em conjunto, descobrirem a
força misteriosa que se esconde em Alpha, um
mundo de 30 milhões de habitantes e com mais
de 8 mil espécies.
Vinte anos separam Luc Besson da sua ópera
espacial anterior, o tal 5.º Elemento, e o regresso
faz-se, mais uma vez, através de um intenso psica-
delismo (“uma perpétua Ibiza na manhã seguinte
à melhor rave de sempre”, escreve o New York Ti-
mes – isto por desconhecerem o Boom Festival,
em Idanha-a-Nova, escrevemos nós).
É impossível não pensar em Guerra das Estrelas,
VINTE ANOS
SEPARAM
O 5.º
ELEMENTO
mas no campeonato das possibilidades infindá-
veis de efeitos especiais e personagens estrambó-
licas que a dupla Disney/Lucas tem conseguido
criar, Besson não se deixa ficar. Tal como não se
coíbe de reunir um elenco improvável para sus-
tentar o par de caras larocas: Clive Owen, Ethan
DESTE Hawke, Herbie Hancock, John Goodman (que dá
VALERIAN voz a Igon Siruss, um Jabba the Hut mais polido)
E A CIDADE ou Rutger Hauer (um habitué em filmes de acção
que o IMDB descreve como louro, olhos azuis, alto
DOS MIL e bonito). Gente gira, portanto, alucinações ade-
PLANETAS quadas à época estival, duas horas e 17 minutos
de correria, pancadaria e boas intenções: a de sal-
var um planeta danificado pelos humanos. v
 CRÍTICA
POLINA
PASSOS
EM FALSO
PEDRO MARTA SANTOS CRÍTICO
k O projecto era prometedor: des-
crever, com realismo (apesar da
origem na graphic novel de Bastien
Vives) e sensibilidade, a autodes-
coberta de uma artista, Polina, bai-
larina russa, de acesso garantido
ao Ballet do Teatro Bolshoi, que de-
cide interromper o percurso clássi-
co para definir uma identidade, pri-
meiro numa companhia de dança
moderna de Aix-en-Provence, Fran-
ça, depois na liberdade coreográfi-
ca de Anvers, Bélgica, junto de um
bailarino de excepção, Karl.
As expectativas eram tanto mais
altas quanto Polina surge interpre-
tada por Anastasia Shevtosa, do
notável Ballet Mariinski de São Pe-
tersburgo, Jérémie Bèlingard, estre-
la do Ballet da Ópera de Paris, é
Karl, e o filme teve a realização de
Valérie Muller com o marido, Ange-
lin Preljocaj, grande coreógrafo
moderno francês de origem alba-
nesa. Mas o cinema não é ballet, e
o par soçobra na verdade emocio-
nal da viagem, das enormes cha-
minés industriais dos subúrbios
moscovitas aos bares de Anvers
onde Polina arranja emprego para
TTSSS
DE VALÉRIE MULLER
E ANGELIN PRELJOCAJ
FRA • Drama • M12 • 108m
Com Anastasia Shevtsova
e Juliette Binoche
“conhecer a vida”, crescendo
como intérprete e coreógrafa.
Quando irrompe a beleza de um
pas-de-deux na reinterpretação de
Branca de Neve, pelos oito minu-
tos finais, é demasiado tarde. Há
aqui um grande filme
algures escondido, mas CINEMA
não chegou a sair do
espaldar. v
17
PUB

k Há uma linhagem con-
siderável de filmes de ter-
ror psicológico em am-
biente gótico. A Hammer
fez disso parte da sua car-
reira como produtora, e a
BBC embebeu muitas das
suas adaptações de clás-
sicos literários na mesma
atmosfera.
Pedras Sombrias assu-
me o legado no caso de
Verena, uma enfermeira
CINEMA
18
CRÍTICA
PEDRAS O sopro sobrenatural
SOMBRIAS passa da sugestão do
primeiro acto aos exces-
GRANÍTICO sos do clímax, Emilia
Clarke parece perdida
sem a cabeleira loira da
Daenerys Targaryen de
A Guerra dos Tronos e
contratada para cuidar Eric D. Howell deveria re-
do filho silencioso de ver 33 vezes Os Inocen-
Klaus, um escultor viúvo tes (1961) para ter noção
com mansão na Toscânia do que é um conto as-
dos anos 50. sombrado. v PMS
TSSSS
DE ERIC D.
HOWELL
EUA/ITA • Thriller
• M16 • 94m
Com Emilia Clarke
e Marton Csokas
TwSSS
DE PHIL VOLKEN
EUA • Acção • M12 • 108m
Com Eion Bailey e Danny Glover
CRÍTICA
PESADELO EM FÉRIAS
TORMENTO
VOLUNTÁRIO
k Este filme conta com um dos
protagonistas mais estúpidos da
história recente do cinema: o mé-
dico Kevin vai passar férias às Ca-
raíbas com a mulher e o filho de
seis anos mas, à falta de barcos
na estância de luxo onde se hos-
peda, resolve alugar uma lancha
usada a um autóctone – a quem
não se identifica ou informa onde
está hospedado – e arranca feito
louco com a esposa e o miúdo,
sem água, comida, protector solar,
telemóvel e roaming, carregando
no pedal durante uma hora, para
longe da costa, num oceano que
não conhece, sem perceber patavi-
na de navegação ou mecânica, até
se deter numa ilha deserta no
meio de nenhures.
A partir daí, Pesadelo em Férias
melhora e revela timing nas peripé-
cias, mas quem se pode importar
com o destino de um canastrão
destes? v PMS

ESTREIA

NICOLAS CAGE TEM UM EXÉRCITO DE UM HOMEM SÓ

q ÂNGELA MARQUES nos Estados Unidos
Nicolas Cage é Gary em 2016, é uma comé-
Faulkner, “o seu faz- dia de Larry Charles,
tudo de eleição”, cheio que também realizou
de opiniões e conse- Borat: Aprender Cultu-
lhos para dar. Um dia, ra da América para Fa-
convence-se de que zer Benefício Glorioso
Deus (Russell Brand) à Nação do Cazaquis-
lhe apareceu com uma tão”, Bruno e O Ditador.
missão: ir até ao Pa- Nas mãos do realiza-
quistão e encontrar e dor que também assi-
matar sozinho Osama nou, como argumentis- Aos 53 anos,
Bin Laden. ta, as séries Seinfeld e Nicolas Cage é
Gary Faulkner,
Exército de um Ho- Doido por Ti, Nicolas que quer matar
mem Só, que estreou Cage faz-se cómico. v Bin Laden

LIVROS
20
Haverá vida
antes da morte?
Livro de contos inédito de Roberto Bolaño chega
a Portugal. Um conjunto de histórias de forte
desencanto e melancolia. E também o habitual
pendor autobiográfico
TEXTO MARCO ALVES
utas Assassinas foi lançado em 2001, dois
P anos antes de o escritor chileno morrer e três
anos antes de se tornar alvo de culto mundial
com o lançamento do romance 2666.
Putas Assassinas, nome de um dos contos, é a
história de uma mulher que se interessa por um
homem que vê em directo na televisão, sai de casa
até ao local onde ele está, consegue seduzi-lo e de-
pois droga-o e amarra-o em casa. É aqui que apare-
ce uma famosa passagem de Bolaño: “As mulheres
são putas assassinas, são macacos transidos de frio
que contemplam o horizonte numa árvore doente,
são princesas que te procuram na escuridão, cho-
rando, indagando as palavras que nunca te pode-
rão dizer” (p. 133). Esta história de “príncipes e prin-
cesas” dá o mote.
São estórias nas quais se vislumbra a vida errante
de Bolaño (vários contos têm exilados chilenos no
México, Espanha e França) e alguns dos seus tiques
narrativos, como os sonhos, ou a biografia dos auto-
res dos livros que as personagens lêem – por vezes,
basta a fotografia na badana. “Preocupo-me com ele
[o autor francês Henri Lefebvre] porque mais nin-
guém o faz”, diz B – assim se chama a personagem
do conto Vagabundo em França e na Bélgica, no
que parece uma óbvia referência ao próprio Bolaño,
tal como noutros contos aparece uma personagem
chamada Arturo Belano, que surge noutro livro do
autor, Os Detectives Selvagens. Como se lê na pág.
193, “a arte faz parte da história particular muito an-
tes de fazer parte da História da Arte”.
É também um mote para a sua habitual reflexão
sobre o papel dos escritores latino-americanos na
história do subcontinente no século XX. O conto
Dentista arranca com a petulância de um pintor
numa festa e termina numa zona de barracas, onde
um adolescente escreve contos. Um deles tinha
apenas quatro páginas, “mas quando o acabei tinha
a impressão de ter lido um romance”.
O desencanto, a melancolia, a fragilidade e a soli-
dão atravessam o livro. Bastam algumas frases. “Sen-
sação de velhice mais irreal que verdadeira” (p. 96);
“Ao chegar ao hotel vê-se ao espelho. Espera ver um
cão espancado, mas o que vê é um tipo de meia-ida-
de, mais para o magro, um pouco transpirado pelo
caminho, que procura, encontra e desvia o olhar
numa fracção de segundo” (103); “Olhavam a glória e
a felicidade, os desejos saciados e a vitória, essas coi-
sas que só existem no reino do futuro e que mais
vale não esperar pois nunca chegam” (123); “Tenho
uma boa notícia. Há vida depois da vida” (141); “A cer-
teza de que se vai morrer e morrer por nada, por coi-
sas estúpidas, e que a nossa vida, a vida que estás
PUTAS prestes a perder, é também uma sucessão de coisas
ASSASSINAS estúpidas, é nada. Até a certeza tem falta de dignida-
ROBERTO BOLAÑO
Quetzal • 248 págs.
de” (192); “De alguma maneira, ambos procurámos
€17,70 desinteressarmo-nos do lento naufrágio das nossas
vidas, do lento naufrágio da estética, da ética, do Mé-
xico e dos nossos sonhos de merda” (202). v

k O “populismo” está nas bocas do mun-
do, é a categoria política mais repetida e vili-
pendiada nas democracias ocidentais, res-
ponsabilizada por vários dos males que
nos assolam e até elevada a efeito principal
dos males que nos assolam. Muitos falam
do “populismo”, mas poucos falam com
acerto e rigor daquilo que o populismo
efectivamente é, ou pode ser.
Mudde é uma referência nas conversas
mais recentes sobre o populismo. Mas a
sua tese não lança a luz que esperaría-
mos. O livro começa com a definição pro-
posta de “populismo” e o resto é dedicado
à sua demonstração.
A definição é a seguinte: o “populismo” é
uma “ideologia de baixa densidade que
considera que a sociedade está, em última
instância, dividida em dois campos homo-
géneos e antagónicos – o “povo puro” ver-
sus a “elite corrompida” – e que defende
que a política deveria ser uma expressão
da volonté générale do povo”. Assim, os
três elementos essenciais do “populismo”
enquanto categoria e enquanto prática são
CRÍTICA
POPULISMO
– UMA BREVÍSSIMA
INTRODUÇÃO
POPULISMO? NÃO SEI O
QUE É, MAS NÃO GOSTO
MIGUEL MORGADO CRÍTICO
o povo, a elite e a vontade geral.
Uma das fraquezas do livro reside precisa-
mente no desenvolvimento teórico destes
três “conceitos nucleares”. A rapidez e superfi-
cialidade com que os três elementos são des-
pachados acaba por levantar suspeitas sobre
as classificações que se seguem (onde anda
o populismo nas várias regiões do mundo?,
quais são as suas causas?, quem são os po-
pulistas e quem não são? e por aí em diante).
Como se pode falar na divisão da socieda-
de em dois campos – o povo messiânico e as
elites corruptas – sem considerar o carácter
TTTSS
CAS MUDDE
E CRISTOBAL ROVIRA
KALTWASSER
Gradiva • 160 págs.
€12
problemático da noção de representação em
democracia, por exemplo? Ou invocar a von-
tade geral para designar o apelo populista,
quando a formalidade do conceito de vonta-
de geral parece contradizer directamente a
apetência “populista” pela informalidade, a de-
cisão flexível e o ódio a regras ou “quadros
constitucionais” internos ou externos?
Além disso, o livro dedica uma grande
proporção ao tratamento da figura do líder
populista, ao mesmo tempo que ignora
um dos temas mais relevantes na questão
do “populismo”: a sua linguagem e os re-
cursos discursivos.
É um livro excessivamente disperso quan-
do se requeria um esforço teórico maior; e
demasiado académico onde se desejaria
uma maior proximidade à práti-
ca do “populismo”. Tem a ate- LIVROS
nuante de ser apenas uma “bre-
víssima introdução”. v
21
PUB
 A FESTA
QUINTA NOVA
DA ASSUNÇÃO,
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• Dom., 11h30 e 16h

receita de • €8

sucesso
O grupo Byfurcação está
TEATRO & DANÇA a fazer quatro espectáculos
em simultâneo – e enche
todos. Paulo Cintrão, que o O PRINCIPEZINHO
dirige, explica porquê PARQUE DA
22 LIBERDADE, SINTRA
Até 29/9 • 6.ª., 21h30
TEXTO RITA BERTRAND • €15

meira cena comum, escolhe o caminho a seguir,

para descortinar a história original de Mário Abel,
através de enigmáticos corredores, quartos e salas.
De facto, cabem mais no Parque da Liberdade,
ara o grupo Byfurcação, sediado em Mem onde o teatro Byfurcação tem em cena o clássico

P Martins, Sintra, a crise no teatro nunca existiu,

como admitiu ao GPS Paulo Cintrão, funda-
dor e co-director (com a produtora, Sandra
Cruz): “Não nos podemos queixar, temos sempre
muito público, todo o ano, sobretudo nas nossas pe-
ças infantis. E mais ainda sobe no Verão, quando es-
treamos os espectáculos ao ar livre.” Em média, cer-
ca de 5.000 pessoas vão ver cada produção, mas
há variações, mais devido às dimensões dos espa-
ços do que à resposta do público.
Por exemplo, O Principezinho, que este Verão está
no Parque da Liberdade, já foi visto noutro cenário
mágico de Sintra, a Quinta da Regaleira, em 2011,
por 17.000 pessoas, enquanto Alice – O Outro Lado
da História, mesmo tendo estado “sempre esgota-
do”, segundo Cintrão, recebeu “apenas” 3.000 es-
pectadores no Pavilhão 30 do antigo Hospital Júlio
de Matos, em Lisboa. Por uma única razão: “Era
uma peça de teatro imersivo, com um percurso por
várias salas e a lotação não podia exceder as 40
pessoas.” Simplesmente, não caberiam. Tal como
não caberão às centenas – e por isso se recomenda
reserva antecipada – na casa da Quinta Nova da As-
sunção, onde se desenrola A Festa, um jogo teatral
imersivo, quase sem texto mas com muita tensão
psicológica, em que o público, a partir de uma pri-
A Casa de Bernarda Alba, de García Lorca, e uma
adaptação d’O Principezinho de Saint-Exupèry, ou
na Quinta da Regaleira, onde em breve estreará
uma adaptação de Tom Sawyer, e até no claustro
do Museu Nacional de História Natural, em Lisboa,
“FUGIR DOS onde o grupo instalou o seu João e o Pé de Feijão.
ESPAÇOS Afinal, têm o céu como limite e são verdejantes e
místicos, quase dispensando cenografia. O que se
CONVENCIO- poupa nisso, porém, vai para material técnico. “Te-
NAIS ESTÁ NA mos de montar muito equipamento. Não se vê,
GÉNESE DO mas há cabos por todo o lado”, diz o encenador,
garantindo que compensa: “Fugir dos espaços con-
GRUPO, DESDE vencionais está na génese do grupo, desde que co-
QUE COMEÇOU, meçou, há quase 20 anos, num clube recreativo da
HÁ QUASE linha de Sintra. O primeiro espectáculo já não foi
20 ANOS, em palco, mas com os actores espalhados pelo edi-
fício, a interagir, a ir ao encontro das pessoas.”
NUM CLUBE É o que o grupo faz até hoje – e talvez por isso
RECREATIVO”, seja tão popular, a ponto de Cintrão confessar que
LEMBRA já o têm “acusado de ser demasiado comercial”,
CINTRÃO mas a verdade é que há uma intenção didáctica de
mãos dadas com o sucesso: “Damos a conhecer
clássicos, alguns com fama de complicados, como
Shakespeare, de que fizemos Romeu e Julieta, por-
que as pessoas não os conhecem de facto, só têm
uma ideia vaga das histórias.” v
 FESTIVAL CRÍTICA

SEGUNDO A SALTO, CONTOS

A TOMADA ARTÍSTICA
DA CIDADE DE ELVAS
q RITA BERTRAND Imersão é a palavra
Fala-se muito de um de ordem do cartaz,
certo interior esqueci- que este ano é mais
do, de um Alentejo pro- ousado, por ter um es-
fundo onde nada se pectáculo íntimo de
passa, dos privilégios Mónica Calle – criado
da capital – e há quem para a casa-de-banho
não se conforme e crie dos homens do bar-dis-
projectos artísticos em coteca Lux, com uma
pequenas cidades, lon- actriz para cada espec-
ge do litoral. tador, em cada cubícu-
É o caso do Um Co- lo – mas não só: tam-
lectivo, liderado pela bém imersivo será À
actriz-encenadora Cá- Luz do Contrabando,
tia Terrinca, que há teatro de rua sobre ne- Quarto Escuro,
de Mónica
pouco mais de um ano gócios clandestinos de Calle, é uma
se mudou da Grande outros tempos, com re-
das propostas
do festival.
Lisboa para Elvas, onde curso a vídeo-mapping,
Estreou numa
de seguida montou pelo grupo de Loures casa-de-banho
um novo festival, de Artelier?, na Praça da do Lux, em
programação tímida República. Lisboa
mas expressiva de um Ao todo, são 22 pro-
certo gosto contempo- postas artiísticas, das
râneo, fora de lógicas quais se destacam,
comerciais e com liga- além das já citados,
ção forte à comunida- quatro escolhidas por
de – com o teatro a do- consulta à comunidade
minar, mas também elvense: Museu Imagi-
com atenção às artes nário, de Rita Sales, El-
plásticas, da pintura à vas Al Andar, do mexi-
fotografia. cano Fernando Aranda,
Chamou-se A Salto Deslocamentos – Vista
e fez sucesso no Ve- Sua Existência, da brasi-
rão passado, portanto leira Simone Donatelli;
teatro e vídeo-
volta de 28 a 30 de Ju- e CartografandOsol,
lho à cidade alenteja- de Filipa Pontes. Mais?
na, vizinha de Badajoz. É espreitar o cartaz. v
CARTAZ
6.ª, 28/7
19h,SociedadeInstrução
eRecreioLançamento da
Revista Flan A Salto • 22h,
PedrasdoCasteloPoesia
Clandestina • 24h,CAD “O
Elvas”Teatro: T0
SÁB., 29/7
7h-14,MercadoCasa das
BarcasInstalação: Como a
vida, o Tempo • 10h e23h
Performance: O Museu
Imaginário (Visita A) • 15h,
16h e17h,Cisterna Dança:
Raízes Húmidas da Fumaça
• 15h,Jardim Laranjeiras
Desenhos-performance:
CartografandOSol • 16h,
Cafetaria doMACE, Cinema
de animação: Constrói e
À Luz do Anima • 18h-21h,Casa da
Contrabando
Joana Teatro-instalação:
vai juntar
Um Quarto de Penélope •
-mapping 22h,Pç. República Teatro:
na Praça À Luz do Contrabando •
da República 21h30-1h,Casas-de-banho
doBarOCastelo,Torre
de Elvas
FernandinaeespaçoALMA
Teatro: Quarto Escuro (com
reserva) • 24h,Cisterna
Música: Sound Surfaces
DOM., 30/7
10h,PostodeTurismoO
Museu Imaginário • 11h
Teatro: As Palavras de Jó •
16h,EspaçoAlma Pintura:
Elvas Al Andar (conversa
com o artista) • 18h,Acade-
mia deMúsica deElvas
Performance: Vista Sua Exis-
tência • 19h,R.Franciscoda
SilvaArte urbana: O Diabo
Também Não ÉMau • 22h,
SededaBanda14deJanei-
roMúsica: Da Terra ao Palco
• Grátis
EM VIAGEM –
CABO VERDE
ESSA ÂNSIA
DE MAIS ALÉM
GISELA PISSARRA CRÍTICA
k O Cabo Verde da ari-
dez, do calor, da dança,
da música, do sustento
arrancado à terra, da con-
quista pelo mar e da
sôdade é cantado neste
espectáculo em
reposição pelos TEATRO & DANÇA
25 anos do
Teatro Meridio-
nal. Com dramaturgia de
23
Natália Luiza e encenação
de Miguel Seabra, é um
puzzle com pedaços de
boa literatura de mais um
dos territórios lusófono
que a companhia tem
abordado.
Este contar histórias,
que aposta sobretudo
no trabalho dos intérpre-
tes, com grande simplici-
dade de recursos, é bri-
lhantemente encarnado
pela força visceral da ac-
triz Carla Galvão – que
narra, representa, dança e
canta – e por Fernando
Mota, que produz o espa-
ço sonoro. A vida de
quem se reinventa por
conta das dificuldades
fica ali, em lugares tão
subtis como um instru-
mento de sopro feito de
uma vassoura e um tubo.
Tal como as gentes de
Cabo Verde, a viagem é
amorosa e aberta ao mun-
do – e a todos convoca pa-
ra uma roda de dança. v
TTTTS
TEATRO MERIDIONAL,
BECO DA MITRA, LISBOA
Até 30/7 • 4.ª a dom., 22h
• €10
 Um campo
depois
da colheita
para deleite
O título em cima é só parte
do nome original de uma das obras
fundamentais de Alberto Carneiro.
Descubra o que falta na exposição
que estará na Culturgest,
ARTES PLÁSTICAS no Porto, até Outubro
TEXTO ÁGATA XAVIER

24

A instalação
foi feita entre
1973 e 76
e integra
uma trilogia

or si só, o título já é uma obra de arte. Poéti- Nascido em São Mamede do Coronado, Santo Tir-

P co, longo, a lembrar um haiku japonês. Um

campo depois da colheita para deleite estéti-
co do nosso corpo, como é na totalidade,
reúne, na Culturgest do Porto, uma das três instala-
ções-chave na obra de Alberto Carneiro, escultor
português que faleceu em Abril passado, aos 79
anos. Realizada entre 1973 e 1976, é determinante na
carreira do artista, integrando uma trilogia da qual fa-
zem parte O Canavial: memória-metamorfose de um
corpo ausente, de 1968, e Uma floresta para os teus
sonhos, de 1970 (que actualmente podem ser vistas
na delegação da Culturgest em Lisboa, na exposição
Simultânea). “As três obras compõem situações telú-
ricas, nas quais a presença do campo, recriado no
espaço expositivo pela rigorosa e cuidadosa organi-
zação de elementos do ciclo da natureza, produz
para o espectador máquinas de viajar no tempo e
no espaço”, explica a organização.
A instalação – que não era vista desde 1991 por
depender de condições naturais muito específicas
– só foi possível graças à reserva de um campo de
centeio, em Outubro de 2016.
so, em 1937, Carneiro destacou-se pelo desejo de
aproximação à natureza. Depois de concluir o curso
de Escultura na Escola de Belas-Artes do Porto partiu
para Londres, onde estudou na Saint Martin’s School
of Art, ao abrigo de uma bolsa da Fundação Gul-
benkian. Foi lá que contactou com a arte conceptual,
com o minimalismo e com o surgimento da Land
UMCAMPO DEPOIS Art, acabando por desenvolver, no seguimento do
DA COLHEITA PARA estudo, a trilogia anteriormente referida.
DELEITEESTÉTICO
DO NOSSO CORPO A criação das Notas para um manifesto de uma
CULTURGEST arte ecológica, que publicou em 1971, consolidou a
Porto
Até 1/10 • 12h30-19h30
identidade estética de Alberto Carneiro: a fusão da
• Fecha 2.ª e 3.ª arte e do artista com a natureza. “Uma nuvem, uma
• Grátis árvore, uma flor, um punhado de terra, situam-se no
mesmo plano estético em que nos movemos, são
parte integrante do nosso mundo, são um manan-
cial de sensações vindas de todos os tempos, atra-
vés duma memória que tem a idade do homem”, vi-
ria a escrever. De destacar ainda que a obra que
agora pode ser vista na Culturgest – sob a curadoria
de Delfim Sardo – representou Portugal na Bienal de
São Paulo em 1977. v
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 Obey Giant,
que reproduz
um stencil
da cara
do wrestler
André the
ARTE URBANA Giant, é um CRÍTICA
COM 4 LETRINHAS dos traba-
lhos mais
conhecidos
FERNANDA
APENAS SE ESCREVE do artista FRAGATEIRO
– CHÃO COMUM
A PALAVRA OBEY ESCULTURA
Frank Shepard Fairey RECRIADA
nasceu em Charleston,
no Sul da Califórnia, em
1970, e é um dos maio-
res nomes da arte ur-
bana contemporânea.
Se nunca ouviu falar CARLOS VIDAL CRÍTICO
dele é porque o de-
signer do famoso pos- k Retrospectivemos, para
ter Hope, com o rosto chegar a esta intervenção:
de Barack Obama em há, na autora, intervenções
azul, vermelho e ama- públicas (por vezes discutí-
relo, assina com outro veis e de gosto peculiar, di-
nome, mais curto e im- vergindo do essencial da
perativo: sua obra, como as do Par-
ARTES PLÁSTICAS Obey. que das Nações); há uma
O artista infatigável busca de interac-
apresenta Obey está ções com a literatura onde,
Printed Matters – uma envolvido em A exposição de modo interessante, a pa-
26 várias causas encerra
mostra que inclui im- humanitárias durante o lavra (Blanchot ou Joyce)
pressões em papel, ma- mês de ganha forma visual ou es-
deira, metal e colagens Agosto cultórica (subtil); há uma
– na galeria Underdogs, sas na sociedade ac- soas dizem que o papel relação com a arquitectura,
em Marvila, Lisboa. Divi- tual. “Sou um produto vai acabar e ser substi- PRINTED buscando uma compreen-
dida em dois períodos da era da produção em tuído pelos meios digi- MATTERS são do lugar da escultura e
– LISBON
(um que encerra já a massa e do que a cultu- tais, mas eu digo que GAL. UNDERDOGS seu contexto; e, resumindo
29 de Julho e outro ra de massas criou”, ex- não se pode substituir Lisboa (aspecto fundamental), uma
que vai de 1 a 23 de Se- plica o artista no site da a experiência provoca- Até 29/7 e de 1 a 23/9 busca do feminino recalca-
• 14h-20h
tembro), a exposição galeria, garantindo que dora e táctil de uma im- • Fecha dom. e 2.ª do pelo modernismo (recu-
realça a importância da o papel está de boa pressão, na rua ou Grátis perando nomes como Lilly
comunicação de mas- saúde. “Algumas pes- numa galeria.” v AX Reich, que trabalhou com
Mies van der Rohe).
Retomando anterior termo
BIENAL de J. L. Brea, muito feliz, esta
intervenção no Montijo reve-
PAULA REGO HOMENAGEADA EM CERVEIRA la uma forte “beleza impla-
cável”, pois é de uma simpli-
Um ano depois de Os pintores Jaime Azi- The Barn, cidade desarmante: trata-se
de 1994,
atingir a maioridade, a nheira e Ernesto de pertence de refazer o chão de uma
Bienal Internacional de Sousa também serão à Colecção obra setecentista, “retoca-
Arte de Cerveira, na homenageados no Berardo da” por Pardal Monteiro nos
sua 19.ª edição, home- evento, que este ano é anos 40. A cota baixa e, jun-
nageia um dos maio- dedicado ao tema Da to ao altar, uma pequena
res nomes nacionais Pop Arte às Trans-Van- rampa deixa ver restos de
da pintura, Paula Rego. guardas – apropriações azulejos geométricos. A me-
A artista estará em da arte popular, reunin- mória liga a escultura à ar-
destaque com a exibi- do 600 obras, realiza- BIENAL DE quitectura. v
ção de 51 obras, desta- das por 500 participan- ARTE DE
cando-se The Barn, de tes de 35 países, expos- CERVEIRA TTTTS
VÁRIOS LOCAIS ERMIDA
1994, e Lenços dos tas não só em Cerveira, V. N. Cerveira, DE ST.ºANTÓNIO
Amores, de 1968 (de mas também aos con- Paredes de Coura, QUINTA DO PÁTIO D’ÁGUA,
realçar que Rego figu- celhos vinhos de Pare- Caminha, Vigo MONTIJO
e Ourense Permanente • 4.ª e 6.ª, 14h-17h30
rou na primeira edição des de Coura, Caminha, Até 16/9 (confirmar na Junta)
da Bienal, em 1978). Vigo e Ourense.. v AX Vários preços • Grátis
S
d SHOPPING
DC SHOES
Em azul claro e com
uma pala larga, estas
sandálias são uma
óptima solução para
Para quem quem quiser pisar a
gosta de areia com estilo.
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à praia e ir €25,90
adiando a
saída até
STYLE o Sol se pôr,
leve as refei-
ções para
o dia nesta
cesta da WOMEN’SECRET
Anita Picnic Este cesto de palha tem
(€98,50) uma alça entrançada colo-
rida e pompons. Além dis-
so, traz uma alça comprida
extra, para pôr ao ombro.
€20,99

Os acessórios que
são a sua praia SHOPPING

27
Ao trocar a cidade ou o campo por um bom areal
e um mergulho no mar, prepare-se com estilo
TEXTO INÊS MENDES OLIVEIRA ÉNFASIS
Com este apoio para a cabeça, tem aqui
uma opção alternativa para a almofada
em só nos biquínis e fatos-de-banho as ALÉM DOS

N
de praia.À venda no El Corte Inglés.
marcas portuguesas dão cartas. A pai- ACESSÓRIOS, €4,95
xão pela zona litoral faz com que muitos
empreendedores se virem para o mar NÃO SE
em busca de inspiração para novos projectos de ESQUEÇA HAVAIANAS
negócio – fazendo assim nascer novas marcas de DE LEVAR O De uma das mais
acessórios de praia. recentes colecções
Algumas – as de maior sucesso e originalidade –
PROTECTOR de Verão da marca,
estão nestas páginas, ao lado das internacionais SOLAR PARA A chegaram estes
clássicas, todas com acessórios – de chinelos e al- PRAIA E EVITAR chinelos de inspira-
mofadas a toalhas de praia – que, além de cumpri- EXPOR-SE NAS ção marinha, com
rem o seu objectivo, são divertidos e originais. Com riscas vermelhas
eles, preferindo a praia, o rio ou evitando a areia na
HORAS DE e brancas.
piscina, vá a banhos com estilo e qualidade. v MAIOR CALOR €25,90

PÉU VERTTY
Com pintas brancas Com um design único
em fundo vermelho, (e já premiado), esta
este (cha)péu é 100% CAIA toalha de praia, versão
algodão, com acaba- Modelo nacional de almofada im- trendy, da inovadora
mento em franjas. permeável, com vários padrões. Este marca portuguesa
Além de ser de uma é o Fiji, inspirado nas paradisíacas Vertty, está disponível
marca portuguesa. ilhas homónimas. em diversas cores.
€75 €24 €49,90
 h 5 COISAS PARA FAZER COSTA ALENTEJANA
EXPOSIÇÃO DE ESCULTURAS DE PAPEL
PORTEL • Capela de Santo António
• Até 30/7 • Entrada gratuita
João Charrua, autor da exposição, formou-se em
Arquitectura, mas continua a dedicar-se à sua
paixão: os trabalhos em origâmi. Agora cria os
seus próprios modelos e são esses que estão
em exposição em Portel até ao fim de Julho.
CASA VICENTINA
ALJEZUR • Monte Novo – Odeceixe
• €125/suíte júnior
Perto da praia de Odeceixe está a Casa Vicentina,
de José Almeida. A propriedade agrícola determi-
na que seja um agroturismo com 12 suítes. Tanto
as cores como os materiais usados na sua cons-
trução estão em harmonia com a região.

PASSEIOS DE BURRO
ALJEZUR
VALE DA AMOREIRA
• DE 3.ª A SÁBADO
• €35/1H30 COM GUIA

É no Sítio dos Burros que Elsa Ribeiro

e Sofia von Mentzingen conciliam as
suas duas paixões: os burros e a olaria.
A apenas 3 km de Aljezur pode cami-
nhar ao lado dos burricos – a que as
proprietárias chamam “burricadas”,
adaptando o seu ritmo ao do animal
para um passeio pedestre descontraí-
do. O único objectivo é desfrutar
da sua companhia e da paisa-
FÉRIAS gem alentejana circundante. Os
passeios podem ser combinados PASSEIOS DE BARCO FEIRA DO LIVRO E DO DISCO
28 VILA NOVA DE MIL FONTES • Cais da Fateixa SINES • Capela da Misericórdia • Até 29/7,
com outras actividades, como
• €20/adulto das 17h às 2h • Entrada gratuita
meditação, desenho e escrita criativa, Durante 2h a 2h30, deixe-se navegar pelo rio Mira, No âmbito do Festival de Músicas do Mundo,
aulas de ioga ou passeios mais ritma- conhecido como um dos mais limpos da Europa. esta capela recebe uma feira com livros
Com partida de Vila Nova de Mil Fontes, os pas- (raridades e promoções) da livraria A das Artes
dos com carroças. Nestes passeios, seios (12 km) são organizados pela DUCA, empre- e com discos de músicas do mundo, clássicos e
pode esquecer a ideia pré-concebida sa que organiza actividades na Costa Alentejana. contemporâneos da loja alternativa VGM Música.
de que os burros são animais teimo-
sos. Aqui vai descobrir o lado mais afá-
vel e pachorrento destes animais.

TEXTOS INÊS MENDES OLIVEIRA

h 5 COISAS PARA FAZER ALGARVE
QUINTA DOS PERFUMES
TAVIRA
CONCEIÇÃO DE TAVIRA
• €95/QUARTO DUPLO
A poucos quilómetros de Tavira, estende-se
um laranjal quase até ao areal da praia mais
próxima, onde se ergue um agroturismo: a
Quinta dos Perfumes, que assim foi baptizada
numa homenagem ao seu passado. É que an-
tes de ter sido adquirida e renovada por Pe-
dro Estrela, o proprietário, era uma fábrica de
extracção de essência de malva para fazer
perfumes. Da fábrica, apenas restam os por-
tões de correr. Lá dentro foram construídos
nove quartos. Os cinco do primeiro andar (um
deles com cama de dossel) partilham o piso
com o rooftop (na imagem), onde pode to-
mar um copo com vista para o mar. Os res-
tantes quartos ocupam o rés-do-chão. Além
das laranjas (que pode provar ao pequeno-al-
moço), a quinta tem uma série de outras plan-
tações: vinhas, medronhos, limões e uma hor-
ta biológica. Por entre as laranjeiras esconde-
-se uma piscina de água salgada, o mais
apetecível cartão-de-visita da propriedade.
XXIV FESTA DA RIA FORMOSA
FARO • Parque de S. Francisco • De 27/7 a 6/8
das 19h à 1h • Entrada livre
Organizada pela Vivmar – Associação dos Viveiris-
tas e Mariscadores da Ria Formosa, esta festa é
uma ode ao marisco da ria, um ecossistema rico
em fauna e flora. Além da gastronomia, a festa
faz-se também de muita animação, com espectá-
culos e exposições a ocupar o cartaz. Tem 11
dias para provar especialidades regionais, confec-
cionadas por quem sabe.
FÉRIAS
29
SALMORA – LIVE KITCHEN & BAR
VILAMOURA • R. do Clube Náutico, Edifício Vila
Lusa, Bloco 2B • 17h-1h • €20 (preço médio)
O nome denuncia o conceito: neste restaurante
pode assistir a tudo o que é preparado na cozi-
nha. Na esplanada, experimente alguns dos pra-
tos da nova carta, como o bife de atum à portu-
guesa, ou um dos 20 cocktails à disposição.
CINEMA AO AR LIVRE
ALMANCIL • Quinta do Lago
• 31/7 e 14/8, 19h • Grátis
As sessões de cinema ao ar livre voltam ao
campo de prática da Quinta do Lago, um
anfiteatro natural pronto a receber alguns
dos mais recentes filmes de animação. Se
tem crianças, no dia 31 não perca Cantar!,
de Garth Jennings.
EXPOSIÇÃO FREE FORMS
ALMANCIL • Hotel Conrad Algarve
• A partir de 27/7 • Entrada gratuita
A exposição deste Verão no Conrad
reúne trabalhos de dois conceituados
artistas britânicos: o pintor John Hoyland
e o escultor Jeff Lowe. Organizada em par-
ceria com a galeria ArtCatto, pode ver-se
até ao fim de Setembro.
 a PROVADOR
RESOLVA
ENIGMAS
AO JANTAR
Imagine: numa
experiência
de laboratório
falhada, ficou
contaminado
por um vírus
mortal e agora
tem de encontrar
o antídoto.
Como?
A resolver
quebra-cabeças,
no Escape
Dinner
PROVADOR
30
ESTA FOI UMA EXPERIÊNCIA de
vida ou de morte – assim que me
sentei no lugar que me estava des-
tinado, fui informada num tom ligei-
ro e pouco preocupado de que a
minha vida corria perigo: um vírus
mortífero tinha sido acidentalmente
libertado. “Como se sente?”, per-
guntou Joana, responsável por me
ter dado a terrível notícia: “Tem sin-
tomas?” Sem sair do fatídico res-
taurante Casa do Chef, na Avenida
de Berlim, e numa corrida contra o
tempo, tive de descobrir a cura.
O mote estava lançado: a produ-
tora Grand’ideia tinha planeado in-
fectar os quatro comensais à mesa,
no grupo que me calhou. Única
dica: tudo o que seria necessário
para chegar ao antídoto estaria em
cima da mesa, ou seja, não seria
necessário andar a deambular pelo
restaurante do chef Jorge Rodri-
gues, em busca da salvação, duran-
te este jantar especial (só há um
por mês), de nome Escape Dinner.
A acompanhar os cogumelos sal-
teados numa redução de vinho e
mel chegou também uma folha A4,
o nosso ponto de partida, e nada
mais. Depois de lidas as instruções,
encontrámos o primeiro enigma:
“O jogo começa aqui.” “Aqui? Onde
exactamente?”, perguntámos. A tal
Joana, que inicialmente nos tinha
dado a má notícia, revelou ser a
nossa agente secreta. No caso de o
enigma nos cortar o fluxo de ideias
e nos encostar à parede podemos
ESCAPEDINNER
PARCERIA GRAND’IDEIA
& A CASA DO CHEF
WWW.GRANDIDEIA.PT/
ESCAPE-DINNER
€35(COM JANTARE
BEBIDAÀDISCRIÇÃO)
ISTOCK
implorar-lhe por uma sugestão,
uma pista simples. Orgulhosamente
digo que eu e o meu grupo nos sa-
fámos bem e só precisámos dos
conhecimentos da Joana duas ou
três vezes. Porém, não se enganem:
não há nada fácil nos enigmas que
nos foram servidos. O objectivo era
descobrir seis ingredientes que, no
fim, seriam a chave para o antídoto.
Quando chegou à mesa o prato
principal, um risoto de cogumelos
(especialidade do chef), foi severa-
mente negligenciado – não pela fal-
ta de fome, mas sim pela ânsia de
nos salvarmos. Pela altura da so-
bremesa, estávamos a um ingre-
diente do fim. O antídoto foi final-
mente alcançado depois de umas
colheradas energizantes de mousse
de chocolate.
Na realidade, estávamos a um úl-
timo esforço da morte, que foi evita-
da graças à sincronização de todas
as mentes envolvidas. Dica: a reso-
lução dos enigmas vai exigir a cola-
boração de todos os sentidos (e de
um smartphone). O próximo jantar
será a 11 de Agosto.
TEXTO INÊS MENDES OLIVEIRA
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para o verão.

GRÁTIS
JJÁ NAS BANCAS

20 Jul 27 Jul 03 Ago 10 Ago 17 Ago

 
  

 

  


 





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