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AS FRONTEIRAS DA

MISSÃO URBANA

JOUGE SCHÜ'fZ DIAs*

No referenciais bem definidos - a igreja, o trabalho e a família -,


povoado
tendo seusrural,
passoso vigiados
homem norteava a suapelo
pelo pároco, vidapatrão,
a partir de côn-
pelo três
juge ou pelos pais. Esse modelo tende a implodir quando o homem migra
do pequeno povoado e chega ao grande centro urbano. Sua nova leitura
da vida passa a ser a partir da consciência de que na cidade se é livre.

A MAGIA DA CIDADE E A UTOPIA DA LIBERDADE


Libânio (2001, p. 54) aponta este momento dizendo: "Nas cidades
maiores a consciência societária ou da comunidade desloca-se para a
valorização do indivíduo ou de grupos espontâneos. [... ] o indivíduo
assume o centro das decisões".
A cidade oferece ao cidadão um espaço amplo entre sua base
residencial e seu trabalho. Entre seu trabalho e seu lugar sagrado ou de
culto. Entre seu lugar de culto e sua residência. Ele circula incógnito,
agora por um novo espaço denominado "espaço público", que ele com-
partilha com outros transeuntes, visitantes de lojas e shoppings, bordéis,
restaurantes e uma imensidade de portas abertas convidando-o para o
encontro com o novo.
O urbano passa a ser um mundo, um mundo próprio que, segundo
Libânio (1001, p. 36), reforça a lógica do indivíduo, da sensação e expe-
riência de liberdade.
Neste contexto, a expressão da fé comunitária perpassará pelo crivo
da individualidade, e a igreja urbana se ressentirá, em sua vivência, do
ônus dessa nova mentalidade do mundo urbano.

* Bacharel em Teologia e Pastor da Igreja Batista, mestre e doutorando pelo Programa de Pós-
Graduação em Ciências da Religião da Universidade Metodista de São Paulo.
E-mail: j.schutz@terra.com.br.
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.Iu('l!1imo C;Jsqucs (2001, p. 29-30) aprcscntrt SllilH l'ol'sidn:tçõcs Viv Grigg (1994, p. 31), fazendo referência a Thomas Wang, vale-
lICl'rcn tI:1 tcologia da acolhida e coloca como eixo dc SU:1 apreciacão o se da abordagem deste para se aproximar desta zona de complexidade n
('sv:lzinmento dos templos nas celebrações semanais, declarando: âmbito da missão, afirmando:

vemos rever nossas atitudes em relação à acolhida das pessoas na Igreja. [...] Falar em urbanização é falar em cidades seculares, grandes e poderosas: elas se
Por que uma parte tão grande da humanidade está longe de Cristo e, ainda estendem como gigantes, bigas de ferro, inimigas das igrejas. Hoje em dia, uma
mais, das comunidades cristãs? [...] É muito provável que nem dez por cento dos cidade sozinha pode ter entre 20 a 25 milhões de habitantes. Assim, como um gigan-
atólicos estão indo à missa nos finais de semana. te, ela berra às portas da igreja: "aqui estou eu, o que você está fazendo por mim?

A forma de pensar do homem (genérico) que vive a mentalidade Nas possíveis tentativas de responder o que a Igreja poderia oferecer
do urbano, de certa forma tomou a Igreja de surpresa. A dinâmica re- ao questionamento da cidade, estão alocadas aquelas que se voltam para
Jigiosa praticada até então no povoado, com a convocação dos fiéis para o atendimento aos pobres. Viv Grigg (1994, p. 33) enxerga a questão
n missa pelo alto-falante da torre da igreja, agora não existe mais. O da pobreza a partir dos movimentos migratórios do campo, rumo aos cen-
ronco dos motores, o vozerio humano, os aviões a jato cruzando o céu tros urbanos. Sua percepção, portanto, se desenha a partir das estatísti-
silenciaram a voz de convocação e de controle das consciências pelo cas que apontam uma horda migratória na ordem de um bilhão de pes-
pároco local.
soas, em trinta anos, deslocando-se das regiões rurais para os centros
O tempo, até então dedicado ao sagrado nos finais de semana, e o urbanos ao redor do mundo.
pr8zer em participar nas festas (quermesses) no pátio da igreja, agora são Segundo o autor, estes serão (ou são) os pobres que irão disputar
substituídos por espaços seculares, lojas, restaurantes finos, e o prazer ali- espaço para construir sua casa, fixar a família, buscar zonas de produção
mentado pelo religioso agora tem outras fontes "menos dignas". para trabalhar, conseguir sustento, e que terão contato com uma série
Neste contexto de reflexão acerca do papel e da presença da Igreja de oportunidades as quais não usufruirão, em razão de sua incapacidade
no espaço urbano, olhando o sistemático esvaziamento dos templos frente econômica e financeira. Para sobreviver ocuparão as terras do Estado, ou
~s perguntas do homem urbano, Gasques (2001, p. 10) cita um elenco invadirão prédios do patrimônio cultural, fábricas desativadas, lugares de
le fatores expostos no texto Evangelii Nuntiandi, do Concílio Vaticano II, trânsito, espaços públicos, transformando-os em espaços privados, onde
tios quais destacamos os seguintes: alocarão suas esposas, sua prole e seus animais de estimação.
Esta população urbana de pobres, que ocupa os espaços visíveis (fa-
Divisões entre os cristãos, escândalos entre as formas de fazer a pastoral, igreja velas, por exemplo) e habita nas periferias ou se instala sob pontilhões
que vive pedindo esmolas para se manter, a indiferença religiosa, a perda do e viadutos, é de moradores da cidade, mas que são privados da cidada-
sentido da transcendência, uma missa mal preparada com precária participação nia. Por outro lado, a Igreja urbana, ao abrir os seus ouvidos à cidade,
dos fiéis e uma liturgia distante do povo, uma celebração sem acolhida, uma ouvirá somente os cidadãos, porque deles é constituída oficialmente.
igreja fria, onde cada um fica na sua, os extravios do campo ético, as graves A missão na fronteira urbana, segundo Grigg, há de se focar nos pobres,
injustiças e formas de marginalização social. de acordo com a sua perspectiva de percepção e identificação do "pobre-
urbano". O autor apresenta um quadro de indicadores para o ingresso da
Na percepção de Gasques, comentando o tópico da celebração sem Igrej a nesta fronteira, os quais apresentamos em forma simplifica da:
:1colhida, ele delimita a acolhida em cinco etapas: receber bem, acom-
panhar a vida das pessoas, ouvir as pessoas, aconselhar o fiel e ser agen- (1) Estabelecer atividades nas igrejas entre os pobres, que sejam verdadeiras
te de perdão.
igrejas dos pobres, voltadas para o atendimento de suas necessidades, que
A relação de fronteira entre a Igreja e a cidade é marcada por uma expressam a liderança e a forma de cultuar desse povo.
mplexidade tal que se pode admitir que esta ainda é uma zona de (2) Estabelecer movimentos de discipulado entre a elite culta e os não pobres,
pesquisa a ser desvendada.
que possuam uma determinada teologia bíblica de justiça, economia e sociedade.
Ilb IIINI r~AI~IO PAI~A UMA PAS'IOr~AL UIWANA: AÇÃO DO POVO 1)1 11111:1111\ ( 11)J\l) AS FRONTEIRAS DA MISSÃO URBANA 11/

(3) Es(orçar-se na mobilização da igreja dos ricos para que abram suas portas aos Destarte a Igreja urbana precisa, para se ver no aqui-e-agora, c
pobres l...] para reencontrar sua relevância e seu sentido, compreender o significado
(4) Desenvolver uma teologia holística, voltada ao reino, com uma ênfase bas- do termo grego paroikia e sua aplicação dinâmica no exercício da missãv,
tante forte na cristologia [... ], na encarnação de Cristo (Grigg, 1994, p. 49). particularmente no que se refere à missão em centros urbanos. Segundo
Duisek (1996), paroikia, em termos, significa peregrinação, ir em deman-
A I GHEJA EM MISSÃO DIANTE DO FENÔMENO da à casa. Párakaios significa peregrino e parraoikeo é a expressão verbal
IJB,BANO do conceito com sentido de peregrinar, caminhar direção à casa. O
A Igreja, no contexto do fenômeno urbano, se vê em cheque frente termo paroikia aplicado à Igreja indica uma Igreja em movimento. Ele é
:)os questionamentos que dizem respeito à sua relevância em atender ao usado para descrever a própria natureza da Igreja enquanto peregrina na
ser humano que ocupa espaço entre pontes, vias, prédios de alto padrão terra. Denota um estado de peregrinação como povo de Deus em missã
e favelas. As tradições protestantes que têm na Bíblia seu referencia1 no mundo. E, neste sentido, assim como o centro urbano em si é um
ri acionista encontram na narrativa da criação o ser humano feito do pó fenômeno, será, simultaneamente, a Igreja um fenômeno inserido em
da terra e colocado no jardim criado pelo próprio Deus, com oportuni- outro fenômeno.
dade para viver todas as benesses. No fenômeno urbano, o homem pro- A cidade, do ponto de vista arquitetônico e geográfico, é um ema-
ria vertiginosamente, infla a densidade popu1aciona1 de pequenos es- ranhado de vias que cortam seu interior em conexões com outros cen-
paços, cria seu hábitat e se esforça para gerar o seu conforto. As benesses tros. É representada pelo tecido entrelaçado por vários fios ou pela teia
não vêm do alto, elas são construídas pelo próprio ser humano. de uma aranha, que do centro abre caminho para todas as direções da
Na obra O esPírito e a missão da Igreja, publica da pelas Pontifícias periferia. A cidade é, segundo Libânio (2001, p. 27), símbolo máximo da
bras Missionárias, analisando a relação missão e antropologia, declaram criatividade do homem. Nascidas há mais de quatro mil anos, as cidades
s autores que a cultura é inerente ao homem e mulher criados por Deus: vêm procurando burlar a natureza, as forças dos ventos, a resistência do
solo, as modulações do relevo e oferecendo ao homem um espaço em
Um ser que produz faz cultura. Cultura não é só o que se lê, mas tudo que que ele manifeste seu caráter essencialmente associativo, seja para o
nasce da criatividade do homem/mulher, numa determinada sociedade em bem, seja para o mal. Na cidade, o homem rural deixa o Deus rural para
tempo específico. É necessário distinguir entre natureza e cultura. Um rio é trás e enxerga a nova face de Deus, o Deus urbano. Na primeira pers··
natureza. Uma ponte é cultura, produto do lazer. A cultura é produto de todo pectiva, a beleza de Deus encontrava-se na natureza. Na segunda, a
um grupo. Por isso caracteriza o ser social. O homem é um ser que trabalha: beleza encontra-se no próprio ser humano.
descobriu o fogo, a fonte de energia; a máquina que mudou a estrutura e a Orlando Costas, reconhecendo a ausência da Igreja junto às massas
eficácia da produção e das relações próprias que o trabalho estabelece. [... ] O populares e apercebido de que o discurso em torno da Boa Nova não ser-
homem trabalha em três dimensões: cósmica - mundo; antropológica - ho- via mais de eixo à Igreja em missão, aponta para o fato de que a Igreja
mem; e religiosa - Deus (POM, 2002, p. 35). deveria buscar novos rumos metodológicos para o cumprimento de sua
missão no contexto urbano. Os apontamentos de Costas, datados da
Nesta perspectiva, o homem culto que trabalha dimensões diferen- década de 1970 - à sombra do Concílio Vaticano II e antecipando por
tes, simultaneamente, cria a cultura, cria a cidade (Comblin, 1996, p. 43) três décadas as considerações de Brighenti (2000) -, assumem caracte-
c nela insere a Igreja. O urbano é ao mesmo tempo estático, porque rística de profetismo a partir de um latino-americano que enxerga simul-
finca alicerces num espaço, e é móvel, na medida em que o homem taneamente a Igreja e a missão, indicando caminhos para uma ação
dentro do espaço se recria. Comblin assim analisa as diferentes dimensões apropriada ao contexto de seu continente. Assim, afirma Costas (1971,
da cidade. Entre elas destaque-se aquela que a vê como centro de re- p. 106):
lações humanas, dentro de uma concepção em que ela não se reduz a
monumentos e conjuntos de coisas. É a cidade no sentido da pó1is grega La misión cristiana en el siglo XX exige de Iglesia fidelidad a Ia proclamación
e da comunidade cristã, construída sobre a tríade liberdade, igualdade del evangelio, uma reoganización de sus relaciones com Dios, consigo misma y
e fraternidade.
1111 IIINIIlÁlllO I'AIV\ UMA I'MIOllAI UlmANA: N"AO 1)0 I'OVlll 11 11111'11'IA UDl\rll AS FRONll:lllAS DA MISSÃO URBANA 111)

ron el mundo y un cambio de estrategia. La eSlr"l~'HIII q\I\' III ('ldll1ra Encaminham-se as considerações finais iniciando-se por Miguf'
pOSl.CriSli,marequicre de Ia Iglesia involucra Ia penetración dei <':v:1I1J(c110
en coda Bonino 92003, p. 120) sobre a relação conflituosa entre evangelizaçã
cst rUClUra (geográfica y social) del mundo secular, Ia movilización de cada uno Igreja no decurso do século XIX. O pietismo forjou o ardor missionári
de sus miembros y Ia renovación de su metodología evangelística. La renovación e, a partir dele, conforme o olhar de Bonino sobre a missão, a Igreja ca-
de Ia metodología misionera de Ia Iglesia es necesaria no solamente porque ésta minhou, ora perto, ora distante dela. A Conferência de Edimburg
ha perdido su ponto de contacto (Ia cultura cristiana) con Ias mas as (especial- (1910) pretendeu estreitar a relação entre Igreja e missão, até então dis-
mente Ias del occidente), sino también porque ha descartado Ia metodología de tanciadas naquele momento. Num segundo momento, o movimento
Ia Iglesia primitiva. [...] Esta tiene tres aspectos, caracterizados por ttres palabras evangelical se expressou em Lausanne e indicou uma formulação de
griegas neotestamentarias: koinonia, diaconia e kerigma. missiologia em que a missão se dá através da Igreja que anuncia o reino
(Bonino, 2003, p. 121). Num terceiro momento, especificamente no
lovis de Castro dá movimento ao ideal exposto por Costas. Se este contexto da América latina, onde o monopólio triunfalista das Igrejas
dl:st8ca a necessidade de urgente revisão da Igreja, Clovis aponta onde que apresentavam] esus Cristo como seu monopólio passou a ser ques-
:1 4uestão precisa ser focada, indicando que a Igreja assumiu uma tionado com a proposta de uma nova hermenêutica do Cristo neste pon-
'oJ1ceituação de pastoral sensivelmente clerical, confundindo a termi- to de vista, ele reina como Senhor, mas é identificado como Cristo Ser-
nologia com a mera ação do pastor ou da pastora, e não como missão da vo, que serve aos pobres.
própria Igreja. A confusão semântica entre ministério e pastoral denota A partir desta hermenêutica, Bonino expõe que a missão, em sua
um empobrecimento de conteúdo missionário e uma fuga da Igreja do totalidade, não significa tão-somente a restrição a uma tarefa evan-
·olidiano. Escreve o autor: gelizadora pela apresentação de um plano de salvação ao homem, enca-
minhando-o ao estado de conversão. Mas a missão tem sua fundamen-
Pastoral [... ] entendida com ação do povo de Deus na realidade cotidiana, tação teológica na Trindade e a realização dela é notadamente ampla,
partindo das necessidades concretas onde o ser humano se encontra. A preocu- como se expressa o autor:
pação básica da pastoral é a eficácia e a relevância da fé cristã.
Há distinções precisas e necessárias na forma em que a unidade inseparável da
Pastoral é também responsável pela inserção do povo de Deus no espaço público. obra do Deus trino e de nossa participação nela na tarefa cultural, social, polí-
Pastoral é ação intencional, sistemática, organizada coletivamente. É fruto do tica, eclesial e evangelizadora é, ao mesmo tempo, reconhecida e respeitada e
esforço missionário da Igreja que busca mudanças, vislumbrando novos tempos a particularidade de cada uma dessas tarefas é igualmente levada em conta. [...]
na perspectiva do reino messiânico de Deus (Castro, 2000, p. 105). Uma teologia e uma ética teológica cuidadosa, assim como uma pastoral que
respeite a liberdade cristã, devem trabalhar dando atenção a estes temas
Nesta mesma perspectiva, Geoval da Silva (2003, p. 45), esclarecen- (Bonino, 2003, p. 121).
10 que o espetáculo urbano não é sempre lúdico, pois neste teatro figu-
rDm os pobres, os excluídos, os contaminados com o vírus HIV e toda BASES PAHA UMA PHÁTICA PASTOHAL EM SÃO
outra sorte de expressão do mal. Entretanto, é mesmo por esta razão que PAULO
1I el a boração de pastorais no eixo da missão fará sentido e transformará A contribuição de Bonino (2003, p. 126) aponta que a pastoral da
o urbano, tornando-o mais humano, como afirma o autor: Igreja latino-americana fica mais adequada na medida em que ela se
elabora a partir da percepção do Deus Triúno, do Cristo Servo e de um
A pastoral urbana não pode separar-se do símbolo da esperança. Não é estática, diálogo com o meio social, político e econômico, ou seja, com o contexto
por isso é marcada pela dinâmica que se desprende da prática da Igreja que é de inserção da Igreja.
motivada pelo Espírito Santo a criar sinais do Reino de Deus e a mostrar e viver Nesta perspectiva da pastoral urbana, tendo como foco a cidade de
a justiça divina através de palavras e atos (... ). Nesta direção o que torna as São Paulo, entende-se que Bonino (2003), Floristán (2002) e Bosch
cidades sagradas é a própria atividade humana, pois o templo de Deus são seres (2002) se reúnem a Castro (2000), Geoval (2003) e Comblin (1996) para
humanos renovados pelo Espírito santo. indicar que é urgente que a Igreja, assessorada pelos documentos da
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ItislClrin e pelos elementos reunidos por Aldafz.) SposlIti (2000), de uma pesquisa histórica sobre a formação daquela população e os fatores
i"l'dl'scubra no bom exemplo de Wesley, como diz Bonino, a preocupação que lhe deram origem, bem como os fatos que alteram a história da popu-
com n pobreza. Isso implica a compreensão de suas causas econômicas, lação. Vencidas estas etapas, procede-se ao levantamento étnico e so-
n oposição à escravidão e a crítica a expressões de colonialismo brutal. ciológico, incluindo elementos religiosos nesta pesquisa, visando à formu-
A cidade de São Paulo oferece campo para esta retomada de uma lação de uma linguagem adequada para aproximação da massa popu-
visf10 pastoral de uma Igreja transformadora, com ações elaboradas a par- lacional. E, finalmente, dialoga-se com os mecanismos públicos e privados
lil' dos pobres, uma vez que há indicadores, sempre renovados na mídia disponíveis, visando a um entrelaçamento de ações que venha a elevar a
n cnda dia, que sustentam a declaração de que São Paulo, como cidade qualidade de vida da população, promovendo a transformação do homem
de homens, piorou em muitos aspectos. É o que indica o texto compa- em ser humano, de excluído em cidadão, de religioso em piedoso, de in-
rn Iivo entre o Rio de Janeiro e São Paulo, publicado pela Folha de S. digente em gente, de perdido em salvo.
Paulo (Qualidade, 2003): 2. A elaboração de uma prática pastoral urbana há de considerar a
história da comunidade denominada igreja, conforme suas vivências e
Os dados do PNDU (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento) conformação social e religiosa, a fim de construir modelos de ação ade-
confirmam que os cariocas já dizem há muito tempo: a qualidade de vida no quados ao seu contexto. O ponto de partida deste procedimento implica
município do Rio de Janeiro é melhor que em São Paulo, De acordo com o lançar o olhar sobre o modelo de liturgia adotado pela comunidade
ranking do PNDU, o Rio é hoje a 62ª cidade brasileira em qualidade de vida, religiosa e quais são os elementos que ela utiliza como sinais e símbolos
e São Paulo 66ª. Em 1991, o Rio era a 24ª e São Paulo, a 15ª. Isso quer dizer religiosos, como orações e cânticos, gestos e eventos. Desta forma, pro-
que no ranking de todos os municípios brasileiros, Rio e São Paulo perderam cure-se discernir se estes são meramente reprodução de sua doutrina e
posições.Um ranking incluindo as 13 cidades com mais de um milhão de habi- história, ou se servem de ponte entre a igreja e a massa populacional
tantes mostra progressos do Rio [Estado], que subiu do quinto para o quarto que se situa no seu contexto. Neste aspecto Viv Grigg, autor de Servo
lugar. São Paulo caiu da segunda para a quinta. O economista Márcio entre os pobres (s. d., p. 172) dá seu depoimento:
Pochmann, secretário do Trabalho do município, em entrevista à Folha, sugere
três causas para o aumento da miséria e da pobreza, nascidas do processo de [.u] isto leva ao terceiro nível de justiça nas favelas. Estabelecermovimentos de
globalização que afetou as cidades industrializadas, a saber: (1) em 1991, de crentes que: demonstrem entre si justiça em seus estilosde vida; comecem a fazer
cada R$ 10,00 arrecadados na cidade, R$ 2,00 ficavam nela. Dez anos depois, justiça na vida e na liderança da comunidade em sua volta. Novamente, isto
para o mesmo valor coletado, só R$ 0,95 permaneceram em São Paulo. O res- começou com pequenas coisas, tais como aquela noite quando Deus me encheu
tante foi para o governo federal. (2) O orçamento paulistano, de R$ 17 bilhões de um desejode orar a respeito do lixo. [u.] O lixo é um problema pequeno, mas
em 1992, caiu para R$ 11 bilhões em 2003. (3) a carga tributária na cidade, que é o envolvimento com Deus em pequenos problemas que afeta a comunidade.
correspondia a 26,8 % de toda a riqueza produzida em 1991, subiu para 52,2 %
em 2001. Os culpados: tributos e taxas federais, como CPMF e Cofins. A vulnerabilidade a que está exposta a massa humana residente no
contexto da igreja, particularmente a situada na periferia dos centros ur-
A aproximação a estes dados aponta subsídios importantes para que banos, uma vez identificadas suas causas por esta, precisa ser tratada
n Igreja inserida numa cidade como São Paulo reformule sua proposta como caminho de acesso às pessoas e ser traduzida em um projeto espe-
ue pastoral, visto que os dados do poder público indicam para um pro- cífico de atendimento, dentro da proposta ampla do Evangelho que é de
esso de pauperização da população urbana, com crescente índice de trazer a salvação de Deus ao homem, exatamente onde ele se encontra.
violência e comprometimento no processo de formação cultural e edu- 3. A composição de uma proposta de prática pastoral urbana há de
acional, principalmente das crianças. A partir deste ponto, delineamos levar em conta que a desigualdade e vulnerabilidade que ocorre nas
R proposta em quatro tópicos. zonas de fronteiras da cidade é resultante da intervenção dos modelos
1. A prática pastoral urbana da igreja há de ser elaborada a partir de políticos implantados pelos órgãos públicos. O movimento de desenvol-
um reconhecimento da comunidade residente em torno do local físico vimento urbano ocorre no sentido do centro para a periferia. Esta di-
'!TI que instala seu patrimônio. Este reconhecimento ampliarNse-á a partir nâmica é comum mesmo nas cidades consideradas megacentros urba-
1~)I IIINIIV\llIO PAllA UMA IWJIOllAI. urmANA: AÇ1\O 1.)0 POVO III 11111'1 111\ I 1I IAI >I AS FRONlllIlAS lJA MISSÃO URI3i\NA 1)1:1

I\OS, onde se multiplicam menores núcleos de centro nos disl ritos e se da comunhão fraterna de nossas comunidades, que se alimentam da Pal~vr:\
irr:ldi:1m as forças de expansão populacional rumo às zonas periféricas. da liturgia, e daí para o diálogo, serviço e anúncio.
Este movimento migratório conta com a força da intervenção do poder
p(1 hJico, quer organizando bairros dormitórios e deslocando massas para 4. A prática pastoral a ser desenvolvida em São Paulo, especialmen-
l'omplexos habitacionais, quer pelas melhorias executadas a partir do te, precisará ser constituída de tal forma pelas igrej as ali localizadas
'i.'ntro. Ou seja, na medida em que políticas de segurança urbana, que, a partir deste ponto, tais práticas pastorais possam ser objeto de
in(rn-estrutura, como água, energia, linhas telefônicas e outras, vão diálogo com outras igrejas e práticas pastorais desenvolvidas em outras
sendo implantadas no centro, ali se aglutinam serviços e oportunida- zonas, visando-se estabelecer um roteiro que seja comum e uma ação
d<.:s,fazendo com que o custo de vida seja correspondente à qualidade conjunta e frutífera em pontos que sejam convergentes, resguardando as
lue os órgãos públicos oferecem. O censo do IBGE de 1991 identifica, especificidades de cada contexto. Pretende-se, por conseguinte, reconhe-
por exemplo, que o bairro de Perdizes, na capital de São Paulo, contava cer que há práticas pastorais urbanas que podem ser consolidadas e
;0/11 33.053 domicílios, e a Penha, na zona leste, com 36.896. Em Per- úteis a diferentes igrejas, que se situam em zonas de fronteiras dos cen-
dizcs, em torno de 25% dos chefes de família ganham mais de vinte tros urbanos, uma vez que a dinâmica de vida das cidades se igualam,
s:\Iários-mínimos, e isto representa, em se tratando da cidade como um razão por que se torna compatível o intercâmbio de vivências e métodos
t mio, o equivalente a 7% da população paulistana. Soma-se a este dado pastorais fronteiriços. Sendo semelhantes, as ações pastorais urbanas
() fa to de que 98 % dos domicílios em Perdizes são alcançados pela poderão ser elaboradas, tanto no macro-espaço, bem como no micro,
'o1cta regular de lixo. Havendo maior riqueza, há melhores serviços orientadas por princípios e valores capazes de serem multiplicados em
pÚblicos. O inverso é verdadeiro. Havendo pobreza, o serviço público diferentes fraldas urbanas, havendo em diversos setores urbanos fenôme-
se :1presenta esporádico. nos comuns. As abordagens destes fenômenos poderão ser orientadas por
Há outro movimento migratório independente que se dá a partir de meios comuns. Maria Clara Lucchetti Bingemer (2003, p. 106) aponta,
iniciativas de uma camada da população que, a partir de seus recursos, dentro deste viés, em seu artigo "Sacramentalidade, desafios e perspec-
husca refúgio em áreas da periferia urbana, onde possa construir para si tivas da missão evangelizadora", algumas pistas comuns para a igrej a
/11clhor qualidade de vida. Tais movimentos são forças vivas na cidade urbana, a saber: (1) praticar liturgias menos convencionais e menos
que não dependem de intervenções de órgãos públicos ou de políticas institucionaisj (2) proporcionar uma espiritualidade que preencha o vazio
hnbitacionais, mas são voluntários. do homem urbano, carente de pertençaj (3) realizar celebrações que per-
Estes dados apontam à Igreja que a sua pastoral há de contemplar mitam a participação do povo; (4) abrir espaços no meio eclesiástico ur-
;ste processo de desigualdade, pois, uma vez que ela se instale nas zonas bano para vivência de experiências de fé, esperança e caridade na co-
de fronteira da cidade, ela será ao mesmo tempo vítima vulnerável e munidade, em aspectos práticos; (5) inaugurar projetos de missão que
vocacionada, nesta vulnerabilidade, a desenvolver o reino de Deus entre sejam coerentes com a construção do reino de Deus, a partir do cristo
os pobres, por meio de ações pastorais bem adequadas às realidades es- encarnado.
pecificas, porque vivencia o mesmo processo que a massa populacional. As práticas pastorais urbanas, desenvolvidas pelas igrejas batistas da
padre Jerônimo Gasques (2001, p. 65) indica que esta pastoral poderá zona leste de São Paulo, encontrarão adequação contextual e melhor ex-
receber o nome de pastoral da acolhida. pressão de sua fenomenologia doutrinal, histórica, teológica e mis-
sionária a partir da consideração de quatro eixos, a saber:
Essa proposta [pastoral da acolhida] deverá suscitar novo e maior ardor na 1) Imersão histórica e social no contexto em que se inserem, a par-
evangelização, que supõe uma avaliação da prática pastoral a verificação se a tir de pesquisas sociais, econômicas, éticas e religiosas.
palavra do Evangelhoestá chegando a todos os ambientes e grupos humanos, nos 2) Eleição dos pobres como princípio de hermenêutica de sua prá-
seguintes termos: (1) através do testemunho do serviço e do empenho na tica pastoral, a partir do Cristo Encarnado e missionário aos pobres.
humanização da sociedade; (2) através do diálogocom todos, em particular com 3) Entender-se vulnerável, assim como todo o segmento social em
as diversas culturas e religiões diferentes da nossa; (3) através do anúncio mis- seu contexto, e, nesta vulnerabilidade, ser agente de transformação do
sionário do Evangelho aos que estão à procura das razõesda nossa fé; (4) através homem e do meio.
, 211 ITINI~I~AI~IOPMA UMA Pi\STOIV\L UIWi\Ni\: ACÀ I'OV() 1)1 11111'1111\ ( 11)1\1)\

4) Dialogar com outras comunidades em situações hom61l)g:1S localiza-


das em outras zonas de fronteira e promover a transformação a partir de seus
modelos e mecanismos institucionais, adaptando sua linguagem e liturgia.
Nesta perspectiva, Geoval Jacinto da Silva (2003, p. 42, 45) indica
que a ação pastoral da Igreja há de se desenvolver no cotidiano, no
espaço onde os desafios de um mundo globalizado exigem do ser humano
contemporâneo respostas e ações que expressem segurança e esperança. E
também afirma que a pastoral urbana não pode separar-se do símbolo da
esperança, da igreja em sua ação, que, motivada pelo Espírito, há de
mostrar e viver a justiça, criando os sinais do reino de Deus na cidade.

REFERÊNCIAS
BINGEMER Maria Clara Lucchetti. Sacramentalidade: desafios e perspectivas da missão
evangelizadora. In SILVA, Josafá Menezes; MACHADO, Genival Fernandes (orgs.). Cidade, Igreja
e missão. São Paulo: Paulinas, 2003.

BONINO, José Miguez. Rosto do protestantismo latino-Americano. São Leopoldo: Sinodal, 2003.
BOSCH, David. Missão transformadora: mudanças de IJaradigmas na teologia da missão. São
Leopoldo: Sinodal, 2002.

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