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BRIZOLA
E O RIO DE JANEIRO
Copyright © Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro - ALERJ
C JP-Brasi l. Catalogação-oa-fonte
Sindicato Nacional dos Editores de Livros, RJ.
B862
BRIZOlA
E O RIO DE JANEIRO
Marieta de Moraes Ferreira
organizadora
Mesa Diretora
JORGE PICCIANI
Presidente
CORONEL JAIRO
10 Vice- Presidente
GRAÇA MATOS
10 Secretário
RENATA DO POSTO
P Suplente
Apresentação pág. 7
Introdução pág. 13
Memórias do brizolismo
Depoimentos colhidos por Mônica Rodrigues pág.202
BRIZOLA ERA, como ele bem se definia, uma planta do deserto. Dizia
que bastava uma gota de orvalho para mantê-lo vivo. Quem, como eu, teve a
honra de conviver com esse líder extraordinário) aprendeu que a paixão pelo
Brasil era a seiva que o alimentava. Brizola falava do futuro como se menino
fosse. Pouco antes de morrer) estava em plena ativa, fazia planos sem cogitar
que a morte estivesse, como ele dizia para tudo o que estava próximo, ('coste-
ando o alambrado". Sua partida foi tão surpreendente como lhe foi a vida, e o
Brasil e a política ficam menores sem ele.
A Assembléia Legislativa do Rio é, como dizemos, o lugar da memória
do parlamento brasileiro, graças a iniciativas que recuperam a história polí-
tica do nosso povo. Na Alerj, fizemos exposições, sessões de homenagens a
Brizola e agora este livro. E foi aqui, quando esta casa não sonhava nascer,
quando o Rio era a capital da República e aqui funcionava a Câmara dos
Deputados, que Brizola teve um de seus momentos políticos mais brilhantes,
como deputado federal mais votado do país.
Fui militante do PDT, liderei sua bancada nesta Assembléia Legislativa
e fui seu representante numa época em que o brizolismo estava em plena as-
censão. Reconheço que, naquela época, o nível do debate político era outro,
havia uma efervescência muito grande que empolgava tanto a nós quanto ao
povo, que participava mais. Brizola, pela sua força indiscutível, pela bravura
reconhecida por aliados e adversários, coerência e fervor na defesa das gran-
des causas nacionalistas e trabalhistas, nos liderava. Quem lhe fazia oposição
tinha que ao mesmo tempo respeitar a sua biografia limpa.
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8 A força do povo: Brizola e o Rio de Janeiro
Poucos políticos, nas seis últimas décadas, exerceram papel tão destaca-
do na vida pública brasileira quanto ele. Conseguiu ser uma referência para
muitos que passaram por ele. Sem nenhum exagero, eu me animo a afirmar
que Brizola, desde o retorno do exílio, além de promover o resgate de impor-
tantes ícones do trabalhismo, cassados e com os direitos políticos suspensos,
como ele, soube criar, pela via democrática seguida pelo PDT, uma escola de
formação de importantes lideranças que estão aí até hoje.
Relembrar a história de vida de Leonel Brizola na Alerj é fazer com que
as pessoas comuns, o povo, os estudantes, com quem Brizola gostava de se
relacionar, não se esqueçam da sua memória. Essa é a nossa missão) como
membros do parlamento e como amantes da boa política.
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16 A força do povo: Brizola e o Rio de Janeiro
3 As principais fontes deste resumo são os verbetes 'Brizola, Leonel' e 'Goulart, João' em DHBB.
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Do Rio Grande do Sul à Guanabara 17
estadual. Nessa opção estava implícita a luta contra o capital estrangeiro. Fiel a
essa orientação, em maio de 1959 encampou a Companhia de Energia Elétrica
Rio-Grandense, filial da Arnerican and Foreign Power Company (Arnforp), tor-
nando-se a partir de então uma expressiva liderança da esquerda nacionalista
brasileira. Em contrapartida, a medida gerou uma grave crise nas relações entre
o Brasil e os Estados Unidos, que explodiria mais tarde, com toda a intensida-
de, no governo de João Goulart.
Como governador, Brizola ampliou sua capacidade de ação, seja desen-
volvendo programas de dinamização para a economia gaúcha, seja criando
projetos de políticas públicas voltadas para as camadas populares, ou ainda
engajando-se em lutas de dimensões nacionais. Já na sucessão presidencial
de 1960, discordando do PSD e de setores do PTB que estavam lançando a
candidatura do general Henrique Lott, começou a planejar, em conjunto com
lideranças sindicais, a organização de uma série de greves a serem deflagra-
das para pressionar o lançamento de um candidato popular e nacionalista.
O projeto não foi adiante, e João Goulart acabou por apoiar o nome de Lott
e por aceitar disputar a seu lado a vice-presidência. O resultado da eleição é
conhecido: como não havia vinculação obrigatória, o petebista Goulart tor-
nou-se o vice-presidente de Jânio Quadros, eleito com o apoio da UDN.
Com suas iniciativas, Brizola passou a ocupar paulatinamente espaços
de destaque no PTB e na cena política nacional, posicionando-se como um
li,1
interlocutor reconhecido nas articulações e qualificando-se como uma lide-
rança emergente. Esse papel ficaria ainda mais claro a partir de 1961.
Na "cadeia da legalidade"
"Não pretendemos nos submeter. Que nos esmaguem! Que nos destruam!
Que nos chacinem, neste Palácio! Chacinado estará o Brasil com a imposição
de uma ditadura contra a vontade de seu povo. Esta rádio será silenciada tanto
aqui como nos transmissores. O certo, porém, é que não será silenciada sem
balas. Tanto aqui como nos transmissores estamos guardados por fortes con-
tingentes da Brigada Militar."5
Uma vez em Brasília, Goulart não quis ser empossado logo no dia se-
guinte, pois, segundo suas próprias palavras, desejava se inteirar melhor dos
acontecimentos e se recuperar das duras críticas feitas por alguns de seus
familiares por ter aceito tomar posse nas condições impostas. Referia-se a
ninguém menos que Brizola, que havia feito declarações contundentes contra
sua postura conciliadora.
O desenrolar desses acontecimentos, do dia 25 de agosto até 7 de se-
tembro, quando João Goulart foi empossado na presidência da República,
colocou Brizola no centro das atenções, projetando seu nome para além da
esfera estadual e transformando-o de fato numa liderança nacional.
No governo parlamentarista
Com iniciativas dessa natureza, Brizola conquistava cada vez mais espaços
na política nacional e assumia a liderança das forças radicais de esquerda.
Outro tema que colocou Brizola no centro dos acontecimentos foi o do
controle do capital estrangeiro no país. Em outubro de 1961, o Ministério
das Minas e Energia apresentou a proposta de cancelar todas as conces-
sões de jazidas de ferro feitas ilegalmente ao grupo norte-americano Hanna
Company. Esse contexto de acirramento das lutas nacionalistas estimularia
ainda mais o governador do Rio Grande do Sul a avançar com sua política dc
nacionalização, efetivando a desapropriação, em fevereiro de 1962, dos bens
da Companhia Telefônica do estado, subsidiária da firma norte-americana
International Telephone & Telegraph (ITT). Esse fato repercutiu na impren-
sa nacional e internacional, intensificando o debate em torno da nacionaliza-
ção das concessionárias de serviço público. Com essas iniciativas, Brizola se
capacitava a competir com Goulart na liderança das forças de esquerda e das
lideranças sindicais, e mesmo dentro do PTB.
Nessa primeira fase do governo Goulart, destacou-se também a nova
orientação dada à política externa brasileira. Assim, em novembro de 1961, o
Brasil restabeleceu relações diplomáticas com a União Soviética, interrompi-
das desde 1947, no governo Dutra. A justificativa para a medida eram as am-
plas possibilidades representadas pelo mercado soviético para as exportações
brasileiras. Ainda de acordo com essa orientação, o governo Goulart rechaçou
as sanções contra Cuba propostas pelos Estados Unidos, assim como os pre-
parativos para a intervenção armada naquele país sob a cobertura da Orga-
nização dos Estados Americanos (OEA). Na Conferência de Punta dei Este,
realizada entre 22 e 31 de janeiro de 1962, o chanceler brasileiro San Tiago
Dantas defendeu a neutralidade em relação a Cuba, enfrentando a oposição
dos Estados Unidos, que procuravam impor suas pretensões aos países da
América Latina.
A posição do governo brasileiro, ainda que apoiada por significativos
setores sociais, criou uma situação de desentendimento com \iVashington,
dificultando as relações entre os dois países. Em março de 1962, novamente
coerente com a Iinlia adotada na política externa, a delegação brasileira en-
viada a Genebra para participar da Conferência de Desarmamento definiu a
posição do Brasil como dc potência não-alinliada, desvinculada de qualquer
bloco político-militar. Brizola se manifestou favoravelmente à política externa
24 A força do povo: Brizola e o Rio de Janeiro
Na campanha do plebiscito