Académique Documents
Professionnel Documents
Culture Documents
Resumo
A seqüência é o principal fator de ligação entre duas das mais apaixonantes formas de
comunicação de todos os tempos: o cinema e as histórias em quadrinhos. O surgimento da
Internet e as possibilidades de que o meio dispõe estão proporcionando uma aproximação
cada vez maior entre ambos. Os cibercomics estão ganhando som e movimento, rompendo
barreiras com o que antes havia sido produzido analogicamente em histórias em
quadrinhos. Desse modo, definir o que ainda é desenho seriado e o que é cinema no mundo
digital pode acabar se tornando apenas uma questão de ponto de vista.
Palavras-chave
1
NP 16 – História em Quadrinhos, do IV Encontro dos Núcleos de Pesquisa da Intercom
2
Mestranda em Comunicação Social na linha de pesquisa Cultura Midiática e Tecnologias do Imaginário na Pontifícia
Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUC-RS). Bacharel em jornalismo pela PUC-RS. Trabalha na
dissertação_Histórias em Quadrinhos na Internet: novas possibilidades no mundo digital. Autora da monografia A
Comunicação Visual em Zé Carioca de Disney na Modernidade e na Pós-Modernidade (2002). Contato:
marciaveronezi@yahoo.com.br
1. Cinema e quadrinhos nos tempos analógicos
Jacques Aumont (1993) diz que uma série de teorias tentam explicar tal
fenômeno de movimento aparente. Para ele, contudo, a mais adotada é uma que atribui essa
sensação à presença no sistema visual de detectores de movimento capazes de codificar os
sinais que afetam pontos vizinhos na retina (p. 47). O olho humano pode não perceber a
transição de imagens bastante semelhantes, mas é capaz de notar qualquer coisa de
diferente que apareça quebrando uma seqüência. Ele explica que “trata-se de uma perfeita
ilusão que repousa sobre as características inatas de nosso sistema visual” (p. 51):
O cinema utiliza imagens imóveis, projetadas em uma tela com certa
cadência regular, e separadas por faixas pretas resultantes da ocultação da
objetiva do projetor por uma paleta rotativa, quando da passagem da
película de um fotograma para o seguinte. Ou seja, ao espectador de
cinema é proposto um estímulo luminoso descontínuo, que dá uma
impressão de continuidade
(AUMONT, 1993, p. 51)
Uma página de história em quadrinhos pode ser lida por partes ou toda de
uma vez. A percepção é feita com base na imaginação. A partir dela, o leitor é capaz de
assistir a uma determinada narrativa. O artista cria um roteiro que será contado através de
desenhos e textos que representam uma situação de modo a fazer com que uma história seja
criada. Caso este trabalho seja bem feito, quem olha os gibis processa em seu cérebro as
ações das personagens.
Morin (1972) explica que são estas imagens que levam a esse exercício do
imaginário. Em As Estrelas: Mito e Sedução no Cinema, ele diz que
As coisas e pessoas do universo da tela são imagens, duplos. O ator
desdobra-se no seu papel de herói. A projeção do espectador no herói
corresponde a um movimento de duplicação. Esse desdobramento [...]
favorece a formação do mito. [...]. Para além da imagem, projeções
míticas se fixam numa pessoa concreta e carnal: a estrela.
(MORIN, 1972, p. 67)
Nem sempre, porém, foi assim. Na primeira metade do século XX, em que a
Modernidade ainda era o paradigma dominante de influência, a imagem era vista com
desconfiança. Talvez porque novas tecnologias estivessem surgindo e mostrando que cada
vez mais a realidade poderia ser simulada quase à perfeição no cinema e na televisão.
Assim, muita gente não acreditou quando o homem pisou à lua em 1969. A idéia até é
bastante coerente, caso se considere que um ano antes Stanley Kubrick apresentava ao
mundo 2001 – Uma Odisséia no Espaço, película de efeitos especiais assustadoramente
críveis.
(...) pode-se dizer que esse amoralismo é próprio de toda imagem, que não
procura o que deve ser em geral, mas descreve o que se vê aqui e agora, e
por isso não se envolve com modelos a imitar ou idéias a realizar, a seguir
ou a aplicar. [...] a imagem é uma forma que seduz, que atrai, e que,
portanto, não tem de fazer qualquer injunção moral.
(MAFFESOLI, 1995, p. 98)
3
Como este artigo versa sobre as histórias em quadrinhos, não nos ateremos em muitos detalhes à história do cinema.
pirâmides e vasos, e no Império Romano, nos “noticiários” dados pelos “césares” aos seus
súditos. Os quadrinhos propriamente ditos surgiram no auge da Modernidade, ao que se
seguiu à Segunda Revolução Industrial. O momento era de imperialismo, guerras (mundiais
e Fria) e desesperança. Nesse contexto, se abriu uma lacuna no imaginário humano, ao que
se necessitava de um divertido consolo no jornal diário, tão cheio de catástrofes e
destruição. Assim, nasceram as tiras de heróis e super-heróis. Os primeiros eram do tipo
bondoso, honesto, sempre disposto a ajudar; os outros, seres dotados de poderes sobre-
humanos, capazes de acabar com todo o tipo de injustiça e “mal”.
Com o advento da Internet, muitas tiras passaram a ser feitas por computador
e para serem lidas em rede. Foi no ciberespaço que alguns artistas começaram a ousar na
composição delas, hibridando características fundamentais dos quadrinhos com ferramentas
de outros meios. Dessa forma sons e algumas animações passaram a fazer parte destas
narrativas, mudando o modo de se enxergar as histórias em quadrinhos.
Para o internauta, pouco importa do que se trata aquilo que ele vê. O
relevante é a diversão resultante desta multiplicidade, que torna ainda mais divertida uma
forma de comunicação já consagrada. Com um toque de narrativa cinematográfica, as
histórias têm uma nova revolução, capaz de torna-las ainda mais atuais e interessantes para
seu público cativo.
COELHO NETTO, José Teixeira. Moderno Pós Moderno. São Paulo: Iluminuras, 1995.
DORFMAN, Ariel; MATTELART, Armand. Para Ler o Pato Donald: comunicação de massa e
colonialismo. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1980.
EISNER, Will. Quadrinhos e Arte Seqüencial. São Paulo: Martins Fontes, 1995.
FLUSSER, Vilém. Filosofia da Caixa Preta: ensaios para uma futura filosofia da fotografia.
Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2002.
LEMOS, André. Cibercultura, tecnologia e vida social na cultura contemporânea. Porto Alegre:
Sulina, 2002.
LYOTARD, Jean-François. A Condição Pós-Moderna. 7.ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 2002.
MORIN, Edgar. As Estrelas:mito e sedução no cinema. Rio de Janeiro: José Olympio, 1989.
NEGROPONTE, Nicholas. A Vida Digital. São Paulo: Companhia das Letras, 1995.
RAHDE, Maria Beatriz Furtado. Imagem: estética moderna & pós-moderna. Porto Alegre:
EDIPUCRS, 2000.
ROSNAY, Joël de. O Homem Simbiótico: perspectivas para o terceiro milênio. Petrópolis, RJ:
Vozes, 1997.
WOLTON, Dominique. Internet, e depois? Uma teoria crítica das novas mídias . Porto Alegre:
Sulina, 2003.