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1. AS SINGULARIDADES, AS ALTERIDADES
Vamos refletir sobre a frase “ao mesmo tempo em que somos muitos, somos um”. Nós
apreendemos todos os nossos códigos sociais e culturais e nos constituímos como pessoas. A
coletividade nos fornece códigos de conduta, valores estéticos, morais, éticos. Considerando que
as relações sociais não são simétricas, tampouco lineares e que são muito dinâmicas, os
indivíduos lançam mão de recursos pessoais, afetivos, subjetivos, e cognitivos, para dar conta da
vida que os cerca. Esse movimento é, então, particularizado por cada um.
Dito de outra forma, a cultura não é algo estático, imutável. O conhecimento e as
tecnologias proporcionam, a cada um e a todos, formas diferentes de entendimento do mundo e,
portanto, promovem ações e atitudes diferenciadas. Talvez isso ocorra até diante das mesmas
situações.
Vivemos momentos em que necessitamos construir marcadores que nos individualizem
e, ao mesmo tempo, há um movimento de uniformização. Pense nisso. Quais são esses
movimentos? E na escola, você consegue observar isso? Entre os colegas professores, entre os
estudantes, como isso é notado?
Nas identidades estão contidas as semelhanças e estas geralmente são traduzidas em
diferenças. Diferenças de raças, de classe, de sexo, de gênero, de religião, de idade. Nas
diferenças está a base dos diversos fenômenos que atormentam as sociedades humanas. As
diferenças unem e desunem; são fontes de conflitos e de manipulações socioeconômicas e
político-ideológicas. Assim como são necessárias as identificações, são necessárias as
diferenciações. Funciona como um jogo de espelhos. É um movimento constante de idas e
vindas. Da sociedade ao indivíduo, do universal ao particular.
Nesse movimento, porém, há que se reter algo fundamental: o reconhecimento.
Alteridade é reconhecer que o outro, diferente de mim é meu semelhante. Nessa perspectiva, a
falta de reconhecimento não apenas revela o esquecimento do respeito normalmente devido. Ela
pode infligir uma ferida cruel ao oprimir suas vítimas (o eu e o outro). Digamos que o
reconhecimento vai além da cortesia ou do respeito. Ele é uma necessidade humana vital,
essencial para que não tenhamos o eu como medida para todas as coisas, para que as
desigualdades não se tornem abismos intransponíveis e objetos de preconceitos.
Ao longo da história das sociedades, os grupamentos vão reconhecendo e produzindo as
chamadas “figuras de alteridade”. Um exemplo bem concreto são as crianças. Se considerarmos
as várias concepções de infância constatamos que, no movimento das relações sociais e culturais
(ciência e o conhecimento principalmente), a criança ocupa um lugar de alteridade. A criança
tem um modo de relacionamento com o mundo que a cerca, produz um entendimento particular
e próprio desta idade da vida. E ainda requer um reconhecimento condizente para que possa se
desenvolver.
Há estudos e pesquisas que mostram como e quando a mulher vira uma figura de
alteridade na nossa sociedade. Esses autores apontam o surgimento da pílula anticoncepcional
como momento da virada do olhar da sociedade sobre a mulher. Esse advento coloca em
discussão toda a problemática dos direitos individuais. A mulher passa a ser “dona do seu
corpo” (dito de forma generalizante, filosófica).
A necessidade das Ações afirmativas no campo da educação aponta que o ponto crucial
do debate sobre diversidade é a percepção, a reflexão e a atuação sobre os mecanismos sociais
que transformam as diferenças em desigualdade. Portanto, o reconhecimento das diferenças
físicas, étnicas, culturais, de gênero e etárias é um fato que deve conduzir as ações neste campo
e trabalhar a diversidade como valor para desconstrução da desigualdade.
Dependendo da forma como é entendida e tratada a questão da diversidade étnica, as
instituições podem auxiliar as crianças a valorizar sua cultura, seu corpo, seu jeito de ser ou,
pelo contrário, favorecer a discriminação quando silenciam diante da diversidade e da
necessidade de realizar abordagens de forma positiva. Nesse sentido, a criança que vivencia
situação de discriminação com relação ao seu corpo geralmente não constrói uma imagem
positiva de si mesma. Assim, o(a) professor(a) ou educador(a) é o(a) mediador(a) entre a criança
e o mundo, e é por meio dessas interações que ela constrói uma autoimagem em relação à
beleza, às relações de gênero e aos comportamentos sociais.
Na contextualização de situações de diversidade étnico-racial e da vida cotidiana nas
salas de aula, alunos e alunas aprenderão conceitos, analisarão fatos e poderão se capacitar para
intervir na sua realidade e transformá-la.
REFERÊNCIAS
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XXI Reunião Anual da ANPED, Caxambu, setembro de 1998.
FUNARI, Eva. Lolo Barnabé. São Paulo: Editora Moderna, 2010.
GEERTZ, Clifford. A Interpretação das Culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.
LARAIA, Roque de Barros. Cultura: um conceito antropológico. Rio de Janeiro: Jorge
Zahar Editor, 1992.
LÉVI-STRAUSS, Claude. Raça e História. Lisboa: Editorial Presença, 1952.
MUNANGA, Kabengele. Diversidade, etnicidade, identidade e cidadania. Palestra
proferida no 1º Seminário de Formação Teórico-Metodológica - São Paulo. s/d.