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EDITORIAL

Q
uando lemos os primeiros escritos de Freud, chama a atenção as
modificações que as manifestações sintomáticas sofreram ao lon
go de um século. Mesmo que encontremos relatos a respeito da
histeria desde a Antigüidade, as mudanças na expressão do sintoma, desde
a época de Freud até nossos dias, são evidentes. Tecidos com palavras, os
sintomas acompanham os deslocamentos discursivos de cada época.
Hoje, os psicanalistas que trabalham com crianças deparam-se com
novas “expressões” para designar os quadros psicopatológicos das crian-
ças: na fala dos pais, professores, profissionais de outras áreas e de seus
pequenos pacientes. Por exemplo, é comum que alguém venha à consulta
dizendo que seu filho é “hiperativo”; temos encontrado também o uso cada
vez mais freqüente do conceito de “autismo”, com a quase extinção do termo
“psicose”, referido à infância.
Quais questões a proliferação e o desaparecimento desses termos e
expressões manifestam? Estamos nos deparando com novas formas do sin-
toma na infância contemporânea? Ou nos encontramos com uma tendência
cada vez maior do discurso da ciência de reduzir os sintomas das crianças
à expressão de uma falha biológica, deixando de fora o sujeito que ali busca
se expressar? Os textos que reunimos na seção temática desse número do
Correio procuram trabalhar essas questões, fundamentalmente, sobre o di-
agnóstico de “Transtorno de déficit de atenção com ou sem hiperatividade”.
A seção debates edita um documento, escrito por especialistas de di-
versas áreas, dirigido ao Ministério da Saúde da Argentina, a respeito dessa
categoria diagnóstica e algumas das questões que a mesma levanta, desde o
modo simplificado com que, muitas vezes, esta síndrome é diagnosticada, até
o uso indiscriminado que com freqüência é feito da medicação.
A APPOA, inicia o ano de trabalho dedicado ao estudo do Seminário
de Lacan, “Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise”. Em janeiro
realizaram-se os primeiros encontros, a discussão segue nas reuniões de
março e na Jornada de Abertura da Associação.
Nesta edição, encontramos ainda notícias a respeito do início dos
trabalhos deste ano e o quadro de ensino da APPOA para 2006.

C. da APPOA, Porto Alegre, n. 144, março 2006 1


NOTÍCIAS NOTÍCIAS

EIXO DE TRABALHO DO ANO: cretaria, poderão ser obtidas diretamente com os coordenadores das ativida-
des ou discutidas com os membros da Comissão de Acolhimento da APPOA.
ENCONTROS DE ESTUDO DO SEMINÁRIO “OS QUATRO CONCEITOS 2. O programa completo do PERCURSO encontra-se à disposição na Secre-
FUNDAMENTAIS DA PSICANÁLISE” DE JACQUES LACAN taria da APPOA
Reuniões sistemáticas de trabalho, que acontecerão ao longo do ano, para
estudo do Seminário “Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise”. GRUPOS TEMÁTICOS
Esse estudo envolverá toda a instituição, inspirando também seus eventos.
Coordenação: Lúcia Mees, Maria Cristina Poli e Marta Pedó. A CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO
Quinta-feira, 20h30min, reuniões quinzenais, gratuitas e abertas aos interes- Coordenação: Carmen Backes
sados. Sexta-feira, 9h30min, quinzenal

SEMINÁRIOS A PSICANÁLISE NA ASSISTÊNCIA SOCIAL


Coordenação: Jaime Betts
A TELA E O DIVÃ Segunda-feira, 19h, quinzenal
Coordenação: Enéas de Souza e Robson de Freitas Pereira
Segunda quarta-feira do mês, 19h30min, mensal. CLÍNICA DA MELANCOLIA E DOS CASOS-LIMITE
Coordenação: Rosane Ramalho
CLINICANDO Sexta-feira, 15h, mensal
Coordenação: Ana Costa
Terceiro sábado do mês, 10h, mensal. CLÍNICA PSICANALÍTICA: ALGUNS CONCEITOS FUNDAMENTAIS
Coordenação: Carmen Backes
TOPOLOGIA: O ATO ANALÍTICO Sexta-feira, 14h30min, quinzenal
Coordenação: Ligia Víctora
Sexta-feira, 18h15min, quinzenal. CONCEITOS FREUDIANOS
Coordenação: Rossana Stella Oliva e Otávio W. Nunes
PSICOSSOMÁTICA: INTERDISCIPLINA E TRANSDISCIPLINA Sexta-feira, 11h, semanal
Coordenação: Jaime Betts
Sábado, 10h, mensal, em Novo Hamburgo. CONCEITOS FUNDAMENTAIS DE FREUD E LACAN E AS SUBJETIVIDA-
DES CONTEMPORÂNEAS
OBSERVAÇÕES: Coordenação: Maria Ângela Brasil e Eduardo Mendes Ribeiro
1. Mais informações (datas, programas, bibliografias) sobre as atividades: na Sexta-feira, 10h30min, quinzenal
secretaria da APPOA. As informações que não forem esclarecidas pela se-

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NOTÍCIAS NOTÍCIAS

CONSEQÜÊNCIAS CLÍNICAS (NA INFÂNCIA E NO ADULTO) DA Atividades Previstas:


ESTRUTURAÇÃO SUBJETIVA EM SEUS PRIMÓRDIOS - Sarau “Sujeito e Cultura”
Coordenação: Silvia Molina e Jaime Betts Encontros mensais, São Paulo
Segunda-feira, 20h, mensal Grandes Histórias na Cultura
Atividade a ser desenvolvida em conjunto com o Pós-graduação de Letras
ESTUDOS PSICANALÍTICOS SOBRE GRUPOS (UFRGS) e com a Livraria Cultura. Última quinta-feira de cada mês, de abril
Coordenação: Jorge Broide a outubro.
Sábado, 10h, mensal
NÚCLEO DAS PSICOSES
FRONTEIRAS DA PSICANÁLISE Segunda-feira, 20h30min, reuniões mensais
Coordenação: Marcelo Victor Responsáveis: Ester Trevisan, Mário Corso, Nilson Sibemberg e Rosane
Quinta-feira, 19h30min, quinzenal Ramalho
- Apresentações de Pacientes
MÍDIA E SUBJETIVIDADE Atividade a ser desenvolvida em conjunto com o Cais Mental Centro.
Os efeitos da midiatização da subjetividade para a constituição (psíquica)
de crianças e adolescentes de nosso tempo NÚCLEO DAS TOXICOMANIAS
Coordenação: Eliana Dable de Mello e Roselene Gurski Sábado, 10h, reuniões mensais
Terça-feira, 18h30min, quinzenal Responsáveis: Eduardo Mendes Ribeiro e Otávio W. Nunes.

PSICANÁLISE DE CRIANÇAS FUNDAMENTOS PSICANALÍTICOS NÚCLEO DE PSICANÁLISE DE CRIANÇAS


Coordenação: Eda Tavares e Marta Pedó Sábado, 10h, reuniões, reuniões mensais
Segunda-feira, 10h30min, semanal Responsáveis: Alfredo Jerusalinsky, Eda Tavares, Ieda Prates, Gerson
Pinho, Marta Pedó e Simone Rickes
A CRIANÇA E A CLÍNICA PSICANALÍTICA
Coordenação: Izabel Dal Pont e Margareth Martta SARAUS
Sexta-feira, 10h30min, quinzenal, em Caxias do Sul Atividades com convidados, em que são desenvolvidos debates sobre o
contexto cultural, seja envolvendo expressões sociais, políticas, artísticas,
NÚCLEOS DE ESTUDO etc., abertas aos interessados. Cronograma a ser divulgado posteriormente.
Atividades gratuitas e abertas aos interessados
GRUPOS TEXTUAIS
NÚCLEO PASSAGENS
Responsáveis: Ana Costa, Edson Sousa e Lucia Pereira A RELAÇÃO DE OBJETO E AS ESTRUTURAS FREUDIANAS SEMINÁ-
RIO IV DE LACAN

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NOTÍCIAS NOTÍCIAS

Coordenação: Gerson Pinho TURMA: VIII


Sexta-feira, 16h15min, quinzenal. Primeiro semestre - Inconsciente

LE SINTHOME - SEMINÁRIO XXIII DE LACAN PERCURSO PSICANÁLISE DE CRIANÇAS


Coordenação: Maria Auxiliadora Sudbrack
Quinta-feira, 14h, quinzenal Seminário compartilhado com o Núcleo de Estudos Sigmund Freud
Em andamento: terceiro semestre - Direção da cura, história e
MOMENTO DE LER intersecções.
Coordenação: Maria Auxiliadora Sudbrack
Sexta-feira, 15h, semanal.

O ESTUDO DO SEMINÁRIO 1 DE JAQUES LACAN OS ESCRITOS


TÉCNICOS DE FREUD SEMINÁRIO DE TOPOLOGIA: O ATO ANALÍTICO (IIA PARTE).
Coordenação: Rossana Stella Oliva e Otávio W. Nunes
Quinta-feira, 12h15min, quinzenal O Seminário “O ato psicanalítico”, conforme Lacan apresentou no ano
letivo de 1967/68, foi um ensino difícil, além de conturbado pelas questões
políticas daquela época: às vésperas da ruptura de Lacan com a ENS, ele foi
OFICINAS interrompido pela greve geral dos estudantes e trabalhadores na França.
Atividades a serem desenvolvidas aos sábados, em horários e datas a Em 2005, trabalhamos a primeira parte deste Seminário, com os es-
serem previstas. quemas e grafos sobre a alienação, a transferência, a polêmica
contratransferência, e a psicanálise como análise da linguagem em suas
OFICINA DE TOPOLOGIA: relações com o inconsciente e com a realidade. Discutimos também os
OS NÓS textos mencionados por Lacan, em saraus mensais, com apresentações
Coordenação: Ligia Víctora. dos participantes.
Sábado, 10h. Em 2006, pretendemos seguir trabalhando sobre a interpretação, o
saber e a verdade, se é que ela existe, implicados neste ato.
EXERCÍCIOS CLÍNICOS
Datas: 20/05, 05/08 e 07/10 Seminário de Topologia: O Ato Analítico
Responsável: Ligia Gomes Víctora
PERCURSO DE ESCOLA Reinício: 10/03/2006
Freqüência: quinzenal
TURMA: VII Horário: das 18h 15min às 20h 15min.
Em andamento: quinto semestre - Transferência

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NOTÍCIAS NOTÍCIAS

PRINCIPAIS EVENTOS EM 2006 JORNADA DE ABERTURA 2006


ASSOCIAÇÃO PSICANALÍTICA DE PORTO ALEGRE
JORNADA DE ABERTURA: “Conceitos Fundamentais da Psicanálise”
Data: 01 de abril de 2006 CONCEITOS FUNDAMENTAIS DA PSICANÁLISE
Local: NOVOTEL – Av. Soledade, 575. Porto Alegre - RS
Desde o início de sua obra Freud enfatizou o inconsciente e a sexua-
CICLO DE DEBATES: PSICANÁLISE E LITERATURA lidade como fundamentos da clínica psicanalítica: o inconsciente e suas
GRANDES HISTÓRIAS DA CULTURA formações de linguagem, como as imagens oníricas, os atos falhos; o sexu-
Datas: 27/04; 25/05; 29/06; 31/08; 28/09; 26/10. Às 20H. al e o recalque: as conversões, as compulsões e as demais formações sin-
Local: Livraria Cultura Shopping Bourbon Country, Porto Alegre - RS tomáticas. Com o desdobrar de seu trabalho outros conceitos foram se so-
mando, entre eles o Édipo, cuja importância Freud insistia em assinalar.
FREUD 150 ANOS Quando Lacan se propôs a destacar conceitos fundamentais, ele os
Data: 06 de maio de 2006 designou em número de quatro: inconsciente, pulsão, repetição e transferên-
Local: SANTANDER CULTURAL, Porto Alegre - RS cia. Poderia se pensar que, em relação aos dois primeiros, ele somente
preserva as formulações freudianas dando continuidade a seus fundamen-
JORNADA DO ENLACE BRASILEIRO DA CONVERGÊNCIA tos. No entanto, justamente neles Lacan inova, partindo do suposto que a
LACANIANA: IDENTIFICAÇÃO E IDENTIDADE relação ao campo do Outro determina toda e qualquer expressão do sujeito.
Datas: de 04 a 06 de maio de 2006 Também por essa razão acrescenta aos conceitos fundamentais a repetição
Local: Recife, PE – resultante dessa relação – e a transferência, condição necessária para que
se possa falar de qualquer conceito da clínica psicanalítica. Ou seja, Lacan
RELENDO Freud: A questão da Análise leiga articula os conceitos ao próprio exercício da clínica, logo, da transferência,
Datas: de 02 a 04 de junho de 2006 sendo que sua elaboração depende de uma trajetória pela mesma.
Local: Hotel Villa Michelon, Bento Gonçalves - RS Se concordarmos com este suposto lacaniano, os conceitos funda-
mentais da psicanálise nunca estarão completamente estabelecidos. Por
JORNADAS DA CONVERGÊNCIA LACANIANA NA ARGENTINA necessitarem de percursos de transferência, sua produção resulta dos cami-
Datas: de 04 a 06 de agosto de 2006 nhos que cada analista encontra para expressar a singularidade de sua clíni-
Local: Buenos Aires, Argentina ca no diálogo necessário com a tradição já reconhecida da psicanálise. Esta
jornada tem por fio condutor renovar esse diálogo.
JORNADAS CLÍNICAS 2006
Datas: 21 e 22 de Outubro Local do Evento:
Local: CENTRO DE EVENTOS PLAZA SÃO RAFAEL, Porto Alegre - RS NOVOTEL Av. Soledade, 575 (mapa no verso)
Bairro Três Figueiras – Porto Alegre – RS
Mais informações sobre estes eventos pelo site ou na secretaria da APPOA.

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NOTÍCIAS NOTÍCIAS

SÁBADO 01 DE ABRIL 2006 OFICINA DE TOPOLOGIA: “OS NÓS”


Abertura – 9h30
“O que funda o sujeito?” Carmen Backes, Psicanalista, APPOA. Os nós e enlaçamentos são importantes objetos de estudo em
Debate topologia. Em sua definição temos que os nós são todas as superfícies
“Lacan, três por um.” Maria Auxiliadora Sudbrack, Psicanalista, homeomorfas à circunferência. Ou seja, um círculo desenhado no papel é
APPOA. um nó, visto que é a projeção de uma esfera em R2. Podemos imaginar um
Debate nó como um filamento deformável e emaranhável, cujas extremidades são
15h grudadas uma na outra. O mais simples dos nós é o círculo (chamado de nó
“A experiência da transferência.” Siloé Rey, Psicanalista, APPOA. trivial), que tem uma projeção que não possui cruzamentos.
Debate Um enlaçamento é uma reunião disjunta de um ou vários nós. “Disjunto”
“O que a linguagem nos permite fazer.” Alfredo Jerusalinsky, Psicana- significa que eles estão soltos uns dos outros. Já uma cadeia ou link, é a
lista, APPOA. união disjunta de dois ou mais nós.
Debate A teoria dos nós foi o último achado de Lacan em sua tentativa de
Encerramento Lucia Serrano Pereira, Presidente da APPOA formalizar os conceitos da psicanálise em uma linguagem científica. Com
18h ela, Lacan afirmava ter encontrado não um modelo do funcionamento do
Lançamentos de livros falasser, mas sua estrutura – teria ele alcançado o impossível, ou seja, tocar
Valor das Inscrições o próprio Real?

Até 24/03 Após e no local Nó Borromeu a seis:


Associados R$ 55,00 R$ 75,00
Estudantes de graduação RS 65,00 R$ 85,00
Profissionais R$ 80,00 R$ 100,00

Informações e inscrições: Associação Psicanalítica de Porto Alegre - APPOA


Horário de funcionamento da Secretaria: das 13h 30min às 21h 30min.
Vagas limitadas.
Inscrições para estudantes de graduação e antecipadas devem ser feitas na
secretaria da APPOA
Inscrições mediante depósito bancário, para Banco Itaú, agência 0604, con-
ta-corrente: 32910-2. Neste caso, enviar, por fax, o comprovante de pa-
gamento devidamente preenchido, para a inscrição ser efetivada.

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NOTÍCIAS SEÇÃO TEMÁTICA

Atividade: Oficina de Topologia NOVOS DIAGNÓSTICOS? EM BUSCA DA


Responsável: Ligia Víctora SUBJETIVIDADE PERDIDA1
Data: 18/03/2006 – sábado
Horário: das 10h às 12h Gisela Untoiglich2
Material: trazer cordões ou fios coloridos.
Atividade gratuita e aberta aos interessados. (Favor inscrever-se na secreta-

E
ste trabalho é atravessado por alguns interrogantes: O que é diag-
ria da APPOA.)
nosticar? De quem é o diagnóstico? Como se realiza o diagnóstico
de um sujeito em estruturação?
A definição que encontramos no dicionário de língua espanhola diz
que: “Diagnosticar é o ato de conhecer a natureza de uma enfermidade me-
“SAÚDE MENTAL E SURDEZ” diante a observação de seus signos e sintomas”. É interessante escutar a
CONGRESSO INTERNACIONAL forma gramatical dessa definição, já que o sujeito “que conhece” é implícito,
dessa maneira se supõe que o profissional que realiza o diagnóstico não põe
Data: 3, 4 e 5 de agosto de 2006. sua subjetividade em jogo; assim como o sujeito sobre o qual se faz “a
Buenos Aires - Argentina observação de seus signos e sintomas” também é implícito, certamente por-
Faculdade de Psicología da UBA. que se parte da hipótese de que “a signos fenomênicos iguais (ou seja,
Envio de trabalhos: de 15 março a 15 de maio de 2006. condutas observáveis), igual diagnóstico”. A partir daí, é absolutamente coe-
rente realizar o diagnóstico de uma criança com o preenchimento de um
questionário.
Desde a psicopedagogia clínica com orientação psicanalítica, um diag-
nóstico é um processo no qual se tenta encontrar o sentido histórico subjetivo
APPOA INFORMA: das dificuldades de cada criança em sua singularidade, que se manifestaram
reinícios das ATIVIDADES através de suas problemáticas escolares.
A maioria dessas crianças chega à consulta porque seus pais foram
Cartel Relendo Freud - 08 de março, quarta-feira, às 20h 30min., na Sede enviados pelo professor, sendo parte do trabalho de início do tratamento ten-
da APPOA.
Cartel do Seminário XI de Lacan - 16 de março, quinta-feira, às 20h 30min., 1
Este artigo foi escrito a partir de uma conferência proferida em maio de 2005 no ciclo do
Seminário: Diagnósticos en la infancia: Problemáticas actuales. Abordajes Interdisciplinarios
na Sede da APPOA. de temas cruciales – Presentacion de casos clínicos, organizado pelo Centro Dos. Publica-
Núcleo das Psicoses - 20 de março, segunda-feira, às 20h 30min., na Sede do em Diagnósticos en la infancia – en busca de la subjetividad perdida, Untoiglich, Gisela
da APPOA. (coord.), Ediciones novedades educativas, Buenos Aires/México.
2
Coordenadora do Pós-graduação de Psicopedagogia Clínica do Centro Dos. Coordenadora
da Equipe de Psicodiagnóstico da Cátedra de Psicopedagogia Clínica, Universidade de Buenos
Aires. Bolsista de investigação de doutorado, Faculdade de Psicologia, Universidade de
Buenos Aires.

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SEÇÃO TEMÁTICA UNTOIGLICH, G. Novos diagnósticos? Em busca...

tar construir, junto aos pais, um espaço em que surja algum interrogante Portanto, será necessário um aprofundamento de cada caso em par-
sobre o que acontece com seu filho. ticular para pesquisar o que acontece a cada uma das crianças que não
Nos últimos anos, temos observado como se intensifica a dificuldade acompanham o ritmo acadêmico exigido.
que experimentam os pais de se perguntarem por aquilo que transcenda o Este trabalho tem como propósito abrir novos interrogantes a situa-
concreto e urgente das necessidades básicas. ções que o trabalho com crianças nos coloca hoje – tanto a partir da clínica
Seria relativamente simples ensaiar como resposta que a forte crise quanto da instituição escolar – que possibilitem a construção de novas ferra-
econômico-social que atravessou a todos, em maior ou menor medida, nos mentas de abordagem teórico-clínica, que permitirão diminuir o risco do fra-
últimos tempos, provavelmente afetou os segmentos mais vulneráveis em casso escolar, dificuldades sociais e familiares às quais as crianças se vêem
uma magnitude arrasadora. No entanto, este trabalho não pretende encon- submetidas, e romper o aparentemente inevitável circuito de exclusão que
trar respostas fáceis e simplificadoras, mas explorar em profundidade a com- se repete sem cessar.
plexidade atual. Se tomarmos o conceito das “séries complementares” freudianas,
Colocar a situação em termos de complexidade é diferente de pensá- percebemos que os fatores constitucionais, a bagagem que o sujeito traz ao
la em termos de completude. Quero dizer que não trataremos de encontrar nascer, somados às vivências infantis, terão que se cruzar com certos fato-
respostas únicas totalizadoras às diferentes problemáticas formuladas. res desencadeantes para que determinada sintomatologia se manifeste.
Cada história possui uma trama singular, fios se entrelaçam de um Desde essa perspectiva, se tratará de romper com o determinismo
modo particular, margeando, em numerosas ocasiões, vazios que são difí- clássico e a causalidade única para poder interrogar-nos sobre a
ceis de preencher. Cada criança que nasce traz seus próprios fios, compos- hipercomplexidade da subjetividade atual.
tos por sua bagagem biológica, pelo momento particular em que nasceu, Por que consideramos necessário colocar a clínica desde o paradigma
pela situação emocional-social-econômica que atravessava sua família nes- da complexidade? Não seria mais fácil recorrer às infinitas listagens de con-
se momento; que se tecem com os anseios, desejos, fantasmas, temores dutas manifestas que circulam pela Internet e treinar pais e docentes para
de ambos pais (ainda que, de alguns deles, o único presente seja sua au- que possam realizar eles mesmos os diagnósticos? Quais seriam os ris-
sência), assim como também com uma sociedade que, no melhor dos ca- cos?
sos, vai realizar sua própria aposta sobre esse sujeito. Piera Aulagnier (1972) Um dos principais riscos dessa supersimplificação consistiria em lo-
designava a esse último como a “função metapsicológica do campo sócio- calizar nessa realidade aquilo que fomos buscar, para depois terminar
cultural”, da qual a instituição escolar costumava ser a porta-voz no transcur- surpreedendo-nos com as altas porcentagens daquele transtorno que final-
so da infância (no final desse texto desenvolvemos o porquê da mudança). mente encontramos.
A escola costuma ser uma vitrine com lente de aumento, onde, em Um dos transtornos com maior peso nos meios de comunicação de
geral, se mostra grande parte das problemáticas da infância. Existem múlti- massa, assim como também entre os pais e docentes, é o “Transtorno de
plas razões que poderiam convergir para que uma criança manifeste dificul- déficit de atenção, com ou sem hiperatividade” (TDA-H, sua sigla em portu-
dades escolares: problemas familiares, situações de abuso e/ou violência, guês, AD(H)D, sua sigla em inglês). Cabe esclarecer que até agora “não
de adequação curricular, desnutrição infantil, dificuldades na visão e/ou audi- existem provas de laboratório estabelecidas para o diagnóstico de tal trans-
ção não diagnosticadas, problemas sócio-econômicos, assim como tam- torno” (DSM IV, “Manual de diagnóstico e estatística das doenças mentais”
bém dificuldades de atenção, que podem ou não ter uma origem neurológica. da OMS). Portanto, é muito difícil realizar um diagnóstico preciso. Geral-

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mente se extrapolam estatísticas que circulam em outros países, sem men- Um dos maiores perigos que encontramos, a partir da divulgação des-
cionar como se chegou a suas conclusões. se tipo de estatística, é que antes tínhamos 250.000 crianças inquietas,
Em outros termos, poderíamos colocar que as dificuldades de aten- desatentas, impulsivas ou agitadas que nos faziam questionar o que estava
ção ou a inquietude excessiva costumam ser apenas a ponta do iceberg; se acontecendo com a instituição escolar, as famílias e as crises sociais, e
ficarmos apenas com isso, com freqüência se atrasa a possibilidade de rea- agora passamos a ter 250.000 ADD que devemos medicar.
lizar um diagnóstico psicopatológico preciso, subjacente à estrutura psíqui- Nesta subjetividade sem espessura que é proposta, sobretudo com
ca de grande quantidade de crianças que manifestam perturbações de aten- crianças, se perde a possibilidade de outorgar um lugar ao sofrimento. Natu-
ção na escola. ralizam-se as funções, portanto seria natural que uma criança atendesse ao
“Experiências clínicas de todo o tipo nos mostram que a mudança do que os adultos esperam dela, se não o faz é porque teria uma falha em seus
“meio ambiente”, a mudança na proposição dessa matriz, modifica as coi- neurotransmissores. Esta simplificação da problemática desresponsabiliza
sas em uma criança. Se alguém introduz o diagnóstico precocemente, e os adultos de ter que se questionar sobre o porque do padecimento da crian-
trata-a como se fosse “um ADD”, no final pode ter razão. Isso é o que encon- ça. Contudo, coloca um inegável risco ao futuro, já que se silenciamos o
tramos na clínica. Por isso, a psicanálise opta por não saber. Não porque sofrimento e domesticamos a conduta, o que provavelmente surja, em longo
sejamos ignorantes, mas porque reconhecemos que esse lugar que a ciên- prazo, sejam diagnósticos psicopatológicos mais graves e com muito me-
cia preenche artificialmente está vazio e que é necessário que esteja porque nos margem de intervenção possível.
cumpre uma função decisiva, que é permitir que a matriz simbólica seja tal, Se nos distanciamos, então, das simplificantes observações
seja simbólica... Isto é, que o signo lingüístico não represente a coisa que fenomênicas e nos colocamos a interrogar quais são os denominadores co-
lhe deu origem. A coisa que deu origem a essa marca tem que se apagar muns que encontramos nos diferentes meninos e meninas diagnosticados,
para que esse signo se torne polissêmico. Se unimos uma criança a um encontramos certos pontos de coincidência.
suposto positivado de um lugar anatômico que falha, a vida dessa criança vai Isto quer dizer que algumas dessas crianças descarregarão compul-
se desenvolver ao redor desse lugar anatômico. sivamente em forma corporal as situações que lhes acontecem; e será en-
Que é que inventam os psicanalistas? São dispositivos para deixar tão seu corpo que falará por eles, sem que eles possam fazer-se cargo do
este lugar vazio. São dispositivos que não são iguais em todos os momentos que lhes acontece, nem dos efeitos de mal-estar que com freqüência geram
da vida de um sujeito porque sabemos que na infância está em trâmite esta nos outros. Ao não haver espaço para o trâmite da angústia, são os outros,
inscrição, este modelamento” (Jerusalinsky, A., 2003). pais, professores ou outras crianças que se angustiam. Isto, com freqüên-
Lacan coloca “que renuncie à psicanálise quem não considere em seu cia, nos faz crer nesta aparência, que dão muitas dessas crianças, de indi-
horizonte a subjetividade de sua época”. Portanto, é desde esse postulado ferentes ou, como dizem alguns pais e professores, que “não se importam
ético que tentaremos abordar as questões clínicas que hoje se colocam a nós. com nada”.
A partir da difusão de dados nos quais se estabelece que haveria Em numerosas ocasiões, quando realizamos o rastreamento das his-
250.000 crianças na Argentina com uma enfermidade neurológica chamada tórias parentais, encontramos que muitas das situações não tramitadas psi-
déficit de atenção, e que este seria o motivo mais freqüente de repetência na quicamente se repetem ao longo das gerações, como podem ser os abusos,
escola, considero imprescindível revisar desde uma perspectiva diferente al- a violência ou o abandono, sem que pareça sequer a possibilidade de ques-
guns dos conceitos que circulam. tionar-se o porque da repetição de tais situações traumáticas.

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SEÇÃO TEMÁTICA UNTOIGLICH, G. Novos diagnósticos? Em busca...

Partimos da hipótese de que um sujeito chega a constituir-se psiqui-


aplacado pela medicação, o que se tornou aparente foi a indiferença. No entan-
camente ao longo de um período de tempo, no qual terão que efetivar certas
to, o pano de fundo era um forte estado de angústia, que encontrava no silenci-
operações lógicas, que podem dar-se ou não. Ou seja, que não é por si
oso fracasso escolar o único modo de fazer-se ouvir.
mesmo que um filhote humano se transforma em um sujeito desejante,
Com o menino foi elaborada uma estratégia para que pudesse prepa-
pensante, atento e que aprende.
rar e prestar as provas, a qual foi trabalhada com a professora, que disse que
era a primeira vez que alguém se comunicava pessoalmente com ela, já que
MARIANO
até esse momento somente lhe haviam enviado estratégias para aula pré-
Os pais de Mariano consultam em dezembro por seu filho de dez
impressas para o trabalho com crianças com ADD. Levando em conta a
anos, que apresenta sérias dificuldades escolares e se encontra realizando
proposta da professora, procurou-se uma nova escola para Mariano, já que
um tratamento psicológico cognitivo-comportamental – lhe haviam dado um
mesmo que a instituição escolar que freqüentava não fosse a causadora das
diagnóstico de ADHD e estava medicado com Ritalina há dois anos.
dificuldades do menino, tanto o grupo de pares como a excelência acadêmi-
Mariano se apresenta como um menino indiferente, a quem aparente-
ca pretendida pela instituição, afundavam ainda mais o menino em uma
mente dá no mesmo prestar provas ou repetir o ano, que se acomoda ao
passivização absoluta.
discurso parental, consoante com o escolar, que diz que o menino não rende
Este foi o início da construção de outro caminho que, por outra parte,
por falta de interesse.
necessitava verificar os modos de transitar por ele, o que requereu um traba-
Ao longo do psicodiagnóstico, Mariano vai mostrando outros aspec-
lho terapêutico com o menino, seus pais e a construção da estratégia de
tos de sua problemática, possibilitado por um espaço de escuta que se abre
integração na nova instituição.
quando digo a Mariano que gostaria de conhecê-lo para poder entender o que
Poderíamos pensar que nos casos dessas consultas atuais, na mai-
está acontecendo, ao que se surpreende e responde que todos já sabem o
oria dos pacientes não há uma apresentação sintomática, no sentido psica-
que acontece: ele é ADD, toma medicação e, além disso, é muito preguiço-
nalítico do termo, e esta será, no melhor dos casos, algo a construir em uma
so para estudar. Diante de minha resposta de que íamos deixar tudo isso de
abordagem terapêutica, já que um sintoma implica um aparato operando sob
lado, no momento, já que nada disso me falava de quem ele era, o menino
a égide do recalcamento e se define como uma mensagem dirigida ao Outro,
pôde desdobrar outros aspectos de si mesmo.
mensagem que suportaria uma pergunta, um enigma. Na clínica atual, em
As produções escritas de Mariano são cuidadosas, ordenadas, preo-
numerosas ocasiões, os pais chegam com uma classificação diagnóstica
cupa-se pelos erros de ortografia e os sinais de pontuação; não condizem
da criança de suposta origem biológica, que obtura a possibilidade de ques-
com um menino que está a ponto de repetir o ano por um aparente fracasso
tionar o porquê do padecimento da criança.
categórico em todas as áreas. Por outra parte, chama muita atenção o con-
Essas dificuldades que se observam do lado dos pais, por outra parte,
teúdo de suas produções: fala de sua solidão, do desprezo de seus colegas
aparecem redobradas na instituição escolar; para poder abordar, então, a
e da dificuldade dos outros para escutar seu sofrimento.
complexidade enunciada, é necessário também interrogar-se sobre o que
Logo que efetuado o diagnóstico de Mariano, o que se pôs em relevo no
está acontecendo na atualidade com a instituição escolar.
trabalho com os pais foi que a capacidade do menino estava detida por uma
Com a queda, nos últimos anos, do estado-nação se vêem altera-
profunda depressão, que no início tentou fazer-se ver através de uma acentuada
das as condições de existência dos indivíduos tanto quanto das institui-
hiperatividade e logo, quando o comportamento foi reeducado “exitosamente” e
ções.

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SEÇÃO TEMÁTICA UNTOIGLICH, G. Novos diagnósticos? Em busca...

“O tabuleiro que regulava os movimentos das peças institucionais se Os dispositivos anteriores pretendiam produzir construções como a
desintegra. Sem tabuleiro que unifique o jogo, as instituições se transfor- memória, a consciência, o saber. O discurso da mídia produz atualidade,
mam em fragmentos sem centro... destituem-se algumas condições com imagem, opinião. Varia, então, o mecanismo mesmo de constituição de sub-
capacidade de organizar significação sem que se constitua nada equivalente jetividade. Ao viver em uma realidade instantânea, se dilui o conceito de
com virtude simbolizadora... Os ocupantes das escolas pós-nacionais (pro- história e a possibilidade de dar-lhe um sentido histórico-subjetivo aos acon-
fessores, alunos, direção e pais), hoje, sofrem de destituição e fragmenta- tecimentos vividos. O mundo se converte, então, como descrevia Borges no
ção; já não se trata do autoritarismo das autoridades escolares, mas do conto de “Funes”, “no mundo multiforme e instantâneo”, no qual o sentido,
‘clima de anomia’ que impede a produção de algum tipo de ordenamento... assim como o tínhamos formulado, se perde.
sofrem porque não há normativa compartilhada. A subjetividade resultante de Considero necessário interrogar-nos sobre o que fazemos como soci-
uma escola, quando o mercado é a instância dominante da vida social, é edade com o mal-estar que nós mesmos geramos. Uma via altamente facili-
absolutamente outra... A velocidade do mercado ameaça a consistência já tada nesses tempos é silenciá-lo com medicação que, no melhor dos casos,
fragmentada das instituições nascidas para operar em terrenos sólidos. Dessa terá um efeito apaziguante por algumas horas, mas que não gerará novas
maneira, as escolas se transformam em galpões (...) que carecem de coe- representações, nem possibilitará por si mesma o trabalho de simbolização
são lógica e simbólica (...) coincidência puramente material dos corpos em que é condição imprescindível para poder apreender os objetos do mundo.
um espaço físico... Cada um arma sua cena, a passagem da instituição ao No entanto, se pensamos que este não é apenas o problema de uma
galpão implica um suposto: ‘as condições de um encontro não estão garan- criança, mas uma problemática complexa, que implica múltiplos fatores que
tidas’” (Corea e Lewkovicz, Pedagogia del aburrido, 2001; o grifado é nosso). comprometem à criança, sua família, a instituição escolar, a equipe médica,
Como vimos anteriormente, as crianças são encaminhadas porque os terapeutas, tanto como aos responsáveis pelas políticas públicas, con-
não prestam atenção, não se comprometem com a aprendizagem, tem pro- cluiremos que requer abordagens coerentes com tal complexidade.
blemas de conduta, não sabem ler e escrever em idades tardias. Contudo, Para poder abordar algumas questões aqui colocadas, serão neces-
desde certo ponto de vista isto não é novo. Qual seria a novidade nesse sários múltiplos trabalhos em distintos níveis. Em primeira instância, é im-
momento? Talvez que as condições de precariedade no passado pareciam prescindível um diagnóstico preciso, que necessita tempo e não se resolve
afetar os alunos das zonas marginais, era a exceção de alguns poucos indi- completando um questionário. Provavelmente, requeira, em numerosos ca-
víduos; no entanto, na atualidade, são as instituições, os docentes, os alu- sos, de consultas interdisciplinares. A seguir, está o trabalho com essa cri-
nos, os profissionais, a sociedade em geral que se encontram atravessados ança em particular e com seus pais para que possam ir construindo novos
pela lógica da precariedade, que implica que nenhuma regularidade é defini- laços simbólicos. Também é imprescindível que exista uma comunicação
tiva, em que as regras se constroem em cada nova situação. fluída entre os diferentes profissionais que trabalham com a criança e a es-
“Na era da informação, a comunicação deixou de existir. O que se cola para poderem ir construindo respostas coerentes desde os distintos
esgotou é o paradigma mediante o qual pensamos, durante quase um sécu- âmbitos. Isto não significa igualar os discursos, senão enriquecê-los, man-
lo, os fenômenos da significação e a produção de subjetividade”. tendo cada um sua especificidade.
“A comunicação deixou de ser o que supusemos durante o ciclo Se tomarmos os aportes da psicanálise, pensamos em uma ética do
estatal nacional: uma via para estabelecer relações entre semelhantes, me- sujeito na qual seus sintomas representam uma verdade que não pode ser
diada por um código compartilhado”. nem deve ser silenciada. Por trás das dificuldades escolares, da desordem,

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SEÇÃO TEMÁTICA UNTOIGLICH, G. Novos diagnósticos? Em busca...

da hiperatividade, da falta de atenção, da impulsividade há uma criança que REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:


sofre, evidentemente também encontramos uma família que padece e uma American Psychiatric Association, DSM-IV. Manual Diagnóstico y estadístico de
los Trastornos Mentales, Argentina, 1994.
instituição escolar que não encontra o modo de responder às demandas que
ARMSTRONG, T., Síndrome de Déficit de Ateción con o sin Hiperactividad, ADD/
se exigem dela. ADHD, estrategias en el aula, Buenos Aires: Paidós, 2000.
Tratar-se-á, então, de incorporar criativamente estratégias coerentes com AULAGNIER, P., La violencia de la interpretación, Buenos Aires: Amorrortu, 1977.
a complexidade do padecimento dessas crianças, tendo em conta os distintos BLEICHMAR, S., La fundación del inconsciente, Buenos Aires: Amorrortu, 1993.
desafios que colocam àqueles profissionais que se ocupam delas. Aos BLEICHMAR, S., La prioridad de detectar los riesgos de fracaso de simbolización
terapeutas, fazendo revisar nossas técnicas de abordagem tradicionais, basi- en la infancia, Actualidad Psicológica, Ano XXIII, Nº 257, setembro 1998.
BORGES, J. “Funes el memorioso”, In Ficiones, Buenos Aires: Emecé, 1956.
camente ligadas à palavra, já que estas crianças têm, em geral, dificultadas CALMELS, D. “Periplo de un nombre: desatención-impulsividad-hiperactividad”,
suas possibilidades de tramitação simbólica através da palavra; assim como In Trastornos en el desarollo infantil. Algunas reflexiones interdisciplinarias, Buenos
também nos levam a sair da segurança que nos brindam as quatro paredes do Aires: Miño y Dávila, 2002.
consultório, já que é condição o trabalho de articulação entre os distintos profis- COREA e LEWKOVICZ, “Pedagogia del aburrido”, Buenos Aires: Paidós, 2001.
sionais que trabalham com a criança e sua família. Por outra parte, as institui- FREUD, S. Conferencia 22: Algunas perspectivas sobre el desarollo y la regressión
(1916-1917), Buenos Aires: Amorrortu, 1984.
ções educativas que aceitem o desafio de integrar crianças com dificuldades
JANÍN, B. Niños desatentos y hiperactivos. Reflexiones críticas acerca del Trastorno
terão que pensar quais são as necessidades de “cada criança”, já que o que por Déficit de Aténcion con o sin hiperactividad, Buenos Aires: Edicones
funciona maravilhosamente com um, pode não ter o mesmo efeito com outro. Novedades Educativas, 2004.
A atualidade dessas problemáticas está em relação tanto com a emer- JERUSALINSKY, A. Seminario: Diagnóstico de déficit atencional, qué puede decir
gência das “novas patologias” desses tempos histórico-sociais, quanto com el Psicoanálisis? Ditado no Centro Coriat, junho de 2003.
MORÍN, E., Introdución al pensamiento complejo, Espanha: Gedisa, 1990.
as particularidades da temporalidade psíquica que elas suportam em sua
SCHLEMENSON, S., Niños que no aprenden, Buenos Aires: Paidós, 2001.
impossibilidade de inscrever-se, que se atualiza constantemente.
UNTOIGLICH, Gisela, “Alejo es ADD. Abordando el dolor de un niño en un
Compreender que se trata de sofrimento psíquico e não de desafio à daignóstico”, In Schlemenson, S., Niños que no aprenden. Actualizaciones en
autoridade escolar ou de uma simples falha no funcionamento dos diagnóstico psicopedagógico. Buenos Aires: Paidós, 2001.
neurotransmissores, possibilitará aos diferentes profissionais encontrar ou-
tros modos de acompanhar a essas crianças em sua impulsividade. Tradução: Gerson Smiech Pinho
Desde essa perspectiva, o diagnóstico precoce dos problemas es-
truturais que estão na base da estrutura psicopatológica dessas crianças e
a abordagem interdisciplinar permitirão construir uma rede que os sustente e
acompanhe em seus transbordamentos, enquanto constroem sua própria
borda. (Untoiglich, 2001).
Por outro lado, será necessário construir, junto aos docentes, ferra-
mentas que possibilitem a inclusão das diferenças no respeito à diversidade.

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DIAGNÓSTICO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO, modo: no que concerne aos sintomas impulsivos e hiperativos, que se su-
O QUE PODE DIZER A PSICANÁLISE?1 põem que formem parte essencial da TDAH, é dito que o uso da medicação
Ritalina apresenta após 14 meses de uso, uma eficácia de 56%. Também
Alfredo Jerusalinsky afirma que a efetividade do tratamento combinado, ou seja, o uso da Ritalina
mais tratamento comportamental, mais tratamento social (isto é, o treina-
mento dos pais e professores) apresenta uma efetividade de 60%. Afirma

P
eço-lhes que tenham em mente o conto de J. Cortázar publicado no
também que o tratamento comportamental apresenta uma efetividade de 45%
livro “Cerimônias”, “Final de Jogo”. Parece-me um dos melhores con
tos que já se escreveu sobre as crianças. Espero que até o final de quando isolado, sem medicação e que o tratamento comunitário isolado apre-
minha exposição possam ter claro por quê começo por aqui. senta uma efetividade de 36%. O que não está dito neste gráfico é que, em
38% das crianças o tratamento medicamentoso isolado não apresentou ne-
Em segundo lugar, vou me dedicar a analisar alguns estudos de inves-
tigação sobre a Síndrome de TDAH, também chamada CHADD ou Children’s nhum efeito, isso está publicado em letra menor nos estudos que acompa-
atentional deficit disorder. Também chamada ADDH. nham o folder. Quer dizer que temos que dedicar, pelo menos, um par de
horas à leitura para nos inteirarmos disto, apesar de que, de modo quase
Um dos estudos mais interessantes que encontrei é realizado por
investigadores espanhóis cujo orientador se chama Miranda Casas. Esse instantâneo, nos inteiremos, através dos gráficos, dos resultados positivos
estudo se intitula Evaluación e intervención con niños pre-escolares con da medicação.
No entanto, é curioso, porque a conclusão que se tira olhando os
manifestaciones de transtornos por déficit de atención con hiperactividad y
conducta disruptiva. Conduta impulsiva é uma das categorias diagnósticas gráficos é que: se aos 14 meses a efetividade da medicação foi de 56%, isto
do DSM IV. quer dizer que em 44% não teve eficácia. O laboratório apresenta somente
do lado da positividade.
Antes de passar à análise detalhada desse estudo, que reúne as con-
clusões de 65 estudos realizados, quero colocar em evidência o modo de Os investigadores que encontraram, não 44%, senão menos que isso,
proceder de alguns laboratórios a respeito desta questão. O laboratório ou seja, que o medicamento não teve eficácia em 38%, dizem que isso
demonstra que o medicamento deve ser usado com muita prudência, já que
Novartis, um dos fabricantes da Ritalina, que é a medicação mais habitual-
mente usada neste suposto transtorno... Novartis Pharmaceutical Corporation não está demonstrado que tenha verdadeira eficácia. Quer dizer que para os
publica um folder de difusão, destinado a médicos, que estimula o uso da investigadores basta que em 38% não reaja para dizer que não se deve
confiar em demasia na medicação, porém, para o laboratório basta que em
Ritalina. Trata-se de um estudo realizado por MTA Cooperative Group, extra-
ído dos Archivos Generales de Psiquiatría de 1999, n°56 2.10831086 que foi, 56% faça algum efeito para dizer que o uso do medicamento é imprescindí-
por sua vez, publicado pela American Academy of Pediatrics, especifica- vel.
Os investigadores e a AAP dizem que, ainda que se possa colocar a
mente pelo sub-comitê destinado à investigação do déficit de atenção e
hiperatividade. hipótese da existência desta síndrome, a diversidade de superposições que
Devo dizer que estes estudos publicados em inglês são apresentados os signos apresentam com outras patologias levanta um interrogante sobre
sua especificidade. O laboratório não disse nada disto, senão que nas 579
por este laboratório como uma espécie de resumo estatístico do seguinte
crianças investigadas, entre sete e dez anos de idade, verifica-se a presen-
1
Seminário proferido na Argentina em Junho de 2003. Degravação, não revisada pelo autor, ça da síndrome, de uma síndrome sobre a qual os investigadores se pergun-
por Norma Filidoro.

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SEÇÃO TEMÁTICA JERUSALINSKY, A. Diagnóstico e déficit de...

tam acerca de sua especificidade. Qual será o motivo desta sutil diferença estudo pode até agora responder.” Este reconhecimento não os impede de
na apresentação dos resultados da investigação? concluir que é pertinente falar de TDAH e que é importante fazer os três
Isto coloca em evidência que o interesse que movimenta a indagação tratamentos. (segundo se lê no Abstract)
acerca de um possível modo de sofrimento das crianças, no caso dos inves- Além disso, dizem que, se fosse necessário sacrificar uma interven-
tigadores, guarda uma discrepância significativa com o motivo que o labora- ção, seria a comunitária; se tivéssemos que sacrificar duas, seria a comuni-
tório manifesta nesta divulgação. Investigadores e laboratórios não coinci- tária e a comportamental; a última a sacrificar seria a intervenção
dem em seus interesses. Há na instrumentalização das investigações um medicamentosa. E isso quando o tratamento combinado das duas terapias
mais além da intenção do investigador. Pode-se discutir a metodologia ou a não medicamentosas não apresenta diferenças significativas nos resultados
conceitualização do investigador, porém não acusá-lo da implementação “tor- obtidos, comparando com os resultados obtidos com o uso da medicação
cida” que um laboratório pode fazer de suas conclusões. somente. No entanto, a conclusão é que se deve usar o medicamento.
O primeiro a questionar é o critério com que os laboratórios difundem Metodologicamente, isto não se sustenta: não é sustentável a conclu-
este tipo de investigação. Vamos, então, analisar a metodologia e os critéri- são acerca do uso da medicação. Ou, pelo menos, não o uso isolado da medi-
os com os quais os investigadores, honestamente, tentam legitimar a pre- cação. Não se sustenta que seja apresentada como o tratamento central.
sença de uma nova síndrome com a intenção de detectá-la e curá-la. No estudo de Miranda Casas, afirma-se que o diagnóstico de TDAH
A conclusão do estudo da MTA Cooperative Group diz que “nosso não pode efetuar-se antes dos sete anos; entretanto, recomenda que o diag-
estudo tem uma série de questões que não foram respondidas, que conside- nóstico se faça antes dos sete anos, por uma razão perfeitamente plausível:
ramos fundamentais, e que são as seguintes: qualquer patologia diagnosticada precocemente tem um grau de mobilidade
-Há algumas crianças para as quais esta medicação não é persisten- maior do que se fosse diagnosticada mais tardiamente, em função disso, é
temente necessária? razoável que se recomende que o diagnóstico se faça antes. O que não
-Por que em alguns casos o uso da medicação, para obter algum parece muito razoável é que se faça antes do que se possa fazer.
efeito, tem que ser prolongado enquanto em outros casos não? Trata-se de um estudo que se dedica a validar indicadores que permi-
-As descobertas sobre as melhorias nos tratamentos combinados, no tam que o diagnóstico de TDAH se realize antes dos sete anos, e que em
caso da amostra tomada, teriam obtido igual nível de êxito sem a medica- estudos longitudinais permita a verificação da existência desta síndrome.
ção? Para verificar a existência mesma de uma síndrome, que não se pode diag-
-Qual é a proporção, no tratamento combinado, devida a uma ou a nosticar antes dos sete anos, se propõe diagnosticá-la quando ainda não se
outra coisa? pode diagnosticar, para que se verifique que o que depois dos sete existe ou
-Qual dos dois tratamentos deveria continuar para se obter resultados se supõe que exista, realmente existe.
persistentes? No que se fundamenta o diagnóstico de TDAH: em entrevistas e esca-
-Será que persistirão as melhorias registradas quando essas crianças las de estimativas preenchidas por pais e professores, técnicas para obser-
forem maiores? E se assim for será devido à medicação ou à terapia vação direta do comportamento e aplicação de procedimentos de avaliação
comportamental? centrados na criança. Ou seja, a metodologia proposta para diagnóstico é
Estudos posteriores dos nossos sujeitos, após os 14 meses, são fenomenológica, nem sequer clínica: é exclusivamente fenomenológica por
necessários para responder algumas destas perguntas críticas, que nenhum se basear na presença ou ausência de certos comportamentos.

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Assim está dito: para sua avaliação deve-se seguir os critérios Segue: “Conseqüentemente, não existe um método confiável para ava-
diagnósticos aplicáveis às crianças em idade escolar. Ou seja, para di- liar a continuidade dos problemas comportamentais precoces, nem tampouco
agnosticar TDAH em crianças em idade pré-escolar são usados os crité- é possível identificar os fatores etiológicos”. Quer dizer que a causa pode ser
rios diagnósticos aplicáveis a crianças em idade escolar. Todavia, diz o qualquer uma. “E a variabilidade das respostas das crianças às medicações
mesmo estudo, já que os pré-escolares exibem com freqüência compor- estimulantes não permite confiar plenamente em sua eficácia...” No entanto,
tamentos impulsivos apropriados para sua idade e já que estes tendem a devemos medicá-las. É quase uma religião.
diminuir na medida em que a criança adquire habilidades pró-sociais e Ninguém diria que o que dizem não tem nenhuma base, por que
assume posições frente ao mundo, necessita-se realizar comparações fenomenologicamente tem, o que acontece é que nada permite afirmar que
com esses progressos evolutivos, que os sintomas apareçam em dois as melhorias sejam próprias à administração da medicação. Não está claro
ou mais contextos, que não haja indícios de dano neurológico prévio, que a medicação seja pertinente. Além disso, na maioria das crianças em
nem um transtorno generalizado do desenvolvimento ou transtorno que a medicação produz algum efeito, deve-se esperar 14 meses para que
psicótico. Nisto têm razão. Somente deixam à margem de um diagnós- estas mudanças se estabeleçam. Em idades precoces, uma intervenção
tico diferencial as neuroses. Isto se deve a que a palavra neurose tem psicológica no prazo de 14 meses, na maioria dos casos, obtém modifica-
sido suprimida do DSM IV, o que implica uma transformação diagnóstica ções significativas.
do lado da fenomenologia, não da clínica. Quais escalas são utilizadas para esta avaliação? São utilizados três
Apesar de que para diagnosticar TDAH em crianças pré-escolares tipos de escala: o primeiro tipo são as escalas específicas de hiperatividade;
siga-se os mesmos critérios usados para as crianças em idade escolar, e o segundo são as escalas de variação situacional; o terceiro são as listas
apesar disto merecer a observação de que muitos desses comportamentos gerais de problemas. Estas listas gerais de problemas são respondidas por
são apropriados às crianças pequenas, o informe afirma: “... a utilidade des- pais e professores.
te instrumento para o diagnóstico de TDAH na primeira infância se põe em As escalas específicas de hiperatividade são muitas e diversas, po-
evidência em estudos que demonstram ser possível classificar corretamente rém pode-se sintetizá-las da seguinte maneira. A Associación de CHADD
uma porcentagem elevada de crianças hiperativas com idades entre três e mostra em sua página quais são as perguntas mais freqüentes. A primeira é:
seis anos”. meu filho tem THDA? Qualquer pai pode se fazer esta pergunta. A resposta
O mesmo estudo afirma: “... levando em conta as inconsistências a esta pergunta é: todas as crianças podem, eventualmente, ter uma ativida-
provocadas pelo amplo processo de desenvolvimento das habilidades de excessiva. Sua atenção também pode, eventualmente, ser breve. No en-
implicadas neste transtorno, damos ênfase à observação dos comportamen- tanto, se seu filho é mais ativo que outros de sua idade, então tem TDAH.
tos e das condutas não-adaptativas durante o processo de avaliação e em Este não é o único indicador, há outros: que a criança tenha esquecimentos
particular nos conceitos naturais. Atualmente, não existe um sistema de freqüentes, perca seus pertences, seja desorganizado, seja inconstante em
classificação empiricamente validado para o diagnóstico do comportamento seus pensamentos, que seu professor afirme sua dificuldade em permane-
perturbador e, mais concretamente de TDAH”. cer sentado, que não consiga esperar que suas perguntas sejam respondi-
Quer dizer que os investigadores admitem que não há um método das, que preste mais atenção ao redor que a si mesmo, que manifeste
certo, consistente com a nosologia do DSM IV, para a realização de diag- agressividade, que apresente dificuldades acadêmicas na aprendizagem da
nóstico nas crianças pequenas. língua e da matemática. Nessa página consta que, se a criança apresenta

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estas características, seus pais estão autorizados a pensar que seu filho nível de execução adulta se alcança, aproximadamente, aos 10 anos de
tem TDAH e devem levá-lo para uma avaliação. Temos aqui um resumo do idade. Somente uma minoria de estudos neuropsicológica analisou o impac-
que são as escalas específicas de hiperatividade. to do dano frontal em sua progressão através do desenvolvimento, devido à
As escalas de avaliação situacional comparam o comportamento da escassez de lesões localizadas e de ferramentas de avaliação apropriadas,
criança em diversas situações: na escola, em casa, no clube. Para os bem como à falta de parâmetros claros de avaliação e à dificuldade para criar
comportamentalistas, a situação é caracterizada pelo físico, o entorno, o tarefas que permitam avaliar a função e habilidades circunscritas à área pré-
local. Não se trata de diferentes situações em cada âmbito. O que pergun- frontal”.
tam é o mesmo em cada um desses âmbitos: na escola e em casa. Essa Apesar de todas estas afirmações, a conclusão afirma que o TDAH
escala se complementa com a de conduta para os pais: como se compor- deve-se, seguramente, a uma alteração na área pré-frontal (não havendo su-
tam os pais é o que eles fazem concretamente (não o que os inspira, seus ficientes estudos que apóiem tal afirmação).
desejos, suas intenções). A EPC tem 99 perguntas que são destinadas a Não teríamos nada contra essa circunscrição já que, seguramente,
avaliar a relação entre a competência social das crianças e o comportamen- por obra do que se chama neuroplasticidade, se houvesse alguma alteração
to de seus pais. importante na matriz simbólica que molda a maturidade do SNC, seria bem
Estas escalas se propõem a registrar condutas anti-sociais, proble- provável que pudesse vir a fabricar-se alguma disfunção cuja localização não
mas escolares, timidez, retraimento, transtornos psicopatológicos, proble- é registrável (mesmo que alguma vez pudesse chegar a sê-lo), nessa área.
mas de ansiedade, problemas psicossomáticos... Ou seja, tudo. O que fica em pé a respeito do TDAH? Certamente um grupo de boas
Na tentativa de circunscrever esta entidade nosográfica a um dano pessoas que tem uma profissão que os leva a interessar-se pelas dificulda-
neurológico específico, o seja, na tentativa anatomista este estudo, dizem o des das crianças já percebeu que quando uma criança tem problemas, eles
seguinte: “Certos estudos que tentam estabelecer os correlatos neuro- aparecem em várias áreas ao mesmo tempo. Quando uma criança tem pro-
anatômicos do comportamento em crianças com TDAH, têm sugerido que blemas é muito difícil encapsular ou delimitar esse problema a uma área
certas anormalidades na estrutura do córtex pré-frontal e suas interconexões específica. Detectado isto, supuseram que esta manifestação diversificada
com outras regiões cerebrais especificamente relacionadas com uma da dificuldade devia obedecer a uma unidade funcional de transtorno. Como
disfunção fronto-estriada, são características do TDAH. As dificuldades das se a interconexão entre estas dificuldades fosse produzida por una certa
crianças em idade escolar com TDAH parecem então estar associadas com conexão da funcionalidade de seu comportamento. Esta suposta unidade
o domínio do funcionamento da zona frontal, ou seja, a auto-regulação de funcional poderia se apoiar em dois pontos:
funções executivas como a fluidez verbal, impulsividade, perda da inibição e A atenção que, neurologicamente, desde o ponto de vista das ciênci-
manutenção da atenção, assim como a organização e monitoração da con- as básicas, ninguém sabe o que é... Tenho buscado tudo o que neste senti-
duta”. do poderia chegar a me informar, e a resposta dos neurocientistas é: “não
Entretanto, também afirma: “... mostram-se evidentes as diferenças sabemos em quê consiste a atenção”. Falo da investigação básica. Trata-se
nos comportamentos circunscritos ao funcionamento da região pré-frontal. de una investigação ou de investigadores básicos que não têm nenhum inte-
Assim, mesmo que algumas das habilidades associadas a esta região só resse corporativo, nem em capturar pacientes, nem em vender medicação.
alcancem um nível de desempenho adulto aos 12 anos, em geral apresen- No terreno da atenção, não tem havido avanços como se tem no terre-
tam seu período maior de desenvolvimento entre 4 e 7 anos, sendo que o no da memória, da percepção, da linguagem ou da sexualidade.

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Por isso, ninguém pode afirmar que o TDAH tem um correlato sas afirmações. Dividir os bons e os maus é um procedimento tão religi-
neurobiológico e o uso “experimental” da medicação tem os resultados que oso como o que eles propõem.
acabamos de analisar, ou seja, incertos, inconsistentes para afirmar conclu- Qual nosso ponto de vista nesta questão? Para apresentá-lo vou-me
sivamente que cura. reportar a três conceitos: conhecimento, memória e inteligência.
O outro ponto que permitiria supor uma unidade conceitual – algo da Vou iniciar pela inteligência.
ordem do imaginário - é a inibição: os mecanismos inibitórios de controle do É um efeito da modernidade a redução da inteligência à sua expres-
movimento. Porém, há mais: supõe-se que esta unidade funcional de contro- são lógica do real. A redução logicista da inteligência é uma obra da
le seja autônoma. Quer dizer, que não poderia alterar-se por outras causas modernidade, a partir de Descartes. Antes não existia. A inteligência foi se
senão, exclusivamente, pela alteração dessa unidade funcional mesma; ao reduzindo ao campo da lógica e da racionalidade por obra, em grande parte,
contrário, não haveria maneira de justificar um diagnóstico específico. Para das contribuições dos positivistas, especialmente Locke e Hume que de-
justificar um diagnóstico específico é necessário supor uma etiologia, e a mandaram à psicologia que construísse um corpo teórico que permitisse
etiologia supõe um ponto causal que neste caso seria esta unidade funcio- afirmar a correspondência entre o percepto (o que é percebido), o perceptum
nal. Se esta unidade funcional dependesse de outras, então, ao não ser (a representação que disso se faz) e o percipiens (o agente da percepção).
autônoma, a causa poderia estar mais atrás ou mais dispersa ou ser mais Isto é uma reivindicação dos filósofos positivistas ingleses que não encontra-
ampla. Assim, já não se justificaria o diagnóstico específico porque haveria ram na psicologia de seu tempo tal construção. É por isso que a partir de
que diagnosticar algo que englobasse também a outra causa... Ou a causa Locke y Hume e com o mesmo fundamento filosófico y epistemológico co-
que está mais atrás. meçam a surgir psicólogos ou investigadores psicológicos que buscam este
Até aqui a análise metodológica tal como a apresentam os que a casamento entre o objeto (percepto), a representação do objeto e o aparato
propõe. Agora nosso ponto de vista sobre esta questão. perceptivo. Assim surge Von2... que na segunda metade do século XIX escre-
Como anotação entre um e outro capítulo, devo dizer que é impor- ve o “Tratado de óptica”, que investiga a estrutura do olho para ver como o
tante, quando alguém faz a crítica de uma proposição psicopatológica, percipiens registra o perceptum, e avalia o nível de correspondência ou trans-
indagar no seio mesmo da metodologia de quem a propõe, porque é de formação que há entre um e outro pólo da percepção óptica. Esse tratado foi
supor que, se alguém tem alguma razão em sua contrapartida é porque publicado em 1879 apesar de que as investigações são de 30 anos antes. É
existem lacunas na demonstração do que foi proposto. Vale a pena dar- o ponto de partida de muitos estudos psicológicos como os de Wundt, Keller
se sempre a este trabalho, porque na discussão com aqueles que nos ou da teoria da Gestalt... Embora quem mais tenha contribuído na análise
propõem estas coisas (são verdadeiramente coisas), é muito importante desta correspondência tenha sido Piaget. Foi ele quem mais contribuiu para
mostrar quais são as lacunas que eles têm em sua própria metodologia, o reducionismo do conceito de inteligência a sua expressão logicista,
porque é a única chance que temos de nos fazer escutar por eles, su- controvertendo a idéia proposta por Aristóteles. Na realidade, a lógica
pondo neles uma honestidade em sua proposição. Não creio que seja aristotélica foi progressivamente se tornando desconhecida e distanciada
um bom procedimento dividir os bons e os maus e pensar que os maus pela modernidade. Para Aristóteles, a inteligência era aquilo que permitia a
são os outros e que como nós somos os bons, temos razão. Vale muito inteligibilidade do discurso segundo figura no capítulo II de seu “Organun”.
mais supor, não que todos somos bons, mas que todos somos bons e
maus ao mesmo tempo, embora isso não diga nada da verdade de nos- 2
Inaudível.

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Esse conceito de inteligência foi se dissolvendo até o ponto de hoje em dia desse teorema vou lhes mostrar um pedacinho que me parece o mais signi-
parecer muito natural assimilar a inteligência ao nível de complexidade lógi- ficativo.
ca das operações. É em função do reducionismo psicologicista que Piaget Kantor disse que há números que não se pode escrever:
tem sido muito bem acolhido na psicologia norte-americana. Essa psicolo- 1,9999999999999... Qual seria o último número que poderíamos escrever
gia não é contraditória ao comportamentalismo. Abandona a ingenuidade antes de passar do 1 ao 2? Impossível. Quer dizer: há uma lacuna. Para
skinneriana do condicionamento direto e introduz, como o neo-behavorismo, preencher esta lacuna, os matemáticos criaram algo que se chama os nú-
a lógica como intermediação. É por isso que encontramos na psicologia meros imaginários. Lacan usa esta escritura para dizer que isso é a
comportamentalista norte-americana muitas adaptações de Piaget. imaginarização do que não se pode escrever, ou seja, daquilo que sobra
Estes comportamentalistas que acabo de citar, tanto os da Academia como resto e que não temos como escrever.
Norte-americana de Pediatria como os da Espanha, utilizam neste estudo Vocês devem estar se perguntando o quê isso tem a ver com o TDAH.
conceitos piagetianos (não somente, mas inclusive) que não entram de for- Em seguida verão. Quando alguém não tem como escrever algo que lhe
ma alguma em contradição com suas afirmativas. afeta, imagina alguma coisa. Quando alguém não sabe o quê fazer, faz ma-
Desde o ponto de vista psicanalítico, a inteligência não é nem o nível gia (como diz minha pequena filha de oito anos depois de ver Harry Potter). E
de complexidade lógica da razão nem a inteligência emocional de Goleman. assim procede também a ciência; mesmo com o discurso matemático que
A inteligência, para o psicanalista, conserva todo seu sentido aristotélico: parece ser o mais isento das conseqüências deste vazio. Até mesmo o
aquilo que torna inteligível o discurso. Como é muito fácil verificar, esta ver- discurso humano que se apresenta como mais isento dos efeitos desse
são da inteligência inclui a lógica sem se resumir a ela. Apesar da pretensão resto sofre as conseqüências.
da ciência de apoiar-se na lógica matemática e nos modelos matemáticos Assim procede a ciência e creio que isso nos explica porquê estes
para deixar seus enunciados a salvo das vicissitudes do desejo, nem mes- bons investigadores no lugar onde não encontram nada, colocam algo,
mo nesse discurso (matemático) as coisas funcionam assim. Posso de- colocam um nome com a melhor das intenções de poder manejá-lo. O
monstrar isso brevemente: Lacan retoma na lógica de Russell, Pierce, Frege problema é que não sabem que estão pondo algo no lugar em que não há ou
e Kantor o tema da lacunariedade do discurso matemático. Faz isso com no lugar em que o que há não é necessariamente da natureza que eles
dupla finalidade. Primeiro para demonstrar que a suposição de que a “vida supõem, ao menos não necessariamente. A partir disso, são levados por um
emocional”, ou a lógica do desejo e a lógica da linguagem não tem um supor- suposto lógico incoercível e inquestionável a afirmar com certeza o que não
te na matemática é falsa. Não é que a vida psíquica seja ilógica e que a vida tem certeza nenhuma.
científica seja lógica, essa dissociação não existe. A segunda finalidade é No plano da inteligência ocorre o mesmo: em nossa clínica, quando
demonstrar que a ciência, por mais que se acredite isenta às vicissitudes do tropeçamos com problemas na inteligência, nos vemos na dificuldade de
desejo, não está. explicar através do reducionismo logicista o que se passa com uma criança
Vou mostrar-lhes, muito brevemente, como demonstra ... 3, um amigo que tem dificuldades de aprender ou de prestar atenção em alguma coisa. E
e colega de Kantor, que teorizou sobre os números inteiros e racionais, ou sabemos que isto excede tanto a lógica suposta da inteligência como tam-
seja, os números reais. Ele formulou um teorema que deixou Kantor louco; bém excede uma suposta lógica homóloga do SNC.
O segundo conceito é o de memória. Existem estudos acerca da
3
Inaudível. memória que distinguem quatro tipos de memória. Uma memória antiga ou

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de largo alcance, uma memória imediata, uma memória de trabalho e uma Elsa Coriat, em “Psicoanálise e clínica con bebés”, oferece uma bela
memória de processamento. Todo mundo conhece a memória de largo al- metáfora, que fala de um papel em que se escreve o desejo dos pais e que o
cance, também a imediata. A de trabalho é indispensável para levar a cabo papel que está ali, o SNC, vai dizer o que ali se escreve.
certos procedimentos que requerem a antecipação de uma tarefa; pode ar- Vamos passar à clínica: verificamos que o mais marcante na manifes-
mazenar-se ou apagar-se. Por outro lado, toda a informação passa pela tação clínica de uma criança diagnosticada com TDHA é que tem problemas
memória de processamento para ser transformada em dados armazenáveis com o conhecimento, seja esse conhecimento da ordem da organização de
ou descartáveis; é uma memória que não guarda nada; chama-se memória suas praxias, seja da ordem da aprendizagem escolar, seja da ordem de
por que contém a informação que permite a recordação acerca do sentido saber como deve compor ou organizar sua relação com os objetos e as
que deve ser processado um dado. pessoas. Quando recebemos uma criança com esse diagnóstico o que se
Esta diferenciação é útil, e não existe ainda uma expressão clínica apresenta clinicamente a nós é que tem problemas com o conhecimento. O
por que se trata de descobrimentos recentes. Assim como Lacan se deu ao quê é o conhecimento? Desde o ponto de vista psicanalítico, o conhecimen-
trabalho de incorporar à psicanálise os aportes que a lingüística to não pode estabelecer-se se o enunciado que o sustenta não tem um
contemporânea nos oferece, aumentando sensivelmente o grau de precisão estatuto simbólico. Assim vemos crianças que podem funcionar de um modo
de nossa escuta e nossas intervenções, dessa mesma maneira caberia mais ou menos adaptado ou concordante com a mecânica física das coisas,
esperar que nós, os psicanalistas, nos ocupássemos da questão da memória mas cujos enunciados não têm no discurso um estatuto de conhecimento.
à luz desses descobrimentos, assim como fez Freud em seu momento, Não podem formular sobre esse conhecimento uma enunciação que transite
transformando as teorias da memória da época. pelo campo do outro, assim a condição fundamental para que um enunciado
O importante é que, mais além da diferenciação desses quatro seja considerado da ordem do conhecimento não se cumpre, ou seja, a
modos de funcionamento da memória, ela não obedece a um mecanismo questão da verdade. Provavelmente, se fazemos uma prática puramente
inatamente fixo, senão que depende do modelamento que a matriz no âmbito da saúde, teremos um conjunto orgânico que funciona mais
simbólica lhe imponha; tanto que o modo de funcionar dessas quatro ou menos adequada e harmonicamente, mantendo um certo crescimen-
formas vai depender desta modelação. É importante considerar dessa to sustentado em tamanho e forma, bem como, talvez logremos que de-
forma porque no TDAH, justamente, um dos traços predominantes é que sordens funcionais maiores - como poderiam ser as convulsões, as
a memória falha dessas quatro maneiras - isso se consideramos as coisas contraturas ou as paralisias - se façam presentes em uma medida míni-
desde o ponto de vista funcional. Se considerarmos desde o ponto de ma. No entanto, nenhum desses procedimentos garantirá que o quê a
vista da etiologia, podemos tomar dois caminhos: ou considerar que algo criança conquiste como conhecimento ou como capacidade de funcio-
está alterado originariamente ali onde faz sede, no SNC, cada uma dessas namento físico, a ordene no campo do desejo. Ou seja, a ordene em um
formas, ou bem podemos pensar que a matriz que as organizou mudou o campo que não é nem da saúde nem da educação, mas da ordem do
rumo da memória. Obviamente que a psicanálise elege este segundo inconsciente.
caminho que, por sua vez, não se dissocia da primeira colocação, já que A articulação entre saúde e educação, desde o ponto de vista dos
hoje é perfeitamente verificável como, de um modo neuroplástico, o SNC discursos de cada uma, é impossível. Somente pode-se entender a imperio-
vai obedecer em seu funcionamento àquilo que ali se intime ou, dito mais sa necessidade da articulação entre esses dois discursos se levamos em
psicanaliticamente, àquilo que ali se inscreve. conta que eles têm efeitos na produção inconsciente que conduz ao sujeito.

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Aí é onde a articulação entre a saúde e a educação se torna não somente realiza não por uma arbitrariedade, senão em nome de uma certa ordem que
necessária, mas também viável. não é inata, e que, mesmo quando já se encontra no discurso, deve ser inscrita
Sábado passado supervisionei um caso de uma menina de 4 anos na criança. Por isso que as mães se dão a tanto trabalho! Essa modalidade,
muito falante que dizia coisas assim: “o cachorro tem o gato para que ma- esse modo de inscrição, é o que chamamos matriz simbólica, e sabemos que
mãe me dê de comer, e eu não tenho mamãe sem que os panos me vistam vai depender em altíssimo grau da formação dessa matriz o modo de funciona-
por isso...”. Um delírio não estruturado no qual era possível escutar a resso- mento do SNC, da forma de inscrição dessa matriz.
nância de frases ditas pela mãe. O que aparecia nessa enunciação era, Experiências clínicas de todo tipo nos mostram que a mudança do
primeiro, a dificuldade de saber o quê ela queria dizer e, segundo, qual era o “meio ambiente”, a mudança na proposição dessa matriz muda as coisas
estatuto de verdade disso que ela enunciava. Assim, se alguém lhe pergun- em uma criança e, como eles mesmos dizem, quanto mais cedo melhor.
tasse o que é um gato, ela respondia dizendo “pipoca bem quentinha”. Terí- Mas sabemos que fazer um diagnóstico extremamente cedo, em um
amos que averiguar se seu gato gostava de pipoca, porque então assim tempo em que não se pode fazer, acaba por fabricar aquilo que se supõe evitar.
poderíamos ver se ela não estava demasiado longe na associação daquilo Se alguém introduz o diagnóstico, se ministra a medicação precocemente e
que lhe era perguntado. Esse grau de liberdade na associação mostra que trata uma criança como se fosse “um TDAH”, ao final pode ter razão. Isso é o
não há repressão; o que falha ali é o que recorta o deslizamento da cadeia que encontramos na clínica. Por isso, o psicanalista opta por não saber. Não
significante de modo tal que ela fica obrigada em sua sintaxe a uma certa porque sejamos burros, mas por que reconhecemos que esse lugar que a
semiótica que vem do Outro (mesmo que isso pese a Chomsky). ciência preenche artificialmente está vazio e que é necessário que esteja vazio,
Chomsky tem uma frase famosa: “Idéias verdes incolores dormiam porque esse vazio cumpre uma função decisiva que é permitir que a matriz
furiosamente”, com a qual pretende demonstrar que ali todo mundo reconhe- simbólica seja tal, seja simbólica. Ou seja, que o signo lingüístico não repre-
ce uma frase, mesmo que não queira dizer nada, e que isso demonstra a sente a coisa que lhe deu origem. A coisa que deu origem a essa marca tem
existência de uma gramática generativa inata, dado que o reconhecimento que se apagar para que esse signo se torne polissêmico. Se soldarmos uma
da condição de frase pressupõe que, mesmo não dizendo nada, responda a criança a um suposto positivado de um lugar anatômico que falha, a vida dela
certas regras gramaticais. Alguém com essa mesma frase poderia dizer, à vai se desenvolver ao redor desse lugar anatômico.
luz do delírio dessa menina, exatamente o contrário: Esta frase seria consis- O quê nós, psicanalistas, inventamos? Dispositivos para deixar esse
tente com o sistema enunciativo dessa menina se alguém pudesse dizer lugar vazio. São dispositivos que não são iguais em todos os momentos da
que é possível reconhecer ali uma frase, porém a menina não pode reconhe- vida de um sujeito, porque sabemos que na infância se tramita essa inscri-
cer no que diz uma frase. Isso demonstraria que a gramática generativa não ção, esse modelamento e, na vida adulta esse trâmite está, de alguma ma-
é inata. Chomsky nunca teve nenhuma experiência com crianças delirantes. neira, concluído. Estamos dizendo que durante a infância temos chance de
Diferentemente de nós que, a partir de nossa experiência, podemos verificar direcionar as coisas para o melhor ou para o pior. Antecipar-se a uma pato-
que há crianças delirantes que não sabem que o que estão dizendo é uma logia suposta não faz nenhum favor às crianças. Refiro-me a antecipar-se
frase. Mais que isso, tampouco sabem que é uma palavra, ou que é uma letra, preenchendo um lugar quando é o sujeito mesmo que deve dar a versão a
nem onde colocar o ponto. Porque a pontuação é filha predileta da repressão, é esse encobrimento.
filha do corte que separa as coisas. Que coisas se separam em primeiro lugar? O que podemos dizer em relação ao TDAH? Podemos dizer que além
O peito da boca, a voz da boca, o olho do olhar, as fezes do ânus. O corte se das inconsistências, da falta de verificação da existência de um correlato

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SEÇÃO TEMÁTICA JERUSALINSKY, A. Diagnóstico e déficit de...

etiológico autônomo... Além da impossibilidade científica de afirmar sobre a O quê é um déficit de atenção? É não saber a que dirigir a percepção.
existência de uma unidade que permita fazer disso uma síndrome, o que Um déficit de atenção é não poder dar continuidade ao perceptum, não poder
podemos dizer é que o surgimento dessa síndrome e a proliferação de seu produzir no percepto um ato de nominação que lhe dê extensão simbólica.
diagnóstico entranha um traço iatrogênico importante na clínica para as cri- Se não tem extensão simbólica é porque este objeto não chega ao Outro,
anças. não passa pelo campo do Outro, carecendo assim de significação. É por
Não creio por isso que devamos suspender as investigações, senão isso que a criança não persiste. Nas crianças que apresentam déficit de
devolver-lhes sua seriedade e, em segundo lugar, não implementar clinicamen- atenção e hiperatividade é clinicamente comprovável que a extensão simbó-
te, nem o diagnóstico nem na estratégia de tratamento algo que não se sabe. lica está reduzida e achatada sobre a coisa. Essa é a razão, e não outra,
Então, em que pode contribuir o discurso psicanalítico para esclarecer como dizem os investigadores, de que as crianças não desconheçam ou
sobre qual conduta clínica seguir? É certo que encontramos crianças hiperativas. não recusem a presença dos objetos, mas se limitem a manuseá-los até
A fenomenologia é verdadeira: existem crianças com problemas de memória, rompê-los.
de atenção, de aprendizagem, de linguagem, com problemas psicomotores. Esta síndrome à luz da neurose não é nenhum mistério, nem nenhum
No entanto, essa fenomenologia se mostra nas crianças “suspeitosamente” descobrimento recente. Que se pretenda, no entanto, essa correlação, nem
concordantes com o que os investigadores chamam uma “dificuldade social”. um pouco comprovada, com as funções pré-frontais-e, mesmo se essa cor-
Trata-se de crianças com dificuldades para se representarem no campo dos relação se comprovasse... O quê mudaria na clínica? Em princípio parece
outros. A possibilidade enunciativa que essas crianças possuem costuma es- que nada. Assim como um comportamentalista intervém no campo da rela-
tar em questão: têm dificuldades no campo da linguagem. ção, um psicanalista também o faz. Qual é a diferença? A diferença que
O que quer dizer essa correlação, esta coincidência do diagnóstico separa o comportamentalista é que seu ato não está desenhado em concor-
de TDAH, com dificuldades no campo social? Quer dizer simplesmente que dância com aquilo que constitui a inscrição, o modelamento do SNC, e a
a instância do Outro, nessas crianças, está em questão. Aquilo que consti- posição de sujeito para que ele esteja habilitado a representar-se no discur-
tui o corte entre a coisa e o sujeito, a operação que apaga a coisa para que so. Porque seu modo de intervenção se faz objeto por objeto, ação por ação,
o sujeito possa enunciar de um modo polissêmico, o que averigua sobre a palavra por palavra... O quê quer dizer que ignora de um modo lato que os
coisa, que aquele corte que sustenta a diferença entre o verdadeiro e o falso, humanos não funcionam de um modo “monoaural”, coisa por coisa ou pala-
entre o ficcional (o que corresponde à ordem do imaginário) e a ordem do vra por palavra, mas que funcionam mais além da correspondência biunívoca
simbólico (o modo em que o sujeito mesmo se representa no outro)... esse da relação entre o signo lingüístico e a coisa. E, justamente porque funciona-
corte, falha. mos na polissemia do significante – e isso nos permite articulá-los no discur-
Será que as dificuldades sociais são uma conseqüência da síndrome, so – a coisa pouco importa.
ou será que essa dificuldade social é indicativa do ponto central da etiologia
do que ocorre com essas crianças? Colocar-se em uma posição reducionista Tradução: Fernanda Breda
e organicista é desconhecer a possibilidade, comprovada na clínica de 100
anos de psicanálise na prática com crianças, de que a não constituição da
distância do Outro por suas falhas incide nisso que não se sabe o que é,
mas que se chama de atenção.

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SEÇÃO TEMÁTICA PINHO, G. S. Hiperatividade e déficit...

HIPERATIVIDADE E DÉFICIT DE ATENÇÃO1 único sentido atribuído a essa configuração sintomática, temos como con-
seqüência o apagamento do sujeito que procura manifestar-se ao colocar a
Gerson Smiech Pinho mesma em cena.
Nesse ponto, a contribuição da psicanálise e sua articulação com o
campo da psicomotricidade tornam-se fundamentais, pois permite situar a

T
em sido cada vez mais freqüente a chegada a tratamento psicanalíti
co de crianças e adolescentes com o diagnóstico de TDAH, “Trans estrutura subjetiva em questão, para além da fenomenologia do sintoma. A
torno de déficit de atenção com hiperatividade”. sintomatologia do TDAH está associada com o tipo de quadro que, na clínica
Segundo o DSM-IV, a característica essencial desse transtorno é “um psicomotora, denomina-se “instabilidade psicomotora”. De acordo com
padrão persistente de desatenção e/ou hiperatividade-impulsividade, que é Marcelli (1998), a instabilidade motora propriamente dita, na qual a criança
mais freqüente e grave que o observado habitualmente em sujeitos de um está permanentemente em movimento, distingue-se da desatenção ou insta-
nível de desenvolvimento similar”. Entre os critérios diagnósticos assinala- bilidade psíquica. Apesar destas duas formas encontrarem-se associadas
dos, destaca-se, ainda, que o TDAH não aparece no transcurso de um trans- na maior parte dos casos, uma delas pode sobressair-se em relação à outra.
torno generalizado do desenvolvimento, esquizofrenia ou outro transtorno Mas, quais interrogações a instabilidade psicomotora coloca em jogo
psicótico, e não se aplica na presença de outro transtorno mental. em relação a constituição de um sujeito?
A partir dessa definição, chama a atenção a diversidade de situações Uma primeira questão importante, assinalada por diversos autores, é
que se apresentam sob essa denominação. Tenho encontrado desde crian- a presença permanente do olhar do Outro sobre o corpo da criança instável
ças pequenas cuja pouca atenção e grande atividade motora (típica dos pri- ou hipercinética. Bergès e Balbo, por exemplo, afirmam que “nessas crian-
meiros anos) é excessivamente intensa, até crianças e adolescentes cuja ças instáveis, a mãe assegura que, se ela deixa de olhá-la, é a catástrofe.
dificuldade de atenção relaciona-se a quadros neuróticos, psicóticos, melan- Se ela cessa de tomá-la no campo de seu olhar, de teleguiar sua hipercinesia
cólicos ou a importantes defasagens cognitivas. Tal heterogeneidade aponta em seu olhar, a partir de então seu próprio desejo será posto a descoberto e
para o uso indiscriminado desse diagnóstico, que, por tornar-se tão abrangente, é a catástrofe” (2001 p.98).
não leva em conta os próprios critérios delimitados pelo DSM-IV. Levin (1995) também sublinha a presença permanente do olhar do
Além disso, o diagnóstico de TDAH traz consigo importantes implica- Outro, dirigido ao corpo em movimento incessante da criança instável. Esse
ções terapêuticas. “Transtorno de déficit de atenção com hiperatividade” é a autor articula essa presença à fragilidade do corte que possibilitaria a sepa-
denominação que substituiu as de “Lesão cerebral mínima” e “Disfunção ração do sujeito em relação ao Outro. A criança hiperativa fica capturada na
cerebral mínima”, conservando delas o pressuposto de um déficit posição de objeto de gozo diante do olhar do Outro encarnado pelo agente
neurocerebral. Como assinala Marcelli (1998), “mesmo que os autores reco- materno. Em alguns casos de instabilidade, encontramos um estado de per-
nheçam nem sempre encontrar lesão orgânica, a existência dessas últimas manente tensão, de elevação do tônus muscular, o qual funciona como uma
constitui o a priori inicial sobre o qual é baseada a síndrome” (p. 284). espécie de “limite”, de armadura que evita a desintegração corporal.
É verdade que a dicotomia entre o orgânico e o psíquico já nos parece Para pensar o modo como se estabelece esta fragilidade e pouca
um tanto ultrapassada. Porém, se o suposto de um organismo deficitário é o diferenciação na relação com o Outro, Bergès e Balbo (2001) propõe que, no
1
caso das crianças hipercinéticas, “é bem o discurso materno que faltou” (p.
Texto publicado no Informativo da Clínica de Psicologia da UNIJUÍ, “Falando nisso”, julho/
agosto de 2005. 72). Aqui, o discurso materno é proposto como aquilo que permite situar o

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SEÇÃO TEMÁTICA PINHO, G. S. Hiperatividade e déficit...

limite em relação à excitação presente no contato corporal com a mãe e seu pais. Dessa forma, no imaginário da criança, seu corpo é sentido como es-
bebê. tranho por ser o lugar de um gozo que lhe é estranho, por ser o gozo experi-
Segundo esses autores, enquanto cuida de sua criança, uma mãe mentado pelos pais.
articula e sustenta um discurso que introduz o simbólico no toque do corpo. Fica evidente, pelas questões até aqui propostas, que, no caso das
Os cuidados corporais podem ser pensados como participando da função de crianças hipercinéticas, a atenção e a função motora encontram-se altera-
pára-excitação, ultrapassando em muito a mera constituição de um ambien- das pelo excesso de excitação decorrente da fragilidade do limite ao gozo,
te de sustentação a partir da necessidade da criança. As palavras maternas que somente a função da palavra poderia situar.
permitem encadear algo à excitação agradável experimentada pela criança e Mas de que forma poderíamos situar a importante disseminação des-
recalcar os excessos dessa excitação. sa forma sintomática, hoje? (obviamente, deixando de lado os equívocos
Clinicamente, interessa interrogarmos o destino dessa excitação, na diagnósticos assinalados no início desse escrito).
medida em que o discurso sustentado pela mãe possa ser frágil ou pouco Melman (2003) propõe algumas questões a respeito da condição sub-
presente. “Desde então se coloca a questão do déficit ou do excesso de jetiva moderna que permitem pensar a proliferação do diagnóstico de
funcionamento desencadeado por essa excitação entre uma satisfação ou hiperatividade na contemporaneidade. Segundo esse autor, o sujeito com o
um gozo que se arrisca a ser sem limite” (Bergès e Balbo, 2001, p. 73). qual lidamos, hoje, é um sujeito atópico. Isto significa que trata-se de um
Essa ausência de limite no contato corporal, geradora de tensão e sujeito que tem uma dificuldade extrema de encontrar seu lugar, que parece
excitação, pode ser pensada como presente no excesso de descarga motora não ter consistência, sem projeto fixo ou votos que lhe seriam pessoais.
da criança hiperativa. Ao longo de muitos anos, a presença dos grandes textos da cultura
Quando uma mãe grita diante de uma criança que se agita, torna-se serviram como lugares organizados pela linguagem, como Outros, que de-
cada vez maior a excitação corporal. Nessa situação, a fala da mãe, ao invés signavam o comportamento, modo de pensamento e destino dos humanos.
de ser recalcante, torna-se uma excitação verbal que acompanha ou agrava Uma das grandes características de nossa cultura atual é a queda desses
a excitação corporal da criança. grandes textos, propiciando a prevalência de um diálogo horizontal com o
Outra questão, ainda, é o interessante paradoxo apontado por semelhante, com os outros, sem levar em conta as mensagens que poderi-
Bergès e Balbo (2001), em relação às criança instáveis e hipercinéticas. am vir do Outro.
Apesar de serem desatentas, de parecerem estar “desligadas” ou “no A ausência, no tecido social, de uma referência simbólica desde a
mundo da lua” e apresentarem um excesso motor que implica em “não qual possa se situar, joga o sujeito num campo de indeterminação que con-
poderem ouvir”, estas crianças geralmente encontram-se em um estado duz a essa “atopia”, essa falta de lugar referida por Melman (2003). Para
de extrema vigilância. Assim, mostram-se atentas diante de um ruído exemplificar essa posição, esse autor menciona três casos de pacientes:
discreto que vem da rua, o qual permanece imperceptível à maioria das dois jovens que “não podem ficar em um lugar, mexem-se o tempo todo” (um
pessoas por estar em segundo plano. Como explicar essa intensa aten- deles fazendo substituições em seu trabalho, o outro através de viagens) e
ção em alguém tão “desatento”? uma criança hiperativa de três anos de idade. Para esse autor, essas situa-
A interpretação desses autores é de que essa posição de ções são o testemunho do que acontece a um sujeito que não pode encon-
hipervigilância vem de algum modo mostrar a espera de um percepto da cena trar um lugar validado na tripla dimensão do Real, em um mundo em que tudo
primitiva, cuja repetição teria como função manter e preservar o gozo dos é possível e nada vem fazer limite ao gozo.

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SEÇÃO TEMÁTICA

A hiperatividade é um sintoma que manifesta a ausência de lugar para PASSAR O SABER: UMA BREVE INTERVENÇÃO SOBRE
o sujeito e a busca feita para situá-lo. É uma tentativa de delimitar um lugar A PSICANÁLISE COM CRIANÇAS EM NOSSOS DIAS1
simbolicamente, “descolado” do olhar do Outro, que situaria um intervalo em
relação ao gozo e possibilitaria a emergência do desejo. Marta Pedó2
Em que medida poderíamos pensar a hiperatividade como uma pato-
logia típica de nosso tempo, sintoma social de nossa época, a agitar o corpo

E
ntre diferentes cenas da infância, esta breve intervenção será sobre a
das crianças de hoje? Penso que esta é uma importante questão que está clínica psicanalítica, configurando-se num pequeno recorte de um
aberta, que insiste em se fazer ouvir, apesar das tentativas de reduzir a campo bastante amplo.
hiperatividade à manifestação unívoca de um organismo deficitário. Ao con- Não é novidade dizer que as crianças não vêm sozinhas à consulta
trário, talvez possamos tomá-la como manifestação paradigmática de um com um psicanalista. Também já conhecemos o fato de que, quando os pais
sujeito, que se movimenta de maneira errante, na procura de um lugar para buscam ajuda, é porque algo não sabem – ou pelo menos pensam não sa-
si. ber, mais especificamente, não saber como fazer. Às vezes são outros que
ocupam esse lugar parental de apelo – pode ser uma professora, ou mesmo
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
um parente ou amigo preocupado, que diz aos pais “vocês têm que procurar
BERGÈS, Jean & BALBO, Gabriel. “A atualidade das teorias sexuais infantis”.
Porto Alegre: CMC editora, 2001. ajuda”.
DSM-IV. Manual diagnóstico e estatístico de transtornos mentais. Erik Porge, psicanalista, tem uma formulação muito simpática a esse
LEVIN, Esteban. “A clínica psicomotora”. Petrópolis: Vozes, 1995. respeito. Ele chama o processo de “transferência aos bastidores”3. Aos basti-
MARCELLI, D. “Manual de psicopatologia da infância de Ajuriaguerra”. Porto Ale- dores é uma expressão traduzida do francês a la cantonade. Não sei se ele
gre: Artes médicas, 1998. toma emprestado de uma frase de Lacan em Television, mas o fato é que
MELMAN, Charles. “Novas formas clínicas no início do terceiro milênio”.Porto
Alegre: CMC editora, 2003. Lacan usa essa mesma expressão4, querendo dizer que, ao falar a um público
de expectadores – como aquele do teatro ou da televisão – ele fala como se a
esmo, como se para ninguém, mas a uma personagem que não está na cena,
ou seja, com o horizonte, a perspectiva, de que alguns – poucos, mas alguns -
ouvirão. Assim, nessa fala como se a esmo, num teatro, aos bastidores, a
criança apela, pois talvez alguns – provavelmente, poucos – a ouçam.
Ora, se essa fala teria por fim que alguém a ouça, ela tem um certo
endereçamento. Este endereçamento nos interessa, aqui, com respeito à
1
Trabalho apresentado na Jornada “Cenas da Infância”, promovida pela Clínica Maud Mannoni,
Porto Alegre, 2003, e a ser publicado pela editora Unijuí.
2
Psicanalista, Mestre em Psicologia do Desenvolvimento, Membro da Associação Psicana-
lítica de Porto Alegre.
3
PORGE, Erik. “A Transferência aos Bastidores” in: Littoral: a criança e o psicanalista. Rio
de Janeiro: Cia. De Freud, 1998.
4
LACAN, Jacques. “Télévision”. Paris: Le Seuil, 1974.

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clínica, pois ele vai além do que se poderia responder com uma perspectiva cência. Durante o período da infância, portanto, o sujeito, a criança, tem para
educativa. com as ditas figuras de autoridade e cuidado – pais e educadores, privilegia-
Talvez seja neste sentido que Lacan5 acrescenta um contraponto a damente – uma relação de dependência. A criança depende do saber des-
Piaget em sua formulação do egocentrismo. Vamos situar melhor: Piaget sas pessoas; pessoas concretas que, admiradas e temidas, representam a
diz que no período pré-operatório assistimos ao fenômeno do egocentrismo autoridade e se constituem como referências a partir das quais é possível
quando, por exemplo, ao brincar, não há um diálogo recíproco entre crian- nortear-se, situar-se perante a vida. Com isto quero dizer que é necessário à
ças, mais bem elas falam do seu brincar individual em conjunto, ou mesmo criança contar com os adultos em suas diretrizes para lidar com os impasses
em solilóquio (ex: uma criança diz: “Eu vou fazer papinha prá Lalá”, e a outra da vida, sejam as pequenas tarefas do cotidiano, ou os grandes desafios
segue: “O meu carrinho é azul”, de novo a primeira: “A Lalá comeu tudinho”, antecipados, tais como “o que vai ser quando crescer”.
e a segunda: “Vrruummm... bateu!”). Se é verdade que nesses momentos a Do saber desses outros, assim, é possível assegurar-se de elemen-
criança não se dirige ao outro, o outro semelhante, também não é certo que tos-chave da sua origem, do seu lugar no mundo, do seu futuro antecipado.
não haja um Outro suposto a quem essa criança fala. Trata-se, segundo O que sabem esses outros, ou, formulando como na clínica, o que
Lacan, do Outro, interlocutor simbólico, presente na linguagem. Em outras eles se queixam de não saber?
palavras, essa fala se dirige a um outro lugar. Propomos pensar que não se trata do saber da informação científica,
Esse Outro suposto seria o interlocutor, aquele com quem se fala e do conhecimento acumulado com o estudo, mas do saber que a Função
que, tal qual no apelo aos bastidores, encontramos quando, ao caminhar- Paterna transmite.
mos pela rua absortos em pensamentos, começamos a falar em voz alta. Falamos muito, entre psicanalistas e interessados no social, há um
Um tipo de cena como esta era corriqueira outrora, mas parece vir-se subs- tempo atrás, do declínio da Função Paterna. Esse declínio – farei apenas um
tituindo pelo sujeito que caminha conversando ao telefone celular. O outro recorte dele – se revela, por exemplo, na necessidade de os pais buscarem
semelhante com quem falo no celular me dispensa o momento de solidão e o resgate de sua própria autoridade na confirmação de seu saber-fazer pelos
de diálogo interior, com o Outro. especialistas. Mais do que nunca, há especialistas em diferentes áreas do
Retomando, assim, o tipo de apelo de uma criança apresenta-se em saber científico e da saúde. Consultamos os livros, os pediatras, a Internet
geral indireto, intermediado pela angústia dos pais e educadores em suas etc para termos a confirmação, a convicção do que, há algum tempo, nossos
perguntas sobre o que fazer com o problema dessa criança, a qual parece avós encontravam na tradição. Com isto, não queremos dizer que não havia
falar a esmo. sintomas e problemas na educação de então, apenas apontamos o fato de
Um psicanalista, diante disto, primeiro escuta para pensar sobre o apelo hoje encontrarmos menos convicção sobre o que fazer. Para cada problema,
presente nas perguntas dos pais e educadores, o que pode resultar numa certa encontram-se muitas respostas diversas, em contextos diferentes, pairando
frustração para estes que, angustiados, mais bem gostariam, talvez, de rece- sempre a difícil tarefa de escolher a mais apropriada.
ber uma resposta informativa direta... Retornarei a esta questão adiante. Os pais, em busca de um saber a transmitir, encontram respostas
Ora, uma criança é um sujeito em estruturação. Desde Freud sabe- diversas.
mos que a estrutura subjetiva (neurótica ou outra) se consolida na adoles- Não é de se espantar que, num contexto assim, as técnicas educativas
5
ou a medicação surjam como saídas promissoras – é possível parar final-
LACAN, Jacques. “O Seminário: Livro XI – Os Quatro Conceitos Fundamentais da Psicaná-
lise”. Rio de Janeiro: Zahar ed., 1979. mente de se perguntar tanto sobre o que não sabemos e acalmar o apelo.

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Ou seja, no contexto da falta de um interlocutor em quem possamos deposi- Segundo Biaggi9, é um diagnóstico herdeiro do que antes se no-
tar nossa confiança – na falta de um suposto saber e na presença de muitas meava como Disfunção Cerebral Mínima, Hipercinesia ou Síndrome da
informações, qual delas escolher? O efeito de sideração diante da impossibi- Hiperatividade. O DSM III estabeleceu o Transtorno por Déficit da Aten-
lidade de apreender o que se poderia configurar como uma resposta consis- ção, colocando suas características principais como inatenção e
tente tem resposta em algo como o take it easy e seja feliz. impulsividade, percebidas como anormais do ponto de vista do desenvol-
Take it easy, uma tradição americana relativa a podermos deixar de vimento, sendo que a hiperatividade aparecia freqüentemente associada,
lado o sofrimento do questionamento e nos permitirmos ignorar um pouco. porém não essencial.
Logo somos convocados a pensar sobre o impacto norte-americano Mas é desde 1994, com o DSM IV, que se conhece Déficit de Atenção
em nossa cultura. Um de seus efeitos está claro no avanço do uso da medi- com ou sem Hiperatividade. O NIMH10 (National Institute for Mental Health –
cação no tratamento dos problemas psicológicos das crianças. EUA) sustenta a hipótese de uma afecção orgânica – de raízes biológicas –
De acordo com diversos estudos compreensivos das últimas déca- baseado em estudos sobre a atividade cerebral. Há menos atividade nas
das, a proporção de pacientes crianças, tratados com drogas psicotrópicas, áreas cerebrais da atenção nesses sujeitos. (Resta saber porque há menos
tem aumentado de modo estável6. Os diagnósticos mais freqüentes são de atividade ali.)
TDAH (Transtorno do Déficit de Atenção com Hipercinesia) e depressão. Há evidências também de prevalência nas famílias. Seu tratamento é
Tal acréscimo tem fundamentado, mesmo nos Estados Unidos, além baseado nos estimulantes ou anfetaminas – o metilfenidato, um deles, é
da preocupação, um debate acirrado sobre o uso da medicação em crian- usado em 90% dos casos.
ças. De um lado, há aqueles que argumentam que o acréscimo é relativo ao O metilfenidato traz preocupações:
conhecimento acumulado sobre os transtornos – medica-se mais, porque se É uma anfetamina (estimulante parente de cocaína que alguns adver-
conhece mais e melhor, dizem. De outro, há muitas questões relativas à tem como potencialmente aditivo 11, embora outros refiram-se a ele como
medicalização excessiva. comprovadamente não aditivo 12 );
Por exemplo, em 20007, a então primeira dama Hillary Clinton lançou
uma campanha nacional, em pronunciamento pela TV, alertando a popula- 9
BIAGGI, 1996, in: RODULFO, M. P. “La generalizacion en el diagnostico y sus riesgos: el
ção sobre o uso do metilfenidato8 em crianças com idade até 4 anos. A sua caso del ADD/ADHD”. www.estadosgerais.com .
10
questão era se esta medicação não estaria sendo usada para sintomas pró- Informações disponíveis em www.nimh.nih.gov/publicat/adhd/cfm
11
Patrícia O´Meara, em matéria para a Revista Insight 20 de Junho de 2000, refere o que a
prios à infância. Organização Mundial da Saúde, trinta anos atrás, publicou sobre a Ritalina, classificando-a
Os sintomas de que se fala e que preocupam estão no conhecido de “farmacologicamente similar à cocaína em seu padrão de abuso, a Ritalina foi classificada
como aditiva”, in: “Psychotropics” (2000), Studies in Reformed Theology, vol 11 nº.1,
Transtorno do Déficit de Atenção com Hipercinesia, uma síndrome que mu- www.reformed-theology.org. Encontramos também no artigo “Ritalina”, disponível em
dou de definições através da história. www.taps.org.br, que a composição da Ritalina, cloridrato de metilfenidato, produz o efeito
da cocaína, sendo a fonte ali citada o Journal of Neuroscience, 2001, 21: RC121.
12
A AAP, Academia Americana de Pediatria, em suas recomendações aos pediatras, indica
6
ZITO, J. M. et allii. “Psychotropic Practice Patterns for Youth: a ten year perspective.” in: o tratamento medicamentoso (prevalentemente a ritalina) além do tratamento comportamental,
Archives of Pediatrics & Adolescent Medicine. Jan 2003; 157:17-25. Disponível em: como tendo tido bons resultados, para esta condição que se toma como crônica até a
www.archipedi.ama-assn.org adolescência, cuja abordagem diagnóstica deve ser muito cautelosa. Adverte-se que ainda
7
www.clinton4.nara.gov/WH/EOP/First_Lady/html/columns/2000/hrc03222000.html não há dados de investigações a médio e longo prazo a respeito deste diagnóstico. Ver
8
Ritalina em seu nome comercial. “Clinical Practice Guideline – Treatment of the School-Aged Child with Attention-Deficit/
Hyperactivity Disorder”. October, 2001, vol 108, n. 4. in: www.aap.org )

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SEÇÃO TEMÁTICA PEDÓ, M. Passar o saber: uma breve...

Está sendo usado em crianças pequenas (época em que o cérebro O apelo de uma criança com medo (no meio da noite ou em outro
em formação poderia sofrer modificações permanentes ainda não estudadas momento) requer uma resposta que assegure. O lugar de pai que assegura
– simplesmente porque essas crianças ainda não cresceram13); requer uma pessoa que o encarne – uma pessoa em carne e osso precisa
É possível que as crianças e jovens medicados passem mais facil- transmitir essa segurança.
mente a atos violentos? Pergunta uma investigadora14. Nos EUA, é ampla- A questão que se coloca para nós é de como operar nesse espaço
mente mais usado por populações menos favorecidas sócio-economicamen- entre a criança que apela e aquele que diz “não sei mais o que fazer”. Este
te, com pouco acesso a outros modos de tratamento; pode ser a mãe, o pai, a professora, que, ao escutar essa “fala a esmo”,
O interesse mercadológico das indústrias farmacêuticas 15 deve sem- percebe que algo não vai bem, mas não entende.
pre ser lembrado enquanto objeto de questionamentos pela população; Em relação à hiperatividade, podemos lembrar a abordagem psicana-
O que chama a atenção é a preocupação tanto de defensores como lítica de Jean Bergès 17, que coloca que é o olhar do Outro primordial que
de críticos no debate quanto ao diagnóstico do transtorno do déficit de aten- marca o sujeito em sua motricidade e na relação com o mundo do espaço e
ção. Os sintomas “normais” da infância poderiam estar sendo tomados como dos objetos. Segundo ele, o olhar do Outro primordial – a mãe, mais
doença? freqüentemente – vai delinear para a criança o espaço a ser conquistado, e
Dentre os colegas psicanalistas, temos falado dessa questão, ocupa- como uma criança hipercinética fica presa e prende o olhar desse Outro, que
dos com uma que parece correlata – a dos diagnósticos freqüentes de depres- precisa não deixar de olhar para ela, pois vai esbarrar em alguma coisa e
são. Ambos, depressão nos adultos e déficit de atenção nas crianças, pare- quebrar, vai-se machucar, vai colocar a si ou ao outro em perigo. Trata-se,
cem ser o mot do momento, com a facilidade da alternativa medicamentosa resumidamente, de uma relação em que o Outro primordial, a mãe, sente-se
apontando para uma cultura que tende a não tolerar nenhuma dor. permanentemente em alerta, e o filho permanentemente em observação – o
No horizonte da boa saúde16, o sofrimento tende a ser banido (pela que resulta no pouco espaço de possibilidade de separação de um e outro,
medicação); assim, por que é preciso mudar qualquer coisa, mesmo que pouco espaço, também, para a internalização, seja do lado simbólico de
não esteja bem? evocação de memórias e constituição de uma história (saber inconsciente),
Lembro-me do pai de um menino que passava por um período de insô- seja do lado simbólico da aprendizagem (saber da ciência).
nia (o menino). Esse pai me dizia: “O problema é que eu não suporto... Para concluir, gostaria de salientar que o saber de que se trata de
preciso consultar um médico, pois quero pelo menos ter a possibilidade do passar – na clínica e na educação – não é aquele da ciência, do conheci-
uso da medicação”. Ou seja, é preciso ter a certeza de que no horizonte não mento, o qual, embora legítimo, não responde ao apelo de saber quem se é.
há sofrimento. Em outras palavras, trata-se de buscar transmitir o saber inconsciente que
oportuniza a uma criança encontrar as referências que vão orientá-la na vida,
13 seja para construir conhecimento, seja para construir os alicerces de sua
Ver “Chemical Kids” in: www.csmonitor.com.
14
Patrícia O´Meara in “Psychotropics”, Studies in Reformed Theology, vol 11/n.1, subjetividade.
www.reformed-theology.org, 2000.
15 17
Há dois processos coletivos – um na Califórnia e outro em N. Jersey – com base na idéia BERGÈS, Jean. “O Corpo e o Olhar do Outro” in: Escritos da Criança. Porto Alegre: Centro
de um diagnóstico criado para promover o uso do medicamento, conforme o artigo “Ritalina” Lydia Coriat, 1979.
disponível em www.taps.org.br, cuja fonte referida é British Medical Journal, 2000, 321:723.
16
LESSA, Fellipe. “Psicotrópicos, masoquismo e transferência: duas observações.” In:
www.estadosgerais.org , 1999.

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SEÇÃO TEMÁTICA TALLIS, J. Sobre o diagnóstico...

SOBRE O DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL DO anos, toda criança que se portava mal ia ao psicólogo; hoje, toda criança que
TRANSTORNO POR DÉFICIT DE ATENÇÃO se porta mal vai ao neurologista como primeira opção da escola, provavel-
mente porque os psicólogos não sabiam solucionar o problema ou precisa-
Jaime Tallis 1 vam de muito tempo para fazê-lo, e a expectativa de poder resolver facilmen-
te com uma pílula é bastante tentadora para os docentes. Além disso, deve-
se levar em conta que existe uma pressão sutil da indústria farmacêutica

P
ara abordar a questão daquilo que as crianças nos mostram nos
para colocar seus produtos 2.
diagnósticos atuais, gostaria de começar perguntando por algo que
está sempre em evidência: O que é? O que significa? Como é diag- Isto quer dizer que se deve chegar ao diagnóstico desse quadro atra-
nosticado? Como é feito um diagnóstico diferencial do Transtorno por Déficit vés de um trabalho interdisciplinar e, fundamentalmente, diferenciando o que
é Transtorno por Déficit de Atenção (como doença) de tomar uma criança
de Atenção?
Conhecido por suas siglas em inglês de A.D.(H).D., este é um caso que não tem atenção (com ou sem hiperatividade como sintoma) e dar a isso
bastante questionado, pois realmente se passa da negação da existência – a entidade de doença. Para que possamos colocar o Transtorno por Déficit
de Atenção dentro de um quadro neurológico, devemos determinar que sabe-
quando se tem uma visão muito psicologista – até diagnosticar como Trans-
torno por Déficit de Atenção a qualquer criança que se mova um pouco de- mos que há uma etiologia provável, uma fisiopatologia e uma resposta tera-
mais – quando se tem uma visão muito organicista. pêutica comum a todos os que têm este quadro.
Nossa exposição é que o sintoma de desatenção e hiperatividade se
As últimas hipóteses explicam que o Transtorno por Déficit de Aten-
ção é um caso que tem origem neurológica, provavelmente por uma altera- apresenta em uma série de patologias, sem se constituir no quadro de déficit
ção na neurotransmissão, e que muito dos casos têm alguma base genéti- de atenção como doença. Uma pessoa pode ter febre porque tem um quadro
gastro-intestinal ou pulmonar, porque tem uma angina ou porque tem uma
ca. Por outro lado, é necessário esclarecer que não existe nenhum tipo de
marcador biológico que possa definir e dizer com absoluta certeza que uma meningite; a febre é um sintoma, então o assunto é como localizar esse
criança tem Transtorno por Déficit de Atenção, nem sequer os famosos sintoma e chegar, a partir dele, à origem. A mesma coisa ocorre com a
tosse: pode ser uma pneumonia, pode ser um problema esofágico, ou seja,
mapeamentos, nem as ressonâncias, nem nada que o indique com certeza.
Como há uma tendência ao sobre-diagnóstico, há um excesso de pacientes a tosse também pode ser tomada como sintoma e não ser uma doença.
diagnosticados como tais. Então, quando o sintoma é atacado do ponto de vista terapêutico (como
seria com todas as doenças), o que acontece é que se acaba por esconder
Por que há um excesso de diagnóstico? Por uma variedade de ra-
zões. Por um lado, uma tendência dos médicos a biologizar os quadros; por a origem do quadro. Quer dizer, se quando uma pessoa é diagnosticada por
outro lado, uma tendência das escolas, dos professores de “patologizar” os desatenção e ela vai diretamente à terapêutica com medicamentos, sem
explorar exatamente qual pode ser sua origem, a origem do quadro acaba
transtornos de conduta e de aprendizagem que os alunos possam ter. Há 20
por ser ocultada, às vezes com conseqüências muito graves, pois há patolo-
1
Neuropediatra. Coordenador da equipe interdisciplinar em Aprendizagem e Desenvolvi-
mento do Hospital Carlos G. Durand. Docente substituto de Pediatria na UBA e Titular de 2
Neurobiologia da Universidade de Salvador. Este texto foi escrito a partir de uma conferência Quando há um congresso em que nos preparam um lunch, a primeira coisa que penso é
proferida em maio de 2005 no ciclo do Seminário “Diagnósticos na infância: problemáticas que querem me vender; a indústria farmacêutica tem que trabalhar para isso, de fato é uma
atuais” – Abordagens interdisciplinares de temas cruciais – Apresentação de casos clíni- das mais importantes das indústrias mundiais, depois da do petróleo. O importante é que nós
cos, organizado pelo Centro Dos. saibamos tomar o que nos dão e poder pensar nisso.

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SEÇÃO TEMÁTICA TALLIS, J. Sobre o diagnóstico...

gias muito severas cuja manifestação inicial pode ser a desatenção e/ou Quando discutimos na equipe e nos trazem o Teste de Bender e nos
hiperatividade. dizem “o que vocês acham?”, podemos ver que está mais perturbado o
A incidência do Transtorno por Déficit de Atenção não passa de 3 ou perceptual, o executivo. É muito difícil pelo resultado antecipá-lo, mas ao pôr
5%. Isto, ao ser comparado com dados das escolas onde a metade das à prova podemos nos dar conta de quais são as dificuldades que se tem para
crianças está tomando “metilfenidato”, nos dá idéia da magnitude do sobre- reproduzir o teste. Como? Muito simples: pela auto-crítica. A criança que
diagnóstico. Nós temos um caminho de diagnóstico que passa fundamental- tem um problema na execução, mas percebe bem, tem auto-crítica daquilo
mente por uma equipe que vai à escola, que trabalha com os pais, onde a que produziu, e vai pedir “me dá outra folha que fiz errado. Posso fazer de
criança é acompanhada por distintos profissionais. novo?”; em troca, uma criança que percebe mal, e o que produziu é tal qual
A história do ADD não foi inventada há 10 anos. Os primeiros diagnós- o que percebeu, então, para ela está tudo bem.
ticos são do século passado; logo, toda sua passagem pelo período da Com relação ao Wisc, nós estabelecemos que o quadro tem uma
Disfunção Cerebral Mínima nos deixou uma imagem a mais do problema da inteligência normal, mas há uma defasagem entre as escalas. O Wisc é
conduta e da inteligência. Em nossa equipe nós estabelecemos o que se muito significativo, as escalas que têm a ver com a execução estão muito
chama Transtorno da Função Executiva; critica-se, novamente, o diagnósti- mais descentes que as que têm a ver com a produção verbal, é tudo ao
co a partir da observação dos sintomas e se conclui que este não dá conta contrário do que acontece com as crianças com disfasia, onde os transtor-
de alterações cognitivas mais gerais que tem a criança com Transtorno por nos da linguagem fazem com que tenham uma pontuação muito baixa na
Déficit de Atenção. escala verbal e uma melhor na de execução. Segundo nossa proposição do
A partir dessa concepção de transtorno, nós utilizamos muito o que Transtorno com Déficit de Atenção, para uma criança será muito difícil fazer
se chama abordagem neuropsicológica. Há uma equipe que trata de explorar os labirintos e, nessa ordem, insisto em que a inteligência não tem nada que
como é o funcionamento, como é processada a informação, como se usa a ver com isto. Contudo, a partir daí, pode-se perceber que muitas crianças
percepção, etc. fazem somente reproduzir situações escolares, mas a abordagem de saber
Na prática psicopedagógica, especialmente, há duas provas que são se uma criança é inteligente passa por muitos outros cenários que não têm
sempre utilizadas: o Teste de Bender e o Teste de Inteligência Wisc, que cons- a ver exclusivamente com um teste.
tituem o primeiro caminho percorrido para abordar este tipo de questões. O Agora lhes apresentarei diferentes casos de nossa casuística do Hos-
Bender sempre dá patológico em uma criança com síndrome de desatenção (já pital Durand, de pacientes que consultaram por Déficit de Atenção e
que não se pode morrer por desatenção, ou porque aparece um mecanismo de Hiperatividade e que tinham passado pelo diagnóstico de Transtorno por Déficit
querer compensar a desatenção da qual a criança está consciente, através do de Atenção como doença.
que se chama “perseverança”, ficar muito fixado). Esta é a criança que começa
com os pontos na folha e os termina na parede, faz e faz os pontos à parte do Vinhetas clínicas
lugar que pode, porque tem problemas perceptuais, de reproduzir adequada- Caso 1
mente a gestalt, porque a está percebendo mal. Além disso, tem transtornos Trata-se de um menininho com transtorno autista. Observa-se o grau
na execução, tem uma lerdeza da motricidade fina que é vista nos traços. Isto de atividade que desenvolve em uma primeira consulta, tem outros indicado-
acontece em diferentes áreas, porque cada criança é diferente e cada criança res, mas o sintoma que apresenta – pelo que veio consultar – é falta de
contribui com um saber distinto. atenção e constante hiperatividade.

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SEÇÃO TEMÁTICA TALLIS, J. Sobre o diagnóstico...

Caso 2 pêutica, porque de algum modo será tratado da mesma maneira. Isto tem a
Este menino tinha um jogo bastante persistente: ele se cobria com ver com a resposta que busca a família e quanto há de narcisismo do neuro-
uma caixa, dava a volta e apontava um revólver ao pai, e isso nos chamou a logista para querer chegar à última instância do diagnóstico. No entanto,
atenção. Logo concluímos que era um caso de violência familiar, uma crian- existem duas situações nas quais deve-se extremar a busca do diagnóstico:
ça que apresentava uma série de sintomas e tínhamos que diagnosticar uma é quando se supõe uma causa hereditária, pois, primeiramente, deve-
realmente do que se tratava. O que quero concluir é que, se uma pessoa se mos fazer um adequado conselho genético, e teríamos que informar à família
fixa exclusivamente ao sintoma, sem indagar e abordar clinicamente à crian- a probabilidade que tenham outro filho com as mesmas características.
ça e à sua família para chegar ao fundo do problema, nestes casos talvez o Este caso que lhes apresentarei é um fracasso do conselho genético,
diagnóstico de base não resulte tão grave se demorar muito para encontrá- quer dizer, como uma doença que conhecíamos muito bem, uma doença
lo. Contudo, em outros casos, aceitar o tema da violência familiar ou dar bastante enganadora, porque simula distintas formas de apresentação da
diretamente a medicação ou não ir a fundo pode trazer conseqüências para fragilidade do cromossomo X, e que hoje sabemos que é a causa mais co-
a criança e para a família. mum do retardo mental hereditário. A causa mais comum de retardo mental
Caso 3 genético é a Síndrome de Down, mas o Down não é hereditário. Ele tem a
O quadro desta criança que lhes apresentarei, falando de novos diag- probabilidade de se repetir somente em 5% de casos bastante definidos,
nósticos, e como trabalhar com o diagnóstico diferenciado, tem a ver com os pois há três formas de Down; contudo, sempre há alguém portando a fragili-
tiques. Eles têm diferentes origens: há tiques que são transitórios da infân- dade do cromossomo X, e geralmente é a mãe. Habitualmente, o quadro se
cia, que têm a ver, geralmente, com situações de neurose, e não com pato- faz expressivo no sexo masculino, embora saibamos que também pode es-
logias de origem neurológica. Há tiques que são permanentes e que adotam tar na mulher. Então, esta é uma família na qual o conselho genético fracas-
certos tipos de características, condutas em que existem diversos tipos de sou, isso que eu queria considerar.
movimentos que vão se modificando, e há participação da função fonatória, Nesta família, encontramos quatro membros com a fragilidade do X:
que são parte de uma doença que se chama Síndrome de Gilles de la Tourette se houvessem feito o diagnóstico do filho mais velho, a mãe teria decidido
– também se apresenta em forma de hiperatividade e desatenção, e é um (ou não) ter mais filhos, sabendo que havia a possibilidade dos filhos, se
diagnóstico diferenciado frente ao diagnóstico por Déficit de Atenção. Co- fossem homens, portarem a fragilidade do cromossomo X. Eu digo que é
mento sobre a Síndrome de Tourette para mostrar o que são tiques comple- uma doença bastante simuladora porque está associada a doenças da lin-
xos. Este é um caso bastante simples porque um médico não pode errar guagem muito importantes, e vincula-se também com o transtorno autista, e
clinicamente, mas às vezes não é tão simples diferenciar se há um transtor- também com a psicose infantil; é muito difícil pensar, no início, que a criança
no emocional que origina os tiques ou se são parte da Síndrome de Tourette. tem uma fragilidade do X.
Caso 4 Eu disse que havia duas instâncias nas quais era imprescindível che-
Um tema a considerar é o retardo mental. É muito difícil explorar suas gar ao diagnóstico causal: uma é, como acabo de explicar, quando se sus-
causas dentro da neurologia, pois, por um lado, algumas técnicas são muito peita que poderia haver uma causa hereditária. O outro caso é quando se
invasoras, outras muito complexas e custosas para serem realizadas em pensa que a doença é progressiva, ou seja, que há chances de que não seja
âmbitos hospitalares e, por outro lado, sabe-se que, em muitos casos, poder uma doença fixa, e sim que com o tempo os sintomas vão se aprofundando,
chegar à causa do retardo mental não afeta a evolução e a abordagem tera- pois o médico deve advertir à equipe e à família que a criança vai à deteriora-

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ção progressiva, independentemente de qualquer estratégia terapêutica que Pouco tempo depois de a psicóloga e o musicoterapeuta começarem
se monte, pois a doença seguirá produzindo danos na medida em que trans- a trabalhar com ele, a mãe nos relatou uma convulsão que nós não conse-
corra o tempo. A maioria das doenças que levam ao retardo mental são guimos notar. Foi feito um eletro-encefalograma, que não resultou em nada
doenças fixas: aconteceu e criou-se o dano. importante; a tomografia mostrava uma área bastante difusa, e decidimos
No entanto, há um grupo de doenças que têm este tipo de deteriora- medicá-lo mesmo assim, sobre a base do relato da mãe. Em pouco tempo,
ção, que se caracterizam porque geneticamente falha uma enzima e o cami- a mãe relatou que houve outra convulsão, voltou-se a estudar o problema,
nho metabólico fica interrompido. Patologias diagnosticadas como “Erros mas sem conseguirmos nenhum resultado significativo. A mãe começou a
congênitos do metabolismo”, que em seu conjunto somam 5% dos retardos nos dizer que o menino caía, e voltamos a fazer agora não uma tomografia e
mentais. Há uma substância que vai se acumulando na medida que trans- sim uma ressonância, que também não nos ajudou muito. Enfim, a mãe nos
corre o tempo e cada vez vai produzindo mais danos; o paradigma desta contava coisas que nós não víamos.
doença é a “fenilcetonúria” – na Argentina, obrigatoriamente por lei, deve-se Em uma reunião de equipe, discutindo o caso, fizemos uma hipótese
examinar todas as crianças recém-nascidas para comprovar se padecem ou diagnóstica: podia ser uma Síndrome de Munchausen. Esta síndrome é uma
não desta doença. A fenilcetonúria é a mais freqüente deste grupo e, se forma de abuso na qual os pais utilizam a equipe médica para infligir agres-
detectado que o recém-nascido não tem essa enzima, pode ser evitado o sões à criança: estudá-la mais, picá-la mais, anestesiá-la. Justificamos nos-
dano, quer dizer, não será dada a ele a substância que não pode se degradar sa opinião porque, quando o menino vinha, não percebíamos nada, e a mãe
(neste caso, a fenilalanina) e são evitadas as conseqüências. Neste grupo nos contava que cada vez mais havia convulsões; então ficamos justamente
há outras doenças que, embora sejam diagnosticadas com antecedência, com essa hipótese, confundir o Transtorno do Desenvolvimento com uma
não podem ser evitadas, já que não se pode deixar de lhes dar essa substân- Síndrome de Munchausen. Por um tempo o perdemos de vista, até que,
cia porque é imprescindível, ou porque o organismo a sintetiza por si só. depois de um tempo recorrendo a outros serviços, a mãe voltou a nos procu-
Caso 5 rar, mas já era outro menino, ou seja, não era o quadro que havíamos visto
Com estas crianças nos enganamos no diagnóstico, pois não pensa- um ano antes. Houve uma deterioração importante nesse ano, e realmente
mos que pudessem ter uma doença progressiva; listamos, a princípio, um aqui nos sobrava somente a possibilidade de agredi-lo mais. Fizemos uma
diagnóstico, pensando que provavelmente havia muito do emocional no qua- biópsia muscular e então obtivemos o diagnóstico: tratava-se de uma doen-
dro, e logo finalizou com uma deterioração progressiva. ça muito rara que integra o grupo dos “Erros Congênitos do Metabolismo”.
Tratava-se de um menino de três anos que não falava, que tinha algu- Neste caso, o caminho era inexorável, quer dizer, não havia maneira
mas atitudes de isolamento, “ficava olhando o ventilador ligado”, também de detê-la, pois se tratava de um quadro para o qual não existe terapêutica
com hiperatividade, que não tinha jogo simbólico. Era uma família um pouco possível. Contudo, penso que é uma questão ética poder antecipar o proble-
complicada. De fato, este menino era produto de um segundo casamento e ma aos pais e à equipe. Muitas vezes, quando uma pessoa trabalha em
a mãe ficou grávida dele depois que a filha do primeiro casamento engravidou, equipe, o terapeuta que se envolve com estas crianças tem que poder esco-
ou seja, ele era menor que o sobrinho, e o primeiro esposo desta mulher (não lher se pode ou não trabalhar com uma criança que vai à deterioração pro-
o pai) estava permanentemente presente. Era uma mãe com características gressiva. São poucos os quadros metabólicos nos quais se pode intervir. Um
especiais. Portanto, pensamos que este caso podia ter uma base emocio- é o da fenilcetonúria, com um diagnóstico antecipado; o outro, talvez, é o do
nal. filme “O óleo de Lorenzo”, na qual o pai do menino (que tinha uma doença

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SEÇÃO TEMÁTICA SEÇÃO DEBATES

que lhe impedia metabolizar óleos) gera um óleo que o menino podia ingerir, CONSENSO DE ESPECIALISTAS DA ÁREA DE SAÚDE
adiando, assim, a progressão da doença. Quer dizer, com algumas doenças SOBRE O CHAMADO “TRANSTORNO POR DÉFICIT DE
se consegue, mas na maioria dos casos não há possibilidade de reverter a ATENÇÃO COM OU SEM HIPERATIVIDADE”1
situação.
O que eu quis mostrar através destes casos é que um paciente pode Gisela Untoiglich2
apresentar sintomas parecidos que podem ser parte de diversos quadros.
Para que haja menos enganos deve ser uma equipe que enfoque, não

A
ssistimos, em nossa época, a uma multiplicidade de “diagnósticos”
dogmaticamente, mas com uma abertura, com um olhar nem muito organicista
psicopatológicos e de terapêuticas que simplificam as determina
nem muito psicologista, que trate de encontrar uma unidade, de maneira que
ções dos transtornos infantis e retornam a uma concepção
cada um, a partir de seu olhar, dê sua contribuição e a equipe possa encarar
reducionista das problemáticas psicopatológicas e de seu tratamento. Esta
um diagnóstico adequado.
concepção utiliza, de modo singularmente inadequado, os notáveis avanços
no terreno das neurociências para derivar dali, ilegitimamente, um biologismo
Destaques
extremo que não dá valor algum à complexidade dos processos subjetivos
A incidência do Transtorno por Déficit de Atenção não passa de 3 ou
do ser humano. Procedendo de maneira sintética, esquemática e carente de
5%. Isto, ao ser comparado com dados das escolas onde a metade das
verdadeiro rigor científico, fazem-se diagnósticos e até postulam-se novos
crianças está tomando “metilfenidato”, nos dá idéia da magnitude do sobre-
quadros a partir de observações e agrupamentos arbitrários de traços, com
diagnóstico.
freqüência, baseados em noções antigas e confusas. É o caso da denomi-
O sintoma de desatenção e hiperatividade se apresenta em uma série
nada síndrome de “Déficit de atenção com ou sem hiperatividade” (ADD/
de patologias, sem se constituir no quadro de déficit de atenção como doen-
ADHD).Este diagnóstico geralmente se realiza com base em questionários
ça.
administrados a pais e/ou professores, e o tratamento que se costuma indi-
car é: medicação e modificação comportamental.
O resultado é que as crianças são medicadas desde idades muito
Tradução: Norton Cezar Dal Follo da Rosa Junior precoces, com uma medicação que não cura (administrada de acordo com a
situação, por exemplo, para ir à escola) e que em muitos casos oculta

1
Documento dirigido ao Ministério da Saúde da Argentina, em junho de 2005, elaborado e
assinado por profissionais de reconhecida trajetória no campo da psicologia, psiquiatria,
neurologia, pediatria, psicopedagogia e psicomotricidade. Participaram em diferentes etapas
e níveis na elaboração deste documento os seguintes profissionais: Beatriz Janin, Silvia
Bleichmar, Ricardo Rodulfo, Marisa Rodulfo, León Benasayag, Jaime Tallis, Juan Carlos
Volnovich, Mónica Oliver, José R. Kremenchusky, Mario Brotsky, Héctor Vázquez, Maril ú
Pelento, Sara Slapak, Isidoro Gurman, Estela Gurman, María Cristina Rojas, Silvia Pugliese,
Gisela Untoiglich, Alicia Stolkiner, Miguel Tollo, Jorge Garaventa, Isabel Lucioni, Mabel
Rodríguez Ponte e Rosa Silver.
2
Publicado em Diagnósticos en la infancia: en busca de la subjetividad perdida, Untoiglich,
Gisela (Coord.), Buenos Aires/México: Ediciones novedades educativas.

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SEÇÃO DEBATES UNTOIGLICH, G. Consenso de especialistas...

sintomatologia grave, a qual eclode a posteriori ou encobre deterioração apontada como fracassada, ali onde é exposta ao olhar social. “Ele não
que se aprofundam ao longo da vida. Em outros casos, exerce uma pseudo presta atenção na aula”, aparece como uma queixa reiterada dos adultos,
regulação do comportamento, deixando, por sua vez, a criança liberada que englobam com essa frase grande parte das dificuldades escolares.
a posterior impulsividade na adolescência, em razão de que não exerce Há escolas primárias nas quais uma quantidade alarmante de alunos
modificações de fundo sobre as motivações que poderiam regulá-las, está medicada por ADD, sem que sejam formuladas perguntas sobre as
dado que tanto a medicação quanto a modificação comportamental ten- dificuldades que apresentam os adultos da escola para conter, transmitir,
dem a silenciar os sintomas, sem perguntar-se o que é que os determi- educar e sobre o tipo de estimulação a que estão sujeitas essas crianças
na, nem em que contexto se dão. E, assim, podem pretender parar as dentro e fora da escola. Quer dizer, supõe-se que a criança é o único ator no
manifestações da criança sem modificar nada do contexto e sem mergu- processo de aprender.
lhar no psiquismo da criança, em suas angústias e temores. Então, o Pensamos que as crianças que não podem sustentar a atenção com
primeiro que se faz é diagnosticá-la de um modo invalidante, relação aos conteúdos escolares, que não permanecem sentadas na classe
incapacitante, com um déficit pela vida, logo é medicada e se tenta mo- ou que estão alheias, como “em outro planeta”, expressam através desses
dificar seu comportamento. Assim, rotula-se, reduzindo a complexidade comportamentos diferentes conflitos.
da vida psíquica infantil a um paradigma simplificador. No lugar de um Em uma época em que os adultos estão em crise, este tipo de trata-
psiquismo em estruturação, em crescimento contínuo, em que o conflito mento passa por cima da incidência do contexto, apesar das investigações
é fundante e em que todo efeito é complexo, se supõe, exclusivamente, que demonstram a importância do âmbito em que a criança se desenvolve.
um “déficit” neurológico. Na medida em que o ser humano é efeito de uma história e um con-
Temos nos encontrado com crianças em que se diagnostica ADD texto, impossível de ser pensado de forma isolada, temos que pensar tam-
(ou ADHD) quando apresentam quadros psicóticos, outras que estão em bém em que situações, em que momento e na presença de quais pessoas
processo de luto ou que sofreram mudanças sucessivas (adoções, mi- se dá este funcionamento. A família, fundamentalmente, mas também a es-
grações, etc.) ou é habitual também este diagnóstico em crianças que cola são instituições que incidem nessa constituição. Instituições marcadas,
foram vítimas de episódios de violência, inclusive abuso sexual. Ao mes- por sua vez, pela sociedade a que pertencem.
mo tempo, os meios de comunicação falam do tema quase como se As crianças desatentas e hiperativas dão conta de algo que ocorre em
fosse uma epidemia, divulgando suas características e os modos de nossos dias? Pais excedidos, indiferenciados, pais deprimidos, professores
detecção e tratamento. Assim, banaliza-se tanto o modo de diagnosticar superados pelas exigências, um meio em que a palavra foi perdendo valor e
como o recurso da medicação. No extremo, qualquer criança, pelo sim- com normas que costumam ser confusas... incidirão na dificuldade para pres-
ples fato de ser uma criança e, portanto, inquieta, exploradora, que se tar atenção na aula?
movimenta, torna-se suspeita de sofrer de um déficit de atenção, ainda Tampouco se levou em conta a grande contradição que é gerada entre
quando que muitíssimas dessas crianças exibam uma perfeita capaci- os estímulos de tempos breves e rápidos aos quais as crianças vão se habi-
dade de concentração quando se trata de algo que lhes interessa pode- tuando desde cedo com a televisão e o computador, onde as mensagens
rosamente. costumam durar uns poucos segundos, com predomínio do visual, e os tem-
Sabemos que os problemas de aprendizagem costumam ser motivos pos mais longos do ensino escolar centrado na leitura e escrita, aos quais
de consulta muito freqüentes e que complicam a vida da criança, enquanto é as crianças não estão em nada habituadas.

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SEÇÃO DEBATES UNTOIGLICH, G. Consenso de especialistas...

Por tudo isso, é totalmente inadequado, desde o ponto de vista da habitualmente está carregado de termos vagos e imprecisos (por exemplo, o
saúde pública, unificar em um diagnóstico todas as crianças desatentas e/ que é “inquieto” para alguém pode não ser para outro). Isto leva a pensar que
ou inquietas sem uma investigação clínica pormenorizada. é impossível realizar um diagnóstico de um modo rápido e sem ter em conta
Assim, nas escolas, há crianças desatentas que permanecem quie- a produção da criança nas entrevistas.
tas e desconectadas, outras que se movimentam permanentemente, algu- Desde nossa perspectiva, nos encontramos com uma criança que sofre,
mas que brincam na aula, outras que reagem imediatamente a cada estímu- que apresenta dificuldades, que essas dificuldades obstaculizam a aprendiza-
lo sem ter tempo de pensar... Uma criança que não atende, que se movimen- gem e que devemos investigar o que lhe acontece para poder ajudá-la.
ta desordenadamente, geralmente atende de outro modo e a outras ques- É importante também destacar que, muitas vezes, o que se considera
tões diferentes ao esperado. E não podem ser englobadas em uma entidade não é tanto o sofrimento, mas a perturbação que o comportamento da crian-
nosográfica única. ça causa no meio ambiente. Por essa razão, a medicação funciona como
Não desconhecemos a importância dos transtornos neurológicos, dos uma tentativa de acalmar uma criança que se “comporta mal”.
desenvolvimentos atuais em neurologia e do recurso da medicação como privi- Ainda quando os meios científicos falam das contra-indicações das
legiado em certas patologias. Mas consideramos que, neste caso, é atribuído diferentes medicações que se utilizam nesses casos, chama a atenção a
um déficit neurológico não comprovado a problemas muito diferentes. insistência com que os meios de comunicação propagandeiam o consumo
Há consenso na comunidade científica que o que se denomina ADD/ de medicação como indicação terapêutica privilegiada diante da aparição
ADHD reflete situações complexas ligadas a diferentes patologias. No en- dessas manifestações.
tanto, isto não costuma ser levado em conta. Todas as drogas que se utilizam no tratamento de crianças que apre-
Pensamos então que se agrupam com esse nome diversas expres- sentam dificuldades para se concentrar, ou que se movimentam mais do que
sões do sofrimento infantil que merecem ser consideradas em sua singulari- o meio tolera, têm contra-indicações e efeitos colaterais importantes, como
dade e tratadas, levando em conta sua determinação múltipla o incremento da sintomatologia, no caso de crianças psicóticas, assim como
Quer dizer, a diferença se dá entre pensar que: a) uma manifestação conseqüências tais como o retardo do crescimento.
implica um quadro psicopatológico e uma causa orgânica e que daí se deriva Em diferentes trabalhos, a respeito do metilfenidato, estabelece-se
um tratamento, ou que: b) uma manifestação pode ser efeito de múltiplas e que: “não pode ser ministrado a crianças menores de seis anos; é
complexas causas e que é necessário descobrir quais são e, por conseguin- desaconselhado em crianças com tiques (Síndrome de Gilles de la Tourette);
te, qual é o tratamento mais adequado. é arriscado no caso de crianças psicóticas, porque incrementa a
Também há oposição entre a idéia de que o diagnóstico pode ser feito sintomatologia; origina, com o tempo, retardo do crescimento; pode provocar
pelos pais e/ou professores, a partir de questionários (como se fossem ob- insônia e anorexia; pode baixar o limiar convulsivo em pacientes com história
servadores não implicados), e sustentar que todo observador está compro- de convulsões ou com EEG anormal sem ataques”.
metido no que observa, forma parte da observação, e que os pais e os profes- Em relação às anfetaminas em geral, têm sido proibidas em alguns
sores estão absolutamente implicados na problemática da criança e, por países (como no Canadá), além de ser conhecida sua potencialidade
isso, nunca podem ser “objetivos”. toxicomaníaca.
Já no início do século XX, o físico Heisenberg estabeleceu que o ob- Em relação a tomoxetina, chegou-se à conclusão de que produz (de
servador forma parte do sistema. Ao mesmo tempo, o questionário utilizado forma estatisticamente significativa): aumento da freqüência cardíaca; perda

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SEÇÃO DEBATES RESENHA

de peso, podendo originar retardo de crescimento; síndromes gripais; efeitos FREUD, S. Un peu de cocaïne pour me délier la
sobre a pressão arterial; vômitos e diminuição do apetite; não existe acom- langue. Paris: Max Milo Éditions, 2005.
panhamento em longo prazo.
Perguntamo-nos também: a medicação dada para produzir efeitos de Trata-se da tradução do alemão para o
modo imediato (efeitos que se dão de forma mágica, sem elaboração por francês realizada por Marielle Roffi, de alguns
parte do sujeito), como necessária durante longo tempo, não desencadeia textos de Freud sobre a cocaína, entre eles:
adição psicológica ao posicionar um comprimido como modificador de atitu- “As cartas de Freud à Martha”; “A propósito da
des vitais, como gerador de um “bom desempenho”? Coca”; “Contribuição ao conhecimento dos efei-
Diante do avanço da difusão dessa “síndrome” e a possibilidade de tos da Coca” e “Contribuições concernentes a
inclusão da medicação no PMO (Programa Médico Obrigatório), tendo levan- cocaínomania e a cocaínofobia”.
do em conta tudo o que foi anteriormente expresso, os abaixo assinados 3, O livro tem uma apresentação de
propomos: Charles Melman com o título “Freud um jo-
Que a avaliação de cada criança seja realizada por profissionais espe- vem que promete”, e um prefácio de Jean Louis
cialistas na temática e que se outorgue a possibilidade de ser tratada de Chassaing, intitulado “Do silêncio dos órgãos
acordo com as dificuldades específicas que apresenta. à fala do sujeito”, este último está traduzido,
Que a medicação seja o último recurso (e não o primeiro) e que seja a seguir, na íntegra.
consenso de diferentes profissionais. “Os escritos de Freud recolhidos neste livro apresentam ao menos um
Que se leve em conta o contexto da criança em avaliação. A família, duplo interesse: informar sobre a história das práticas e das idéias de uma
mas também o grupo social a que a criança pertence e a sociedade em seu época, e dar traços, características cuja atualidade não deixa de nos surpre-
conjunto, que podem facilitar ou favorecer funcionamentos impulsivos, difi- ender.
culdades para concentra-se ou um esforço motor sem metas. É indispensável, se queremos evitar as interpretações equivocadas,
Que se limite, nos meios de comunicação, a difusão massiva da exis- na verdade mal intencionadas, situar seus estudos e seus escritos no con-
tência do transtorno por déficit de atenção (já que é um transtorno sobre o texto de sua época.
qual não há acordo entre os profissionais) e, sobretudo, o consumo da medi- Freud é apaixonado pelas ciências, pela metodologia, ele não é ainda
cação como solução mágica diante das dificuldades escolares. um grande clínico; ele é jovem e tem ambição. Ambição, às vezes pessoal,
e ambição pela sua prática e pelas teorias. Homem de grande cultura, mas
Tradução: Gerson Smiech Pinho antes de tudo, nesta época, médico, ele tem também o olhar afiado do pes-
quisador.
Quando ele se interessa pelos trabalhos recentes sobre cocaína, não
é, entretanto, o olho – e sua anestesia pela futura Xylocaína – que o prende
particularmente, mas já poderíamos demarcar, a energética geral. Os índios
dos Andes, “mascadores de coca”, trabalhavam sem se revoltar contra mui-
3
Ver nota 1, onde constam os nomes dos profissionais que elaboraram este documento. to trabalho, durante horas, sem muitos nutrientes além da planta mágica?

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RESENHA RESENHA

Os soldados sobre os campos de batalha não se lançam aos assaltos com to de trabalho que sua acuidade exacerbada torna particularmente produtiva,
uma energia quase inesgotável, isto que um militar médico retranscrirá em sem sentir esforço.
seus estudos? Impelido mais longe que a célebre frase do cirurgião Leriche – “a saú-
Estes trabalhos, Freud os leu com avidez e seriedade científica, mas de é o silêncio dos órgãos” – o uso de cocaína arrasta mais uma rentabilida-
também com o interesse de um homem por vezes sujeito à dor de cabeça, à de a menos custo.
neurastenia, a timidez, à fadiga, enfim, aos diversos males que vem incomo- A experimentação sobre si para um médico é tão banal a época. Freud,
dar e acompanhar um trabalho intenso. ao lado dos benefícios pessoais que ele pôde transitoriamente tirar, evoca o
De onde vem este “a mais” liberado pela coca? Quais são os meca- fato que a variabilidade constatada dos efeitos, segundo os indivíduos, é
nismos de ação e os benefícios reais deste “alimento de economia”, econo- assim reduzido!
mia de energia? Em qual lugar intervém a cocaína para produzir esses efei- Quando ele constata que esta variabilidade existe no mesmo indiví-
tos? duo, segundo as circunstâncias e, também, as disposições biológicas, é
Assim, introduzido à pesquisa, uma outra vertente, pragmática, o in- para ele uma grande decepção: aquela de uma possível análise científica da
teresse de Freud é pelo uso terapêutico. É, todavia, neste enquadre, entre cocaína. A subjetividade resiste aí ao universal da ciência.
pesquisa apaixonada e aplicações clínicas, que a inadequação provocará o Mas Freud é também e já com Charcot, onde a cocaína lhe “soltou a
abandono da cocaína. Este aspecto é atual ainda hoje: a pesquisa funda- língua”. Este mestre em neurologia, homem do mundo, estuda os quadros
mental, a experimentação clínica e os benefícios terapêuticos são etapas que lhe apresentam as histéricas assim colocadas em cena: aí também a
distintas, das quais a conjunção não é dada de roldão. Uma prudência na singularidade vem desafiar o rigor científico anatômico da neurologia. E é na
interpretação, um pouco “esquecida” em nossos dias, onde certa descober- língua, na fala e na linguagem que os trabalhos vão seguir”
ta do progresso terapêutico em uma clínica singular. Jean Louis Chassaing, p. 13-16.
“É agora que eu me sinto médico”, escreve Freud à sua noiva Martha! Tradução : Marta Conte
O apoio mágico sobre o medicamento científico não desmentirá o entusias-
mo e as prescrições abusivas – questões sempre atuais. Essas grandes
esperanças são compartilhadas na época de Freud com um determinado
Merck, um dos fundadores de um grande laboratório farmacêutico. A substi-
tuição de um produto como meio de cura de uma dependência ao tóxico é
fortemente esperado. Por vezes, freqüentemente mesmo, com aspectos dra-
máticos: a cocaína para curar os alcoolistas e morfinômanos é temível revés.
Mas as análises clínicas de Freud, a experimentação sobre ele mesmo,
descrita mais abertamente do que serão seus sonhos, os mais íntimos,
mais reveladores, mas tudo tão analisado sob anonimato, suas análises nos
interessam em nome de sua pertinência. Ele relaciona, por exemplo, este
fato: com a cocaína, a gente se sente “normal”. Qual é esta normalidade? É
aquela de um corpo desembaraçado das sensações penosas; de um espíri-

70 C. da APPOA, Porto Alegre, n. 144, março 2006 C. da APPOA, Porto Alegre, n. 144, março 2006 71
AGENDA AGENDA

Revista da APPOA
MARÇO – 2006 e Correio da APPOA
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conecte-se com os temas e eventos
mais atuais em Psicanálise
05, 12, 19h30min Sede da APPOA Reunião da Comissão de Eventos
Para receber a Revista e o Correio da APPOA, copie e preencha o
19 e 26
cupom abaixo e remeta-o para*:
09 e 23 20h30min Sede da APPOA Reunião da Comissão do Correio da APPOA

05 21h Sede da APPOA Reunião da Mesa Diretiva ASSOCIAÇÃO PSICANALÍTICA DE PORTO ALEGRE
06, 13 15h15min Sede da APPOA Reunião da Comissão da Revista da APPOA
Rua Faria Santos, 258 - Bairro Petrópolis
90670-150 - Porto Alegre - RS
20 e 27
Se preferir, utilize telefone, fax ou e-mail
19 21h Sede da APPOA Reunião da Mesa Diretiva aberta ao Membros
( (51) 3333 2140 6 (51) 3333.7922 : appoa@appoa.com.br
e Participantes

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Data Local Evento
01/04/06 NOVOTEL JORNADA DE ABERTURA: Conceitos CEP: _____________ CIDADE:______________________ UF: _______
Porto Alegre Fundamentais da Psicanálise TEL.: __________________________ FAX: _______________________
06/05/06 SANTANDER CULTURAL FREUD 150 ANOS: - A Psicanálise tem
Porto Alegre futuro? E-MAIL: ___________________________________________________
02 e 04/06/06 Hotel VILLA MICHELON RELENDO FREUD: A questão da Análise INSTITUIÇÃO: ______________________________________________
Bento Gonçalves leiga.
1ª semana Buenos Aires JORNADA DA CONVERGÊNCIA
Sim, quero receber as publicações da APPOA, nas condições abaixo:
agosto LACANIANA NA ARGENTINA
( ) Promoção Especial
21 e 22/10/06 CENTRO DE EVENTOS JORNADA CLÍNICAS: O Inconsciente
Assinatura anual da Revista e do Correio da APPOA R$ 100,00
PLAZA SÃO RAFAEL e as Pulsões
( ) Assinatura anual da Revista da APPOA R$ 40,00
Porto Alegre
( ) Assinatura anual do Correio da APPOA R$ 70,00
02/12/06 Sede da APPOA FESTA DE FIM DE ANO
Data: ______/_____/2006

PRÓXIMO NÚMERO
* O pagamento pode ser feito via depósito bancário no Itaú, Ag. 0604, C/C 32910-
2. O comprovante deve ser enviado por fax, juntamente com o cupom, ou via
CONCEITOS FUNDAMENTAIS DA PSICANÁLISE correio, com cheque nominal à APPOA.

72 C. da APPOA, Porto Alegre, n. 144, março 2006 C. da APPOA, Porto Alegre, n. 144, março 2006 73
Capa: Manuscrito de Freud (The Diary of Sigmund Freud 1929-1939. A chronicle of events
in the last decade. London, Hogarth, 1992.)
Criação da capa: Flávio Wild - Macchina
S U M Á R I O
EDITORIAL 1
NOTÍCIAS 2
SEÇÃO TEMÁTICA 13
NOVOS DIAGNÓSTICOS? EM BUSCA
DA SUBJETIVIDADE PERDIDA
Gisela Untoiglich 13
DIAGNÓSTICO DE DÉFICIT DE ATENÇÃO,
O QUE PODE DIZER A PSICANÁLISE?
Alfredo Jerusalinsky 24
ASSOCIAÇÃO PSICANALÍTICA DE PORTO ALEGRE
GESTÃO 2005/2006 HIPERATIVIDADE E DÉFICIT DE ATENÇÃO
a
Presidência: Lucia Serrano Pereira Gerson Smiech Pinho 42
1 Vice-Presidência: Ana Maria Medeiros da Costa
2a Vice-Presidência: Lúcia Alves Mees PASSAR O SABER: UMA BREVE
1a Secretária: Marieta Madeira Rodrigues
2a Secretária: Ana Laura Giongo INTERVENÇÃO SOBRE A PSICANÁLISE
1a Tesoureira: Maria Lúcia Müller Stein COM CRIANÇAS EM NOSSOS DIAS
2a Tesoureira: Ester Trevisan
MESA DIRETIVA
Marta Pedó 47
Alfredo Néstor Jerusalinsky, Ângela Lângaro Becker, Carmen Backes, SOBRE O DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
Edson Luiz André de Sousa, Ieda Prates da Silva, Ligia Gomes Víctora,
Maria Auxiliadora Pastor Sudbrack, Maria Ângela Cardaci Brasil, DO TRANSTORNO POR DÉFICIT DE
Maria Beatriz de Alencastro Kallfelz, Maria Cristina Poli, Nilson Sibemberg, ATENÇÃO
Otávio Augusto Winck Nunes, Robson de Freitas Pereira e Siloé Rey
Jaime Tallis 54
SEÇÃO DEBATES 63
EXPEDIENTE CONSENSO DE ESPECIALISTAS
Órgão informativo da APPOA - Associação Psicanalítica de Porto Alegre
Rua Faria Santos, 258 CEP 90670-150 Porto Alegre - RS DA ÁREA DE SAÚDE SOBRE O
Tel: (51) 3333 2140 - Fax: (51) 3333 7922 CHAMADO “TRANSTORNO POR
e-mail: appoa@appoa.com.br - home-page: www.appoa.com.br DÉFICIT DE ATENÇÃO COM OU
Jornalista responsável: Jussara Porto - Reg. n0 3956
Impressão: Metrópole Indústria Gráfica Ltda. SEM HIPERATIVIDADE”
Av. Eng. Ludolfo Boehl, 729 CEP 91720-150 Porto Alegre - RS - Tel: (51) 3318 6355 Gisela Untoiglich 63
Comissão do Correio
Coordenação: Gerson Smiech Pinho e Marcia Helena de Menezes Ribeiro
RESENHA 69
Integrantes: Ana Laura Giongo, Fernanda Breda, Henriete Karam, Liz Nunes Ramos, UN PEU DE COCAÏNE POUR ME
Maria Cristina Poli, Maria Lúcia Müller Stein, Marta Pedó, Norton Cezar Dal Follo da Rosa
Júnior, Robson de Freitas Pereira e Rosane Palacci Santos, Tatiana Guimarães Jacques DÉLIER LA LANGUE
Marta Conte 69
AGENDA 72
N° 144 – ANO XIII Março – 2006

DIAGNÓSTICOS
NA INFÂNCIA HOJE

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