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La Vita Sensibile
Tradutor
Diego Cervelin
Conselho Editorial
Alexandre Nodari, Diego Cervelin, Flávia Cera, Leonardo D’Ávila
de Oliveira, Rodrigo Lopes de Barros Oliveira
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Toda indagação sobre o modo de existência do sensível deve con-
frontar-se com o curioso destino que pesa sobre as imagens desde
as origens da modernidade. Contra o sensível e as imagens não se
armaram, como havia acontecido no mundo tardo-antigo, o poder
político e a teologia (que, depois do segundo Concílio de Nicéia,
reduziram-se a sofisticadas práticas iconográficas e a perspicazes
técnicas de produção do sensível), senão a filosofia mesma, que
já há tantos séculos declarou um verdadeiro abandono de ambos:
indagar o modo de existência do sensível não seria possível por-
que ele não possui uma existência separada e separável do sujeito
cognoscente que através dele conhece a realidade. Não existe
nenhum sensível em si e por si.
A proibição de reconhecer qualquer autonomia ontológica
às imagens é um dos inúmeros mitos fundadores que a moderni-
dade produziu e cultivou. No gesto aparentemente insignificante
pelo qual Descartes procurou liberar “o espírito de todas aquelas
pequenas imagens que flutuam no ar, as ditas formas [specie] inten-
cionais, que tanto cansam a imaginação dos filósofos”, trava-se na
realidade uma das batalhas decisivas do pensamento moderno
A Vida Sensível 13
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Os fenômenos estão aquém da alma, mas além das coisas. O lugar
onde as coisas se tornam fenômenos não é a alma, tampouco a
sua simples existência. Para que haja sensível (e para que, assim,
haja sensação) “é necessário que exista algo intermediário”
(hôst’anagkaion ti einai metaxu, De anima, 419a 20). Entre nós e os
objetos há um lugar intermediário, algo em cujo seio o objeto torna-
se sensível, faz-se phainomenon. É
“Demócrito não se expressa bem
nesse espaço intermediário que quando sustenta que, se o meio coin-
as coisas se tornam sensíveis e cidisse com o vazio, se veria com pre-
cisão até mesmo uma formiga no céu.
é desse mesmo espaço que os Isso é algo impossível”
viventes colhem o sensível com
o qual, noite e dia, nutrem suas próprias almas. Também para
observar a si mesmo, ouvir a si mesmo, faz-se necessário, para todo
animal, constituir a própria imagem
Actio visus non perficitur
nisi per diaffonum medians fora de si, em um espaço exterior: é no
espelho que conseguimos devir sensíveis
e é ao espelho (e não exatamente aos nossos corpos) que deman-
damos nossa imagem; é apenas depois de termos pronunciado