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COLUNAS / SENTIDOS DO MUNDO (/COLUNA/P/ID/12/N/SENTIDOS_DO_MUNDO)

04 MAIO 2012 0  993

Por quem (e como) os sinos dobram?


Em sua coluna de maio, Luiz Fernando Dias Duarte faz homenagem a colegas antropólogos que saíram de cena recentemente – entre eles,
Gilberto Velho – e aborda um tema que motivava esses pesquisadores: os sentidos sociais dos fenômenos musicais.

Um dos sentidos dos sinos na cristandade era ‘atingir a alma’ das pessoas. As variadas manifestações musicais, embora tenham se afastado do campo especí co da religião,
também conservam esse poder. (foto: Stephen J. Sullivan/ Sxc.hu)

As atividades criativas a que chamamos de artísticas, e todo o complexo de valores, sensibilidades e práticas que as sustenta, são objeto da
investigação antropológica desde o começo do século 20. Na obra dos sociólogos alemães Georg Simmel e Max Weber já se encontravam importantes
análises do modo como a música ocidental se estruturava e se relacionava com as demais dimensões da organização social.

Considera nosso senso comum que a experiência artística expressa mais diretamente os sentimentos e emoções do que outras áreas da atividade
humana; o que é matéria de muita discussão e dissenso, já que não há uma de nição universalmente válida do que seja ‘emoção’. Tampouco da
fronteira possível entre o sensível, o sentimental e o cognitivo – tão elaborada em nossa cultura e tão fundamental para as argumentações internas
ao mundo artístico.

As manifestações musicais – imensamente variadas como são – conservam aquele aguilhão profundo
que, como se diz, “atinge a alma”

É mais adequado ao pensamento antropológico considerar que a experiência artística, tal como de nida pela cultura ocidental, relaciona-se com as
áreas de máxima intensidade vivencial; é inseparável, na maior parte das culturas, do que chamamos de ritual, seja na forma contrita do religioso, por
um lado, ou na forma lúdica dos lazeres, por outro. Mesmo que, entre nós, a música, por exemplo, tenha se afastado do campo especí co da religião,
suas manifestações – imensamente variadas como são – conservam aquele aguilhão profundo que, como se diz, “atinge a alma”. Esse era um dos
sentidos dos sinos na cristandade.

A antropologia brasileira tem abrigado importantes desenvolvimentos na área da antropologia da arte – ou da música, mais especi camente. Por
dolorosa coincidência, três personagens importantes desse campo vieram recentemente a interromper suas atividades: Santuza Naves e Gilberto
Velho faleceram neste último mês e Elizabeth Travassos foi jogada em um estado grave de inconsciência por um acidente hospitalar, de que padece
desde o m de 2011.
(/colunas/sentidos-do-mundo/imagens/porqueossinos02.jpg)

Luiz Fernando Dias Duarte (à esquerda, abaixado), ao lado de colegas, entre


eles, Gilberto Velho (sentado), Santuza Naves (à direita, de blusa branca) e
Elizabeth Travassos (no centro, abaixada), após aula magna proferida por
Velho no Museu Nacional/UFRJ em 30 de junho de 2010. (foto: Arquivo
pessoal do colunista)

Santuza havia feito seu mestrado com Velho, a respeito de Caetano Veloso e a Tropicália. Elizabeth fez seu doutorado também com ele, sobre o
modernismo musical e seu interesse nas tradições populares, comparando o compositor brasileiro Mário de Andrade com o húngaro Béla Bartók.
Velho, entre tantas facetas criativas, dedicou-se à pesquisa sobre o papel da arte nas sociedades urbanas contemporâneas, tendo publicado já em
1977 uma instigante coletânea sobre ‘arte e sociedade’. Nesse volume combinavam-se três tendências de análise que continuam caracterizando o
campo: a histórica, a sociológica e a etnológica.

A história social dos fenômenos artísticos na cultura ocidental é um pano de fundo essencial para compreender os fenômenos da atualidade; assim
como é essencial para o olhar antropológico sobre as outras culturas humanas e os fatos que ali parecem equivalentes à nossa arte. Esta última
tendência abriga o campo bastante autônomo da etnomusicologia. O leitor interessado no que haja aí de mais recente pode consultar o programa do
atual curso (http://www.ppgasmuseu.etc.br/museu/Pages/cursos.html) de Carlos Fausto e Tommaso Montagnani no Museu Nacional da Universidade
Federal do Rio de Janeiro.

Vários estudos, um mestre

Gilberto Velho orientou muitas outras teses dedicadas à pesquisa sobre fenômenos musicais: as de Hermano Vianna
(http://hermanovianna.wordpress.com/) sobre o mundo funk (http://www.overmundo.com.br/banco/o-baile-funk-carioca-hermano-vianna) e sobre o
samba como música representativa da nacionalidade (http://hermanovianna.wordpress.com/tag/o-misterio-do-samba/), a de Pedro Leite Lopes
(http://www.bdae.org.br/dspace/bitstream/123456789/1590/1/tese.pdf) sobre o heavy metal, as de Sandra Costa sobre o hip-hop carioca
(http://www.bdae.org.br/dspace/handle/123456789/1586) e sobre as carreiras populares de músico
(http://teses.ufrj.br/PPGAS_D/SandraReginaSoaresDaCosta.pdf), a de Caio Dias (http://teses2.ufrj.br/Teses/PPGAS_M/CaioGoncalvesDias.pdf) sobre
Tom Jobim, a de Mila Burns (http://milaburns.com/2012/04/16/ao-mestre-com-carinho/) sobre Dona Ivone Lara
(http://www.academiadosamba.com.br/monogra as/MilaBurns.pdf), a de Roberta Ceva (http://www.bdae.org.br/dspace/handle/123456789/1570)
sobre o forró universitário. Esses trabalhos, assim como muitos outros dessa seara dedicados à arte e à cultura, buscavam compreender os sentidos
sociais de tais fenômenos, articulando-os com as condições de organização social e espírito cultural de seu tempo e lugar.

(/colunas/sentidos-do-mundo/imagens/porqueossinos03.jpg)

Gilberto Velho orientou várias pesquisas sobre fenômenos musicais, entre


eles, o samba. (foto: Naty Torres/ Flickr – CC BY-NC-ND 2.0)

Na tradição seguida por Velho é muito forte o aporte da escola norte-americana do ‘interacionismo simbólico’, particularmente na gura do sociólogo
Howard Becker – também músico de jazz –, que desenvolveu o conceito de ‘mundos artísticos’, ou seja, a constituição de grupos ou redes de sujeitos
vinculados à prática da arte. Esses mundos se caracterizam pela especi cidade dos estilos de vida ali cultivados; com o desenvolvimento de um
sentimento de comunhão peculiar, regras práticas, disposições éticas, e até mesmo formas próprias de cultivar o con ito e a competição. Velho
explorou as relações contemporâneas desses mundos no Brasil com o fenômeno dos ‘comportamentos desviantes’, como o consumo de drogas ou a
homossexualidade.

A conotação de transgressão de que se cercou no Ocidente a vanguarda artística desde o romantismo é uma das marcas mais vívidas desse mundo –
o que tem sido tratado por numerosos autores, interessados na sua correlação com a racionalização, com o individualismo, com a interiorização;
en m, com as linhas mestras da modernidade ocidental. Um ponto importante é o da associação da atividade artística com uma qualidade de
verdade subjetiva, chamada de ‘autenticidade’, que tanto pode se expressar no plano pessoal, do artista criador, quanto no plano coletivo, da
expressão de uma ‘alma nacional’.

Saber como dobram os sinos, qual o sentido do mundo de experiências em que passamos imersos na
vida, é a dura tarefa dos antropólogos

É interessante destacar que os trabalhos de Travassos e de Naves, embora com estilos diferentes, enfrentaram questões comuns da relação entre
música e nação. Suas próprias teses, já citadas, moviam-se no âmbito do desa o de articulação entre o modernismo artístico e a modernização
nacional. E seus trabalhos posteriores continuaram a frequentar essa linha fundamental de exploração do sentido da música brasileira: no caso de
Travassos, o estudo das tradições orais e do patrimônio cultural; no de Naves, o da música popular brasileira e da contracultura, por exemplo.

Como disse o poeta inglês John Donne em 1624, os sinos, quando dobram, dobram sempre por todos nós, servos da morte. Saber como dobram,
qual o sentido do mundo de experiências em que passamos imersos na vida, é a dura tarefa dos antropólogos; mesmo quando acabrunhados pela
perda de colegas tão caros.

Luiz Fernando Dias Duarte


Museu Nacional
Universidade Federal do Rio de Janeiro

Sugestões para leitura


TRAVASSOS, Elizabeth. Os mandarins milagrosos: arte e etnogra a em Mário de Andrade e Béla Bartók. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.

TRAVASSOS, Elizabeth. Modernismo e música brasileira. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1999.

NAVES, Santuza C.. O violão azul: modernismo e música popular. Rio de Janeiro: Editora da Fundação Getúlio Vargas, 1998.

NAVES, Santuza C.. Da bossa nova à tropicália. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001.

VELHO, Gilberto (org.). Arte e Sociedade: ensaios de sociologia da arte. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1977.

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