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“Ut olim vitis, sic nunc legibus laboramus.”
1
“Outrora, sofríamos por causa de nossos vícios, hoje sofremos por causa de nossas leis. ” Blaise Pascal – Pensamentos (1669).
2
Tribunal de Rua, música de O Rappa (trecho).
DO CABIMENTO DO HABEAS CORPUS
“Em suma, por meio do Habeas Corpus, tutelava-se não apenas o direito de
locomoção, com, inclusive, todo e qualquer direito que é amparado pelo
4
mandado de segurança” .
Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a
inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à
propriedade, nos termos seguintes: LXVIII - conceder-se-á habeas
corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer
violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou
abuso de poder.
3
TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo Penal. Vol. 4. São Paulo: Saraiva, 2000. Pág.532.
4
Idem, pág. 532.
4. E sua regulamentação feita pelo Código de Processo Penal:
Art. 647. Dar-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar na
iminência de sofrer violência ou coação ilegal na sua liberdade de ir e vir,
salvo nos casos de punição disciplinar.
5
“100 Regras de Brasília sobre Acesso a Justiça de Pessoas em Condição de Vulnerabilidade”, disponível em
(https://www.anadep.org.br/wtksite/100-Regras-de-Brasilia-versao-reduzida.pdf)
“En las circunstancias actuales del presente caso, en la Comunidad de Paz
de San José de Apartadó hay personas que prestan diferentes servicios a la
Comunidad cuya vida e integridad personal están en la misma situación de
riesgo, quienes no están determinadas, pero que pueden ser identificadas e
individualizadas por este vínculo de servicio que tienen con dicha Comunidad.
Por ello, esta Corte considera necesario mantener las medidas provisionales
en favor de las personas ya protegidas en la Resolución del Presidente de 9
de octubre de 2000 y la Resolución de la Corte de 24 de noviembre de 2000,
como también, por las razones expresadas en los escritos presentados por la
Comisión y el Estado y los respectivos alegatos expuestos durante la
audiencia pública celebrada el 13 de junio de 2002, ampliarlas a todas las
6
personas que tengan un vínculo de servicio con dicha Comunidad de Paz.”
6
Resolução de 18 de junho de 2002 del caso de las Medidas Provisionales respecto de la Comunidad de Paz de San José de
Apartadó en Colombia, disponível em http://www.corteidh.or.cr/docs/medidas/apartado_se_09.doc
as pessoas e os bens fundamentais (domicílio, parcela vital do patrimônio
pessoal etc.) que são afetados pelas ações repressivas, exigir-se sempre,
em qualquer caso, a determinação dos afetados resultaria em uma
diabólica inversão de ônus. Sublinho o ponto porque o considero crucial,
tendo em conta o compromisso constitucional de tutela das liberdades
públicas e de preservação da dignidade da pessoa humana. Em jogo, nessa
patente distorção ideológica dos direitos humanos, encontram-se os mesmos
fatores que estiveram presentes ao tempo do Império escravocrata: a)
grupos sociais vulneráveis sob os mais variados aspectos, mas
principalmente no que concerne à capacidade econômica e de representação
judicial; b) a repressão penal ordenada “coletivamente” e em contrariedade à
ordem jurídica. Os exemplos de habeas corpus coletivo e as suas causas
confirmam a hipótese: tutela de crianças e adolescentes submetidos a “toque
de recolher”; tutela de presos indevidamente mantidos em regime de
7
cumprimento de pena mais rigoroso.”
7
Geraldo Prado, in “Flanelinhas e Habeas Corpus Coletivo. Parecer de Geraldo Prado”, disponível em
(http://emporiododireito.com.br/flanelinhas-e-habeas-corpus-coletivo-parecer-de-geraldo-prado-confira/)–grifamos.
HC nº 5587); 2. Marcha da Maconha no RS (TJRS HC nº 1080118354-9); 3.
Proibição de criança e adolescente ficarem na rua depois das 23h (STJ. nº
207.720/SP). 4. Questão dos “Rolezinhos no Shopping”.
8
ANVISA – Portaria 344/98: Lista F-2 (Substâncias Psicotrópicas), item 28: THC (TETRAHIDROCANABINOL).
9
ANVISA – Portaria 344/98: Lista F-1 (Substâncias Entorpecentes), item 8. COCAÍNA.
10
A título de exemplos: ANVISA – Portaria 344/98: Lista F-1, item 11. HEROÍNA (DIACETILMORFINA); Lista F-2, item 6.
LISERGIDA (9,10-DIDEHIDRO-N,N-DIETIL-6-METILERGOLINA-8 β-CARBOXAMIDA) – LSD; item 14. MDA (∝-METIL-3,4-
(METILENDIOXI)FENETILAMINA) -TENAMFETAMINA; 15. MDMA ( (±)-N, ∝-DIMETIL-3,4-(METILENDIOXI)FENETILAMINA) e;
17. MESCALINA (3,4,5-TRIMETOXIFENETILAMINA).
11
Na redação do parágrafo único, art. 1.º, da Lei 11.343/06, “Para fins desta Lei, consideram-se como drogas as substâncias ou
os produtos capazes de causar dependência, assim especificados em lei ou relacionados em listas atualizadas periodicamente
pelo Poder Executivo da União.”
12
Expressão cunhada por MARIA LUCIA KARAM para destacar que a proscrição de determinadas substâncias não obedece a
critérios de razoabilidade e proporcionalidade, tampouco se ampara em razões científicas.
13
“...os resultados carga global das doenças realçam o fato que a maior parte dos problemas de saúde no mundo são devidos
mais a substâncias lícitas do que ilícitas.” (Relatório Neurociências: consumo e dependência de substâncias psicoativas. OMS –
Genebra. 2004)
14
Como anotou Foucault, a respeito da Genealogia da Moral de Nietzsche: “A invenção [Erfindung] para Nietzsche é, por um
lado, uma ruptura, por outro, algo que possui um pequeno começo, baixo, mesquinho, inconfessável.”
17. Certo é que a história da proibição de cada uma das drogas
ilícitas tornaria enfadonha a análise do presente. Sendo assim, nos limitaremos
a algumas referências gerais, com o objetivo de que possam servir de guia até a
conclusão já antecipada no título do presente capítulo, qual seja: a de que os
usuários (portadores para uso próprio) de drogas assumem a situação jurídica
de comunidade e de vulnerabilidade. Malgrado estejamos a falar genericamente de
uma comunidade de usuários de drogas ilícitas, sua demonstração aparece mais
claramente no que se refere aos consumidores de maconha15, até porque se trata do
grupo mais numeroso16 e organizado. Destacando “a função contramajoritária do
Supremo Tribunal Federal no Estado democrático de direito, estimulando a análise da
proteção das minorias na perspectiva de uma concepção material de democracia
constitucional”17, no julgamento da ADPF 187/DF, o Exmo. Ministro CELSO DE MELLO
afirmara:
15
Embora não possa ser desprezado o número de usuários de cocaína. Pesquisa recente da UFF mostra que há resíduos da
droga em cerca de 90% das cédulas de nossa moeda corrente – usada como canudo para consumo da droga
(http://www.focosh.com.br/v2/materias.php?id=23693).
16
“Prevalências de uso na vida”, estatísticas disponíveis em
http://www.obid.senad.gov.br/portais/OBID/biblioteca/documentos/Dados_Estatisticos/indicadores/327423.pdf
17
P. 24 do Voto, disponível em (http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/ADPF187merito.pdf)
18
P. 52/53 do Voto
19
Idem - Apud, SALO DE CARVALHO (A Política Criminal de Drogas no Brasil - Estudo Criminológico e Dogmático da Lei
11.343/06, p. 258/261, item n. 12.10, 5ª ed., 2010, Lumen Juris)- p. 42 do Voto.
ao plantio e consumo da ‘cannabis’, tanto para fins medicinais como
recreativos.”
“Que ninguém tenha em sua casa rosalgar, nem o venda nem outro
20
material venenoso.” - grifamos
20
ORDENAÇÕES FILIPINAS, Livro V, Título LXXXIX (disponível em http://www1.ci.uc.pt/ihti/proj/filipinas/l5p1240.htm)
21
A obra ficou pronta ainda no tempo de Filipe I, que a sancionou em 1595, mas só foi definitivamente mandada observar, após a
sua impressão em 1603, quando já reinava Filipe II. Filipe I, político hábil, quis mostrar aos portugueses o respeito que tinha
pelas leis tradicionais do país, promovendo a reforma das ordenações dentro de um espírito tradicional. Fonte: Wikipedia
presente no Decreto 4.294, de 06.07.1921, sancionado por Epitácio Pessoa e que
revogaria o art. 159 do CP de 1890. No mesmo diploma, a noção de “veneno” veio a
se juntar à palavra “entorpecente”, iniciando-se assim “sua longa e polissêmica
carreira no direito penal brasileiro”.22
22. Para além das referências aqui indicadas, não se olvida que as
políticas proibicionistas (globais) tenham base menos remota e mais difundidas em
Convenções Internacionais sempre internalizadas pela legislação doméstica.
Mantenhamos sobranceira, contudo, a ideia inaugural de que “todo preceito de lei (...)
constitui apenas um elemento entre outros de uma construção ideológica edificada
para justificar certas ações e para, numa certa medida, mascará-las.” Tal é a lição de
NILO BATISTA para nossos tempos:
“O fato de que uma tentativa do furto de uma bebida, por um jovem negro e
pobre num subúrbio, e a tentativa de furto de uma blusa, por uma
adolescente de classe média num shopping center, tenham soluções tão
desiguais (no primeiro caso, encaminhamento policial-judiciário; no segundo,
composição com a família no centro de vigilância privada), com efeitos sociais
tão distintos, parece não interessar em nada ao comentário jurídico penal;
mas este desinteresse cumpre uma função importante, ao dissimular, em
23
estilo ‘nobre e vago’, o desconchavo ‘das práticas reais que se sucedem’”
22
Nilo Batista, “Política Criminal Com Derramamento de Sangue”, RBCC n.º 20, 1997, p. 131.
23
Nilo Batista, “Matrízes Ibéricas do Sistema Penal Brasileiro”, p. 19, apud, Georges Duby, “Idade Média, Idade dos Homens –
Do Amor e Outros Ensaios”, Cia. Das Letras, 1990, p. 12.
proibido. Desde então tem sido possível fazer dessa “conjunção maligna”
formada pelo homem e pela “substância venenosa”, alvo da exclusão física do
espaço territorial tutelado pela norma proibidora.
24
WASP é o acrônimo que em inglês significa "Branco, Anglo-Saxão e Protestante" (White, Anglo-Saxon and Protestant). Com
frequência usada em sentido pejorativo, presta-se a designar um grupo relativamente homogêneo de indivíduos estadunidenses
de religião protestante e ascendência britânica que supostamente detêm enorme poder econômico, político e social. Costuma ser
empregada para indicar desaprovação ao poder excessivo de que esse grupo gozaria na sociedade norte-americana. Salvo em
tom jocoso, é incomum que alguém se refira a si mesmo como um WASP. Em termos mais genéricos, a expressão pode ser
aplicada a qualquer descendente de europeus ocidentais (não necessariamente britânicos), mas não a católicos, judeus, negros,
latinos, nativos americanos e asiáticos. Fonte: wikipedia
25
ZACCONE, Orlando, Acionistas do Nada, REvan, 2008, p. 83.
26
“A história de sua presença [da maconha] no Brasil ainda não foi satisfatoriamente esclarecida. Para D. Parreiras, o canabismo
foi introduzido no Brasil pelo negro escravo, com o que concordam E. Cardoso, J. Mendonça, R. Dória, J. Lucena, G. Moreno, C.
Farias, todos participantes da Coletânea de Trabalhos Brasileiros sobre a Maconha, Publicada pelo Ministério da Educação e
Saúde, em 1958, ‘todos bons conhecedores do assunto’ (A Maconha, 1958, p. 333)” LUIZ MOTT, A Maconha na História do
Brasil in, Diamba Sarabamba, p. 119.
pessoas - que têm algum tipo de relação com as drogas. Sem desligar-nos dessa
perspectiva histórica, é possível dizer que: da mesma forma como os escravos
foram alvos de uma política escravagista, os usuários de drogas podem
também serem identificados como alvo de um outro tipo de política (bélico-
proibicionista). Conclui-se que tais pessoas estão vinculadas por um liame
objetivo, característico da noção de comunidade.
27
CARVALHO, Salo. A Política Criminal de Drogas no Brasil, p. 202.
art. 33, em crime equiparado a hediondo28 (por outro lado). Eis aí o manifesto e
amplíssimo espaço de arbítrio que medeia as duas condutas. De sorte que, ainda
que os diversos agentes das instâncias de policiamento ostensivo reconheçam estar
diante de usuários, a compreensão de que estamos lidando com uma tradição
moral autoritária, o reconhecimento de nossas desigualdades históricas, aliado
a uma mirada minimamente realista para o cotidiano; tudo isso permite
depreender de que tipo de abuso estamos tratando aqui.
28
Segundo SALO DE CARVALHO a possibilidade de extradição do brasileiro naturalizado na forma do art 5.º, LI da Constituição
da República por “comprovado envolvimento em tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins” torna o delito previsto no art. 33
da Lei 11.343/06 o mais grave dentre todos os tipos penais.
29
“O senso comum é um fundo de evidências partilhadas por todos que garante, nos limites de um universo social, um consenso
primordial sobre o sentido do mundo...” BOURDIEU, Pierre. Meditações Pascalianas, p. 118.
30
ZAFFARONI, E. Raul; BATISTA, Nilo; ALAGIA, Alejandro & SLOKAR, Alejandro. Direito Penal brasileiro: teoria geral do direito
penal. RJ: Ed. Revan, 2003, vol. I, p. 43
31
Id. p. 54
32
Salo p. 33 nota de rodapé
seja drasticamente diverso, a reação das agências de repressão (malha
criminal) à figura do usuário acaba contaminada pela fantasmagoria33 que
reveste o estereótipo do traficante.
33
[Numa realidade em que] “bala perdida, roubo de veículos, queima de ônibus e até o comércio são diferentes práticas ilícitas
imputadas aos ‘traficantes’, que passam a ‘constituir uma categoria fantasmática, uma categoria policial que migrou para a
academia, para o jornalismo, para a psicologia e que não tem cara, não é mais humana. É uma coisa do mal.” Entrevista com
Nilo Batista e Vera Malaguti Batista. In, Caros Amigos: agosto de 2003.
34
Arquétipo, na psicologia analítica, significa a forma imaterial à qual os fenômenos psíquicos tendem a se moldar. Originam-se
da constante repetição de uma mesma experiência para formar as tendências estruturantes e invisíveis dos símbolos, criando
imagens ou visões que irão balancear aspectos da atitude consciente do sujeito. Fonte: Wikipédia.
35
SALO DE CARVALHO: Op. Cit., pp. 81 e 82.
“O estereótipo do bandido vai se consumando na figura de um jovem negro,
funkeiro, morador de favela, próximo do tráfico de drogas, vestido com tênis,
boné, cordões, portador de algum sinal de orgulho o de poder e nenhum sinal
de resignação ao desolador cenário de miséria e fome que o circunda. A
mídia, a opinião pública destacam o seu cinismo, a sua afronta. São
36
camelôs, flanelinhas, pivetes e estão por toda a parte...”
35. Para além do fato de serem alvo do controle social motivado pelo
proibicionismo, a solidariedade cultural que vincula os usuários de drogas ilícitas
em genuína comunidade vulnerável39 para os fins a que se destina o presente
HC preventivo, pode ser observada não só na já mencionada Marcha da
Maconha, mas está presente em diversos outras organizações, personalidades
públicas e na promoção de campanhas por instituições nacionais e
internacionais40 que participam do debate público, sempre motivados pela
constatação de que a atual política de drogas tem sido responsável pelo exponencial
aumento do encarceramento no país. Como visto, apesar da despenalização
advinda com a Lei 11.343/06, a previsão legal do art. 28 tem sido capaz de
submeter ainda largos estratos comunitários à experiência deletéria e
36
MALAGUTI, Vera. Difíceis Ganhos Fáceis, p. 36.
37
Ideologia e Desenvolvimento Nacional, Instituto Superior de Estudos Brasileiros, MEC, 1956
38
ADPF 187/DF e ADI 4274/DF
39
O conceito de vulnerabilidade permite não só constar o processo de atribuição dos rótulos, no qual o estigmatizado adquire
posição passiva (o estigma lhe é empregado), como o processo de risco pessoal, da conduta comissiva pessoal ou coletiva na
qual o sujeito se coloca em situações estigmatizáveis. (Op. Citada, p. 41)
40
Como por exemplo, o ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso, a LEAP – Law Enforcement Against Proibition
e, mais recentemente a campanha do CESEC – Centro de Estudos de Segurança e Cidadania intitulada “Da Proibição Nasce o
Tráfico”, deixa ver que há uma ampla rede (comunidade) de pessoas identificáveis como vulneráveis a merecer resguardo do
Poder Público. Do texto que resume a campanha do CESEC extrai-se: “A proibição afasta dos serviços de saúde e cuidado
aquelas pessoas mais afetadas pelo abuso dessas substâncias, que, com medo de serem presas, preferem se esconder a
pedir ajuda. Por fim, a proibição e as organizações criminosas que ela alimenta sujeitam populações inteiras a uma guerra
sem fim, sacrificando, sobretudo, a vida de policiais e de moradores das periferias brasileiras.”
estigmatizante da restrição à liberdade; da detenção – ainda que limitada à
captura destinada à lavratura de termo circunstanciado.
41
GALLIEZ, Paulo, O Defensor Público como Instrumento de Transformação Social, Lumen Juris, 2001, p. 37
42
MUNDIM, Pedro Santos, Das Rodas de Fumo à Esfera Pública, AnnaBlume, 2006, p.122
43
GALLIEZ, PAULO, O Defensor Público como Instrumento de Transformação Social, Lumen Juris, 2001, p. 47
recursos são gastos no financiamento de um modelo reconhecidamente bélico – o
que se constata pelo slogan adotado: war on drugs.
“The global war on drugs has failed, with devastating consequences for
individuals and societies around the world. Fifty years after the initiation of the
UN Single Convention on Narcotic Drugs, and years after President Nixon
launched the US government´s war on drugs, fundamental reforms in national
44
and global drug control policies are urgently needed.”
44
War on Drugs, disponível https://en.wikipedia.org/wiki/War_on_Drugs, acesso em 08 de julho de 2015.
exportação ilegal para os Estados Unidos.45 Em clara contraposição ao modelo
inaugurado a partir da década de 1970, Colorado e Washington permitem, desde
2012, o consumo de pequenas quantidades de entorpecente para uso recreativo a
partir dos 21 anos, o que conta com a aprovação da maioria dos norte-americanos.
Atualmente, 20 estados também autorizam médicos a receitar no apoio de tratamento
de doenças. Avança, ainda que lentamente, a mudança de mentalidade em razão dos
desastrosos resultados produzidos em décadas de prisões, intervenções militares e
enorme gasto de recursos públicos sem qualquer retorno efetivo.
45
Effiency of war on drugs in the United States,
https://en.wikipedia.org/wiki/War_on_Drugs#Efficiency_of_war_on_drugs_in_the_United_States, acesso em 08 de julho de 2015.
quantidade: cannabis folha, 25 gramas; haxixe, 5 gramas; cocaína, 2 gramas;
heroína, 1 grama; LSD ou ecstasy, 10 comprimidos.
47. Uma reunião com a Comissão não tem a mesma carga formal e
simbólica de uma audiência em um juízo criminal, reduzindo a estigmatização dos
consumidores. O relato a seguir colacionado revela que um ambiente sem a
intervenção da polícia e dos atores do sistema de justiça criminal produz efeitos
benéficos:
“De facto, os consumidores entrevistados neste estudo descrevem ter
sentido menos receio de serem presentes perante a Comissão do que
teriam se tivessem sido presentes a tribunal, como no antigo sistema. A
audição tem lugar numa sala normal, com uma mesa onde membros da
comissão e indiciados abordados por posse de substâncias ilegais se
sentam. Os indiciados podem ser apoiados por um terapeuta ou
advogado, e o representante legal é obrigatório no caso de menores de 18
anos. No caso dos indiciados com mais de 18 anos, a correspondência
não tem obrigatoriamente que ser enviada para a sua morada se a pessoa
não quiser que terceiros tenham conhecimento do seu processo. Se uma
pessoa é presente à Comissão pela primeira vez, na grande maioria dos
casos a Comissão suspende o processo e não aplica nenhuma sanção.
Se um consumidor não dependente é presente à Comissão uma segunda
vez, pode ser-lhe aplicada uma coima de valor aproximado de 30€ ou 40€,
e proporcionalmente mais em reincidências futuras. Outras sanções
administrativas incluem trabalho comunitário, apresentações regulares em
local designado pela Comissão, privação da gestão de subsídio ou
benefício atribuído por entidades públicas ou a participação em algumas
46
sessões de prevenção em grupo”.
46
Política de drogas em Portugal: os benefícios da descriminalização do uso de drogas. Open Society Foundations”.
maioritariamente consumidas por jovens. O estudo de 2007 inclui uma
nova geração que não havia sido estudada em 2001; daí que pareça que o
consumo de drogas subiu abruptamente. Cada estudo consequente, em 5,
10 ou 20 anos, independentemente da política seguida, poderá mostrar
um “aumento” dos consumos conforme mais pessoas jovens que
experimentaram drogas, pelo menos uma vez ao longo da sua vida, vão
sendo incluídas e respondem “sim” à questão acerca dos consumos de
drogas. (...). De acordo com a análise do grupo dos 15–24 anos, o
consumo de drogas aumentou de 12.4% para 15.4% com um aumento
substancial no grupo dos 20–24 anos. No entanto, o nível de consumo de
drogas no grupo mais “sensível” (15–19 anos) diminuiu de 10.8% para
8.6%. Este resultado dá esperanças aos profissionais e especialistas
Portugueses, uma vez que o período tardio da adolescência, entre os 15 e
os 19 anos, determina se uma pessoa vai consumir drogas no futuro ou
não. Além do mais, estudos realizados entre estudantes de dois grupos
etários (13–15 e 16–18) também mostraram que o consumo de drogas
decresceu desde 2001. (...) O sucesso também pode ser reclamado visto
que as taxas de reincidência são baixas, sugerindo que a aproximação
sistémica resulta. Dos indivíduos notificados para a Comissão para
Dissuasão de Lisboa nos últimos dois anos e meio, apenas 395 de 4.981
eram reincidentes, uns meros 7.9%. Outro fenómeno positivo em Portugal
é o facto de o consumo de heroína, a droga mais problemática, não ter
aumentado e vir-se a manter em níveis mais ou menos estáveis desde que
a nova política entrou em vigor. De facto, funcionários do IDT consideram
que o consumo de heroína está “sob controlo”, o que significa que não
existe uma nova epidemia e que o número de consumidores não tem
aumentado. Quanto desta tendência se deve à nova política não é claro,
uma vez que na Europa Ocidental em geral a procura de heroína também
tem vindo a estabilizar ou diminuir desde 2001. Certamente podemos
afirmar que o terrível aumento na prevalência dos consumos previsto
pelos detratores das reformas não se materializaram. Por outro lado, os
consumidores de heroína em Lisboa alegam que a oferta de heroína é
muito mais baixa do que a procura; o que pode sugerir que as operações
policiais têm sido tão ou mais efetivas do que as campanhas de prevenção
e as medidas de dissuasão. O resultado, de qualquer forma, é positivo.
Um sucesso inegável é a mudança da forma como a heroína é consumida.
Atualmente, é mais vezes fumada que injetada. Este desenvolvimento
contribuiu para um “efeito secundário” positivo: a diminuição da
percentagem de consumidores infetados com VIH positivo. Tal sucesso
pode ser atribuído à política de prevenção e redução de danos, e, acima
de tudo, à informação acerca dos riscos de injetar heroína e ao aumento
dos programas de troca de seringas e agulhas”.
47
RICARDO LUIS LORENZETTI (según su voto)- ELENA I. HIGHTON de NOLASCO - CARLOS S. FAYT (según su voto) -
ENRIQUE SANTIAGO PETRACCHI (según su voto)- JUAN CARLOS MAQUEDA - E. RAUL ZAFFARONI (según su voto)-
CARMEN M. ARGIBAY (según su voto), disponível em http://s.conjur.com.br/dl/decisao-justica-argentina-porte-.pdf.
convivência social, não o reforço do aparato bélico, optou-se pela regulação do
mercado da maconha.
48
Clécio Lemos et al, “Drogas: Uma Nova Perspectiva”, org. Sergio Salomão Schecaira, São Paulo, IBCCrim, 2014
56. Argumentos que que foram perfilhados pelo Tribunal de Justiça de
São Paulo:
“O artigo 28 da Lei n. 11.343/2006 é inconstitucional. A criminalização
primária do porte de entorpecentes para uso próprio é de indisfarçável
insustentabilidade jurídico-penal, porque não há tipificação de conduta
hábil a produzir lesão que invada os limites da alteridade, afronta os
princípios da igualdade, da inviolabilidade da intimidade e da vida privada
e do respeito à diferença, corolário do princípio da dignidade, albergados
pela Constituição Federal e por tratados internacionais de Direitos Humanos
49
ratificados pelo Brasil”
49
Inteiro teor disponível em http://www.conectas.org/arquivos/editor/files/RE%20635659.pdf
50
(TJSP. JECRIM-CAMPINAS Proc. Nº 2.564/2013)
cada cidadão, inexistindo bem jurídico concreta e legitimamente tutelável;
logo, carecendo a conduta tipificada de ofensividade, e violando a
incriminação os supra citados princípios constitucionais, carece aquele tipo
penal de respaldo na Carta Maior, impondo-se o reconhecimento de sua
inconstitucionalidade, o que ora declaro.”51
51
(TJRJ. Proc. Nº Processo nº 0021875-62.2012.8.19.0208)
deste precedente, no mínimo, acena para uma mudança entendimento do
Tribunal Supremo.
64. Na esteira do que já fora ventilado no item 55, há, além do aceno
advindo com o reconhecimento da RG no RE 635.659/SP, a alusão à necessidade de
uma “correção de rumos” manifestada em fundamentação à ordem concedida de
ofício ao paciente do já mencionado habeas. Além disso, é clara a menção a
comunidades e ao coletivo de usuários. Assim sendo, não seria justo e nem
proporcional obrigar a pessoa humana a suportar o ônus do de um processo
criminal cuja conduta esta sendo revista pelo Tribunal Supremo.
“Avisa que todos os recursos que tenham por objeto da lide a discussão
sobre os expurgos inflacionários advindos, em tese, dos Planos econômicos
Bresser e Verão ficam sobrestados, observando que o objeto da
repercussão geral não alcança as ações em sede executiva (decorrente de
sentença transitada em julgado) e as que se encontrem em fase instrutória e
dá outras providencias.”
67. Nesta exata medida, se é possível o sobrestamento dos recursos
que protegem direitos econômicos, com mais razão se o sobrestamento vem a
resguardar o direito de liberdade. E aqui ainda incide a questão da máxima
efetividade de proteção ao direito de liberdade.
69. Eis as razões apresentadas para que a ordem seja deferida a fim
de que nenhuma pessoa que porte drogas na forma do art. 28 da Lei 11.343/06, sofra
o constrangimento ilegal de ser levado para a Delegacia a fim de que seja lavrado
termo circunstanciado.
52
Neste sentido, v. JOCK YOUNG. A Sociedade Excludente.
DA POSTULAÇÃO
LIMINARMENTE
NO MÉRITO