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04/12/2016 O caráter “natural” da maternidade

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O caráter “natural” da
maternidade Pesquisar

Publicado em 4 de dezembro de 2016 por Márcia - artigos

Duzentos e setenta
dias: desde sempre,
hora do parto. Sinais?
Pingos de sangue e as
primeiras dores – nos
livros de médicos do
século XVI ao XX,
chamadas de “puxos”.
Entre gente simples,
era a “perrengada”, o
“despacho” ou o
“rodiadô”, quando as
mulheres davam à luz
MARY DEL PRIORE
em casa. “Finalmente,
depois de dezesseis Historiadora e escritora,
horas de sofrimento, com mais de 36 livros
risos, cantoria e ginástica, as catorze e cinquenta do dia 3 de maio de publicados e diversos
1906, senti dores violentíssimas me rasgarem as entranhas […] Ai, prêmios nacionais e
aaaaai! Gritei desesperada agarrando-me ao pescoço de Valdomiro internacionais.
enquanto a criança entrava no mundo, escura, quase as៯�xiada pela
luta que tínhamos travado juntas. Rapidamente a parteira a pegou,
deu-lhe bofetadas e mergulhou alternadamente em bacias de água
quente e fria até que um chorinho assustado se ៯�zesse ouvir”, registrou
Maria Isabel Silveira.

       Parir era assim mesmo. Muito comum a qualquer gestante


fechar-se no quarto, portas e janelas cerradas, somente avós, tias e
vizinhas no recinto. Daí a pouco um choro anunciava a chegada de
mais um membro da família. Banquinhos baixos, gamelas, o colo ou
o pescoço do marido ou de uma mulher forte, cordas passadas por
portas e traves em que gestantes se penduravam, parto de cócoras,
de joelhos, de pé com as pernas abertas e 둺�etidas – en␯�m, desde a
noite dos tempos, não houve variações nas posições em que se dá à
luz.

       Em áreas rurais, no lugar de remédios de farmácia, partes


untadas com azeite de mamona ou gordura de animais e MÁRCIA PINNA RASPANTI

beberagens e banhos para diminuir


http://historiahoje.com/o­carater­natural­da­maternidade/ a dor foram eternamente Historiadora e jornalista. 1/8
04/12/2016 O caráter “natural” da maternidade

beberagens e banhos para diminuir a dor foram eternamente Historiadora e jornalista.


ministrados. A erva-de-são-joão fazia parte da receita analgésica  
desde tempos imemoriais. O chá de cordão-de-frade e agripalma,  
ainda hoje ingeridos, eram analgésicos registrados desde o século Siga-nos no Twitter
XVIII. Para expulsar a placenta? Ingerir três grãos de feijão. Depois, Follow
era preciso juntar a “mãe do corpo”, ou seja, “os ovários, o útero,
tudo o que a mulher usa para reproduzir”, explicou uma parteira.  
 
Parteiras no interior falavam com a “mãe do corpo”: “Eu coloco o
dedo no umbigo e aperto, quando ela não bate ou bate fraquinho é
porque a mulher está doente”. O remédio é a massagem com óleo
de andiroba, cânfora ou azeite. E dava certo? Nem sempre.

       Cássio de Rezende contou que certa vez, ao ser chamado com


urgência na casa de lavradores encontrou a “parturiente estirada de
costas e de pernas abertas sobre uma cama alta […] e no chão, o corpo
de uma linda criança, completamente nua, mas, sem cabeça”.
Horrorizado, quis saber o que aconteceu: “A criança vinha nascendo,
com as pernas de fora. Mas, como não acabava de sair, eles
começaram a puxar o corpo para fora pelas pernas. E tanto puxaram
que arrebentaram o pescoço da criancinha”. Cabeça que ele retirou
com o fórceps, depois de ter anestesiado a pobre mulher.  

        Retrato ␯�el dos partos em casa, em pleno século XX, deixou-nos


José Lins do Rego: “No outro dia de manhã começaram a aparecer as
dores tão esperadas na força da lua. Foram correndo à procura da
velha Alexandrina no São Miguel. A casa-grande voltou-se inteira para o
quarto de Tia Maria.Horas seguidas. Parara tudo. As negras da cozinha
não se mexiam. […] Ouvíamos de longe os gritos da Tia Maria […] Até
que se ouviu um grito: “Viva Nosso Senhor Jesus Cristo!”. E chorava o
menino. As negras gritavam depois: “É uma menina”. Mais tarde passou
Pia com a secundina, os restos do parto para enterrar. Abriam a
destilação. Garrafas de mel de abelha misturavam-se as canadas de
aguardente. A mulher parida não podia ver ninguém ainda!”.

      No interior de Minas Gerais, como explicou Rubem Alves, “não se


falava em mulheres grávidas. Dizer que uma mulher estava grávida era
uma obscenidade, uma grosseria. As mulheres não ៯�cavam grávidas,
៯�cavam em “estado interessante” […] Acho que a palavra grávida trazia
associações ao ato ridículo que se encontrava nas suas origens.
Imaginar aquela “excelentíssima senhora” de pernas abertas sendo
cavalgada pelo seu “excelentíssimo marido”, de traseiro nu para cima,
era realmente ridículo. Mulher não paria. Ficava doente. Quando a
parteira era chamada dizia-se “Dona Leonina adoeceu”. Esse era o jeito
educado de falar”.

       Diante da violência e da precariedade da maioria dos partos,


lançou-se mão de uma revolução sanitarista que buscava abafar o
passado “atrasado”. A herança do colonialismo e da escravidão
tinha de ser substituída pela “modernidade”. E o que signi␯�cava
isso? A transformação da mulher em máquinas de fazer ␯�lhos, mas,
sobretudo, cidadãos e soldados, para o bem da pátria. Nascia a
“maternidade cientí␯�ca”: que seria acompanhada por médicos,
amparada pela mamadeira com leite arti␯�cial – invenção americana
dos anos 1890 – e pela promoção da mulher como auxiliar dos
médicos na luta por uma sociedade mais saudável. Organizações
␯�lantrópicas ajudavam. Mulheres de classe média e alta
organizavam programas de assistência às mães pobres. Palestras

sobre higiene infantil e saúde pública


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sobre higiene infantil e saúde pública promoviam a atuação


feminina na “ascensão física e moral” da população brasileira.

        O papel social preponderante era ser mãe e Adalgisa Néri


estava impregnada desta mentalidade: “Eu não podia conceber a
ideia de passar pela vida sem ser mãe. Um ៯�lho para mim era um
motivo independente de um casamento feliz ou não […] Um dia
deslumbrada, veri៯�quei que meu corpo preparava-se para a
maternidade. O encantamento que experimentei foi tão grande quanto
o que constatei no amor […] Todos se ocupavam no enxoval para o ser
que eu guardava no ventre. O meu primeiro ៯�lho nasceu normalmente
numa quente manhã. Era um menino como tantos outros”.

      Mas, a fertilidade do casal e a capacidade de reproduzir atingiam


o homem, também. Eles desejavam ␯�lhos e eram incitados, segundo
a historiadora Rosa Maria de Araújo, a dar apoio à grávida e, depois,
à parturiente: “Para nós o maior acontecimento de 1935 foi o
nascimento de nosso primeiro ៯�lho, uma menina. Nos primeiros três
anos de nossa vida de casados, minha mulher e eu, que mal podíamos
esconder nossa tristeza e nossa decepção por não termos ៯�lhos,
entretínhamo-nos com os ៯�lhos alheios, que pedíamos “emprestados” a
vizinhos e amigos”, con␯�rmou Érico Veríssimo.

      A maioria dos pais aguardava o nascimento dos ␯�lhos do lado de


fora do quarto, esperando a boa notícia: Um ␯�lho! Uma ␯�lha!
Seguiam-se as visitas de cortesia onde se trocavam comentários
sobre a semelhança física da criança com algum membro da família.
Ao dar a luz em casa, as sofredoras tinham que se conter para não
assustar o cônjuge ou os familiares. O pudor era obrigatório:

“Por ocasião de seus partos – e foram quatorze – Coelho Neto ៯�cava


nervosíssimo e enchia a casa  de amigos… – Imagine a minha situação
nesses momentos, em que toda a mulher deve ter o direito de expandir
sua dor, os seus sofrimentos, eu não podia nem gemer, pois os rapazes
estavam todos no gabinete do Henrique, fumando, bebendo,
palestrando, separados de mim, às vezes, por uma porta!”, queixou-se
Dona Gaby à senhora Campos.

       Os partos em domicílio eram feitos pelos médicos, quando eles


estavam por perto. Veja-se o relato de Afrânio Peixoto a Humberto
de Campos, sobre o seu primeiro:

 “ – Quando eu me formei minha mãe me ofereceu uma bonita caixa de


ferros para parto. Um dia, mandaram-me chamar…Peguei a caixa e
fui…Pelo caminho, vinham-me à lembrança todas as providências
recomendadas pelos mestres na faculdade….E se fosse uma placenta
prévia? Seria o insucesso, o desastre da carreira…Quando penetrei no
quarto, encontrei a mulher estendida soprando uma garrafa…ninguém,
no interior, nasce sem o auxílio de uma garrafa que a parturiente sopra
a ៯�m de fazer força e expelir a criança. A minha cliente já estava
exausta de soprar. Peguei-lhe da mão, acalmei-a, mandei que
descansasse um pouco: “Minha ៯�lha, isso não é nada; dentro de uma
hora está tudo acabado”. Não foi preciso tanto; eu estava começando a
distraí-la quando a parteira gritou: – Seu doutor, lá vem criança! Foi um
sucesso! Toda a gente ៯�cou absolutamente certa que eu salvara a
criança”.

       E depois, vinha o “tempo de resguardo.


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       E depois, vinha o “tempo de resguardo. Depois do parto,


con␯�ado às mãos amorosas das parteiras competentes, as
mulheres atravessavam por largo período de cuidadoso descanso,
dito resguardo, que durava coisa de quarenta dias. Parentas e
amigas chegavam para cuidar da criancinha e poupar esforços à
mãe que passava os dias deitada e recebia alimentação especial, na
base de canjas, caldos, mingaus de caridade, caldo de galinha gorda,
caldo de mulher parida. “Um menino batia à porta e entregava:

– Aqui está o frango que mamãe mandou para o resguardo de dona


Josefa. Não podia faltar era a Água Inglesa Granado, vinho
reconstituinte, nem a marmelada Colombo. Em compensação, às visitas
freqüentes durante quarenta dias do resguardo, era servido mijo de
criança: vinho do porto ou aluá de abacaxi, com sequilhos de araruta
feito em casa”, reconstituiu Thiago de Mello.

       O compadrio espiritual, desde sempre, se mantinha: “batizaram-


me na igreja do Estácio, Rio de Janeiro, tendo sido padrinhos Maria José
e José Ferreira Vaz, ele português, negociante de vida folgada. O casal só
tinha ៯�lho e D. Maria José pediu a mamãe para chamá-la para
madrinha se a criança esperada fosse menina. Foram sempre muito
gentis para com a a៯�lhada, enviando-lhe belos presentes dos quais o
mais valioso foi um estojo de prata em caixa de veludo vermelho,
forrada de cetim do mesmo tom que constava de talher, copa, argola,
chocalho e uma canequinha de café com colherinha… Para que, num
estojo infantil, aquela canequinha de café? Talvez para um chazinho
calmante”, registrou Laura Rodrigo Octávio.

      Não bastava gerar ␯�lhos. Era preciso que a mãe fosse educadora
e dirigente moral da sociedade; era preciso pensar que o Brasil
necessitava de exércitos, de braços. A nova mãe possuiria
sentimentos cívicos. Nas revistas, publicavam-se fotogra␯�as com o
subtítulo “quando eu tiver vinte anos… serei um valente soldado
brasileiro”. O pequerrucho da foto contava apenas seis meses!

      Ai de quem descumprisse seu “dever maternal”. Com ␯�lhos, o


divórcio seria impensável, a␯�rmava a Revista Feminina. Era preciso
um sacrifício, “por ser mãe e viver para os ␯�lhos”. Senão, virava
“fera”. Nas páginas das revistas, a maternidade servia aos anúncios
de publicidade. Ovomaltine, por exemplo, anunciava-se com a
chamada “Uma mãe feliz”. Ambos, ela e o bebê, sorviam gulosos o
alimento à base de leite, ovos e cacau. Dizendo-se “linda e rosada”,
Laura Rodrigo Octávio não tomou Ovomaltine, mas mamou “numa
portuguesa feiosa e sardenta chamada Maria”. Naqueles tempos,
quem não tinha leite precisava recorrer às amas de leite, a e assim
conheci várias famílias”.

       O papel feminino que prevaleceu nesses primeiros cinquenta


anos do século XX foi o de mãe. Multiplicavam-se creches
bene␯�centes para que mães pobres pudessem trabalhar. No II
Congresso Internacional Feminista, defendeu-se que “fosse feito um
apelo às mulheres brasileiras, visto que era responsabilidade do
sexo feminino, por excelência, a proteção e a defesa da criança”. “A
maternidade, o cuidado e os carinhos com sua prole são os
primeiros deveres da mulher”, admoestava o número de junho de
1916, de Vida Doméstica. E prevenia: “A mulher que não for boa
mãe, deixa por isso mesmo de ser mulher”. Atributos normalmente
associados à feminilidade reforçavam o caráter “natural” da
maternidade. “Com o nascimento dos ␯�lhos, o papel da mulher já
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maternidade. “Com o nascimento dos ␯�lhos, o papel da mulher já


nobilitado pelo amor, aumenta bruscamente”, informava a Revista
Feminina, de maio de 1923. “Que virtude brilhante manifesta a
mulher como mãe”, martelava a Vida Doméstica. Só o casamento e
a maternidade salvavam. E até de moléstias:

“Eu dormia na cama com Tia Naninha. E aconteceria um fato


desagradável. Ao amanhecer, notei manchas de sangue nos lençóis.
Corri para a tia e ela me deu um puxavão: Deixa de besteira, menino! E
៯�cou vermelha como a malagueta. Vim, a saber, depois que eram coisas
de mulher. Sofria muito a Tia Naninha de dores nas cadeiras.
Constantemente procurava pílulas para minorar os sofrimentos. “Coisas
de moça – dizia Firmina – Isto sai com o casamento” – contou Zé Lins
do Rego.

       A “nova mãe” deveria aprender, pois a maternidade era uma


“ciência”. O médico higienista, doutor Fontenelle, explicava: “Já está
absolutamente provado que a mais importante causa da
mortalidade infantil é a ignorância das mães”. Nada de danças ou
futilidades. Apenas a instrução permitia-lhes colaborar para o
desenvolvimento do país. Em junho de 1929, foi criada em São
Paulo, sob os auspícios da Liga das Senhoras Católicas, a Escola de
Economia Doméstica, cujo objetivo era “formar boas mães de
família, que por sua vez darão à Pátria ␯�lhos valorosos e fortes,
inteligentemente educados na moral”. Importou-se mesmo da Suíça
uma professora para ministrar os cursos: mademoiselle Girodat.

      A puericultura entrou na moda. O “ensino vivo da higiene”,


também. O livro do pediatra Antonio Wittrock, Guia das mães,
tornou-se leitura obrigatória. Ele ensinava que era preciso
abandonar as “crendices do passado” e con␯�ar no médico.
Distribuíam-se “conselhos” e “ensinamentos” sobre medicina
doméstica e doenças infantis, desmame e alimentos adequados.
Anunciavam-se produtos: a Camomilina, a farinha láctea Nestlé, os
mingaus Otker. Especialistas condenavam o uso da chupeta e os
mimos excessivos – crianças assim criadas resultariam em adultos
medíocres. Viva a moderação! Pediatras ocupavam colunas em
revistas femininas lembrando mais uma vez que apenas a
“alimentação racional dos ␯�lhos” os fazia “fortes e sadios”,
concorrendo para “elevar bem alto o nome de nossa querida
Pátria”. O medo da morte dos pequenos e a alta mortalidade infantil
ajudavam a consolidar o papel da “nova mãe”. O I Congresso de
Proteção à Infância, realizado no Rio de Janeiro em abril de 1923,
elegeu dois heróis: os médicos e as mulheres como salvadores do
país!

     A fertilidade feminina era assunto discutido nas famílias. Suas


causas, esmiuçadas à boca pequena. A esterilidade, sempre
condenada, lembrava Zélia Gattai: “Tia Dina também não podia ser
mãe, coitada. Ela tinha oveiro seco. Nunca tivera ៯�lhos. Soube disso por
uma conversa ouvida entre mamãe e tia Margarida. Mamãe dizia que
só podia ser oveiro seco porque tia Dina estava no segundo marido e…
Nada!Tia Margarida dizia que podia também muito bem ser matriz
virada”.

      Mas junto com as mães, nas cidades industrializadas, crescia o


número de mulheres operárias. Como cuidariam dos ␯�lhos? Patrícia
Galvão, a conhecida Pagu, feminista e comunista, foi a primeira a
denunciar, em seu romance Parque industrial, a situação perversa
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denunciar, em seu romance Parque industrial, a situação perversa


em que essas viviam. Na voz de uma personagem “revolucionária”,
fomentadora de greves, ela denunciava: “Nós, à noite, nem força
temos para acalentar nossas crianças que ␯�cam sozinhas e largadas
o dia inteiro ou fechadas em quartos imundos, sem ter quem olhe
por elas”!

      Os poderes públicos se preocupavam então com o movimento


operário e a participação feminina. Quando se tratava de pedir
aumento de salários ou protestar contra a elevação dos impostos e
do custo de vida, mulheres iam para as ruas. Em outubro de 1902,
para ␯�car em um exemplo, paralisaram fábricas de tecido no Bom
Retiro, em São Paulo, em um movimento grevista contra os maus-
tratos de mestres de teares. As paralisações se sucediam, e o
movimento por melhores condições de vida se alastrou entre as
trabalhadoras.

       Uma das soluções foi criar um discurso normativo que as tirasse


das ruas e as ␯�zesse voltar para a vida doméstica. Os médicos
colaboravam. Um Concurso de Robustez, que premiava a mãe
operária e pobre que amamentasse até o sexto mês, encheu as
capas dos jornais. Boletins de “Conselhos às mães” eram
gratuitamente distribuídos. A preocupação era convencer a mulher
de que o amor materno era inato, puro e sagrado, e que apenas por
meio da maternidade e da educação dos ␯�lhos ela realizava sua
“vocação natural”. Sanear a sociedade por intermédio das mulheres
era a meta. Mas qual mulher? Somente a esposa e mãe.

       Mas não foi só a medicina que tentou, cienti␯�camente,


“moralizar” a mulher. Durante o Estado Novo, Getúlio Vargas
concedeu uma série de favores à Igreja, e um “pacto moral” selou
novo acordo entre Estado e Igreja. Esta se tornaria uma grande
aliada na consolidação de uma ética cristã baseada na valorização
da família, do bom comportamento, do trabalho e da obediência ao
Estado. Desse esforço, havia que se multiplicar “mães e esposas”.
Aquela que não preenchesse os requisitos estipulados pela
“natureza” era identi␯�cada como “anormal”, pecadora e criminosa.
Não amamentar, não ser esposa nem mãe signi␯�cava desobedecer
à ordem natural das coisas. E, como se não bastasse, ainda punha
em risco o futuro da nação, por não formar bons cidadãos.

       Na representação santi␯�cada da mãe-esposa-dona de casa


ordeira e higiênica, a sexualidade só aparecia associada à
procriação. A ascensão da ␯�gura da mãe inibia a sexualidade
conjugal. A mulher destinada à maternidade não podia procurar
prazer, e a idéia do orgasmo materno se torna escandalosa, mesmo
impensável. E mais: o amor aos ␯�lhos deveria ser o principal fator
de união dos casais. Dentro do casamento, prevalecia o caráter
assimétrico: a mulher, reduzida ao papel de mãe e esposa. O pai,
dedicado ao trabalho, à posse da mulher e à ␯�scalização dos ␯�lhos.
Texto de Mary del Priore.

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“Madona do leite”, Correggio (séc. XVI).

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