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A moral segundo Holbach

Pedro Gabriel Rezende

Nascido em 1723, na Alemanha, mais precisamente em Edesheim, Paul Henri Thiry,


mais conhecido como barão de Holbach, mudou-se para a França por influência de seu tio – de
quem, aliás, herdou a fortuna e o título de Barão de Holbach. Como barão de Holbach,
devotou-se aos estudos científicos.

Thiry viveu num tempo muito propício para a feitura da sua obra – prova-o não
somente o seu apreço pela química nascente, à qual dedicou nada menos do que 396 artigos,
mas também as figuras que frequentaram sua propriedade, tais como Diderot, Hume,
D’Alembert e Rousseau. Nos encontros organizados em sua casa, o empirismo de Locke era
muito propagado por ele. Aliás, Holbach fez parte da Encyclopédie1. Esses encontros eram
jantares luxuosos promovidos pelo próprio barão (o que lhe rendeu a alcunha de Le premier
maître d’Hotel de la philosophie). Algumas das figuras que os frequentavam eram, assim como
Holbach, ateístas. Sobre a questão do ateísmo de Holbach, Rousseau fizera uma alusão em La
nouvelle Heloïse, dando a entender que Hobach era o ateu que incorporava todas as virtudes
cristãs. Como veremos, Holbach elaborou um sistema materialista no qual incluíra uma ética; o
fato de Holbach ser ateu lhe rendeu muitas animosidades, que não passavam de preconceitos,
pois o filósofo se preocupou com a moral e o bom convívio entre os homens. O próprio
subtítulo do Système de la nature é Des lois du monde physique et du monde moral.

De fato, Holbach foi discriminado pelos seus contemporâneos; a obra da qual


trataremos aqui, Système de la nature, foi condenada e execrada pelo próprio Parlamento de
Paris. Assim, Système de la nature e Le bon sens foram queimadas em praça pública. Holbach
morreu no ano do início da Revolução Francesa, 17892.

No que tange ao pensamento de Holbach, podemos, como já dissemos, encontrar


influência de Locke, que, no seu Ensaio acerca do entendimento humano, anuncia que todo o
conhecimento provém da experiência, sendo a sensação e a reflexão as suas fontes originárias.
Já nas primeiras linhas de sua obra, Holbach acentua a sua inclinação para o empirismo: “Os
homens sempre se enganarão quando abandonarem a experiência em prol de sistemas
gerados pela imaginação.”3 Assim como Locke, Holbach admite que é pelos nossos sentidos
que estamos ligados à natureza: “É pelos nossos sentidos que podemos experimentá-la (a
natureza) e descobrir seus segredos; assim que abandonamos a experiência, caímos no vazio
onde a nossa imaginação nos perde.”4 Holbach também o confirma por uma exortação:

1
Araújo, Robson Jorge de. O materialismo radical de Holbach e a química moderna. Dissertação de
mestrado. UFMG, 2006.
2
Stanford Encyclopdia of Philosophy. Acessível em: https://plato.stanford.edu/entries/holbach/#1
3
Holbach. Système de la nature ou des lois du monde physique et du monde moral, p.5
4
Holbach. Op. cit. p. 8
“Tomemos a experiência por guia; consultemos a natureza.”5 Mas, ao contrário de Locke,
Holbach não admitirá a existência de Deus senão como uma quimera proveniente da
imaginação e do desconhecimento da natureza, uma quimera de cujo nosso conhecimento
não pode haurir nenhuma ideia fiável.

Holbach dirá que o homem é produto da natureza, isto é, o homem é apenas parte
deste todo a que chamamos natureza: a reunião de diferentes matérias e suas diferentes
combinações. Por considerar o homem um ser puramente físico, a distinção entre homem
físico e homem moral é uma distinção feita meramente a partir de um ponto de vista: “O
homem físico é o homem que age pelo impulso de causas que os nossos sentidos nos fazem
conhecer; o homem moral é o homem que age pelas causas físicas que os nossos preconceitos
nos impedem de conhecer”6.

Assim, vemos que, para Holbach, mesmo o agir moral não é senão uma cadeia de
causas e efeitos físicos. Notamos também a influência da química sobre o filósofo, uma vez
que ele admite o movimento mecânico, mas reconhece que os corpos estão sempre em
movimento do ponto de vista químico: a natureza está sempre em movimento, está sempre a
desenvolver-se. A própria essência da natureza, diz Holbach, é agir; não há corpo que goze de
repouso absoluto: o corpo não goza senão de um repouso aparente, porquanto o movimento
dos átomos e o movimento de composição das moléculas, por exemplo, são imperceptíveis
para nós.

Mas de onde a natureza recebe seu movimento? ora, se não há nada fora da natureza,
o movimento deve provir dela mesma. A matéria está sempre em movimento em razão de
suas forças internas e inerentes. Holbach falará do movimento das moléculas insensíveis
internas aos corpos e usará como exemplo o processo de fermentação, ou seja, um processo
químico. Outrossim, a vontade humana também resulta desse movimento chamado interno.
Cito Holbach:

“Tais são ainda os movimentos internos que se passam no homem, que


nós nomeamos suas faculdades intelectuais, seus pensamentos, suas paixões, suas
vontades. (...) A vontade do homem é movida ou determinada secretamente por
causas exteriores que produzem uma mudança nele.”7

Não há, para Holbach, segundo a mecânica dos corpos e a sua composição interna,
movimento que seja estritamente espontâneo: toda mudança ocorre devido à ação recíproca
dos corpos e das moléculas imperceptíveis; ocorre devido aos movimentos visíveis ou ocultos
aos nossos sentidos. Ora, mas em que isso implica? Se a vontade que inclina o homem para
uma ação em particular é determinada por causas exteriores, não há livre-arbítrio; de igual
modo, se a matéria se move a partir de sua própria energia, excluímos a possibilidade de um
Deus que criou este mundo. Nietzsche também negará o livre-arbítrio, considerando o
indivíduo uma polifonia de forças com um único sentido; a ação – para Nietzsche, ser é agir –,
não é determinada por um sujeito isolado do mundo que possui o pensamento como atributo,
mas pelas forças que se relacionam.

5
Holbach. Op. cit. p. 11
6
Holbach. Op. cit. p. 7
7
Holbach. Op. cit. p. 16
Portanto, vemos que no sistema de Holbach, nenhum lugar é reservado para Deus ou
para o livre-arbítrio, uma vez que “suas (i.e., do homem) ações visíveis, assim como os
movimentos invisíveis excitados no seu interior, devenientes de sua vontade ou do seu
pensamento, são, igualmente, efeitos naturais, sucessões necessárias de seu mecanismo
próprio e dos impulsos que ele recebe dos seres que o cercam”8. De igual modo, todo
desenvolvimento da humanidade não é senão uma “longa sucessão de causas e efeitos”
daquilo que a natureza dotou o homem.

Com isso, poderíamos erroneamente supor que Holbach não está preocupado com
problemas éticos e morais, uma vez que ele considera Deus uma quimera criada pelo homem a
partir da ignorância acerca de sua própria natureza – mais, a partir da ignorância do homem
em relação à natureza como um todo, da qual ele é apenas uma parte – e não há no seu
sistema nenhum espaço para o livre-arbítrio. Porém, Holbach se preocupa verdadeiramente
com os problemas de natureza ética e moral. Para ele, o fundamento das ações humanas não
deve derivar de um ser metafísico e inexperienciável pelos homens; o fundamento das
relações e ações humanas devem, ao contrário, derivar do conhecimento da natureza, uma vez
que, conhecendo a natureza, o homem conhece a si mesmo. Neste ponto, vemos Holbach dar
um passo além de Locke, para quem a moral é pensada no nível das ideias complexas de
relação, que o pensamento engendra a partir de operações da reflexão; para Holbach, como
dissemos acima, o homem é puramente físico. O conhecimento e a ação conforme à natureza
é também o ponto de convergência entre Holbach e o estoicismo. Comparemos o que
dissemos com essa passagem de Marco Aurélio:

“Considera-te digno de toda palavra e ação conformes com a natureza.


Não te distraiam a censura ou os comentários pelas pessoas suscitados; se agiste e
falaste com acerto, não te consideres indigno. Aquelas pessoas têm seu próprio guia
e seguem impulsos seus; não te preocupes com elas, mas prossegue, acompanhando
a tua natureza e a universal; o caminho de uma e outra é um só.”9

Ou esta: “Ninguém te impedirá de viver segundo a razão de tua natureza e nada te


acontecerá contra a razão da natureza comum.”10

Como produto da natureza, o homem está submetido às suas leis. Nessas leis, nessa
natureza ao qual o homem pertence, reside a felicidade. “Todo erro é nocivo”, diz Holbach: “é
por ter se enganado que o gênero humano se tornou infeliz”11. Holbach considera, então, que
os erros morais devêm da ignorância em relação à natureza. Ele acredita que, se o homem
tivessem recorrido ao conhecimento da natureza pela experiência, ele não se enganaria. Até
então, os homens mergulharam no abismo do oceano metafísico e negligenciaram que é no
conhecimento da natureza que está a cura para os infortúnios e o caminho para a felicidade: a
partir dessa negligência, criaram uma fantasia responsável tanto pelas suas penas quanto
pelas suas glórias: Holbach, então, atribui à falta de conhecimento da razão imanente à
natureza a criação dos deuses.

8
Holbach. Op. cit. p. 6
9
Marco Aurélio. Meditações, livro V, meditação 3.
10
Marco Aurélio. Op. cit. Livro VI, meditação 58.
11
Holbach. Op. cit. p. 8
Nietzsche trilhará um caminho similar: para ele, o ressentimento cristão cinde o
mundo numa dicotomia, qual seja, a do mundo ilusório, passageiro e de sofrimentos, que é
este, e do mundo verdadeiro e estável, no qual reside a felicidade post-mortem. Já no século
XVIII, Holbach quererá demonstrar que não existe dicotomia entre homem e natureza: o
homem não precisa esperar e nem acreditar na vida após a morte para viver bem consigo e
com os outros, mas deve fazê-lo aqui, visto que não existem dois mundos, mas apenas um,
onde homem e natureza estão unidos. Cito Holbach:

Contemplemos atentamente o mundo visível e vejamos se ele não basta


para julgarmos as terras desconhecidas do mundo intelectual. Pode ser que
descubramos que nunca houve razão para distingui-los e que, sem motivos,
separaram-se dois impérios que são igualmente do domínio da natureza.12

Entretanto, a meu ver, não é o desconhecimento do homem isolado em relação à


natureza que mais preocupa Holbach, mas do homem em comunidade: é o homem na
sociedade que, não conhecendo suas tendências, sua natureza, “caiu da liberdade para a
escravidão”13. O homem, em sociedade, se vê forçado a entregar seu bem estar àqueles que
ele proclama seus senhores. Holbach escreve claramente que, em sociedade, o homem se
entrega sem reservas a outros homens; mais, o indivíduo julga que estes homens a quem ele
sacrifica seu bem-estar são superiores a ele. Estes homens superiores, os chefes, diz Holbach,
“aproveitam-se do erro do homem para subjugá-lo, corrompê-lo, torná-lo vicioso e
miserável”14. Como um iluminista, Holbach acredita (assim como Kant, a despeito do abismo
que há entre os dois) que o homem deve se libertar dos senhores.

Em sociedade, portanto, o problema do desconhecimento da própria natureza se torna


maior: não reconhecendo a própria natureza, o homem não reconhece o que o liga
necessariamente aos outros homens, como diz Holbach. Numa sociedade, cada indivíduo deve
reconhecer que o bem estar do outro – que é, assim como ele, copartícipe do todo natural –
está necessariamente ligado ao seu próprio bem estar. Poder-se-ia, todavia, objetar-se que a
felicidade do indivíduo nada tem a ver com a felicidade de toda a sociedade, pois é nítido que
há indivíduos felizes à custa do sofrimento alheio, ainda mais se pensarmos no nosso horizonte
político e econômico contemporâneo. Contra este argumento – muito antigo, por sinal –,
Holbach dirá que o homem nunca conheceu seus verdadeiros interesses. De todo modo, é o
desconhecimento da natureza que torna o homem cego para si mesmo. No fundo, quando
Holbach diz que o homem nunca conheceu seus verdadeiros interesses, ele quer dizer que o
homem vê a si mesmo cindido da natureza, isto é, vê a natureza como um “não-eu”
totalmente diverso dele – pois, se contemplasse a si mesmo como parte integrante da reunião
e combinação da matéria, que é a natureza, o homem não cairia em excessos e vícios,
tampouco usaria o outro como um meio para a sua felicidade.

Olhando para a natureza como um objeto, no sentido mais etimológico da palavra, isto
é, como aquilo que lhe é oposto, o homem cria fantasias, quimeras, como se a natureza lhe
fosse alheia. O problema que Holbach levanta é muito atual. Cuidar da natureza é cuidar de si;
cuidar do outro, como parte integrante da natureza, também é cuidar de si.

12
Holbach. Op. cit. p. 9
13
Holbach. Op. cit. p. 11
14
Holbach. Op. cit. p. 9
O sistema de Holbach é uma prova de que o homem não precisa buscar na
transcendência uma felicidade vindoura, mas que ele pode ser feliz aqui, na única existência
que lhe é possível. Para tal, o homem deve mergulhar no conhecimento da natureza, uma vez
que, adentrando as portas da natureza, o homem conhece também a si mesmo como parte
integrante da natureza. Homem e natureza estão de tal forma unidos que o conhecimento de
um deságua no conhecimento do outro.

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