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PROGRAMA:

Cap. I – A filosofia, o direito e a filosofia do direito.


Cap. II – Os clássicos da filosofia do direito.
Cap. III – A filosofia do direito no nosso tempo.
1º Exercício 19/03 – O caso dos exploradores de caverna e Antígona.
PROVA – 25/04

AULA 1 - 05/03

Protágoras (Platão) foi o primeiro a levantar uma discussão sobre o problema da racionalidade,
até que ponto os juristas pode ser convertido em uma linguagem nacional. Trata-se de uma
conversa que Sócrates acorda com alguém esmurrando a porta dele, acordando assustado ele
abre a porta e vê o Hipócrates (o pai da medicina). Ele foi pedir um conselho a Sócrates sobre
um curso de Protágoras. Sócrates o levou até Protágoras para perguntar “Você está aqui pra
poder ensinar os jovens atenienses a prática da justiça e da política. A justiça por acaso é
alguma coisa que a gente aprende ou será uma virtude?” Protágoras respondeu: é claro que a
justiça é uma coisa que a gente ensina e aprende. Sócrates então diz: se a gente fizer um
apanhado histórico, vai haver caso de pessoas habilidosa na vida pública que não deixaram
discípulos, como é o caso de Péricles. Todo mundo não sabe quem foi ele? Cadê os discípulos
dele? Será que ele não de propôs a ensinar aos seus filhos? Protágoras responde: quando Zeus
fez o mundo, ele fez tudo que há por aí, mas os seres que estão na terra não tinham essas
virtudes que ele possuía. Zeus pegou uma sacola com as virtudes e entregou a Prometeu para
que ele desse aos seres. Prometeu ao encontrar Epimeteu, seu irmão, deixou que ele o
distribuísse. Mas até que Epimeteu foi inteligente no começo, deu para a águia um bico bem
forte para ela pegar a presa; para o urso polar, ele deu bastante pelo para cobrir o corpo; para os
peixes, deu grandes habilidades. De modo que, cada um dos animais recebeu atributos, só que
já se aproximava o momento que Prometeu deveria fiscalizar o serviço. A sacola esvaziou e o
homem não tinha recebido absolutamente nada. Aí Prometeu ficou irritado e roubou o fogo dos
deuses e deu de presente para os humanos como uma forma de recompensar. Assim, o homem,
na posse do fogo, podia compensar todas as faltas que ele foi submetido. Com o conhecimento,
ele construiu casas, roupas, criou remédios e teve vários recursos para poder compensar o seu
prejuízo. Porém, apesar de tudo isso, o homem ainda estava numa desvantagem muito grande
em relação aos animais. Ele então começou a se reunir com os outros homens, para poder unir
as suas forças. Entretanto, eles brigavam e se feriam e com isso a raça humana estava se
exterminando da face da terra. Hermes então veio para ensinar como associar as forças,
trazendo a virtude da justiça e da política. Zeus diz para Hermes que ele deve distribuir
igualmente a justiça e a política para todos os humanos.

É por isso, Sócrates, que quando a gente está discutindo um determinado assunto, a gente não
pergunta para pessoas que não tenham conhecimento sobre o assunto. Nem todo mundo
desenvolve essas virtudes igualmente, cada um adquire características próprias, pelo fato de
Hermes ter distribuído igualmente essas virtudes.

No que diz respeito à vida pública, aquele que não desenvolver a sua virtude de pessoa pública
será expulsa da cidade.

No início do diálogo, Sócrates aparece totalmente cético e Protágoras acaba dizendo que a
justiça é mesmo uma ciência. E Sócrates termina acreditando que pela via do conhecimento,
todo mundo pode desempenhar uma atividade dentro da poli e que todo mundo pode
desempenhar uma atividade justa.

Há quem diga que o Protágoras é o primeiro livro da história do ocidente a levantar essa
discussão. Em que termos se pode dizer, que a sentença do juiz que condena um réu é
racional? Isso é científico? E o tribunal quando muda essa decisão, sua mudança é científica?
Que segurança o conhecimento dos juristas traz aos destinatários do direito?

Protágoras sonha com essa possibilidade da racionalidade na vida comum. Existindo de fato
uma ciência de cálculo sobre a coisa pública.

CAP. I

Philia = amizade / Sophia = sabedoria

A filosofia na história do ocidente, segundo Platão, nasceu do espanto. Houve um tempo na


história do ocidente em que havia explicação para tudo através dos mitos. Em um determinado
momento, alguém percebeu que aquilo estava pouco explicado e que havia uma incoerência.
Assim, tudo aquilo que parecia muito explicado, passou agora digno de ser problematizado. Por
isso que Platão diz que a filosofia nasceu do espanto do homem perante a natureza e o mundo
(o que é tudo isso que nos envolve?) – primeiros filósofos da natureza ou da physis.

Os filósofos jônios viviam se perguntando: qual a origem da vida? Quem somos nós? Para onde
vamos?

Ao longo da história do ocidente, é a partir desse momento que o homem passa a realizar a
primeira grande descoberta. É por isso que Sócrates se fazia de ignorante, porque a ignorância
era uma estratégia. A filosofia, na sua origem, é o reconhecimento das nossas limitações.

Na filosofia se tem essa busca incessante pelo saber, isso tem no direito os seus reflexos. Não
existe um conceito único de filosofia do direito. Existem tantos quantos forem a busca por novos
autores.

Existem muitas formas de encarar a filosofia que aparecem nos conceitos dos autores. Miguel
Reale vai dizer que: “a filosofia do direito é a indagação sobre o valor e a função das normas,
que governam a vida social no sentido do justo”. Em um outro momento ele vai afirmar que: “a
filosofia do direito é o estudo dos pressupostos ou condições da experiência jurídica”.

A filosofia do direito pode ser tomada pelo menos em duas direções: para uns, ela é um ramo da
filosofia que reflete alguma coisa sobre o direito. Os filósofos pensam sobre muitas coisas, como
a arte por exemplo, tal como a filosofia do direito (como sendo uma das dimensões da filosofia.
Da experiência normativa de um determinado homem). Há quem diga que a filosofia do direito
não é uma especialidade da filosofia, mas sim do direito. Para refletir como uma forma sobre os
problemas vivenciados pelos juristas.

A verdade é que a filosofia do direito se ocupa de estudar várias questões, com vários campos
temáticos. Os principais temas são: a própria história da filosofia do direito (existem filósofos do
direito especializados neste campo); gnosiologia ou epistemologia jurídica (dedicado ao estudo
da dimensão científica do direito); ontologia jurídica (parte da filosofia que estuda o ser das
coisas: o que é uma coisa? porque o ser e não o nada?); axiologia jurídica (é o problema dos
valores jurídicos: quais são os valores pelos quais os juristas se debatem?); lógica jurídica.

AULA 2 – 07/03

I – EPISTEMOLOGIA JURÍDICA

Essa parte da epistemologia é muito importante para os juristas, mas que nem sempre é levado
em conta por eles. Ela surge na filosofia do direito de nos colocar a seguinte questão: é possível
colocar de modo científico os problemas jurídicos? Os problemas que são levados ao
conhecimento do juiz e a solução que ele dá é uma solução reconhecidamente, qualificadamente,
legitimamente passível de ser considerada científica?
Antes da explicação cientifica das coisas, existiram os mitos que representam na história do
ocidente, o primeiro esforço da humanidade para compreender racionalmente as coisas.
Inventaram os mitos em um determinado momento para colocar uma certa ordem nas coisas.
Supõe-se que antes da organização das idéias, tenha existido o caos. Em determinada época
surgem os poetas que trazem determinado conforto. Platão era contra os poetas.

Para compreender a razão pela qual se deu a origem do amor, surgiu o mito. Para tudo que
existia, havia uma explicação mítica.

Ésquilo diz o seguinte: no dia que os gregos iam partir para Troia pra vingar o crime cometido
contra a corte de Minelau, os barcos estavam presos porque não tinha vento. Foi revelado que a
deus Artêmes exigiu um sacrifício para liberar o vento que era a morte de Efigência (a filha de
Agameno) que o fez. Agameno chefiou os exércitos gregos e foi coroado como rei. No momento
em que ele vai se banhar, a esposa dele o mata. Atraindo para ela as iras das deusas da vingança
(as Erínias que perseguem os criminosos). Orestes era o filho do casal que voltou para casa para
vingar a morte do pai matando a mãe. Perseguido pelas Erínias, Orestes pede socorro a Atena
(deusa da sabedoria). Nesse momento, Atena se compadeceu com a história e cria a justiça. Ela
cria um tribunal para ouvir o caso de Orestes e as razões das Erínias. A justiça é aplicada por
alguém desinteressado, ele não está movido por uma paixão. O seu único desejo é fazer justiça.
Assim, nenhum crime fica sem punição. Logo, isso é uma narrativa mítica sobre a criação da
justiça, pois até então não havia a ciência.

Nasceu a explicação científica, mas afinal de contas o que é o conhecimento científico do direito?
Nós podemos ter, pelo menos, três tipos de conhecimento (graus do conhecimento):

- Conhecimento vulgar = É o tipo de conhecimento que a pessoa tem, orienta sua vida, encontra o
sentido, porém ele não consegue convencer ninguém sobre a veracidade do mesmo. O sujeito
não tem provas do que diz. Cabral de Moncada diz que o direito também esse tipo de
conhecimento vulgar. Ele diz que o conhecimento vulgar do direito é um conhecimento simbólico,
quando a pessoa associa determinados símbolos ao direito (ex: o texto legal). O direito não é a
própria lei, a lei é apenas um instrumento utilizado pelo direito para se manifestar perante o
cidadão. E conhecer a lei não é garantia de conhecer o direito. Quem simplesmente só conhece a
lei, tem um conhecimento vulgar do direito.

- Conhecimento científico = É o conhecimento que a gente tem juntamente com sua prova, ainda
que seja limitada. Tem-se como comprovar a veracidade da afirmação.

- Conhecimento filosófico = O conhecimento do direito deve almejar também uma compreensão


filosófica. Esse conhecimento cumpre um grande papel em todo tipo de conhecimento, que é o de
provocar o cientista a buscar a excelência do seu conhecimento, a ser mais rigoroso nas coisas
que diz ou repensar os critérios por ele escolhidos para chegar às conclusões que ele chama de
científicas.

É preciso ter apenas uma base científica, pois é com base da comprovação que se tem a
confiança da sociedade.

O conhecimento filosófico do direito é aquele que quer alguma coisa a mais do que ler códigos e
aplicar leis. É a filosofia do direito é aquela que nos provoca para avançar além daquele papel que
desempenhamos. A dogmática deve ter respostas, o juiz deve saber o que responder. Mas a
filosofia está aí para desafiar o juiz para observar coisas novas

AULA 3 – 12/03

I – Possibilidade do conhecimento
É possível conhecer o direito? O direito é algo que se conhece e que se ensina? Essa posição
dividiu a escola da filosofia em dois grupos: uma chama de ceticista e outra chamada de
dogmatista. O ceticismo é uma corrente da filosofia que diz que não é possível afirmar com
certeza o conhecimento de algo. Pode-se até dizer que conhece as coisas, mas com um grande
risco de estar enganado. O ceticismo defende a idéia de que o conhecimento científico é
impossível.

O dogmatismo diz exatamente o oposto. Diz que nós podemos conhecer as coisas pelo seu grau
de cientificidade.

Essa discussão ao logo dos séculos foi falada por filósofos, até que Kant no século XVIII
(criticismo) vai afirmar que a discussão entre dogmatistas e ceticistas era uma discussão
maniqueísta e sem possibilidade de aderir a um ou a outro. Ambos tinham razão em alguma coisa
e estavam enganados em outras. Ele escreve uma obra chamada de Crítica da Razão Pura, onde
ele se dedica à possibilidade do conhecimento. A conclusão que ele chega é que é possível
conhecer, mas não apenas conhecer a coisa em sim, mas sim conhecer um fenômeno. Conhece-
se aquilo que os fenômenos permitem que o ser humano capte com os sentidos. Eis aí a
possibilidade do conhecimento, por isso fica afastado todo e qualquer radicalismo do ceticismo.

Miguel Reale vai dizer que nós temos umas correntes ceticistas que negam toda e qualquer
possibilidade do conhecimento, o que é por si mesmo uma contradição. Então, o ceticismo total é
uma contradição em si mesma. Afirmar que eu não conheço é no mínimo ter certeza de que não
conheço, logo, já é um conhecimento.

A idéia mesmo do ceticismo é dizer que toda e qualquer tentativa de conhecer as coisas é uma
tentativa enganosa. Os sofistas são sempre tendentes a afirmar que o conhecimento absoluto das
coisas é sempre enganoso.

Esse problema do ceticismo e do dogmatismo também está presente no Direito. Existem


determinados autores que tendem a tratar o conhecimento jurídico como uma espécie de uma
farsa, o discurso dos juízes como uma coisa enganosa. O autor que é mais citado dentre os
outros a propósito dessa impossibilidade do conhecimento jurídico é um alemão do século XIX,
chamado “Kirchman”. A ideia dele é que falar de uma ciência do direito é impossível anti a
mutabilidade do direito decorrente de uma simples vontade do legislador. Contudo, ele está
partindo de um pressuposto equivocado que é a ideia de que o legislador é o senhor do direito,
que o direito se resume na palavra do legislador.

A existência de escolas céticas acerca do direito não anula a existência de uma corrente
dogmatista, que inclusive é a mais predominante. O dogmatismo é uma condição si ne qua non
para a existência do direito. Falar de dogmatismo é falar da crença de que existe a possibilidade
de conhecer o direito. O conhecimento no racionalismo é a priori.

II – A origem do conhecimento

O conhecimento nasce com o sujeito como dizem os racionalistas? O conhecimento está na


mente? Ou o conhecimento vem depois como dizem os empiristas? O racionalismo e o empirismo
são as duas grandes escolas que se revelaram na filosofia. O racionalismo diz que o
conhecimento é o atributo da razão, portanto, o conhecimento tem na razão intelectual a sua fonte
geradora. Sócrates defende essa ideia do racionalismo. Já o empirismo duvida que o
conhecimento na mente seja possível. Aristóteles vai dizer que não tem nada na nossa mente,
que não tenha passado pelos nossos sentidos. Tudo que há na nossa mente decorre do que os
nossos olhos ou ouvidos, por exemplo, tenham sentido. O empirismo diz que o conhecimento é a
posteriori. Dizem os empiristas decorrem necessariamente de uma experiência que o sujeito
realiza, é uma condição si ne qua non que a experiência tenha ocorrido.
Assim como Kant discutiu o problema do conhecimento, ele também afirmou que os empiristas e
os dogmatistas não estão totalmente certos, nem totalmente enganados. Ele afirma que não há
conhecimento que não tenha decorrido de uma experiência praticada pelo sujeito, mas ele vai
dizer que uma coisa nata no sujeito é que todo humano nasce em condições de conhecer alguma
coisa. Assim, ele nasce com a condição de conhecer, mas não com o conhecimento. O ser
humano tem a condição de transcender a experiência, adquirindo assim o conhecimento. O
criticismo kantiano diz que o sujeito nasce com a condição de conhecimento, fazendo dele um
sujeito privilegiado na criação do conhecimento.

Os jusnaturalistas são, via de regra, racionalistas. Enquanto que os juspositivistas são empiristas.
O justanuralismo é partidário de uma ideia de que o direito é posto anteriormente ao sujeito,
independe de uma experiência humana. Segundo Heráclito, a ordem existente na natureza ou na
physis projeta sobre o sujeito. A visão jusnaturalista é uma visão que se adéqua ao racionalismo,
porque o processo de conhecimento do direito é um processo de adequação da razão a um direito
colocado exteriormente ao sujeito.

O sujeito conhece o verdadeiro direito estudando, Platão diz que nós podemos pensar no mundo
do conhecimento como vários prisioneiros que estão presos numa caverna e que só olham para
um determinado lugar. Se você quiser conhecer o verdadeiro direito e contemplar o sol, só há
uma saída que é estudar. Sem educação não há justiça. Platão diz que um homem bem educado
é o melhor de todos os seres vivos, agora um homem mal educado é o pior de todos os animais.
Só depois de estudar todos os ramos é que a pessoa tem condição de descobrir a verdade sobre
as coisas, chegando enfim ao mundo das idéias e das formas. Então, o conhecimento jurídico em
Platão é intelectivo, decorre da sua capacidade intelectual.

Os positivistas partem do pressuposto de que o conhecimento do direito decorre de uma


experiência que realizamos. Então, se eu quero conhecer um direito, devo comparar um direito
com o outro. O conhecimento do direito na visão empirista decorre da capacidade do direito de
testar. Então, o profissional do direito tem o conhecimento almejado pelo conhecimento.

III – Ciência do Direito

Que ciência? Se a leitura do caso dos exploradores de caverna nos deixa em um pessimismo em
relação ao conhecimento, por causa dos juízes que vão com opiniões opostas. Aristóteles terá
sido um dos primeiros a discutir esse problema das ciências e de sua classificação de modo
sistemático. Na metafísica ele diz que as ciências podem ser classificadas em: ciências teoréticas
(teos = deus, divindade, astro. A finalidade de conhecer é o próprio conhecimento); ciências
poiéticas (vem de poiesis = fazer, construir, produzir. O sujeito visa conhecer para construir
alguma coisa); ciências práticas (práxis = vem de ação, atuar. São ciências em que o sujeito
busca o conhecimento em vista de uma ação, porque ele quer aprender a agir). O direito, na visão
de Aristóteles, não existe ainda. A temática da justiça na visão aristotélica se enquadra nessa
classificação. Por isso a ciência que o profissional do direito estuda é uma ciência prática, que se
dirige a conhecer uma ação.

AULA 4 – 14/03

– Ontologia jurídica

O problema ontológico do direito é um dos problemas mais antigos, a ponto de alguns autores da
contemporaneidade se aborrecerem com isso e proporem uma espécie desontologização do
direito, pelo fato de não se chegar a uma definição. O que se propõe é um abandono da
discussão sobre o que é o direito, já que até hoje os filósofos não conseguiram ter nenhuma
definição própria. Luman, embora não possa ser considerado propriamente um desontolizador, diz
que a filosofia do direito às vezes ocupa nossa vida com perguntas inúteis.
Em nome de uma desontologização do direito propõe-se uma funcionalização. Ao invés de uma
discussão ontológica, seria muito mais proveitoso ter uma discussão funcional. Perguntando, por
exemplo, para que serve o direito? Alguns autores vão dizer que toda definição do direito é um
mito.

Dworkin diz que na verdade eles querem é ignorar o sentido de direito e tomar outro, tomando um
qualquer conceito de direito como se fosse evidente por si mesmo. Ele propõe uma retomada
dessa discussão porque isso é de fato importante para que as nossas investigações a propósito
do direito façam algum sentido.

Hart trata da discussão sobre o conceito de direito. Ele diz que não existe um conceito universal
de direito, não existe um conceito de direito que possa ser aceito por todas as pessoas. Aliás,
existem muito conceitos de direitos, que são até contraditórios. Não obstante essa pluralidade de
conceitos há uma noção e um ponto de partida que é comum a todos os conceitos. Isto é, a noção
de que o direito tem a ver com regras. Existem aqueles que entendem que a regra jurídica é
aquilo que obriga e existem aqueles que concebem as regras jurídicas como alguma coisa que
leva ao bem e a justiça. A nota característica do direito é aquela capacidade de constranger o
cidadão a fazer o que deve ser feito. Hart diz que seja numa concepção de regra que é algo que
constrange e que castiga ou, seja na concepção que orienta, cada um deles tem esse ponto em
comum de que o direito tem regras.

O autor MacIntyre vai falar que não existe mesmo um conceito universal de direito. Os conceitos
de direito são, segundo ele, podem até serem rivais uns dos outros. O seu ponto de partida é que
os conceitos de direito são formados a partir de certa tradição, em que o seu autor está filiado.
Pensar no conceito de direito de um autor é necessariamente conhecer a cultura ou a tradição
que este autor está inscrito. Não há como pensar em um conceito de direito que se sobreponha a
todas às tradições e culturas. Um tradição é uma manifestação de uma certa concepção do
mundo. O conceito de direito de São Tomás de Aquino não se aplica de forma nenhuma ao
conceito de direito de Platão. Conhece-se uma tradição a partir dos narradores. Portanto, para
conhecer o direito é preciso conhecer os poetas. Pesquisar sobre o direito é fazer uso da
linguagem dos poetas, porque os narradores tentam sempre superar a narrativa anterior. No lugar
das narrativas podemos encontrar o conceito de direito. O conceito de direito tem a ver com o que
uma certa tradição diz a determinado povo. Nessas teorias narrativas do direito, o conceito de
direito tem a ver com a concepção de felicidade do autor. Portanto, ele vai se debater exatamente
com esse problema: quando ele diz que o direito tem a ver com a tradição, aí ele se pergunta
“quer dizer então que o direito está condenado ao nacionalismo e ao relativismo? Sendo assim o
Ocidente não pode dialogar com o Oriente”. Afinal de contas, há uma possibilidade de
universalização? Não é possível, mas o direito não precisa ser necessariamente fragmentado.
Tradição e tradução pra ele são duas concepções do direito. É possível sim o Oriente dialogar
com o Ocidente através da tradução. A tradução é o trabalho que uma pessoa tem de inverter
para sua língua alguma coisa que está escrito na língua do outro. É possível trazer para o meu
mundo uma coisa que pertence a outro mundo. Mas para realizar a experiência da tradução são
necessárias duas virtudes básicas: a humildade cultural e intelectual para reconhecer que o
mundo não encerra no seu mundo, que existem outras pessoas que falam outras linguagens
igualmente racionais. Então, admite-se que é possível encontrar a resposta do meu problema em
outras línguas; e a disposição para aprender com o outro, de entrar no mundo do outro. Segundo
ele, tudo isso não é feito com a renúncia das minhas experiências e concepções do bem, mas
também não se assimila completamente o que vem do outro. O ponto de partida é sempre o meu,
eu leio o outro a partir do que eu sou. Ele aposta que a modernidade se equivocou
completamente ao renegar a tradição, construindo uma nova tradição. Para ele, se deve retomar
a São Tomás de Aquino. A experiência universal pode ser tornar possível dentro de um limite,
mas um diálogo entre os outros é possível.
AULA 5 – 19/03

Continuação: Ontologia jurídica

Reale vai dizer que podemos dizer algo sobre o ser do direito se reformularmos a teoria do
objeto – que é uma matéria da filosofia que se propõe a investigar os objetos que temos em
mente e como eles se põem para nós. Segundo ele, podemos dividir objetos em:

1) Objetos naturais – são aqueles que nós podemos conhecer, contactar, mas não
podemos instituir. São todos aqueles objetos que se põem para nos como necessários. Duas
subclassificações são os naturais físicos e os naturais psíquicos. São físicos aqueles objetos
que a natureza nos dá e que não podem ser conhecidos, prescindindo de espacialidade – que
de um modo ou de outro tem que passar pela dimensão de espaço que ocupam. Os naturais
psíquicos ou espirituais são também naturais no sentido de dizer que “uma pessoa está alegre”,
mas não tem uma espacialidade, mas sim uma temporalidade. Não se pode falar da alegria
pensando na espacialidade.

Reale vai dizer depois que o direito não é um objeto natural pelo fato dele não ser estudado a
partir de um processo de causalidade. O direito não é um dado natural, que nós não alteramos.
O positivismo sociológico quis explicar o direito em uma relação de causa e efeito, entretanto,
Reale diz que isso é impossível para o universo do direito. Muito embora o direito tenha uma
dimensão social, ele não pertence ao mundo do ser (das coisas naturais), mas sim do dever-ser.

2) Objetos ideais – são todos aqueles que são enquanto pensados. Não que eles não
possam se projetar fisicamente, mas eles não devem ser projetados necessariamente. Para
saber um triângulo, por exemplo, não é necessária a sua materialização, apenas mentalmente já
se tem a noção da sua forma. Entretanto, Reale vai dizer que o direito não é um objeto ideal pelo
fato desse objeto não precisar de uma realização empírica. Os objetos ideais não precisam ser
projetados no espaço e são atemporais.

3) Objetos culturais - são aqueles onde nós temos uma integração entre o ser e o dever-
ser. Os valores, por exemplo, não são do mundo que são, mas sim do mundo que deve ser.
Então, ele somente se constitui quando há uma correlação entre o mundo do dever-ser (daquele
querer) com o mundo do ser. Logo, o direito também diz respeito àquilo que o cidadão ou o
legislador projeta sobre o mundo natural. Há um dever-ser na norma jurídica. É a teoria
tridimensional do direito de Reale. Ao longo da história, os teóricos do direito se equivocaram ao
pensar no direito. Ele diz que os jusnaturalistas pensavam o direito como um simples valor,
bastando o fato de ter existido uma lei – com uma dimensão axiológica. Já o positivismo
sociológico desvestiu o direito da sua dimensão axiológica e enalteceu a dimensão factual do
direito. O direito para eles é um encadeamento lógico, como fato. O normativismo, por sua vez,
vê o direito como norma. Reale diz que essas foram explicações reducionistas do direito,
nenhuma delas podem isoladamente explicar o direito. Para ele, o direito para ser explicado
deve ser: fato (ser), valor (dever-ser) e norma (integração do ser com o dever-ser). Essa relação
é dinâmica. Então, o direito só pode ser entendido com essa correlação desses três elementos.
Ele é um objeto cultural referido a valores porque é uma construção humana. Se nós retirarmos
a normatividade do mundo, ele será um mundo natural. Logo, quando se pensa no direito ele
acaba por ser uma projeção do ser no dever-ser.

- Axiologia jurídica

É um tema da filosofia dedicado ao estudo dos valores, além de ser um capítulo da filosofia do
direito dedicado aos valores do direito. Reale criou quatro teorias para falar dos valores:
1) Teoria Subjetivista – diz que os valores são aquilo que o sujeito internamente decide
ser. Então, os valores são construídos internamente pelo sujeito na busca do prazer ou na pura
realização de uma vontade. Uma vertente diz que valioso é aquilo que traz prazer. Outra
vertente diz que valioso é aquilo que o sujeito tem vontade de ser. Reale vai dizer que nós não
podemos dizer que os valores são uma simples e arbitrária decisão do sujeito por vários
motivos: pelo indeterminismo, pois nunca chegaríamos a uma compreensão do que é um valor;
determinados valores existem para nós ainda que realizados, então, se valioso pra mim é aquilo
que eu desejo, eu poderia pensar que quando realizo um desejo ele deixaria de ser valioso;
pensar o valor é estar além das escolhas das pessoas. Com base nisso, Reale negará o
conceito de valor a partir dessa concepção subjetiva ou arbitrária da concepção do valor.

2) Teoria Objetivista – o valor é construído externamente e assimilado pelo sujeito. Ou


seja, a sociedade é a projeção dos valores dos cidadãos ou então é como se a sociedade
tivesse um valor, do qual nós não conseguimos apartar. Reale vai dizer que não se pode dizer
que o valor é determinado pura e simplesmente pela sociedade, pelo fato de que aquilo que é
não pode ser determinado como aquilo que deve ser. Não é o determinismo social que vai ser o
valor. Nenhum grupo de pessoas que se reúne para praticar determinados anti-valores ou
determinadas práticas que eles consideram como sendo interessantes, como matar moradores
de rua, não nos autoriza a aceitar isso como sendo valioso e valoroso. Para Reale, do ser não
se passa necessariamente para o dever-ser.

3) Teoria Ontológica – essa teoria quer explicar o valor de um modo diferente das duas
anteriores. Reale assume delas o pressuposto de que o valor está no mundo, embora as negue.
Contudo, para a teoria ontológica os valores têm uma constituição em si. Eles são algo posto.
Na visão ontológica a história não constitui os valores, ela apenas os descobre. A vida humana
não tem um papel constitutivo, mas apenas um papel de desvelamento (ex: a existência prévia
da beleza é que permite alguém ser belo). Reale rejeita essas três teorias, mas reconhece que
as teorias subjetiva e objetiva ao afirmar que os valores têm uma constituição empírica.

4) Teoria Histórico-cultural – os valores são, antes de tudo, algo humano. Algo instituído
pelo humano, mas não é algo arbitrariamente posto por um sujeito. O valor é algo que
transcende a subjetividade humana. O valor é necessariamente alguma coisa que eu devo tomar
como sendo algo diferentemente daquilo que se encontra na natureza. O mundo da natureza é
das coisas que são e o mundo da cultura é das coisas que devem ser (tem uma dimensão
própria quando confrontado com o mundo da natureza). Se o mundo da natureza é, o mundo da
cultura é na medida em que deve ser. A realidade cultural é a realidade do que está por ser, do
por vir - não é apenas daquilo que pode acontecer, mas também do que pode acontecer, porque
o que já aconteceu pode acontecer de novo. Logo, uma coisa é valiosa na medida em que ela
abre um mundo de possibilidades.

AULA 6 – 28/03

O mundo dos valores só é na medida em que deve ser. O valor vai sendo, ele representa uma
intervenção do espírito na natureza. A natureza é a natureza. A cultura é a participação do
espírito (no sentido da inteligência, da alma, da memória) nessa natureza.

O direito não é somente um valor, mas é também um valor por ser um objeto cultural. O
legislador, ao criar uma norma, ele projetou uma ideia do direito sobre a natureza. O legislador
olha para o mundo (a natureza) e projeta uma determinada lei baseada nos valores da
sociedade. Por isso que a norma jurídica é a existência de uma determinada participação do
espírito da natureza.

A concepção de valor vai partir da integração do ser e do dever-ser. Logo, o direito não é só um
valor e nem é só uma norma. O direito é essa conjugação entre o fato, o valor e a norma – teoria
tridimensional do direito. A norma é gerada a partir de uma base do mundo e cristaliza
determinados valores que existem na sociedade.

- Características dos valores

1) Bipolaridade – uma ideia de valor pressupõe sempre um contra-valor ou desvalor. Só é


possível compreender o valor da liberdade, na medida em que se pensa o valor da prisão.
Então, todo valor convive com a existência do seu contrário.

2) Implicação – os valores se implicam mutuamente. O valor dá sempre causa para a existência


de outro valor. Como, por exemplo, a existência da justiça implica a existência da equidade.

3) Referibilidade – o valor existe sempre em referência a alguém ou a algo. Algo é valioso


sempre de forma vetorizada. O sagrado é valioso para o santo; a justiça é valiosa para o justo.
Um valor só tem sentido de ser na medida em que ele está projetado em algum acontecimento.

4) Preferibilidade – todo valor já tem si alguma coisa que faz dele atrativo. Na sua própria
constituição há alguma coisa que possibilita o valor ser escolhido.

5) Objetividade – o valor não é aquilo que nós achamos que é. O valor tem uma dimensão
objetiva. Ele transcende a objetividade humana. A existência do mundo dos valores pressupõe
uma existência comunitária, compartida.

6) Historicidade – os valores não têm uma existência em si, no sentido de dizer que eles sempre
são a mesma coisa. OS valores são aquilo que a própria existência humana possibilita. A
existência humana transforma os valores e traz inovações.

7) Inexaubilidade – os valores nunca se completam. Os valores estão sempre em formação, eles


não se esgotam. Não sendo passíveis de serem consumidos ou exauridos. A existência do valor
está no reino da possibilidade e não no reino da necessidade. É próprio do valor não se dar
inteiramente.

8) Hierarquia – É da própria natureza dos valores serem hierarquizados. Todo valor é passível
de uma certa hierarquização, os valores existem neste mundo sobre uma disputa hierárquica, no
qual cada valor será mais importante para uma pessoa do que para outra.

É da característica do valor hierarquizar. Mas essa hierarquia não é absoluta, mas sim histórica
e vai mudando com o passar do tempo.

9) Os valores, de acordo com Reale, existem correlativamente. De forma ordenativa,


complementarmente e é a própria historia que nos revela que os valores podem ser
hierarquizados. De modo que em determinada época se prefere determinado valor e
posteriormente, se prefere outro valor.

AULA 7 – 02/04

Se há uma possibilidade de hierarquização dos valores, como realizar uma teoria sobre as
preferências axiológicas?

Os valores e os valores jurídicos podem ser classificados de diferentes modos, inclusive para
resolver seus conflitos internos. Esse esforço de classificação decorre de um pressuposto de
que não há um valor universal. Desde o início da filosofia de discute a supremacia de um bem
ou um valor supremo. Hoje mais do que nunca se discute isso. Aristóteles vai dizer que se há um
supremo bem, este vai ser a felicidade.

1) Classificação I (Nader) – Diz que os valores podem ser classificados em dois grupos:
- Classificação formal: os valores são subordinantes – valores em si porque são autônomos.
São valores “fins”. Eles se autojustificam. Eles têm uma existência que lhe é própria.

Ou subordinados – aqueles valores “meios”. Eles só têm uma razão de ser porque eles lhes
possibilitariam chegar a um fim.

- Classificação material: os valores são sensoriais – são todos aqueles que estão ligados ao
prazer, a vida, a utilidade. São valiosas porque despertam esse sentimento de utilidade e de
melhoria da vida.

Ou espirituais – são dignos de serem buscados em razão de uma certa idealidade.

2) Classificação II (Máynez) – Os valores podem ser:

- Fundamentais – a justiça, a segurança jurídica e o bem comum. É em nome desses três


valores que todo o sistema jurídico é formado. Então, seriam aqueles valores considerados a
razão do início e para o qual todos os valores caminham.

- Consecutivos – a liberdade, a igualdade e a paz social.

- Instrumentais – os demais valores que não foram elencados anteriormente.

Será que os valores realmente são indispensáveis na construção de uma teoria sobre o direito?

O Formalismo e o Positivismo tentaram uma abordagem a-valorativa do direito. Isso em Kant e


nos neokantianos procurando o máximo possível de universalidade. E nos positivistas, inclusive
para declarar a dispensabilidade da justiça. A grande preocupação de Kant (formalismo) é
construir a abordagem mais abrangente possível. Pensar no direito renunciado a concepção
axiológica, pois os valores são reféns do subjetivismo. Todo o projeto jurídico kantiano está
sustentado na possibilidade de um mundo jurídico racional. Kant vai acreditar na criação de um
direito internacional. O formalismo jurídico como um todo é assentado nesta preocupação.

Del Vecchio e Stammler tentaram recuperar essa dimensão formal do direito para poder fazer
frente aos equívocos do positivismo sociológico. Contudo, Reale vai dizer que eles são
contraditórios pelo fato de que ambos tinham a justiça como o fundamento de todo o
ordenamento jurídico. Reale, diz que como é possível pensar em um ordenamento jurídico
formal tendo a justiça como fundamento desse ordenamento?

Hans Kelsen vai dizer que a sua teoria sobre o direito pode ser aplicada em qualquer sociedade.
O seu grande argumento é que não há nenhuma firmeza nos autores toda vez que eles falam de
justiça. Não se consegue extrair nada de objetivo do que se diz sobre o justo e o injusto. Então,
há uma tentativa de compreender o direito renunciando expressamente os valores.

No positivismo encontra-se a ideia de que é preciso criar uma concepção do direito que seja
objetiva, que seja precisa. O positivismo, segundo Norberto Bobbio, vai realizar o grande sonho
da “purificação do direito”, fazendo uma distinção entre juízo de valor e juízo de realidade.
Afirmando que o direito deve se preocupar apenas com o juízo da realidade, que é o juízo
explicativo das coisas. No juízo de realidade é possível entrar em consenso com as pessoas,
mas no juízo de valor entra-se em conflito. Então, para o positivismo jurídico era preciso fazer
essa distinção para que o direito tivesse a pretensão para realizar apenas o juízo de realidade.

Apesar dessa tentativa de compreender o direito renunciado a ideia da justiça, essa procura pela
justiça continua viva até hoje. Reale vai dizer que existem pelo menos dois sentidos distintos
sobre a justiça:
- Justiça em sentido subjetivo: Ele diz que existem autores que ao falarem da justiça, falam a
partir de uma dimensão que está no próprio sujeito. É a justiça como uma virtude. Por isso que
Aristóteles vai dizer que não se pode chamar de justa uma ação de alguém que não foi praticada
por um querer.

- Justiça em sentido objetivo: é o que a sociedade se espelha como justo.

Reale vai dizer que existem três teorias básicas sobre a justiça: 1) Individualista – é aquela que
afirma que o justo é a realização do bem individual. A sociedade funciona muito bem quando
cada um cuida de si mesmo. Consequentemente, o Estado de Direito só tem a função de tutelar
os direitos individuais. Essa é uma concepção liberal; 2) Transpersonalista - ela parte do
pressuposto de que o bem social é indispensável para a realização do bem individual; 3)
Personalista (Reale se filia a esta) – vai refutar as duas teorias anteriores. A teoria individualista
está equivocada porque não é possível cair nessa ilusão de que há a possibilidade de uma
harmonia espontânea da sociedade. Mas também a teoria transpersonalista está equivocada a
querer reduzir o indivíduo ao coletivo. Reale diz que é necessário superar essa tensão entre o
coletivo e o individual, pensando o bem comum nos limites do bem individual. Para ele a única
forma da gente sair dessa situação de extremismo, é admitindo que o bem comum é relevante,
mas a gente deve pensar o bem comum no limite do bem individual. Quer dizer que se
reconhece a importância do bem comum, mas é o bem comum que permite a realização do bem
individual. Para ele, a pessoa está no centro da justiça. Isso vai admitir a possibilidade extrema
de sacrificar o bem comum pelo bem individual.

AULA 8 – 04/04

- Continuação aula anterior

Existe um conflito entre pessoa e comunidade, tendo em vista o histórico de teorias acerca
destes elementos. A quem devemos justiça, ao individuo ou a comunidade que a contem? Foi
comum no pensamento antigo, a preferência da comunidade sobre o individuo. Já a
modernidade, colocou o individuo no centro do universo, deixando a comunidade em segundo
plano. Aristóteles, por diversas vezes nas suas obras, dirá uma coisa que é muito comum entre
os autores gregos: o homem é um animal político. Ou seja, o homem não é nada fora da polis ou
da comunidade. Ele dirá que ninguém em sã consciência iria aceitar o mundo só para si, para
viver sozinho, pois o homem precisa da presença de outras pessoas para viver. A comunidade
como centro se manteve até a morte de São Tomás de Aquino.

O centro da discussão passa a ser o indivíduo. Para Hobbes, o Estado existe em função do
indivíduo. Para Locke não é diferente.

É com Kant que se vai celebrar, petrificar o indivíduo, ainda que contrariamente ao Estado. Uma
frase dele: o homem é um fim em si mesmo. Essa frase traduz muito bem isso. É o Estado que é
o instrumento de realização, pois o homem não é meio para nada. O constitucionalismo
moderno depois de Kant jamais será o mesmo.

Na contemporaneidade há uma crise visível desse viés individualista. Não se fala mais do
individualismo no sentido moderno, em que os direitos do indivíduo estavam acima de qualquer
coisa. Isso porque o individualismo desmedido levou a uma série de prejuízos. Depois da
segunda guerra mundial, com a crise ambiental, esse paradigma ficou mais fragilizado, quando a
sociedade se dá conta de que o consumo desfreado tem colocado em risco a própria
sobrevivência humana, Na crise ambiental não há lugar para ninguém se proteger de nada e
isso é um sinal da crise do individualismo. A intensificação da corrupção ou a descoberta dos
abusos cometidos pelos administradores públicos, comparada com a indiferença do cidadão
com a coisa publica é um atestado dessa crise do individualismo.
Hoje com a crise econômica da Europa, demonstra que os discursos extremistas de outrora
sobre o capitalismo e consumismo estão esgotados, após copiar o consumismo americano. O
individualismo tem mostrado sinais de cansaço. Com isso, já se assiste na filosofia atual um
retorno à dimensão comunitária.

A Constituição de 1988 é fortemente marcada pelo individualismo. Seu arcabouço é moderno


individualista, com uma certa vocação para a função social, mas principalmente individualista.

Para Reale a pessoa humana está no centro da justiça, a pessoa humana é o bem jurídico
fundamental. Então, de onde vem essa dignidade da pessoa humana? Ele diz que a pessoa
humana é portadora de uma dignidade inviolável. Mas de onde vem essa dignidade? Ele dirá
que ela vem do fato de que em relação a todos os seres existentes, o homem é o único ser
capaz de valorar. É porque os humanos têm consciência de estar no mundo, e essa consciência
significa a capacidade do homem de tomar posição diante do mundo. Isto é, fazer escolhas. É
um racionalismo diferente, porque a linha de Reale é culturalista.

AULA 9 – 09/04

- Lógica Jurídica

Dizem os filósofos que pensamos logicamente quando escolhemos ou quando temos condição
de escolher razoavelmente. Logo, pensar logicamente significa escolher algo de modo razoável.
Ou seja, algo que não é arbitrário. Então, por meio de um verbo copulativo atribuímos
qualidades a determinados sujeitos. Costuma-se dizer que a lógica é uma prerrogativa dos
humanos. Tem-se que a lógica é uma propriedade exclusiva dos humanos.

A lógica é indispensável nas nossas vidas, quer a gente queira ou recuse viver sob o comando
dos argumentos lógicos, parece ser uma necessidade humana. Embora, muitas vezes nós
andamos à caça de resultados que não se sustentam no ponto de vista lógico. Até os loucos, de
certo modo, buscam uma certa organização na sua vida.

Se a lógica é indispensável, no sentido de ciência a lógica é uma espécie de teoria da prova. Por
meio da lógica ou por meio do raciocínio lógico, nós buscamos organizar nossos pensamentos
no sentido de orientar nossas ideias. Quando nós queremos provar alguma coisa para alguém
ou para nós mesmos, fazemos um esforço muito grande para organizar as ideias para tomar
uma decisão acertada. Platão, Aristóteles foram filósofos que desde a Antiguidade discutiam
sobre como deve organizar o seu pensamento para tomar decisões acertadas. Se a lógica em
geral é isso, o que seria então a lógica jurídica? Kalinowski diz que não existe lógica jurídica,
assim como não existe lógica matemática. Para ele, existe uma única lógica que estrutura o
pensamento do ser humano. Mas não obstante essa objeção do autor, a lógica jurídica já foi
pensada, de um certo modo, desde a Antiguidade por Aristóteles (em sua obra Retórica).
Admitindo que há uma lógica jurídica, os autores falam de uma forma de pensamento, de uma
estruturação própria do pensamento, que leva o juiz a tomar uma decisão acertada. Essa lógica
jurídica serve para orientar o juiz a decidir acertadamente. Não que o advogado, promotor ou
delegado não precisem de lógica, mas é que a organização da lógica decorre de uma
necessidade de tomar uma decisão.

Para Perelman, a lógica jurídica não pode jamais se reduzir a uma lógica formal (uma lógica
vazia de conteúdo). A lógica formal abandona os conteúdos jurídicos para ficar apenas com a
sua estrutura, ela não leva em consideração o seu conteúdo. Ou seja, ele diz que a lógica
jurídica não se resume puramente a uma lógica formal, que tem o objetivo apenas demonstrar e
não mostrar as coisas como são. O juiz não tem possibilidade de demonstrar por qual razão ele
condena um réu a pagar determinada quantia. A lógica formal permite ser demonstrativa porque
os objetos com os quais ela trabalha permanecem. Mas os elementos jurídicos são sempre os
mesmos? Se nós admitirmos que o raciocínio jurídico que lida com decisões, costumes e
normas podem ser sempre os mesmos, da mesma forma que os números? Não, pois não há
uma insensibilidade dos objetos jurídicos frente aos fatores tempo e local. Se nós insistirmos em
pensar a lógica jurídica de forma formal, é empobrecer demais a experiência jurídica. E disso
Aristóteles já tinha consciência. Aristóteles faz a seguinte pergunta: nós bem sabemos que
cumprir a lei é uma forma de realizar a justiça. E quando nós estivermos diante de uma situação
que o cumprimento literal da lei vai causar uma injustiça? Não, pois nós não temos uma
obrigação de cumprir a lei como se ela tivesse uma finalidade em si mesma. A lei deve ser
entendida como uma regra geral e abstrata, criada em uma situação que o legislador imagina
casos hipotéticos. Então, a lei no caso concreto, precisará sofrer uma adaptação para tornar
possível o seu objetivo, que é a realização da justiça. A regra da equidade foi criada por
Aristóteles. Para Aristóteles, o bom juiz é aquele que sabe adaptar a lei àquela situação
concreta. Logo, uma aplicação literal da lei (formal) fatalmente levaria a um empobrecimento do
conhecimento jurídico. Em razão disso, a lógica jurídica não resolve os problemas jurídicos
realizando um simples silogismo. O que Beccaria e Montesquieu queriam era que o juiz fosse “a
boca da lei”, reservando ao juiz meramente um papel de dizer o direito. Entretanto, não se
decide silogisticamente como se pudesse fazer um simples raciocínio vazio de qualquer
conteúdo.

O raciocínio jurídico não é um mero silogismo, ele opera com elementos de fato e de direito,
sempre deixando margem a alguma escolha. No raciocínio jurídico a regra de direito não se
emplaca diretamente sobre as nossas decisões, como se nada mais acontecesse. Os fatos
podem exercer certa influência na decisão. O raciocínio é afetado pelos fatos, pelas
contingencias. Qualquer decisão jurídica envolve sempre uma situação de escolha, por mais
rigorosa que ela seja. A lógica jurídica não é coercitiva como a lógica matemática, pois nesta não
há margem para escolher diferentemente da lógica jurídica. Não é que havendo uma
determinada lei, haverá determinado resultado. Pois os fatos poderão levar a lei à outra direção.
A verdade é que qualquer decisão, por mais criteriosa e rigorosa que ela seja, terá sempre que
lidar com alguma margem de escolha. Um raciocínio jurídico não se impõe de forma implacável
como se não pudéssemos fazer mais nada para mudá-lo.

O raciocínio jurídico não obtém nenhuma certeza. O raciocínio verdadeiramente jurídico não é
comprometido com a certeza. Certeza é somente para as ciências demonstrativas. O raciocínio
jurídico é um raciocínio da probabilidade de estarmos certos de alguma coisa. De modo, que a
decisão do juiz não é demonstrativa, mas sim fundamentada. A decisão do juiz reúne a maior
quantidade suficiente de elementos e argumentos a ponto de levar as partes a se convencerem
de que aquela decisão é razoável. Mas há sempre a possibilidade de ter outra decisão, por isso
que o juiz tenta apenas convencer o leitor. Aristóteles dedicou boa parte do seu estudo para
dizer como é que o jurista e o político devem raciocinar para convencer o leitor. Aristóteles vai
dizer que eles podem lançar mão de três recursos: o “logos”, o “ethos”, e o “pathos”. O logos é o
recurso que o orador lança mão para organizar o seu discurso de modo a ser tão coerente que
leva o auditório a se convencer da verdade da sua fala – a razão, a ordem Aristóteles diz que
nem sempre o orador tem isso a sua disposição, às vezes os elementos que o orador tem são
ilógicos, ele se quer tem condição de organizar o seu raciocínio logicamente, o que exige um
certo nível de inteligência e racionalidade para organizar o seu pensamento. Se o logos não o
satisfizer, ele ainda tem o recurso do ethos, que é o caráter, convencendo as pessoas pelo
caráter que o orador tem, pelo seu passado limpo, pelas suas origens, levando o auditório a
acreditar e confiar naquilo que ele esta dizendo. Determinados oradores usam desse recurso
que é a capacidade que leva o auditório a acreditar nele diante dos seus antepassados. O
pathos é o sentimento; aqui o orador não está sustentado por um histórico de vida, mas é ele
mesmo que escolhe as palavras e organiza o seu texto de modo a sensibilizar o auditório.
Porém, aqui não se trata propriamente de uma manobra, porque Aristóteles não está pregando
uma falsificação do discurso. Pois, para Aristóteles o bom orador é aquele que possui os três
elementos. O Aristóteles diz é que dominando todos esses recursos, é possível que o auditório
se convença dos seus argumentos.

Cap. II – Os clássicos da filosofia do direito

1. As considerações gerais

Esse capítulo não é um estudo minucioso dos autores da filosofia do direito. Na verdade, é uma
visão panorâmica da filosofia do direito ao longo de 18 séculos de história do pensamento
jurídico ocidental.

Enrique Dussel é um autor de um movimento mais abrangente da teologia da libertação. Tem


como ponto de partida de que a América Latina é uma região que foi oprimida durante séculos e
que um dos motivos dessa opressão é a inexistência de um pensamento filosófico e teológico
autônomo. Assim, devemos pensar o mundo da nossa própria realidade histórico-cultural. Uma
de suas críticas à ética tradicional é que nós vamos buscar nos autores europeus as referências
para compreendermos o nosso mundo. Enquanto, na verdade, deveríamos nos preocupar em
criar um horizonte de reflexão próprio. Antonio Truyol y Serra faz um estudo bastante atencioso
do Oriente. Contudo, são poucos autores que se encontra com essa predisposição para
compreender uma cultura própria ou que não seja europeia.

Não existe um só jusnaturalismo e não existe um só juspositivismo.

2. O período religioso e cosmológico da cultura grega

2.1 Os pré-socráticos

2.2O jusnaturalismo: parte do pressuposto de que o Direito é eterno. Essa escola possui quatro
características: o direito é eterno, imutável, universal e necessário. Nascer humano e nascer
sobre o império do Direito. Contudo, não há um só jusnaturalismo.

- Cosmológico: poetas gregos, pré-socráticos, Platão, Aristóteles e Cícero / juristas romanos. Diz
que o direito é natural sim, mas é natural em razão do cosmos porque ele tem a ver com certa
ordenação prévia do mundo. O cosmos para os gregos tem uma dimensão espiritual. Então,
esses autores acreditam que o direito é cosmológico porque há uma necessidade do cosmo.

- Teológico: São Paulo, Santo Agostinho e Santo Tomás. O direito continua sendo natural, mas
não há uma dimensão pagã. É teológico no sentido que advém de uma matriz hebraica cristã. O
direito é natural porque ele é dado por Deus (o Deus hebraico cristão – monoteísmo). Aqui já
não há mais lugar para a existência de uma força do universo atuando sobre nós (o cosmos).
Aqui é a ideia de que Deus criou o direito e gravou no coração do homem. Então, o direito está
em qualquer lugar que o homem se encontre.

- Racionalista: Grocio, Hobbes, Locke, Rousseau, Kant e Hegel. Aqui, pelo menos até a morte
de Santo Tomás de Aquino, os filósofos partiam do pressuposto de que o direito era um dado,
que a gente já vinha ao mundo pra viver sobre a ordem de determinado direito. A partir da
modernidade jurídica, o direito é um artefato (uma criação humana), rompendo definitivamente
com a visão de que o direito é uma realidade externa do ser humano. O direito aqui é natural
porque decorre da própria razão humana, logo, onde o ser humano estiver o direito estará. O
direito é construído pela razão. A rigor, Hegel e Kant não são propriamente jusnaturalista.
Hobbes também tem alguma característica que induz que ele seja jusnaturalismo. São autores
que estão numa zona de transição entre o jusnaturalismo e o juspositivismo. São autores que,
nos seus racionalismos, preparam os caminhos para uma investida definitiva do pensamento
jurídico positivista. Eles afirmam que o homem é capaz de criar o seu próprio destino.
2.3 O juspositivismo: não há direito eterno para essa escola. O direito não é imutável, embora os
juspositivistas recaiam sobre essa mesma ilusão. O direito é uma criação humana em um
determinado momento e em um determinado lugar. O direito reflete a situação de certo lugar. O
direito também não é necessário, o direito é o que ele é. A lei positiva é estabelecer algo de
determinado modo, mas não é necessária porque poderia ser de outro modo. Se alimenta de
algumas ideias do próprio jusnaturalistas e constrói o seu embasamento.

- Legalista: Escola da exegese, Montesquieu e Beccaria. Para os legalistas não há direito


natural, porque todo direito é criado pelo legislador. O Estado, pelas mãos do legislador cria o
direito que é único.

- Consuetudinário: Savigny. Não há direito natural, nem é uma criação do legislador. O direito
decorre do espírito do povo.

- Normativista: Kelsen. Não confundir nunca Kelsen com o próprio positivismo. A verdade é que
existem muitas versões do positivismo, que como um todo, não aceitam o direito como algo
natural. Para Kelsen, o direito é um conjunto de normas postas hierarquicamente para serem
cumpridas. Essas normas não são necessariamente leis, as normas são regras de dever-ser que
podem tanto ser instituídas pelo legislador, como pelos costumes. Pelo fato dele admitir os
costumes, é que não se confunde com o puro positivismo.

Esse confronto jusnaturalismo x juspositivismo já não faz o menor sentido. O único interesse
desse confronte é o interesse histórico. Mas na contemporaneidade, essa discussão é tida como
ultrapassada. Já no final do século XIX, passou-se a suspeitar dessas ideias positivistas. Na
segunda metade do século XX houve uma profundidade do pensamento moderno do direito.
Chega um determinado momento que tudo aqui que a modernidade acreditava começou a ruir.

2.4 A crise da modernidade jurídica:

-Novo direito natural: Stammler / Del Vecchio. É uma tentativa de ressuscitar o direito natural.

- Crítica ao normativismo: Reale, Cossio e Siches. Esses autores reconhecem a crise desse
normativismo, mas não admitiram necessariamente um regresso ao direito natural.

- Contemporaneidade: Rawls, Dworkin, Posner, Nussbaunr, Castanheira Neves. Os autores


mostram não apenas a insuficiência da abordagem do jusnaturalismo e do juspositivismo, mas
cuidam eles mesmos de encontrar respostas para os problemas jurídicos que decorrem da
realidade que vivemos. Como, por exemplo, o problema ambiental.

AULA 10 – 11/04/12

2. O período religioso e cosmológico da cultura grega

2.1. Os pré-socráticos

- Período chamado pré-socrático: principais idéias destes autores para o direito:

- Os filósofos pré-socraticos são filósofos muito preocupados em descobrir a origem de tudo o que
está no universo. De onde viemos? Qual a primeira substância a existir? O que representamos?
Esse chamado cosmos, ou a natureza, physis, é tema central destes autores. Para estes autores
o cosmos tem um logos. Porque um corpo se jogado ao ar cai? Isso e tantas outras ordens é
porque o cosmos tem um logos. Esses logos existente no cosmos te uma voz no mundo humano,
tem uma expressão no mundo humano. Como esse logos se expressa no mundo? Por meio da
nomos, ou da lei. A lei que governa a cidade, que rege a cidade é uma expressão da grande lei
que rege o universo. É por isso que o filósofo Heráclito dirá que nós devemos lutar pelas nossas
leis tal como um soldado luta por suas muralhas e fronteiras. Pois a lei é quem garante a
existência da cidade. É a nomos que possibilita essa existência nossa dentro da cidade. Disso,
vem outra observação que se deve fazer toda vez que lembramos os pré-socráticos, que é a
seguinte: a lei humana representa uma necessidade que o humano tem de se adaptar, ou de se
adequar a esta grande lei que existe no universo. Mas porque que a polis institui as suas leis? É
porque a polis é uma espécie de micro-cosmos. A cidade é também uma ordem, um logos. Na
cidade vemos representada essa lei que atua no universo, que rege, que administra os atos e
tudo mais que existe no mundo, a lei que governa a cidade é justamente esse esforço que o
humano tem de adaptar a lei que existe na natureza. O filosofo Heráclito acredita piamente que o
universo, que sua força age sobre nós. Ele acredita que os astros interferem nas ações humanas.
Existe uma lei maior, o macro-cosmos, e lei humana, que é também uma espécie de cosmos.

2.2. Os poetas gregos

- Os poetas, embora alguns autores não reconhecem teor filosófico ao trabalho dos poetas, a
verdade é que os poetas foram os nossos primeiros filósofos. Vamos encontrar primeiramente
neles que esse cosmos, esse logos tem uma direção – Zeus, que na mitologia grega é o deus
maior. Isso tem algo em comum com os pré-socráticos, no sentido de que há algo superior que
comanda a organização do mundo. Em Zeus tudo começa e tudo termina. Homero, na Odisséia,
apresenta muito essa da força de Zeus. História de Ulisses que durante dez anos vivencia a
guerra e Homero quer dar a lição de que Zeus é o governo do mundo.

- É preciso considerar uma característica muito presente, especialmente nos poetas trágicos, de
que nenhuma falta ficará sem a devida punição. Todo crime será punido, mesmo que pelos
descendentes. Exemplo que percebemos em Antígona, quando ela reclama a tragédia em sua
vida por conta da descendência. E a lição que se tira é que contra os deuses não há o que fazer.

- Outra observação é que os humanos estão sempre sujeitos ao arbítrio do destino e à ação dos
deuses. Os humanos são sujeitos frágeis. É importante tomar nota dessa questão da
arbitrariedade do destino, pois isso é presente em quase todos os poetas gregos e quase que
determinante nas obras trágicas.

- A cultura grega é indissociável da idéia de que quando o homem vem ao mundo, ele vem com
um destino. Ex.: tragédia de Ésquilo.

- Na história de Orestes (Ésquilo) que pede ajuda a Atenas, deusa da sabedoria, para que as
Eríneas parem de persegui-lo. Atenas cria um conselho de anciãos para ouvir as partes e decidir.
Seria uma espécie de tribunal que já nasce tendo em vista a questão do destino de cada um. Os
gregos se perguntavam se não era tudo uma sina, um destino a seguir, e é isso que Ésquilo
mostra, que todos temos uma sina a cumprir. No destino de cada um está a possibilidade de ser
feliz ou infeliz. Em suma, ser justo ou injusto não está inteiramente ao alcance de nossas mãos. O
homem é como um instrumento dos deuses. Orestes mata sua mãe porque já estava escrito que
ele mataria sua mãe. Contra esse destino não há nada que se fazer, como dirá Sófocles.

3. Sócrates e os sofistas

- Falamos que houve uma filosofia primeira preocupada com a existência do cosmos. Agora, nos
deparamos com outra realidade da cultura grega, pois o problema da justiça toma um rumo
diferente do que já vimos, pois o contexto político é um pouco diferente do momento anterior. Pelo
simples fato de que chega um momento que as realezas que governam as cidades gregas
perdem o poder e estas cidades começam a ser governadas pelas pessoas. Há uma
efervescência da democracia grega, que gera um movimento chamado de sofística – um
movimento de educadores que começam a andar de cidades em cidades para ensinar o que
aprenderam. Alguns destes sofistas, ou destes professores, eram verdadeiros professores de
política, que chegavam nas cidades e ofereciam seu trabalho para ensinar aos jovens como
participar ativamente da vida de suas cidades, como se tornar líderes de suas cidades. Em meio a
esse movimento de educação, vamos encontrar tanto sofistas no sentido indeterminado da
palavra, como o próprio Sócrates, que para alguns é um sofista. Essa afirmação é em razão do
fato de que quando falamos em sofistas somos induzidos em pensar negativamente a arte dos
sofistas, pois o que sabemos deste movimento vem de Aristóteles e Platão que eram contrários a
este movimento. Sócrates e os sofistas têm em comum uma característica que é a de trazer a
filosofia para a Terra, para este mundo. Os pré-socráticos estavam preocupados com o cosmos; a
sofística e Sócrates estavam preocupados com o que está aqui, com o mundo humano. Mas, se
assim é, se eles têm esse traço em comum, talvez seja somente isso. Pois Sócrates e os outros
sofistas se distanciam na medida em que Sócrates vai insistir na busca de uma lei, ou de um
princípio universal e garantidor da felicidade, uma lei na base de tudo que orienta a nossa ação.
Ao contrário dos sofistas, que não eram crentes nesta possibilidade. Por serem pessoas viajadas,
os sofistas vão espalhar a idéia de que a lei é uma característica de cada cidade – a lei é um
retrato da vida e do costume de uma cidade. Sócrates vai acreditar tanto nessa possibilidade que
vai se empenhar na busca de uma technè, ou uma arte da vida pública capaz de nos orientar no
caminho do bem, da felicidade. Uma techne que oriente como conduzir a polis. Protágoras é um
diálogo de Platão em que ele retrata a conversa de Sócrates com Protágoras. Será que a política
e a justiça é coisa que se aprende? Isso é questionado no diálogo, no qual Protágoras defende
que é possível sim, embora Sócrates convença Protágoras do contrário e se convence da
possibilidade da afirmação inicial de Protágoras. Para Sócrates, o próprio ser humano tem que
vencer a sua própria ignorância para buscar, através de nós mesmos e da humildade, essa lei
universal.

4. Platão

- Platão é um autor no qual vamos encontrar uma restauração desta unidade que foi perdida pelos
sofistas. Se nos pré-socráticos havia a unidade do logos, do cosmos, Platão vai tentar recuperar
essa unidade do ser através, ou procurando metafisicamente, uma forma geradora para todas as
coisas que existem no mundo. O grande empreendimento platônico é a distinção entre o mundo
sensível e o mundo inteligível. Entre o mundo das Idéias ou Formas e o mundo das sombras.
Platão, com a morte de Sócrates, se desencanta completamente do homem e da política. Ele
ficou fascinado pelo seu mestre. Ele tinha tudo para se tornar um grande político ateniense, pois
era de família rica. Quando Sócrates é morto pelo tribunal democrático, Platão se desencanta,
pois para ele não há salvação para a política ateniense. O humano não merece crédito, pois o
homem mais sábio que se conheceu foi condenado por outro homem. Ele propõe uma reforma
total na política ateniense, que parte da idéia de mostrar que existem dois mundos bem
separados: de um lado o mundo das Idéias e o mundo sensível que está aí, no qual vivemos no
meio. Para explicar bem isso, Platão fala na abertura do livro sétimo, da Republica, da alegoria da
caverna (pessoas que de dentro da caverna só vêem sombras e ouvem ecos, sem nunca terem
visto o sol, a verdadeira coisa, a verdadeira voz, ou seja, vivem num mundo de sombras sem
contemplar a verdadeira luz. Ele até fala que se estas pessoas saíssem da caverna tomariam um
choque de adaptação, mas que não mais iriam querer voltar à caverna). Com essa metáfora ele
quer dizer que o mundo que vivemos é um mundo de ilusões, pois é o mundo sensível, percebido
pelos nossos sentidos. É um mundo que não é confiável, percebido por aquilo que há de mais
nobre – a razão. O mundo inteligível vale a pena ser procurado, pois é nele que está a matriz das
verdadeiras coisas. Quanto mais distante do mundo das idéias se está, mais se está perdido, pois
está na sombra. Quanto mais tentados pelos sentidos, mais distante da realidade se está. Ao
pensar o quadro de Van Gogh, dos girassóis, se percebe o quanto se está distante do verdadeiro
girassol – pois o girassol veio da mente, ou seja, já distante do girassol real. Devemos, segundo
Platão, tomar o poder da mão dos atenienses e entregar para os filósofos. A proposta de justiça
de Platão é revolucionaria, pois ele vai ironizar a democracia ateniense e vai propor, antes de
qualquer coisa, a educação. No tempo de Platão, a educação é um atributo da família. Somente
as pessoas nobres tinham acesso. Platão propõe uma reforma na educação, propondo uma
educação pública e extensiva a todos os cidadãos, inclusive às mulheres. Pois para ele é
impossível construir uma cidade justa, se não se sabe verdadeiramente o que é a justiça. Isso é,
portanto, a alteração que Platão irá propor para tentar salvar Atenas da corrupção, da falsidade
em que os atenienses estão vivendo. Tudo isso só terá uma saída a partir do momento em que as
pessoas tiverem educação.

AULA 11 – 16/04/12

4. Platão (cont.)

- Recapitulando: Platão quer trazer novamente para a filosofia a idéia que há um pólo irradiador
onde todas as coisas encontram o seu sentido. Platão estuda e elabora isso através da distinção
entre mundo sensível e mundo inteligível. O desencanto dele com a democracia ateniense (por
conta da condenação de Sócrates), ele prega uma reforma na educação e política e prega que os
cargos públicos deveriam ser ocupados mediante escolhas ou concursos, nos quais só aquele
que estudou muito poderia ocupar estes cargos.

- Para Platão, a justiça é essencial para o direito. O livro I da república já começa enfrentando
essa discussão: o que é a justiça? Em determinada passagem, Platão dirá que estudar, pesquisar
sobre a justiça é mais importante que garimpar a busca do ouro. Platão entenderá como sendo
justiça como cada um assumir dentro da polis uma função na qual essas pessoas já nasceram
habilitadas para elas (isso é discussão entre estudiosos, e essa concepção é consenso, embora
haja divergências). Quando a gente nasce, nasce sabido, prudente ou corajoso – as três virtudes
da coragem, da temperança ou da sabedoria. Quem nasce com a virtude da coragem deveria ser
soldado, cuidar da defesa da cidade, é a esta pessoa que se deve entregar a proteção contra o
inimigo. Toda aquele que nasce com a virtude da temperança deve cuidar das funções produtivas
da cidade (pecuária, agricultura, construção), é a capacidade que a pessoa tem de não exagerar
na dosagem, como uma prudência. Capacidade de reconhecer na situação concreta qual a dose
adequada para se aplicar na realização de uma dada tarefa. As pessoas que nascem com a
virtude da sabedoria deve governar as cidades. Isso é discussão, pois costuma-se atribuir a
Platão uma sociedade elitista e aristocrática. O que não parece ser verdadeiro. A principal
acusação atribuída a Platão seria a de que ele teria criado uma sociedade de castas e atribuído
privilégios. Mas isso não parece sustentável a começar pela forma que Platão pensa a
distribuição destes cargos pela cidade. Platão se questiona como é que teremos certeza que
serão mesmo os sábios que voa governar. Se Platão propõe a educação acessível para todos é
sinal de que ele acredita que através da educação se pode identificar a virtude de cada um. Ele
prega que quando as crianças nascem, devem ser levadas para um lugar aos cuidados de um
educador, ao serviço do Estado. Essa criança começa a desempenhar algumas tarefas – as
pessoas que mostram aptidão para continuar os estudos, continuam; as que não apresentam
essa característica vão ser destinadas aos serviços de sustentação da cidade, como de
agricultura, pecuária etc. Então mais para frente faz-se outro teste e os que continuam se
destacando nos estudos, continuarão os estudos e os demais são destinados às funções de
defesa. (Platão traça esse currículo numa tabela em a Republica) Por volta dos 40 anos de idade
a pessoa está terminando os estudos e é mandada para o estrangeiro para um estágio de mais
ou menos 10 anos para conhecer outras realidades políticas e sociais. O sistema de Platão a
pessoa ocuparia o primeiro cargo público com mais ou menos 50 anos. É assim que os cargos
públicos na cidade ideal de Platão são preenchidos. Cada cidadão tem um papel a desempenhar
e a polis reclama dele essa atividade. Como as pessoas acessam estes cargos? O sistema
platônico de governo é rigoroso e aposta na sabedoria das pessoas para ocupar os cargos. A
justiça somente se fará no momento em que cada pessoa veja florescida sua capacidade através
da educação – cada um, uma vez investido na função correta, vai praticar suas atividades com a
máxima destreza. De modo que não há a criação de uma sociedade elitista. É preciso observar
que essa leitura que normalmente se faz de Platão é muito marcada no que contem na Republica.
Quando se parte para outras obras, percebe-se que existem outras idéias além destas. Embora
ele mantenha que a justiça só se concretizará quando o sistema de educação for perfeito. Platão
vive uma experiência pessoal dramática, relatada na carta 7. Ele foi convidado por Dionísio, ex-
aluno seu, para ajudar o mesmo para implantação do modelo platônico. Mas acabam se
desentendendo e Dionísio acaba vendendo Platão como escravo. Um ex-aluno encontra Platão e
acaba libertando ele. A partir desta experiência, Platão começa a repensar esse modelo e até
pensar na possibilidade de leis para este processo – como em O Político. Já Nas Leis (ultimo livro
que ele publica) ele reconhece a propriedade privada.

5. Aristóteles

- É o principal discípulo de Platão. É um estrangeiro e conhece Platão e se entusiasma. Mais


tarde divergem e Aristóteles acaba criando sua própria escola. Vamos ver o que Aristóteles trouxe
de contribuição para a justiça.

- Esse idealismo metafísico de Platão é rompido em Aristóteles. Platão preocupado com o divino e
Aristóteles mundano, preocupado com as coisas que estão na Terra. Aristóteles ironiza essa coisa
da suprema justiça. A idéia dele é: o que adiantaria uma pessoa ter o conhecimento perfeito sobre
um bem se na prática essa pessoa não sabe realizar esse bem? Então mais importante de saber
o bem, é saber fazer, realizar o bem. O exemplo que ele dá é o de uma pessoa que sabe que as
carnes brancas são mais saudáveis que as carnes vermelhas, mas não sabe que a galinha é uma
carne branca, esse conhecimento não serve para nada. Muitas das classificações usadas na
biologia (animal, mineral, vegetal) foi identificada por Aristóteles, pois ele quando estudava, se
dedicava aos mínimos detalhes, à descrição minimalista, com um senso de observação
admirável, com o olhar voltado para o mundo e para os acontecimentos. Ter o conhecimento
teórico sem saber identificá-lo no mundo é um conhecimento pouco valioso. Interessa a
Aristóteles saber o que é que as pessoas realizam um bem, como as pessoas escolhem seus
bens. Ele cria uma teoria sobre as escolhas, dos bens, dos amigos, das decisões, dentro da polis
– presente em Nicomaco. Essas escolhas estão relacionadas à busca pela felicidade, pois o que
todo homem busca é a felicidade. O que diferencia um homem do outro é o caminho que cada um
percorre em busca da felicidade. Para Aristóteles, a noção de justiça também está relacionada à
felicidade. A justiça tem a ver com nossas expectativas de felicidade. Tudo busca a felicidade ate
mesmo uma pedra. Aristóteles parte da premissa de que todas as nossas escolhas são
impulsionadas pela felicidade. Os animais, dos mais simples aos mais complexos, tem uma coisa
em comum: o desejo de ser feliz. Embora cada um tenha a sua idéia de como ser feliz. Essa
busca comum da felicidade é o que na verdade vai orientar a nossa vontade, ou a nossa procura
da justiça. Aristóteles escreve sobre a justiça em alguns lugares.

- “Ética a Nicômaco” – É um tratado sobre a felicidade.

- A felicidade para Aristóteles é dependente de bens externos. A pessoa para ser feliz depende de
bens externos ou de bens que ela não encontra em si mesma. Para Aristóteles, essa
autossuficiência apregoada por Platão é falsa. Aristóteles reconhece nos poetas, a ideia de que
para nós sermos felizes nós não podemos só contar com nosso esforço pessoal, nós também
temos que contar com a sorte. Essa é a diferença entre a virtude e a felicidade. Uma criança que
nasce numa família rica tem tudo para ser feliz, mas isso não é verdade.

- Para sermos verdadeiramente felizes temos que contar com a sorte. Vamos ter um
reconhecimento de Aristóteles que muitas coisas para sermos felizes depende da sorte. Ele vai
reconhecer a desgraça, a vulnerabilidade humana. Temos que contar com o outro. Para
Aristóteles a amizade é superior à justiça, pois ate os homens justos precisam de amigos.
Somente na companhia de amigos que conseguimos implementar nossa felicidade. Em Ética a
Nicômaco, tem um capítulo dedicado à amizade. São as pessoas de confiança que nos ajudam a
nos livrar da humilhação da sorte, do destino.

- De qualquer modo, a idéia de justiça como virtude ainda permanece em Aristóteles. Justiça
ainda tem a ver com atribuição de tarefas às pessoas dentro da polis. A justiça se cumpre
também, relativamente às tarefas que as pessoas exercitam na cidade. Na teoria de Aristóteles,
vamos ter uma justiça decididamente praticada entre iguais. Importa fundamentalmente para
Aristóteles um Estado integrado por pessoas mais ou menos iguais entre si (em sentido
econômico, social, intelectual, moral). Em Aristóteles encontramos uma justiça excludente, pois
ele se empenha em construir uma teoria sobre a desigualdade para justificar a escravidão – uns
nascem para mandar e outros para obedecer. Na justiça de Aristóteles, muitas pessoas estão
excluídas da polis. As mulheres, assim como escravos, estrangeiros, não estão integradas na
polis e são inteiramente felizes. A grande crítica que se faz a Aristóteles é que ele estava tão
mergulhado na sua cultura que não se deu conta que a escravidão não era um dado da natureza
– ele toma uma conseqüência como causa. Por outro lado, ele reconhece as nossas falhas
humanas e por sermos seres frágeis estamos sujeitos a grandes faltas.

- A justiça é para Aristóteles a maior de todas as virtudes que se conhece, de todas as qualidades.
Na Ética a Nicômaco ele dirá que a justiça é a mais destacada de todas as estrelas, é a que brilha
mais. O motivo de a justiça ser a maior é que é a única virtude que se preocupa com o bem do
outro. Como se pratica essa virtude? Como essa virtude se manifesta em nós? Aristóteles vai falar
de dois tipos: a justiça geral e a justiça particular. A justiça geral visa o bem da comunidade, tem
como objetivo realizar o bem da polis, o bem comum e diz respeito àquela justiça em que a
comunidade é a credora e o sujeito é o devedor – exemplo: quando pagamos os impostos damos
algo ao estado, para que este forme um caixa para realizar o bem comum. A justiça particular é a
justiça que visa o bem do particular e não o bem da comunidade. Essa justiça, segundo
Aristóteles ainda se dá de modo distributivo e de modo sinalagmático (ou contratual, ou corretiva).
A distributiva é quando o Estado ou o sujeito distribui aos particulares a parte que cada um tem
direito (ex: saúde, segurança, etc) e pode ser também sinalagmática quando o particular dá a
outro particular o que lhe é de direito – é o que se chama de justiça contratual. O Estado participa
na seguinte situação também: quando uma das partes, na relação particular, falta com a
obrigação – Aristóteles fala que o Estado participa de modo superveniente para corrigir uma falha.
É o Estado juiz. Aristóteles se depara com a seguinte dificuldade: de que modo essa justiça pode
ser bem aplicada? Isso porque Pitágoras tinha dito que a justiça se representa como um
quadrado, pois a justiça é uma igualdade absoluta, na qual não há diferença. Mas se a igualdade
é o objetivo da justiça, Aristóteles vai concluir que se levarmos as idéias de Pitágoras a justiça
nunca será atingida, pois não somos todos iguais. Então, Aristóteles vai falar que isso é corrigido
se levarmos em consideração essas desigualdades, para aplicar a igualdade em sentido
proporcional. Se encontrarmos pessoas desiguais e tratarmos de modo igual, isso aprofundará a
desigualdade. Então, deve-se amenizar a desigualdade para que haja a justiça. Quando ele fala
em justiça geral, ele fala que haverá necessidade de se observar as desigualdades – como
exemplo de pagar impostos, quem é mais pobre deve pagar menos. Da mesma forma na justiça
distributiva, que deve ter em conta as desigualdades. É preciso observar a proporcionalidade. No
que diz respeito à justiça particular sinalagmática essa justiça é absoluta, no sentido de que as
pessoas devem ter de prestar os compromissos que assumem entre si – não há
proporcionalidade, pois cada um assume o que se comprometeu.

- Equidade: a justiça só se cumpre verdadeiramente na idéia de equidade. Teoria da equidade que


é a teoria de flexibilização da lei, para cumprimento da justiça. As leis, quando muito rigorosas,
tendem a cometer injustiça. A lei tem que ser flexível para se adaptar aos casos.
AULA 12 – 18/04/12

Estoicismo: ver em tudo que existe no mundo uma espécie de divindade.

- Universalização do logos

- Pandectismo

- É a filosofia que vai predominar entre os filósofos romanos

- No estoicismo vamos encontrar algo não comum na cultura grega: pregação da supressão das
diferenças humanas – são autores propensos a reconhecer os nossos limites como humanos.

- A importância geral que a filosofia romana tem para o estudo da história do pensamento jurídico
é que a filosofia romana vai ser uma espécie de passagem da especulação racional, muito
comum entre os gregos e presentes de certo modo nos romanos, para uma espécie de
pensamento que deixa de ser especulativo para ser prático. Quando chegamos aos jurisconsultos
romanos a preocupação deles não é com a idealidade jurídica.

6. Cícero e os juristas romanos

- Cícero: destaca-se porque contribui decisivamente para a formação de um pensamento romano.


Presta um grande serviço ao pensamento romano, além de ser um grande divulgador da filosofia
grega. Cícero é um leitor voraz da filosofia grega e deve-se muito a ele a tradução de muitos
pensadores para a cultura romana. Em muitas obras de Cícero, percebe-se muito da idéia de
Platão. É preciso destacar que em Cícero a marca filosófica mais presente é também a do
estoicismo. Do pensamento de Cícero, vale destacara: 1) a pressuposição de uma sociabilidade
humana. Quando falamos dos gregos, insistíamos muito no ponto de que o homem é um animal
político, e em Cícero isso também está presente. 2) vai desenvolver uma teoria do direito natural –
diz que a reta razão é a lei natural (no sentido da razão) – existe uma lei que não está escrita,
mas o fato de não estar escrita não significa que as pessoas não a conheçam. Essa reta razão
nos chama para o bem e nos afasta do mal. É uma lei eterna e imutável e universal. Cícero diz
que para além do que fazemos no senado, do que o príncipe edita, do que o povo decide, há uma
outra lei, grandiosa, que nos manda fazer o bem e evitar o mal; essa lei não pode ser revogada
por nós, ainda que o senado ou o povo queira, pois essa lei é imposta de forma coativa
independente da vontade, imposta pelo logos. É exatamente essa lei que dá justeza e validade à
lei positiva. A lei produzida pelo homem não pode se afastar da reta razão, da lei natural, pois
pode perder sua efetividade. Essa crença dele na lei natural é interessante porque essa lei natural
é o meio que Cícero vê que permite uma unificação entre o mundo humano e os deuses. Essa
única comunidade, deuses-humano, vai refletir na crítica que o autor faz a algumas instituições
como a escravatura, por exemplo. 3) vamos encontrar uma recriação do mito platônico, da
felicidade eterna, do desapego ao mundo (beatitude), do governante justo. Há uma coisa que
inquieta Platão que é a seguinte: porque devemos ser justos? A justiça traz felicidade para aquele
que a pratica? Platão está um pouco preocupado em convencer as pessoas a serem justas.
Platão conta no mito de Er, que Er foi um grande guerreiro que morreu em combate e fica na pilha
de mortos esperando sua vez de ser sepultado e quando chega a sua vez Er levanta e conta sua
história sobre o mundo dos mortos, no qual havia um julgamento que as pessoas justas eram
colocadas de um lado e as não justas de outro. Ele conta que viu grandes tiranos gregos
sofrendo, e viu outras pessoas muito boas que estavam felizes. Er, segundo Platão, teria recebido
uma incumbência de quem comandava o regresso das almas de contar essa história para o
mundo dos humanos, para continuarem sendo justos. Platão conclui que as pessoas que forem
justas nesta vida, serão felizes, pois contemplarão a verdade e receberão o reconhecimento
público, sendo o maior bem a felicidade eterna. Essa idéia de felicidade eterna é retomada por
Cícero em “Sonho de Cipião”. Cipião foi, em nome de Roma, exercer uma atividade do governo e
durante uma noite ele teve um sonho e recebeu a visita de seu avô Cipião também. Cipião velho
diz ao novo que onde ele estava vivendo era muito admirado e respeitado pelos deuses, e que os
deuses admiravam a capacidade humana de criar e governar cidades, os deuses admiravam a
arte política. Cipião velho aconselha o novo a permanecer à frente do governo, sendo justo, pois
quando ele morrer será muito bem acolhido pelos deuses. A coisa pública conferirá ao governante
a felicidade eterna. Essa idéia de Cícero tem uma grande repercussão da filosofia romana, que é
a dimensão ativa dos autores romanos em contraposição com os gregos – muito presente entre
os jurisconsultos. Cícero é um autor que admira muito os gregos, mas na comparação com os
romanos ele considera os romanos superiores, pois são práticos, desenvolvem mais sua vida
ativa, do que a contemplativa. Os gregos cultivavam a vida contemplativa. E os romanos têm uma
natureza prática, se preocupam com a vida prática. É nesse contexto de elogio à práxis que
vamos encontrar os jurisconsultos. A principal contribuição destes é a jurisprudência. Estes
homens não foram advogados, nem juízes, nem filósofos, eram autores que se apropriaram da
filosofia grega e romana sem serem filósofos. A sabedoria que eles constroem é uma sabedoria
prático-prudencial. Enquanto os gregos se preocuparam qual era a justiça ideal, os jurisconsultos
estavam preocupados em criar instrumentos para que essa justiça fosse possível. O tempo de
ouro da jurisprudência é do séc. I ao III. Se forma um grande corpo de pessoas que despertaram
para um conhecimento específico – o do direito. supõe-se que tudo isso nasce de um evento
histórico que ocorreu na Roma antiga, que tem Tibérios Caruncanius como responsável. Ele foi o
primeiro plebeu a chegar ao cargo máximo no colégio dos pontífices. A plebe romana vivia em luta
permanente para conquistar certos direitos. (no livro “a cidade antiga” a tese de surgimento do
direito é a crença na religião). Tiberius está situado numa posição de privilégio, já que eram os
pontífices que ditavam o que era o direito. E ele escancara as portas do colégio dos pontífices e
deixava qualquer um assistir aos julgamentos e decisões. Essa iniciativa despertou muitos jovens
aristocratas para a importância de estudar o direito. então se desenvolve esta “casta” de pessoas,
os jurisconsultos, que se especializam em direito, elaborando teorias, edificando conceitos e
instituições jurídicas duradouras e universalizantes. Através dos jurisconsultos que o povo romano
se firmou no mundo, pensando o direito para além da religião. Eles desenvolvem conceitos que
poderiam ser aplicados pelos romanos em qualquer lugar que eles estivessem (conceito de direito
público, direito privado, propriedade, pena etc.).

- Ainda sobre os jurisconsultos, no interesse deles pela solução de problemas concretos,


encontra-se a característica neles de preocupação com a justiça, ou a definição da justiça como
uma virtude humana, “aequitas”. A justiça, na dimensão da virtude, se assemelha àquilo que
encontramos nos gregos – se pensar a justiça como uma qualidade, de agir de um determinado
modo. Isso é uma noção de justiça que tem a ver com a busca deste aperfeiçoamento do sistema
positivo de direito. Vamos encontrar essa preocupação de ajustar o direito positivo em pontos bem
específicos, como Paulo (jurisconsulto) vai identificar a diferença entre direito e moral e vai
mostrar que nem todo direito posto é moralmente aceitável, é honesto, ou seja, pregando um
direito justo. Outro jurisconsulto que vai promover o direito como idéia do bom e equitativo é
Celso. Ulpiano vai definir o direito como um cuidado das coisas divinas e humanas e a justiça
como algo que tem que partir de cada um, como uma qualidade. O bom e o divino são qualidades
que os juristas devem ter em mente. Para atingir uma realidade como essa somente a noção da
necessidade de transpor a ordem, tendo em vista a esperança de criar uma sociedade justa.
(embora a tendência geral da jurisprudência seja separar o direito da religião).

AULA 13 – 23/04

7. Santo Agostinho (séc. XV e XVI)

Representa a primeira grande síntese entre a filosofia grega e o cristianismo. Sua obra é muito
marcada pelos traços filosóficos gregos, principalmente platônicos. Essa ideia do cosmos, de uma
perfeição de uma ordem influencia a obra de Santo Agostinho. A partir de Santo Agostinho toda
filosofia pagã ficou para trás. A verdade é que o depois do nascimento de Jesus Cristo o mundo
jamais seria o mesmo, cuja pregação influenciou milhares de pessoas. Ele trará uma leitura bem
diferente dos autores pagãos. Tal como era muito comum entre os filósofos antigos, encontra-se
em Santo Agostinho uma doutrina política de que o ser humano é sociável por natureza. Ou seja,
o homem tem uma vocação natural para viver em sociedade.

Santo Agostinho perpassa por um pessimismo quando analisa das menores organizações às
maiores, a autoridade é sempre necessária pelo fato de ser necessário unir os pecadores. A razão
de ser da autoridade de pai da família, do governante que rege a cidade e do juiz que aplica a
sentença, tem como justificativa o fato do ser humano viver perturbado pelo pecado. Essa é uma
leitura marcante em Santo Agostinho. Ele associa tudo isso à corrupção, à cobiça, à violência e ao
afastamento de Deus. A função da autoridade é intervir na conduta do cidadão para levá-lo ao
bem. Esse pessimismo do autor em relação ao homem fará com que ele desenvolva um estudo
que tem a “Cidade de Deus” e a “Cidade dos Homens”. Onde ele vai fazer esse confronto na
sociedade jurídica. Onde de um lado está a organização que reúne todas as disposições,
condutas e códigos necessários a uma vida boa e justa – Cidade de Deus. E a Cidade dos
Homens é composta por malandragem, pelo jogo de interesse das pessoas, tudo aquilo que nos
afasta do bem. Esse confronto é com o objetivo de dizer de que se o mundo quer de fato
recuperar a bondade e a felicidade reinante no mundo ele deverá ser governado por uma
república cristã. Porém, ele não faz nenhuma alusão de que o mundo deverá ser governado pela
Igreja. O que ele quer na verdade é propor uma republica crista que significa um mundo ou um
poder governado segundo princípios cristãos. Essa Cidade de Deus será aquela governada pela
boa vontade, como querer a coisa certa. Ele considera que há em nós uma razão natural ou uma
habilidade natural para receber o preceito de Deus.

Em Agostinho a ação humana é livre. Santo Agostinho e a Igreja estão envolvidos em uma
dificuldade imensa que é a de saber até que ponto o diabo exerce sobre nós algum poder. A
doutrina reinante diz que Deus é onipotente e onipresente. Se Deus é o criador de tudo, mas o
pecado está no mundo, será ter sido Deus que criou o pecado? Ele diz que não, que o diabo
existe sim, mas ele não tem a palavra final sobre nós. E que não foi Deus o criador do mal. Deus
fez o homem livre e deu tudo que bom que há. Se o mal existe, esse mal nasceu da cobiça. Santo
Agostinho introduz aqui o elemento do livre arbítrio. Deus, para Santo Agostinho, não pune
ninguém, Ele apenas distribui os castigos que nós merecemos. O mal nasceu do desejo de cobiça
que está no homem. Deus nos dar, inclusive, a possibilidade de nos redimirmos dos nossos
pecados. Toda sua teoria moral está sustentada em torno dessas ideias.

Santo Agostinho projeta isso tudo no mundo de Direito da seguinte forma:

I – Teoria da Lei: é uma teoria tripartida da lei. Existem três leis que governam o mundo e as
pessoas, que são a lei eterna, a lei natural e a lei humana. A lei eterna é definida como a razão e
vontade divina mandando respeitar a ordem natural das coisas, sendo imutável e suprema – é a
própria vontade divina atuando e governando tudo que há no mundo. Já a lei natural é a
participação da criatura humana na lei divina, que está gravada em nós permitindo que o homem
escolha o bem para evitar o mal. A lei humana, por sua vez, é a adaptação da lei natural às
circunstâncias de tempo e lugar visando assegurar a paz e a ordem social na direção do fim
último do ser humano. Ou seja, esta lei é prescrita pelo próprio humano, mas é uma adaptação da
lei natural – adaptação da lei divina que toca o homem.

Para ele a justiça é uma exigência para qualquer sociedade. Tudo o que há no mundo existe e é
orientado segundo a justiça. O que justifica e que confere validade a qualquer organização é a
justiça. Há um compromisso do ser humano de buscar essa justiça divina. Essa justiça que
sustenta a ordem pública dos Estados. Fora isso, os funcionários do Estado não terão outro
destino senão a bandidagem.

É possível instituir um governo mundial como queriam os estoicos? Ele diz que não há essa
possibilidade. Para ele o homem não está à altura para viver uma experiência dela, mas apenas
uma “vizinha amiga” é possível (ex: MERCOSUL). Contudo, a teoria da guerra é um problema
encontrado na questão da vizinhança amiga. Para ele, a guerra entre si é algo que deve ser
rejeitado, existindo apenas uma situação que torna a guerra justa que é a de fazer reparar um
mal.

8. Santo Tomás

O pensamento dele tem uma significação grandiosa seja para a filosofia, seja para o direito ou
para a cultura como um todo. Ele é a coroa do cristianismo medieval (o autor mais bem realizado
na Idade Média). Santo Tomás é o construtor de um sistema que vai unir fé e razão, paganismo e
cristianismo, especulação e observação. Seu autor referência é Aristóteles. Ele vai cumprir um
grande papel que é o de “domar” Aristóteles que ameaçava as estruturas do catolicismo. Ele
descreve segundo um discurso de autoridade, ele propõe uma questão e diante dela ele busca
argumentos favoráveis e contrários. Ao final, ele dá a sua conclusão. Enquanto em Santo
Agostinho se tem um direito governado pela vontade de Deus. Em Santo Tomás se tem a razão.

AULA 15 – 02/05

9. GRÓCIO

- Com a morte de S. Tomás de Aquino (por volta de 1275), a filosofia do direito ganhou um novo
mundo. Morreu com ele aquela esperança de fundar o direito e o Estado na fé cristã.

- Hugo Grócio é um dos responsáveis pela virada racionalista na filosofia do direito. Grocio é um
filosofo holades, protestante, que viveu em um tempo em que a Europa estava dividida ideológica
e religiosamente, de modo a preocupar este autor. No tempo dele, a igreja católica não tem mais
a hegemonia do passado. Ele convive com guerras devastadoras e divergência religiosa. Esse
quadro desperta a preocupação em encontrar um fundamento novo para o Estado e direito. Isso é
possível encontrar numa obra dele: “do direito, da guerra e da paz” – tornando-o um dos pioneiros
a versar sobre o direito internacional.

- Ele é um autor que, para encontrar o fundamento novo para o direito, vai partir do pressuposto
que há em cada um de nós a tendência para a vida em comunidade (que já foi dito em Aristóteles
e S. Tomas), mas tudo não passa de aparência. O que Grocio chama de “appetitus societatis”,
apetite de viver em comunidade, já não tem mais aquela natureza empírica, verificacionista, que
se encontra em Aristóteles, do homem de necessidades, do homem cheio de desejos que não
satisfaz isoladamente.

- Em Grocio não há mais a dimensão empírica, mundana, fisiológica. Esse apetite de viver em
sociedade de Grocio é inspirado pela razão. Quem nos vocaciona para a comunidade é a razão.
Esse discurso da razão vai marcar a doutrina de Hugo Grocio e que vai selar a nova era da
modernidade jurídica. Essa razão é da natureza humana, embora Grocio não entre nessa
investigação.

- Se pode perguntar qual é o motivo que está presente nesta idéia em termos políticos. Em termos
conjunturais é um momento de guerra, mas em termos políticos é uma época que dois grandes
pensadores exerciam sua influencia sobre o pensamento europeu. De um lado Jean Bodin e do
outro Maquiavel. A doutrina predominante que se tem na época é a doutrina da soberania
absoluta do Estado, que preocupava Grocio. O príncipe, uma vez investido do poder, dispõe de
seu poder e do exército de modo absoluto – e Grocio quer dar nova direção a isso, diante de uma
doutrina que concentra poder no Estado e de um momento de guerra. O poder não pode ser uma
simples vontade do príncipe. O direito não pode nascer com a simples vontade de querer o direito.
Grocio vai dizer que há um direito que antecede qualquer vontade humana. Qualquer exercício de
poder, vontade do príncipe, segue uma lei que o antecede – e essa lei não é a natural, da qual
Tomas de Aquino tanto falou. Em Grocio, a lei natural segue outra doutrina. A nova doutrina pra a
lei natural vai ser traçada aqui. Grocio tentará mostrar que essa lei não provem de Deus, muito
menos do rei. Essa é uma época que o rei e o papa disputam quem é o verdadeiro representante
divino. Grocio dirá que o poder e o direito não estão nem no papa e muito menos no rei, a lei é um
imperativo da razão. Toda e qualquer lei nasce necessariamente da razão.

- O que vamos ter aqui é um esforço deste autor para fundar um direito não mais embasado em
princípios metafísicos do cosmos ou do divino. Tudo agora conduz a filosofia jurídica para
horizontes inteiramente impensados, que são os ideais matemáticos. O direito é verdadeiramente
um imperativo da razão, e tem nos pensamentos matemáticos a razão de ser. Tal como Deus não
faz com que dois mais dois deixe de ser quatro, Deus também não faz com que o Direito deixe de
ser Direito e o justo deixe de ser justo. Deus não interfere nas razões matemáticas – isso não está
ao alcance do divino. Deus também não fará com que o certo fique tortor e o torto fique certo.
Máxima de Grocio dirá que o direito natural existiria mesmo que Deus não existisse, ou existindo
não cuidasse das coisas humanas. Grocio não é ateu e nem profana o nome de Deus, ele
simplesmente afasta Deus desta discussão. É o discurso religioso que estava levando a perdição
do mundo – em nome de Deus muitos se arvoravam, fazendo as nações se dividirem, dizendo-se
os detentores da verdade divina. Grocio propõe então o direito natural racionalista, de acordo com
questões matemáticas. Grocio tenta libertar o direito das convicções religiosas que estavam
dividindo a Europa. Se o direito pode ser libertado do viés religioso ele vai se fixar em bases
universais que pode unificar os povos. Então Grocio deseja instituir o Direito, ou buscar uma
sociabilidade a ponto de criar, ou aspirar, uma cooperação entre todos os povos – e por isso é
considerado o pai do direito internacional moderno. O direito deve ser pensado não somente no
viés provinciano, mas deve abranger e procurar uma dimensão internacional. Duas coisas ele
desenvolverá com base em um direito internacional: semeia a idéia da fidelidade aos
compromissos assumidos, e a idéia de que uma guerra, mesmo sendo uma guerra, carece de
uma disciplina. Diante da impossibilidade de paz, deve-se criar regras mínimas de trato, mínimo
de respeito entre os beligerantes.

10. HOBBES

- Embora chegue a conclusões contrárias a de Grocio, ele vive basicamente os mesmos


acontecimentos. Ele é um inglês que vive as mesmas aflições de Grocio, do tempo de guerra. E o
assunto da segurança permeia toda a obra de Hobbes.

- O problema da segurança é central na obra de Thomas Hobbes. Se o problema da guerra é


central, e atormenta o autor, ele também não deixará de tentar libertar o direito de seu
compromisso religioso. De modo que uma das coisas que ele fará é subjugar a igreja ao Estado.
O Estado não pode ter concorrente. Consequentemente ele tentará achar outro fundamento para
o direito e a mecânica e a matemática inspiram a teoria político-jurídica de Hobbes. Inspiram e
fazem com que ele elabore uma verdadeira teoria para a ação humana, pois ele quer encontrar
uma explicação para a ação – por que o ser humano age? A fim de responder esta pergunta,
Hobbes tenta penetrar a alma humana para descobrir o que está por trás das ações do homem. E
vai chegar a uma conclusão pessimista em relação ao homem, ao descobrir que tudo que já tinha
lido (Aristóteles, Agostinho, S. Tomas), do homem vocacionado etc., ele percebe que não existe. A
única coisa que leva o homem à ação é sua vontade de auto-preservar. A vontade de se auto-
preservar é a mola propulsora da vontade humana, pois o ser humano é egoísta e não tem
nenhuma vocação de viver em comunidade.
- Essa idéia de que o homem procura o amparo no outro para viver bem não passa de balela que
os filósofos contaram e que agora é preciso desmontar. E Hobbes tenta demonstrar isso pela
vontade que o homem tem de ter sempre poder. Isso ele dirá que acompanha o homem antes
mesmo da existência do Estado. A característica do homem em seu estado de natureza é essa.
Supostamente, antes do Estado, existia o estado de natureza – aquele momento primeiro que só
existia a fraude e a violência e nenhum tipo de direito. Todas as pessoas exerciam sua liberdade
com extremismo. Nesse estado de natureza, os homens viviam em guerra permanente uns com
os outros. Isso é o que fará com que esse autor tente nos mostrar outro fundamento para o
direito, que antes estava sustentado na vontade e razão de deus. O direito passa a ser um
expediente da razão, pois o direito não vem do céu, não é força atuante da natureza, o direito é
um artefato humano, uma criação humana. O direito nasceu a partir do momento que o homem se
deu conta de que viver neste estado de guerra não lhe era adequado. Todos eram livres, mas
ninguém usufruía totalmente desta liberdade, pois o outro homem, também livre, podia cercear a
liberdade do outro a qualquer momento – o maior mal disso é a insegurança. A insegurança de
que a qualquer momento se poderia ser violentado por outra pessoa. Não é Deus que coloca o
direito na mão do homem. Mas é a inteligência humana que faz com que o homem perceba que
ao renunciar a essa liberdade absoluta e entregar a um ente centralizador a insegurança
diminuiria. (OBS: em Grocio não há uma escolha pelo direito, pois o próprio fato de ser humano já
traz o pertencimento ao direito). O homem em Hobbes é o homem cansado de guerra que, em
determinado momento, optou pela criação de um contrato – Hobbes não tem a preocupação de
trazer um marco, um momento histórico para a criação do direito.

- Hobbes dirá que diante da precariedade da vida em estado de natureza o homem é obrigado a
renunciar à liberdade absoluta que ele tem e fazer um contrato social – o contrato é um desafio
proposto ao ser humano de sair do estado de natureza. Esse contrato torna possível a vida. Não é
um contrato entre o cidadão e o Estado, é um contrato entre os próprios cidadãos, de modo que
Hobbes não vincula o Estado aos cidadãos, mas vincula os cidadãos entre si. O contrato social,
com isso, não limita o poder do Estado, pelo contrario, de modo que o Estado em Hobbes é tirano
– só tem que garantir a segurança do cidadão. Em nome dessa segurança o Estado pode tudo.

- Hobbes está tão convencido de que o Estado tem de ter poder sem limites para garantir a
segurança do cidadão, que vai considerar a monarquia o tipo ideal e a democracia o pior. Sendo a
monarquia o governo de um só, a chance de divisão, de perturbação e de abalo da força do poder
é sempre menor.

- Chega-se à questão: será Hobbes juspositivista ou jusnaturalista? Há divisão, e esta é uma


celeuma que alimenta o debate entre filósofos, e a razão para isto está no fato de que Hobbes
negue um direito natural, mesmo porque antes do contrato não havia o direito. Para Hobbes, em
princípio, não há direito natural. Mas Hobbes dirá, por algumas vezes, que há uma coisa que o
homem tem e que existe independentemente de qualquer coisa, que se reconhece em todo
mundo, que é o direito de repelir uma agressão contra si mesmo – auto-preservação.

- Aparentemente o que se tem em Hobbes é um positivismo de feição nominalista (discussão


ontológica sobre o ser das coisas e para o nominalismo as coisas são arbitrárias, não há algo
fundante – foi uma discussão que ocorreu em contraponto ao essencialismo). O justo e o legal é o
que o Estado diz que é, o que o Estado fixa e determina. Essa idéia de que não há direito natural,
que o direito é constituído a partir de contrato soberano, há que ser exercido com o maior rigor
pelo Estado, sem admitir hipótese de o cidadão se rebelar contra o Estado. Quando Hobbes diz
que não há direito natural, mas diz que tem que se reconhecer que há entre nós a idéia de
reprimir a guerra entre nós mesmos, admite que os cidadãos devem se rebelar contra o Estado se
ele não cumpre sua função – mas Hobbes não apresenta esta possibilidade, pois a idéia é que os
cidadãos não devem se rebelar contra o Estado, o Estado tem de se organizar de tal forma para
evitar isso. Para evitar a volta ao estado de natureza, tudo é possível para o Estado.

11. LOCKE

- É também inglês, que não tem a ver com Hobbes, embora parta de alguns pressupostos deste.

- Locke vai recusar a doutrina de Hobbes, de que no estado de natureza o homem vivia em
guerra. Ele dirá que não era um estado de guerra e sim um estado de cooperação. Ele dirá que
no estado de natureza as pessoas se ocupavam umas das outras, mas a partir daqui a coisa
começa a se complicar – se no estado de natureza não havia guerra, se havia paz e cooperação,
então para que o direito? Era uma cooperação ingênua, tão ingênua que algumas pessoas
faltavam com essa cooperação e nada acontecia a elas. Então foi preciso um contrato para que
os iníquos cumprissem sua parte. Era necessário instituir uma lei segura para que determinasse
expressamente o que cabia a cada um. Faltava uma lei clara e um julgador isento, para Locke,
um juiz isento para julgar essas situações surgidas da iniqüidade. Faltava também um órgão
executor, para que a sentença dada fosse cumprida – as três (leis claras, juiz isento e órgão
executor) precariedades apontadas por Locke que levavam a essa situação de contrato.

- Surge a necessidade de um contrato social, de um pacto, que vai fazer o homem passar de uma
liberdade natural para uma liberdade civil. A natural é a do estado de natureza, e a civil é outro
tipo de liberdade – essa só nasce depois. É a liberdade artificial, criada como um suplemento para
a liberdade anterior. A liberdade civil significa a pessoa seguir uma lei pública, que é conhecida de
todos e é permanente. As pessoas participando da criação da lei e tendo conhecimento para
segui-las, elas se sentem seguras. A liberdade é condição de existência da lei – a lei está
sustentada nessa liberdade civil.

- Locke vai ser conhecido, por isso, como pai do liberalismo. Vai ser o primeiro grande pensador
liberal, pois já semeia a ideia de que o Estado cria mecanismos que permitem ao cidadão exercer
sua liberdade e se preservar, se defender, da ameaça do próprio Estado.

- Problema da propriedade.

AULA 16 – 07/05/12

11. LOCKE

- Locke vai recusar a doutrina de Hobbes, de que no estado de natureza o homem vivia em
guerra. Ele dirá que não era um estado de guerra e sim um estado de cooperação. Ele dirá que
no estado de natureza as pessoas se ocupavam umas das outras, mas a partir daqui a coisa
começa a se complicar – se no estado de natureza não havia guerra, se havia paz e cooperação,
então para que o direito? Era uma cooperação ingênua, tão ingênua que algumas pessoas
faltavam com essa cooperação e nada acontecia a elas. Então foi preciso um contrato para que
os iníquos cumprissem sua parte. Era necessário instituir uma lei segura para que determinasse
expressamente o que cabia a cada um. Faltava uma lei clara e um julgador isento, para Locke,
um juiz isento para julgar essas situações surgidas da iniquidade. Faltava também um órgão
executor, para que a sentença dada fosse cumprida – as três (leis claras, juiz isento e órgão
executor) precariedades apontadas por Locke que levavam a essa situação de contrato.

- Surge a necessidade de um contrato social, de um pacto, que vai fazer o homem passar de uma
liberdade natural para uma liberdade civil. A natural é a do estado de natureza, e a civil é outro
tipo de liberdade – essa só nasce depois. É a liberdade artificial, criada como um suplemento para
a liberdade anterior. A liberdade civil significa a pessoa seguir uma lei pública, que é conhecida de
todos e é permanente. As pessoas participando da criação da lei e tendo conhecimento para
segui-las, elas se sentem seguras. A liberdade é condição de existência da lei – a lei está
sustentada nessa liberdade civil.

- Locke vai ser conhecido, por isso, como pai do liberalismo. Vai ser o primeiro grande pensador
liberal, pois já semeia a ideia de que o Estado cria mecanismos que permitem ao cidadão exercer
sua liberdade e se preservar, se defender, da ameaça do próprio Estado.

COMEÇA AQUI A AULA 16

- Ao dizer que o Estado tem que proteger a segurança e a propriedade privada, Locke se mete em
uma confusão. Será que a propriedade é mesmo um direito do cidadão? A gente pode dizer que a
propriedade é um direito natural? Ele se faz estas perguntas e raciocina que pelo direito natural
ninguém pode falar em propriedade. Formula o raciocínio: se eu olhar pela janela e ver o lago,
ninguém em sã consciência diria que a água daquele lago me pertence. Agora se olho para a
água de um jarro em minha mão, ninguém diria que ela não me pertence. O que aconteceu para
possuir a propriedade de uma água e de outra não? O raciocínio engenhoso de Locke afirma que
em principio, cada um de nós pode se apropriar de tudo que há no mundo – todos os bens do
mundo são propriedades de todos, menos o meu corpo. A partir do momento que o agricultor foi
ao pé de fruta e colheu a fruta e trouxe para sua mesa, ele incorporou à natureza a força de seu
próprio corpo, a energia de sua própria vida. É o trabalho que realiza esse exercício de passagem
do direito natural para o direito à propriedade – pelo trabalho se cria a propriedade privada. Antes
de alguém empregar sua força física não havia propriedade privada, mas a partir do momento em
que alguém aplicou um força, despendeu alguma energia num trabalho a propriedade chegou. O
liberalismo está presente aqui, pois verdadeiramente estamos diante de um pensador que
revoluciona a idéia de trabalho. Até esse momento prevalecia a idéia de que o trabalho era uma
pena, era visto com reserva, assim como na Bíblia o trabalho era visto como um castigo. De certo
modo, na literatura antiga, trabalho é sempre visto como algo não digno ao homem nobre. Sem
contar o fato de que o pensamento católico também pensava o trabalho como castigo e como um
lugar de acumulo de riqueza e de pecado.

- Deve-se muito a Locke a formulação desta construção acerca do trabalho, de pensamento


liberal.

- Quem legitima a propriedade privada é o trabalho. Os bens pertencem a todos em seu estado de
natureza. Ninguém pode se auto-intitular dono de nada antes do trabalho.

12. ROUSSEAU

- Pensador francês.

- Noção da racionalidade presente em Rousseau – o padrão de racionalidade é rompido nele, pois


ele busca humanizar as emoções. No sistema político de Rousseau entra uma grande questão
em torno da paixao, no sentido de emoção, de sentimento. Isso vale a pena de ser destacado,
pois em Platão, na sua sociedade política, ideal, ele expulsou os poetas – a grande intriga com
eles é que para Platão os poetas prestavam desserviço ao estado na medida em que dificultavam
o acesso à verdade. Os poetas criam um mundo de magia e imaginação que para Platão era
dispensável. Esse pensamento de Platão acabou por prevalecer em toda a história da filosofia,
pelo menos até Rousseau. Havia uma grande desconfiança dos sentimentos – na visão de Platão
o único mundo confiável era o inteligível, enquanto que o sentimento deixa as pessoas no mundo
da confusão. Em Rousseau temos uma confissão de que é impossível pensar qualquer coisa
nesse mundo abandonando as paixões. No tratado “Emílio”, Rousseau vai dizer que todo e
qualquer projeto humano que ignorar os sentimentos é um projeto fadado à desgraça. Então todo
projeto deve levar em consideração a administração destes sentimentos.

Rousseau possibilita a humanização dos sentimentos, em contraposição aos demais autores que
desumanizam os sentimentos na tradição platônica.

- Rousseau, em “O contrato social” ele quer saber porque o homem, mesmo nascendo livre em
todo lugar ele se encontra acorrentado. Ele elabora uma teoria sobre isso, que vai deparar com
uma constatação de que no estado de natureza o homem era bom, muito feliz (tudo contrário à
idéia de Hobbes). Sendo que no estado de natureza a propriedade era comum a todas as
pessoas e a liberdade era plena – havia liberdade e não havia propriedade. Vamos encontrar em
Rousseau, no todo de sua obra, uma grande hostilização à civilização e uma visão positiva do
estado de natureza.

- A crítica dele à civilização:

- Rousseau afirma que no estado de natureza o homem era livre e não havia propriedade privada.
Isso é motivo suficiente para ele afirmar que o grande mal da civilização foi a criação da
propriedade privada. Em “O contrato social” ele diz que bom seria para a sociedade se no
momento que o primeiro espertalhão cercou a propriedade privado os outros homens tivessem
impedido isso. A idéia aqui presente é que no estado de natureza as pessoas não ambicionavam
ter nada a mais que o necessário para sua vida, sendo que cada um retirava da natureza os bens
necessários para a sobrevivência. Ninguém pensava em matar ou roubar, pois todos tinham o que
queria. Mas no momento que nasce a propriedade privada há uma degeneração da sociedade,
pois as pessoas cederam às suas paixões. As pessoas passaram a querer mais do que realmente
precisavam e o mal entrou para a vida do homem. Foi na verdade a paixão que levou a tudo isso,
que o homem passou a ter vontade e deixou que a vontade e o desejo se impusessem sobre ele.
O descontrole que levou ao crescimento do mal – e o mal que nasceu com a vontade do homem
de ter aquilo que não era necessário. Isso soa como uma crítica ao consumismo.

- Se o homem é feliz no estado de natureza, se a civilização é que o corrompeu, onde entra o


Estado? Tendo insurgido a propriedade privada e com ela o descontrole das paixões, surgiu com
ela a necessidade de colocar um freio nisso tudo. O contrato social nasce com esse compromisso
de colocar uma ordem no Estado e proporcionar aos homens a restauração da liberdade que foi
perdida.

- Rousseau começa a se debater com o problema da liberdade. Como é que nós vamos conciliar
a ideia da liberdade e a ideia da sujeição à lei? Rousseau afirma que quando nós obedecemos
uma lei, que nos é imposta de fora isso é servidão. Agora, a obediência à lei que nós mesmos
construímos é liberdade. Aqui está mais uma contribuição ao Estado. Atribui a um legislador o
papel de construir as leis. Para Rousseau é preciso pensar uma lei na qual todos os cidadãos
tomem parte. A obediência a essa lei construída por todos é a liberdade. Nasce o Estado pela
necessidade de homens se unirem, para os homens fortalecerem a liberdade anterior, perdida. O
que Rousseau está fazendo é buscar resgatar uma condição humana que nós, por descuido,
perdemos. Nós, por natureza, somos frágeis. O contrato social nasce da necessidade de nós
fortalecermos a nossa precariedade e criarmos condições para uma vida feliz. A precariedade
nossa está, em parte, nas paixões. Mas a precariedade e fragilidade da vida humana é que os
homens estão expostos a muitos riscos e sofrimentos que devem ser administrados. Ele não é um
filosofo trágico, mas mostra, e insiste nisso, que não devemos ensinar às crianças que a família
protege, deve ensinar que elas são frágeis, que o mundo é tenebroso. Todos devem saber que
não estamos a salvo dos perigos do mundo. Ele diz isso para poder nos educar a ter consciência
dos nossos limites e fragilidades e buscar na lei e na companhia de outros homens a segurança.
- O Estado vai restaurar a nossa bondade original. A conclusão a qual Rousseau chega a
propósito do Estado e da Lei é diferente de Hobbes e Locke (o Estado e a lei devem ser
entendidos como uma coisa positiva). Na visão de Rousseau a civilização é má, em sentido
genérico. Agora, a lei e o Estado vão ser positivos na medida em que regressa ao estado de
natureza.

- Paradoxo do pensamento de Rousseau, em que o autor nos propõe uma idéia de que o contrato
é inviolável. Ele é considerado um pensador democrático. E porque motivo propõe esse contrato
inviolável? Pelo motivo de que o Estado e a Lei carecem de ser formulados por todos. O próprio
poder que o soberano tem é precário, podendo ser retomado diante de uma deslealdade. Alguns
autores se debatem aqui na questão de pensar onde está realmente a dimensão democrática de
Rousseau? Ele vai dizer que a lei nasce da vontade geral, mas o que é essa vontade geral?
Decorre, segundo Rousseau, não propriamente da vontade de todos, não é a soma das vontades
individuais. Os autores, em geral, não têm como explicar a teoria de Rousseau da vontade geral,
pois fala o que ela não é, mas não fala o que ela é. Parece que Rousseau quer chegar a idéia de
que a vontade geral é aquela que corresponde ao interesse da comunidade, mas pensando em
sua maioria. E aqui está o problema do pensamento dele, uma vez que por um lado Rousseau
fala que o contrato social é inviolável – pois violar a lei pode nos fazer regressar àquele estado
que passou a surgir depois da perda da inocência natural; a lei constitui um pouco moral que se
não fosse o fato de ela ter vindo para acobertar a desgraça de criação da propriedade privada, se
a lei não tivesse chegado para remendar esse erro, a lei seria um corpo moral enobrecedor da
humanidade. Fora isso, a lei é nobre porque vai nos permitir colocar um freio nessa nossa
ambição e vontade de ter aquilo que não é necessário. Por pior que a lei seja, ela compensa as
perdas. E por isso é inviolável.

- Se a lei não pode ser violada, onde está a democracia de Rousseau? Perguntam alguns
pesquisadores contemporâneos. Essa universalidade, que tanto foi sonhada pelos pensadores
modernos já não tem espaço em nosso tempo. O nosso tempo celebra a pluralidade e a
diferença, como diz Derrida.

- Se questiona hoje em dia que democracia é essa que a minoria tem que seguir a maioria? Será
que a vontade da maioria imposta à minoria não é também uma tirania.

- Cabral de Moncada, de certo modo, alude a isso dizendo que Hobbes e Rousseau soa muito
controvertidos, embaraçados por grandes paradoxos. Hobbes travestido de tirano é um grande
liberal, na vontade de proteger o indivíduo da guerra. E Rousseau, travestido de democrata, é um
grande tirano.

13. KANT

- Pensador alemão.

- Podemos dizer que estamos diante de um pensador que vai colar toda essa movimentação da
academia europia entorno de uma estrutura intelectual e política para proteger a burguesia e
salvaguardar seus interesses. Todas essas discussões já suscitadas desde Grocio, até Rousseau,
vão encontrar um autor que vai selar tudo isso e vai encaminhar esse pensamento para o
constitucionalismo moderno.

- Kant confessara sua dívida de gratidão com Rousseau.

- Em Kant, sua doutrina do direito pertence ao universo das críticas kantianas. O pensamento dele
é comumente chamado de criticismo.

- O criticismo é uma filosofia sustentada numa espécie de trilogia de obra dele que levam este
nome: crítica da razão pura, crítica da razão prática, crítica da faculdade de juízo. O pensamento
jurídico dele está atrelado ao criticismo. Sobretudo com a Crítica teórica, sustentada na Crítica da
Razão Pura, é uma síntese do pensamento kantiano sobre o problema da possibilidade de
conhecimento. O conhecimento é possível? O homem pode ter consciência, discernimento para
compreender o mundo em que se situa? A crítica prática está na obra Crítica da Razão Prática e o
problema é a possibilidade e habilidade humana para a ação. Aqui ele quer responder se o
homem pode compreender a natureza de suas ações. As ações humanas são racionais? Ou
agimos por agir?

- A primeira grande conclusão que ele chega: tal como nascemos com habilidade de conhecer,
também nascemos em condição de agir conscientemente. Existe um a priori da ação, tal como
existe um a priori do conhecimento. Pelo simples fato de sermos humanos, temos uma habilidade
para agirmos. Ele fala uma frase relacionada a isso que diz que “existem duas coisas que me
comovem profundamente, o céu estrelado acima de mim e a lei moral dentro de mim”. Não há
escusa para ninguém – a lei moral está dentro de nós. É uma condição humana, categórica. Ele
fala que cada um de nós está habilidade para agir conforme o dever. De nada mais precisamos
para vivermos corretamente do que o fato de sermos racionais. Nascer racional significa nascer
em condição de agir conforme o dever. O supremo mandamento moral é: age de modo tal que
sua conduta se torne compatível com a conduta de todos os humanos, de todas as criaturas
racionais.

- Mas por qual razão devemos agir, devemos perseguir a lei moral? Para Kant, a lei moral (em
sentido amplo, incluindo o direito – para contrapor à lei natural) decorre de dois postulados
básicos – a liberdade e a imortalidade de Deus (deus cristão).

- Esse primeiro postulado da liberdade é o da autonomia humana – nós, enquanto humanos, não
repetimos cegamente os gestos e as ações que a natureza como um todo repete, pois temos
habilidade para realizar escolhas. Uma pedra, abandonada no ar, regressa necessariamente para
a terra, não tem escolha. Um humano, abandonado no ar, não necessariamente cai ao chão, pois
escolheu entre sujeitar-se à lei da gravidade ou a contorná-la. Isso constitui a liberdade humana, a
autonomia, a razão prática decorre dessa possibilidade de inventar e reinventar o mundo.

- O segundo postulado, a imortalidade de Deus. Kant afasta a religião da vida humana e parece
curioso ele falar da imortalidade de Deus. A imortalidade de Deus surge como postulado, porque
embora ele não vincule seu pensamento com Deus, ele vai dizer que nossa felicidade no mundo
não tem nenhuma garantia que efetivamente se realizará. Por isso que a imortalidade de Deus vai
nos confortar. A ideia de Deus em Kant está atrelada ao que ele chama de ideias reguladoras –
que são ideias que não temos certeza, não temo possibilidade de comprovar, mas convém que
nós acreditemos em sua possibilidade. Assim é com a existência de Deus, pois acreditar que ele
existe conforta.

AULA 17 – 09/05 (faltei)

13. KANT (CONT.) – Aula de Marcelo

Movimenta academia européia para proteger seus interesses. Kant diz ser grato a Rousseau. Seu
pensamento é o criticismo que é uma filosofia sustentada numa trilogia de obras. Critica da razão
pura, da razão prática e da faculdade do juízo. O pensamento dele esta com uma critica teórica
de uma síntese do pensamento kantiano sobre a possibilidade da estrutura do pensamento
humano. É possível conhecer alguma coisa, ter consciência sobre o mundo em que se situa
(critica da razão pura)? Agora a discussão seria fundamentada na possibilidade da ação humana,
temos condição de compreender a natureza de suas ações, elas são pensáveis, são racionais ou
só agimos por agir (critica da razão prática)?
Conclusão: tal como já nascemos com habilidade de conhecer, também nascemos em condição
de agir conscientemente. Existe um a priori da ação assim como há uma a priori do
conhecimento. “existem duas coisa que me comovem profundamente: O céu estrelado acima de
mim e a lei moral dentro de mim” (Kant). De nada precisamos alem do fato de sermos racionais e
por tanto capazes de agir conforme o dever. Age de modo tal que sua conduta se torne
compatível com a conduta de todos os humanos. Mas porque nos devemos agir? Porque
perseguir a lei moral (em contraponto à lei natural)? A lei moral existe em função de dois
postulados básicos: a autonomia da escolha e da imortalidade de Deus.

 Autonomia humana – Nós enquanto humanos não repetimos os gestos da natureza,


pois somos habilitados a realizar escolhas. Uma pedra abandonada regressa necessariamente
para terra um humano não necessariamente, pois o humano escolheu entre sujeitasse à lei da
gravidade e criar suas próprias asas.
 Imortalidade de Deus – Ele afasta a ciência da divindade, mas defende a imortalidade
de Deus. Surge como um postulado da razão prática e defende que nossa felicidade no mundo
não há nada que nos garanta que ela se realizará e por isso a imortalidade de Deus nos garante
que um dia poderemos encontrar a felicidade.
Surge a ideia reguladora. São coisas que nunca poderemos comprová-la, mas convém que nos
acreditemos nela e isso nos conforta. Kant consagra o iluminismo alemão e a doutrina da crítica
prática. Para ele esse a priori do direito não se extrai da natureza e sim da razão. Assim, o
conceito de direito não se extrai empiricamente. Thomasius dizia que a norma moral é uma força
interior e a jurídica exterior. O direito tem sansão externa já a moral tem sansão interna (dar
esmolas). Assim Thomasius distinguia o direito da moral, já Kant dizia que a diferença estava na
finalidade da norma. Para ele a lei jurídica decorre de uma motivação diante de um interesse. Por
que não furtar? Para não ser preso. Se não quer ser preso pague a pensão alimentícia. Já a lei
moral não exige um fim exterior é um dever pelo dever. Eu cumpro a lei moral, pois sei que ela
deve ser cumprida, ou seja, mesmo que eu tivesse o anel de Gigiz (anel que fica invisível).
Imperativo hipotético (direito) e categórico (moral). Apesar de serem diferentes ambos (direito e
moral) tem o mesmo fim.

O homem é um fim em si mesmo e não o meio. O ser humano não é coisa nem instrumento.
Tudo que é feito deve levar em conta a pessoa humana. É o Estado que vive em razão do homem
e não o homem em função do Estado. Esta concepção de que o conceito de direito não se extrai
empiricamente é completamente abstrato, idealista e afastado. O direito seria o conjunto das
condições para que a liberdade de cada um se concilie com a do outro segundo uma lei universal
de liberdade. Assim, o autor pensa a matriz do direito a partir de nossa condição racional de
pessoa, nada tendo a ver com democracia, bem comum e etc. Kant era um autor que consuma
esse projeto liberal de John Lock.

Outro problema para Kant é a coercibilidade (possibilidade que existe de alguém ser
constrangido contra sua própria vontade). Se a liberdade é norma essencial do direito como impor
o cumprimento de uma lei. Não estamos falando de coação (uso efetivo da força). O direito não
quer tornar as pessoas boas. A função do direito é tornar possível a vida. O direito não é para
santos e sim para humanos.

O que é a liberdade para Kant (ideia central dele)? Se há direito natural é o direito à liberdade
(fato diferente de arbítrio). Ser livre não é fazer o que se quer, mas sim o que a razão determina.
Liberdade não tem para Kant um sentido negativo. Liberdade seria uma capacidade de fazer
alguma coisa. É a capacidade de dirigir a nossa própria vida. É a capacidade de não fazer aquilo
que a força natural me obriga. O homem não reage aos estímulos. O homem não é reativo, tem
liberdade de escolha e por isso é livre. A liberdade é criativa porque podemos tomar decisões
sobre nossos atos.
O Estado é uma necessidade mais que empírica e sim natural. O Estado é um
aperfeiçoamento da vida pela possibilidade de coação. Para Kant o contrato era um imperativo da
razão. Quais seriam as divisões do Estado para Kant? Não seria o controle do equilíbrio, do poder
como em Rousseau, mas garantir e coordenar a unidade do Estado. A função do Estado seria a
de garantir o direito. A felicidade é tarefa de cada um e não do Estado.

O direito de resistência como fica? O direito de resistência é incompatível com a finalidade do


Estado. O Estado é uma construção racional e só é Estado se torna possível à racionalidade.
Kant elogiava a revolução francesa e americana.

AULA 18 – 14/05

Continuação de Kant

- Pensamento iluminista, racionalista, pensamento formal do direito.

- Fala do autor que a inteira realização do direito só se alcançara com uma cidade cosmopolita.
Kant sonhou com um sistema racional do direito que desse conta de abrigar uma visão universal,
ou racional, do direito. é esse mesmo autor que vai nos mostrar que esse direito somente se
tornara possível no dia que atingirmos um direito numa dimensão também racional e cosmopolita.
Kant fala dessa necessidade e por um lado chama a atenção que se por um lado o direito
nacional os Estados já saíram do estado de natureza em que viviam e estabeleceu-se uma esfera
civil, na esfera internacional ainda ocorre um estado de natureza. Kant se refere às guerras e ele
fala do que adianta sair do estado de natureza na esfera de uma cidade e não atingir isso
internacionalmente? Ele propõe outra visão do direito para atender à demanda internacional.

Segundo Kant, na esfera internacional ainda estamos no estado de natureza. Ele está se
referindo às guerras. Logo, ele diz que não adianta nós termos saído do estado de natureza
interno, se internacionalmente ainda continua. No texto Paz Perpétua, Kant aborda de uma forma
que parece que ele está se referindo a um quadro que existe na recepção de uma pensão, com a
seguinte descrição “aqui reside a paz perpétua das nossas vidas”. Após isso, Kant expõe a
reflexão sobre uma possível fraternidade entre os povos. Ele diz que não apenas é possível,
como o mundo conspira a favor dessa paz perpétua. O mundo oferece uma possibilidade em
realizar a paz entre os povos porque nenhum país produz tudo que precisa para viver bem. Então,
Kant diz que essa necessidade é uma conspiração da natureza para que haja esse entendimento
entre os países. Ele vê o direito comercial como uma chave para a paz entre os povos. Se é
necessário por um lado, se é possível por outro, como chegar a essa paz perpétua? A questão por
ele colocada é que não é adequado falar de um governo único, falar de um direito cosmopolita
não significa falar em um monarca universal. Ele propõe um sistema republicano reunido em
federação de países. Uma federação de estados com um objetivo comum, que não seja uma
federação governada por uma única autoridade. Esse sistema é sustentado na ideia de que a lei
deve ser soberana, mas não é o governante soberano. Todo governo deve ser exercido com base
na lei. Então, por um lado há uma lei que é soberana e por outro um governante que governa
segundo uma lei estabelecida publicamente (a lei não pode ser produto de um arbítrio). Essa
federação é organizada sob a liberdade de associação e de desligamento. Nenhum país está
obrigado a entrar na federação, do mesmo modo que não pode ser constrangido a permanecer na
federação. Por exemplo, esse princípio da autodeterminação dos povos que entra em vigor na
estrutura da ONU não constrange nenhum país a entrar, nem permanecer. Para Kant, para
realizar a verdadeira paz o governo há de ser cosmopolita. Esse governo haverá de estar
sustentado em três princípios desse projeto de paz perpétua: sistema deverá ser republicano, o
sistema deverá ser de federação e o sistema deve estar assentado no direito de visita. Falar de
uma paz perpétua e de uma união do Estado não significa necessariamente em falar de uma
cidadania universal. O que está em questão é a criação de um sistema que garanta a cada um de
nós o direito de visita. Ou seja, para garantir o direito de visita e não necessariamente espantar o
povo com a ideia de uma cidadania universal, o formato geográfico da terra que permite que todos
cheguem ao mesmo lugar, conspira a favor. Assim, a terra é comum a todos, pois ninguém pode
se apropriar de determinado pedaço da terra. Logo, ninguém pode ser privado de visitar aquilo
que lhe pertence. O direito de visita seria um direito de cada um se movimentar sobre a terra, de
visitar qualquer país sem ser constrangido de modo algum. Derrida vai dizer que o mundo só vai
encontrar a paz absoluta se o mundo adotar a hospitalidade universal, porque um dos motivos da
guerra é a intolerância ao outro diferente.

14. Hegel

Vai encerrar o período chamado de Idealismo Alemão. Esse autor é extremamente importante
porque ele vai criar as bases que o positivismo jurídico precisava para se efetivar enquanto
projeto filosófico do direito. O sistema filosófico hegeliano mostra um novo método e a
estruturação de um novo sistema filosófico, que é o desejo de fundir a realidade na idealidade. Há
uma frase de Hegel que diz que “tudo que é racional é real; tudo que é real é racional”. Desde
Platão a uma espécie de maniqueísmo entre os filósofos nesse confronte de realidade e
idealidade. Platão vai mostrar que há uma diferença grande entre o mundo sensível e o mundo
inteligível. Essa tradição da separação entre idealidade e realidade persegue os filósofos até
Kant. Kant tentou encontrar uma solução, mas no fundo a teoria kantiana dá prosseguimento a
essa distinção e é isso que Hegel vai tentar desconstruir, fundindo as duas coisas em uma só.
Para Hegel tudo é real é racional. Cabral de Moncada vai dizer que Hegel vai fazer um
hipostasiamento da história (converter em substância aquilo que é acidental) e uma
historiarização da ideia. Na verdade, é uma superação daquela razão abstrata do século XVIII,
que cede lugar para uma história concreta, uma análise sistemática dos acontecimentos
históricos. De modo a mostrar que o ideal conforma-se à realidade. O ideal só é ele mesmo
quando conformado com a realidade que, por sua vez, é manifestação de uma idealidade. Hegel
nos oferece também a descoberta do método dialético hegeliano. Falar desse método não
significa apenas falar de um procedimento mental, mas sim a descrição do espírito humano e das
coisas na direção do que elas são. O método hegeliano vai refletir sobre o que é a opinião
pública, por exemplo. O que levou cada realidade a ser como ela se tornou. O método é
exatamente esse movimento de perceber o que as coisas se tornaram. O movimento da
consciência humana respira a racionalidade da ideia, o que quer dizer que nada se concluiu, tudo
é provisório e tendente a ser transformado. Cabral de Moncada vai perguntar se são justas as
acusações feitas a Hegel de que ele é o grande responsável pela criação dos sistemas
totalitários.

O sistema filosófico hegeliano costuma ser dividido em três partes: a) Lógica: é a explicação do
método dialético; b) Filosofia da natureza: é a explicação de como se dá a evolução ideal do
mundo, como é que surge o espírito absoluto; c) Filosofia do espírito: é a parte da filosofia que
explica o que é o espírito absoluto, como se dá o progresso do espírito subjetivo (razão individual)
para o espírito objetivo (razão objetiva) que estão nas instituições históricas (família, sociedade), e
do espírito objetivo para o espírito absoluto (síntese ou a comunhão dos anteriores). Segundo
Hegel, nós passamos de uma fase individual (da razão individual) na direção de um progresso,
onde nós atingimos as instituições (primeiramente a família, depois a sociedade e por fim o
Estado de direito). Depois atingimos o espírito absoluto, que é uma sintetização do espírito
(momentos da arte, da filosofia e da religião porque são momentos de contemplação).

O sistema filosófico jurídico aponta o estado e o direito como a máxima realização da moralidade
humana. O direito e o estado em Hegel estão situados na fase do espírito objetivo, só que com a
proposta mais arrojada em Hegel do que em Kant. Em Kant, Rousseau, Hobbes o direito é um
regulativo. Em Hegel, ele é um constitutivo. O espírito tem origem na vontade livre e a liberdade é
a substância do direito. O direito é como se fosse a consumação da realidade. A liberdade dá e se
realiza em etapas. Em uma primeira fase, a vontade dá a si mesma abstratamente,
individualmente, um reconhecimento de si mesma, surgindo o conceito de pessoa. A segunda
fase, a vontade dá a si mesma a moralidade, tomando pra si mesma os deveres para comigo e
com outras pessoas, fazendo juízo de si mesmo. A terceira fase, em que as vontades anteriores
se fundem, formando a eticidade pura. Aqui é o salto que se dá para formar uma sociedade e
aceita essa sociedade como sendo parte de nós. De modo que a instância derradeira da
moralidade dá origem à família, a sociedade civil e ao Estado. A família, em verdade, é esse
primeiro ensaio de agregação externa, mas que está fadada ao desaparecimento porque ela é
insuficiente a todo esse processo de unificação (não consegue realizar a eticidade pura por
inteiro). A sociedade civil é o rearranjo desses vínculos perdidos da família, é a recolocação das
pessoas cuja desagregação da família deixou perdida. O Estado é síntese da família com a
sociedade civil, é máxima realização moral, o lugar de chegada de toda essa marcha. Essa
maximização da moralidade faz gerar o dever sagrado de nós nos entregarmos ao Estado (o
direito do Estado sobre nós). Aqui se encontra o grande lugar do direito. O direito tem uma
dignidade tamanha que vai se constituir quase em absoluto. No direito positivo é possível realizar
a felicidade, porque é na ordem positiva de direito que a história cumpre o seu projeto de fundir a
realidade na idealidade. A vontade geral aqui já não é mais aquele regulativo, aquela moralidade
abstrata, mas sim o momento racional que hipostasia o espírito do mundo. É a vontade geral que
fixa (hipostasia) o espírito do mundo. O contrato social é uma espécie do momento racional, quer
dizer que é o momento que a racionalidade se consuma. O mundo está evoluindo na direção da
sua objetivação. Atingir a etapa do estágio direito é atingir essa etapa de evolução do mundo.
Cabral de Moncada vai dizer que Hegel não é tirano, pois somente uma interpretação isolada da
obra de Hegel pode levar a essa conclusão. Na verdade, Hegel vai mostrar que nenhum
movimento do espírito nos leva a resultados definitivos. Tudo está condenado a se aperfeiçoar,
cada síntese dá lugar a uma nova tese. Hegel vai dizer que a máxima do direito é ser pessoa e
respeitar o outro como pessoa. O Estado não pode ser alguém sem limites a ponto de destruir as
nossas liberdade e individualidade. É o limite da racionalidade, que o Estado tem que se
autorrever. No Estado se objetiva aquilo que era individual.

AULA 19 – 16/05 (FALTEI)

15. OS POLEMISTAS DA CODIFICAÇÃO

- Como se deu na historia do ocidente esse fenômeno da codificação? Há um autor Antonio


Castanheira Neves, que diz que tem uma grande diferença entre o sistema pré-moderno e o
moderno de legislação, porque no sistema moderno o Estado e a lei criam o direito (constitui o
direito), no sistema pré-moderno a lei não cria o direito, declara o direito. Acontece de novo com a
modernidade a idéia de que não há outro direito que não seja esse direito reconhecido pelo povo.
No passado, isso era exceção. Na modernidade passou a ser a regra.

- Existem dois fatores básicos associados ao movimento de codificação. O primeiro é esse ideal
racionalista, do qual falamos em Hegel – esse autor encerra o período de idealismo alemão. A
Europa viveu, dois a três séculos, movida pelo movimento de ilustração, que foi, em síntese, de
aposta na capacidade humana de conhecimento. O segundo foi o positivismo jurídico – cientificar
o direito, dando segurança jurídica diante da incerteza da natureza. O positivismo é um
movimento metodológico, cientificista, que aposta na capacidade humana de vencer a
arbitrariedade da natureza.

- Dois filósofos, Bacon e Descartes, são autores importantes que vão fazer grande diferença entre
o homem e a natureza. Bacon vai dizer que o homem é diferente da natureza pela capacidade da
razão, e Descartes vai dizer, também nessa linha, que a essência do homem é o pensar. Bacon
vai dizer que o homem é a sua razão, e por isso ele tem dignidade, em contraponto à natureza
que é coisa. Pelo fato de a natureza ser coisa, o homem tem o direito e obrigação de torturar a
natureza até revelar todos os seus segredos. Ele quer criar uma concepção de ciência em que o
homem eleve ao máximo a capacidade de exploração, para dar ao homem segurança na vida.
Castanheira Neves diz que o positivismo tem como herança uma afirmação de Galileu Galilei de
que todo mundo pode ser escrito na linguagem da matemática – Galileu está dizendo que não há
nenhum segredo nesse mundo que não possa ser desvendado pelo homem, pois a linguagem
matemática é clara, não há dúvida, não há espaço para subjetividades. Esse sonho de clareza e
objetividade não apenas se contentou em estar presente nas ciências da natureza, mas foi
transferido para o mundo das ciências sociais e humanas, objetivando atingir a mesma certeza e
precisão. Esse movimento levou à codificação do direito.

- Há outro fator histórico, além dos dois filosóficos citados, citado por Montesquieu, chamado de
absolutismo monárquico. Esse dado é relevante no surgimento e institucionalização e afirmação
do positivismo, porque esse absolutismo monárquico representa um momento na Europa em que
o poder está totalmente concentrado nas mãos do rei. Montesquieu vive sobre a influencia desse
fator e contribui, em um livro chamado O Espírito das Leis, de que há uma tendência humana de
abusar do poder toda vez que o homem chega ao poder. Diante desta constatação, ele vai ser
despertado para um problema: se essa e uma tendência do ser humano, o que devemos fazer? O
mundo não tem salvação? Existem duas salvações: uma é aguardar o rei iluminado que Platão
prometia, o rei filósofo, justo, mas Montesquieu acha difícil essa possibilidade; outra possibilidade
é, ao invés de esperar pelo salvador, se libertar dessa condição do próprio governante.
Montesquieu vai oferecer a idéia nova de que os homens não devem depender de um governante
iluminado e propõe uma garantia para que o poder não fique concentrado numa pessoa. Ele quer
criar um mecanismo que seja ele mesmo a prestar um grande serviço ao Estado, que é o de
dividir as funções do poder, para que o poder não fique concentrado nas mãos de um governante.
Através de uma divisão equânime, poderia ser feito um controle. Ao juiz foi destinado o mísero
papel de ser a boca da lei, para manter a segurança e evitar a arbitrariedade dos juízes.

- Houve também um italiano, na formação do positivismo, que foi o Beccaria. É um autor que vai
realizar um trabalho significativo, pois se trata de um jovem, estudante de direito, que recebeu a
missão de seus colegas de preparar um esboço para discussão em um grupo de estudos – e
numa dessas discussões Beccaria apresentou Do delito e das penas e foi rapidamente traduzido
para várias línguas. De importante para o movimento da codificação, Beccaria trouxe de
Montesquieu a idéia de que o juiz não pode ser mais do que uma boca da lei. Beccaria elege o
legislador como sendo a única fonte do direito, a única fonte aceitável. Ele dirá que a sociedade
não estará segura enquanto os juízes forem capazes de decidir criativamente. A única forma de
garantir a segurança da sociedade é impedir que o juiz decida de outro modo que não seja na
realização de um silogismo perfeito – silogismo é um esquema de raciocínio preparado por
Aristóteles de modo a verificar a premissa maior (axioma universal), seguindo para a premissa
menor e, então, chegar à conclusão perfeita. Beccaria parte da lei como a premissa maior, o fato
a premissa menor e a conclusão é a sentença do juiz.

- Outro fator histórico, que já é em si mesmo a consagração desse novo projeto de direito, é o
código civil de Napoleão de 1804. Esse código coroou esses ideais iluministas, dessa proposta de
dominação do direito pelo legislador. O legislador passa a ser a única fonte do direito. Napoleão
nomeou uma comissão de notáveis para escrever o seu código. Surge aqui uma ideologia da
codificação, que vai encontrar nos autores franceses uma obsessão nunca vista até então na
história da filosofia – escola da exegese. Movimento metodológico que se forma em torno desse
código de Napoleão. O exemplo mais significativo é Bugnet, no qual um aluno em sala de aula
pergunta para ele o significado do direito civil e Bugnet responde que não sabe, que apenas
ensina o código de Napoleão. Isso demonstra a reverência ao código, de como estava implantada
no sentimento europeu a idéia de que não existe outro direito que não o codificado. O código de
Napoleão passa a ser motivo de discussão por toda a Europa. Na Inglaterra, Austin, um autor em
pleno direito costumeiro, colocou em dúvida a validade dos costumes, pois só eram válidos ao
serem confirmados pelos tribunais. Iniciou o movimento de impor o direito por um legislador
inteligente para instituir a lei – sistema que fará perfeita distinção entre ciência jurídica e ciência
da legislação. Para ele, a ciência jurídica descreve, que analisa as leis positivas; e a ciência da
legislação analisa o conteúdo ético dessa legislação. Por um lado, a cobrança de uma legislação
clara, por outro uma sistematização de uma doutrina que separasse a lei de seus conteúdos
éticos – Jurisprudência analítica. Austin defende a criação de legislação em contraposição à
jurisprudência embasada em costumes.

- O debate mesmo sobre a exportação do código de Napoleão se dá fortemente na Alemanha.


Thibaut escreveu um livro sobre a necessidade de um código civil para a Alemanha e nesse livro
ele se inspira no exemplo da França. Thibaut, vendo a Alemanha dividida por vários povos, aposta
na unificação da Alemanha e a criação de um código para impor a ordem. Um ano depois, em
resposta à proposta de Thibaut, surgiu uma contra-resposta de Savigny sobre a vocação do
tempo para a legislação e jurisprudência. O discurso de Savigny, se não evitou o código, retardou
por quase 100 anos a implantação do mesmo. Importa conhecer as principais idéias de Savigny.
Ele se apropria de algumas idéias surgidas na França, na escola exegeta. Geny, autor francês,
levantou questionamentos depois do código sobre a legitimidade do legislador para representar o
povo – qual a capacidade de ele tem de representar e qual a capacidade que o legislador tem
para colocar no papel tudo aquilo que acontece na sociedade. Savigny, em parte, se apropria
dessas críticas já feitas ao sistema francês e a reproduz na doutrina historicista do direito. Aqui,
está em causa a autoridade, competência, do legislador para ser a fonte do direito. Savigny não
está de acordo com a idéia de que a lei é a única fonte do direito. Ele dirá que a fonte do direito é
o costume, o espírito do povo. Se o legislador não é fonte do direito, de fato é povo, sua vivencia,
seu dia a dia, que é capaz de eligir uma determinada prática em práticas obrigatórias, objetivadas.
Savigny chamará muita atenção para o fato de que a lei não apenas não cria o direito, mas é
também um obstáculo para o progresso do direito. Colocando o direito na lei, isso impede a
transformação do direito. A experiência jurídica é infinitamente mais rica do que a legislação. Essa
escola historicista vai servir como ponto de questionamento a esse sistema de codificação que
está em moda na Europa do séc. XIX.

AULA 20 – 21/05

16. Restauração do direito natural

É uma tentativa de restaurar o antigo de direito natural, tentando estabelecer novas bases para o
pensamento jurídico. Essas lições do positivismo de que nada é conhecido para além dos
fenômenos e das relações que estabelecem entre si, não trazem nada de novo em termo de
história da filosofia. Se há uma coisa de novo que o positivismo traz é o de reduzir isso tudo à
ideologia das ciências. O positivismo sociológico reduziu a ciência a uma empiria, a um processo
de construção do mundo e das coisas a partir de observações feitas pelo sujeito cognoscente.
Isso pode ser considerado uma verdadeira ideologia, no sentido de construção de um sistema de
ideias.

A filosofia de Augusto Comte foi uma espécie de física social que tinha no seu projeto o desejo de
dominar o mundo. Desejo de dominação esse, que avança inclusive sobre as ciências sociais (a
vida social humana). Essa expectativa que tinha de dominar a natureza, se tem também no
campo das ciências humanas. É o desejo de construir uma tecnologia social. Essa ideia de
causalidade mecânica, o estudo da sociedade segundo regras da mecânica, com esse desprezo
dos conteúdos ideias e espirituais do individuo da sociedade orientou a sociedade. O mais alto
grau da socialização se identifica com uma época essencialmente técnica e industrial. Então, nós
estamos assistindo a uma era em que o sonho da tecnificação do mundo, da explicação do
mundo a partir de dados sociais e tecnológicos está em pleno vapor. Desde Hobbes, que nós
assistimos a uma ruptura com aquele projeto de direito e de Estado sustentados numa
comunidade de virtudes, onde aquele homem virtuoso busca a justiça. O homem a partir de
Hobbes é um homem de interesses. Ele vive e se organiza socialmente é apenas atrás da
realização dos seus interesses. O homem positivista é um homem de interesses. De modo que o
Estado e o direito na visão positivista é o de reduzir o direito às realidades naturais e as leis da
sociologia. As explicações que são dadas ao Estado e ao Direito são explicações de ordem
sociológica. São explicações que tentam romper com todo o idealismo existente nos pensadores
que se punham anteriormente a essa febre positivista. Quer dizer que o pensamento político,
filosófico, jurídico é agora organizado abdicando desse projeto finalístico de realização de valores
supremos para ser apenas projeto de realização de interesses (de organização inteligente da vida
social). Eis aí o motivo pelo qual nós vamos assistir ao movimento chamado de restauração do
direito natural porque, se por um lado esse sociologismo encantava o movimento acadêmico no
sentido de exorcizar as instituições políticas e jurídicas de qualquer realização final, de alguma
intenção transcendental e queira reduzir o direito e o Estado a uma realidade natural e social; por
outro lado, o neokantismo, pretendeu fugir a essa metafísica do naturalismo e desse materialismo,
buscando aqui a instituição de um novo positivismo, que foi também uma tentativa de pensar um
novo positivismo. O positivismo sociológico, Truyol y Serra diz ser um positivismo ingênuo no
sentido de tomar a realidade simplesmente como ela é. Enquanto o neokantismo queria tomar a
realidade criticamente, submetendo a realidade a uma justificativa que se põe para além da
realidade que os fatos mostram. Esse positivismo neokantista vai elaborar no sentido de
compreender o direito como uma organização normativa construída dentro de certa realidade
social vivida por um determinado povo, mas que pudesse ser apreendido abstratamente. Esse
novo positivismo procurará agora um conceito universal de direito, o que se espera agora é um
conceito de direito que não fique refém dos casuísmos da natureza. O sociologismo, enquanto
teoria social e jurídica expõe o direito a uma arbitrariedade dos fatos sociais, assim como as
ciências da natureza expõe os acontecimentos naturais à arbitrariedade da natureza. Diz-se que a
pesquisa científica tem que suportar a arbitrariedade da natureza. A mesma arbitrariedade a qual
nós estamos sujeitos nas ciências naturais, o positivismo sociológico deixa o direito refém dela. E
é isso que o neokantismo quer fugir, buscando um conceito de direito que tenha uma validade
universal, uma validade que não deixe o direito refém desse casuísmo social. O neokantismo quer
submeter o direito a um conceito universal.

Dentro disso tudo, vamos encontrar um movimento que se conheceu pelo nome de restauração
do direito natural. Rudolf Stammler e Gorgio Del Vecchio são dois autores que possuem em
comum o desejo de dar uma explicação para o direito para além desse simples factualismo que o
positivismo sociológico dava. Stammler fugiu dessa arbitrariedade do casuísmo social, indo atrás
bases lógico-formais, para ele somente a construção de um conceito formal de direito podia dar
conta de compreender a realidade jurídica para além desses acontecimentos sociais – a busca
por um conceito formal de justiça era o seu grande projeto. Por um lado, Stammler criticou o
positivismo sociológico e por outro percebeu que o jusnaturalismo clássico já não tinha mais
possibilidade de ser defendido. Pois, o positivismo sociológico trouxe à tona a impossibilidade de
se explicar o direito tal como o jusnaturalismo explicava. Stammler vai dizer que há sim uma coisa
natural entre nós, que é comum entre todos os humanos (que é o fato de nós sermos seres
naturais). Nós temos instintos comuns, como a busca da liberdade, como a preservação da vida,
fazendo de nós todos iguais independentemente do tempo e do lugar. Isso leva o autor a se
animar com a construção de um conceito de direito que pudesse ser aceitável por todos os
humanos. Caminha-se aqui para a procura de um conceito mental de direito, mas mental não
naquele sentido kantiano apenas (abstratamente). Os conteúdos do direito não são imutáveis,
então é um conceito mental de direito com conteúdo variável - histórico. O conceito é mental, mas
o seu conteúdo é histórico. É daí que nasce o nome dessa escola fundada por Stammler –
Jusnaturalismo Variável. Stammler vai dizer que o direito é natural, mas o seu conteúdo pode
modificar. Não se pode negar do ponto de vista da preservação da vida, que o direito a vida seja
universal, por isso todas as épocas se puniu o homicídio. Só que, diferentes épocas e lugares,
estabelecem penas diferentes para o homicídio. O que muda é o conteúdo de punição contra a
vida e é isso que Stammler diz. O direito é um processo mental, seu conteúdo é variável, mas
todo o direito é a tentativa de um direito justo. Isso é o que se encontra como uma marca
registrada de Stammler. A sede de justiça está presente em qualquer ordem de direito.

Nessa mesma direção de uma concepção formal do direito, nós vamos encontrar Del Vecchio,
que também combateu o positivismo sociológico. Combateu duramente esse reducionismo do
direito a uma realidade social. Para Del Vecchio é preciso procurar a autonomia do pensamento
filosófico jurídico na direção de uma dimensão universal do direito, que ele vê em uma ordem de
princípios. É o que ele chama de princípios jurídicos ou a “prioris universais da experiência
jurídica”. Ele quer ler o direito a partir da noção de princípios. São o fundamento ou o ponto de
partida e chegada de qualquer experiência jurídica, ou se qualquer relação dita jurídica na direção
do justo. Uma ordem jurídica é, antes de tudo, uma ordem de justiça. Se Stammler tinha dito que
todo direito é a tentativa de um direito justo, Del Vecchio vai dizer que a justiça é a pedra angular
de todo edifício jurídico, é na justiça que o direito assenta as suas estruturas. A justiça é o lugar
onde o direito começa e termina. Del Vecchio explora tudo isso a partir da noção de princípio,
dando muita importância de que há uma possibilidade de reduzir toda a experiência para uma
universalização dela até chegar a um local de onde não terá mais como seguir adiante. Esse é o
movimento de se conheceu pelo nome de restauração do direito natural, com a vontade de
superar o casuísmo social que o positivismo sociológico tinha submetido.

AULA 21 – 28/05

17. A agonia do normativismo kelseniano e as alternativas de Reale, Cossio e Siches

Quando falamos na tentativa de restauração do direito natural, se faz pelo motivo do positivismo
jurídico na tentativa de construir um direito verdadeiramente científico, tentou renunciar algumas
exigências que os outros filósofos do direito comumentemente faziam. Sob diversas modalidades,
o positivismo jurídico tentou uma compreensão do direito que renunciava às exigências de justiça.
A escola da renovação do direito natural, inconformada com esse abandono da justiça, tentou
com os casuísmos do direito, uma outra abordagem do direito que pudesse fazer frente a essas
exigências de justiça.

Kelsen também estava inconformado com o positivismo sociológico, ele queria uma compreensão
do direito que fosse jurídico. Mas sua solução não foi a solução do jusnaturalismo. Foi, na
verdade, o de pensar uma ciência pura do direito, inclusive, liberta da filosofia. Acontece que essa
pretensão de Kelsen, que foi aquela que mais levou a sério o projeto de construir uma autêntica
ciência do direito, mostra-se em franca decomposição porque já não responde mais por um
grande desafio que lhe foi posto pela história – o problema de como conviver com a realidade da
guerra. Pode-se dizer que a Segunda Guerra assinala decisivamente esse esmorecimento do
normativismo kelseniano. O problema que se coloca agora para os filósofos do direito, é que se o
direito é um conjunto de normas e que se a ciência do direito é uma ciência que toma as normas
jurídicas naquilo que elas prescrevem; se à ciência do direito é reservado o mísero papel de
descrever as normas jurídicas e ao juiz o mísero papel de aplicar as normas jurídicas, que sorte
teremos nós se um dia o mundo todo tiver rendido a tiranos da espécie de Hitler e Mussolini. Por
esse motivo, a Segunda Guerra foi o principal fator de enfraquecimento do normativismo
kelseniano. Logo, percebe-se uma tentativa de superar esse limite que o normativismo tinha
dentro de si. Diversas escolas surgiram para explicar uma alternativa de compreender a
experiência jurídica.
O pressuposto comum que identifica essas três correntes, é o pressuposto da corrente
culturalista. O culturalismo jurídico é uma proposta de direito que quer, por um lado fugir daquele
determinismo da natureza que o sociologismo e o jusnaturalismo nos impõem e, por outro lado,
para deixar de pensar o direito de forma abstrata. Busca compreender o direito a partir de uma
raiz histórica, de uma certa visão do direito com o pé fincado em uma determinada realidade. O
direito já não pode mais ser pensado abstratamente, ou ser pensado de forma eterna. O direito
tem relações decisivas com o meio onde está inserido.

- Cossio (Egologismo)

O egologismo de Cossio propõe uma compreensão do direito a partir de uma dialética da conduta.
Se compararmos isso com uma proposta normativista, que tem uma proposta de cognição do
direito, Cossio identifica o direito em uma dimensão social baseada no culturalismo. O que se fala
em Cossio não é uma simples cognição, mas sim de uma compreensão, onde o sujeito faz
estimativas acerca dos seus objetos. Ou seja, o direito é pensado a partir de uma compreensão
do mundo e não a partir de uma explicação. A ciência do direito não tem por objeto o estudo das
normas jurídicas, mas sim da conduta praticada. Então, situar o direito no universo da
compreensão torna-se diferente na medida em que o direito de Kelsen não nos deixa tomar
posição.

Ele diz que a ciência do direito pode ser dividida em três dimensões: a) dogmática jurídica: é a
dimensão da ciência do direito que relaciona dados normativos contingentes a fatos da
experiência; b) lógica jurídica: parte da ciência jurídica que estrutura o pensamento jurídico dentro
da lógica do dever-ser; c) estimativa jurídica: a parte da ciência jurídica que compreende o sentido
da conduta.

A teoria de Cossio não está voltada para compreensão da norma jurídica, mas sim para a
compreensão da conduta humana. O que importa fundamentalmente não é compreender a norma
na sua abstração ou na sua prescrição, mas sim a conduta do sujeito. Com isso, a lei ou a norma
não é nenhuma prescrição fria, vazia e desvinculada da realidade vivida e dos apreços que os
sujeitos fazem no mundo em que estão atuando. Mas a lei é a cristalização dos valores emanados
da conduta, conduta esta manifestada na contingência (aquilo que é precariamente, não é
definitivo). Para Cossio, valores não são entes ideais como o jusnaturalismo imaginava, mas são
projeções histórico-sociais de um determinado tempo e lugar. A rigor, temos uma proposta que
mostra-se encorajada a desafiar o normativismo jurídico no mundo jurídico como um mundo
estático.

- Reale (Tridimensionalismo)

O fato de ver o direito a partir de uma dimensão cultural é um fator comum entre Reale, Cossio e
Siches. Reale propõe uma compreensão do direito como uma experiência única, onde fato e valor
se implicam em um processo dialético e normativo. Reale recusa as explicações reducionistas
que se encontra no normativismo de Kelsen, no sociologismo jurídico e no jusnaturalismo.

A proposta do autor vai recusar esse estatismo, mas essa recusa passa por algumas elaborações
teóricas: o ser humano é porque vale (está fundada a dignidade da pessoa e a organização
jurídica e política da comunidade) – o ser do homem está no seu valer; a norma jurídica,
diferentemente de Kelsen, otimiza os valores pelo fato; o valor é uma categoria constitutiva (o
valor é algo que se refaz), gnosiológica (passível de ser conhecido) e deontológica (impõe
determinadas condutas obrigatórias).

O fenômeno jurídico se manifesta na propositura de fins racionais. Ele quer dizer que o fato de o
direito ter a ver com a cultura, não significa dizer que qualquer prática cultural é juridicamente
reconhecida. O fato jurídico, por sua vez, não é um fato empírico apenas. Mas que sobrevive a
uma estimativa jurídica sedimentada na vida comunitária.

- Siches (Raciovitalismo)

Pode-se dizer que o raciovitalismo compreendeu o direito dentro da filosofia da razão vital. Ou
seja, nós temos uma dimensão biológica e psicológica e agimos por influência dos fatores físico-
naturais, mas vamos para além deles por causa da nossa consciência. As nossas condutas são
influenciadas, mas não agimos como se fossemos animais. Trata-se de uma filosofia situada no
contexto do existencialismo filosófico de Ortega y Gasset. Esse autor diz que nós somos seres
com necessidades materiais e espirituais. É uma filosofia existencialista porque pensa o ser
humano como alguém que está dentro do mundo. Então, a filosofia de Siches vai nos possibilitar
que a vida humana está por fazer, não há nada pronto e acabado à nossa disposição. O direito é
um objeto da cultura, nós fazemos um mundo. A cultura é esse nosso atuar no mundo.
Consequentemente, a ciência jurídica estuda a norma na sua historicidade, na visão do justo. Não
estuda a norma jurídica cegamente como Kelsen. O pensamento dos juristas há que ser um
pensamento que dê conta dessa realidade própria do direito. A lógica do razoável não explica as
normas jurídicas, mas ela tenta compreender muito mais que explicar; compreende os problemas
humanos e não explicar as normas. A norma jurídica é uma parte da vida humana objetivada e
não pode ser entendida fora da vida, muito menos ser um fim em si mesma. A norma jurídica tem
a ver com a busca do ser humano de sobreviver, só que não é simplesmente essa vida na sua
instintividade, mas sim na sua racionalidade (objetividade). Nós não agimos simplesmente como
agiriam os outros seres da natureza, a nossa capacidade da razão nos obriga a pensar nas
melhores soluções.

AULA 22 – 30/05

Cap. III: A filosofia jurídica no nosso tempo.

1. As tendências filosóficas da contemporaneidade.


A) Tópica Jurídica (Theodor Viehwing)
B) Nova Retórica/Teoria da Argumentação (Perelman /Alexy)
C) Semiótica Jurídica (...)
D) Principiologismo Jurídico (Dworkin)
E) Neoconstitucionalismo (Santiago Ariza)
F) Procedimentalismo Jurídico Discursivo (Habermas/Rawls)
G) Neocontratualismo (Rawls)
H) “Law and Economis” (Coase, Calabresi, Posner)
I) “Critical Legal Studies” (Unger, Kennedy, Boyle)
- “Feminist legal theory” (Whest, Cornell)
- “Critical race theory” (Bell, Delgado)
J) Alternativismos Jurídicos (…)
K) Jurisprudencialismo (A. Castanheira Neves)
L) “Law and Literature” (Boyd White, Nussbaum)

A própria situação presente gera certa dificuldade para essa sistematização por causa de muitos
motivos. A dificuldade de situar as escolas na contemporaneidade decorre da dificuldade de
entender o presente. Um grande fator que contribui para a dificuldade de sistematização é o
pluralismo de escolas. O homem de hoje é comprometido com a busca da satisfação da sua
felicidade e busca ser reconhecido socialmente. Por isso que a psicologia assumiu o lugar do
direito, pois o homem de hoje é desejoso de ser conhecido. Algumas dessas escolas nascem da
tentativa de recuperar um pouco aquilo que a filosofia clássica já reconhecia e pensava. Dois
casos desses são a tópica jurídica e a nova retórica. A reabilitação da filosofia prática seria esse
regresso à Aristóteles para tentar reaprender o que os juristas precisavam aprender.
A tópica jurídica propõe um pensamento jurídico que é pensar por problemas. É uma teoria que
propõe uma reflexão sobre o direito não a partir de uma norma abstrata, mas nos propõe uma
reflexão jurídica a partir dos problemas. Então, o ponto original de partida tem essa procura pelos
chamados lugares comuns da reflexão jurídica. Tópica vem de lugar. Quais as soluções e
expectativas que os juristas ou que uma certa comunidade pensa a cerca desses problemas. O
convite aqui é para pensar o problema em si, tentando encontrar os lugares normalmente
frequentados pelos pensadores, numa dialética pensador para pensador. A importância dessa
proposta é nos livrar dos compromissos com uma solução previamente estabelecida. A solução
tem que se sujeitar a uma dialética. Essa teoria é uma herança aristotélica.

A nova retórica e a teoria da argumentação também são uma herança aristotélica. Aristóteles
mostra a necessidade de construirmos sistemas de argumentação para convencer o nosso
auditório de que a sua tese é verdadeira. Esses autores ensinam como é que a partir de
estratégias de sistemas nós podemos encontrar uma solução original para determinado problema,
ainda que ele não tenha uma resposta formulada anteriormente. Na verdade, não há nenhuma
decisão acertada previamente. Aqui a solução só é construída no caso concreto, mas com um
objetivo já delineado.

A semiótica jurídica busca construir uma filosofia a partir da linguagem. Essa teoria tenta
despertar a atenção para as práticas de linguagem utilizadas. É uma corrente dentro da filosofia
do direito, que tenta pensar o direito a partir de uma crítica linguística e por uma análise dos
símbolos linguísticos. A semiótica jurídica tenta fugir ao rigor e frieza da lei para pensar os
sentidos que os símbolos jurídicos manifestam. Na verdade, a proposta dessa escola é de fato
para pensar os símbolos linguísticos utilizados pelo direito.

O principiologismo é uma corrente inegavelmente crítica depois dessa crise do normativismo


kelseniano. É uma corrente que tenta se libertar do positivismo estrito, do legalismo, do
normativismo ou dessas soluções fáceis que são vendidas por autores dogmáticos e mostrar que
nem sempre as coisas estão facilmente acessíveis. Para cada caso existe apenas uma solução,
mas essa solução nem sempre é fácil. Diante de um caso difícil, somente um juiz Hércules estará
em condição de responder a essa demanda. Um juiz na contemporaneidade há de ter uma
capacidade intelectual bastante reconhecida a ponto de mergulhar na cultura jurídica, indo às
origens do direito para achar a solução autêntica. Regressar aos princípios significa perseguir
aquilo que o direito verdadeiramente é, ainda que ele não tivesse sido antes percebido. O
princípio é o lugar que tudo tem que chegar é o lugar de onde tudo partiu. Esse principiologismo é
um movimento que nos convida para pensar o direito para além dos textos legais e supostamente
inquestionáveis.

O neoconstitucionalismo é uma escola que nasce, embora iludida, com essa intenção de criticar
o dogmatismo jurídico que se enfraqueceu nas últimas décadas. A proposta é dar à constituição
uma importância maior do que a vem sido dada. O que esse movimento que é dar uma eficácia
mais direta à constituição. Eles acreditam que a ideia da constituição é mais estável no sistema
jurídico. Se contrapormos o estado de direito e o estado absoluto, nós encontraríamos certa
estabilidade para determinadas garantias, como a dignidade. Então, a invocação do texto
constitucional seria uma tentativa de chamar a responsabilidade dos juristas para essas garantias
e direitos que já estão consolidados.

Contudo, nada nos assegura que isso sempre será verdadeiro, por isso que há certa ilusão nessa
proposta. O texto legal é ou não a referencia adequada para solucionar os problemas?

O procedimentalismo jurídico discursivo é outra proposta que tem como ponto de partida uma
reflexão filosófica sustentada nas apostas de uma teoria do discurso ou de uma teoria da ação
comunicativa. É a aposta de se construir uma comunidade sustentada em regras consistentes de
discursos. Essa sociedade se organizaria e se estruturaria basicamente em duas garantias: a
primeira de que as pessoas que dialogam falarão sempre a verdade, trazem para a discussão
pública e as expõe com lealdade; e a segunda, que é a de que todos os participantes dessa
comunidade de fala assumem o compromisso de ao final aceitar o melhor argumento. Então, é
uma sociedade em que as pessoas aceitam conversar, trazer as suas propostas e as defender,
mas sem trapacear. E com o compromisso declarado de todos seguirem o melhor argumento no
final. Os juristas têm aproveitado dessa teoria a defesa do sistema republicano e da democracia,
onde o exercício da palavra permite a execução da vida pública. É considerado um sistema
procedimental porque é uma teoria que não está preocupada com a efetivação de nenhum direito
material especificamente traçado. É uma teoria que está preocupada em discutir os
procedimentos jurídicos que devem ser adotados por uma sociedade. O principal é garantir que
todos os cidadãos possam participar da construção desses direitos.

O neocontratualismo propõe uma restauração do Contrato Social para poder se adequar ao


sistema atual do liberalismo. Ele acredita que o liberalismo foi a melhor proposta política
elaborada no Ocidente e que, portanto, o liberalismo precisa ser recomposto. Ele acredita,
entretanto, que esse liberalismo não pode mais ser assentado com os moldes que foi elaborado,
devendo ser restaurado para os moldes da modernidade. Então, ele propõe uma restauração do
Contrato Social para cumprir o projeto do liberalismo.

O movimento direito e economia (“law and economics”) é bastante influente, principalmente nos
EUA. São autores que têm chamado a discussão da racionalidade jurídica em um campo
completamente diferente. São autores que chamam a nossa atenção para o fato de que muitas
propostas sobre o direito são insustentáveis porque não captam uma peculiaridade da sociedade
humana, que é a experiência da maximização da riqueza. A riqueza é tudo aquilo que
acumulamos no sentido de patrimônios de diferentes naturezas. Em geral, essa análise
econômica do direito tem por objetivo mostrar dentro do campo do direito como é que os juristas
devem orientar suas decisões pensando sempre na maximização da riqueza da sociedade.

O “criticam legal studies” se sustenta em reflexões gerais de mostrar os compromissos


ideológicos que o sistema jurídico e o ensino do direito reproduzem. São autores que se
empenham em denunciar que por traz dos formalismos das estruturas jurídicas, se ocultam
ideologias terríveis e insustentáveis do ponto de vista da análise jurídica. Aqui a queixa é que os
profissionais do direito têm um compromisso político que não pode ser desvencilhado, que é o
compromisso da transformação da sociedade. Dentro da escola encontramos algumas
ramificações, como é o caso das feministas que tentam desmascarar o direito a partir do
machismo que predomina o próprio sistema jurídico, para reclamar um sistema jurídico baseado
na experiência feminina sensibilizada, para reclamar por uma autentica participação da mulher na
sociedade. Há também a crítica ao racismo, em uma outra segmentação dessa escola, mostrando
a ideologia que está por traz das discussões em torno da participação dos negros dentro da
sociedade. Tentam mostrar como essa discussão dos negros visa na verdade ocultar o verdadeiro
problema de tentar justificar uma sociedade construída com base na cor da pele.

Os alternativismos jurídicos têm em comum a denúncia das ideologias políticas que estão
adormecidas dentro do sistema jurídico. Diz que os sistemas legalista e formalista do direito
servem àqueles que estão no poder. O legalismo é, na verdade, um sistema que ignora as
diferenças, as necessidades e os reclames da sociedade. É uma proposta que ao denunciar
essas ideologias políticas e os interesses escusos, faz um apelo aos juristas para que eles
assumam um papel político que eles têm na sociedade. O direito não é um sistema a parte,
totalmente alheio àquilo que se dá no poder. O direito tem um compromisso ideológico na
sociedade e os juristas devem dizer que lado estão. O direito alternativo brasileiro tem origem em
outra proposta chamada de alternativistas.
O jurisprudencialismo traz uma proposta que por um lado se forma a partir de uma crítica ao
normativismo de Kelsen, ao projeto iluminista moderno do Direito e, por outro lado, é também uma
crítica pesada a essas teorias alternativistas, ao neocontratualismo e a uma série de outras
propostas. Isso tudo em troca com o reencontro da autonomia do direito que foi descoberta com a
jurisprudência romana. É uma proposta de direito que se alimenta basicamente dessa expectativa
de encontrar a autonomia do direito no sentido de atribuir ao direito a responsabilidade de
proteger a pessoa humana de qualquer arbitrariedade do estado e de qualquer outra pessoa. O
direito seria a última salvaguarda que a sociedade poderia obter.

O “law and literature” (movimento direito e literatura) é um movimento muito expressivo nos
EUA. É uma proposta que também nasce no final do século XX. O ponto em comum desses
autores é o convite a pensar o direito a partir da obra literária. É pensar o que os juristas têm a
aprender com os poetas e o que o direito tem em comum com a literatura. Seja do ponto de vista
da procura pelo o humanismo perdido, pelos textos jurídicos e pena doutrina jurídica tradicional.
Ou pela dimensão pedagógica, servindo-se das obras literárias, tentando encontrar nelas algum
estímulo para pensar o direito. Pensando a solução jurídica com a leitura de um texto literário.
Seria o pensar do juiz como se estivesse pensando em um texto literário, decidindo um caso
jurídico como se fosse um romance.

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