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A RELEVÂNCIA DE CASOS CLÍNICOS NA


PSIQUIATRIA DA INFÂNCIA E ADOLESCÊNCIA:
UMA CONTRIBUIÇÃO...

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Daniela Ceron-Litvoc
Santa Casa Medicine School, São Paulo
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Maio de 2016 - Vol.21 - Nº 5

Psiquiatria na Infância e Adolescência

A RELEVÂNCIA DE CASOS CLÍNICOS NA PSIQUIATRIA DA INFÂNCIA E


ADOLESCÊNCIA: UMA CONTRIBUIÇÃO POSSÍVEL DA FENOMENOLOGIA-
ESTRUTURAL

Daniela Ceron-Litvoc (1)


Cristiane Stravino Messas (2)
Guilherme Peres Messas (3)

Panorama histórico da Psiquiatria da Infância e Adolescência:

A psiquiatria da Infância e Adolescência (PIA) praticamente não existia como


uma disciplina até a metade do século XX. As primeiras cadeiras dessa disciplina
apareceram nos anos 50 nos EUA e na Europa, marcando o início de um processo
de mudança de paradigma sobre a compreensão do desenvolvimento infantil. O
desenvolvimento era concebido, até então, como um processo praticamente
autossuficiente, necessitando de pouco amparo além da subsistência básica
(nutrição, por exemplo) para o seu desenrolar saudável. Esse conceito foi
substituído pela concepção de que o desenvolvimento, para atingir sua
potencialidade ao longo do processo de maturação, necessita de um olhar
cuidadoso em cada etapa para o reconhecimento dos pontos de vulnerabilidade,
assim como do delineamento de intervenções terapêuticas se necessárias e,
quando possível, preventivas ou precoces(Parry‐Jones, 1989; IRWIN, MACSWEEN,
& KERNS, 2011; CHESS, 1988).

Bowlby foi o primeiro autor que deflagrou essa mudança de olhar ao


apresentar na ONU, em 1951, uma revisão sobre os efeitos da privação materna no
desenvolvimento infantil (Bowlby, 1951). Esse texto é considerado revolucionário
para os cuidados destinados às crianças institucionalizadas, por ser o marco inicial
do reconhecimento de que o desenvolvimento pleno na idade adulta resulta de um
processo que precisa ser amparado e reconhecido nas necessidades específicas de
cada etapa.

A partir do aumento do interesse no processo de desenvolvimento infantil,


ocorreu também uma modificação no reconhecimento das patologias psíquicas que
afligem essa faixa etária. Até a década de 1950 deu-se pouca atenção para os
diagnósticos psicopatológicos e os poucos existentes usavam definições vagas e
amplas como, por exemplo, "problemas comportamentais na infância". As propostas
terapêuticas seguiam a pouca especificidade do diagnóstico, constituindo-se em
propostas não orientadas para a psicopatologia, sem foco definido, sem
planejamento e de longa duração (RUTTER, Michael, 2011, p. 25). Outra evidência
da precariedade do conhecimento psicopatológico infantil foi a tendência na década
de 60 a 80 do século XX de responsabilizar os cuidados parentais, mesmo sem
evidências claras, pelo aparecimento de quadros psicopatológicos na infância.
Nesse contexto que apareceram os termos “mãe esquizofrenizante”, para crianças
com quadros psicóticos, e “pais geladeiras”, para crianças com alterações na
comunicação e interação (SCHUHAM, 1967) (IRWIN, MACSWEEN, & KERNS,
2011) (CHESS, 1988) (SEEMAN, 2009).

Esse foi o panorama histórico que gerou a demanda pela procura por
diagnósticos psiquiátricos padronizados com algum grau de evidência na infância e
adolescência, culminando na criação e a ampla utilização dos critérios diagnósticos
operacionais (FEIGHNER, 1972) (ROBINS & GUZE, 1970) (RUTTER, 1965). Assim
foram formulados os critérios diagnósticos para quadros psicopatológicos na infância
e adolescência como os conhecemos atualmente, com uma preocupação focada na
procura de maior especificidade e alguma comprovação, a partir das publicações do
DSM-IV em 2000 e CID-10 em 1996 (RUTTER, Michael, 2011, p. 27).

Desde então, os critérios padronizados foram aceitos de forma homogênea


pela comunidade de saúde mental e trouxeram inegáveis avanços para a
identificação das psicopatologias na infância e adolescência (RUTTER, Michael,
2011, p. 35). No mínimo, essa mudança conseguiu diminuir o ceticismo de que
crianças precisam de cuidados para o seu desenvolvimento normal e que podem
adoecer psiquicamente, levando ao aumento do reconhecimento e à procura por
tratamentos (RUTTER, Michael, 2011, p. 42).

Porém, os critérios utilizados para definição e reconhecimento dos quadros


psicopatológicos nas crianças e adolescentes padecem de uma complicação
importante e eventualmente esquecida quando não observada em uma perspectiva
histórica: foram criados, em sua grande maioria, a partir das concepções das
patologias nos adultos.Apresentam, portanto, dificuldades intrínsecas em
reconhecer as diferenças das apresentações psicológicas e psicopatológicas em
cada momento do desenvolvimento, levando a erros no diagnóstico e tratamentos
ineficazes e inespecíficos (RUTTER, Michael, 2011, p. 44).

Outro ponto relevante dentro da perspectiva histórica é a forma atual de


reconhecimento dos quadros psicopatológicos. A psiquiatria foi historicamente
construída a partir de observações clínicas, descrições minuciosas de casos. Nos
adultos, as descrições psicopatológicas foram e são pontos- chaves para o
reconhecimento de quadros como esquizofrenia, mania, melancolia, transtorno
bipolar, trema, entre outros (BLEULER, 1950) (KRAEPELIN, 1921) (CONRAD,
1963) (Schneider, 1957). Na seara da infância e adolescência, temos dois exemplos
que percorreram esse processo: as observações de casos clínicos que levaram ao
reconhecimento do Autismo e da Síndrome de Asperger (KANNER,
1943) (ASPERGER, 2015) (ASPERGER, 2015). O mesmo mecanismo, ou seja, o
reconhecimento das vicissitudes da psicopatologia através da observação criteriosa
de casos clínicos,poderia ter ocorrido na PIA. Entretanto, dois fatores
impossibilitaram esse desenvolvimento: em primeiro lugar sua recente aparição no
meio científico e, em segundo, a atual realidade de orientação de pesquisa
psicopatológica que substituiu a descrição clínica apurada pela compilação
epidemiológica de sinais e sintomas.

Quando idealizado, o diagnóstico realizado por critérios clínicos, como o


DSM, não tinha a intenção de promover descrições compreensivas dos quadros,
mas sim tentar criar um limiar de reconhecimento para a patologia (ANDREASEN,
2007). Para se criar critérios replicáveis operacionalmente, deve-se levar em conta
que é necessária uma padronização em que alguns fenômenos podem ser
excluídos por serem considerados de difícil quantificação objetiva (como
autoidentidade, autoconsciência, intersubjetividade) e outros podem ter maior
destaque não pela relevância psicopatológica unicamente, mas também por serem
objetiváveis (PARNAS & BOVET, 1995).

Porém, operacionalmente, a avaliação psicopatológica foi substituída pela


realização de averiguação de listas de sintomas, diminuindo o encontro do terapeuta
com o paciente, como indivíduos. Criou-se uma situação clínica em que o principal
papel do psiquiatra é identificar e propor estratégias para a supressão dos
sintomas (LÓPEZ-IBOR JR & LÓPEZ-IBOR, 2008), situação que empobrece
significativamente a compreensão psicopatológica. Temos uma realidade atual em
que há uma tendência de gradual desaparecimento do reconhecimento das
características centrais das situações psicopatológicas, com substituição pela
procura de um conjunto de sintomas (PARNAS J. , 2011).

A simplificação do “objeto” estudado na psiquiatria e a metodologia usada


(entrevistas estruturadas) promovem o risco de não captar a essência das
patologias. A consequência desse fenômeno tem aparecido nas análises que
observam que apesar dos inúmeros esforços e investimentos dos últimos 30 anos
na Psiquiatria como um todo, os avanços no conhecimento da etiologia, do
tratamento e seus limites, não avançaram na mesma proporção do
investimento (PARNAS, SASS, & ZAHAVI, Rediscovering psychopathology: the
epistemology and phenomenology of the psychiatric object, 2012). Como preveniu
Andreasen: aplicar investimentos tecnológicos sem a parceria do olhar clínico
apurado para a psicopatologia pode transformar-se em uma empreitada solitária e
estéril (ANDREASEN, 2007). A psiquiatria está em um momento de reabertura para
outras possibilidades de pensamento em busca de desenvolver uma consistência
lógica mais robusta que consiga resgatá-la da encruzilhada em que se
encontra (MESSAS G. P., 2010).

Descrição de casos clínicos: prática obsoleta?

Descobertas clínicas a partir da observação minuciosa de casos clínicos


tiveram e têm papel fundamental na psiquiatria e na psicopatologia e permanecem
válidas ao lado de outras práticas também de extrema relevância como as
pesquisas epidemiológicas, ensaios clínicos e outras modalidades
consagradas (RUTTER, Michael, 2011, p. 42). A descrição de casos típicos não
deveria ser relegada a um plano inferior, pois é capaz de apresentar as categorias
centrais, passíveis de serem generalizadas e fomentar o reconhecimento
psicopatológico (PEREIRA) (ARAGONA, 2009).

No estudo da psicopatologia da infância e adolescência, existe uma


escassez de observações minuciosas tanto do processo de desenvolvimento normal
quanto da psicopatologia e sua apresentação em cada grupo etário. Investir nessa
área é um caminho para o aprimoramento da capacidade de reconhecimento dos
quadros patológicos (CARLSON & MEYER, 2006).

Fenomenologia-Estrutural

Como pontua Andreasen (2007), a formação geral do psiquiatra atual está


orientada para o reconhecimento de critérios diagnósticos, método que não propicia
o treinamento do olhar clínico para um reconhecimento psicopatológico acurado. Se
esse fato cria uma realidade preocupante para a Psiquiatra voltada para a
população adulta, é ainda mais alarmante para a PIA. Como colocamos acima, a
sua tenra idade como uma área de pesquisa promove amplas áreas em que a
manifestação psicopatológica é reconhecida de forma incipiente. Ao mesmo tempo,
a psiquiatria, como praticada atualmente, promove o risco de perpetuar esse
desconhecimento. Uma possível saída para esse entrave é repensar a formação do
psiquiatra, procurando metodologias que enfatizem a ciência psicopatológica. O
aperfeiçoamento da capacidade diagnóstica favoreceria melhores tratamentos e
intervenções precoces, acarretando grandes ganhos para a saúde pública da
infância e da adolescência.

Entre outras áreas do conhecimento, uma opção é a Fenomenologia-


Estrutural ( (MESSAS G. , 2010) (MINKOWSKY, 1973) (Messas,
2004)). Inicialmente originada na filosofia, essa disciplina passou a ser aplicada no
último século ao reconhecimento psicopatológico (BERRIOS, 1989). O ponto central
do seu método é a procura pela delineação da estrutura psíquica que está
subjacente à manifestação dos fenômenos na consciência. Esse formato oferece as
características metodológicas propícias para observação e análise criteriosa da
psique humana saudável, das diferenças temperamentais, das personalidades
e das manifestações psicopatológicas, desde o início do desenvolvimento até a vida
adulta (MESSAS G. , 2010). Ao definir o “objeto” analisado como a experiência em
primeira pessoa e sua irredutível subjetividade, essa metodologia é capaz de traçar,
a partir desse ponto inicial, uma clara corrente de coerência conceitual para a
conceptualização da estrutura observada (MESSAS G. P., 2010).

Casos clínicos:

Para exemplificar o ponto que levantamos no texto acima, apresentaremos,


sucintamente, dois casos clínicos de crianças de 8 anos encaminhadas para
avaliação psiquiátrica por queixa de dificuldade para manter a atenção focada, com
prejuízos em todos os ambientes, principalmente no escolar. Uma análise mais
detalhada poderá ser encontrada em outro artigo (Ceron-Litvoc, 2012).

Caso Clínico 1: O Distraído-Dissolvido

Criança de 8 anos, encaminhada para avaliação por queixa de desatenção


com prejuízos acadêmicos relevantes.
Dócil no contato, sorridente, procura facilmente engajar-se aos estímulos da
consulta já no primeiro contato. Não coloca restrições a nenhuma atividade
proposta, mas tende a manter-se engajado por pouco tempo. Com facilidade, seu
olhar "vaga" pelo ambiente como que à procura de algo.

Conta que tem muita dificuldade na escola, principalmente com português e


história. Diz que se esforça, mas não consegue prestar atenção. Gostaria de prestar
mais atenção na escola, mas não consegue. Fica de “castigo” constantemente por
ter notas abaixo do esperado. Estuda para as provas, mas não entende por que não
consegue ir bem. Não sabe o que está sendo dado em sala de aula, não consegue
contar o que está aprendendo.

Pais contam que sempre foi muito dócil, bem humorado, sorridente. Sempre
foi muito distraído, envolvia-se em acidentes facilmente por não prestar atenção no
ambiente. Perdia com frequência objetos, mesmo brinquedos ou jogos eletrônicos
de que gostava muito.

Na consulta, a criança se distrai facilmente. Olha a esmo para os estímulos


do consultório e ilumina-se com a ideia de como seria interessante experimentar um
novo jogo, porém esse estímulo e interesse não perduram, de forma que é quase
impossível terminar uma atividade sem muito esforço e estímulo da parte do
entrevistador.

Não sabe dizer no que pensa em seus devaneios. Responde, docilmente,


que não sabe ao certo, geralmente faz algum comentário vinculado a um estímulo
imediato, como, por exemplo, ter visto o avião passar e ter se distraído. Seus
pensamentos parecem vagar, sem controle ou foco, de acordo com os estímulos
ambientais ou emocionais.

Essa criança mostra-se aberta ao ambiente, disposta a engajar-se


facilmente, aceitando propostas de atividades, porém tem curto tempo de duração
em cada atividade.

Em uma análise Fenomenológica-Estrutural, a espacialidade pode ser


dividida entre espaço interno, íntimo, onde se desenlaçam as experiências não
compartilháveis, denominado de espaço escuro e o espaço claro, externo, das
relações, da publicidade, do encontro com os outros, onde o indivíduo interage
recebendo e doando (MINKOWSKY, 1973). Em uma estrutura saudável, ocorre
uma harmonia entre ambas manifestações espaciais que permitem tanto o contato e
trocas com o externo como a atividade interna distanciada e diferenciada do que
está fora do individual.

A criança descrita acima relata uma vivência de predomínio do espaço claro,


social, em detrimento do espaço escuro, íntimo. Ela é invadida a todo momento por
esse espaço claro que se sobrepõe à sua atividade interna. Por exemplo, mesmo
que se interesse por algo ativamente, uma vivência externa interrompe o seu
interesse e transporta-a para uma nova realidade, com pouco lastro interno do
interesse anterior. Vivencia as experiências de forma aleatória, de acordo como
determinado pelo meio, sem conseguir construir uma história linear de
acontecimentos. Essa aleatoriedade promovida pela pouca retenção do espaço
interno promove uma vivência de acontecimentos e situações fragmentadas em sua
consciência.

Se observarmos a estrutura pela sua constituição temporal, essa criança


apresenta uma constituição com predomínio dos eventos presentes em detrimento
das do passado e do futuro. A temporalidade, estruturalmente, divide-se
harmonicamente em seus três tempos constituintes, passado, presente e futuro. A
cada segundo, a consciência atualiza as vivências imediatas em uma base temporal
que contém as experiências passadas e as projeções para o futuro (MINKOWSKY,
1973, p. 180). A criança descrita nesse caso é capaz de atualizar as experiências
em uma base temporal que contenha os três elementos, porém com uma
característica diferenciada: o estímulo presente tem uma proporção maior do que o
esperado, de forma que diminui a intensidade do passado, assim como restringe
perspectivas de futuro ao vivenciar os estímulos. Dessa forma, a sua consciência é
tomada por estímulos presentes que se sobrepõem a outras aferências em sua base
temporal. Logo, recorda-se de acontecimentos de forma fragmentada, sem um
encadeamento temporal linear esperado para a sua capacidade cognitiva. Apresenta
dificuldade de conexão linear e causal entre acontecimentos e desfechos. Conta
situações frequentes em que foi surpreendido por um desfecho não esperado, como,
por exemplo, ter a impressão que estudou o suficiente e, mesmo assim, ir mal na
prova.

Caso clínico 2: Distraído-Absorvido

Criança de 8 anos, encaminhada para avaliação por queixa de desatenção


com prejuízos acadêmicos relevantes.

Também muito dócil no contato, mas muito observadora e contida. Responde


a todas as perguntas, mas de forma sucinta, com certo incômodo. Aceita engajar-se
nas brincadeiras propostas na consulta, mas com certa ressalva. Facilmente distrai-
se e desliga-se da atividade proposta.

Conta que gosta muito de pensar, que sua cabeça cria muitas histórias e que
é difícil prestar atenção na aula. Tem muitas histórias "inventadas”, mas não
apresenta intenção espontânea de relatar o conteúdo. Essas histórias, depois de
insistir em saber sobre o que inventava, mostram-se ricas, cheias de personagens,
ações bem elaboradas, adequadas para seu perfil cognitivo e cronológico. Deixa
claro que tem consciência de que deveria prestar mais atenção nas aulas, mas
conta que era muito difícil controlar a sua imaginação.

Pais procuraram atendimento por dificuldade de desempenho escolar e por


terem fracassado na tentativa de estudar mais com a criança em casa. Relatam um
histórico de uma criança introspectiva, mas com boas habilidades de socialização.

Observando a criança no consultório, a impressão é de distanciamento no


contato, o oposto da abertura e facilidade do primeiro caso. Mesmo muito
estimulada externamente e não recusando o estímulo, parece ser “seduzida” por
suas histórias internas e a facilidade com que se transporta para uma realidade
imaginária e mais rica que a experiência externa imediata.

Analisando , nessa criança, a proporção entre seu espaço claro e escuro,


encontramos uma estrutura oposta à primeira. Em oposição à primeira, esse caso
apresenta um predomínio do espaço interno, íntimo, em relação ao externo, claro,
público. O espaço claro existe, tanto que ela é capaz de se abrir ao contato, mas ele
é facilmente apagado pela exuberância do seu mundo íntimo.

Temporalmente, apesar de que as vivências ocorrem predominantemente no


espaço interno, pouco compartilhável, não há fragmentação das atividades devido
a alteração nas proporções temporais. As histórias são coesas, não fragmentadas,
com continuidade viva. A criança tem dimensão inclusive do tempo que esteve
ausente dos estímulos externos (percepção ausente no caso anterior).

Aplicações da construção de caso segundo a metodologia da Fenomenologia-


Estrutural

Apesar dos dois casos poderem ser enquadrados, pelos critérios


diagnósticos, como pertencentes a um mesmo transtorno, no caso, o Transtorno de
Déficit de Atenção/Hiperatividade (Manual diagnóstico e Estatístico de Transtornos
Mentais-: DSM-5, 2014), a análise fenômeno-estrutural permite diferenciar cada
apresentação clínica e delinear estruturas subjacentes diversas. Enquanto o
primeiro caso, o distraído-dissolvido, apresenta-se invadido pelo externo por uma
ampla abertura e pouca continência interna, o segundo caso, o distraído-absorvido,
coloca-se na apresentação oposta: é pouco ressonante ao meio, pouco aberto para
os estímulos. Enquanto o distraído-absorvido tem o espaço externo se sobrepujando
ao interno, o distraído-absorvido tem uma predominância de vivências internas,
nublando as experiências externas. Ambos apresentam-se clinicamente distraídos,
mas apresentam quadros psicopatológicos estruturais distintos.

Uma aplicação imediata para essa diferenciação clínica seria a indicação do


uso de metilfenidato. No primeiro caso, o distraído-dissolvido, se a medicação
permitir um aumento da capacidade de manter-se intencionalmente focado em um
estímulo, diminuindo a abertura para o externo (atenção involuntária),
provavelmente essa criança se beneficiaria da medicação. No segundo caso, existe
a possibilidade de que a mesma medicação promova um excesso de estímulo, com
aumento da atenção voluntária para os estímulos externos sem diminuir a vivência
intensa dos estímulos externos. Na estrutura do distraído-absorvido, a medicação,
pelo aumento de estímulos, poderia causar a sensação de desconforto e ansiedade,
levando, secundariamente, à tendência a um afastamento ainda maior do externo.

Conclusão:
A psiquiatria como um todo vive um momento de reflexão sobre seus
instrumentos de reconhecimento psicopatológico e sobre a prática clínica. Essa
reflexão é ainda mais relevante no segmento da Psiquiatria da Infância e
Adolescência pela sua imaturidade cronológica e campos de conhecimento pouco
explorados.

A descrição de casos clínicos, método em desuso nas últimas décadas, pode


ter seu papel novamente reconhecido na seara do reconhecimento de
características essenciais do desenvolvimento psíquico e suas diferenças em cada
grupo etário. A utilização do método proposto pela Fenomenologia-Estrutural pode,
exatamente, proporcionar que, ao descrever um caso clínico, reconheçamos as
modificações estruturais que são gerais para todos na mesma idade.

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