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A Santa Sé

PAPA FRANCISCO

MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


 NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

Nunca falar mal dos outros

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 13 de 31 de Março de 2013

Falar mal de alguém equivale a vendê-lo. Como fez Judas, que vendeu Jesus por trinta denários.
E precisamente partindo do trecho evangélico de Mateus que prenunciava a traição de Judas
Iscariotes, na breve homilia da missa celebrada na manhã de quarta-feira 27 de Março na capela
da Domus Sanctae Marthae, o Papa Francisco admoestou contra as intrigas. Com um convite
explícito: «Nunca falar mal de outras pessoas».

Na celebração estavam presentes, como já se tornou costume, alguns empregados do Vaticano,


entre os quais um grupo da Esmolaria Apostólica e outro do Serviço dos Telefones Vaticanos.

A eles o Papa quis deixar uma reflexão sobre o gesto feito por Judas, um dos amigos de Jesus,
que não hesita vendê-lo aos chefes dos sacerdotes. «Jesus é como uma mercadoria: é vendido.
É vendido naquele momento — ressaltou — e também muitas vezes no mercado da história, no
mercado da vida, no mercado da nossa vida. Quando fazemos uma escolha pelos trinta denários,
pomos Jesus de lado».

Quando se encontra um conhecido e a conversa se torna intriga, difamação, segundo o Papa


«esta é uma venda» e a pessoa no centro da nossa tagarelice «torna-se uma mercadoria». Não
sei porquê — disse ainda o Pontífice — mas há uma alegria obscura na tagarelice». Começa-se
com palavras boas, «mas depois vem o murmúrio. E começa-se aquele arranhar o outro». E é
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então que deveríamos pensar que todas as vezes que nos comportamos assim, «fazemos a
mesma coisa que fez Judas», que quando se encontrou com os chefes dos sacerdotes para
vender Jesus, tinha o coração fechado, não tinha compreensão, não tinha amor, não tinha
amizade.

E assim o Papa Francisco falou sobre um dos temas que lhe são mais queridos, o do perdão:
«Pensemos e peçamos perdão», porque o que fazemos ao próximo, ao amigo, «fazemo-lo a
Jesus. Porque Jesus está neste amigo». E se nos apercebemos de que a nossa conversa pode
fazer mal a alguém, «rezemos ao Senhor, falemos com o Senhor disto, para o bem do outro:
Senhor, ajuda-o». Não devo ser eu — concluiu — «quem faz justiça com a minha língua.
Peçamos esta graça ao Senhor».

No final da celebração o Santo padre recolheu-se em oração no fundo da capela. Em seguida


esperou todos os presentes à saída, para os saudar um por um: para todos uma palavra, um
sorriso, um encorajamento e os bons votos para a Páscoa iminente.

Também na segunda e na terça-feira o Santo Padre celebrou missa na mesma capela da Domus
Sanctae Marthae — estrutura que hospeda os sacerdotes que trabalham na Cúria Romana e
onde ele ainda reside — na qual têm participado numerosas pessoas que trabalham em vários
organismos vaticanos. Na homilia de 25 de Março, o Papa, comentando as leituras litúrgicas,
falou sobre a paciência de Deus, e no dia seguinte, reflectiu sobre a doçura do perdão de Cristo,
aquela doçura que se expressa no olhar dirigido por Cristo a Pedro que o tinha renegado. «Que
bom ser santos — disse — mas como é bom também ser perdoados».

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PAPA FRANCISCO

MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


 NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

Obediência é escuta que liberta


 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 15 de 14 de Abril de 2013

Deus não pode ser objecto de negociação. E a fé não prevê a possibilidade de sermos «tíbios»,
«nem maus nem bons», procurando com «uma vida dupla» chegar a um acordo num «status
vivendi» com o mundo. O Papa Francisco disse-o na homilia da missa, celebrada na manhã de
quinta-feira 11 de Abril, na capela da Domus Sanctae Marthae, na qual participaram a direcção e
a redacção de «L’Osservatore Romano». Além dos jornalistas do diário estavam presentes
também os das edições periódicas e alguns funcionários da direcção geral.

Entre os concelebrantes estava o cardeal indiano Telesphore Placidus Toppo, arcebispo de


Ranchi, o arcebispo Mario Aurelio Poli, sucessor de Bergoglio no governo da arquidiocese de
Buenos Aires, pe. Indunil Janakaratne Kodithuwakku Kankanamalage, subsecretário do Pontifício
Conselho para o Diálogo Inter-Religioso, monsenhor Robinson Edward Wijesinghe, chefe de
departamento do Pontifício Conselho para a Pastoral dos Migrantes e Itinerantes, pe. Sergio
Pellini, director-geral da Tipografia Vaticana Editrice L’Osservatore Romano, os jesuítas
W?adis?aw Gryz?o, encarregado da edição mensal em língua polaca do nosso jornal, e Konrad
Grech, e o franciscano conventual Giuseppe Samid. Estavam também presentes o presidente e o
secretário-geral da Fundação «Centesimus Annus Pro Pontifice», Domingo Sugranyes Bickel e
Massimo Gattamelata.

Nas leituras, explicou o Papa na homilia, «aparece três vezes a palavra “obedecer”: fala-se da
obediência. A primeira vez, quando Pedro responde “é preciso obedecer a Deus e não aos
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homens”» diante do sinédrio, como referem os Actos dos Apóstolos (5, 27-33).

O que significa — questionou-se o Pontífice — «obedecer a Deus? Significa que devemos ser
como escravos, todos amarrados? Não, porque exactamente quem obedece a Deus é livre, não é
escravo! E como se faz? Obedeço, não faço a minha vontade e sou livre? Parece uma
contradição. Mas não é uma contradição». De facto «obedecer vem do latim e significa escutar,
ouvir o outro. Obedecer a Deus é escutá-Lo, ter o coração aberto para ir pela senda que Deus
nos indica. A obediência a Deus é escutar Deus. E isto torna-nos livres».

Comentando o trecho dos Actos dos Apóstolos, o Pontífice recordou que Pedro «diante destes
escribas, sacerdotes e também do sumo sacerdote, dos fariseus» foi chamado a «tomar uma
decisão». Pedro «ouvia o que os fariseus e os sacerdotes diziam, e ouvia o que Jesus dizia no
seu coração: “o que faço?”. Disse: “Faço o que me diz Jesus, e não o que quereis que eu faça”. E
assim foi em frente».

«Na nossa vida — disse o Papa Francisco — ouvimos também certas propostas que não vêm de
Jesus, nem de Deus. Pode-se entender: as nossas debilidades às vezes levam-nos por este
caminho. Ou também por outro que é ainda mais perigoso: estabelecemos um acordo, um pouco
de Deus e um pouco de vós. Fazemos um acordo e assim continuamos com uma dupla vida: um
pouco a vida daquilo que ouvimos de Jesus e um pouco a vida do que escutamos do mundo, os
poderes do mundo e muito mais». Mas não é um «bom» sistema. De facto «no livro do
Apocalipse, o Senhor diz: isto não é bom, porque assim não sois maus nem bons: sois tíbios.
Condeno-vos».

O Pontífice advertiu exactamente contra esta tentação: «Se Pedro tivesse dito aos sacerdotes:
“falemos como amigos e estabeleçamos um status vivendi”, talvez tivesse corrido bem». Mas não
teria sido uma escolha própria «do amor que vem quando ouvimos Jesus». Uma escolha que tem
consequências. «O que acontece — prosseguiu o Santo Padre — quando escutamos Jesus? Às
vezes os que nos fazem outra proposta enraivecem-se e a estrada acaba na perseguição. Neste
momento, disse, temos muitas irmãs e irmãos que para obedecer, ouvir, escutar o que Jesus lhes
pede estão sob perseguição. Recordemos sempre estes irmãos e irmãs que puseram a carne ao
fogo e nos dizem com a própria vida: “Quero obedecer, ir pelo caminho que Jesus me indica”».

Com a liturgia hodierna «a Igreja convida-nos» a «ir pela senda de Jesus» e a «não ouvir as
propostas que o mundo nos faz, propostas de pecado ou tíbias, a meias»: trata-se, reafirmou, de
um modo de viver que «não é bom» e «não nos fará felizes».

Nesta escolha de obediência a Deus e não ao mundo, sem ceder a acordos, o cristão não está
sozinho. «Onde encontramos — perguntou-se o Papa — a ajuda para ir pela estrada do ouvir
Jesus? No Espírito Santo. Somos testemunhas desses factos: foi o Espírito Santo que Deus doou
aos que o obedecem». Portanto, disse, «é precisamente o Espírito Santo dentro de nós que nos
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dá força para continuar». O Evangelho de João (3, 31-36), proclamado na celebração, com uma
bonita expressão, garante: «“Aquele que Deus enviou diz as palavras de Deus: Ele dá o Espírito
incomensuravelmente”. O nosso Pai dá-nos o Espírito, sem medidas, para escutar Jesus, ouvir
Jesus e ir pela senda de Jesus».

O Papa Francisco concluiu a homilia com o convite a sermos corajosos nas diversas situações da
vida: «Peçamos a graça da coragem. Teremos sempre pecados: somos todos pecadores». Mas
serve «a coragem de dizer: “Senhor, sou pecador, às vezes obedeço às coisas mundanas mas
quero obedecer a ti, quero caminhar pela tua vereda”. Peçamos esta graça, de ir sempre pela
estrada de Jesus. E quando não o fizermos, peçamos perdão: O Senhor perdoa-nos, porque Ele
é muito bom».

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PAPA FRANCISCO

MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


 NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

Não se pode domesticar o Espírito

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 16 de 21 de Abril de 2013

«Hoje é o aniversário de Bento XVI. Ofereçamos a missa por ele, para que o Senhor esteja com
ele, o conforte e lhe dê muita consolação». No início da celebração eucarística presidida na terça-
feira 16 de Abril, na capela da Domus Sanctae Marthae, o primeiro pensamento do Papa
Francisco foi dirigido ao seu predecessor no dia do seu octogésimo sexto aniversário. E recordou
também as vítimas do atentado de Boston. Entretanto a homilia foi a ocasião para advertir
quantos se deixam seduzir pela tentação de opor resistência ao Espírito Santo. «O Espírito —
afirmou com doçura — não se domestica!».

Não foi ocasional a referência do Pontífice ao concílio Vaticano II que, disse, «constituiu uma
bonita obra do Espírito Santo. Pensai no Papa João: parecia um pároco bom e ele foi obediente
ao Espírito Santo», realizando o que o Espírito desejava. «Mas após cinquenta anos —
questionou-se — fizemos tudo o que nos disse o Espírito Santo no concílio», naquela
«continuidade no crescimento da Igreja que foi o concílio?».

«Não» foi a sua resposta. «Festejamos este aniversário — explicou — quase que erigindo «um
monumento» ao concílio, mas preocupamo-nos sobretudo que «não incomode. Não queremos
mudar». Aliás: «há vozes que gostariam de voltar para trás. Isto chama-se “ser teimoso”, chama-
se querer “domesticar o Espírito Santo”, chama-se tornar-se “insensatos e lentos de coração”».
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O Papa referiu-se à primeira leitura tirada dos Actos dos Apóstolos (7, 51-8, 1a). «As palavras de
Estêvão — afirmou — são fortes: “Teimosos e não circuncisos no coração e nos ouvidos, vós
opondes sempre resistência ao Espírito Santo. Como os vosos pais, assim sois também vós.
Qual dos profetas os vossos pais não perseguiram? Eles mataram os que prenunciavam a vinda
do Justo, do qual agora vos tornastes traidores e assassinos”. “Assassinastes” os profetas, depois
fizestes-lhes um bonito túmulo, um monumento, não? — não sei se se diz exactamente assim —
e depois de os terdes matado, veneraste-los. Eis que se manifesta a resistência ao Espírito
Santo. Também o próprio Jesus, um pouco mais suavemente, o diz, com mais mansidão, aos
discípulos de Emaús: “Insensatos e lentos de coração, que acreditais em tudo o que anunciaram
os profetas!”».

Também entre nós, acrescentou o Pontífice, se manifesta a resistência ao Espírito Santo. Aliás,
«para dizer claramente, o Espírito Santo incomoda-nos. Porque — explicou — move-nos, faz-nos
caminhar, impele a Igreja para a frente. E nós somos como Pedro na transfiguração: “Ah, que
bom permanecer assim, todos unidos!”. Mas que não nos incomode. Queremos que o Espírito
Santo nos adormeça. Queremos domesticar o Espírito Santo. E isto não está bem. Porque ele é
Deus e é aquele vento que vai e vem, e tu não sabes de onde. É a força de Deus; é aquele que
nos dá a consolação e a força para continuar. Mas para ir em frente! E isto incomoda. A
comodidade é melhor. Poderíeis dizer: “Mas, padre, isto acontecia naqueles tempos. Agora
estamos todos contentes com o Espírito Santo”. Não, não é verdade! Esta tentação existe ainda
hoje», como demonstra a experiência da recepção do concílio Vaticano II.

«Também na nossa vida pessoal, na vida particular — continuou o Papa — acontece o mesmo: o
Espírito impele-nos a empreender um caminho mais evangélico, e nós: “Mas não, está bem
assim, Senhor...”». Eis a exortação conclusiva: «Não opor resistência ao Espírito Santo». Porque
«é o Espírito que nos torna livres, com a liberdade de Jesus, com a liberdade dos filhos de Deus!
Não opor resistência ao Espírito Santo: esta é a graça que gostaria que todos nós pedíssemos ao
Senhor; a docilidade ao Espírito Santo, ao Espírito que vem até nós e nos faz ir em frente no
caminho da santidade, a santidade tão bonita da Igreja. A graça da docilidade ao Espírito Santo».

E a quantos participaram na missa no dia seguinte, 17 de Abril, o Papa recordou que a Igreja não
pode ser «uma babysitter que procura fazer adormecer uma criança». Se assim fosse seria «uma
Igreja adormecida». Quem conheceu Jesus tem a força e a coragem de o anunciar. E quem
recebeu o baptismo tem a força de caminhar, de ir em frente, de evangelizar e «quando fazemos
isto a Igreja torna-se uma mãe que gera filhos» capazes de levar Cristo ao mundo.

A calúnia esteve no centro na reflexão da missa celebrada na manhã de segunda-feira, 15 de


Abril. Referindo-se ao Salmo 118 da liturgia do dia, o Papa Francisco explicou que a calúnia
destrói a obra de Deus, porque nasce do ódio. Ela é filha do «pai da mentira» e quer aniquilar o
homem, afastando-o de Deus. Na Igreja «há muitos homens e mulheres que são caluniados,
perseguidos e assassinados por ódio a Jesus, por ódio à fé». Alguns são mortos porque
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«ensinam o catecismo»; outros, porque «carregam a cruz». A calúnia encontra espaço em muitos
países, onde os cristãos são perseguidos. «Eles são nossos irmãos e irmãs — sublinhou o Papa
— que hoje sofrem, neste tempo de mártires. Temos que pensar nisto».

Depois, o Pontífice observou que a nossa época está caracterizada por «mais mártires do que
nos primeiros séculos. Perseguidos por causa do ódio: é precisamente o diabo que semeia o ódio
naqueles que fomentam as perseguições». Por fim, o Papa exortou a ter confiança em Maria, a
dirigir-lhe a oração que começa com as palavras «Sob a tua protecção» e a recordar o antigo
ícone onde, «com o seu manto cobre o seu povo: é a mãe». É a coisa mais útil neste tempo de
«ódio, em períodos de perseguição e de turbulência espiritual», porque — concluiu — «o lugar
mais seguro é sob o manto de Nossa Senhora».

Para resolver os problemas da vida é preciso encarar a realidade, prontos, como o guarda-redes
de uma equipa de futebol, a impedir a entrada da bola de onde quer que ela chegue. E sem ceder
ao medo ou à tentação da lamentação, porque Jesus está sempre ao lado de cada homem,
também e sobretudo nos momentos difíceis. Disse o Papa Francisco na missa celebrada na
manhã de sábado 13 de Abril.

Um problema, disse o Papa, não se resolve se nos limitamos a dizer «não gosto» e começamos
«a murmurar ou a mexericar». E «não é uma boa atitude disfarçar a vida, fazer maquiagem na
vida». Não, não. A vida é como é. É a realidade. É como Deus quer que seja ou como Deus
permite que seja. Mas é como é, e devemos aceitá-la assim. O Espírito do Senhor indicar-nos-á a
solução para os problemas».

«Também no Evangelho — explicou o Papa comentando o trecho de são João (6, 16-21) que foi
lido — acontece uma coisa semelhante. Os discípulos estavam contentes porque tinham visto
que os cinco pães nunca acabavam. Deram de comer a muitas pessoas, muitíssimas. Dirigiram-
se para a outra margem, com a barca, e chegou um vento forte: o mar agitou-se e tiveram medo.
Encontravam-se em dificuldade. E o Senhor veio até eles para os ajudar. Assustaram-se, mas Ele
disse-lhes: “Não temais, sou eu!”. Esta é a palavra de Jesus, sempre: nas dificuldades, nos
momentos obscuros, nos quais tudo é sombra e não sabemos o que fazer, também quando há
escuridão na nossa alma. A vida é assim. Hoje é assim, com esta escuridão. Mas o Senhor está
presente. Não tenhamos medo! Não temamos as dificuldades, não tenhamos medo quando o
nosso coração está triste, quando está sombrio! Aceitemos tudo como vem, com o Espírito do
Senhor e a ajuda do Espírito Santo. E deste modo vamos em frente, certos no caminho justo».

O Papa Francisco concluiu a homilia com a exortação a pedir ao «Senhor esta graça: não ter
medo, não pintar a vida» para ser capazes de «aceitar a vida como é e procurar resolver os
problemas como os apóstolos fizeram. E também procurar o encontro com Jesus que está
sempre ao nosso lado, inclusive nos momentos mais obscuros da vida».
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MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


 NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

Cristo é a porta do Reino

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 17 de 28 de Abril de 2013

Há uma só porta para entrar no Reino de Deus. E esta porta é Jesus. Quem tentar entrar por
outro caminho é «um ladrão» ou «um salteador»; ou ainda é «um arrivista que pensa só na sua
vantagem», na sua glória, e rouba a glória de Deus. O Papa Francisco, durante a missa
celebrada na segunda-feira 22 de Abril, na capela da Domus Sanctae Marthae, voltou a propor
Jesus como centro das vicissitudes humanas e a recordar que a nossa não é uma religião «que
negocia». Estavam presentes um grupo de técnicos da Rádio Vaticano e os funcionários da Sala
de Imprensa da Santa Sé acompanhados pelos sacerdotes Federico Lombardi e Ciro Benedettini,
respectivamente director e vice-director, que concelebraram, e por Angelo Scelzo, vice-director
para os credenciamentos dos jornalistas.

Comentando as leituras da liturgia do dia, tiradas dos Actos dos Apóstolos (11, 1-18) e do
Evangelho de João (10, 1-10), o Pontífice recordou que nelas «é repetido o verbo “entrar”. Antes,
quando Pedro vai a Jerusalém é repreendido: “Entraste em casa dos pagãos”. Depois, Pedro
narra o modo como entrou. E Jesus é muito explícito, nisto: “quem não entra no redil das ovelhas
pela porta, não é o pastor”». Para entrar no reino de Deus, na comunidade cristã, na Igreja, «a
porta — explicou o Papa — a verdadeira porta, a única porta é Jesus. Devemos entrar por aquela
porta. E Jesus é explícito: “Quem não entra no redil das ovelhas pela porta — que é Ele — mas
entra por outro lado, é um ladrão ou um salteador”, alguém que quer ter lucro para si mesmo».
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Isto, notou, acontece «também nas comunidades cristãs. Há esses arrivistas, não?, que procuram
vantagens. E consciente ou inconscientemente fingem que entram; mas são ladrões e
salteadores. Por quê? Porque roubam a glória a Jesus, querem a própria glória. E é isto que
Jesus dizia aos fariseus: “Vós roubai-vos a glória uns aos outros...”. Uma religião que negocia,
não? “Negociais a glória entre vós”. Mas eles não entraram pela porta verdadeira. A porta é Jesus
e quem não entra por esta porta erra».

E na missa celebrada no dia 25 de Abril, o Papa Francisco recordou que a Igreja é uma história
de amor e nós fazemos parte dela. Mas precisamente por isso, quando se dá demasiada
importância à organização, quando escritórios e burocracia assumem uma dimensão
predominante, a Igreja perde a sua verdadeira substância e corre o risco de se transformar numa
simples organização não governamental. A história de amor à qual o Papa Francisco se referiu
durante a missa celebrada na manhã de quarta-feira, 24 de Abril, na capela da Domus Sanctae
Marthae, é a da maternidade da Igreja. Uma maternidade, disse, que cresce e se difunde no
tempo «e que ainda não acabou», impulsionada não por forças humanas mas «pela força do
Espírito Santo». No altar com o Papa estavam presentes o cardeal Javier Lozano Barragán, D.
Dominique Rey, Bispo de Fréjus-Toulon, e D. Luigi Renzo, bispo de Mileto-Nicotera-Tropea.
Participou na missa também uma representação dos funcionários do Instituto para as Obras de
Religião.

Como acontece habitualmente, o Pontífice comentou as leituras do dia, tiradas dos Actos dos
Apóstolos (12, 24 – 13, 5) e do Evangelho de João (12, 44-50). «A primeira leitura — frisou —
inicia com estas palavras: “Naqueles dias, a Palavra de Deus crescia e difundia-se”. Trata-se do
início da Igreja, no momento que cresce e se difunde em todos os lugares, em todo o mundo».
Um facto que, explicou, poderia ser avaliado em termos meramente quantitativos, com satisfação
porque deste modo se obtêm mais «seguidores» e se reúnem mais «sócios» para a empresa.
Aliás, chega-se até a estabelecer «pactos para crescer».

Ao contrário «o caminho que Jesus quis para a sua Igreja — disse o Pontífice — é outro: é o
caminho das dificuldades, o caminho da cruz e das perseguições». E também isto nos faz pensar:
«Mas o que é esta Igreja? Esta nossa Igreja, que não parece ser uma empresa humana, mas é
outra coisa». A resposta mais uma vez está no Evangelho, no qual Jesus «nos diz algo que talvez
possa iluminar esta pergunta: “Quem crê em mim, não crê em mim mas crê n'Aquele que me
enviou”». Também Cristo, explicou, foi «mandado, é enviado por outro!». Portanto, quando indica
aos doze apóstolos o programa de vida e o modo de viver, «não o faz por si mesmo» mas «por
Aquele que o enviou».

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 NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

Para ser a Igreja do sim

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 18 de 5 de Maio de 2013

A Igreja «comunidade do sim», forjada pelo Espírito Santo, contraposta à «Igreja do não» que
obriga o Espírito «a um trabalho duplo»: é a imagem proposta pelo Papa Francisco a quantos
participaram na missa matutina de quinta-feira 2 de Maio, na capela da Domus Sanctae Marthae.
Entre os concelebrantes estava o cardeal Albert Malcom Ranjith Patabendige Don, arcebispo de
Colombo (Sri Lanka); D. Lorenzo Voltolini, arcebispo de Portoviejo (Equador), e monsenhor
Raphael Kutaimi, pároco emérito da igreja sírio-católica de Bagdad, ferido no atentado perpetrado
no último domingo de Outubro de 2010, durante o qual morreram cerca de cinquenta fiéis que
assistiam à missa.

Durante a homilia o Pontífice reflectiu sobre a Igreja, que no dia de Pentecostes saiu do cenáculo
depois da oração dos apóstolos com Maria. Uma Igreja, frisou, sempre impelida pelo Espírito
Santo, que se difundiu devagar em todos os lugares do mundo, levando o anúncio entre os
pagãos.

E na terça-feira 30 de Abril, aos participantes na missa, entre outros, um grupo de colaboradores


da Administração do Património da Sé Apostólica, acompanhados pelo cardeal Domenico
Calcagno, o qual concelebrou, o Papa ofereceu uma reflexão sobre o sentido da paz, da paz
verdadeira, que não se compra. É um dom de Deus. Um dom que Ele oferece à sua Igreja. Para a
obter os cristãos devem continuar a confiar a Igreja a Deus, pedindo-lhe que se ocupe dela e a
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defenda das ameaças do maligno, que oferece ao homem uma paz diversa, uma paz mundana,
não a paz verdadeira. Mas «nós — perguntou-se o Papa — rezamos pela Igreja? Por toda a
Igreja? Pelos nossos irmãos, que não conhecemos, em todo o mundo?». É a Igreja do Senhor,
espalhada no mundo inteiro; e quando «na nossa oração dizemos ao Senhor: “Senhor, olha para
a tua Igreja”», entendemos esta Igreja, a Igreja do Senhor, a Igreja que reúne «os nossos
irmãos». Esta é a oração que «devemos fazer com o coração — repetiu o Papa — e cada vez
mais. Para nós é fácil rezar para pedir uma graça ao Senhor, quando necessitamos de algo; e
não é difícil rezar para agradecer ao Senhor: obrigado por… Mas rezar pela Igreja, pelos que não
conhecemos, mas que são nossos irmãos e irmãs, porque receberam o mesmo baptismo, e dizer
ao Senhor: “são os teus, são os nossos... protege-os”», é outra coisa: significa «confiar a Igreja
ao Senhor»; é «uma oração que faz crescer a Igreja» mas é também «um acto de fé. Nada
podemos, somos todos pobres servidores da Igreja: mas é Ele que pode levá-la em frente,
protegê-la e fazê-la crescer, torná-la santa, defendê-la do “príncipe deste mundo”», isto é,
daquele que «quer que a Igreja se torne sempre mais mundana.

«Este é o maior perigo», porque «quando a Igreja se torna mundana, quando tem dentro de si o
espírito do mundo», quando obtém a paz que não é do Senhor — a que Jesus nos garantiu
dizendo: «Deixo-vos a paz, dou-vos a minha paz» — então torna-se uma Igreja «débil, uma Igreja
que será vencida e incapaz de levar precisamente o Evangelho, a mensagem da Cruz, o
escândalo da Cruz. Não pode levá-lo em frente se for mundana! Por isso é tão importante e forte
esta oração: confiar a Igreja ao Senhor».

«Não é habitual para nós — frisou o Santo Padre — confiar a Igreja ao Senhor». Eis o convite a
aprender a confiar os anciãos, os doentes, as crianças, os jovens ao Senhor, repetindo «”Protege
Senhor a tua Igreja”: é tua! Com esta atitude ele dar-nos-á, no meio das tribulações, a paz que só
ele pode dar. A paz que o mundo não pode dar, que não se compra; a paz que é um dom
verdadeiro da presença de Jesus no meio da sua Igreja», inclusive nas tribulações: nas grandes,
como «a perseguição», e também «nas pequenas, como a doença e os problemas de família».
Tudo isto, disse o Pontífice na conclusão, devemos confiar ao Senhor, rezando: «protege a tua
Igreja na tribulação, para que não perca a fé, para que não perca a esperança». E «hoje —
acrescentou — gostaria de dizer: recitar esta oração de confiança para a Igreja fará bem a nós e
à Igreja; dará grande paz a nós e grande paz à Igreja; não nos livrará das tribulações, mas far-
nos-á fortes nas tribulações».

A missa do dia anterior, 29 de Abril, foi dedicada ao tema da reconciliação. Comentando as


leituras do dia, o Papa frisou que o confessionário não é uma «lavandaria» que lava os pecados,
nem um «momento de tortura» onde se infligem pauladas. De facto, o confessionário é o encontro
com Jesus e sente-se directamente a sua ternura. Mas é preciso aproximar-se do sacramento
sem truques nem meias-verdades, com mansidão e alegria, confiantes e armados com «aquela
bendita vergonha», a «virtude do humilde» que faz com que nos reconheçamos pecadores.
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MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


 NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

Jesus não exclui ninguém

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 19 de 12 de Maio de 2013

Jesus não excluiu ninguém. Construiu pontes, não muros. A sua mensagem de salvação é para
todos. Na manhã de 8 de Maio, durante a missa na Domus Sanctae Marthae, o Papa Francisco
meditou sobre a atitude do bom evangelizador: aberto a todos, pronto a ouvir todos, sem
exclusões. Felizmente, observou, «esta é uma boa fase na vida da Igreja: estes últimos
cinquenta, sessenta anos, foram um tempo positivo. Porque recordo-me que quando eu era
criança nas famílias católicas, também na minha, se ouvia dizer: «Não, não podemos ir a casa
deles, porque não são casados na Igreja». Tratava-se de uma exclusão. Não, não podias ir!
Porque são socialistas ou ateus, não podemos ir. Agora, graças a Deus, já não se diz».

O Pontífice propõe o exemplo do apóstolo Paulo que no aerópago (Actos dos Apóstolos, 17,
15.22 — 18,1) anuncia Jesus Cristo entre os adoradores de ídolos. Na opinião do Papa, é
importante o modo como o faz: «Ele não diz: «Idólatras, ireis para o inferno...», mas «procura
chegar aos seus corações»; desde o início não condena, procura o diálogo: «Paulo é um
pontífice, um construtor de pontes. Ele não quer tornar-se um construtor de muros». Construir
pontes para anunciar o Evangelho, «esta é a atitude de Paulo em Atenas: edificar uma ponte no
coração deles, para depois dar mais um passo e anunciar Jesus Cristo».

Paulo ensina qual deve ser o caminho da evangelização a ser percorrido com coragem. E
«quando a Igreja perde esta coragem apostólica, torna-se uma Igreja estagnante. Ordenada,
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bonita; tudo bom, mas sem fecundidade, porque perdeu a coragem de ir até às periferias, onde
vivem muitas pessoas vítimas da idolatria, da mundanidade, do pensamento tíbio». E mesmo se o
medo de errar reprime, é necessário pensar que é possível levantar-se e ir em frente. «Quantos
não caminham para não errar — concluiu o Papa Francisco — cometem um erro mais grave».

E na missa celebrada na manhã de 7 de Maio, o Papa recordou que a alegria e a força da


suportação cristã rejuvenesce o homem e ajuda a aceitar e a viver pacientemente tribulações e
dificuldades da vida. Concelebraram os cardeais Angelo Comastri e Jorge Mejia, os prelados
Carlos Aguiar Retes, arcebispo de Tlalnepantla no México, e presidente do CELAM, com o
auxiliar Efraín Martinez Mendoza; Vittorio Lanzani, delegado da Fábrica de são Pedro; Francisco
Javier Chavolla Ramos, bispo de Toluca no México, e Juan José Omella, bispo de Clahorra y La
Calzada-Logroño, Espanha.

As leituras do dia — tiradas dos Actos dos Apóstolos (16, 22-24) e do evangelho de João (16, 5-
11) — ofereceram ao Papa a ocasião para repropor o espírito de suportação testemunhado pelos
primeiros mártires cristãos. A este propósito, recordou o testemunho de Paulo e Silas que,
prisioneiros, permaneceram em oração e cantaram hinos a Deus. Os outros prisioneiros
escutavam-nos admirados: «espancados e cheios de chagas “cantam, rezam... pessoas meio
estranhas!”. Mas eles — explicou o Pontífice — estavam em paz. Eram felizes por ter sofrido em
nome de Jesus. Estavam tranquilos. Cantavam, rezavam e sofriam. Naquele momento, eles
estavam naquele estado de ânimo tão cristão: o da paciência. Quando Jesus iniciou a estrada da
sua Paixão, depois da ceia, “entra na paciência”». Entrar na paciência: é este «o caminho que
Jesus ensina a nós, cristãos. Entrar na paciência». Mas isto «não quer dizer ser triste. Não, não,
é outra coisa! Isto quer dizer suportar, carregar nos ombros o peso das dificuldades, o peso das
contradições e das tribulações».

Um «amigo» que todos os dias se torna para cada um de nós «companheiro de caminho», foi o
perfil do Espírito Santo traçado pelo Papa Francisco na missa celebrada na manhã de segunda-
feira 6 de Maio, na capela da Domus Sanctae Marthae. Para o conhecer, sobretudo para
reconhecer a sua acção na nossa vida «é importante — este é o conselho do Pontífice — fazer o
exame de consciência» todas as noites antes de adormecer.

Na missa de 4 de Maio, o Papa Francisco disse que os cristãos são hoje mais perseguidos do
que no início da história do cristianismo. A causa originária de cada perseguição é o ódio do
príncipe do mundo em relação a quantos foram salvos e remidos por Jesus com a sua morte e
ressurreição. As únicas armas para se defender são a palavra de Deus, a humildade e a
mansidão. Indicou também um caminho a seguir para aprender a deslindar-se entre as insídias
do mundo.

 
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PAPA FRANCISCO

MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


 NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

Os problemas de são Paulo

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 20 de 19 de Maio de 2013

Com o seu testemunho de verdade o cristão deve «incomodar» as «nossas estruturas


confortáveis», também correndo o risco de terminar «em maus lençóis», porque animado por uma
«loucura espiritual sadia» em relação a todas as «periferias existenciais». Seguindo o exemplo de
são Paulo, que passava «de uma batalha campal para outra», os crentes não devem refugiar-se
«numa vida confortável» ou nos compromissos: hoje, na Igreja existem demasiados «cristãos de
salão, educados», «tíbios», para os quais está sempre «tudo bem», mas que dentro não têm o
fervor apostólico. Foi o forte apelo à missão — não só em terras longínquas, mas também nas
cidades — lançado pelo Papa Francisco, na manhã de quinta-feira 16 de Maio, durante a missa
celebrada na capela da Domus Sanctae Marthae.

Bispos e sacerdotes que se deixam vencer pela tentação do dinheiro e pela vaidade do
carreirismo, pastores que se transformam em lobos «que devoram a carne das suas ovelhas».
Não usou meios-termos o Papa Francisco para estigmatizar o comportamento de quem — disse,
citando santo Agostinho na missa de quarta-feira 15 de Maio — «se apodera da carne da ovelha
para a comer, aproveita-se; negocia e é apegado ao dinheiro; torna-se avaro e muitas vezes até
simoníaco. Ou aproveita da sua lã para a vaidade, para se vangloriar». Para superar estas
«verdadeiras tentações», bispos e sacerdotes devem rezar, mas precisam também da oração dos
fiéis.
2
O egoísmo não leva a nenhum lugar. Ao contrário, o amor liberta. Por esta razão, quem for capaz
de viver a própria vida como «um dom que deve ser oferecido ao próximo» nunca ficará sozinho
nem experimentará «o drama da consciência isolada», presa fácil de «Satanás, mau pagador»
sempre «pronto para enganar» quem escolhe o seu caminho. Foi a reflexão que o Papa
Francisco fez na missa de terça-feira 14 de Maio.

O Pontífice repropôs a figura de Judas, o qual tem uma atitude contrária em relação a quem ama,
porque «nunca compreendeu, coitado, o que é um dom». Judas é um daqueles homens que
nunca fazem um gesto de altruísmo e que vivem sempre na esfera do próprio eu, sem se deixar
«envolver pelas situações boas». Atitude que, ao contrário, é característica de «Madalena,
quando lava os pés de Jesus com o nardo, muito caro». É um momento «religioso — afirmou o
bispo de Roma — um momento de gratidão, de amor». Ao contrário, Judas vive isolado, na sua
solidão, e nela permanece. «Uma amargura do coração» como a definiu o Santo Padre. E assim
«como o amor cresce no dom», também a atitude «do egoísmo cresce. E cresceu, em Judas, até
à traição de Jesus». Em síntese, afirmou o Papa, quem ama dá a vida como dom; quem é
egoísta, atraiçoa, fica sempre sozinho e «isola a sua consciência no egoísmo, ocupando-se da
própria vida, mas no final perde-a».

Vem vontade de dizer «o Espírito Santo, este desconhecido», pensando nos muitos que ainda
hoje «não sabem explicar bem quem é o Espírito Santo» e «dizem: “Não sei o que fazer!” com
ele, ou dizem: “O Espírito Santo é a pomba, aquele que nos dá sete prendas”. Mas assim o pobre
Espírito Santo é sempre último e não encontra um lugar bom na nossa vida».

O Papa Francisco voltou a falar do Espírito Santo na missa matutina de segunda-feira, 13 de


Maio, ressaltando o pouco conhecimento que ainda hoje muitos cristãos têm dele.

O Pontífice, partindo da narração do encontro de Paulo com alguns apóstolos em Éfeso, durante
o qual — como é referido nos Actos dos Apóstolos (19, 1-8) — à pergunta se tinham recebido o
Espírito Santo, responderam que nunca tinham ouvido falar da sua existência. Para explicar o
episódio, o Santo Padre recorreu à narração de um momento da sua experiência pessoal:
«Recordo que uma vez, quando eu era pároco na paróquia de São José Patriarca, em São
Miguel, durante a missa para as crianças, no dia de Pentecostes, perguntei: “Quem sabe quem é
o Espírito Santo?”. E todas as crianças levantaram a mão». Um deles, a sorrir, respondeu: «”o
paralítico!”. Disse assim. Tinha ouvido a palavra “paráclito”, e compreendera “paralítico”! É assim:
o Espírito Santo é sempre um pouco o desconhecido da nossa fé. Jesus diz acerca dele aos
apóstolos: “Enviar-vos-ei o Espírito Santo: ele ensinar-vos-á todas as coisas e recordar-vos-á
tudo quanto vos disse”. Pensemos neste último: o Espírito Santo é Deus, mas é Deus activo em
nós, que faz recordar. Deus que faz despertar a memória. O Espírito Santo ajuda-nos a
recordar».

 
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MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


 NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

Aquele sal que dá sabor


 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 21 de 26 de Maio de 2013

O cristão, segundo a metáfora evangélica de Mateus (5, 13-14), é chamado a ser sal da terra.
Mas se não transmitir o sabor que o Senhor lhe doou, transforma-se num «sal insípido» e torna-
se «um cristão de museu». Foi este o tema abordado pelo Papa Francisco na missa celebrada na
manhã de quinta-feira 23 de Maio, na capela da Domus Sanctae Marthae.

O Evangelho do dia (Marcos 9, 41-50) inspirou ao Santo Padre uma reflexão sobre a
peculiaridade que caracteriza os cristãos: ou seja, ser para o mundo o que o sal é para a dona de
casa e para quem tem bom gosto e aprecia o sabor dos alimentos. «O sal é bom» iniciou o
Pontífice. Algo bom «que o Senhor criou», mas «se o sal se tornar insípido — perguntou-se —
com que dareis sabor?».

Fala-se sobre o sal da fé, da esperança e da caridade. «O Senhor dá-nos este sal», esclareceu o
Santo Padre que, depois, levantou o problema de como fazer para que «não se torne insípido».
«Como se deve fazer, para que o sal não perca a sua força?». Entretanto, o sabor do sal cristão
— explicou — nasce da certeza da fé, da esperança e da caridade que surge da consciência de
que «Jesus ressuscitou para nós» e nos salvou. Mas esta certeza não nos foi dada simplesmente
para a conservar. Se assim fosse, ela acabaria como o sal conservado num pequeno recipiente:
«não importa, não serve». Ao contrário, o sal — explicou o Papa — tem sentido quando é usado
para dar sabor. Penso que o sal conservado no recipiente com a humidade perde força. E não
serve. O sal que nós recebemos é para doar; serve para dar sabor, para ser oferecido»; caso
2
contrário «torna-se insípido e não serve».

Na reflexão proposta na manhã de quarta-feira 22 de Maio, o Papa afirmou que não se deve
matar em nome de Deus. Só pronunciar esta frase é uma blasfémia. Ao contrário, todos os
homem não só podem, mas devem praticar o bem, seja qual for a fé professada, porque «têm em
sim o mandamento de fazer o bem» pelo facto de terem sido «criados à imagem de Deus».

O trecho do Evangelho de Marcos (9, 38-40) proclamado durante a missa narra as queixas dos
discípulos em relação a uma pessoa que realizava o bem, mas não pertencia ao grupo deles.
«Jesus corrige-os: Não o impeçais, deixai que ele faça o bem. Os discípulos sem pensar, queriam
fixar-se numa ideia: só nós podemos fazer o bem, porque nós temos a verdade. E os que não têm
a verdade não podem praticar o bem» esclareceu o Pontífice.

Contudo, trata-se de uma atitude errada. E Jesus corrige-os. A este ponto é lícito «perguntar:
quem pode fazer o bem e por que razão? O que significa esta frase de Jesus «não o impeçais»?
O que está por detrás?» Neste caso, «os discípulos eram um pouco intolerantes», mas «Jesus
alarga o horizonte e nós podemos pensar que ele diz: Se ele pode fazer o bem, todos o podem
fazer. Inclusive os que não fazem parte do nosso grupo».

«Hoje gostaria de pedir ao Senhor — concluiu — esta graça para todos. Descobrir o mandamento
que todos temos: fazer o bem, não o mal, e trabalhar sobre este encontrarmo-nos praticando o
bem». Um caminho que pode ser percorrido por todos, reafirmou o Papa Francisco, recordando
que «hoje é o dia de santa Rita, padroeira das causas impossíveis»; e, por conseguinte, se isso
parece impossível, «pedimos-lhe esta graça»: que todos façamos o bem como se fôssemos uma
única família. Um «trabalho de criação» definiu-o, obra que se aproxima «da criação do Pai».

Na manhã de terça-feira 21 de Maio, o Papa Francisco voltou a reafirmar um conceito já expresso


noutras ocasiões, ou seja, que o verdadeiro poder é serviço.

«A luta pelo poder na Igreja — frisou o Pontífice — não é uma questão destes dias, eh? Começou
já com Jesus»: quando o Senhor falava da Paixão, os discípulos estavam empenhados em
debater sobre qual deles fosse o mais importante, de forma a merecer «a parte maior» daquela
que o Papa comparou com um bolo para dividir. Mas na Igreja não deve ser assim. O Santo
Padre reafirmou-o citando outro trecho do Evangelho de Mateus (20, 24-26) no qual Jesus explica
aos discípulos qual é o verdadeiro sentido do poder: «Os chefes das nações governam-nas como
seus senhores, e os grandes exercem sobre elas o seu poder Mas, não seja assim entre nós»
afirmou o bispo de Roma. Portanto, sob o ponto de vista do Evangelho, «a luta pelo poder na
Igreja não deve existir. Ou melhor, deve ser a luta pelo poder verdadeiro, ou seja, o que ele, com
o seu exemplo, nos ensinou: o poder do serviço. O verdadeiro poder é o serviço.

Na Igreja não há outro caminho para poder ir em frente. «Para o cristão — esclareceu o Pontífice
3
— ir em frente, progredir, significa abaixar-se. Se não aprendermos esta regra cristã, nunca
poderemos compreender a verdadeira mensagem cristã sobre o poder». Por conseguinte,
progredir quer dizer estar sempre ao serviço. E «na Igreja é maior quem mais serve, quem mais
está ao serviço do próximo. Esta é a regra».

E sobre os milagres que ainda hoje existem, falou na missa celebrada na manhã de segunda-
feira, 20 de Maio. Mas para consentir que o Senhor os faça é necessário uma oração corajosa,
capaz de superar «aquela incredulidade» que habita no coração de cada homem, mesmo se
homem de fé.

Uma oração sobretudo por quantos sofrem devido às guerras, às perseguições e a qualquer outro
tipo de drama, que abala a sociedade de hoje. Mas a oração deve ser concreta, ou seja, envolver
a nossa pessoa e comprometer toda a nossa vida, para superar a incredulidade.

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MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


 NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

A eternidade não será tediosa


 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 22 de 02 de Junho de 2013

São tantos os cristãos que não conhecem a alegria. E até quando estão na Igreja a louvar a
Deus, parece que seguem um cortejo fúnebre e não uma celebração jubilosa. Ao contrário, se
aprendessem a sair de si mesmos e a dar graças a Deus, a «perder tempo louvando a Deus,
compreenderiam realmente o que é a alegria que os liberta».

A alegria cristã esteve no centro da reflexão proposta pelo Papa Francisco, na manhã de sexta-
feira 31 de Maio, durante a missa celebrada na Domus Sanctae Marthae. Ao comentar as leituras
evangélicas do dia, voltou a propor a imagem de Maria como mãe que vai sempre apressada —
como recordou no domingo passado na paróquia romana — o Pontífice prolongou-se sobre
aquele «sobressalto do menino no seio de Isabel» por ela revelado a Maria: «Logo que ouvi a tua
saudação, o menino saltou de alegria no meu seio».

«Tudo é alegria. Mas nós cristãos — observou o bispo de Roma — não estamos muito
habituados a falar de alegria, de júbilo. Penso que muitas vezes nos agrada mais o lamento! O
que é a alegria? A chave para compreender esta alegria é o que nos diz o evangelho: “Isabel
estava cheia do Espírito Santo”. O que nos dá a alegria é o Espírito Santo. Também na primeira
oração da missa pedimos a graça da docilidade ao Espírito Santo, o que nos dá a alegria».

O Papa propôs depois outro aspecto da alegria que nos vem do Espírito. «Pensemos — disse —
naquele momento em que Nossa Senhora e são José levam Jesus ao templo para cumprir a lei.
2
O Evangelho diz que eles vão cumprir o que a lei prescrevia». Naquela mesma circunstância
encontram-se também dois idosos; mas, observou, o evangelho não diz que eles foram lá para
cumprir a lei, mas sim levados pela «força do Espírito Santo. O Espírito leva-os ao templo». A
ponto que diante de Jesus, os dois «fazem uma oração de louvor: mas este é o Messias, bendito
seja o Senhor! E fazem também uma liturgia espontânea de alegria». É a fidelidade adquirida em
tantos anos na esperança do Espírito Santo que faz com que «este Espírito venha e lhes dê
alegria».

Na celebração de 29 de Maio foi a humildade que esteve no centro da reflexão do Papa. O


triunfalismo que pertence aos cristãos passa através da falência humana, a falência da cruz.
Deixar-se tentar pelos outros triunfalismos, pelos triunfalismos mundanos, significa ceder à
tentação de conceber um «cristianismo sem a cruz», um «cristianismo incompleto». O Evangelho
de hoje ( Mc 10, 32-45) descreve o caminho de Jesus, seguido pelos discípulos, rumo a
Jerusalém. Analisando os sentimentos que, naquele momento, se agitavam no coração dos
discípulos «assombrados» e «atemorizados», o Santo Padre quis evidenciar o comportamento do
Senhor que lhes revela a verdade. Jesus «diz a verdade» e mostra-lhes o caminho que acaba
«no terceiro dia».

Não obstante as palavras de Cristo, os discípulos pensam que é melhor parar. E ao mesmo
tempo, observou o Pontífice, começam a debater entre eles sobre «como organizar a Igreja».
Aliás, Tiago e João «pediram a Jesus o cargo de chefe do governo». Mas também os outros
«debatiam e perguntavam quem entre eles era o mais importante» na Igreja que queriam
organizar. Cristo, explicou o Papa, estava prestes a cumprir a sua missão, ao passo que os
discípulos falavam sobre «outro projecto, outro ponto de vista da Igreja».

E na manhã de terça-feira 28 de Maio o tema da reflexão foi o sofrimento. Ao comentar o


evangelho do dia (Mc 10, 28-31), o Pontífice afirmou que o sofrimento faz parte da vida; mas para
o cristão, chamado a seguir o mesmo caminho de Cristo, ele torna-se mais um valor. Muito mais
quando se apresenta sob forma de perseguição, por causa do espírito do mundo que não tolera o
testemunho cristão.

Seguir Jesus não pode ser só uma expressão cultural, nem um modo para adquirir poder. O
Pontífice observou que a «história da Igreja está cheia de pessoas assim, começando por alguns
imperadores, governantes e muitas pessoas. E também, não quero dizer muitos, mas alguns,
sacerdotes e bispos. Muitos cristãos, tentados pelo espírito do mundo — acrescentou — pensam
que seguir Cristo» é bom porque «assim podem fazer carreira, ter sucesso».

Eis então o convite a reflectir sobre a resposta de Jesus: «Não há ninguém que tenha deixado
casa ou irmãos, irmãs, mãe, pai, filhos ou campos por minha causa ou por causa do Evangelho,
que não receba já agora, neste tempo, o cêntuplo, em casas, irmãos... mas também em
perseguições. Não o esqueçamos».
3
Sobre o fascínio do provisório, a sensação de ser dono do tempo e a cultura do bem-estar não
importa como, que muitas vezes impedem que o homem de hoje siga de perto Jesus, o Papa
Francisco falou na segunda-feira, 27 de Maio: «Parecem-nos duas riquezas» mas na realidade
não nos fazem «ir em frente».

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MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

A difícil ciência do amor

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 23 de 09 de Junho de 2013

A «ciência da carícia» manifesta dois aspectos do amor: a proximidade e a ternura. E «Jesus


conhece bem esta bonita ciência». Disse o Papa Francisco, celebrando na manhã de sexta-feira,
7 de Junho, a missa da solenidade do Sacratíssimo Coração de Jesus, na capela da Domus
Sanctae Marthae.

Ao referir-se às leituras do dia, o Pontífice definiu a solenidade do Sagrado Coração de Jesus


como a «festa do amor»: Jesus «quis mostrar-nos o seu coração, como o coração que amou
muito. Portanto, hoje façamos esta comemoração. Sobretudo do amor de Deus. Deus amou-nos
muito. Penso no que nos dizia santo Inácio. Indicou-nos dois critérios sobre o amor. Primeiro: o
amor manifesta-se mais nas obras do que nas palavras. Segundo: há mais amor em dar do que
em receber».

Mas, perguntou-se o Pontífice, «como é pastor o Senhor»? E afirmou: «O Senhor diz-nos muitas
coisas, mas mencionarei só duas. A primeira está no livro do profeta Ezequiel: Eis que eu mesmo
procurarei as minhas ovelhas, examiná-las-ei. Examinar significa que as conhece, todas pelo
nome. Examinar. E Jesus diz-nos o mesmo: conheço as minhas ovelhas. Conhece uma por uma,
pelo nome. Assim Deus nos conhece: não em grupo, mas um por um. Porque — explicou o bispo
de Roma — o amor não é abstracto, nem geral para todos; é um amor por cada um. Assim Deus
nos ama».
2
Na missa de quinta-feira, 6 de Junho o Papa Francisco dirigiu um convite a descobrir «os ídolos
escondidos nas muitas dobras que temos na nossa personalidade», a «afugentar o ídolo da
mundanidade, que nos leva a torna-nos inimigos de Deus. Entre os presentes, estavam os
funcionários da Biblioteca Apostólica Vaticana e da Pontifícia Universidade Lateranense.

A exortação a empreender «o caminho do amor de Deus», «para chegar» ao seu reino foi o
âmago de uma reflexão centrada no trecho do evangelho de Marcos (12, 28-34), no qual Jesus
responde ao escriba que o interroga sobre qual é o mandamento mais importante. A primeira
observação do Pontífice é que Jesus não responde com uma explicação, mas usando a palavra
de Deus: «Ouve, Israel! O Senhor nosso Deus é o único Senhor». Estas, disse, «não são
palavras de Jesus». De facto, ele dirige-se ao escriba como tinha feito com Satanás nas
tentações, «com a palavra de Deus; não com as suas palavras». Fá-lo utilizando «o credo de
Israel, que os judeus recitam, e até muitas vezes ao dia: Shemá Israel! Recorda-te Israel, de amar
só Deus».

As pessoas que vivem no «subsolo da existência», em condições «extremas», estiveram no


centro da reflexão proposta na missa celebrada na manhã de 5 de Junho.

E sobre a corrupção voltou a falar na manhã de terça-feira, 4 de Junho, propondo uma reflexão
sobre a linguagem que habitualmente é usada pelos corruptos, isto é, a da hipocrisia: a mesma,
disse, usada por Satanás no deserto quando tentou Jesus de vários modos.

A hipocrisia, frisou, é «a língua dos corruptos. Eles não gostam da verdade. Amam só a si
mesmos e assim procuram enganar, envolver o outro na sua mentira, na sua farsa. Têm o
coração mentiroso; não podem dizer a verdade. A hipocrisia é a língua dos corruptos. Satanás
usou-a depois do jejum no deserto: “tens fome: podes transformar esta pedra em pão...”; “para
que tanto trabalho, lança-te do templo...”. Esta linguagem, que parece persuasiva, produz erro,
mentira». Assim, aqueles fariseus — continuou o Papa, voltando à narração evangélica — «são
tão amáveis na linguagem, são os mesmos que na quinta-feira à noite irão buscá-lo ao horto das
oliveiras e na sexta-feira levá-lo-ão a Pilatos.

Portanto, a hipocrisia é a linguagem da corrupção e certamente não a «linguagem da verdade,


porque a verdade — frisou o bispo de Roma — nunca vem sozinha, mas sempre com o amor.
Não há verdade sem amor. O amor é a primeira verdade. E se não há amor não há verdade».

O pensamento do Papa Francisco na missa de segunda-feira 3 de Junho foi dirigido de novo ao


seu predecessor João XXIII — um «modelo de santidade», definiu-o — para recordar o
cinquentenário da sua morte, mas também e sobretudo para relançar o seu testemunho num
tempo em que até na Igreja há quem escolhe a estrada da corrupção e não a do amor, como
resposta ao dom de Deus para o homem.
3
Durante a homilia, o Papa Francisco quis partilhar com os participantes algumas reflexões sobre
o evangelho de Marcos (12, 1-12). «Penso — disse — nas três figuras de cristãos na Igreja: os
pecadores, os corruptos e os santos. Dos pecadores não é preciso falar muito, porque todos nós
somos tais. Conhecemo-nos a partir de dentro e sabemos o que é um pecador. E se algum de
nós não se sente assim, deve fazer uma consulta com o médico espiritual: algo não funciona». O
Santo Padre deteve-se mais sobre a figura dos corruptos. Na parábola evangélica, explicou,
Jesus fala do amor grande do proprietário de uma vinha, símbolo do povo de Deus: «Ele chamou-
nos com amor, protege-nos. Mas dá-nos a liberdade, dá-nos todo este amor “emprestado”. É
como se nos dissesse: Preserva e protege o meu amor como eu te protejo. É o diálogo entre
Deus e nós: proteger o amor. Tudo começa com este amor».

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MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

A humildade concreta do cristão


 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 24 de 16 de Junho de 2013

Sem humildade, sem a capacidade de reconhecer publicamente os próprios pecados e a própria


fragilidade humana, não se pode alcançar a salvação nem pretender anunciar Cristo ou ser suas
testemunhas. Isto vale também para os sacerdotes: os cristãos devem-se recordar sempre que a
riqueza da graça, dom de Deus, é um tesouro para ser conservado em «vasos de barro» a fim de
que seja claro o poder extraordinário de Deus, do qual ninguém se pode apropriar «para o seu
currículo pessoal».

Mais uma vez o Papa Francisco convidou a reflectir sobre o tema da humildade cristã durante a
missa da manhã de 14 de Junho.

As leituras do dia foram o fulcro da meditação do Papa que relacionou a imagem da «beleza de
Jesus, da sua força e da salvação que Ele nos traz» com a dos «vasos de barro» nos quais está
contido o tesouro da fé.

Os cristãos são como vasos de barro, porque são débeis. Não obstante isso, frisou o Papa, entre
«nós miseráveis vasos de barro» e «o poder de Jesus Cristo salvador» instaura-se o «diálogo da
salvação». Mas, advertiu, quando este diálogo assume o tom de uma auto-justificação significa
que algo não funciona e não há salvação. Mas nos homens acontece algo de diverso. «Temos
sempre a tentação do currículo e de esconder o prontuário para que não se veja muito» o que
não está bem. A humildade do cristão é a que segue o caminho indicado pelo apóstolo. Este
2
modelo de humildade vale também «para nós padres, para nós sacerdotes. Se nos gabarmos só
do nosso currículo e nada mais — disse o bispo de Roma — acabaremos por errar».

Na missa da manhã de quinta-feira 13 de Junho o Papa frisou que a cólera e o insulto ao irmão
podem matar, comentando o trecho evangélico de Mateus (5, 20-26) da liturgia do dia, no qual se
narra que quem quer que se irrite com o seu irmão deverá ser submetido a juízo. Com o Papa, no
dia em que se completavam três meses desde a sua eleição, estavam presentes alguns
diplomatas argentinos. Na primeira fila o pessoal da Embaixada junto da Santa Sé e o da
Embaixada na Itália, os representantes do país junto da Organização das Nações Unidas para a
Alimentação e a Agricultura (Fao) e junto da Soberana Ordem Militar de Malta (Smom), e os
empregados do consulado argentino em Roma e em Milão.

E das tentações que devem ser enfrentadas neste momento da história da Igreja, o Papa falou na
manhã de quarta-feira, 12 de Junho. Voltar atrás — disse comentando as leituras — tiradas da
segunda carta de são Paulo aos Coríntios (3, 4-11) e do evangelho de Mateus (5, 17-19) —
porque se receia a liberdade que vem da lei «cumprida no Espírito Santo»; ceder a um
«progressismo adolescente», isto é, incline a seguir os valores mais cativantes propostos pela
cultura dominante.

Não se trata de verdadeiro progressismo: é uma cultura que vai em frente, da qual não
conseguimos desapegar-nos e da qual tiramos as leis e os valores que mais nos agradam, como
fazem precisamente os adolescentes. Trata-se de uma tentação frequente neste momento
histórico para a Igreja. Concelebraram, entre outros, os cardeais Manuel Monteiro de Castro,
penitenciário-mor, e João Braz de Aviz, prefeito da Congregação para a Vida Consagrada e as
Sociedades de Vida Apostólica.

Na celebração de 11 de Junho o tema da reflexão da homilia proposta pelo Pontífice foi os sinais
da gratuidade. «Pobreza e louvor a Deus: são as duas coordenadas principais da missão da
Igreja, os sinais que revelam ao povo de Deus se um apóstolo vive a gratuidade».

A reflexão do Pontífice, comentando como de costume as leituras do dia, foi totalmente centrada
sobre o tema da gratuidade. Porque, explicou, «a pregação evangélica nasce da gratuidade, da
admiração da salvação; e o que recebemos gratuitamente, devemos dar de graça». Vê-se isto
quando Jesus envia os seus apóstolos e lhes dá instruções para a missão que os espera. «São
recomendações — evidenciou o Santo Padre — muito simples: não procureis ouro nem prata
nem dinheiro»; dado que serão suficientes «os cintos, o alforge de viagem, as duas túnicas, as
sandálias, o bastão» para a tarefa que lhes foi confiada. Uma missão de salvação, acrescentou
Jesus, que consiste em curar os enfermos, ressuscitar os mortos, purificar os leprosos e expulsar
os demónios.

A frase-chave das recomendações de Cristo aos seus é: «gratuitamente recebestes, de graça


3
dais»: palavras nas quais se encontra toda «a gratuidade da salvação». Porque — esclareceu o
Pontífice — «não podemos pregar, anunciar o reino de Deus, sem esta certeza interior de que
tudo é gratuito, tudo é graça». E quando agimos sem deixar espaço à graça, afirmou o Papa,
então «o Evangelho não tem eficácia».

Por que existem pessoas com o coração fechado à salvação? Foi nesta interrogação que o Papa
Francisco centrou a homilia da missa de 10 de Junho, concelebrada, entre outros, pelo cardeal
Stanis?aw Ry?ko, presidente do Pontifício Conselho para os Leigos. Uma pergunta que encontra
uma resposta e uma explicação no medo, porque — explicou o Pontífice — a salvação nos
assusta. É uma atracção que desencadeia os temores mais recônditos do nosso coração.
«Temos necessidade» da salvação, mas ao mesmo tempo «temos medo» dela porque «quando o
Senhor vem para nos salvar, devemos dar tudo... mas temos medo disto». Com efeito, os
homens querem «mandar», desejam ser «os senhores» de si mesmos. Assim, «não chega a
salvação, a consolação do Espírito».

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PAPA FRANCISCO

MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

Um coração em busca do tesouro verdadeiro


 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 25 de 23 de Junho de 2013

«O amor, a caridade, o serviço, a paciência, a bondade e a ternura» são os «tesouros


lindíssimos» sobre os quais o Papa Francisco falou na manhã de sexta-feira, 21 de Junho,
durante a missa na capela da Domus Sanctae Marthae.

A primeira coisa a fazer, explicou o Santo Padre, é perguntar: «Qual é o meu tesouro?». E
certamente não podem ser as riquezas, dado que o Senhor diz: «Não acumuleis para vós
tesouros na terra, porque no final perdem-se». De resto, frisou o Papa, são «tesouros a risco, que
se perdem»; e são também «tesouros que devemos deixar, não os podemos levar connosco.
Nunca vi um camião de mudança atrás de um cortejo fúnebre», comentou. Então, perguntou-se,
qual é o tesouro que podemos levar connosco no final da nossa vicissitude terrena? A resposta é
simples: «Podemos levar o que demos, só isso. Mas o que poupamos para nós mesmos, não
podemos levar connosco». São coisas que os ladrões podem roubar, que se deterioram ou que
ficarão para os herdeiros. Enquanto «aquele tesouro que demos aos outros» durante a vida, levá-
lo-emos connosco depois da morte «e ele será “o nosso mérito”»; ou melhor, frisou, «o mérito de
Jesus Cristo em nós». Também porque é a única coisa «que o Senhor nos deixa levar». O próprio
Jesus disse-o claramente aos doutores da lei que se gabavam da beleza do templo de Jerusalém:
«Não permanecerá pedra sobre pedra». Isto vale também «para os nossos tesouros, que
dependem das riquezas, do poder humano».
2
Na manhã de quinta-feira, 20 de Junho, o Papa Francisco relançou o conselho dado por Jesus
aos apóstolos. Não há necessidade — disse — de desperdiçar muitas palavras para rezar: o
Senhor sabe o que lhe queremos dizer. O importante é que a primeira palavra da nossa prece
seja «Pai». O Papa afirmou também que a oração não deve ser considerada uma fórmula
mágica: «A oração não é algo mágico; não se faz magia com a oração». Narrando a sua
experiência pessoal, como faz de costume, disse que nunca se dirigiu a bruxas que prometem
magias mas soube o que acontece em encontros deste tipo: desperdiçam-se tantas palavras para
se obter «às vezes a cura, ou outras coisas» com a ajuda da magia. E advertiu: «isto é pagão».

Então, como devemos rezar? Foi Jesus quem no-lo ensinou: «Diz que o Pai que está nos céus
“sabe do que precisamos, ainda antes que lho peçamos”». Portanto, a primeira palavra seja
«“Pai”. Esta é a chave da oração. Sem dizer, sem sentir esta palavra, não se pode rezar»,
explicou o bispo de Roma. E perguntou-se: «A quem rezo? Ao Deus Todo-Poderoso? Está
demasiado distante. Não o ouço, nem Jesus o ouvia. A quem rezo? Ao Deus cósmico? Mais ou
menos habitual nestes dias, não? Rezar ao Deus cósmico. Esta modalidade politeísta que tem
origem numa cultura superficial».

Ao contrário, devemos «rezar ao Pai», àquele que nos criou. E não só: é preciso rezar ao Pai
«nosso», isto é, não ao Pai de um genérico e demasiado anónimo «todos», mas àquele «que nos
gerou, nos deu a vida, a ti, a mim», como pessoa única, explicou o Pontífice. É o Pai «que nos
acompanha no nosso caminho», que «conhece toda a nossa vida, toda»; àquele que sabe o que
«é bom e o que não é tão bom. Conhece tudo». Mas ainda não é suficiente: «Se não
começarmos a oração — frisou — com esta palavra não pronunciada pelos lábios, mas dita com
o coração, não podemos rezar como cristãos».

No dia anterior, 19 de Junho, o Papa Francisco indicou as categorias de «hipócritas que Jesus
tanto reprova»: «intelectuais sem talento, eticistas sem bondade, portadores de belezas de
museu». Na homilia o Pontífice recordou que «o Senhor fala várias vezes no evangelho sobre a
hipocrisia» e «contra os hipócritas», enumerando os episódios mais significativos. Trata-se, disse
actualizando o discurso, «de cristãos intelectuais sem talento». Não sabem o que é a bondade.
São eticistas: deve-se fazer isto e isto e isto... Enchem-se de preceitos mas «sem bondade».
Enfeitam-se com «vestes, muitos objectos para fingir que são majestosos, perfeitos»; contudo,
«não têm o sentido da beleza. Só conseguem uma beleza de museu».

Na manhã de terça-feira, 18 de Junho, o Papa convidou a amar os nossos inimigos, aqueles que
nos perseguem e nos fazem sofrer, é difícil e nem sequer é um «bom negócio» porque nos
empobrece. E no entanto é esta a estrada indicada e percorrida por Jesus para a nossa salvação.

O Papa advertiu também sobre as atitudes que justificam a vingança de acordo com o grau da
ofensa recebida, do mal causado pelos outros: isto é, a vingança fundada no princípio «olho por
olho, dente por dente». Com o perdão, com o amor pelo inimigo tornamo-nos mais pobres. Mas
3
aquela pobreza é semente fecunda para os outros, como a pobreza de Jesus se tornou graça
para todos nós, salvação. Pensemos nos nossos inimigos, em quem não nos ama. Seria bom se
oferecêssemos a missa por eles, se oferecêssemos o sacrifício de Jesus por eles que não nos
amam. E também por nós, para que o Senhor nos ensine esta sabedoria: tão difícil mas ao
mesmo tempo tão bonita e que nos torna semelhantes também ao seu Filho, que na sua
humilhação se fez pobre para nos enriquecer com a sua pobreza».

Na missa celebrada na manhã de segunda-feira, 17 de Junho, o Papa falou do que distingue o


cristão. O nada — disse — é semente de guerra, sempre; porque é semente de egoísmo. O tudo
é Jesus». É na compreensão correcta deste binómio que se fundam a mansidão e a
magnanimidade». Quando somos propensos a seguir o nada, «nascem os conflitos em família,
com os amigos, na sociedade. Até os conflitos que terminam em guerra».

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MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

 Cristãos de acção e de verdade


 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 26 de 30 de Junho de 2013

Temos necessidade de «cristãos de acção e de verdade», cuja vida se «funda sobre a rocha de
Jesus», e não de «cristãos de palavras», superficiais como os gnósticos ou severos como os
pelagianos, disse o Papa Francisco retomando um tema que muito lhe agrada, na missa
celebrada na manhã de quinta-feira, 27 de Junho, na capela da Domus Sanctae Marthae.
Concelebraram, entre outros, o cardeal Raymundo Damasceno Assis, arcebispo de Aparecida e
presidente da Conferência episcopal brasileira.

A reflexão do Papa, inspirada como de costume pelas leituras do dia, teve início em particular a
partir do trecho do evangelho de Mateus (7, 21-29), no qual — explicou o Pontífice — «o Senhor
nos fala do nosso fundamento, a base da nossa vida cristã» e diz-nos que este «fundamento é a
rocha». Isto significa que «devemos construir a casa», ou seja, a nossa vida, sobre a rocha que é
Cristo. Quando são Paulo fala sobre a rocha no deserto refere-se a Cristo, frisou o Papa. Ele é a
única rocha «que pode dar-nos segurança», a ponto que «somos convidados a construir a nossa
vida sobre esta rocha de Cristo. Não sobre outra».

E sobre a graça da paternidade centrou-se a reflexão do Papa Francisco durante a missa de


quarta-feira 26 de Junho. O Pontífice recordou sobretudo que «todos nós, para sermos maduros,
devemos sentir a alegria da paternidade». Um discurso, acrescentou imediatamente, que é válido
2
também no caso do celibato sacerdotal porque «paternidade é dar a vida pelos outros»: portanto,
para os sacerdotes será «uma paternidade pastoral, a paternidade espiritual» que é sempre e
contudo «um dar a vida, tornar-se pai».

Na missa celebrada na manhã de 25 de Junho o Papa Francisco, referindo-se à «luta pela terra»
entre Abraão e Lot, narrada no capítulo 13 do Génesis (2.5-18), frisou que o caminho para a paz
no Médio Oriente é indicado pela «sabedoria» de Abraão, pai comum na fé para judeus, cristãos
e muçulmanos. «Quando leio isto, penso no Médio Oriente e peço tanto ao Senhor que nos dê a
sabedoria, esta sabedoria: não nos confrontemos — tu ali, eu aqui — pela paz» disse no início da
homilia. Abraão, acrescentou, recorda-nos também que «ninguém é cristão por acaso», porque
Deus nos chama pelo nome e com «uma promessa».

Concelebraram, entre outros, os cardeais Camillo Ruini e Robert Sarah, presidente do Pontifício
Conselho Cor Unum, que acompanhava um grupo de oficiais e colaboradores do dicastério.

Há uma promessa, recordou o Pontífice, na raiz da história de Abraão que se preparava para
deixar a sua terra «sem saber para onde ir, mas para onde o Senhor lhe teria indicado». O Santo
Padre repercorreu as suas vicissitudes, a passagem pelo Egipto e, sobretudo, a disputa pela
questão da terra e a paz com Lot. O Papa Francisco repetiu as belíssimas palavras do Génesis:
«Então o Senhor disse a Abraão: “Ergue os olhos e, do lugar onde estás, dirige o olhar para norte
e para sul”, em todas as direcções, tudo é teu, tudo será teu e da tua descendência».

Abraão, frisou o Pontífice, «parte da sua terra com uma promessa. Todo o seu caminho é ir rumo
a esta promessa. O seu percurso é também um modelo para o nosso. Deus chama Abraão, uma
pessoa, e dela faz um povo. Se formos ao livro do Génesis, no início, à criação, poderemos
constatar que Deus criou as estrelas, as plantas e os animais». Tudo no plural. Mas «criou o
homem: singular. Um. Deus fala-nos sempre no singular porque nos criou à sua imagem e
semelhança. Deus fala-nos no singular, e falou a Abraão, fez-lhe uma promessa e convidou-o a
sair da sua terra». Também «nós cristãos — continuou o Papa — somos chamados no singular.
Nenhum de nós é cristão por mero caso: ninguém. És chamado tu, tu e tu». É uma chamada
«pelo nome, com uma promessa: vai em frente, estou contigo, caminho ao teu lado».

Certamente, reconheceu, «há muitos problemas, momentos difíceis. Também Jesus passou por
tantos, mas sempre com aquela segurança: o Senhor chamou-me, está comigo, Ele fez-me uma
promessa. Mas o Senhor errou em relação a mim? O Senhor é fiel, porque jamais poderá negar-
se a si mesmo. Ele é a fidelidade». O Papa concluiu desejando que «o Senhor dê a todos nós a
mesma vontade de ir em frente que teve Abraão» inclusive no meio das dificuldades. Ir em frente,
com a segurança de Abraão, a certeza de que «o Senhor me chamou, que me prometeu muitas
coisas boas, que está comigo».

E na manhã de segunda-feira, 24 de Junho, festa litúrgica da natividade de São João Baptista,


3
que a Igreja venera como «o maior homem nascido de mulher», o Papa propôs uma Igreja que se
inspire na figura do santo: que «exista para proclamar, para ser voz de uma palavra, do seu
esposo que é a palavra» e «para proclamar esta palavra até ao martírio» que lhe foi infligido pelos
«mais soberbos da terra». Com o Pontífice concelebrou, entre outros, o cardeal Gianfranco
Ravasi, presidente do Pontifício Conselho para a Cultura e da Pontifícia Comissão de Arqueologia
Sacra, que acompanhava um grupo de oficiais e colaboradores das duas entidades.

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MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

Misericórdia, festa e memória

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 27 de 07 de Julho de 2013

«Deixemo-nos proteger pela misericórdia de Jesus; façamos festa» com ele; e mantenhamos viva
a «memória», dado que na vida encontrámos «a salvação»: foi tríplice o convite que sobressaiu
da reflexão do Papa Francisco durante a missa de sexta-feira, 5 de Julho, na capela da Domus
Sanctae Marthae.

Entre os concelebrantes estava, entre outros, o cardeal Jorge Liberato Urosa Savino, arcebispo
de Caracas, no dia da festa nacional na Venezuela. A seguir, o Pontífice comentou na homilia o
trecho do Evangelho de Mateus (9, 9-13), que narra a conversão do mesmo autor, cobrador de
impostos, que se tornou um dos doze. A mensagem de Jesus — explicou — foi retomada «pela
tradição do povo de Israel. Uma mensagem profética, mas que o povo teve sempre dificuldade de
compreender: quero misericórdia, não sacrifícios». Com efeito, o nosso é o Deus da misericórdia.
Isso é evidente precisamente na vicissitude de Mateus, que «não é uma parábola»: é uma
realidade «concreta; aconteceu».

O tema da liberdade dos filhos de Deus esteve no centro da homilia da missa celebrada na
manhã de quinta-feira 4 de Julho. Ela é o fruto da reconciliação com o Pai actuada por Jesus, o
qual assumiu sobre si os pecados de todos os homens e redimiu o mundo com a sua morte na
cruz. Ninguém, frisou o Pontífice, nos pode privar desta identidade. Se existisse um «bilhete de
identidade», disse o Papa, para os cristãos, certamente a liberdade estaria entre as suas
principais características.
2
Reconciliar o mundo em Cristo em nome do Pai: «esta é a missão de Jesus. O resto, as curas, o
ensinamento, as reprovações são só sinais daquele milagre mais profundo que é a recriação do
mundo. Uma linda oração da Igreja diz: “Ó Senhor vós que criastes maravilhosamente o mundo,
mais maravilhosamente o redimistes, recriastes”». Portanto, a reconciliação é recriação do mundo
e a missão mais profunda de Jesus é a redenção de todos nós, pecadores. E «Jesus —
acrescentou o Papa — faz isto não com palavras, nem com gestos ou caminhando nas ruas, não!
Fá-lo com a sua carne. É precisamente Deus que se torna um de nós, homem, para nos curar a
partir de dentro». Mas, perguntou-se o Pontífice, «podemos dizer que Jesus se fez pecador? Não
é exactamente assim, porque ele não podia pecar. São Paulo diz a palavra justa: não se fez
pecador, fez-se pecado (cf. 2 Cor 5, 21). Assumiu sobre si todo o pecado. E isto é bom, esta é a
nova criação», é «Jesus que desce da glória e se humilha até à morte e morte de cruz. Esta é a
sua glória e esta é a nossa salvação. E a cruz, no final, faz-se pecado (cf. ibid.)».

Pôr as mãos na carne de Jesus, pôr o dedo nas chagas de Jesus ressuscitado foi o tema central
da homilia pronunciada durante a missa celebrada na manhã de quarta-feira, 3 de Julho. A festa
de são Tomé apóstolo ofereceu ao Papa Francisco a ocasião para falar de novo sobre este tema
que lhe é particularmente querido.

É preciso que saiamos de nós mesmos — frisou o Papa Francisco — e prossigamos nos
caminhos do homem para descobrir que as chagas de Jesus são visíveis ainda hoje no corpo de
todos aqueles irmãos que têm fome e sede, que estão nus, humilhados e escravos, que se
encontram em prisões e hospitais. E precisamente ao tocar estas chagas, acariciando-as, é
possível «adorar o Deus vivo no meio de nós».

O Santo Padre iniciou a homilia da missa de terça-feira, 2 de Julho, evidenciando precisamente a


singularidade da liturgia do dia (Gn 19, 15-29; Sl 25; Mt 8, 23-27) que faz pensar em certas
situações «conflituais», difíceis de enfrentar. Reflectir sobre elas, frisou, «far-nos-á bem». A
tentação, a curiosidade, o temor e, por fim, a graça. São quatro situações que se podem verificar
quando nos encontramos diante de uma dificuldade.

A primeira atitude pode ser indicada na lentidão com a qual Lot responde ao convite do anjo que
lhe diz para se apressar a deixar a cidade, antes que seja destruída. A segunda atitude é tirada
da narração da fuga de Lot. «O anjo — recordou o Papa — disse-lhe que não olhasse para trás:
“Foge e não olhes para trás, vai em frente”. Também aqui está um conselho para superar a
nostalgia do pecado». Contudo, às vezes não é suficiente superar a nostalgia «porque — advertiu
o Papa Francisco — existe a tentação inclusive da curiosidade. Foi o que aconteceu com a
esposa de Lot». Portanto, diante do pecado é preciso fugir sem nostalgia e recordar que «a
curiosidade não serve, faz mal». Fugir e não olhar para trás, porque «todos somos frágeis e
devemos defender-nos».

A terceira atitude sobre a qual o Papa Francisco falou é o temor. A referência é o episódio,
3
narrado no evangelho de Mateus (8, 23-27), da barca na qual se encontram os apóstolos e que
de repente é investida pela tempestade. «A barca estava coberta pelas ondas — recordou o
Pontífice — “Salva-nos, Senhor! Estamos perdidos”, dizem. O temor é uma tentação do demónio.
Ter medo de ir frente no caminho do Senhor».

A quarta atitude refere-se à graça do Espírito Santo, que se manifesta «quando Jesus faz voltar a
bonança sobre o mar. E todos permanecem cheios de admiração». Portanto, diante do pecado,
da nostalgia, do medo é necessário «olhar para o Senhor — evidenciou o Pontífice — contemplar
o Senhor», conservando aquela «maravilha tão agradável de um novo encontro com o Senhor.
“Senhor, sinto esta tentação, quero permanecer nesta situação de pecado. Senhor, tenho a
curiosidade de saber como estão as coisas. Senhor, tenho medo...”, mas depois os discípulos
olharam para o Senhor: “Salva-nos Senhor, estamos perdidos”. E veio a maravilha do novo
encontro com Jesus. Não sejamos ingénuos nem tíbios: sejamos valorosos, corajosos. Sim,
somos débeis mas devemos ser corajosos na nossa fragilidade».

Na missa celebrada a 1 de Julho o Pontífice exortou a reflectir sobre a coragem de negociar com
o Senhor. Se se quiser obter algo de Deus é necessário ter a coragem de «negociar» com Ele
através de uma oração insistente e convicta, feita de poucas palavras, melhor se forem as do
Salmo 102. O Papa Francisco voltou a falar sobre a coragem que deve amparar a oração dirigida
ao Pai, com «toda a familiaridade possível». E citou como exemplo a oração de Abraão, o seu
modo de falar com Deus como se estivesse a negociar, exactamente, com outro homem. E
concluiu a homilia exortando a que «a partir de hoje todos nós por 5 minutos durante o dia
recitemos lentamente o Salmo 102, o mesmo que recitámos entre as duas leituras. «Bendiz, ó
minha alma, o Senhor, e toda a minha vida interior, o seu santo Nome; bendiz, ó minha alma, o
Senhor, e não esqueças todos os seus benefícios. É Ele quem perdoa as tuas culpas, e sara
todas as tuas enfermidades; é Ele quem resgata a tua vida do túmulo, e te coroa de graças e
bondade». Rezemo-lo inteiramente. E assim aprenderemos o que devemos dizer ao Senhor,
quando pedimos uma graça».

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MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

A graça da alegria
 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 36 de 08 de Setembro de 2013

Ser cristão significa sentir a alegria de pertencer totalmente a Cristo, «único esposo da Igreja» e ir
ao encontro dele como se fôssemos para uma festa de casamento. Portanto, a alegria e a
consciência da centralidade de Cristo são as duas atitudes que os cristãos devem cultivar no dia-
a-dia. Recordou o Papa Francisco na homilia da missa celebrada na sexta-feira, 6 de Setembro.

A reflexão do Papa Francisco inspirou-se no episódio evangélico proposto pela liturgia, no qual o
evangelista Lucas narra o confronto entre Jesus, os fariseus e os escribas sobre o facto que os
discípulos que estão com ele comem e bebem enquanto os outros jejuam (Lc 5, 33-39). O
Pontífice explicou o que Jesus, na sua resposta aos escribas, quer fazer entender. Ele apresenta-
se como esposo: «Ele é o esposo. A Igreja é a esposa. E no Evangelho — frisou o Papa —
muitas vezes esta imagem volta: as virgens prudentes que esperam o esposo com as lâmpadas
acesas; a festa que o pai faz para as núpcias do filho». Com a sua resposta aos escribas,
explicou o Pontífice, «o Senhor diz que quando se é esposo não se pode jejuar, não se pode ficar
triste. O Senhor faz-nos ver aqui a relação entre ele e a Igreja como núpcias». Eis, explicou, «o
motivo mais profundo pelo qual a Igreja protege muito o sacramento do matrimónio. E chama-o
sacramento grande porque é precisamente a imagem da união de Cristo com a Igreja». Portanto,
quando se fala de núpcias «fala-se de festa, de alegria; e isto indica a nós cristãos uma atitude»:
o cristão quando encontra Jesus Cristo e começa a viver segundo o Evangelho, deve fazê-lo com
alegria. Uma alegria «porque é uma grande festa».
2
Quando o Senhor passa na nossa vida, diz-nos sempre uma palavra e faz-nos uma promessa.
Mas pede-nos também para nos despojarmos de algo e confia-nos uma missão. Recordou o
Papa Francisco durante a missa celebrada na manhã de quinta-feira, 5 de Setembro.

O Senhor passa na nossa vida como aconteceu na vida de Pedro, de Tiago e de João. Neste
caso, o Senhor passou na vida dos seus discípulos com um milagre. Mas, esclareceu o Papa,
«Jesus nem sempre passa na nossa vida com um milagre». Embora, acrescentou ainda, «faz-se
sempre ouvir. E quando o Senhor passa, diz-nos algo, faz-nos sentir algo, depois diz-nos uma
palavra, que é uma promessa; pede-nos algo no nosso modo de viver, que deixemos algo, para
nos desprendermos das coisas. Além disso, confia-nos uma missão».

Estes três aspectos da passagem de Jesus na nossa vida estão bem representados no trecho de
Lucas. O Senhor, quando vem à nossa vida, quando passa no nosso coração, diz-nos sempre
uma palavra e faz-nos uma promessa: «Vai em frente, com coragem, não temas: tu farás isto!». É
um «convite a segui-lo». E «quando ouvimos este convite e constatamos que na nossa vida há
algo errado, devemos corrigi-lo» e devemos estar prontos para deixar qualquer coisa, com
generosidade. Por fim, o momento da missão: a oração ajuda-nos sempre a compreender o que
«devemos fazer». Eis então a síntese do nosso orar: «Ouvir o Senhor, ter a coragem de nos
despojarmos de algo que nos impede de o seguir imediatamente e, por fim, assumir a missão».
Isso não quer dizer que não se devem enfrentar algumas tentações. Pedro, recordou o Papa
Francisco, pecou gravemente renegando Jesus. Mas depois o Senhor perdoou-o, Tiago e João
pecaram devido ao carreirismo. Mas também a eles o Senhor concedeu o perdão. Por
conseguinte, é importante rezar tendo bem presentes estes três momentos.

A humildade, a mansidão, o amor, a experiência da cruz são os meios através dos quais o
Senhor derrota o mal. E a luz que Jesus trouxe ao mundo vence a cegueira do homem, muitas
vezes deslumbrado pela falsa luz do mundo, mais poderosa mas enganadora. Cabe a nós saber
discernir qual é a luz que vem de Deus. Este é o sentido da reflexão proposta pelo Papa
Francisco durante a missa celebrada na terça-feira de 3 de Setembro.

Ao comentar a primeira leitura, o Santo Padre meditou sobre a «boa palavra» que são Paulo
dirigiu aos Tessalonicenses. Onde parece claro o que o apóstolo quer dizer: «a identidade cristã é
identidade da luz, não das trevas». E Jesus trouxe esta luz ao mundo. Hoje — acrescentou o
Pontífice — pensamos que seja possível obter esta luz que rasga a escuridão através das
descobertas científicas e de outras invenções do homem. Mas «a luz de Jesus — admoestou o
Papa — não é uma luz de ignorância! É uma luz de sabedoria, de conhecimento. A luz que o
mundo nos oferece é uma luz artificial. Forte como um fogo de artifício, como um flash de
fotografia. Ao contrário a luz de Jesus é uma luz humilde, é uma luz suave, uma luz de paz. É
como a luz da noite de Natal: sem pretensões. Não faz espectáculo; vem do coração. É verdade
que o demónio muitas vezes vem disfarçado como anjo de luz. Ele gosta de imitar a luz de
Jesus».
3
«Peçamos ao Senhor — foi a exortação conclusiva do Papa Francisco — que nos dê hoje a graça
da sua luz e nos ensine a distinguir quando a luz é a sua luz e quando é uma luz artificial
irradiada pelo inimigo para nos enganar».

Foi profunda a reflexão proposta pelo Papa Francisco na homilia da missa celebrada na segunda-
feira de 2 de Setembro.

A língua, a tagarelice, o mexerico são armas que todos os dias insidiam a comunidade humana,
semeando inveja, ciúmes e ganância do poder. Com elas chega-se até a matar uma pessoa.
Portanto, falar de paz significa também pensar em quanto mal se pode fazer com a língua. O
Papa inspirou-se na narração do regresso de Jesus a Nazaré, proposta por Lucas (4, 16-30) num
dos mais «dramáticos» trechos do Evangelho, no qual — afirmou o Pontífice — «é possível ver
como a nossa alma é realmente». Em Nazaré — explicou o Papa — todos esperavam Jesus, que
pela primeira vez regressava ao seu país, porque ouviram falar sobre tudo o que ele tinha feito
em Cafarnaum, os milagres. «Eles — esclareceu ainda o Pontífice — queriam o espectáculo. Mas
Jesus não é um artista». Jesus não fez milagres em Nazaré. Aliás, realçou a pouca fé dos que
pediam o «espectáculo». O que começara de forma jubilosa ameaçava de se concluir com um
crime, o assassínio de Jesus «devido aos ciúmes, à inveja». Mas não se trata só de um evento de
há dois mil anos, evidenciou o bispo de Roma. «Isso acontece todos os dias no nosso coração,
nas nossas comunidades» todas as vezes que se acolhe alguém falando, no primeiro dia, bem
dele e, depois, cada vez menos até chegar ao mexerico, quase para «o destruir». Quem, numa
comunidade, fala mal contra um irmão acaba por «querer matá-lo», frisou o Pontífice.

Por conseguinte, pergunta o Papa: como podemos construir uma comunidade? Do modo «como
é o céu», respondeu; do modo como anuncia a Palavra de Deus. Portanto, «para termos paz
numa comunidade, numa família, num país, no mundo, devemos começar a estar com o Senhor.
E onde está o Senhor não existe a inveja, a criminalidade, os ciúmes, mas há fraternidade.

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MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

Dos murmúrios ao amor pelo próximo


 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 37 de 15 de Setembro de 2013

As tagarelices matam como e mais que as armas. Sobre este conceito o Papa Francisco voltou a
falar na manhã de sexta-feira 13 de Setembro, na missa celebrada na capela de Santa Marta.
Comentando as leituras do dia, tiradas da carta a Timóteo (1, 1-2. 12-14) e do Evangelho de
Lucas (6, 39-42), o Pontífice realçou que o Senhor — depois de ter proposto, nos últimos dias,
atitudes de mansidão, humildade e magnanimidade — «hoje nos fala do contrário», ou seja, de
uma «atitude odiosa para com o próximo», a que temos quando nos tornamos «juízes do irmão».

O Papa Francisco recordou o episódio evangélico no qual Jesus repreende quem pretende tirar o
argueiro do olho do outro sem ver a trave que está no seu. Este comportamento, o facto de se
sentir perfeito e, por conseguinte, capaz de julgar os defeitos dos outros, é contrário à mansidão,
à humildade sobre as quais fala o Senhor, «àquela luz que é tão bela e que consiste em
perdoar». Jesus, evidenciou o Santo Padre, usa «uma palavra forte: hipócrita». E sublinhou: «Os
que vivem julgando o próximo, falando mal do próximo são hipócritas: porque não têm a força, a
coragem de ver os próprios defeitos. Sobre esta questão o Senhor não fala muito. Mais tarde dirá:
aquele que tem no seu coração o ódio contra o irmão é um homicida. Isto será proferido também
pelo apóstolo João, que muito claramente na sua primeira carta afirma: quem odeia o próprio
irmão caminha nas trevas. Quem julga o seu irmão é um homicida». Por conseguinte,
acrescentou, «todas as vezes que julgamos os irmãos no nosso coração, ou pior, quando falamos
mal deles com os outros, somos cristãos homicidas». E isto «não sou eu quem o digo, mas é o
Senhor quem o diz», especificou acrescentando que «sobre este ponto não há dúvidas: se falares
mal do teu irmão estás a matá-lo. E todas as vezes que fizermos isto, imitaremos o gesto de
Caim, o primeiro homicida». O Pontífice concluiu invocando «para nós, para toda a Igreja, a graça
2
da conversão da criminalidade das maledicências na humildade, na mansidão, na
magnanimidade do amor ao próximo».

Não é fácil para os cristãos viver segundo os princípios e as virtudes inspirados por Jesus. «Não
é fácil — disse o Papa na missa celebrada na manhã de 12 de Setembro em Santa Marta — mas
é possível»: basta «contemplar Jesus sofredor, a humanidade sofredora» e levar «uma vida
escondida com Jesus em Deus».

A reflexão do Santo Padre foi inspirada pela celebração da memória litúrgica do nome de Maria.
«Outrora, esta festa chamava-se o doce nome de Maria e hoje na oração pedimos a graça de
sentir a força e a doçura de Maria. Precisamos da sua doçura para entender o que Jesus nos
pede.

«O apóstolo Paulo insiste sobre este tema: “Irmãos, escolhidos por Deus, santos e amados,
revesti-vos de sentimentos de ternura, bondade, humildade, mansidão e magnanimidade,
suportando-vos e perdoando-vos uns aos outros” (Cl 3, 12-17)». Sem dúvida, observou o
Pontífice, pede-se-nos muito e por isso a primeira pergunta é: «Como posso fazer isto?». Para o
Papa, a resposta é clara: «Com o nosso esforço não podemos fazê-lo. Só uma graça pode fazê-lo
em nós. O nosso esforço é necessário, mas insuficiente».

«Nestes dias, Paulo falou-nos muitas vezes de Jesus como totalidade e esperança do cristão,
porque é o esposo da Igreja e infunde esperança para ir em frente, como vencedor sobre o
pecado e a morte». A este propósito, o apóstolo ensina-nos algo: «Irmãos, se ressuscitastes com
Cristo, procurai as coisas do alto, onde está Cristo triunfador; Ele está à direita de Deus. Dirigi o
pensamento para as coisas do alto... Com efeito, estais mortos e a vossa vida está escondida
com Cristo em Deus».

Eis «o caminho para fazer o que o Senhor nos pede: esconder a nossa vida com Cristo em
Deus». E isto deve renovar-se em cada atitude diária. Mansidão, bondade, ternura e
magnanimidade são as virtudes necessárias para seguir o caminho indicado por Cristo. Recebê-
las é «uma graça que brota da contemplação de Jesus».

«Só contemplando a humanidade sofredora de Jesus, podemos ser mansos como Ele. Não há
outro caminho». Portanto, para ser cristão é necessário contemplar sempre a humanidade de
Jesus, o homem que sofre.

Hoje, no mundo, há «muitos cristãos sem a ressurreição». A eles o Papa Francisco, durante a
missa celebrada na manhã de 10 de Setembro, em Santa Marta, dirigiu o convite a encontrar o
caminho para ir rumo a Jesus ressuscitado, deixando-se «tocar por Ele, pela sua força», porque
Cristo «não é uma ideia espiritual», mas está vivo. E com a sua ressurreição «venceu o mundo».
3
Ao comentar as leituras da liturgia do dia, o Pontífice recordou alguns trechos da carta aos
Colossenses, nos quais são Paulo fala sobre a figura de Jesus, descrito gradualmente como «a
totalidade, o centro, a esperança, porque é o esposo». No trecho de hoje (2, 6-15) o apóstolo
acrescenta outro fragmento, definindo Cristo «o vencedor», aquele que «venceu a morte, o
pecado e o demónio». Portanto, a mensagem paulina inclui um convite a caminhar no Senhor
ressuscitado, bem enraizado e edificado nele, na sua vitória, firme na fé. Em particular, o Pontífice
referiu-se àqueles «cristãos sem Cristo ressuscitado», os que «acompanham Jesus até ao
túmulo, choram, amam-no tanto», mas não são capazes de ir além. E a este propósito, identificou
três categorias: os temerosos, os vergonhosos e os triunfalistas.

Os primeiros, explicou, «são os da manhã da ressurreição, os de Emaús que fugiram, porque


tinham medo»; são «os apóstolos que se fecharam no Cenáculo por medo dos judeus»; são
também «as mulheres boas que choram», como Madalena em lágrimas «porque levaram embora
o corpo do Senhor».

A segunda categoria é a dos «vergonhosos, para os quais confessar que Cristo ressuscitou
suscita um pouco de vergonha neste mundo tão avançado nas ciências».

Por fim, o terceiro grupo é o dos cristãos que no íntimo «não acreditam no ressuscitado e querem
fazer própria uma ressurreição mais majestosa que a de Jesus». O Pontífice definiu-os
«triunfalistas», porque «têm um complexo de inferioridade» e adoptam «atitudes triunfalistas na
sua vida, nos seus discursos, na sua pastoral e na liturgia».

Segundo o Papa Francisco, é necessário recuperar a consciência de que Jesus ressuscitou. E,


por conseguinte, os cristãos são chamados «sem temor, sem medo e sem triunfalismo» a olhar
«para a sua beleza», a pôr o dedo nas chagas e a mão no lado do ressuscitado, daquele «Cristo
que é tudo, a totalidade; Cristo é o centro, Cristo é a esperança», porque é o esposo, é o
vencedor. E «um vencedor — acrescentou — restabelece toda a criação».

Referindo-se ao trecho do Evangelho de Lucas (6, 12-19), o Santo Padre evocou de novo a
imagem de Jesus entre a multidão de homens e mulheres que acorreram para «o ouvir e ser
curados das suas doenças. Nisto o Papa Francisco vê a promessa da vitória final de Cristo, o
qual «cura todo o universo», é «a sua ressurreição». Eis porque, foi a conclusão, é necessário
redescobrir a beleza de ir rumo ao ressuscitado, deixando-se tocar por Ele, pela sua força.

Como é triste quando um sacerdote perde a esperança! Por isso, na missa celebrada na manhã
de 9 de Setembro em Santa Marta, o Papa Francisco dirigiu aos sacerdotes presentes o convite a
cultivar esta virtude, «que para os cristãos tem o nome de Jesus». E o povo de Deus tem
necessidade de que nós, sacerdotes, demos esta esperança em Jesus, que renova tudo: em
cada Eucaristia renova a criação, em cada gesto de caridade renova o seu amor em nós».
4
O Pontífice falou da esperança inspirando-se na reflexão hodierna e dos dias precedentes, nas
quais Jesus foi proposto como totalidade, centro da vida do cristão, único esposo da Igreja. O
Pontífice meditou sobre o conteúdo da Carta de São Paulo aos Colossenses (1, 24-2, 3): Jesus
«mistério escondido, Deus». O mistério de Deus que «se manifestou em Jesus, nossa esperança:
é o tudo, o centro e também a nossa esperança». O optimismo, explicou, é uma atitude humana
que depende de muitas coisas, mas a esperança é diversa: «é um dom, uma dádiva do Espírito
Santo e por isso Paulo dirá que ela nunca engana».

O Papa indicou uma confirmação deste conceito no Evangelho de Lucas (6, 6-11), na referência
ao tema da liberdade. A «liberdade e esperança caminham juntas: onde não há esperança, não
pode haver liberdade». Jesus «não é um curandeiro, mas um homem que recria a existência. E
isto dá-nos esperança, porque Jesus veio precisamente para este grande milagre, para recriar
tudo». Portanto, acrescentou, «a grande maravilha é a reforma de Jesus. E isto dá-nos
esperança: Jesus recria tudo». E quando «nos unimos a Jesus na sua paixão renovamos o
mundo».

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MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

O poder do dinheiro
 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 38 de 22 de Setembro de 2013

É preciso evitar ceder à tentação de idolatrar o dinheiro. Significaria debilitar a nossa fé e deste
modo correr o risco de se tornar dependente do engano dos desejos insensatos e prejudiciais,
aqueles que levam o homem a ponto de se afogar na ruína e na perdição. Sobre este perigo o
Papa Francisco advertiu-nos durante a homilia da missa celebrada na sexta-feira 20 de
Setembro, na capela de Santa Marta. «Jesus — afirmou o Santo Padre comentando as leituras —
disse-nos claramente, e também de maneira definitiva, que não podemos servir a dois senhores:
não podemos servir a Deus e ao dinheiro. Entre eles alguma coisa não se harmoniza. Há algo na
atitude de amor pelo dinheiro que nos afasta de Deus». E citando a primeira carta de são Paulo a
Timóteo (6, 2-12), o Papa disse: «Aqueles que querem enriquecer caem na tentação do engano
de muitos desejos insensatos e prejudiciais, que fazem com que os homens se afoguem na ruína
e na perdição».

De facto, a avidez — prosseguiu — «é a raiz de todos os males. Subjugados pelo desejo, alguns
desviaram-se da fé e encontraram muitos tormentos. É o poder do dinheiro que nos faz desviar
da fé pura. Priva-nos da fé, debilita-se e acabamos por perdê-la». E, permanecendo na carta
paulina, frisou que o apóstolo afirma em seguida que «se alguém ensina diversamente e não
segue as palavras sadias de nosso Senhor Jesus Cristo e a doutrina em conformidade com a
religiosidade verdadeira fica cego de orgulho, nada compreende e torna-se um maníaco de
questões ociosas e conversas inúteis». Depois, o Papa explicou o pecado ligado ao desejo do
dinheiro, com todas as suas consequências, no primeiro dos dez mandamentos: peca-se de
«idolatria», disse: «O dinheiro — evidenciou — torna-se ídolo e tu prestas-lhe culto. E por isso
Jesus diz-nos: não podes servir ao ídolo dinheiro e ao Deus vivo. Um ou outro». Os primeiros
2
Padres da Igreja «diziam uma palavra forte: o dinheiro é esterco do diabo. É assim, porque nos
torna idólatras e adoece a nossa mente com o orgulho, tornando-nos maníacos de questões
ociosas e afasta-nos da fé. Corrompe». O apóstolo Paulo por sua vez diz-nos para nos
inclinarmos para a justiça, a piedade, a fé, a caridade, à paciência. Contra a vaidade e o orgulho
«serve a mansidão». Aliás, «este é o caminho de Deus, não o do poder idolátrico que o dinheiro
pode dar. É o caminho da humildade de Jesus Cristo que, sendo rico, se fez pobre para nos
enriquecer precisamente com a sua pobreza. Este é o caminho para servir Deus. E que o Senhor
ajude todos nós a não cair na armadilha da idolatria do dinheiro».

Como uma mãe que nos ama, nos defende, nos dá a força para ir em frente na luta contra o mal.
Eis a imagem da Igreja caracterizada pelo Papa Francisco na terça-feira 17 de Setembro, durante
a missa celebrada de manhã cedo em Santa Marta.

Comentando o trecho do Evangelho de Lucas que narra a ressurreição do filho da viúva de Naim
(7, 11-17), o Pontífice descreveu Jesus que, ao ver a mulher diante do cadáver do seu único filho,
«sentiu grande compaixão». E definiu o sentimento de Cristo como «a capacidade de sofrer
connosco, de estar próximo dos nossos sofrimentos e fazê-los seus». Ele sabia bem «o que
significava ser viúva naquele tempo», quando as mães que ficavam sozinhas a crescer os filhos
dependiam da ajuda e da caridade de outros. Em relação a elas o Senhor mostra uma particular
«atenção, um amor especial», a ponto que elas acabam por constituir «um ícone da Igreja,
porque — explicou — também a Igreja é num certo sentido viúva: o seu esposo foi embora e ela
caminha na história esperando encontrá-lo. Então ela será a esposa definitiva». «Entretanto,
admoestou, a Igreja está sozinha», e o Senhor não é visível para ela: portanto, «tem uma certa
dimensão de viuvez». A primeira consequência desta viuvez é que a Igreja se torna «corajosa», à
semelhança de uma mãe «que defende os filhos». Da coragem deriva depois um segundo
elemento, a força, como testemunham outras viúvas descritas nas Escrituras. E dado que o Papa
vê a «nossa mãe Igreja nesta viúva que chora», é preciso perguntar-nos o que diz o Senhor a
esta mãe para a confortar. A resposta está nas próprias palavras de Jesus referidas por Lucas:
«Não chores!», porque «eu estou contigo, acompanho-te, espero-te lá, nas núpcias, as últimas
núpcias, as do Cordeiro»; não chores, «este teu filho que estava morto agora vive». E a esta
última, terceira figura presente no cenário evangélico, o Senhor dirige-se ordenando-lhe: «Jovem,
eu te digo: levanta-te!». Para o Pontífice são as mesmas palavras que o Senhor dirige aos
homens no sacramento da reconciliação, «quando morremos para o pecado pedindo-lhe perdão».
O Papa concluiu afirmando que «não há caminho de vida, não há perdão, não há reconciliação
fora da mãe Igreja», e por isso é sempre necessário «pedir ao Senhor a graça de ser confiantes
nesta mãe que nos defende, ensina, faz crescer».

Um bom cristão participa activamente na vida política e reza para que os políticos amem o próprio
povo e o sirvam com humildade. Foi a reflexão proposta pelo Papa Francisco na missa celebrada
a 16 de Setembro, em Santa Marta.
3
Comentando o trecho do evangelho de Lucas (7, 1-10) no qual é narrada a cura, por obra de
Jesus, do servo do centurião em Cafarnaum, o Pontífice realçou «duas atitudes do governante».
Antes de tudo, «deve amar o seu povo. Um governante que não ama não pode governar. No
máximo, pode pôr um pouco de ordem mas não pode governar». Para o Papa Francisco o
governante deve ser também humilde como o centurião do Evangelho, que teria podido orgulhar-
se do seu poder, se Jesus lhe tivesse pedido para ir ter com ele, mas «era um homem humilde e
disse ao Senhor: não te preocupes, não sou digno que entreis em minha casa, mas diz uma
palavra e o meu servo será curado. Estas são as duas virtudes de um governante: amor ao povo
e humildade». Contudo, também os governados devem fazer a suas escolhas. A política, diz a
doutrina social da Igreja, é uma das mais elevadas formas de caridade, porque é servir o bem
comum. Por conseguinte, devemos colaborar, com a nossa opinião, com a nossa palavra e
também com a nossa correcção. Um bom católico participa na política oferecendo o melhor de si
para que o governante possa governar». Então, o que «podemos oferecer de bom» aos
governantes? «A oração», respondeu o Pontífice. Rezemos pelos governantes para que nos
governem bem. Para que levem em frente a nossa pátria, a nossa nação e também o mundo; e
que haja paz e bem comum.

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MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

No caminho de Jesus
 

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 39 de 29 de Setembro de 2013

A escolha é entre «ser cristãos do bem-estar» ou «cristãos que seguem Jesus». Os cristãos do
bem-estar são os que pensam que têm tudo se tiverem a Igreja, os sacramentos, os santos... Os
outros são cristãos que seguem Jesus até ao fim, até à humilhação da cruz, e suportam
serenamente tal humilhação. Em síntese, foi esta a reflexão proposta pelo Papa Francisco na
manhã de sexta-feira, 27 de Setembro, na homilia da missa celebrada na capela de Santa Marta.

O Santo Padre deteve-se na descrição de diversas atitudes que um cristão pode assumir. O
perigo que corremos, advertiu, é ceder «à tentação do bem-estar espiritual», isto é, de pensar que
temos tudo: a Igreja, Jesus Cristo, os sacramentos, Nossa Senhora e, portanto, já nada devemos
procurar. Se pensarmos assim «somos bons, todos, porque pelo menos devemos pensar nisto;
se pensarmos o contrário é pecado». Mas isto «não basta. O bem-estar espiritual — explicou o
Papa — existe até a um certo ponto». O que falta para ser cristão verdadeiramente é «a unção da
cruz, a unção da humilhação. Ele humilhou-se a si mesmo até à morte e morte de cruz. Este é o
termo de comparação, a verificação da nossa realidade cristã. Sou um cristão de cultura do bem-
estar ou sou um cristão que acompanha o Senhor até à cruz? O cristão que não concordar com o
programa do Senhor é um cristão na metade do caminho; um tíbio. É bom, realiza coisas boas»
mas continua a não suportar as humilhações e a perguntar-se «por que àquele sim e a mim não?
A humilhação a mim não. E por que acontece isto e a mim não? E por que nomeiam aquele
monsenhor e a mim não?».

Mas nem todos, disse o Papa, estão dispostos a seguir o caminho de Jesus: pensam que é um
escândalo se lhes fazem algo que julgam uma afronta e se lamentam por isso. Portanto, o sinal
2
para entender «se um cristão é verdadeiramente cristão» é «a sua capacidade de suportar com
alegria e paciência as humilhações».

Para conhecer verdadeiramente Jesus é preciso falar com ele, dialogar com ele enquanto o
seguimos no seu caminho. O Papa Francisco centrou a sua homilia da missa celebrada na
manhã de quinta-feira, 26 de Setembro, exactamente no conhecimento de Jesus.

O Pontífice inspirou-se no trecho do Evangelho de Lucas (9, 7-9) no qual Herodes se questiona
sobre quem é aquele Jesus de quem tanto ouve falar. A pessoa de Jesus, recordou o Pontífice,
suscitou muitas vezes perguntas deste tipo: «Quem é? De onde vem? Pensemos em Nazaré, por
exemplo, na sinagoga de Nazaré, quando esteve lá pela primeira vez: mas onde aprendeu tudo
isto? Nós conhecemo-lo bem: é o filho do carpinteiro. Pensemos em Pedro e nos apóstolos
depois da tempestade, naquele vento que Jesus parou. Mas quem é aquele ao qual obedecem o
céu e a terra, o vento, a chuva, a tempestade? Mas quem é?».

Perguntas, explicou o Papa, que se podem formular por curiosidade ou para ter certezas sobre o
modo de se comportar diante dele. Contudo, permanece o facto que quem conhece Jesus se faz
estas perguntas. Aliás, «alguns — prosseguiu o Papa voltando ao episódio evangélico —
começam a ter medo deste homem, porque os pode levar a um conflito político com os romanos»;
e, portanto, decidem não considerar mais «este homem que causa tantos problemas».

E por que, perguntou-se o Pontífice, Jesus provoca problemas? «Não se pode conhecer Jesus —
foi a sua resposta — sem ter problemas». Paradoxalmente, acrescentou, «se quiseres ter um
problema, vai pelo caminho que te leva a conhecer Jesus» e então surgirão muitos problemas.
Em todo o caso, não se pode conhecer Jesus «na primeira classe» ou «na tranquilidade», nem
«na biblioteca». Só conhecemos Jesus no caminho diário da vida. Para conhecer
verdadeiramente Jesus é preciso ler «o que a Igreja diz sobre ele, falar com ele na oração e
caminhar na sua estrada com ele». Este é o caminho e «cada um — concluiu — deve fazer a
própria escolha».

A vergonha diante de Deus, a oração para implorar a misericórdia divina e a plena confiança no
Senhor: foram estes os pontos centrais da reflexão do Papa Francisco na manhã de 25 de
Setembro. Ao comentar as leituras da liturgia (Es 9,5-9; Lc 9, 1-6), o Santo Padre disse que o
trecho tirado do livro de Esdras o levou a pensar nos bispos maronitas e, como de costume,
resumiu o seu pensamento em volta de três conceitos. A atitude de vergonha e confusão diante
de Deus, a ponto de não conseguir dirigir o olhar para Ele; vergonha e confusão de todos nós
pelos pecados que nos levaram à escravidão, porque servimos ídolos que não são Deus.

A oração é o segundo conceito. Seguindo o exemplo de Esdras, que de joelhos levanta as mãos
para Deus implorando a misericórdia, assim devemos agir também nós por causa dos nossos
numerosos pecados. Uma prece que, disse o Papa, é preciso elevar também pela paz no Líbano,
3
na Síria e em todo o Médio Oriente. A oração é sempre o caminho que devemos percorrer para
enfrentar os momentos difíceis, como as provas mais dramáticas e as trevas que às vezes nos
fazem viver situações imprevisíveis. O sacramento não é «um rito mágico», mas o instrumento
que Deus escolheu para continuar a caminhar ao lado do homem como companheiro de viagem
na vida, para fazer a história com o homem, esperando por ele, se for necessário. E diante desta
humildade de Deus devemos ter a coragem de o deixar escrever a história, que deste modo se
torna «segura».

A certeza da presença divina contínua na vida do homem foi o cerne da homilia do Papa na
manhã de 24 de Setembro, na missa celebrada em Santa Marta. «A Igreja — disse o Papa —
celebra esta certeza com muita alegria inclusive na Eucaristia». E recordou «a bonita oração
eucarística, que hoje recitaremos, entoando o grande amor de Deus que quis ser humilde, quis
ser companheiro de caminho de todos nós e quis também escrever a história connosco». E se
Ele, concluiu, «entrou na nossa história, entremos também nós um pouco na sua, ou pelo menos
peçamos-lhe a graça de escrever a história com Ele. Que Ele escreva a nossa história. É
segura!».

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MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

A alegria da memória cristã

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 40 de 06 de Outubro de 2013

Quando o cristão transforma a memória da história da salvação realizada por Jesus em simples
recordação, perde de vista o valor de um dos princípios fundamentais da fé cristã: a memória que
se faz alegria. E assim, vive a Eucaristia, isto é, a memória que faz a Igreja, como um evento
social que causa tédio, disse o Papa Francisco ao comentar a primeira leitura da missa celebrada
na manhã de quinta-feira, 3 de Outubro, na capela de Santa Marta.

Todos nós temos a memória da salvação, garantiu o Papa. Mas, perguntou, «esta memória está
próxima de nós? Ou é uma memória meio distante, um pouco espalhada, um pouco arcaica,
quase de museu?». Quando a memória não está próxima, quando já não fazemos experiência da
memória, aos poucos ela transforma-se numa «simples recordação. Por isso, Moisés dizia ao
povo: todos os anos ide ao templo, todos os anos apresentai os frutos da terra, mas todos os
anos recordai-vos de onde saístes, e do modo como fostes salvos». Sentir próxima a memória da
nossa salvação acende a alegria em nós. «E esta — especificou o Bispo de Roma — é a alegria
do povo. É um princípio da vida cristã. Os levitas tranquilizavam o povo que chorava de emoção e
repetiam: não vos entristeçais, não vos entristeçais, porque a alegria, aquilo que sentis agora, é a
alegria do Senhor e é a vossa força».
2
E no entanto muitas vezes «nós cristãos temos medo da festa» e com frequência a vida faz com
que nos afastemos da nossa memória; «só nos leva a manter a recordação da salvação, não a
memória que é viva. A Igreja — realçou o Papa Francisco — faz a sua memória, aquela que
faremos agora, a memória da Paixão do Senhor. O mesmo Senhor que nos disse: fazei isto em
memória de Mim. Mas também acontece que afastamos esta memória e a transformamos numa
recordação, num evento banal. Todas as semanas vamos à igreja, ou quando morre um
conhecido e vamos ao seu funeral. E esta memória muitas vezes chateia-nos, porque não está
próxima. É triste: a missa às vezes transforma-se num evento social».

Isto significa que não estamos próximos da memória da Igreja, que é a presença do Senhor
diante de nós. «Peçamos ao Senhor — concluiu o Santo Padre — a graça de ter sempre a sua
memória próxima de nós. Uma memória próxima e não domesticada pelo hábito, por tantas
coisas, nem distante como uma simples recordação».

Na conclusão da missa de terça-feira, 1 de Outubro, o Papa falou sobre a reunião, iniciada nesse
mesmo dia no Vaticano, dos cardeais consultores por ele nomeados, pedindo: «Senhor, que o
nosso trabalho hodierno nos torne mais humildes, mais mansos, mais pacientes e mais confiantes
em Deus. Para que assim a Igreja possa dar um bom testemunho ao povo. E vendo o povo de
Deus, vendo a Igreja, sintam a vontade de vir connosco».

Anteriormente na homilia o Papa tinha recordado a memória de santa Teresa do Menino Jesus,
padroeira das missões, convidando a reflectir sobre o seu espírito de humildade, de ternura e de
bondade. É este espírito manso característico do Senhor que ele quer de todos nós. O Papa
propôs a força e a actualidade da figura de santa Teresa do Menino Jesus: «A Igreja sábia
canonizou esta santa — humilde, pequena, confiante em Deus, mansa — padroeira das missões.
Não se entende isto. A força do Evangelho consiste justamente nisto, porque o Evangelho
alcança o ponto mais alto precisamente na humildade de Jesus. Humildade que se torna
humilhação. E a força do Evangelho está na humildade. Humildade de criança que se deixa guiar
pelo amor e pela ternura do Pai».

Na missa de segunda-feira, 30 de Setembro, o Papa Francisco reflectiu sobre a atmosfera que se


respira quando a Igreja sabe colher a presença constante do Senhor. Uma atmosfera de paz,
justamente, na qual reina a alegria do Senhor. Os episódios de referência foram tirados do livro
de Zacarias (8, 1-8) e do Evangelho de Lucas (9, 46-50) que narra a disputa surgida entre os
apóstolos sobre quem deles era o maior. Nos dois trechos o Pontífice vê uma espécie de debate,
ou melhor, um intercâmbio de opiniões sobre a organização da Igreja. Mas, recordou, «o Senhor
gosta de surpreender» e assim «muda o centro do debate»: indica um menino ao seu lado,
dizendo: «Quem acolher este menino em meu nome, é a mim que acolhe, pois quem for o mais
pequenino entre vós, esse é grande». E os discípulos não entendiam.

«Na primeira leitura — especificou o Papa — ouvimos a promessa de Deus ao seu povo: voltarei
3
a Sião, habitarei em Jerusalém e Jerusalém será chamada cidade fiel. O Senhor voltará». Mas
«quais são os sinais de que o Senhor voltou? Uma boa organização? Um governo que vá em
frente limpo e perfeito?», perguntou-se. Para responder, o Santo Padre propôs a imagem da
praça de Jerusalém cheia de velhos e de crianças. Portanto, «aqueles que deixamos de lado
quando pensamos num programa de organização — afirmou — são o sinal da presença de Deus:
os velhos e as crianças. Os velhos porque trazem consigo a sabedoria, a sabedoria da sua vida,
a sabedoria da tradição, a sabedoria da História, a sabedoria da lei de Deus; e as crianças,
porque são também a força, o futuro, aqueles que levarão em frente o futuro com a própria força
e com a sua vida».

O futuro de um povo — afirmou o Papa Francisco — «consiste precisamente nisto, nos velhos e
nas crianças. E um povo que não cuida dos seus velhos nem das suas crianças não tem futuro,
porque não terá memória nem promessa. Os velhos e as crianças são o futuro de um povo».

Infelizmente, disse, é um hábito triste pôr de lado as crianças «com um rebuçado ou com um
brinquedo». Assim, como não deixar que também os velhos falem e «ignorar os seus conselhos».
No entanto, Jesus recomenda que se preste a máxima atenção às crianças, que não as
escandalizem: e recorda que «o único mandamento que traz consigo uma bênção é precisamente
o quarto, o dos pais, os velhos: honrar».

«A palavra criança — concluiu o bispo de Roma — faz-nos pensar na alegria. É a alegria do


Senhor. E os anciãos sentados com o bastão na mão, fazem-nos pensar na paz. Paz e alegria,
este é o ar da Igreja».

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MEDITAÇÕES MATUTINAS NA SANTA MISSA CELEBRADA


NA CAPELA DA DOMUS SANCTAE MARTHAE

 Como se derrota a estratégia do diabo

Publicado no L'Osservatore Romano, ed. em português, n. 41 de 13 de Outubro de 2013

«Por favor, não façamos negócios com o diabo» e levemos a sério os perigos que derivam da sua
presença no mundo», recomendou o Papa na manhã de 11 de Outubro, na homilia da missa em
Santa Marta. «A presença do diabo está na primeira página da Bíblia, que termina com a vitória
de Deus sobre o demónio», que volta sempre com as tentações. Não podemos «ser ingénuos».

O Pontífice comentou o episódio em que Lucas (11,15-26) fala de Jesus que expulsa os
demónios. O evangelista menciona também os comentários de quantos assistem perplexos e
acusam Jesus de magia ou, no máximo, reconhecem que Ele é só um curandeiro de pessoas que
sofrem de epilepsia. Também hoje, observou o Papa, «existem sacerdotes que quando lêem este
e outros trechos do Evangelho, dizem: Jesus curou uma pessoa de uma doença psíquica». Sem
dúvida, «é verdade que naquela época era possível confundir a epilepsia com a possessão do
demónio, mas também a presença do demónio era verdadeira. E nós não temos o direito de
simplificar a questão», como se se tratasse de doentes psíquicos, e não de endemoninhados.

Voltando ao Evangelho, o Papa disse que Jesus nos oferece critérios para compreender esta
presença e reagir: «Como ir pelo nosso caminho cristão, quando há tentações? Quando nos
perturba o diabo?». O primeiro critério sugerido pelo trecho evangélico «é que se pode obter a
vitória de Jesus sobre o mal, sobre o diabo, parcialmente».
2
Não se pode continuar a crer que é um exagero: «Ou estás com Jesus, ou contra Ele. E neste
ponto não há alternativas. Existe uma luta na qual está em jogo a nossa salvação eterna». E não
há alternativas, embora às vezes ouçamos «propostas pastorais» que parecem mais tolerantes.

Eis os critérios para enfrentar os desafios da presença do diabo no mundo: a certeza de que
«Jesus luta contra o diabo», «quem não está com Jesus está contra Ele» e «a vigilância». É
preciso ter presente que «o demónio é astuto: nunca é expulso para sempre, e só o será no
último dia», pois quando «o espírito impuro — recordou — sai do homem, vagueia por lugares
desertos à procura de alívio e, dado que não o encontra, diz: voltarei à minha casa, de onde saí.
Quando volta, encontra-a limpa e adornada; vai então e toma consigo outros sete espíritos piores
do que ele, entram e estabelecem-se ali. E a última condição desse homem vem a ser pior do que
a primeira».

Eis por que motivo é preciso vigiar. «A sua estratégia avisou o Papa — é esta: tornaste-te cristão,
vai em frente na tua fé e eu deixo-te tranquilo. Mas depois, quando te habituas e já não vigias,
sentindo-te seguro, eu volto. O Evangelho de hoje começa com o demónio expulso e termina com
o diabo que volta. São Pedro dizia: é como um leão feroz que dá voltas ao nosso redor». E isto
não é mentira, «é a Palavra do Senhor».

E na missa de 10 de Outubro o Papa voltou a falar sobre a força e a coragem da oração. A nossa
oração deve ser corajosa e não tíbia, se não quisermos obter só as graças necessárias mas
sobretudo através dela, conhecer o Senhor. Se pedirmos, Ele mesmo nos trará a graça.

À necessidade de rezar com insistência se for necessário, mas deixando-se sempre envolver por
ela, refere-se o trecho litúrgico do Evangelho de Lucas (11, 5-13) «com esta parábola — explicou
o Pontífice — do amigo atrevido, o amigo inoportuno», que na noite funda vai pedir pão a outro
amigo para saciar um conhecido que acabou de chegar à sua casa e ao qual nada tinha a
oferecer. «Com esta solicitação — frisou — o amigo teve que se levantar da cama e dar-lhe o
pão. Isto faz-nos pensar na nossa oração. Como rezamos? Rezamos por costume,
piedosamente, mas tranquilos, ou pomo-nos com coragem diante do Senhor para pedir a graça,
para pedir por que rezamos?».

A atitude é importante porque «uma oração que não for corajosa — afirmou o Pontífice — não é
uma oração verdadeira». Quando rezamos é necessária «a coragem de acreditar que o Senhor
nos ouve, a coragem de bater à porta».

Mas, perguntou-se o Santo Padre, a nossa oração é assim? Ou limitamo-nos a dizer: «Senhor
tenho necessidade, fazei-me esta graça»? Numa palavra, «deixamo-nos envolver na oração?
Sabemos bater à porta do coração de Deus?».

Portanto «quando rezamos corajosamente, o Senhor não só nos dá a graça, mas doa-se também
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a si mesmo na graça». «Porque o Senhor — explicou o Papa com uma expressão incisiva —
nunca dá ou envia uma graça pelo correio: é ele quem a leva, é Ele a graça!».

«Hoje — disse na conclusão — na oração, na colecta, dissemos ao Senhor que nos dê aquilo que
nem a oração ousa pedir. E o que é que nós não ousamos pedir? Ele mesmo! Nós pedimos uma
graça, mas não ousamos dizer: vem tu trazê-la a mim. Sabemos que uma graça é sempre trazida
por ele: é ele que vem e no-la dá. Não façamos má figura aceitando a graça sem reconhecer que
quem a traz, quem no-la dá, é o Senhor».

Na missa celebrada na manhã de terça-feira, 8 de Outubro, o Papa reflectiu sobre o valor da


oração: não de «papagaio» mas «feita com o coração» que nos faz «olhar para o Senhor, escutar
o Senhor, pedir ao Senhor». Rezar significa abrir a porta ao Senhor a fim de que possa fazer algo
para reorganizar as nossas situações. O sacerdote que cumpre o seu dever, mas não abre a
porta ao Senhor, corre o risco de se tornar só um «profissional».

A reflexão desenvolveu-se a partir das leituras da liturgia, tiradas do livro de Jonas (3, 1-10) e do
Evangelho de Lucas (10, 38-42). Em particular, referindo-se ao trecho evangélico o Pontífice
propôs como modelo a seguir a atitude de Maria, uma das duas mulheres que hospedaram Jesus
na sua casa. De facto, Maria parou para escutar e olhar para o Senhor, enquanto Marta, a irmã,
continuou a ocupar-se dos afazeres de casa.

«A palavra do Senhor — explicou o Papa — é clara: Maria escolheu a melhor parte, a da oração,
da contemplação de Jesus. Na opinião da outra irmã era perda de tempo». Maria parou para
contemplar o Senhor como uma menina admirada, «em vez de trabalhar como fazia a outra».

A atitude de Maria é justa porque, frisou o Pontífice, ela «escutava o Senhor e orava com o seu
coração». Eis o que «nos quer dizer o Senhor. A primeira tarefa na vida é a oração. Não a oração
das palavras como papagaios, mas a oração do coração», através da qual é possível
«contemplar o Senhor, escutar o Senhor, pedir ao Senhor. E nós sabemos que a oração faz
milagres».

E na celebração da missa na manhã de segunda-feira, 7 de Outubro, o Papa Francisco sugeriu


que deixemos que Deus escreva a nossa história. Para ouvir a voz de Deus na própria vida é
preciso ter um coração aberto às surpresas. Caso contrário o risco é de «fugir de Deus»,
encontrando às vezes até uma boa desculpa. E pode acontecer que exactamente os cristãos
sintam a tentação de fugir de Deus e as pessoas «distantes», ao contrário, consigam ouvi-lo.

 
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