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Apostila da
Agricultura Camponesa
Outubro de 2005
Elaboração:
Coletivo de Promoção e Resistência Camponesa
Diagramação:
MDA Comunicação
Impressão:
Gráfica Editora Battistel
Agricultura
A agricultura é a primeira atividade profissional desenvolvida pela
espécie humana, a qual tinha por objetivo apenas produzir para sua ali-
mentação. Antes de sua descoberta, todo o alimento era obtido da natu-
reza. Primeiramente, a alimentação era a base de frutas, folhas verdes,
brotos e raízes, posteriormente começam a buscar seus alimentos na caça
e na pesca de outros animais.
A atividade de coleta de frutos, folhas, brotos e raízes era exercida
pelas mulheres, com isso, elas foram observando que as sementes quando
jogadas na terra, germinavam e cresciam, desenvolvendo uma nova plan-
ta, semelhante aquela de onde o fruto havia sido coletado. Por isso, se
deve as mulheres todo o processo de descobrimento e desenvolvimento
da arte de cultivo das plantas. Portanto, foram as mulheres as responsá-
veis pela criação e desenvolvimento da agricultura.
Com o passar do tempo as aldeias, como eram chamados os luga-
res onde viviam as comunidades de pessoas, começaram a criar e reser-
var alguns locais (as roças) para cultivarem as plantas que serviam de alimento.
Esse sistema de agricultura, chamado de agricultura tradicional, existe há
mais de 15 mil anos e sua característica principal sempre foi a produção
diversificada, o que fornecia para as pessoas uma alimentação bastante variada.
Após milhares de anos com o sistema de agricultura tradicional surgem
várias formas de produzir. Após a segunda guerra mundial, entre 1950 e 1960, foi
inventado o modelo de agricultura convencional chamado de Revolução Verde.
Nos anos entre 1980 e 1990 se propagou a biotecnologia e após o ano 2000 o
que se fala é o agronegócio.
Modelo da Biotecnologia
Este surge com o mesmo discurso de produzir mais a fim de acabar com a
fome no mundo e revolucionar a agricultura. Serviu para manter maior controle
sobre a vida e incentivar o desenvolvimento do pacote tecnológico produzido em
laboratório e nas indústrias multinacionais, tirando a autonomia dos produtores e
tentando acabar com a agricultura camponesa.
Modelo do Agronegócio
Este modelo vem com os mesmos
objetivos da revolução verde e da
biotecnologia, que é acabar com a fome.
Mas sabemos que o agronegócio é mais
um golpe para a agricultura camponesa.
Tentando tirar o resto que ainda existe no
campo para dominar todo o sistema de
produção, comercialização, transformação
e distribuição, mantendo o controle des-
de a semente, forma de plantio/tecnologia,
financiamento, preços e cobrança de
royalties. Tanta coisa que fazem chegam
deixar a planta com muleta.
6 Movimento de Mulheres Camponesas - RS
Conseqüências destes modelos de agricultura
Todos estes modelos trouxeram e trazem os mesmos efeitos, baseados em:
9 Uso intensivo de máquinas e equipamentos mecânicos, uso abusivo de
insumos químicos, agrotóxicos (herbicidas, inseticidas, fungicidas, etc...) e
fertilizantes solúveis (adubos químicos, NPK, uréia, etc...);
9 Plantio e criação de animais baseados em sementes e raças híbridas e
transgênicas;
9 Plantio em grande extensão de terra de somente uma cultura, exemplo soja.
A Agricultura Camponesa
Vimos que nos últimos 55 anos foram introduzidos vários modelos de agri-
cultura, todos com um falso objetivo. Embora tenha sofrido muitas tentativas de
superação e destruição, a agricultura camponesa está presente em todos os luga-
res do mundo. Sabemos que, a agricultura camponesa sempre se manteve, mes-
mo tendo criado diferentes formas de produzir. Portanto, podemos afirmar que a
resistência da agricultura camponesa fez e faz com que as pessoas permaneçam
no campo, com melhor qualidade e vida.
Porém, para continuarmos com a luta de resistência e melhorarmos as con-
dições básicas das camponesas e camponeses, precisamos repensar a agricultu-
ra. O que significa repensar a lógica de funcionamento, o modelo tecnológico, a
8 Movimento de Mulheres Camponesas - RS
Natureza
política, o ensino técnico, os conceitos, os valores. Isto implica uma nova
agricultura, valorizando a cultura e o saber popular das camponesas e
dos camponeses, buscando o reconhecimento e sua importância, traba-
lhando com as orientações do princípio da agroecologia. Com isso, forta-
lecemos a vida do solo, o equilíbrio dinâmico, a fertilidade orgânica, plantas
sadias e resistentes, a produção de alimentos, o respeito à natureza.
Para isso, é fundamental conhecer as relações que se estabele-
cem entre o solo, a planta e os animais. Ambos são movidos pela ener-
gia que um passa para o outro.
Animais
Solo
Planta
Sabemos que esta energia passada da planta, animal e solo (terra) tem uma
relação com os principais elementos da natureza, realizando assim, a composição
do solo.
Composição do solo
O solo é composto por quatro partes muitos importantes. São as partes:
Sólida - composta por minerais, sendo 45%;
Imagine a reconstrução de
sua casa, quebrada em
pequenos pedaços
PERFIL DO SOLO
Predominam organismos
1 a 8 cm que precisam de
mais estruturado oxigênio do ar
9 a 18 cm Predominam organismos
menos estruturado que vivem com
oxigênio da água
Compactação
Terra crua Subsolo - Terra ainda
mais jovem
ROCHA
O solo, além de servir de base para as raízes das plantas se fixarem, é onde
as plantas buscam a maior parte dos seus alimentos, os nutrientes. Em análise
química de plantas já foram encontrados mais de 60 diferentes tipos de minerais,
os quais as plantas utilizam para se alimentar.
Entre os principais minerais utilizados pelas plantas para se alimentarem
estão: o Nitrogênio (N), Fósforo (P), Potássio (K), Cálcio (Ca), Magnésio (Mg),
Enxofre(S), Ferro (Fe), Cobre (Cu), Zinco (Zn), Boro (B), Cobalto (Co),
Manganês (Mn), Silício (Si)... Todos estes minerais tem a mesma importância na
alimentação das plantas. Onde faltar um deles a planta não vai se desenvolver
bem, ficando desequilibrada e não produzindo direito.
Para produzir alimentos de qualidade, a nossa primeira tarefa é cuidar bem
do nosso solo. A terra é a base de toda a produção agropecuária, ou seja, é a
base de toda a existência da vida do planeta.
Na agricultura agroecológica o solo é tratado como um organismo vivo e toda
a fonte dessa vida está na matéria orgânica (palha, folhas com umidade - se decom-
pondo) que serve de alimento para os microorganismos. Quanto mais matéria orgâni-
ca tiver no solo, mais vida ele terá. Será um solo mais equilibrado e com muito mais
alimento para as plantas. Podemos observar a importância da matéria orgânica.
Plantas indicadoras
Porque será que numa parte da propriedade de repente, aparece um tipo
de mato e em outra parte não? O que a natureza quer dizer para a gente quando
faz surgir determinado tipo de vegetação numa área de terra?
Cada tipo de vegetação é um sinal, uma indicação. É o jeito da terra gritar:
está faltando isso, está sobrando aquilo.
Por isso, quando uma planta se torna agressiva e toma conta de uma área,
sendo muitas vezes chamadas de “invasoras” ou “inço”, o problema não está na
planta, mas no solo. A única maneira de superar algum inço é resolver os proble-
mas existentes no solo. Estas plantas que chamamos de “inço” são apenas plantas
indicadoras. A planta chamada de indicadora é o melhor remédio que a natureza
dispõe no momento, na tentativa de solucionar mais rápido possível o problema.
Por exemplo, a guanxuma só aparece enquanto o solo ainda estiver compactado;
a samambaia só é inço enquanto o solo ainda estiver acido.
Guanxuma: solo compactado. Em solo fértil fica viçosa, solo pobre fica
pequena. Aparece muito onde se manobra as máquinas após o plan-
tio, estradas, pátios, etc;
Língua de vaca: solo compactado e úmido com excesso de nitrogênio
livre e terra fresca;
Maria-mole ou berneira: solo denso em 40 a 50 cm de profundidade,
falta potássio;
Mamona: solo arejado, deficiente de potássio;
Adubação Verde
A natureza é composta por uma infinita diversidade de seres vivos,
formando uma cadeia. Entre eles existe o controle de espécie, um se
alimenta do outro para sobreviver e não deixar que se forme super popu-
lação, equilibrando, assim, a natureza, conforme o ambiente onde vivem.
Observamos algumas espécies e seu controle para sobreviver.
Alguns exemplos de
amigos naturais: pássaro
que come lagarta; tatu,
Pássaro, sapo e lagarta
Tatu e formiga tamanduá que comem for-
miga; andorinha que come
cupim; cobra que come
rato; aranha que come mos-
ca; joaninha que come pul-
gão, cochinilhas, ácaros,
Joaninha
e pulgão
mosca branca; vespa que
Aranha e mosca
comem lagarta, broca de
tomate, ovos de cochonilha; sapo e rãs que comem larvas, gafanhotos, maripo-
sas; lagartixa que come mosquitos, ovos de barata; fungos que atacam baculovírus.
Adubação verde
Adubação verde é o cultivo de plantas recuperadoras da fertilidade do
solo. Estas plantas aumentam a matéria orgânica do solo, protegem contra a ero-
são, realizam a reciclagem de minerais que servem de nutrientes para as plantas
que serão cultivadas posteriormente. Através de suas raízes, fazem a
descompactação do solo, deixando ele mais fofo, conservam mais a umidade e a
infiltração de água no solo, provocando menor
variação de temperatura. Vejamos os vários ti-
pos de raízes.
A adubação verde é uma das melhores for-
mas de recuperarmos a fertilidade do solo, pois
dá um resultado muito bom, é de baixo custo,
além de ser mais ecológico.
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Quando manejamos corretamente a adubação verde, deixando ela sobre o
solo, sem mexer com ela, a palha formada atuará na proteção do solo contra as
chuvas fortes e o sol quente, que esteriliza a sua superfície, protegendo, ainda,
contra a ação dos ventos que resseca o solo e também provocam erosão.
Podemos afirmar que a adubação verde age como um cobertor do solo,
protege do frio, do calor e até das chuvas fortes.
É importante, no cuidado com o solo, que a água da chuva não escorra
sobre a superfície, pois vai provocando erosão. Toda água da chuva deve infiltrar
no solo, assim como acontece na mata. Temos exemplos de cuidado do solo.
OPÇÃO 1 OPÇÃO 2 OPÇÃO 3
Deixar o material Semi-incorporado Enterrá-lo
sobre a superfície
Compostagem
É um modo de aproveitamento de restos de vegetais e resíduos de animais
que, amontoados e com a presença de ar, microrganismos, bactérias, realiza a fer-
mentação, fixando nitrogênio na massa, resultando num húmus rico em nutrientes.
O composto orgânico é formado por camadas de esterco de animais, es-
pecialmente de bovinos e palhas de culturas. Normalmente são feitos montes ou
fileiras de aproximadamente 1 a 2 metros de altura, por 3 metros de largura, com
comprimento variável, de acordo com
o espaço disponível na propriedade.
A pilha é formada por uma par- Palha
Biofertilizante enriquecido
Esterco: 30 kg. Utilizar esterco fresco de bovino, para ativar a fermentação.
Cinza: 0,5 kg fonte de minerais.
Melado: 1 kg ativador de fermentação.
Leite: 3 litros. Pode ser soro de leite (6 litros), que não contenha sal.
Sangue: a quantia que tiver (no máximo 2 litros).
Plantas: a maior diversidade de plantas possível, pegando a mesma quantida-
de de cada planta e picando-as.
Biofertilizantes
Misturar 20 kg de esterco de vaca fresco e 20 litros de água, colo-
car 3 Kg de melado ou 10 litros de caldo de cana (garapa) e deixar fermen-
tar numa vasilha bem fechada por 30 dias. Está pronto, pode aplicar.
Biofertilizante rápido
Misturar 20 litros de soro de leite sem sal, 3 kg de cinza e 2 kg de
melado ou açúcar mascavo, deixar fermentar por 15 dias. Está pronto,
pode coar e guardar. Usar em qualquer tipo de cultura como adubo foliar
ou uréia. Dosagem: 500ml (meio litro) de biofertilizante em 20 litros de
água.
Adubo foliar
Misturar um litro de leite, 10 litros de água, 700 gramas de cinza, 300
gramas de açúcar mascavo e 1 kg de calcário, mexer bem e coar. Pulveri-
zar em frutas, hortaliças e verduras.
Extrato de urtiga
Colocar 500 gramas de folhas de urtiga de molho em 5 litros de
água durante 10 dias. Coar e pulverizar nas plantas atacadas por
pulgões, lagartas e outros insetos. Usar 1 litro de extrato de urtiga
em 10 litros de água.
Extrato de alho
Esmagar 10 dentes de alho grandes em um litro de água. Deixar des-
cansar por 12 dias. Misturar com mais 10 litros de água e pulverizar as
plantas atacadas por insetos.
Chá de arruda
Cozinhar por alguns minutos 500 gramas de folhas de arruda em 2 litros
de água. Coar e acrescentar mais 5 litros de água e pulverizar em plantas
atacadas com pulgões e em piolhos de humanos e animais.
Chá coentro
Cozinhar por alguns minutos 500 gramas de coentro em 2 litros de água.
Coar e acrescentar mais 5 litros de água. Pulverizar em plantas atacadas
por ácaros e pulgões.
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Macerados de plantas
Fumo, arruda, cinamomo, urtiga, cipó e outras plantas têm efeito
controlador de insetos e doenças. Coletar um punhado de folhas, picar,
misturar com álcool e deixar em repouso por dois dias, coar e misturar um
litro deste macerado e 10 litros de água. Pulverizar as plantas doentes ou
atacadas por insetos.
Isca de taiuiá
Tirar a raiz e colocar em lugares atacados por vaquinhas (cascudinho
verde que atacam o feijão). Cortar pedaços de raiz com 10cm de compri-
mento, colocar em estacas e distribuir na lavoura ou horta na mesma altura
que as plantas. Esmagar as vaquinhas que estão perto da isca.
Isca de barata
Ralar uma colher de sopa de cebola, colocar uma colher de banha, uma
colher de chá de farinha de trigo, 2 colheres de açúcar e 3 colheres de
ácido bórico em pó (encontra-se em farmácias de manipulação). Misturar
tudo até fazer uma pasta e colocar onde tem barata.
Composto de vaquinha
Triturar 100 cascudinhos (vaquinhas) no liquidificador com um copo de
água. Coar e misturar este suco em 20 litros de água e pulverizar as plantas
atacadas pelos cascudinhos ou patriotas.
Composto de lagartas
Amassar um copo de lagartas, colocar 2 litros de água e pulverizar so-
bre as plantas atacadas por lagartas de folhas em couve e rúcula.