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HISTORIA DA TEOLOGIA NA AMERICA LATINA ie) EDIGOES PAULINAS FICHA CATALOGRAFICA CIP-Brasil. Catalogagéo-na-Fonte Camara Brasileira do Livro, SP Historia da teologia na América Latina. — Sio Paulo: EdigGes Paulinas, 1981 #58 pp. 198 (Tealogia em diélogo) Bibliografia, J, Teologia catdlica — América Latina — Historia 2. Teologia protestante — América Latina — Hist6ria 81-1190 CDD-230.098 a sistemstico: Indices pars 230.098, 1, América Latina: Teologia cristd Col “TEOLOGIA EM DIALOGO” — Estudos nao da Fac. de Teologia Nossa Srt da Assungio = Dincitos bupanos —A religizo do povo — Puebla: antlise, perspectivas ¢ interrogogées -ologia —A fantlie em nossa sociedede de conflitos — Histéria da teologia na América Latina IV. TEOLOGIA NA EPOCA DA INDEPENDENCIA E NO PER/ODO LIBERAL 5. O PENSAMENTO DE MORELOS NAS LUTAS PELA INDEPENDENCIA DO MEXICO I. A NOVA ESPANHA NA ENCRUZILHADA DOS SECULOS Trés grupos sociais dominaram a economia neo-hispanica durante os sé- culos XVIII e comego do XIX: 1) 0 Consulado da cidade do México, que manteve preso o mercado interno; 2) a Igreja; 3) os mineiros e os fazen- deiros. Os dirigentes desses grupos, espa- nhéis, detinham o verdadeiro poder sobre a colénia. Os funcionérios ré- gios deviam unirse a eles, para evi- tar que sua autoridade fosse mera- mente decorativa. Em 1761, 0 rei Carlos II] enviou a Nova Espanha o visitador José de Galvez com instrugdes para reformar as estruturas econémicas, politicas, religiosas e sociais a fim de que a colénia proporcionasse maiores pro- ventos & metrépole. 1. O comércio exterior G4lvez fomentou as exportagdes neo-hispanicas de tal maneira que esta renda constituiu o fundamento da economia colonial. Com isso cresceu © mercado interno. As relagées insté- veis entre esses dois setores da pro- dug3o conformaram as classes da so- ciedade. Para aumentar o poderio econémi- co da Coroa, Carlos III combateu o AGusTIN CHURRUCA PBLAEZ monopélio andaluz ¢ apoiou a outros grupos de comerciantes espanhéis. Em 1770 permitiu que os portos de Yuca- t4n e Campeche fossem abertos ao comércio exterior. Concedeu que a Nova Espanha comerciasse com a Nova Granada e com o Peru, exclut- dos, porém, os produtos competitivos com os da Metrépole, como o vinho, por exemplo. Em 1796, Carlos IV tirou aos bar- cos do monopélio de Cadiz a exclu- sividade de realizarem viagens da Es- panha para Veracruz. 2. A mineracao Como resultado do apoio decidido que Gélvez outorgou aos mineiros da Borda, Manuel de Aldase, Conde de Regla, entre outros, em 1800 eram exploradas 3.000 minas, cuja produ- 4o equivalia a 25 milhdes de pesos anuais. Empregavam 14 mil pessoas. Visando a incrementar a produgdo mineira, Carlos III fundou o Consu- lado de Mineragao (1776) e 0 Banco de Avio (1784). Carlos IV fundou a Escola de Mineracio (1792). Os senhores das minas foram isen- tados de impostos na compra da ma- tériaprima e da maquinaria como re- sultado da politica econémica prote- cionista concedida a este setor da producio, os mineiros obtiveram 150% de desconto no prego do mer- cirio ¢ viram reduzidos seus custos gerais de produgdo em 15% 78 Muitos comerciantes _investiram seus capitais nas minas diante da pers- pectiva de obter ganhos considerdveis. Em 1800 a Nova Espanha produzia 66% do total da prata que circulava mo mundo. A Coroa obtinha somas importantes devido aos impostos. En- tre 1760 ¢ 1781, Guanajuato pagou a Espanha 23 milhdes de pesos. A mina de La Valencia, por sua vez, rendeu a seu dono a quantia de 8 milhoes de pesos entre os anos de 1788-1798. 3. A indhistria A atividade industrial da colénia foi muito limitada pela monarquia Para evitar que competisse com a da peninsula e para facilitar a este as exportagdes para a Nova Espanha. © protecionismo espanhol permi- tia, unicamente, as importages e ex- Portagdes com a metrépole, a custa da economia colonial, se bem que esta polftica tivesse seu apogeu com © contrabando. A América estava proibido explorar mercirio, produzir seda, farinha, xerga, sabio e muita coisa mais. Nesta época surgiram os mono- POlios estatais chamados de estancos. © do tabaco iniciou suas operagées em 1765, Suprimiu a propriedade pri- vada no ramo e deu infcio a um qua- se proletariado industrial. Entre 1785 1789, a Coroa obteve um ganho de cerca de 16 milhdes de pesos, equiva- lentes a 137% da inversio e dos gas- tos efetuados. Em cada um dos anos seguintes, até 1800, este estanco en- viou a Madrid uma média de 4 mi- Ibdes de pesos anuais. 4. A agricultura e a pecudria Esta atividade sofreu as restrigdes andlogas as das anteriores. Na Nova Espanha era proibido plantar vinhas 76 € olivais, destilar mel de cana ¢ de pita, explorar terras, traficar, inte riormente, com as sementes, etc. Pa- ra proteger as plantagdes de Cuba e Porto Rico, os reis proibiram a produgao do agiicar e da aguardente. Quando a Espanha, por sua vez, ne- cessitou de linho e de c4nhamo, ofe- receu grandes facilidades para que fossem cultivados. Considerando-se estas medidas, a agricultura colonial teve até um bom crescimento. Em 1803, Guadalajara produziu 3 milhées de pesos em tri- go, milho, legumes, etc. Possuia esta regiao 370 fazendas, 118 estancias e 1511 ranches produzindo. No mesmo ano, a pecudria de Michoacdn rendeu 2 milhées de pesos. No nordeste e no noroeste os rebanhos eram inconté- veis, No centro, na regiéo perto da capital havia 824 fazendas, 871 ran- chos e 57 estdncias, em 1810. Produ- ziam cereal e milho. Enviavam a cana para Bajfo e de Puebla e de Bajfo, traziam trigo e cevada, Em outras regides, este tipo de atividade era se- melhante ao aqui descrito. 5. O regime fiscal Os impostos arrecadados na Nova Espanha eram vultosos. Provinham da cobranga dos quintos, do almoxa- rifado, da venda do pulque e da aguardente, do papel selado ¢ da lo- teria, dos 2/9 do décimo, da venda de pélvora e das salinas, das taxas pagas as autoridades eclesidsticas, do tabaco, do jogo de cartas, do mer- ctrio, das bulas, das vacancias e de varias coisas mais. O imposto de transmissio propor- cionava & Coroa até final do século XVIII, 3 milhées de pesos cada ano. A venda de pulque pagava nessas épo- cas 800 mil pesos anuais. Os indige nas contribufam, no mesmo perfodo, com 1 milhdo e duzentos mil pesos. Fernando IV retirou em 1754 do Consulado a permissdo de cobrar o imposto de transmissio, ¢ 0 privou do controle que exercia sobre a Al- fandega de Veracruz. Ordenou a aber- tura de 24 oficinas recolhedoras de impostos e as situou nas cidades prin- cipais. Foram estabelecidos impostos sobre as vendas de tabernas. Estas medidas produziram um aumento ex- traordinario na arrecadacio fiscal. Cerca de 1750, os vice-reis envia- vam ao rei cerca de 1 milhio de pe- sos anuais, Em 1800, a quantia que safa do porto de Veracruz era de 7 milhdes de pesos, Mais 5 milhdes eram destinados & ajuda que a Nova Espa- nha dava a Cuba, Porto Rico, Sio Domingos e as possessées espanholas na Asia. A Corte de Madrid obteve, além disso, diversos pagamentos extraor- dindrios. A confiscacéo dos bens dos jesuftas lhe rendeu 6 milhées de pesos até 1794. Em virtude do Decreto de 1804 de Cessio de bens iméveis de Fundagoes Piedosas e a Cobranga de Capitais emprestados foram levados para Madrid 10 milhdes de pesos, junto com outros 5 provenientes das Cajas de Comunidades y Censos de Indios. Se as rendas neo-hispfnicas pro- duziam 3 milbdes de pesos em 1712, no ano de 1765 somavam 6 milhoes, e em 1798 chegaram & quantia de 21 milhoes. De 1784 a 1805 foram cunhadas moedas no valor de 477 milhdes de pesos. Destes, 342 passaram para a Espanha. Dos 135 milhdes que per- maneceram na Nova Espanha, 30 per- tenciam ao rej, 25 aos comerciantes e 80 deviam ser repartidos pelo resto da populacdo. 6. As consegiiéncias sociais A colénia neohispanica era habi- tada por 6.122.000 pessoas, em 1810. Uns 70 mil indivfduos eram es- panhéis (vascos e sahtanderinos prin- cipalmente). Cerca de 1 milhao eram crioulos. Os membros das castas eram 1.338.706. O nimero de indfgenas so- mava 3.676.280. A prosperidade econémica que te- mos estudado levou, A Espanha mi- Ihdes de pesos coloniais, mas tam- ‘bém sacudiu as estruturas da colénia, gerou amplas expectativas politicas ¢ estourou na revolugdo de 1810. A len- ta acomodacdo social que vinha se dando na Nova Espanha desmoronou de maneira drastica. O montante das exportagdes au- mentou sua consciéncia de classe ex- plorada. Eles sofreram uma grave frustragdo social e politica, tanto maior quanto mais incontrolavel fora sua esperanca de participar no bene- ficio, que estava levando o progresso econémico & sua patria. © grupo de espanhéis que mane- java o comércio exterior queria que a ordem estabelecida fosse mantida. O grupo que se beneficiava do mercado interno, ao contrdrio, desejava pro- fundamente reformas estruturais. Es- te grupo era formado por individuos pertencentes a classe média que sur- giu quando o mercado interno foi, indiretamente, favorecido pelo auge das exportacdes. Eram pequenos co- merciantes, administradores, letrados, ¢tc., que compreendiam a injustica da situagdo social bem melhor que os outros. ‘A distribuicio desigual da riqueza mantinha o povo num regime de in- fra-subsisténcia. Aos indfgenas havia sido arrebatada boa parte de suas terras. Junto aos membros das cas- tas, trabalhavam como pedes das mi- nas, nas fazendas ou nas cidades, as- sim como o proletariado rural mé- vel. A sociedade neo-hispanica, estra- tificada rigidamente, nao absorveu es- tes desajustes sociais. Indfgenas e castas eram presa fé- cil da fome e das epidemias. Iletra- dos, nfo tinham consciéncia da opres- so que sofriam. Esta consciéncia foi 7 despertada pelos rebeldes da classe média, facilmente, aliés, devido & fo- me que experimentavam diariamente. Os privilegiados do regime eram os mineiros exportadores, que man- tinham relages estreitas entre si ¢ com seus compradores espanhdis. Sa- biam que o crescimento de suas for- tunas dependia da dependéncia da colénia. Desta dependiam também os ganhos da burocracia ¢ dos oficiais do exército, formado quase exclusiva- mente por espanhdis. O malestar social podia ser clas- sificado de agudo, ¢ até mesmo cré- nico, As autoridades vice-régias ha- viam reprimido violentamente os mo- vimentos de rebeldia surgidos no fi- nal do século XVIII. Por outro lado, a ferida causada pela expulsio da Companhia de Je- sus nfo havia cicatrizado, nem se es- queceram os mortos, torturados e carcerados que tinha deixado a vi ganga de Galvez, contra aqueles que se opuseram a impopular medida. Com o exército espanhol que de- sembarcou em Veracruz, em 1765, che- garam protestantes, magons ou ilus- trados que zombavam do catolicismo do povo. O regalismo, que estava em voga, impés a permissio do rei aos documentos papais. O direito de asilo foi restringido a partir de 15 de maio de 1779 e as imunidades do clero fo ram reduzidas a partir de 11 de de zembro de 1779. Tudo isso havia mo- lestado um povo que amava secu cle- ro, suas imagens, templos ¢ costumes religiosos. A zombaria que os estran- geiros faziam disso nao foi aceita pe- los neo-hispanicos. 7A situagdo politica Carlos III reinou na Espanha ¢ nas colnias de 1759 a 1788, Enviou como vicereis Francisco Gagigal de la Vega (1760), 0 Marqués de Cruilles (1760-66), 0 de Croix (1766-71), Anto- 78 nio Maria de Bucareli (1771-79), Mar- tin de Mayorga (1779-83), Matias de Gdlvez (1783-85), Bernardo de Gdlvez (1785-87), Alonso Nufiez de Maro y Peralta (1787), que também foi arce- bispo do México, e Manuel Antonio Flores (1787-89) Carlos IV cingiu a coroa de 1788 a 1808. Foram seus vicereis: o 2° Conde de Revillagigedo (1789.94), 0 Marqués de Branciforte (1794-98), Miguel José Azanza (1798-1800), Félix Berenguer de Marquina (1800-03) © José de Iturrigaray (1803-08). Os espanhéis gozavam de exclusi- vidade nos postos importantes: vice- -rei, oficial, familiares, secretrio, pri- meiro secretério, oficial maior, regen- te da Audiéncia, alcaides da Corte, di- retor de mineracio, alcaides ordind- rios, etc. Os intendentes eram espa- nhéis com excecfo de um, O capitao geral do exército, os marechais, bri- gadciros, comandantes e coronéis eram naturais da penfnsula, assim como um bom ntimero de capitdes e oficiais. A situagdo era essa, quando Na- poledo ordenou a invasio da Espa- nha em 1808, No dia 19 de maio Car- los IV abdicou em favor de seu filho Fernando VII. Pai e filho foram obri- gados a se apresentarem perante Na- poledo em Bayone, Franca. Napoledo nomeou rei da Espanha seu irmao José. O povo espanhol se sublevou em armas. A noticia chegou ao México no dia 14 de julho. No dia 29 foi conhecido o levantamento dos espanhdis contra © usurpador. A posicio a assumir diante dos acontecimentos, foi uma questo amplamente discutida pelas classes sociais, sem chegarem a um acordo comum, visto que os interes- ses € as expectativas de cada uma delas eram diferentes, Os espanhdis temiam que tomasse f6lego 0 movi- mento de independéncia. No dia 15 de setembro, guiados pelo fazendeiro Gabriel Yermo, os espanhéis captura- ram o vicerei Iturrigaray ¢ os diri- gentes do partido americano Azcarate, Verdade, Talamantes e outros. Como resultado desta arbitrarie- dade, governou Pedro de Garibay, de 16 de setembro de 1808 a 19 de julho do ano seguinte. A Junta Central da Espanha nomeou o arcebispo Fran- cisco Xavier Lizana y Beaumont vice- -rei, 0 qual ocupou o posto de 19 de julho de 1809 até 8 de maio de 1810. Os crioulos, mais desgostosos que antes por causa destes acontecimen- tos, conspiraram tio secretamente quanto puderam. A Audiéncia tomou as rendas da colénia de 8 de maio de 1810 a 13 de setembro desse ano, por ordem da Regéncia. No dia 14 de maio, Francisco Xavier Venegas ini- ciou seu mandato de 5% vice-rei. Ao amanhecer do dia 16 de setem- bro de 1810, Dom Miguel Hildago er- gueu o estandarte da Virgem de Gua- dalupe e¢ iniciou o movimento de in- dependéncia do México! Il. ..NASCEU EM VALLADOLID, MORREU EM SAN CRISTOBAL Nesta colénia nasceu o mesti¢o José Maria Morelos y Pavén. Viu a primeira luz da cidade de Valladolid, hoje chamada Morelia, no dia 30 de setembro de 1765. Filho de Manuel, carpinteiro, e de Juana, filha de um mestre. Teve dois irmaos: Marfa An- tonia e Nicolau. Seu pai morreu quando José Ma- ria apenas sabia ler ¢ escrever. Um tio, Filipe, tomou sob sua responsa- bilidade o menino, ¢ conseguiulhe o trabalho de guardador de vacas. Quan- do rapaz, Morelos trabalhou como la- vrador e¢ arriciro. Correu os atuais estados de Michoac4n, México, More- los, Guerrero, a partir de Uruapan, Apatzingén e Taretan. Esta ocupagdo lhe facilitou 0 co nhecimento da regido, onde, duran- te a insurreicZo, obteria importantes vitérias, e 0 ajudou, além disso, a terminar a formagdo de sua persona- lidade endurecida pelo meio em que trabalhava e pelo constante enfrentar o perigo. Em 1790 0 rumo da vida de José Maria mudou radicalmente. Ingres- sou no Colégio de San Nicolau para cursar a carreira sacerdotal. Contava entdo 25 anos de idade. A situagdo é parecida & de outro personagem, Ind- cio de Loyola, que aos 33 anos pas- sou a freqiientar as aulas de Barce- lona. Era reitor da instituicao valli- soletana Dom Miguel Hidalgo. Fre- qiientavam aquelas aulas José Maria Cos, José Sixto Berdusco, futuros adeptos da causa da independéncia. Morelos foi ordenado sacerdote no dia 21 de dezembro de 1797. Desen- volveu seus primeiros ministérios nos povoados afastados de Churumuco ¢ La Huacama. Em 1799, foi transferi- do para Cardcuaro ¢ Nocupétaro, on- de foi paroco. Ali vivia quando soube que em 16 de setembro de 1810, Hi- dalgo, “seu mestre”, “seu reitor” — como o chamava Dom J. Maria — ha- via tomado as armas e desencadeado a luta emancipadora da Nova Espa- nha. Morelos nao perdeu tempo em apresentar-se a Dom Miguel. Alcan- ou-o em Indaparapeo ¢ Ihe ofereceu seus servigos como capelféo do povo insurgente, que em numero de 100 mil pessoas seguia o libertador. Este lhe ordenou que se dirigisse para o sul para levantar armas, em favor da independéncia. O importante en- contro se verificou no dia 25 de ou- tubro de 1810. Morelos conseguiu seus primeiros 25 seguidores na sua propria pard- quia. Apoderou-se de Tecpan, onde a ele se uniram os irmios Galeana, ¢ do Cerro del Veladero, perto de Aca- pulco, aonde chegou seguido de trés mil homens. Os realistas impediram que Acapulco passasse ao dominio in- surgente. Morelos entrou em Chilpan- cingo, onde os irmfos Bravo ofere- ceram seus servicos, e venceu igual- 73 mente em Tixtla e em Chilapa. Em 9 meses conquistou grandes exten- sdes do sul ¢ disciplinou admiravel- mente suas tropas. Optou por sair rumo a Cidade do México. Antes de fazélo, estabeleceu e organizou a Provincia de Tecpan ¢ ditou medidas econémicas ¢ sociais. Para chegar & capital ingressou no atual estado de Puebla. No dia 16 de dezembro de 1811, venceu em Izucar, chamado depois de Matamoros, por- que este sacerdote se alistou aqui, sob as ordens de Dom José Marfa, ¢ chegou a ser seu lugar-tenente. Mo- relos enviou parte de suas tropas a Oaxaca e Taxco, enquanto ele se apo- derava de Tenancingo, chegou a To- luca, deixou de lado Puebla e se en- trincheirou em Cuautla. Ao finalizar © ano de 1811, 0 Exército da Recon- quista comandado por Morelos, Ma- tamoros, pelos Bravo, os Galeana, Guerrero, Trujano, Ayala, ¢ outros, dominava os estados de Michoacdn, México, Oaxaca e Puebla. Ameacava cortar 0 comércio entre a capital e o porto de Veracruz ¢ arruinar a eco- nomia vice-régia. Compreendendo a situagao, o vice- -rei Venegas concentrou suas forcas militares contra Morelos, desprote- gendo outras frentes. Calleja, o terror dos insurgentes, sitiou Cuautla no dia 19 de fevereiro de 1812. Afirmou que em 24 horas liquidaria as forcas de Morelos. A resisténcia, admiragiéo de Wellington, durou 72 dias, Morelos di- rigiu a retirada, voltou a Chilapa, pe- netrou em Tehuacén no dia 10 de agosto, ¢ depois em Orizaba e outros lugares do estado de Veracruz. Vene- gas e Calleja ficaram confusos. D. José Marfa decidiu entrinchei- rarse na cidade de Oaxaca (25 de novembro) de onde podia controlar o caminho para Veracruz, o estado de Puebla, o estado que hoje leva seu nome, e aquele que seria batizado com o nome de seu fiel Guerrero. Em vez de atacar Puebla e passar para o México, no dia 9 de fevereiro 80 de 1813 caiu sobre o porto de Acapul- 0, que nao pudera dominar antes. Nao o conseguiu senao no dia 20 de agosto. Esta demora causou graves danos ao movimento de libertacdo, porque deteve as forcas de Morelos naquele lugar, enquanto as de Calle- ja se reorganizavam c se instalavam em pontos estratégicos, preparando- -se para a ofensiva final. Receberam ordens para concentrar sua capacida- de de fogo exclusivamente contra as forgas de Morelos, sem distrair-se em outras agées. Enquanto se desenrolavam estas operagées, D. José Maria nao se des- cuidava de seu propdsito de organi- zar politica, social e economicamente © povo a que dava a independéncia. Seguindo a idéia de Hildalgo, in- sistiu, junto a outros importantes di- rigentes do levantamento popular, na necessidade de organizar um Congres- so Constituinte que redigisse a pri- meira Carta Magna da América Se- tentrional Libre. Para isto, se reuni ram em Chiepancingo (14 de setem- bro de 1813) os deputados padres Mo- relos, Berdusco, Herrera, Cos ¢ os le- trados Liceaga, Bustamante, Quinta- na Roo, Lopez Rayén, entre outros. D. José Marfa leu para a Assem- bléia os Sentimentos da Nagao, em que expds seu idedrio em 23 pontos. No dia 15, Morelos foi nomeado Ge- neral dos Exércitos. Recusou outras honras e deu a mesmo 0 titulo de Servo da Nagio. O Congresso decretou a indepen- déncia de nossa p4tria no dia 6 de novembro. Deputados ¢ exército saf- ram rumo a Valladolid para fazé-la sede do Congresso, ¢ para reconquis: tar, a partir deste lugar estratégico, tanto o ocidente — Guadalajara — como 0 norte — Guanajuato e San Luis Potosi — ¢ o sul — a capital. No dia 22 de dezembro os insur- gentes atacaram Valladolid, onde se encontrava o bispo eleito Manuel Abad y Queipo, acérrimo opositor de nossa independéncia. Morelos fracassou es trondosamente por causa de umas manobras infelizes ¢ da intempesti- va chegada de reforcos reais coman- dados por Llano ¢ Iturbide. O brago direito de Morelos, o padre Matamo- ros, foi fuzilado logo depois. Os sobreviventes fugiram. Com os soldados que péde reunir, Morelos decidiu escoltar o Congresso até Apat. zingén. Aqui, em 22 de outubro de 1814, foi promulgada a Constituicao cuja redacao havia sido iniciada em Chilpancingo. © Congresso prosseguiu na sua fuga para Oaxaca, aonde o Servo deci- dira ir refazer as suas forcas e pros- seguir na luta. Em Temazcala os pe- regrinos foram surpreendidos pelas forcas repressivas, que até esse mo- mento haviam conseguido burlar. Mo- relos enfrentou-as em posicio desvan- tajosa, enquanto facilitava a safda dos congressistas guiados pelo general Nicolau Bravo, A vitéria — 6 de no- vembro de 1815 — favoreceu aos his- Panos. Transferiram Morelos para a cidade do México e o fuzilaram no dia 22 de dezembro de 1815 na po- voacéo de San Cristobal Escatepec. Uma das wltimas palavras do pré- cer foram as que dirigiu ao coronel realista Concha: “...eu queria a in- dependéncia da minha patria, e lutei por ela. Nao me arrependo do que fiz por este ideal. Minha consciéncia nao me acusa...” Quando as balas Penetraram em seu corpo, Morelos pronunciava as palavras do Credo dos Apéstolos ! Il. OS _INIMIGOS DO POVO E SUAS ACOES Morelos dirigiu sua luta armada contra: 1) a monarquia dos Bourbon que havia escravizado os neo-hispani- cos; 2) os funciondrios a servico des- sa Coroa; 3) as espanhéis europeus que habitavam Nova Espanha Embora um grupo de insurgentes opinasse que ndo convinha declarar -se abertamente contra a monarquia, para nao perder adeptos entre o po- vo, Morelos se opés a esta tendéncia, pouco depois de iniciada a indepen déncia, considerando que jA nao rei- nava Fernando VII na Espanha, ¢ que, mesmo n4o tendo renunciado, os insurgentes haviam decidido recon- quistar a sua soberania e independén- cia, ¢ romper com 0 rei, esse “jovem imbecil... perseguido e degradado”, como Ihe chamou Morelos! Este reprochou aos funciondrios reais a terrivel opressio que exerce- ram sobre 0 povo ¢ © saque que ha- viam realizado em sua riqueza2. Os espanh6is europeus foram qualifica- dos por Morelos como “nossos inimi. gos implacaveis” 3 Contra a monarquia, seus funcio- nérios e europeus, Morelos escreveu graves acusagoes. Acusou-os de haver mantido uma humilhante e despética ditadura de 300 anos de duracdo. Por meio dela puderam roubar a riqueza da Amé- rica. Desencadearam, além disso, uma feroz repressio contra a insurreigio por "sua resolucdo injusta de eterni- ar. sua tirania nestes domfnios, cuja opuléncia tanto excita sua ava- reza", afirmou o Servo. “A sede de prata ¢ ouro é insacidvel em vés", assacouhes. Ao camponés neo-hispa- nico ndo deixavam sequer “o fruto do suor de seu rosto e do trabalho pessoal”. Despojavam 0 povo, impon- do “enormes multas”, e “contribui: ges opressoras" Além disso, cram incontdveis as “quantidades de prata € ouro que, desde a conquista de Cortés até h4 um ano ¢ meio os gachupines levaram para seu reino a fim de facilitar a vida aos estrangei: ros 4 custa da rufna e da infelicidade dos habitantes deste solo”, como os chamava D. José Maria. “Nao se detém nos meios para hostilizar-nos, mesmo que reprovados pelos direitos humanos, até atingirem 81 seu objetivo final: escravizar-nos. O veneno, 0 fogo, 0 ferro, a perfidia, a negociata, cis as armas com que nos assestam, fazendo a guerra mais de- testdvel”, assegurava o libertador. Morelos censurou também aquilo que chamava de atuacio sacrilega dos tiranos, por mais que estes se disses- sem defensores da religiao. Atenta- ram sacrilegamente contra a essén- cia religiosa do coragdo mexicano, ¢ provocaram uma enérgica reacio de- fensiva do povo. Morelos os acusou de estarem destruindo a religifo, os altares, as imagens ¢ nao tolerou que blasfemassem contra Jesus Cristo, roubassem as igrejas ¢ fuzilassem os sacerdotes insurgentes ‘. Hidalgo havia sustentado acusa- gées semelhantes. Refutando o Edito da InquisicZo langado contra ele, per- guntou: “Quem creria, amados con- cidad&os, que chegasse até este pon- to 0 descaramento ¢ o atrevimento dos gachupines? Profanar as coisas mais sagradas para assegurar sua in- tolerdvel dominacio? Valer-se da pr6- pria religiio santa para abatéla c destruf-la? Usar de excomunhdes con- tra as mentes da propria Igreja? Ful- miné-las sem que nenhum motivo de religido intervenha? Abri os olhos americanos. . Eles nfo so catdlicos seno por politica: seu Deus é 0 di- nheiro, ¢ as ameacas somente tém por objeto a opressdo. Acreditais, por acaso, que n&o pode ser verdadeira- mente catélico aquele que nio est4 sujeito ao déspota espanhol? De onde surgiu este novo dogma, este novo artigo de £62"5 IV. O PRIMEIRO GOVERNO MEXICANO Cumprindo um antigo anelo de seus antepassados, que haviam mor- rido sem poderem realizar seu dese- jo, os insurgentes desconheceram o 82 governo espanhol, considerando-o le. gitimo. Viveram “o momento glorio- so da posse do México”}, e foram a partir desse histérico entre “donos ¢ senhores livres do pafs” em que ha- viam nascido?, Desconhecendo Fer- nando VII, José Napoledo, a Regén- cia, as Juntas, os mexicanos se decla- raram “o legitimo Governo America- no” >. Os insurgentes julgaram que por ter sido preso Fernando VII, a sobe- rania, que reside essencialmente nos povos, havia recafdo novamente so- bre a nagio. A determinagéo de Morelos era clara: “que os crioulos governem o reino, e que os gachupines se vao para sua terra ou com o seu amigo, o francés“. O mesmo expressou nos Sentimentos: “A América é livre ¢ in- dependente da Espanha e de qualquer outra nagéo, Governo ou Monar- quia” >. Igndcio Lépez Rayén formou a Jun- ta de Zitécuaro ou Suprema Junta Nacional Americana, com a finalida- de de coordenar o movimento insur- gente. No dia 19 de agosto de 1811 convocou os partidérios da indepen- déncia para elegerem os diretores da Junta — Morelos nfo péde assistir, por estar muito distante. Foram nomeados o proprio Lopez Rayén (presidente), José Maria Li- ceaga e José Sixto Berdusco (ambos vogais), no dia 21 Quando ficou sabendo do resulta. do, José Maria Morelos jurou obe- di a esta autoridade que forma: va o primeiro governo livre 5. Subme- teu A sua aprovagdo todos os assun- tos de sua competéncia. Accitou a nomeag’o de Capitéo Geral que a Junta lhe concedeu? © exército espanhol atacou Zitd- cuaro no dia primeiro de janeiro de 1812 e venceu a resisténcia insurgen- te, Calleja fuzilou quem pdde, orde- nou que a povoacio fosse saqueada ea incendiou totalmente. rr Lopez Rayén se refugiou em ter- ras de Valladolid, Liceaga chegou as Ge Guanajuato, Berdusco as do Mé xico. Por causa das peripécias mili- tares, da distancia entre os eleitos, ¢ de suas diferencas ideolégicas, a Jun- ta no péde prestar, eficazmente, seus servigos, mesmo levando-se em conta 0s esforgos de Morelos para defen- der e consolidar esta instituigao po- Itica. 1, O congresso Morelos insistiu repetidas vezes na necessidade urgente para os america: nos da realizagio de um Congreso Nacional que reassumisse a tinica ¢ legitima autoridade da nagao®. A idéia, que havia sido expressa claramente por Hidalgo, era compartilhada, como vimos, por numerosos insurgentes, que comecaram, inclusive, a redigir textos provisérios da Constituigao, por exemplo, frei Vicente Santamaria ¢ © Lic. Carlos Maria Bustamante. © Congresso iniciou seus traba- Ihos no dia 14 de setembro de 1813, na cidade de Chilpancingo. Solicitou 20 papa Pio VII a restauragao da Companhia de Jesus?. Na opinido de Morelos, o Congresso velaria pelos interesses da nagdo ¢ restabeleceria lade e 0 império das leis”. 2. A independéncia No dia 6 de novembro de 1813, os emitiram a “Solene De- claragdo da Independéncia da Améri- ca Setentrional”, cujo texto diz as- sim: “O Congresso de Andhuac, legi- timamente instalado na cidade de Chilpancingo, na América Setentrio- nal, pelas provincias desta: declara solenemente na presenga do Senhor Deus, arbitro moderador dos impérios e autor da sociedade, que os da ¢ os toma, segundo os des{gnios im- prescrutaveis de sua providéncia, que congressistas devido a atual situagao da Europa, recobrou o exercicio de sua sobera- nia, usurpado; que neste sentido, fica rompida para sempre e desfeita a de- pendéncia do trono espanhol; que ¢ 4rbitro para estabelecer as leis que melhor convenham para a paz ¢ fe- licidade interiores, para fazer a guer- ra e a paz, para estabelecer aliangas com os reise as repiiblicas do An- tigo Continente, ndo menos para as- sinar tratados com o Sumo Ponti- fice Romano, para o regime da Igre- ja Catdlica, Apostélica, Romana, ¢ mandar embaixadores e cdnsules; que ndo professa nem reconhece outra re- ligido além da catélica, e nem permi- tird ou toleraré o uso piblico nem secreto de alguma outra; que prote- ger4 com todo seu poder e velard pela pureza da {6 ¢ de seus dogmas € pela conservagio de seus corpos Te- gulares; declara réu de alta traigio todo aquele que se oponha direta- mente ou indiretamente a sua inde- pendéncia, seja protegendo os curo- peus opressores por a¢éo, palavra ou escrito, seja negando-se a contribuir com as despesas, os subsidios e pen- ses para continuar a guerra até que sua independéncia seja reconhecida pelas nagdes estrangeiras; reservan- do-se ao Congresso apresentar a clas, por meio de uma nota ministerial, que circulara por todos os gabinetes, o manifesto de suas queixas ¢ a jus- tiga desta resolugdo, j4 reconhecida pela propria Europa. Dado no Pald- cio Nacional de Chilpancingo, a 6 dias do més de novembro de 1813. Lie. Andrés Quintana, Vice-presidente. Lic. Ignacio Ray6n. Lic. José Manuel de Herrera. Lic. Carlos Marfa de Busta- mante, Dr. José Sixto Berdusco. José Marfa Liceaga. Lic, Cornélio Ortiz de Zarate, Secretério"'. 3. A. constituigéo ‘A Constituicao, cuja redagdo_ foi acabada em Apatzingén no dia 22 de 83 outubro de 1841, constava de 242 ar- tigos. Seus temas principais foram: reconhecimento da religigo catélica, soberania popular, cidadania eral, igualdade perante a lei, garantia de liberdade e de direitos, inviolabilida- de de domicflio, divisio de poderes, faculdades do Congresso, Poder Exe- cutivo colegiado, estabelecimento das Secretarias de Guerra, da Fazenda, do Governo e as atribuigées de cada um dos trés poderes ¥, 4. Diviséo dos poderes No artigo 6 dos Sentimentos da Nag&o, o caudilho expressou: “Os po- deres legislativo, executivo ¢ judicié- rio sejam divididos em érgios com- petentes para exercé-los”. No artigo 7, introduziu a idéia de que os vogais da Junta deveriam se revezar no exer- cicio de suas fungdes para que fos- sem evitados os abusos ¥. © Congresso adotou a divisio de poderes de Montesquieu, concebidos como servigos. O equilforio dos po- deres entre sie seu uso diferenciado Por pessoas diversas ou grupos aju- daria os governantes a _cumprirem mais fielmente sua missio: "Repar- tam entre si os poderes soberanos, ligando suas sagradas atribuig6es, sem confusdo, ficam sujeitos a vigilancia mtitua, e suas fungdes reduzidas a um determinado periodo” ™ 5. A autoridade concebida como servigo De acordo com o que sabemos, diante da investida das tropas re- pressivas, a Junta perdeu sua forca. Cada grupo insurgente obedeceu a seu respectivo chefe, enquanto espe- rava a chegada de tempos mais pro- Picios. Podemos estudar, no entanto, qual era a concepcio de Morelos a 84 Tespeito do que deveria ser 0 novo governo americano. D. José Marfa nao queria conver- terse em ditador, nem pretendia usar © poder em seu proprio beneficio Pediu aos cidad&os que tomassem Parte nos destinos do pais: “Qual quer individuo — escreven — sem excegdo alguma, tem direito a apresentar projetos que ajudem a0 governo em assunto de qualquer es- pécie “15. Comunicon a Lépez Rayén: “No aspiro 4 Presidéncia” Morelos deixaria os cargos que lhe haviam sido confiados se seus servi- g0s nao resultassem Uteis a sua cau- sa, ¢ entéo, acrescentou: “Ficarei mui- to honrado com o epiteto humilde Servo da Nagao" 6. Morelos rechaga- va como a peste o “governo tirdnico, isto €, 0 monarquico, mesmo que me elegessem o primeiro” "7 Suas préprias expressdes nos en- sinam que era do interior do homem que safam tais posicdes politicas: “Eu sou ingénuo, afirmava, e no posso usar outra linguagem que no a ver- dadeira, e a mentira ndo conviria ao meu cardter, . basta dizer que sou um homem miserdvel, mais que os outros, e que minha meta é servir ao homem de bem, levantar o que est cafdo, pagar por aquele que nao tem como fazélo,e ajudar. ao que necesita, seja quem for ; eu nao fago outra coisa que ndo seja empe- nhar-me para que cada um tenha o que é seu" Conceitualizando seus sentimentos, © Servo disse em outra ocasifio: "E constante o ardor com que sustentei os direitos da pAtria, pedindo por to- dos os meios a tranqliilidade ¢ a or- dem ao Governo, Sou o homem mais amigo da justica ¢ da igualdade ¢ tenho aversio aquele que se opde 2 liberdade civil de qualquer individuo, pois ndo sou déspota e nem esta idéia se coaduna com os principios liberais que se harmonizam, naturalmente, 20 meu genio” Aproximando-se o final de sua ges- ta, Morelos mantinha-se firme em suas convigées. Escreveu: “Nosso sis- tema de governo, que comegara, co- mo é natural, nos mais informes ru- dimentos, foi se aperfeigoando suces- sivamente, segundo permitiram as perturbagdes da guerra, e hoje est4 sujeito a uma constituicao baseada em méximas liberais e adaptadas, 0 quanto foi poss{vel, ao carter, aos costumes ¢ hdbitos de nossos povos, ndo menos que as circunstancias da revolugao. Com o decorrer do tem- po, receberé modificagées e melhoras, & medida que a experiéncia for nos esclarecendo mais; porém, nunca nos desviaremos uma s6 linha dos prin- cipios essenciais que constituem a verdadeira liberdade civil"? Vv. A LIBERDADE Estudamos as queixas de Morelos contra a tirania dos Bourbon, que reservara para si o direito de decisio em Andhuac e privara os naturais deste direito. Estes, nos lembrou o insurgente, eram tratados como escravos, apesar de serem os donos do pafs. Depois de 1810, muitos americanos aceitaram resignadamente esta heranca social imposta e herdada. O mesmo nio aconteceu com Morelos que se rebe- lou contra ela, e decidiu dar a sua vida pela independéncia de seu pais. © Servo recordava trés datas-cha- ves na histéria de seu povo. A pri- meira, uma recordagio higubre. As duas restantes, com um profundo sig- nificado de esperanga No dia 12 de agosto de 1521 — escrevia 0 caudilho — “apertaram as cadeias de nossa servidao"!. O dia 16 de setembro, ao contrario, foi o dia “em que se levantou a voz da inde- pendéncia, ¢ comesou nossa santa liberdade. . (por) mérito do grande heréi, o senhor Dom Miguel Hidalgo e seu companheiro Dom Ignacio Al- lende"?. A terceira data honrava as consciéncias insurgentes. Era o 14 de setembro de 1813. As cadeias de 1521 cafam espedacadas “para sempre no venturoso povoado de Chilpancingo”, onde redigiam a Ata da Independén- cia e Constituigao do pais livre? Conhecamos, agora, por que a No- va Espanha explodiu de ira em 1810. O General insurgente assim a expli- cou ao Presidente dos Estados Uni- dos, Mr. James Madison: “O povo mexicano, cansado de sofrer o enor- me peso da dominacdo espanhola, ¢ perdida para sempre a esperanga de viver feliz sob 0 governo de seus con- quistadores, rompeu os diques de sua moderacao e enfrentando dificulda- des e perigos, que pareciam insupe- rdveis aos esforgos de uma colénia escravizada, levantou o grito de sua liberdade ¢ cmpreendeu valorosamen- te a obra de sua regeneragio” + Com efeito, Morelos havia dito que “os povos escravizados sio livres no momento em que querem. "* 1 A liberdade: dom de Deus Quando D. José Maria reconquis- tou Oaxaca, afirmou: “Nosso propd- sito no € outro que o de defender a liberdade que nos concedeu o AU- tor da Natureza, e da qual tentam nos despojar injustamente”; “somen- te aspiramos”, acrescentou, a uma dependéncia tal qual o Autor da Natureza nos concedeu desde o prin- cfpio” EB necessério recordar que os po- vos tém a obrigacdo de serem livres porque tal é a vontade de Deus, que criou o homem livre. Contraria 0 de- sejo do Criador quem escraviza um individuo ou uma nagao. A conquista do México contrariava, portanto, a vontade divina, como afirmava Las as Casas, Quando os povos recuperam sua liberdade usurpada, restauram a ordem da criaco que havia sido vio- lada 2. Independéncia e¢ liberdade A que liberdade se referia Morelos em seus escritos? © movimento insurgente queria “afastar os tiranos intrusos” do po- der’, pretendia dar por terminada a escraviddo “mais ignominiosa que ¢xperimentamos sob os reis da Espa- nha’’’, e, por fim, desejava acabar com o “ignominioso jugo espanhol”? Além de nos tornar independentes da metrépole e de qualquer outro pafs, a liberdade concebida por Mo- relos consistia, também, no gozo des- ta faculdade pelos cidaddos na vida didria. No pais independente, nfo have- nla diferencas sociais que favoreces- sem a ‘iberdade de alguns cidadaos em detrimento dos outros. No nt- mero 15 dos Sentimentos, Morelo es- creveu; “Que a escravidio seja pros- crita para sempre, assim como a dis- tingdo de castas, ficando todos iguais; © que distinguiré um americano de Outro seré somente o vicio ¢ a vir- tude” 1. Abolir a escravidio ¢ as discrimi- nagdes sociais era certamente um ideal muito difundido pelo Iuminis- mo. Sem duvida, Morelos derivou ex- plicitamente seus principios do Evan- gelho. Estabeleceu o ideal da igual. dade social: “ para que olbando- ‘Nos como irmios, vivamos na san- ta paz que nosso Redentor Jesus Cris- to nos deixou quando subiu triunfan- te aos céus..."11 Em que outros fatos renasceu a liberdade dos habitantes de Anahuac durante 0 movimento insurgente? O decreto constitucional de Apat- zingdn dispds em seu artigo 40: “A 86 liberdade de falar, de pensar e de manifestar suas opinides por meio da imprensa, nado deve ser proibida a nenhum cidadio, a menos que em suas manifestagdes ataque os dog- mas, perturbe a trangiiilidade publi- ca ou ofenda a honra dos cidaddos” 2 A liberdade politica dos cidadaos foi também reconhecida no artigo 40 Estabelecia que a “sociedade. . tem © direito incontestavel de estabelecer © governo que mais Ihe convenha, al- ter4lo, modificélo e aboli-lo total- mente quando sua felicidade o re- queira” 3 Estes conceitos nfo se referem so. mente ao sistema monarquico ante- rior. Abriam as portas a mudangas futuras que o bem comum pudesse exigir dos cidadios A bem da verdade, levar a cabo tal decisio nao foi facil para os in- surgentes Em 1813, Morelos descreveu as- sim os esforgos realizados: “Ah! a li- berdade, este dom precioso do céu, este patrimdnio cuja aquisicao e con serva¢do nfo se consegue senio a custa de sangue e dos mais duros sacrificios, cujo prego est4 na pro. porgdo do trabalho que custa seu re- cobro, vestiu nossos pais, filhos, ir- mios € amigos de aflicio ¢ amargu- Tas. Porque, quem de nés nao sacri- ficou alguma das prendas mais que- ridas de seu coragéo? Quem nio en- contra no pé ¢ nas cinzas de nossos campos de batalha, os restos mortais de algum amigo, pai, parente? Quem € que na solidio da noite nfo vé a sua imagem querida, ou ouve os gri- tos magoados que clamam por vin ganga de seus assassinos?” Morelos terminou seu pronunciamento usan- do frases to ousadas como era de sua vontade. Prometeu, “morrer ou salvar a pétria, morrer ou salvar a patria!”, “vamos ser livres e indepen- dentes, afirmou, vamos restabelecer 0 Império Mexicano. ou morrer” Nao tinha outra alternativa '4 VI. INSURGENCIA E RELIGIAO Como o General do Sul também empunhou as armas para salvar a re- ligido, que ele considerava em situa- gio de perigo, devemos conhecer os Principios biblico-teolégicos que o ins- Piraram em sua aco libertadora do Povo. A visio religiosa do homem, da sociedade, do mundo representava um valor essencial na posigéo inte- lectual ¢ pratica do caudilho, seja por voca¢4o, raga ou convencimento. Esta frase caracteriza a atitude do insur- gente: “Eu sou catélico, e por isso mesmo digo a vocé, que tome seu caminho para sua terra .", escre- veu D. José Maria a Calleja durante © cerca de Cuautla! Se queremos compreender integral- mente o cardter e a personalidade profunda da insurgéncia nao podemos prescindir da visdo religiosa que ma- nifestava insistentemente o insurgente seus companhciros, Morelos nunca pés em diivida os princfpios de sua fé, Era precisa- mente dela que obtinha as luzes, a forga, a esperanca e o valor necessé- rios para manter-se em luta e conti- nuar pelo caminho libertador no qual havia empenhado sua vida? 1. Israel e América, Espanha e Babil6nia: histérias paralelas Desde crianga, Morelos conhecia a marra¢éo que nos transmitiu a Bfblia sobre a opressio que sofreu o povo de Israel] sob o domfnio da Babilé- nia e do Egito. Durante a gyerra de independén- cia, 0 revolucionario comparou a his- téria de Israel com a do povo neo- hispanico, como destinos andlogos. Ambas as nagées haviam sido perse- guidas por poténcias estrangeiras. A nagdo judaica foi subjugada pela Ba- bilénia e pelo Egito. A pétria neo- shispanica o era pela Espanha, a nova Babilénia. Os trés impérios foram igualmente surdos A causa da justi- sa, segundo lhes censurava Morelos > © insurgente, sem duvida, achava que a servidio experimentada por seu povo era pior que a de Israel‘. Aos patriotas correspondia, portanto, des- truir o altar erigido na Nova Espa- nha para o culto de Baal> © discfpulo de Hidalgo descreveu também o paralelismo entre as vicis- situdes de Gededo e as préprias. Re- cordemos que Deus pediu a Gededo que libertasse seu povo. Os madiani- tas eram o terror da nacido eleita. Deus ordenou a Gededo que destruis- se o altar de Baal e a estela que sim- bolizava a deusa Astarte. Como o en- viado obedecera A ordem divina, scus proprios pais, que eram idélatras, quiseram assassin4lo. Gededo foi sal- vo por Jods. Quando Gededo foi elei- to Juiz de Israel, derrotou os ma- dianitas © livro do Bxodo relata que “o povo de Israel sofria debaixo do re- gime de escravidao. Gritavam e seu clamor subiu até Deus. Deus escutou seus lamentos e se lembrou da alian- ga com Abraio, Isaac e Jacé. E olhou Deus com bondade para os filhos de Israel ¢ os atendeu" (Ex 2,23-25). Séculos depois, outro grito deses- perado chegou A eternidade, onde nao existia nem antes, nem depois. Era a voz dos novos israelitas: “Este po- vo oprimido, semelhante em muito ao de Israel, trabalhando para o fa- ra6, cansado de sofrer, elevou suas mos ao céu, fez ouvir seus clamo- res no trono do Eterno, 0 qual, com- padecido de suas desgracas, abriu sua boca e decretou diante da corte dos serafins que Andhuac fosse livre”, es- creveu Morelos”. Ele mesmo usou também uma comparagio baseada em Ex 17,8-16. Amalec atacou Moisés em Rafi- dim. Os israelitas, comandados por 87 Josué, venceram os amalecitas. “Javé disse a Moises: Escreve isto em um livro para que sirva de recordacao, e faga saber a Josué que eu apagarci, por completo, a meméria de Amalec debaixo dos céus.. " Desde Tehuantepec, o General do Sul anunciava aos realistas que eles teriam a mesma sorte: “Temei a Deus a sua Mae Sant{ssima, e estai cer- tos que se ndo 0 fizerdes, brevemen- te sereis reduzidos a mintsculos Ato- mos ¢ exterminados de tal modo que até mesmo vossa meméria perecera como a de Amalec, ¢ se por acaso a posteridade recordar algo, sera so- mente para escarnecer de vosso fo- me"® 2. A atuagdo de Deus na independéncia A intervengio de Deus na indepen- déncia do nosso pafs teve lugar de diferentes maneiras, segundo se_de- preende das expressies de D. José Marfa Morelos y Pavén. Deus escutou seu poyo, inspirou a independéncia, escolheu os libertadores, dirigiu o Exército e cuidou do movimento in- dependente. ‘As vozes chegadas ao céu foram ouvidas pelo Senhor, que teve com- paixio dos sofrimentos do povo. Ele levou este povo a defender seus di- reitos. Seu Espfrito o iluminou? © Senhor dos céus exigiu atuagio dos patriotas: “Aquele espirito que animou a enorme massa que vagava no antigo caos, que lhe deu vida com um sopro e fez nascer este mundo maravilhoso, semelhante agora a um golpe de eletricidade, sacudiu espon- taneamente nosso coragdo, tirou a venda de nossos olhos, ¢ transformou a apatia vergonhosa em que jazfamos, em furor belicoso ¢ terrfvel” 0 Deus escutou a Nova Espanha, as- sim como escutara a Israel: “O Se- nhor nos ouviu no dia em que o in- 88 vocamos, ¢ os clamores de Israel chegaram a seus ouvidos” José Marfa Morelos invocava ¢ cla- mava diante de Deus: “Senhor Deus, que nos observas da alta Sion: compa- dece-te das misérias que tanto tem- po nos afundaram na terrivel cala- midade, sem deixar-nos outro conso- lo que, de Babil6nia, voltar os olhos cheios de dgua ¢ ver nossos paises devorados pela tirania, Que a man- sidio de Davi e a retiddo do seu co- ragio movam tua soberana piedade para dar fim a um projeto que tan- to interessa ao teu santo servigo, con- servando a vida mais amAvel no moti vo principal de nossas agées. Entio, descobriremos os instrumentos que deixamos calados por tanto tempo, ¢ entoando com eles hinos sonoros cm ago de gracas daremos honra, gloria e béncfio ao triunfo de teu santo no- me e€ aquele que enviaste a promo- vé-lo” 2. © préprio Deus se pds A frente das forcas insurgentes. Ele levantou os exércitos que reconquistaram “os direitos que nos foram usurpados pe- los gachupines” 3. 0 Senhor dos Exér- citos foi o Senhor do Exército do Sul. Ele, Deus mesmo, o Invencti- vel Tal como fizera com os israelitas, © Deus eterno chamou um homem mortal para comandar suas hostes Judas Macabeu planejou, a exemplo de Moisés, a libertagio de seu povo Para libertar os americanos, 0 Se- nhor previdente chamou a Morelos” que aceitou sua obrigacio como uma resposta necesséria ao que a provi- déncia divina ditou para sua cons- ciéncia '8. Deus operou a conversdo na von- tade do pdroco de Cardcuaro, con forme ele nos explicava; sacudiuo espantosamente, tiroulhe a venda, transformou a apatia em furor. Deus converteu Morelos ¢ félo abandonar sua paréquia em 1810. A atuacdo divina foi mais longe Deus cuidou incessantemente para que sua obra chegasse ao fim. More- los, por sua vez, confiava — esperan- gas sem limites — na providéncia continua de Deus. Lendo os textos que se referem as vicissitudes pelas quais 0 Exérci- to Libertador teve que passar, vemos que eles narram os fatos que confir- mam o Rayo do Sul na sua fé. Por- que Deus que decreta ¢ move, tam- bém protege seus cleitos, os acom- panha, vai a frente, permanecer4 sem- pre a seu lado e devolver4 aos na turais da América aquilo que lhes pertence. Como sabemos, a partir do levan- tamento de armas, os triunfos mili- tares de Morelos foram surpreenden- tes. O céu encadeava os aconteci- mentos para o bem do povo oprimi- do que ansiava por sua liberdade, ajudavao a vencer as agressdes da cobiga, da ambigSo e da tirania que o havia humilhado. O Generalissimo o reconhecia em Cuautla: “As repetidas vitérias com que o céu se especializou em prote- ger, visivelmente, os diversos comba- tes que sustentou esta divisdo, valen- te e aguerrida. sio um testemu- nho claro ¢ constante da justica de nossa causa, pela qual derramaremos a ultima gota de nosso sangue antes de render nossos pescogos a0 jugo tolerével do governo tiranico" !. A rapida tomada de Oaxaca fez 0 rebelde exclamar que a vitéria foi conseguida gracas ao “Senhor Deus dos Exércitos”®. Morelos convocou o Congresso de Chilpancingo “tendo a Divina Provi- déncia proporcionado um terreno se- guro e propicio para se planejar al- gum governo"?!. © Padre Hildago recomendara a seu discipulo que incendiasse o sul da Nova Espanha. Depois de apoderar- -se de Castillo de Acapulco, o vence- dor participou 0 fato ao povo para a satisfagdo do Senhor dos Exércitos e em sua homenagem conclufmos a re- conquista do sul com toda felicida de2, No discurso com que Morelos ini- ciou as sessdes do Congresso reco- nheceu que, apesar das calamidades, © movimento de independéncia foi protegido a cada passo pela provi- déncia: “Mas, oh! misericérdias do Altissimo! — exclamou — tudo pas- sou como passam as tormentas peri- gosas, as perdas foram repostas com acréscimos, as derrotas ¢ dispersdes sucederam as vit6rias e os filhos de Andhuac jamais foram tio temiveis a seus inimigos como quando vaga- ram errantes pelas montanhas, rati- ficando a cada passo e a cada perigo, o voto de salvar a Patria e vingar 0 sangue de scus irmfos”?: Redigido o Decreto Constitucional, reconheceram que estavam repletos de “sentimentos religiosos de gratidio pela benéfica providéncia com que o céu nos proporcionou maravilhosa- mente os meios para recobrar nossa liberdade” ™*. Juntamente com “o brio e o en- tusiasmo de nossos patriotas, decidi- mos antes morrer que voltar para o jugo afrontoso da escravidio”, os re- beldes, segundo Morelos, “confidva- mos na protegao do céu que nado po- dia desamparar a justiga notéria de nossa causa...” No mesmo documen- to, o libertador descreveu o modo de agir da providéncia, que proporcio- nara os meios com os quais colabo- raram os homens: “aproveitando — disse — os momentos preciosos que nos trouxeram uma série de inciden- tes encadeados pela mao da provi- déncia, nos apressamos em realizar nossos planos.. "2. A fé na providéncia futura de Deus era outro elemento integrante da religiosidade do caudilho insur- gente. As demonstragées de interfe- réncia de Deus em seu movimento de independéncia nao fizeram mais que confirmar esta verdade para Morelos A convicgao e o sentimento de que Deus estava a seu lado invadia 89 ‘as agdes do General e lhe proporcio- nava a energia necesséria para pla- nejar suas agdes futuras. Assim pedia ele: “Oh! queira o céu que chegue © afortunado dia em que, pacificado nosso territério, se instale a Repre- sentacio Nacional”. Pediu também a Deus que protegesse a Junta de Go verno %. Na protegio do Senhor o caudi- Iho baseava sua atuagéo: “com a gra- ga de Deus” planejava os ataques”. Confiava, também, no “Senhor Deus Tode-poderoso que vela, incessante- mente, pela conservagéo ¢ prosperi- dade de nossa causa, cuida de des- truir os obstdculos que encontra em seus caminhos" 2. A providéncia pedia aos patriotas “constancia e valor”. O éxito final cabe ao Deus dos Exércitos “em quem est4 depositado todo o poder e a for- ¢a das nagées"’. Com efeito, ele “dis- siparé como nuvem ligeira a porcao miseravel de europeus . ”, declarava José Marfa Morelos». 3A Virgem de Guadalupe Maria de Guadalupe, como ¢ de se supor, participou de maneira impor- tante em favor da causa de libertagdo. do povo mexicano, segundo o teste- munho de Morelos. Desde o tempo de Hidalgo ela foi patrona e defensora da independéncia. Querida aos insurgentes, permaneceu do lado deles nas lutas reivindicaté- rias, nas vitérias e nos fracassos. Em certas ocasi6es, a Virgem atua- va junto com Deus. Ambos, por exem- plo, livrarant milagrosamente os si- tiados em Guatla, na opinigo do che- fe da resisténcia », D. José Maria expressou, também, que ele © a América intcira “espera. vam mais que nas suas proprias for- gas, no poder de Deus ¢ na interces- so da Santfssima Mie, e em sua 90 imagem milagrosa de Guadalupe, que apareceu nas montanhas de Tepeyac para nosso consolo c defesa, e que visivelmente nos protege. A América espera que esta soberana Rainha do Império, castigue — disse aos hispa- nos — vossa insoléncia e perfidia inaudita, com que esté se vendo ul trajada com lancas ¢ escarnecida com as vozes sacrilegas do agui estd esta. Espera, também, que seus filhos ar. Tanquem de vossas maos 0 que ha- veis roubado a Deus ¢ & sua Igreja, que vinguem as injurias enormes que nossos irmfos verdadeiros sofreram nos povoados desarmados, vendo quei- mar ¢ destrogar os filhos que cram sua complacéncia, « em quem depo- sitavam a esperanca de serem 0 am- paro na sua velhice. Nao me deixarao mentir — expés o Generalissimo — as diversas representagdes que os pa- rocos zelosos fizeram ao Governo, so- bre todos os fatos a que me referi” * Em outros momentos, Maria de Guadalupe manifestou sua ajuda aos exércitos da América Setentrional. O Generalfssimo exortava os que defen- diam Cuautla: Confiai na protesdo da Soberana Protetora nossa, ¢ pros- segui com alento, animados e sem temor algum, na defesa da mais jus- ta causa a que se propés uma nagio no decorrer de todos os tempos” 32. A {6 e 0 amor A Virgem, tao fi me em Morelos ¢ em todos os insur- gentes, os levara a classificd-la como a Senhora “milagrosa” que ajudava a obra da independéncia»». Maria era também a “amabilfssima protetora” dos homens empenhados em melho- rar a nacéo™, O Servo lhe concedeu © titulo de Patrona da liberdade », “protetora ¢ defensora visivel” das ex- pedigdes*. Ela outorga as vitérias. Da obtida em Oaxaca, por exemplo, Morelos dizia que nao se devia a ele, “mas a Imperatriz de Guadalupe, co- mo todas as outras” 7 So conhecidos os versos que cir culavam entre as filas dos patriotas Guadalupana, salve salva, Virgen excelsa que del Divino Verbo sois Madre verdadera. A Juan Diego d que como madre tierna nos constituya objetos vuestra piedad inmensa Por esto los indianos en la presente guerra vuestro poder invocan Yuestros cultos aumentan. Escuchad compasiva sus ayes y sus quejas pues sois su protectora liberal, fiel discreta. Humildes os pedimos que una paz verdadera selle gloriosamente vuestra dulce clemencia Romped, reina adorable, romped nuestras cadenas y engujad nuestros ojos con amorosa diestra Al Padre siempre demos y al Espiritu Santo alabanzas eternas Como sinal visivel de guadalupa- nismo, os seguidores do chefe da re volugo traziam “a imagem de G dalupe nos chapéus””. Morelos deu outra manifestagao de seu agradeci- mento ao estabelecer as divisées ter- ritoriais politicas, como recordamos: “atendendo ao mérito do povoado de Teypan,.. vim transform4lo em ci- dade, nomeandoo nesta data Cidade de Nossa Senhora de Guadalupe © 4. Revolucdo e religéo catélica © movimento insurgente nao era uma ag&o que contrariasse algum pre- ceito divino. Segundo a concepgao de Morelos, lutar pela independéncia da col6nia equivalia a restaurar a ordem social desejada por Deus: “Somente aspiramos, dizia, a uma independén- cia tal qual o Autor da Natureza a concedeu desde 0 principio” 4 Quando © Congresso declarou que a América recobrara o direito natu: ral e divino de sua liberdade, o Ser- vo exclamou: “Americanos, o Servo da NagSo fala em poucas, mas con- vincentes razdes: ouvi somos li vres pela graca de Deus e indepen- tes da tirania arrogante espanho- la, "a, Em outras palavras, Morelos re- conhecia que a independéncia estava de acordo com os planos de Deus, € era desejada por ele. Oporse a ele era, ao contrario, obra do pecado de soberba propria de Lucifer. Aqueles que questionavam a independéncia eram seguidores de Satanés, pecavam € se afastavam da graca” Buscar a independéncia era um ato moral Icito, exigido pela virtude da justica, Nao filiar-se a0 movimen. to era uma ac&o covarde e egofsta Significava deixar que a pdtria e a religifio fossem destrufdas. Salvar am- bas aparecia como um dever iniludi- vel para a consciéncia dos insurgen- tes. Aqueles que no o cumprissem seriam traidores de sua religiéo#, Por seus fins ¢ natureza, a revolu 40 iniciada em 1810 era chamada “santa”, “santa revolugio”, “santa in- surreigio” ©. Era para os patriotas um dever “sagrado” 4, Os participantes do amplo movi- mento regenerador obedeciam aos di- tames divinos, correspondiam ao que seu dever pedia e¢ realizayam atos meritérios na ordem da graca. Por este motivo, Morelos dizia a Calleja — recordemos — que como catélico exi- gia que abandonasse o pats. Como exigéncia premente de sua religiio, como um ato legitimo, como uma agao moral ¢ grata a Deus, Morelos lutava contra a metrépole, Posto que eram catélicos, os in- surgentes proclamaram a independén- cia ¢ puseram mfos aos fuzis. Ndo trafram seu dever religioso, mas, sim, atuaram de acordo com ele. Atuaram religiosamente seguindo o que ditava @ consciéncia “7” ot Com a mesma clareza, Morelos se dirigiu ao defensor realista de Aca- pulco: “Isto que vocé chama de Re- volugdo € para mim e ser4 aos olhos de Deus, dos anjos e dos homens, um exercicio de virtude”* A participacao dos insurgentes na libertacao nacional produzia o efeito de uni-los “com os vinculos mais es- treitos com Deus”, “avangarei mais, sem diivida, ao menos para com Deus, libertando-os ¢ protegendo-os”, con: clufa o paroco de Cardcuaro? Libertar 0 povo e procurar o bem comum honrava ¢ glorificava a Deus, € dever de todo ser humano fazer isto. As batalhas tinham por finali- dade salvar a patria e a religiio. A revolugdo de Morelos nado era anti- -religiosa nem a-religiosa. Em plena expansao revoluciondria, os insurgen. tes se descobriam mais unidos a Deus, como decorréncia de haverem decidi- do levar ao fim a insurrei¢ao *. No dia 6 de novembro de 1813 os patriotas puderam declarar a indepen- déncia, como vimos Conclufam uma fase importante de sua luta. Por isso se apressaram em dizer: “O Congres- so de Andhuac declara solencmente na prescnga do Senhor Deus, arbitro moderador dos impérios e autor da sociedade ", que a América Seten- trional “recobrou o exercicio de sua soberania ” Segundo crenca antiga, Deus dava aos reis o poder e © rei. no. De qualquer modo, agora Deus decretava a liberdade da América. Posto que tal havia sido a determi. Racio divina, a0 povo correspondia cumprir e terminar esta tarefa, mes- mo & custa de suas vidas, como estu- damos. Os insurgentes podiam estar Seguros de seus princfpios e de sua atuagio, pois Deus os Tespaldava ¢ cles atuavam conforme os ditames de sua consciéncia 5! Morelos pedira ao Senhor da Glo- na a realizacdo de scus ideais: “Deus grande e misericordioso, Deus de nos- Sos pais, louvado sejas por toda a eternidade sem principio e a cada 92 momento, que cada minuto de nossa vida seja assinalado por um hino de gracas por incalculdveis e tio gran- des beneficios. Mas, Senhor, que nada fagamos, nada tencionemos, sem an- tes, neste lugar, jurarmos todos na Presenca deste Deus bondoso: sal- var a p&tria, conservar a religiio ca- t6lica, apostdlica, romana, obedecer ao Sumo Pontifice, vigtrio de Jesus Cristo na terra, construir a felicidade dos povos, proteger todas as institui ges religiosas, esquecer nossos res: sentimentos mutuos ¢ trabalhar in- cessantemente para chegar a nosso objetivo” 2 Podemos afirmar que salvar a pé tria_¢ a religiio era uma obrigacdo civica ¢ religiosa, um exercicio de virtude, inspirado, promovido ¢ pre- miado por Deus. A “ficticia” > Inquisigao, ressusci: tada festivamente por Calleja para condenar os insurgentes, reprovou Morelos, dizendo que cram, “para este réu, concilidveis a observancia da re- ligiio catélica com as mdximas cor- Tuptas da rebelio infqua.. "4. Este juizo do Tribunal nos apresenta uma curiosa coincidéncia com a afirma- So atual de Gustavo Gutierrez: cle Predisse que os cristéos comprometi- dos no atual processo libertador se- viam acusados de “confundir Reino com revolug&o’’55 Os insurgentes obedeceram ao pla: no divino. N&o se desviaram do ca- minho moral. Atuavam de acordo com © bem. Consideraram suas ages co mo obras virtuosas, pois tinham como objetivo direto a Deus. Acreditaram em sua verdade que os movia para a ago, Esperaram nele como no Bem Supremo que os mantinha em seu es. forgo. Amaram-no de mancira prati. ca, como o Bem em si mesmo ¢, con- seqlientemente, trataram de libertar © povo. Sua consciéncia de cristios fez como que emergissem do avilta- mento forgado em que estavam, para restaurarem a obra criadora de Deus, Para irem contra o proceder dos in. justos invasores de seus direitos. Es- tas conviccdes ¢ sentimentos cristios dos insurgentes levaram-nos a estar A altura de sua missdo, mesmo que, em determinado momento, esse des- tino resultasse trégico. Como tem ocorrido no decorrer da histéria, os cristZos vio para o cdrcere um dia antes da vitéria. Conforme o que temos dito, se depreende, contudo, que hé 165 anos © Servo respondeu as perguntas que Gustavo Gutierrez formula hoje para ‘Qual € © significado da ida comprometida na luta contra a injustica ¢ a alienagio? Co- mo se articula a obra de construgdo de uma sociedade justa, com o valor absoluto do reino?” Afirma o tedlogo Peruano que a “amplidio ¢ gravida- de do processo de libertagéo € tal que a pergunta, por sua significacSo, é na realidade uma questo sobre o sentido do préprio Cristianismo e so bre a missio da Igreja no mundo”. Nesta linha de pensamento, pudemos refletir como os cristos insurgentes enfrentaram este mesmo problema ¢ como responderam a ele. Morelos afastou o dilema “ou redencio espi- ritual ou redencio temporal”. Na fé de Morelos, “o politico” no “se acha- va num segundo plano, .”, ele nfo acreditava que “intervir diretamente na agdo politica é trair sua funcdo”. Gutierrez recorda as tradicionais afir- mag6es bfblicas, por exemplo, Pr 14,21 ¢ 175, assim como Dt 24,1415 ¢ Ex 2221-23, etc., que sintetiza nas expres- ses “conhecer a Deus é praticar a Justiga”, “amar a Javé é fazer justica ao pobre e ao humilhado”, “amar a Javé € estabelecer relagdes justas en- tre os homens, ¢ reconhecer os dirci- tos dos pobres. Ao Deus da renova- ¢4o bfblica se conhece através da jus- tiga entre os homens”. Tal nos parece que foi a posigéo assumida por Morelos. Ao promover a libertag3o do povo, o Generalfssimo cooperou com a aco salvifica, Gu- tierrez disse que “trabalhar, transfor- mar este mundo ¢€ fazerse homem. ¢ forjar a comunidade humana j& ¢ também salvar”, “¢ inserir-se no mo- vimento salvador em marcha até seu cumprimento”. Para Morelos, “a cons- trugio de uma sociedade justa’ teve © valor de aceitagSa do reino, e “par- ticipar no processo de libertagéo do homem" foi, na concepgio do insur- gente, “de certo modo, obra salvado- ra". Tal crescimento do reino assim tragado “é 0 acontecer salvifico, mas no a chegada do Reino nem toda a salvagio”, assinala acertadamente Gu- tierrez. E, melhor, “anuncio da ple nitude”, “significa a vinda do Reino” Devemos recordar que Morelos confessou que avangava no conheci- mento de Deus através do processo de libertag&o com que acompanhava seu Povo: “No encontro com os homens se realiza nosso encontro com o Se. nhor, sobretudo no encontro com aqueles a quem a depressio, o despo- jamento ¢ a alienag&o desfiguraram © rosto humano ..”, afirmard, agora, Gutierrez. “Todo esforgo — concluf- mos — para construir uma sociedade justa... j € obra salvadora, mes- mo que nao seja a salvag3o toda” Esta, com efeito, serd consumada no final dos tempos, quando toda a cria- s4o voltar para Deus e quando for re- capitulada em Cristo toda vida ¢ toda a humanidade. Entretanto, a historia ser4, para os cristdos, a imitaco con- Unua de Deus da Histéria que liber. tou seu povo e de Jesus Cristo, que libertou toda a humanidade %. VI, TIRANIA EVIDENTE Pacifista por natureza ¢ vocacio crist&, Morelos foi guerreiro por des- tino. Combateu a frente do Exército da Redeng&o que — ele mesmo nos diz — Deus comandava, Maria de Gua- dalupe protegia ¢ ele organizou adm ravelmente, O Pe. José Maria More- 93 los no foi original ao propor as tra- dicionais conclusdes _teol6gico-politi- cas ¢ que eram vigentes em seu tem- PO, as quais justificavam moralmente © uso de meios violentos, aos quais ele recorreu. Foi, com Hidalgo, ori- ginal em atrever-se a leva-las a cabo. A teologia catélica manteve ao lon- go dos séculos o direito que assiste a08 povos tiranizados e oprimidos de rebelar-se contra seus tiranos. Fazen- dose eco dessa tradico, Paulo VI especificou que a “insurreigio revo- luciondria” € uma ago legitima “no caso de tirania evidente e prolongada que atente gravemente contra os di- reitos fundamentais da pessoa ¢ cau- se dano perigoso ao bem comum” |! Com o Pe. Francisco Sudrez, como € sabido, aparece, entroncado com di- versos tedlogos, a doutrina do direi- to que assiste os povos tiranizados para suprimirem scus males. O je sufta afirmou: “Se o rei transformas- se em tirania seu poder natural, abu- sando dele para causar danos mani- festos 4 cidade, 0 povo poderia usar de seu poder natural para defender- -s¢, porque deste nunca se privou”, “porque na repiiblica (aqui est o di- reito de resisténcia) — acrescentava © tedlogo — sé existe por meio de uma defesa necess4ria para sua con- servacao". Sudrez conclufa: “E assim pode toda repiiblica, através de acor- do pliblico e geral das cidades e dos préceres, depor o rei: quer em vir- tude do direito natural, pelo qual é licito repelir a forga com a fora; quer porque, no caso necessrio para a conservagao da republica, fica sem valor aquele primeiro pacto, pelo qual a repdblica transfere seu poder ao rei"? 1. O direito ¢ a guerra Morelos © os tedlogos insurgentes conheciam secu dircito natural de re- pelir com a violéncia a tirania e 0 abuso da autoridade de que eram ob- 94 jeto. Segundo o General," . & licito a um reino reconquistar-se, ¢ ainda, a um reino obediente é I{cito nao obe- decer a seu rei quando este é into- lerével em suas leis, que se tornam insuportaveis, como as que, de dia a dia, nos carregavam neste reino os malditos gachupines arbitraristas” } Os patriotas apelaram para a violén- cia como ultimo recurso possivel pa- ra reivindicar seus direitos. Haviam se esgotado todos os outros meios. O tinico de que podiam dispor, en- to, era o de “repelir a forca com a forga”. Somente com as armas re- cobrariam os direitos usurpados & sua nagdo‘. Os tiranos fecharam todos 0s caminhos pacfficos de reivindica- G40 do povo, Foi necessério aos criou- los “valer-se da forca” para reclamar seus direitos, ¢ expulsar os invasores do territério >. O Pe. Morelos explicou assim ao bispo de Oaxaca: “Ainda que a obs- tinada resisténcia do governo curo- peu, tdo ilegftimo em seus principios como tirano e bérbaro em suas pro- vidéncias, no s6 se negou a nossas solicitagdes, como também, e parece inerivel, fechou seus ouvidos a ra- z4o, sem querer discutir sobre a jus- tiga de nossa causa e os princ{pios com que nos conduzimos; nem por isso nos desconsideramos, nés que estamos & frente da Nacio, susten- tando seus direitos sagrados, de ob- servar ¢ repetir exatamente as cau- sas justificadas ou méximas dos po- vos ¢ da guerra, em beneffcio da hu- manidade, na ocasifio em que, mais que a todos, interessa aos nossos an- lagonistas conhecer e acolher os Ultimos subterfugios, que depois de vinte ¢ seis meses de uma guerra in- testina, nunca vista, cairam devido & forga de nossa religiosidade € nos- so caréter por temperamento huma- no” 6, A guerra insurgente nao foi um movimento arbitrério produzido por um capricho irracional, assinalou o Servo: “Nao é minha intengao pro ceder pela forca ¢ por capricho, mas pela reta razfio”?. Empenhar-se em sua ago libertadora era um direito natural e uma aciio justificada teolo- gicamente: “Temos que nos valer do direito de guerra — exortava o che- fe da resisténcia em Cuautla — para Testaurar a liberdade politica”’. Em Acapulco, o chefe militar que incen- diara 0 sul, expés claramente aos cs- panhéis: “A nacZo quer que o gover- nO recaia sobre os criovlos, e como nao querem ouvi-la, tomou das armas Para fazer-se entender e obedecer"®. Morelos lembrou as excegdes que merecem o quinto mandamento da lei divina: é Ifcito matar em "guerra justa como a presente”, dizia, assim como ao “injusto invasor” 1: O gene- ral instruiu seus compatriotas com Palavras contundentes: “Por fim, meus patricios, é lei prescrita no Di. reito Comum e dos Povos, que se cli- mine 0 inimigo conhecido. Se os ga- chupines nao se rendem nem se su- jeitam ao governo da Soberana e Su- Prema Junta Nacional desta América, acabemos com eles, destruamolos, ex- terminemo-los, sem embainhar nossas espadas até nos vermos livres... A persuasio da necessidade ¢ da justica da revolucio, era {ntima no 4nimo de Morelos. Por isto dizia ao Cabido de Oaxaca que se a causa nfo fosse justa “eu e todo o meu exército largaremos as armas’'2, Sem reti- céncias, portanto, o discipulo de Hi- algo, que recusava outros. titulos, aceitou o que lhe deu um subordina. do seu, D. Miguel Antonio de Quesa- da: “Generalfssimo das Armas Catd- licas desta América Setentrional” » VIII, DIVERSAS OPCOES POLITICAS DO CLERO DIANTE DA INDEPENDENCIA Durante a insurreigéo se produziu uma acirrada polémica entre 0 clero neohispanico, da qual participaram também os leigos. Uma parte do cle- ro, irredutivelmente presa ao passa do, execrou o movimento renovador Outros foram insurgentes. Das filei ras do clero sairam realistas e insur- gentes que tomaram das armas para defender suas idéias, segundo mostra © quadro da pagina seguinte. 1. Algumas opinides episcopais No dia 24 de maio de 1810 0 bis- po eleito Dom Manuel Abad y Quei- Po declarou que “D. Miguel Hidalgo € seus partiddrios sfo pertur- badores da ordem publica, seduto- res do povo, sacrilegos, perjuros € caluniam os europeus"', O arcebis- po do México, D. Francisco Xavier Lizana y Beaumont, reagiu no dia 24 de setembro. Numa carta pastoral Perguntou a Hidalgo: “Diga-me, diga- “me, pobre enganado pelo espirito maligno... como cafste qual o outro Lucifer por sua soberba? Nao se ou- viré teu nome neste reino de Deus, sendo para eterno andtema”. Segun- do Lizana, Hidalgo nao cra ministro de Jesus Cristo mas de Satands ¢ Precursor do Anticristo. Contra a re- volucdo, o prelado defendeu a tese polftica de que “o melhor governo de cada pais ¢ o atual. . pois sio lais e tantas as desgragas que inter- viréo para mudé-lo que jamais podera compensé-lo felicidade alguma", Liza- na exortou ao clero a sustentar a cau- sa de Fernando VII para que limpas- se “a mancha com que um ministro do santudrio maculou nosso venerd- vel grémio"?. Na opinido do Sr. Li- zana, a insurrei¢io era anticatdlica, quimérica, extravagante, ridicula ¢ produziria trés males terriveis. Seria sumamente prejudicial para seus di- rigentes, para a Nova Espanha ¢ para todas as nagdes da terra, O movi- mento de independéncia era também uma “doutrina que as Sagradas Es. 95 - QUADRO ESTATISTICO GERAL INSURGENTES TRIGARANTES REALISTAS TOTAL Ne % Ne % Ne % CONEGOS 1 0 PAROCOS 2% 24% de 1072 1 VIGARIOS 10 ie PRESBITEROS 18 DIACONOS 2 0 SUBDIACONOS 4 MINORISTAS 1 CLERIGOS 29 ro woro-ono 1 13% de 1072 42 3,9% de 1072 10 19 2 5 1 4 x8 nocoow-+8 Do clero secular a1 2,1% de 4229 AGOSTINIANOS CARMELITAS DOMINICANOS FRANCISCANOS 1 HIPOLITOS 0,5% de 4229 114 2,6% de 4229 1 2 1 4 1 1 JOANINOS 6 1 2 7 2 7 u 1 6 1 MERCEDARIOS NAO ESPECIFICADOS L 7 Do clero regular 3 1% de 3112 10 47 15% de 3112 TOTAL GERAL 128 1,7% de 7341 1 32 0,4% de 7341 161 2% de 7341 NOTAS — 1. Os nimeros assinalados com * no grupo Trigarantes nao foram somados, por se tratar de pessoas j inclufdas nos insurgentes. 2, Segundo estatistica de D. Fernando Navarro y Noriega, havia na Nova Espanha, em 1810: 1072 Vigérios Clérigos 4229 Religiosos 3112 Clérigos ¢ religiosos 7341 Fonte: José Bravo, S.J. Revista Abside, vol. VII, 1943. crituras © a nossa Santa Mae, a Igre- ja, reprova”, afirmava 0 anciao D. Francisco 3 © bispo de Guadalajara, excomun- gou, no dia 24 de outubro de 1810, os “protervos” Hidalgo, Allende, Alda- ma, Abasolo e "todos aqueles que de qualquer maneira, voluntariamente, aprovam, auxiliam e favorecem seus proclamas. . .'"4 O bispo de Puebla e seu clero ade- riram A causa do rei mediante um juramento que fizeram no dia 27 de outubro de 1810: “Como ministros da religiio santa que professamos, que nos impée como um dos primei- ros deveres a obediéncia, o respeito © a submissdo aos reis, de que nos deu exemplo seu soberano Autor, de- vemos ser as mais firmes colunas que sustentam o trono do monarca, a quem juramos reconhecer e obede- cer”. Os camponeses tacharam os sa- cerdotes insurgentes de “sujeitos in- fames e desnaturados que aspiram a sacudir 0 jugo suave, debaixo do qual agradavelmente temos vivido”. Conclufram seu escrito prometendo ndo se afastarem “jamais da justa causa, pregar ¢ ensinar, tanto nos exercicios préprios de nosso ministé- rio, quanto nas conversas familiares, a doutrina sadia da obediéncia ec res- peito a nosso legitimo soberano Sr. Dom Fernando VII" >. 2, Admiraséo de um espiao Um grupo de sacerdotes ¢ secula- Tes se reuniram para comentar os sucessos que tanto interessavam a todos, A junta se reuniu na cidade de Celaya. Frei Cristobal Rodriguez, espido realista, denunciouos em 17 de fevereiro de 1811. Sua carta é re- veladora da efervescéncia vivida na- queles dias. Diz assim: “Ilmo. Sr. No cumpri- mento de minha obrigaco... passo @ fazer as seguintes dentincias: houve uma reunifio na cela do R. P. Plancarte, na qual compareceram os padres Dom Manuel Dias, cura it rino de Celaya, Dom José Bellojin, Dom José Perez, Dom Pedro Perez, Dom Ramén Natera, o R. P. Guar- digo daquele colégio Frei Ignacio Mo- rales, o padre Reitor de Teologia sa- grada, Frei Mariano Salazar e os se- culares Dom Francisco Tres Guerras¢ ¢ Dom Francisco Oviedo. No meio da confusio, pois falavam ao mesmo tem- Po, ouvi esta proposicao: o Edito (de Abad y Queipo) era sub-repticio pois nao viera segundo o costume: € me parece que ela foi proferida por Dom Francisco Tres Guerras; eu disse que aquela proposicao devia ser delatavel. Todos se calaram, porém, depois de pouco tempo comesou ou. tra vez a mesma confusdo de pergun- tas e mais perguntas ao R. P. Plancar- te; perguntavam se no dia seguinte, sendo domingo, rezariam missa, ¢ se fixassem os editos eles deveriam ras- g&los ou nao... Nessa mesma reu- nigo, o P. D. José Bellojin disse (co- mo se estivesse escandalizado) que um sujeito, creio que de carter, lhe dissera que 0 Edito da Santa Inqui- sigdo somente serviria para limpar. . Quvi o préprio P. Guardido engran- decer e louvar o espirito do herege Hidal, Ouvi dona Gertrudes las Ojos dizer que o Sr. bispo de Valla- dolid, por ser gachupin, podi exco- mungar, e por ndo estar consagrado no podia fazé-lo O P. D, José Pe- rez dissera que todos aqueles que acreditam nos gachupines so here- ges... O P. D. Manuel Dias disse a0 Sargento Magdaleno Rodriguez que a primeira descarga foi dada para o ar, € a segunda aos gachupines; que ele € os padres Dom José Perez ¢ Dom Pedro Perez os absolviam completa- mente... O P. Rodriguez disse que... num dia do més de outubro ultimo rezou um rosério pelas ruas, e de. Pois pregou agradecendo a Nossa Se- nhora elo éxito do -herege Hidal- go." 97 3. Acusagdes andlogas Realistas e insurgentes se acusa- ram mutuamente, de maneira muito forte. Cada grupo defendia com tena- cidade seu ponto de vista, baseado em seus conhecimentos _teoldgicos. Morelos nao ficou a salvo do jufzo in- quisitorial. No dia 24 de novembro de 1815, o Tribunal o acusou de ter passado para o grémio “feio, impuro ¢ abomin4vel dos hereges Hobbes, Hel- vécio, Voltaire, Lutero € outros auto- res pestilentos” A inquisicao decla- rou o Servo “herege formal, apésta- ta de nossa sagrada religiéo, atev, materialista, defsta, libertino, sedicio- so, réu de lesa-majestade divina ¢ humana, inimigo implacdvel do cris- tianismo e do estado, sedutor, pro- tervo, hipécrita, astuto, traidor do rei e da pétria, lascivo, obstinado, contumaz e rebelde ao Santo Offcio” Essas cram as imputagdes gerais. A estas seguiram vinte e seis capitulos de acusagSes pormenorizadas ®, Embora Abad y Queipos conside- rasse Morelos “sem diivida, a alma © © corpo de toda insurreigéo”, di- zia, também: “mesmo que ele seja um idiota, a inveja e a ambigdo de- senvolyeram bastante os seus talen- tos para entender e considerar seu proprio negécio, e aproveitar-se das luzes ¢ das experiéncias dos fracas- sos, que o dirigem”?. Antes de atacar Valladolid, More- los escreveu para Abad y Queipos nos seguintes termos: “Entre os gran- des corifeus da tirania na América, sem divida, tu ocupas um lugar de destaque. Tu foste o primeiro que infringindo as regras prescritas por Jesus Cristo langaste o terrivel raio da excomunhio contra © povo cris- Yo © generoso. Tu, com tuas persua- ses ¢ escritos, és aquele que mais fortemente soprou a fogueira em que tantas vitimas inocentes foram imo- ladas A justica e & liberdade Tu te achas no momento de dar a tilti- ma prova: ou de que és monstro en- 98 tre os tiranos, ou de que circula em tuas veias o espfrito racional. Ouve em teu coragfo os solugos das vid- vas, © pranto dos inocentes, os ais dos feridos, a confusio de todos ¢ tudo o que hd de horrivel no aspecto da morte cspalhando caddveres por todas as partes; e, j4 que tantas vezes exortaste este povo para sua perdicao, anima, agora, A salvacio. "10 Terrivel, também, € o bando do insurgente Dr. Cos contra o mesmo Abad y Queipo. Acusou-o de seguidor de Rayo ¢ Jansénio. Disse que ele pregava que “Jesus Cristo nfo derra- ‘mou seu sangue pelos insurgentes, que & impossivel que estes se salvem, mesmo que se arrependam de seus pecados; que os insurgentes sacerdo- tes deixam de sélo ¢ ficam destitus- dos do cardter espiritual pelo fato de se declararem pelo partido da Nagao Americana" © doutor escreveu os seguintes “teoremas” que lembram o método de Spinoza, contra o eleito: “1) Abad y Queipo nfo é nem péde ser peni tenciério nem bispo de Valladolid, porque € acusado formalmente de he rege hd muitos anos .; 2) Ainda que fosse habilitado para esta dign dade, deveria recusla por ser ini- migo irreconcili4vel da América; cle que procurou o exterminio de todo © crioulismo _ porque ao invés de trabalhar como pastor, agiu como um lobo, querendo a morte temporal ¢ eterna do rebanho de Jesus Cristo 3) Abad y Queipo é€ um excomunga- do € esta incurso em todas as cen- suras determinadas pelo Direito Ca- nénico, tanto pelas razdes j4 indica- das, como por haver usado violéncia contra os clérigos! IX. TEOLOGIA POLITICO. -CARITATIVA Varios decénios antes de 1810, ha- via iniciado em Michoacén, em Pue- bla, no México, um movimento propi- ciado pelos jesuftas, renovador da teologia ¢ filosofia escoldstica ensi- nada nas escolas. Em 1763, Clavijero iniciou seu pe- riodo docente em Vallodild. Ocupou- -se em incorporar a filosofia e as cién- cias modernas a escoldstica tradicio- nal. Francisco Xavier Alegre, de sua parte, preparava suas Instituicdes Teolégicas, que depois publicou em sete volumes. Afirmou que a autori- dade se funda na natureza social do homem, porém sua origem mais pré- xima é 0 consentimento da comuni- dade. A autoridade civil, escreveu, nao vem diretamente de Deus para os governantes, mas sim, através da co- munidade. Andrés de Guevara y Ba- soazabal promoveu o estudo da filo- sofia moderna e escreveu o elogio de Descartes, de Galileu « de Bacon. O filipense Diaz de Gamarra, autor de Elementa Recentiéris Philosophiac, impulsionou — j4 expulsos os jesui- tas — “a avalancha da modernidade”. Enfrentou, como Clavijero, contra- tempos graves por aquilo que pare- cia aos conservadores uma ousadia intoleravel. O P. José Pérez CAlama, patroci- nado pelo bispo de Puebla, D. Fabfan y Fuero, partid4rio do Iluminismo, Jutou contra o ergotismo e contra aquilo que ele chamava “vicios da es- coldstica”. Apesar das contradigées que uma parte do clero lhe opés, ocupou-se em fomentar nos alunos do semindrio de Valladolid, tanto o espirito critico como o uso dos au- tores contemporaneos. No concurso convocado para a de- signagio do reitor dessa instituicdo, D. Miguel Hidalgo obteve o posto gra- gas A sua “Disertacién sobre el ver- dadero método de estudiar Teologia Escolastica”. Hidalgo expés a neces- sidade de unir a escoldstica com a teologia positiva. Uma vez consolidados estes inten- tos renovadores no campo académi- co, os efeitos vieram & tona. Pérez C4lama fundou a Sociedade dos Ami- gos do pais, em 1784. Tinha como fim estender ao povo os frutos da renovagao que o clero estava experi: mentando. Desejava desenvolver a educacéo ¢ incrementar a industria popular para transformar a economia ea sociedade. Alguns se opuseram, alegando que o movimento propicia- ria a independéncia politica da Nova Espanha, 0 que nao desejavam de maneira alguma. O bispo S. Miguel apoiou o projeto em 1785. Em se- tembro deste ano, as geadas destrui- ram as colheitas de Michoacan. O bispo fez varios empréstimos para que o milho, alimento necessdrio pa- ra o povo, fosse trazido de outras regioes. Pérez Célama idealizou um “Pro- jeto Caritativo” que pretendia conse- guir maiores quantias em dinheiro para facilitar os empréstimos. Jun- tamente com o bispo, iniciou a cons- truco de um monumental aquedu- to — que ainda existe — para dar trabalho aos pobres. Ambos pediram as classes mais ricas que dessem tra- balho ao maior numero possivel de desocupados e indigentes, para evitar que morressem de fome. Embora 0 cénego Lazo se opusesse a tais ini- ciativas, tiveram éxito. De outubro de 1785 a janeiro do ano seguinte os necessitados obtiveram empréstimos no valor de 288 mil pesos. Ativida- des similares eram empreendidas nos arcebispados de Puebla e do México. O movimento anterior desemboca- ra no esboco da chamada Teologia Politico-Caritativa, que foi qualificada como uma “‘interpretacdo ilustrada da caridade cristé". Estabeleceu um método novo para a consideragao ¢ a reinterpretagio dos contetidos teold- gicos. Essa tcologia tratou de encar- nar efetivamente a fé a partir das necessidades sociais. Pérez Cdlama escreveu sua Carta Histérica sobre “Siembras Extempo- r4neas de Mafz y otras Precauciones para lo Futuro contra la Escasez” 99 assim como seu “Proyecto de Trans- porte por el Rio Balsas”. Aprofundou sua reflexiio sobre a realidade ¢co- némica, instado pela fé religiosa que © interpelava. O Dr. Vicente Antonio de los Rios fez o possivel para que © movimento teolégico social fosse detido pelas autoridades reais. ‘A mudanga de mentalidade de mui- tos clérigos, principalmente na dioce- se de Michoacén, contudo, era uma realidade. Os adeptos destas tendén- cias se preocuparam em fundir a teo- logia da Cidade de Deus com a inquie- 30 que mostravam a respeito da Cidade do Homem. Desde 1787 0 clero mostrava um claro malestar com relagio a cres- cente ingeréncia da Coroa nos assun- tos eclesidsticos. Igualmente grave foi a reagdo diante do Decreto de Alie nacho expedido em 1804, que tantos danos causou & economia colonial. Um elemento externo, a Revolugao Francesa (seus efeitos e Napoledo), deteve 0 choque contra a Coroa, co- mo também o aprofundamento e a evolugaéo da Teologia Politico-carita- tiva. Sem davida, o clero se interes- sara vivamente pelos problemas po- Iticos © econdmicos. A presenca na revolugéo de um clero altamente po- litizado, que entendia de organizacSo social © econémica, teve um papel muito importante na sua origem !. X. CONCLUSAO As observagées do revolucionério Morelos analisaram os cinco proble- mas mais importantes que sua nagio enfrentava. Em seus escritos, D. José Maria criticou a situagéo politica, ju- ridfca, econémica, social ¢ religiosa da entSo Nova Espanha. Os escritos do insurgente foram produzidos no tempo em que comandava suas for- ¢as armadas. Nao so, portanto, nem o lamento do poeta que manifesta a 100 solidao de sua alma, nem o {rio en- saio analista do especialista que diag- is alheios & sua vida. Por necessidade revolucionaria Morelos descreveu os males que ¢x- perimentava como parte que era do povo oprimido pela injustica. Lendo seus pardgrafos compreen- demos por que o Servo abandonou sua paréquia e foi incendiar o Sul. Cum- pria as ordens de Hidalgo, seu mes- tre, enquanto este encarnava a voz angustiada de um povo que exigia a libertagdo. O merecimento de More- los consistiu no fato de haver amplia- do de modo efetivo a acdo libertado- ra iniciada por Hidalgo, que rompeu com um decorrer histérico trés vezes centendrio. Morelos deu origem a uma época nacional criadora. O pensamento do insurgente teve como fonte principal a pobreza an- gustiada que o povo sofria. Como sa- cerdote, sentiu na propria carne o profundo mal-estar que experimenta- va o nascido nestas terras. Morelos foi o guia indiscutivel da insurgéncia porque no fora alheio ao sofrimen- to de seus irmaos. A forga extraordinaria que 0 Servo imprimiu a revolugdo de independén- cia foi o resultado de uma acio cons- ciente do caudilho, que tinha o fir- me propésito de-conseguir a liberda- de e a reorganizagSo social de sua nag&o. Os graves erros cometidos por Morelos nas batalhas de Valladolid e Puruarén acabaram com as energias do homem e derrotaram o movimen- to insurgente, que decaiu quando as balas realistas assassinaram o prisio- neiro, Contudo, © espfrito de Morelos ainda est4 vivo e permanece como um ideal, porque ele ¢ heréi ¢ simbo- lo da Histéria do México. O répido decorrer dos anos, a partir do j4 re- moto ano de 1815, ndo reduziu a im- portancia da heranca que D. Jos¢ Marfa legou a sua patria. £ relevante o fato de os mais en- carnigados opositores de Morelos te- rem pronunciado, sem sombra de du- vida, os melhores elogios feitos ao homem fuzilado em San Cristobal. Ala- man confessou: “E o homem mais no- tdvel que houve entre os insurgen- tes”. Abad y Queipo reconheceu: “Foi um heréi extraordin4rio na guerra ¢ na politica”. Calleja chamou-o “Espf- rito verdadeiramente revolucionario ¢ empreendedor” !. Nao queremos terminar este sin- gelo trabalho sem reproduzir uma parte do manifesto redigido pelos sol- dados de Morelos quando este cami- nhava para o México, préximo a der- ramar seu sangue. As linhas refletem os sentimentos dos combatentes que perdiam seu chefe, como o ambiente em que se encontrava nosso pais agoitado pela guerra: ‘“‘Soldados, aca- bais de ser testemunhas quase ocula- res de um fato que cobriu de luto vosso coracdo...; queremos falar so- bre a detengio do Generalfssimo D. José Maria Morelos, ocorrida desgra- gadamente no domingo, dia 5 do cor- rente, nas imediagdes de Temazcala. Este acontecimento que a Na¢éo Me- xicana choraré com a mesma justica com que 0 povo de Israel chorou seu caudilho Judas Macabeu nao deve precipité-los no abandono, na desola- A Nova Espanha na encruzinhada de dois séculos 1 Podese consultar: Histéria de Mé- xico de ALaMAN, Lucas, México, JUS, 1942, t. 1, pp. 89144; Vittoro, Luis, El Proceso Ideoldgico de la Revolucion de Independéncia, México, UNAM, 1967, 350, pp. 1331; FioRescano, Enrique ¢ SAN- cuez, Isabel Gil, La Epoca da las Re- el Cresimiento Econémico, formas y 1750-1808, pp, 183-301, em Historia ral de México, El Colegio de México, 1976, t. 1; Cuevas, Mariano, Historia de la Iglesia en México, México, Ed. Patri: S ed, t. IV, Pp, A359, et. V de Edi torial Revista Catélica, el Paso, Texas, 1928, pp. 33.96. Gao € no desespero.. Soldados, sa beis melhor do que ninguém o que haveis perdido; conhecestes nosso Pa- dre Morelos, 0 acompanhastes em suas brilhantes campanhas, merecestes seu carinho {ntimo, repartistes com ele a gloria de libertar a América aflita, e ele sempre vos conduziu pelo cami- nho da honra e da vitéria. Ah! Ima- gind-lo agora no meio de seus inimi- gos, sedentos de seu sangue, como ovelha nas garras dos tigres e leo pardos, feito objeto de deboche; bur- lado, ultrajado, ferido e disposto a sofrer por vés uma morte cruel, em que executam nossos inimigos as ar- bitrariedades de sua ferocidade natu- ral, Soldados, eis a sorte que coube a vosso Pai, 0 ornamento da América Mexicana, o Heréi do Sul, cujo nome fazia tremer nossos tiranos e forga- va a admiragfo da Europa... Eia! juremos todos vingar seu sanguc; re- pitamos este propésito pela tarde, pela manh4, a noite e em todos os instantes de nossa vida. Morram seus assassinos ¢ que o sangue dos 60 mil europeus tiranos que habitam esta América lave o sangue de vosso ama- do e querido general! Guerra, guerra ¢ édio eterno aos assassinos do Gran- de Morelos!” 2 Nasceu em Valladolid, morreu em San Cristobal 1A ltima afirmagao provém de ViL- LASEROR ¥ VILASEROR, Alejandro, Biogra- fias de los Heroes’ y Caudillos de la Independencia, México, JUS, 1962, t. II, . 43. A melhor obra que conheco sobre joreios, verdadeira enciclopédia do in- surgente ¢ de sua época, é a de LEMOINE Vuiticats, Ernesto, Morelos y la revo- lucién de 1810, Governo do ‘Estado de Micboacén, 1979, Fontes importantes so BUSTAMANTE, Carlos Maria, Cuadro His: trico de la Revolucion ‘Mexicana Co- menzada em Septiembre 15 de 1810 por el C. Miguel Hidalgo y Costilla, México, Talleres Soria, 1928; ALAMAN, op. cit, t. Ia III. Dos estudos dignos’ de serem 101 mencionados sobre D. José Maria sao os de CHAVEZ A. Ezequiel, Morelos, Méxi- co, JUS, 1965, ¢ VaRcAs, Ubaldo, Morelos Siervo de la Nacion, México, Porria, 1971, 3* ed. Os inimigos do povo e suas agdes 1 Para estudar os escritos de Morelos usei a recopilagdo publicada por LEMOI- NE Viuicasa, Ernesto, Morelos, Su vida revoluciondria através de sus escritos y de otros testimonios de la época, Méxi- co, UNAM, 1965. Adiante cito 0 titulo do escrito, o lugar onde foi redigido e a data, A letra D indica o nt que este. Documento tem nesta obra, € as- Sinalo as paginas em que se encontra. Veja-se neste caso 0 Proclama, Cuautla, 23, IT 1812, D 24 p. 196. 2 Desengafio de la América, Tehuan- tepec, XII, 1812, D 55 p. 255. 3 Manifiesto de Puruarén, ib., 28 VII 1815, D 202 p. 557 4'Tratados de forma mais ampla, po- demos ver estes conceitos em Caunauca (ez, Agustin, Abad y Queipo y Mo- relos, Diagnosis Sociales en Pugna, Mé- ico, Chrotus, julko, de 1978, n* 512, pp. ¥ Garcts, Genaro, Documentos Inédi- tos 0 Muy Raros ‘para la Historia de México, El Clero de México y la Guerra de Independéncia, México, Libreria de la Vda, de Ch. Bouret, 1906, t. IX, pp. 3849 documento V ¢ anexo A. O primeiro governo mexicano ) Elementos da Constituigio, Tehua- can, 7 1X 1812, D 40 p 222 4 Broclama,’ Cuautla, 8 1 1812, D n p. 192. }"Anotagio em Uma Circular do Ar- cebispado do México, Chilpancingo, 2 VI 1813, D 84 p. 317. 4'Aos Crioulos que andam com as tropas dos gachupines, Cuautla, 23 II 1812, D 24 p. 195, 5’Sentimentos da Ni 14 IX 1813, D 110 p, 370, 6 Oficio, Cuautla, 31 XII 1811, D 19 P. 186. 7-Carta a J. M, Liceaga, Chilapa, 28 VE 1812, D 28 5 arta a Dom io Lopez Rayén, Tehuacan, 12 1X 1812, D3l-p. 207. 9 Atas ‘do Congresso, Chilpancingo, 5 10, Chilpancingo, a9 XI 1813, D 135 p. 421. 10 Regulamento para a inst do Congreso, Chilpancingo, 11 IX {613 D 107 p. 355. WD 136 p 4255 102 2 Pode-se consultar 0 texto constitu. cional em TENA RAMIREZ, Filipe, Leyes Fundamentales de México, 1808-1957, Mé- xico, Porniia, 1957, 942 pp. 3258. As ‘prin: cipais influéncias\ que esta constituicdo recebeu vieram de Locke, Hume, Moi tesquicu, Rousseau, Jefferson, Feijoo, en- tre outros. Cabe aqui recordarmos que nas universidades americanas havia sido claborada uma tradicao jurfdica, basea- da no Direito Romano ¢ no Direito Clas- sico Espanhol, populista e democratico, que, fora clarficado| no século XVI por itéria, Solo Suarez ¢ outros. Os uni- versitarios da América também conhe- ceram os juristas Grécio, Puffendorf ¢ Heincccius: Por outro lado, 0 exemplo dos Estados Unidos foi determinante, como podemos supor. cesso cleitoral, nossa constitui pirou na de Cédiz ¢ na francesa. 0 Do- Cumento significou o auge social ¢ po Mtico do povo neohispanico. Foi a sexta escrita na América, depois da dos Esta- dos Unidos (1776), Haiti (1804), Equa- dor (1809), Colombia (1810) ¢ Venezue- Ia (1811). ‘Pode ser consultado o exce- Iente estudo de De ta Torse Vuniar, Er- nesto, La Constitucin de Apatzingdn y los Creadores del Estado Mexicano, M& xico, UNAM. 1964, 439 pp. 41-34. ® Sentimentos da Nagao, Chilpancin- , D 10 p. 371 M4 Exposig¢. de motives, Apatzingén, 23 xe Bes pe Spates 15 Decreto, Chilpancingo, 25 X 1813, D 131_p. 41-12. | % Sublinhou Morelos. Carta a Igna- io, bpez Rayon, Acapuico, 3 VIII 1813, D 101, pp. 346. 1 Carta a Lépez Rayén, Liceaga y Berdusco, E} Veladero, 29 III 1813, D 68 p. 280, Ultimatum a Velez, Acapulco, 2 V 1813, D 76 p. 287. P 8 Carta a Liceaga, Puruardn, 31 1814, D 151 p. 453, % Carta ao Presidente dos Estados Unidos do Norte, Puruaran, 14 VII 1815, D 206 p. S64, Madison governou de 1608 A liberdade 1 Discurso, Chil, ‘ingo, 14 D 103 5 3g, lpancingo, 14 IX 1813, 2 Sentimentos da Nagdo, sentimento 23, Chilpancingo, 14 1X 1813 D 110 p. 1S iscurso, Chilpancingo, 14 1X 1813, D 103 p. 369. _ s. 4 Carta ao Presidente dos Estados Unidos do Norte, Puruardn, 14 VII 1815, D 206 p. 563. 3 Proclama, Cuautla, 8 II 1812, D 22 . 190, » Manifesto, Oaxaca, 23 XII 1812 D 53 pp. 243 e 245. 7 fb, ; 8 Exposigio. de Motivos, Apatzingén, 23 X 1814 D 175 p. 493. 9 Decreto, Puruardn, 3 a 14 VII 1815, D 203 p. 559. 10 Sentimentos da Nacdo, Chilpancin- go, 14 IX 1813 D 110 p, 372. U1 Circular, Cidade de Nossa Senhora de Guadalupe de Tecpan, 13 X 1811, D 16 B- 182. 2 Tena Ramirez, op. cit. p. 354. B Ib, p. 33. 44 Discurso, Chilpancingo, 14 IX 1813 D 109 p. 3679. Insurgéncia e religiao 1 Carta a Calleja, Cuautla, 4 IV 1812, D 26 p, 201. 2 Morelos explicou sua fé catélica gontrapondea 2° conduta ‘dos inimigos da independéncia. Qualificou-os de “per- juros inimigos de Deus”, a quem nao guardavam © devido respeito. Tampouco tinham veneracdo A Virgem, segundo expressou Dom José Marfa. ' (Desenga- no, Tehuantepec, XII, 1812, D 55 p. 255). A conduta dessas’ pessoas era para © Generalissimo pior que a dos pagaos (Manifesto, Oaxaca, 23 XII 1812, D 53 p. 244, 3 Desengano, ib, O autor chama os espanhéis de “gachupines brutos da Ba- bilénia”. Vejase também Intimagdo a Velez, Acapulco, 2 V 1813, D 77 p. 290. 4 Carta ao bispo de Puebla, D. Ma- nuel Ignacio del Campillo, Tlalpa, 24 XI 1811, D 17 p. 183. 5'Proclama, s/l,, XII 1811, D 18 p. 1854. $ Tb. Morelos se incomodava com _o fato de nem todos os seus compatrio- tas seguirem o caminho do sacrificio exigido pelo bem da patria. Recordemos que nao foi facil para Moisés acalmar Os protestos dos judeus que também pref feriam as cadeias da escravidao. Ve- Jase, por ex, Exodo 14,11-12: “é melhor servir aos eg{pcios que morrer no de- serto”. 7 Carta ao bispo de Oaxaca D. Anto- nio Bergoza y Jordan, Oaxaca, 25 XI 1812, D 48 Jp. ,231; Discurso, Chilpancin- 20, 14 1X 1813 D 109 p. 366. pp {sbesengano, Tehuantepec, XII 1812, P. ¥ Reflexdes, Tehuacdn, 7 XI 1812, D 40 p. 226. Discurso, Chilpancingo, 14 IX 1813, D 109 p. 366, Permitam-me uma digres- so. O papa Joao Paulo II encontra um belo significado nesta citagao do Géne sis, Deus, criador onipotente, é Amor “O Deus da criagdo se fez Deus da Alian- ga._E isto se realiza segundo a mesma Tégica que preside, desde o principio, toda a obra da criagdo. E uma logics do amor que pode, talvez, ser identifi. cada com aquela de que fala Pascal: Le coeur a ses raisons, Precisamente © coragao, le coeur! Em toda a descri- go do Génesis se sente pulsar 0 cora- Gao! Nao temos diante de nés um gran de construtor do mundo, um Demiur- go: estamos diante do grande Coragac (Wosrvis, Karol, Sinal de Contradigao, Edigées Paulinas, S. Paulo, 1978). Wf Desengano, ‘Tehuantepec, XII 1812, D 55 p. 253. 2 Proclama, s/l. XII 1811 D 185.6. 9 Proclama, Cuautla, § I 1812 D 22 . 192. PW Decreto, Acapulco, 30 111 1813, D 70 p. 281. 15 A los Sefiores Europeos, Chilpan: cingo, 30 IX 1813, D 119 p. 384. is Proclama del Gobierno Insurgente, Tehuacdn, 17 IX 1815, D 218 p. 60: 17 Proclama s/l. XII 1811 D 18 p. 186. 18 Carta a Liceaga, 28 VI 1812 D 28 P i Broclama, Cuautla, 8 II 1812 D 22 p. 190. % Anotaco de_ Morelos, XI_1812 D4 p. 233. 2 Convocagag para 9 Congresso, Ac pulco, ib. 28, VI, 1813, 68, p. 325. 2 Tomada ‘do Castelo de Acapulco, ib,, 25 VIII 1813 D 105 p. 352. 2 Discurso, Chilpancingo, 14 IX 1813 18 p. Oaxaca, 26 D 109 p36. 24 Normas para o Juramento do De- creto Constitucional, Apatzing4n, 24 V 1814 D 176 p. 493 % Carta ao Presidente dos Estados Unidos do Norte, Puruardn, 14 VII 1815, D. 206 p. 5634. % Oficio, Cuautla, 31 XII 1811 D 19 186, Exposigdo de motivos, Apatzingn, 33 x isi4 D 175 p, 493. 2 Carta ao Lic. Ignacio Lopez Rayon, Hacienda de la Viguera, Oaxaca, 24 XI 1813 D 42 p. 229. Carta ao Dr. José Iba fez de Corvera, Oaxaca, 18 Ii 1813 D 61 p. 267. ® Circular, Zacapo, 7 1X 1815 D 209 p. 582. % Proclama, Cuautla, 8 II 1812 D 22 p. 190. Morelos anotou outras caracteris. ticas de atuagdo de Deus na independén cia de nosso ‘pais. Confiava na interve: go dele para que finalizassem as_dis COrdias internas que qualificava de “can. 103 cer", ocorridas entre os insurgentes (Car- ta ao Dr. Sixto Berdusco, El Veladero, 28 III 1813, D 68 p, 279). Tratou de mo- ver a vontade de Deus para isto: “Eu mandarei celebrar missas de agio de gracas no dia em que estivermos todos de acordo; espero em Deus que esta tur- buléncia acabe logo” (Carta a D. José Maria Liceaga, Acapulco, @ VI. 1813 D 73 p. 284). Na_concepcio de Morelos, assim mesmo, Deus julgava, premiava € castigava: julgard os crioulos que se ‘opuserem a0 movimento insurgente (Aos Americanos, Cuautla 23 III 1812 D 25 p. 199). Premiaré os membros da Junta que cumprirem sua obrigacdo e castiga- ré aos que forem infiéis a seu dever (Circular, Uruapan, 6 IX 1815 D 208 p. 576). Castigar, também, aqueles euro. peus que se opuserem ‘& “recuperacio de direitos dos americanos” a Calleja, Cuautla, 4 IV 1812 D 26 p. 200) A Virgem de Guadalupe castigaré tam: bém a “insoléncia e perfidia inaudita” dos inimigos da causa (Desengafio, Te- huantepee, XII 1812 D 55 p. 255). Mo- relos nos apresentou uma atuacdo de Deus muito parecida com a que. Ele mostrou no éxodo dos judeus (vejase, P. €., 669); libertou-os da escravidio ¢ guiouos para a terra prometida. Obser- vemos que o Generalissimo considerava a Deus, como observa agora G. Gutiér- rez, “um Deus perto, de comunhio ¢ compromisso com o' homem” e “que acompanha as vicissitudes histéricas de seu povo” (Gutiérrez, Gustavo, Teologia de la Liberacién, Salamanca, ' Sigueme, 1972, 399 pp. 244 © 246). Segundo ana- lisa ‘oP. Gutiérrez, a presenga de Deus entre os homens teve duas fases no An- tigo Testamento. Com efeito, de “locali- zada ¢ ligada a um povo", 6 judeu, foi estendendo-se a todos os povos da terra. Para Dom José Maria Morelos, no tem: po da independéncia, ao contrario, Deus volveu & sua posicao inicial. optou pre- ferencialmente pelo povo oprimido da Nova Espanha (ib. 250) 30 A los Americanos, Cuautla, 23 IIT 1812 D 25 p. 199. 31 Desengafio, Tehuantepec, XII 1812 D 55 p. 258 % Proclama. Cuautla, 10 IT 1812 D 22 P. 193. _ » Razén, Pinotepa del Rei (hoje Na. cional) 3 IT 1811 D8 p, 169. o Desengatio, Tehuantepec, XII 1812 40 p. 25: % Sentimentos da NacSo, sentimen- 19,19, Chilpancingo, 14 1X"1813 D 110 p 3 A Jos Americanos, Cuautla, 23 II] 1812 D 25 p. 199 104 17 Carta ao Lic. Ignacio Lopes Rayén, Oaxaca, 1 X11 1812 D 47 p. 235. 38 HeNANDez ¥ Davalos, J.E., Colec cién de Documentos para la Historia de la Guerra de Independencia de México de 1808 a 1821, México, El Sistema Pos- tal de la Reptiblica Mexicana, 1877-82, 6 t VD 148 p. 36, * Informe de um espido Cuautla, 1 I 1812 D 20 p. 1878. Decreto, Cidade de Nossa’ Senhora de Guadalupe, 18 IV 1811 D 10 p. 172 Grifo de Morelos. 41 Manifesto, Oaxaca, 23 XII 1812 D 25 p. 198, “2 Breve Argumentacio, tlan, 2 XI 1813 D133 p. 417. 4A los Americanos, Cuautla, 23 V 1812 D 25 p, 198, Desengafio, Tehuantepec, XXI 1812 D 55 p, 251 ® Proclama, Cuautla, 8 11 1812 D 22 B; 190: Juramento, Oaxaca, 13 XII 1812 49," p. 236; Carta ao Governador do Bispado Dr, Antonio Ibafiez de Corvera, Oaxaca, § V 1813 D 78 p. 291, Convoca: toria, Acapulco, 28 VI 1813 D'88 p, 325. 4 Exposigao’ de Motivos, Apatzingén, 23 X 1814 D 175 p. 43991 Carta a Calleja, Cuautla, 4 1V 1812 realista, Tlacosanti- D 25 p. 201. 48 Ultimato a Velez, Acapulco, 30 1V 1813 D 76 p, 287. * Proclama, s/I, XII 1811 D 18 p 185; Intimagao a Pedro Antonio Velez, Campo sobre o Castelo de Acapulco, ZV 1813 D 7 p. 289 3 Morelos _nio concebia a sociedade auténoma frente A autoridade cclesids- ica, em parte como reagdo a0 anticle- icalismo revoluciondrio francés, Nem a Tgreja — isto por vicios do Estad 31 Ata, Chilpancingo, 6 1X 1813, D136 p. 424. 2 Discurso, Chilpancingo, 14 1X 1813 D 109 p. 3 Cuevas t. Vp. 98. 34 GuzmAn, Martin Lufs, Morelos y Iglesia Catdlica, Documentos, México Empresas Editoriais, 1948, 231 ‘p. 95 ca 19, Causa instruida por la Inquisicin de México contra D. José Maria Morelos y la Pavon. 3 Gutiérrez, op. cit. p.177 5 Ma B12 90, 108, 17, 187, 210-1, 221-2, 2375, 240, 251-2, 255, 264. Tirama evidente ! Exceto este caso, o Pontifice consi. derava a sublevagéo como um “mal maior” porque “enquadra novas injus tigas, introduz novos desequilibrios © produz novas rufnas”: Populorum Pro- gressio, Primeira Parte, II, 3031. Per- mitam-me incluir aqui o comentario que © padre Pedro Arrupe fez a este res- peito, durante o III CELAM, efetuado em Puebla, no ano de 1979. © jornalis- ta José Ramén Ceschi, de Cadena de Radio Rosario, Argentina, em uma par- te de sua pergunta disse: “A Igreja admite tradicionalmente que a violéncia considerada como recurso as armas po- de ser o mal menor (embora como meio excepcional, ¢ sob determinadas condigées) diante de uma situacdo de extrema opressao..." O superior geral dos jesuitas respondeu: “...a Constitui- go Gaudium et Spes nos diz que o uso e a violéncia das armas sao legiti- mos em casos extraordinérios, muito extraordindrios. Que se depreende desse ensinamento da Igreja? Primeiro: o cris- tao é um homem de paz. Nao é paci- fista_ por covardia, mas por amor. O cristao esta e deve estar disposto a ser mértir, porém, é pacifista, Segundo: é importante saber que a paz é possivel ou, dito de outra forma, a violéncia e a ‘guerra nao sao inevitaveis. E poss{- vel desarmar as mos € 0 coragao. Ter- ceiro: a paz jamais é uma coisa pron- ta e dada de uma vez para sempre, se- ndo uma tarefa e um desafio a ser realizado dia a dia. A paz é fruto da justi da justica eqiiitativa na dist ico de bens e oportunidades para todes os homens. E também, da justiga do corag’o que sabe respeitar os de- mais em sua dignidade de irmios e fi- Ihos de Deus. Além disso, a justica que se alimenta do amor vai mais longe que a justica apenas. Quarto ponto, que convém deixarmos claro, é que h4 uma obrigacdo de evitarmos a_violén- cia armada, usando todos os meios e em todos 0s niveis, Por isto, fazse ne- cessério uma oposigao forte as causas, principalmente as situagdes de injustiga que ‘siéo uma certa forma de violéncla institucionalizada, como diz Medellin no Documento sobre a Paz, n* 16. Quinto: € verdade que a insurreicao revolucio- naria pode ser legitima, como disse Pau- lo VI na Carta Encfclica Populorum Progressio, “no caso de tirania evidente e prolongada que atentasse gravemente aos direitos fundamentais da pessoa” (e sdo palavras do Santo Padre, nao do Pedro Arrupe revoluciondrio) “e causas- se danos perigosos ao bem comum do pais”. Isto Medellin também diz no n° 19 do Documento sobre a Paz (...) Mas, se se verificasse em algum pais da Amé rica Latina (falo no condicional), “ se verificasse aquela situagdo excepcio- pal a que se referia Paulo VI, as pes- soas que pensam em empregar a vio- Iéncia contra outra violéncia maior, jo- gam sobre suas consciéncias uma gra- vissima responsabilidade de que tcréo que prestar contas a Deus, aos homens @ a histéria de seu préprio povo. Isto muito delicado, e portanto escrevi-o, pois n4o quis falar, improvisando, nem mais nem menos do que é... (grava- so do autor). ; 2 SuaReZ, Francisco, Defensio Fidei, 3, 3, 3; 6, 4, 5. 3'Aos crioulos, Cuautla, 23 II 1812 D 2 p. 196. 4 Manifesto, Oaxaca, 23 XII 1812 D 53 "5 Desengafio, Tehuantepec, XII, 1812 D 55 p. 246. © Carta ao bispo, Antonio Bergosa_y Jordan, Oaxaca, 25 XI 1812 D 43 p. 230. 7 Carta ao Governador do bispado. D. Anténio Ibafiez de Correra, Oaxaca, 30 V 1813 D 78 p. 291. 8 Proclama, Cuautla, 8 I] 1812 D 22 p. 192. 9 Ultimato, Acapulco, 30 IV 1813 D 76 p. 287. 10 Decreto, Oaxaca, 29 1 p. 266, 4 Proclama, Cuautla, 8 II 1812 D 32 p. 193. 12 Carta a0 Cabildo de Oaxaca, Aca- pulco, 5 VII 1813 D 91 p. 330. 8 Cireular, Chilpancingo, 28 X 1813 D 132 p. 415. 1813 D 60 Diversas opgées politicas do clero diante da independéncia 1 Garcia, op.cit. p. 245. 2 HERNANDEZ y DAVALOS, t 152-4, 3 Garcia, op.cit. p. 9.20. go” HERNANDEZ y Divalos, t. IT D 83 p. 5 Garcia, op.cit. p. 73.4. $ Tratase do célebre arquiteto, pin- tor e gravador. 7 HERNANDEZ y Davdtos, t. 1 D 113-15. , ep 8 GUZMAN, op.cit. p. 87 a 122, > 9 damon, Morelos y la revolucon, 10 Carta ao Sr. D. Manuel Abad Queipo, Valladolid, 23 XII 1813 D 148 p. UuD7~p LEMOINE, Ernesto, José Maria Cos, Escritos Politicos, México, UNAM, 1967, D 34 p. 11418. 105 Teologia politicocaritativa 1A Teologia politicocaritativa pode ser estudada em Carpozo Gave, Gér- man, Michoacan en el siglo de las luces, México, El Colegio de México, 1973. Para a anterior renovagio académica e suas repercussées, ¢ muito util a obra de MENDEZ PLancaRte, Gabriel, Humanistas del siglo XVIII, México, UNAM, 1941. necess4rio um estudo da Teologia poli- tico-caritativa como antecedente, e de alguma maneira andloga a atual Teolo. gia da Libertagio. Muito antes de che- gar a década “recém-passada dos anos , havia sido produzida uma teologia latinoamericana que tratava de julgar a situagao social a luz da fé e que pre- tendia levar a cabo uma aco congru- ente com a inspirac3o que seus princi. pios Ihe proporcionavam. Ao estudar 0 que se chama “nova teologia politica”, aquela que se “faz criadora no contato 106 com as realidades sociais do mundo de hoje”, G. Gutiérrez recorda a teologia da historia, a teologia do desenvolvimen to, a teologia politica e¢ a teologia da revolugao, em especial a vertente ini. ciada por Bloch e revigorada por J.B. Metz Esta teologia avangou nd “deter: minagdo de um novo tipo de relacio entre religiio e sociedade publica, entre f ‘escatologica_e pritica social’, ‘Nao foi outra, nos parece, a busca que oricn- tou a Teologia politico-caritativa. (Cf Gutiérrez, op. cit. p. 73 y 288) Conclusdo 1 Henestrosa, Andrés, Héroe de He- roes, p. 1814, La Imortalidad de More- tos, México, Secretaria da Fazenda e Cre- dito Publico, 1965. 2 As Supremas Corporacées da Amé& rica Mexicana aos ilustres defensores de sua liberdade e independéncia, Tehua cén, 17 XT 1815, D218 p. 6063"

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