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A REPRESENTAÇÃO DO COTIDIANO NO FILME PUBLICITÁRIO 1

Marcelo Eduardo RIBARIC’2


Universidade Tuiuti do Paraná e UNIBRASIL, Curitiba, PR

RESUMO

No filme publicitário temos um discurso que vai além de sua própria natureza mercantil,
refletindo e retratando a realidade em que vivemos por ter sido construído nos limites
entre nossas demandas do cotidiano e os nossos desejos. Este texto é parte de nossas
reflexões teóricas acerca da história da publicidade audiovisual e do consumo como
representações do real e, como tal, uma representação da própria sociedade, onde a
audiência se identifica com seu cotidiano. Tendo como principal suporte teórico os
estudos do cotidiano de Agnes Heller e Michel de Certeau. Para apoiar o estudo serão
feitas, no decorrer do texto, micro análises de filmes publicitários realizados no período
denominado primeiro cinema e, uma obra de 2013 que faz uso de plataformas
transmidiáticas como a televisão simultaneamente à rede social twitter.

PALAVRAS-CHAVE: publicidade; filme publicitário; representação; consumo;


cotidiano.

Introdução
A publicidade sempre procurou novas formas de se relacionar com os
consumidores, interagindo com outros produtos midiáticos, em especial, os de
entretenimento. É uma característica da publicidade estar em constante evolução,
acompanhando o desenvolvimento dos meios de comunicação, reinventando linguagens
a fim de se adaptar ao contexto social, histórico, econômico e cultural em que se insere.
Este texto é parte de nossas reflexões teóricas acerca da publicidade audiovisual
e do consumo como representações do real e, como tal, uma representação da própria
sociedade, em um formato onde a audiência se identifique com seu cotidiano.
Marshall McLuhan (1995, p. 262) já afirmava na década de 1960 que “Os
historiadores e arqueólogos um dia descobrirão que os anúncios de nosso tempo
constituem os mais ricos e fiéis reflexos diários que uma sociedade pode conceber para
retratar todos os seus setores de atividades”.
Mas não são nem historiadores nem arqueólogos que têm se voltado para o
estudo das estratégias publicitárias como forma de analisar e conhecer o “espírito do
tempo”, mas, sim, os próprios pesquisadores da comunicação. Estes registros
indispensáveis do imaginário representam a forma como os consumidores se situam no
1
Trabalho apresentado no V Pró-Pesq PP – Encontro de Pesquisadores em Publicidade e
Propaganda. De 21 a 23/05/2014. CRP/ECA/USP.
2
Professor/Pesquisador da UNIBRASIL, doutorando em Comunicação e Linguagens pela Universidade
Tuiuti do Paraná. mribaric@gmail.com; marceloribaric@unibrasil.com.br; Marcelo.ribaric@utp.br .
mundo, como comunicam o seu “self” por meio de seus gostos e até expressam sua
cidadania, como afirma Néstor García Canclini (2005).
Nosso objetivo neste estudo é tentar desvelar uma parte do passado do cinema,
do filme publicitário, para iluminar o presente através de rastros de uma história
escondida em restos de filmes publicitários que nos apontam para um caráter
documental3 e de entretenimento destas peças midiáticas desde o seu surgimento.

Das origens do cinema e do filme publicitário

Desde sua estreia mundial em dezembro de 1895, o cinema passou a demonstrar


sua importância social, dado ao seu grande poder de persuasão e capacidade narrativa.
Atentos a isso foi que, já nos seus primeiros anos, pioneiros do mundo
cinematográfico como Georges Méliès e os irmãos Lumière, na França, e Thomas
Edison e Edwin S. Porter, nos Estados Unidos, começaram a rodar pequenas narrativas
fílmicas onde se destacavam algumas marcas, produtos e serviços da época.
Estes primeiros filmes publicitários eram dramatizações que envolviam a vida
cotidiana das pessoas, cotidiano que é aquela esfera da qual não podemos nos
desconectar. Como afirma Agnes Heller:
A vida cotidiana é a vida do homem inteiro; ou seja, o homem participa na vida
cotidiana com todos os aspectos de sua individualidade, de sua personalidade.
Nela, colocam-se “em funcionamento” todos os seus sentidos, todas as suas
capacidades intelectuais, suas habilidades manipulativas, seus sentimentos,
paixões, ideias, ideologias (HELLER, 1970, p. 17-18).
Para Walter Benjamin, o cotidiano é a realidade vivida pelo homem e o cinema
mantém uma relação indissolúvel com essa realidade. Através do aparato
cinematográfico, o cinema penetra na essência da realidade:
A natureza ilusionística do cinema é de segunda ordem e está no resultado da
montagem. Em outras palavras, no estúdio o aparelho impregna tão
profundamente o real que o que aparece como realidade ‘pura’, sem o corpo
estranho da máquina, é de fato o resultado de um procedimento puramente
técnico, isto é, a imagem é filmada por uma câmara disposta num ângulo
especial e montada com outras da mesma espécie (BENJAMIN, [1955] 1994, p.
186).
O cinema permitiu uma ampliação da percepção sensível, que desvelou aspectos
desconhecidos da realidade, ampliando o conhecimento, habituando o ser humano às
3
O caráter documental estaria na capacidade intrínseca das imagens de remissão à realidade ou
em seu efeito de verossimilhança, que dispensa epígrafes ou legendas, no qual imagem e som
compõem um traço sensível de algo que efetivamente existiu e que é exposto ao espectador
como uma existência real.
modificações de seu próprio cotidiano, que também é alterado pela evolução das novas
tecnologias.
Benjamin percebeu que o impacto desse ambiente alterado tecnologicamente
estabelecia um novo sensorium, formado a partir dessa realidade modificada,
introduzido pelas novas mediações entre o homem e a tecnologia, resultando outros
meios de ser e estar na sociedade.
Ele pensava o cinema como o ambiente social das grandes cidades modernas,
afetado pelas técnicas, modificando os costumes e a sensibilidade humana, permitindo
aos espectadores vivenciarem imagens inquietas e fragmentadas por meio da montagem.
As novas condições de produção e as transformações culturais promovidas pelas
novas tecnologias da comunicação e informação permitiram uma aproximação das
pessoas comuns com aquilo que até então lhes era distante, como a arte. Este novo
sensorium, criado pela imagem cinematográfica, pode ser considerado como
constituinte de uma memória voluntária (quando o sujeito propositalmente busca
recursos no seu presente que permitam remetê-lo a um passado, que lhe trará as
lembranças almejadas), possibilitando ao espectador, através do seu momento hodierno,
um acesso a um passado abafado.
Desta forma, o cinema permite que a subjetividade dos espectadores se alimente
de imagens para lhes revelar seu novo presente.
Benjamin não se referia a nenhum gênero cinematográfico em especial, o que
alcança também o filme publicitário.
O pensamento benjaminiano sobre o cinema e a modernidade nos permite
estabelecer uma breve história cultural do filme publicitário, balizada nas análises
realizadas por Roger Chartier (1990, pp.16-17) acerca dos objetos e das categorias de
análise procedentes do campo da história cultural.
Roger Chartier tem como um dos seus principais objetivos o de identificar o
modo como, em diferentes momentos e lugares, uma determinada realidade social é
construída, pensada e dada a ler.
Pela alta polissemia do conceito de “construção social” e seu poder heurístico e
analítico, decidimos defini-lo para este trabalho a partir da abordagem de Ian Hacking
em sua obra de 1999, The Social Construction of What.
Para Hacking, não é o objeto em si que é socialmente construído, mas sim, as
ideias é que o são. No entanto, são as ideias que efetivamente definem o objeto, sendo
necessário perguntar o que é construído socialmente em cada caso concreto e específico.
Ele afirma que a construção social é a construção de uma matriz composta de
elementos heterogêneos, que está em torno daquilo que é construído. Como exemplo,
Hacking (1999) analisa a construção da ideia de “mulheres refugiadas políticas”,
baseado no livro The Social Construction of Women Refugee, de Helene Moussa (1992).
Ele explica que ao migrar para outro país, essa mulher concreta que fugiu de sua terra
por razões políticas buscando abrigo em outro país, não é uma construção social, porém,
é rotulada como “mulher refugiada política”.
Para que ela receba esse rótulo, uma série de elementos são envolvidos nesta
transformação - instituições e pessoas têm que ser envolvidas: advogados, ativistas de
direitos humanos, imprensa, legislação específica, abrigos onde elas ficam enquanto o
processo está correndo.
Na prática, estes elementos as caracterizam como mulheres “de certo tipo”, e
fazem com que elas sejam classificadas como refugiadas: “A matriz na qual a ideia de
mulheres refugiadas é formada é um complexo de instituições, defensorias, artigos de
jornais, advogados, decisões judiciais, procedimentos de imigração. Sem mencionar a
infraestrutura material, barreiras, passaportes, uniformes, balcões em aeroportos, centros
de detenção” (HACKING, 1999, p. 10, tradução livre).
Hacking mostra como esse conjunto de elementos transforma as vidas destas
mulheres, faz com que elas sejam percebidas enquanto mulheres refugiadas e, por isto,
recebam tratamento diferenciado e ocupem posições sociais diferenciadas. Enfim, é uma
matriz que envolve classificação e que transforma vidas, que faz diferença substancial
para quem é classificado. Há, assim, uma materialidade aí implicada que faz com que
essa ideia efetivamente construa o objeto “mulher refugiada”.
Em suma, é importante ter clareza da matriz de elementos que sustentam a ideia
que está sendo construída socialmente.
Em nosso caso é a ideia de “realidade” que está sendo socialmente construída a
partir da matriz dos diferentes momentos e lugares em que o filme publicitário surge.
Estes elementos são fundamentais para assimilar o conceito que a representação 4
adquire dentro deste olhar.
O historiador Roger Chartier afirma que as representações estão atreladas ao
processo de produção de sentido, seja através de elementos materiais (textos, imagens,
4
Neste estudo, trataremos o conceito de representação a partir de um olhar semiótico peirciano,
que caracterizava “a semiótica como a Teoria Geral das Representações” (Santaella e Nöth,
1999: p.16). Desta forma a representação é a relação entre o signo e o objeto, é estar no lugar
do outro, de tal modo que, para um interpretante, o signo é visto como sendo o próprio objeto.
objetos), corporais ou físicos, eletrônicos e orais (CHARTIER, 2001, p.29). E prossegue
dizendo que para que essa produção de sentido aconteça, um determinado grupo social
deve utilizar-se de determinadas classificações, divisões e delimitações que constituem
a apreensão do mundo social e que formam categorias fundamentais de percepção e
apreciação do real.
Segundo Roland Marchand (1985), na sociedade norte-americana do final do
século XIX temos um claro exemplo destas representações atreladas ao processo de
produção de sentido.
Ela já se destacava pela difusão do ideal de uma modernidade ligada à produção
industrial, à tecnologia e ao entretenimento, foi uma época marcada por profundas
transformações sociais e culturais que inspiraram novas formas de pensar e viver o
cotidiano, tendo no american dream a base de um desejo coletivo de consumo e
prosperidade, conforme explica Michael Schudson (1984).
Marchand (1985) também afirma que a publicidade nos EUA teve um papel
central nessa propagação da modernidade à sociedade. O American Dream of Life foi a
base de um desejo coletivo que vinculou um sistema industrial amadurecido a um
anseio consumista que se transformava em função da intensa mobilidade social ocorrida
nas primeiras décadas do século XX, numa migração do campo à cidade, e da cidade
pequena à grande e à metrópole.
Para o autor, esse desejo coletivo americano orientou a dependência de um
sistema industrial a uma pauta de consumo, que se transformava em função dessa
enorme mobilidade social e geográfica, quando homens e mulheres subiam na escala
social, através de um fluxo continuamente crescente de novos empregos para uma classe
média que surgia enfrentando condições de vida estranhas à sua história pessoal e
familiar e na qual explodia uma grande reforma da publicidade (MARCHAND, 1985).
Essa efervescente transformação social propiciou uma nova forma de perceber a
publicidade, e em nosso caso, a publicidade fílmica, agora reconhecida e entendida
como integrante da vida cotidiana das pessoas deste novo mundo moderno.
Da mesma forma que o cinema convencional alimenta o imaginário da sociedade
através das tramas narrativas dos filmes, nutrindo desejos, objetivos e comportamentos,
inspirando as pessoas por meio dos personagens, dos contextos sociais distintos
daqueles que compõem seu dia a dia, fazendo com que as mesmas transitem entre
realidades e ficções em seus próprios cotidianos, como afirmou Edgar Morin na década
de 1950, a publicidade audiovisual, desde suas origens, incorpora as grandes metas
humanas em seu universo simbólico. O universo dos sonhos de consumo. Um mundo
imaginário fundado na realidade, na vida material da experiência humana.

Publicidade como "espelho" da sociedade

Para Everardo Rocha (2006), a publicidade possui uma característica educadora,


pois, segundo o autor, na sua narrativa e nas suas representações de consumo, pensa o
próprio consumo como um sistema cultural. Estas representações encontradas nas
narrativas publicitárias acabam sendo uma fonte de informação para decifrar o
imaginário “que informa práticas de consumo” (Rocha, 2006, p.12), fazendo com que a
publicidade dê sentido ao consumo, tornando-se, desta maneira, em uma das principais
“produtoras de sistemas simbólicos presentes em nosso tempo”.
A publicidade se enraíza na vida cotidiana como uma forma de expressão do
próprio ser humano, trazendo à luz estereótipos, modelos e representações, mas também
desejos, necessidades - reais ou construídas- relacionadas ao consumo e à inserção deste
ser humano na sociedade. Ratificando classes sociais, condutas, valores e normas de
conduta social.
Como afirmam FLAUSINO e MOTTA (2007), a publicidade audiovisual não é
uma narrativa de transgressão do comportamento humano, mas sim, a de uma
conciliação de uma sociedade construída nas aspirações do ter e do ser cada vez mais,
numa constante busca de um pertencimento. Em nossa dia a dia, destacar-se pelo ser
diferente dos demais, é um contradito com a consensual produção em série de produtos
estandardizados. A publicidade é a ferramenta e o resultado desse empenho em
conciliar, mostrando-se eficaz quando resulta no consumo, quer seja de um conceito, de
uma marca, um estilo de vida manifestado por um produto, serviço ou ideologia.
É comum observarmos que a população a que se destinam alguns dos
filmes/campanhas, não consome o produto ou estilo de vida ofertado, mas sim a
narrativa que deveria servir apenas como suporte/guia ao consumo. Desta forma, um
personagem ou ambiente pode alcançar tanto ou maior destaque que o próprio produto,
como o famoso case do ator Carlos Moreno e do Bombril (FLAUSINO; MOTTA,
2007); um bordão, como no case Lei de Gerson: “Gosto de levar vantagem em tudo.
Certo?” ou a trama narrativa, na campanha Margarina Qualy, que conta em capítulos, a
história do menino que busca encontrar uma namorada para seu pai (IBIDEM).
Se pensarmos nas origens do filme publicitário, esse raciocínio é idêntico, na
obra mais antiga, intitulada Défense d'afficher, produzida na França em março de 1896
por Georges Méliès, no qual o autor/diretor se aproveita de um aviso proibindo a
fixação de cartazes, pintado em um muro, para produzir um filme de divulgação de um
de seus espetáculos.

Figura 1 - Fotograma do filme publicitário Défense d'afficher

Nessa produção (Imagem 1), vemos a apropriação da realidade objetiva


para construir uma mensagem publicitária – a utilização do cenário urbano, a
adoção do traje cotidiano das profissões e a atitude de insubordinação social das
pessoas, em uma clara execução de normas sociais, como afirmam Lazarsfeld;
Merton (1978): “os meios de comunicação tendem claramente a reiterar normas
sociais, ao exibirem à opinião pública os desvios em relação ao padrão geral”
(1978, p. 240).
Essa afirmação do uso pela publicidade de padrões estabelecidos é
compartilhada por Nilda Jacks em sua obra Mídia Nativa: indústria cultural e cultura
regional, na qual a autora reafirma esse conceito dizendo que é vital para a publicidade
“trabalhar com os valores e elementos constitutivos do sistema, sem os quais ela não
realiza sua interação social” (1998, p. 124).
E enquanto na França, a produção de filmes publicitários possuía um caráter
autoral, a exemplo das produções de Georges Méliès onde o diretor imprimia à obra sua
percepção artística própria, no qual o cotidiano era representado pela verossimilhança
das imagens e situações, nos Estados Unidos, rapidamente empresas e agências de
propaganda se envolveram na produção desses filmes, se apropriando de um contexto
cultural influenciado pela construção narrativa dos filmes de entretenimento, usando a
fórmula pelas quais eram compreendidos pela audiência, conectando as marcas e
produtos às diversas notícias, histórias e imagens, o que culminou na formação de
cinema de atrações.
Klenotic (2005) diz que estes primeiros filmes publicitários norte-americanos
eram chamados de "cartazes animados" ou "painéis animados" e, ocasionalmente, eram
projetados nas telas ao ar livre em cruzamentos lotados, de acordo com as práticas
existentes para publicidade ao ar livre.
Como exemplo, podemos citar as indústrias tabagistas American Tobacco
Company e National Cigarette & Tabacco Company que, de acordo com Klenotic
(2005), até a década de 1890, inseriam cartões comerciais que retratavam mulheres
famosas ou exóticas nas embalagens de algumas de suas marcas, entre elas a marca de
cigarros Admiral.

Figura 2 - Cartões usados pelas empresas tabagistas

Desta forma, uma pessoa familiarizada com as embalagens dessa marca não teria
dificuldade para entender o trocadilho visual do filme dos cigarros Admiral, de 1897,
onde uma mulher em vestimenta flagrantemente caricata de um almirante, sai de um
grande maço de cigarros e distribui cigarros à pessoas trajadas com o estereótipo de
diversas etnias e classes sociais que constituiriam o imaginário que a sociedade norte-
americana daquele período construiu para si.
Figura 3 - Fotograma do filme da Admiral Cigarette.

Percebemos então que é fundamental que a publicidade seja vista pela sua
relevância social, cultural e alegórica, refletindo e refratando a sociedade em que está
inserida, através de suas representações simbólicas.
De acordo com Márcia Coelho Flausino e Luiz Gonzaga Motta (2007), a
publicidade é a expressão do ser humano em sua cotidianidade, destacando
representações e identidades, expondo desejos e necessidades de autoinserção na
sociedade. Confirmando condutas, valores e regras sociais. Os autores compreendem
que na publicidade:
O homem se conta. Conta histórias sobre o homem contemporâneo, seu
cotidiano. Seus tempos por excelência são o presente e o futuro. O presente, por
ser o momento da fruição do discurso e o de sua apresentação – naquele instante
a ação se desenrola, a narrativa efetivamente acontece, agora (todas as vezes em
que o comercial é veiculado). O futuro, por ser quando o desejo será realizado.
(FLAUSINO e MOTTA, 2007, p.161).
Induzindo um imaginário daquilo que deveria ser a felicidade, o bem-estar, o
prazer e o sucesso, em seus modos pré-concebidos de fruição e de compreensão da
representação do real, a publicidade nos fala sobre estilos de vida idealizados, padrões
de beleza e de conduta, nossa percepção de um mundo ideal no qual aqueles que
consomem são felizes justamente por isso como referenda Everardo Rocha:
A publicidade – enquanto narrativa do consumo - estabelece uma cumplicidade
entre a esfera da produção com sua serialidade, impessoalidade e
sequencialidade e a esfera do consumo com sua emotividade, significação e
humanidade. [...] Ela é o território do simbólico (ROCHA, 1995, p. 154).
E justamente por serem relatos da vida cotidiana, os filmes publicitários são de
pronto reconhecidos como histórias verossímeis. A essência dessas representações são
os signos de felicidade, de prazer, de bem-estar e de sucesso com os quais se
estabelecem relações afetivas que estimulam ações o consumo.
Flausino e Motta afirmam que:
Mesmo que a narrativa comece com a apresentação de um conflito/situação
problema a ser resolvida, o produto/serviço/marca encarregar-se-á de
restabelecer a ordem, reorganizando a realidade, trazendo de volta o equilíbrio.
Não há na publicidade histórias sem finais felizes, ao contrário, por exemplo, do
jornalismo. Aqui reside a magia da publicidade: todo o possível e o impossível
se realizam para levar o público –alvo à felicidade, ainda que simulada
(FLAUSINO e MOTTA, 2007, p.163).
O filme publicitário permite à audiência construir o que Barthes (1986) chama
de efeitos de real através dos signos presentes dentro e fora deles e de suas narrativas,
produzindo uma relação afetiva de alegria, prazer, satisfação, ironia, etc. entre a
audiência e o objeto de consumo.
Mesmo na contemporaneidade, na era das redes sociais e da conectividade, esta
relação afetiva a partir da vida cotidiana dos consumidores pode ser percebida.
Como se vê na campanha desenvolvida em 2013, pela Coca-Cola, que lançou
um filme para televisão, criado e produzido na Romênia, integrando mensagens do
Twitter em tempo real, mostrando a marca se conectando com as conversas que
acontecem nessa rede social.
Na ação, intitulada “LetsEatTogether”, a marca instiga os usuários a enviarem
tweets, simultaneamente transmitidos no filme de TV, que convida os consumidores a
fazerem suas refeições com o produto e a resgatarem os diálogos das tradicionais
refeições do passado, divulgando-os pela rede social.

Considerações Finais

A publicidade fílmica sempre procurou novas formas de se relacionar com os


consumidores, interagindo com outros produtos midiáticos, em especial, os de
entretenimento. É uma característica do filme publicitário estar em constante evolução,
acompanhando o desenvolvimento dos meios de comunicação, reinventando sua
linguagens a fim de se adaptar ao contexto social, histórico, econômico e cultural em
que se insere.
As representações da vida cotidiana na publicidade produzem um campo de
identificações do ser humano com a sua própria experiência e/ou expectativa de
existência, da qual fazem parte o ambiente cultural e social, que permite florescer seu
imaginário e suas ações.
O filme publicitário age como demarcador da vida em um espaço midiatizado,
uma vez que ele expõe as relações de identidades de grupos e representações coletivas,
não permitindo que seja analisado apenas no seu contexto de consumo.
O filme publicitário é um discurso que representa a realidade em que vivemos
por ter sido construído nos limites entre as nossas demandas cotidianas e os nossos
desejos.
Da mesma forma que o cinema convencional alimenta o imaginário da sociedade
através das tramas narrativas dos filmes, nutrindo desejos, objetivos e comportamentos,
inspirando as pessoas por meio dos personagens, dos contextos sociais distintos
daqueles que compõem seu dia a dia, fazendo com que as mesmas transitem entre
realidades e ficções em seus próprios cotidianos, a publicidade audiovisual, desde suas
origens, incorpora os grandes anseios humanos em seu universo simbólico.
O universo dos sonhos de consumo de um mundo imaginário fundado na
realidade, na vida cotidiana da experiência humana.

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