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RESUMO
No filme publicitário temos um discurso que vai além de sua própria natureza mercantil,
refletindo e retratando a realidade em que vivemos por ter sido construído nos limites
entre nossas demandas do cotidiano e os nossos desejos. Este texto é parte de nossas
reflexões teóricas acerca da história da publicidade audiovisual e do consumo como
representações do real e, como tal, uma representação da própria sociedade, onde a
audiência se identifica com seu cotidiano. Tendo como principal suporte teórico os
estudos do cotidiano de Agnes Heller e Michel de Certeau. Para apoiar o estudo serão
feitas, no decorrer do texto, micro análises de filmes publicitários realizados no período
denominado primeiro cinema e, uma obra de 2013 que faz uso de plataformas
transmidiáticas como a televisão simultaneamente à rede social twitter.
Introdução
A publicidade sempre procurou novas formas de se relacionar com os
consumidores, interagindo com outros produtos midiáticos, em especial, os de
entretenimento. É uma característica da publicidade estar em constante evolução,
acompanhando o desenvolvimento dos meios de comunicação, reinventando linguagens
a fim de se adaptar ao contexto social, histórico, econômico e cultural em que se insere.
Este texto é parte de nossas reflexões teóricas acerca da publicidade audiovisual
e do consumo como representações do real e, como tal, uma representação da própria
sociedade, em um formato onde a audiência se identifique com seu cotidiano.
Marshall McLuhan (1995, p. 262) já afirmava na década de 1960 que “Os
historiadores e arqueólogos um dia descobrirão que os anúncios de nosso tempo
constituem os mais ricos e fiéis reflexos diários que uma sociedade pode conceber para
retratar todos os seus setores de atividades”.
Mas não são nem historiadores nem arqueólogos que têm se voltado para o
estudo das estratégias publicitárias como forma de analisar e conhecer o “espírito do
tempo”, mas, sim, os próprios pesquisadores da comunicação. Estes registros
indispensáveis do imaginário representam a forma como os consumidores se situam no
1
Trabalho apresentado no V Pró-Pesq PP – Encontro de Pesquisadores em Publicidade e
Propaganda. De 21 a 23/05/2014. CRP/ECA/USP.
2
Professor/Pesquisador da UNIBRASIL, doutorando em Comunicação e Linguagens pela Universidade
Tuiuti do Paraná. mribaric@gmail.com; marceloribaric@unibrasil.com.br; Marcelo.ribaric@utp.br .
mundo, como comunicam o seu “self” por meio de seus gostos e até expressam sua
cidadania, como afirma Néstor García Canclini (2005).
Nosso objetivo neste estudo é tentar desvelar uma parte do passado do cinema,
do filme publicitário, para iluminar o presente através de rastros de uma história
escondida em restos de filmes publicitários que nos apontam para um caráter
documental3 e de entretenimento destas peças midiáticas desde o seu surgimento.
Desta forma, uma pessoa familiarizada com as embalagens dessa marca não teria
dificuldade para entender o trocadilho visual do filme dos cigarros Admiral, de 1897,
onde uma mulher em vestimenta flagrantemente caricata de um almirante, sai de um
grande maço de cigarros e distribui cigarros à pessoas trajadas com o estereótipo de
diversas etnias e classes sociais que constituiriam o imaginário que a sociedade norte-
americana daquele período construiu para si.
Figura 3 - Fotograma do filme da Admiral Cigarette.
Percebemos então que é fundamental que a publicidade seja vista pela sua
relevância social, cultural e alegórica, refletindo e refratando a sociedade em que está
inserida, através de suas representações simbólicas.
De acordo com Márcia Coelho Flausino e Luiz Gonzaga Motta (2007), a
publicidade é a expressão do ser humano em sua cotidianidade, destacando
representações e identidades, expondo desejos e necessidades de autoinserção na
sociedade. Confirmando condutas, valores e regras sociais. Os autores compreendem
que na publicidade:
O homem se conta. Conta histórias sobre o homem contemporâneo, seu
cotidiano. Seus tempos por excelência são o presente e o futuro. O presente, por
ser o momento da fruição do discurso e o de sua apresentação – naquele instante
a ação se desenrola, a narrativa efetivamente acontece, agora (todas as vezes em
que o comercial é veiculado). O futuro, por ser quando o desejo será realizado.
(FLAUSINO e MOTTA, 2007, p.161).
Induzindo um imaginário daquilo que deveria ser a felicidade, o bem-estar, o
prazer e o sucesso, em seus modos pré-concebidos de fruição e de compreensão da
representação do real, a publicidade nos fala sobre estilos de vida idealizados, padrões
de beleza e de conduta, nossa percepção de um mundo ideal no qual aqueles que
consomem são felizes justamente por isso como referenda Everardo Rocha:
A publicidade – enquanto narrativa do consumo - estabelece uma cumplicidade
entre a esfera da produção com sua serialidade, impessoalidade e
sequencialidade e a esfera do consumo com sua emotividade, significação e
humanidade. [...] Ela é o território do simbólico (ROCHA, 1995, p. 154).
E justamente por serem relatos da vida cotidiana, os filmes publicitários são de
pronto reconhecidos como histórias verossímeis. A essência dessas representações são
os signos de felicidade, de prazer, de bem-estar e de sucesso com os quais se
estabelecem relações afetivas que estimulam ações o consumo.
Flausino e Motta afirmam que:
Mesmo que a narrativa comece com a apresentação de um conflito/situação
problema a ser resolvida, o produto/serviço/marca encarregar-se-á de
restabelecer a ordem, reorganizando a realidade, trazendo de volta o equilíbrio.
Não há na publicidade histórias sem finais felizes, ao contrário, por exemplo, do
jornalismo. Aqui reside a magia da publicidade: todo o possível e o impossível
se realizam para levar o público –alvo à felicidade, ainda que simulada
(FLAUSINO e MOTTA, 2007, p.163).
O filme publicitário permite à audiência construir o que Barthes (1986) chama
de efeitos de real através dos signos presentes dentro e fora deles e de suas narrativas,
produzindo uma relação afetiva de alegria, prazer, satisfação, ironia, etc. entre a
audiência e o objeto de consumo.
Mesmo na contemporaneidade, na era das redes sociais e da conectividade, esta
relação afetiva a partir da vida cotidiana dos consumidores pode ser percebida.
Como se vê na campanha desenvolvida em 2013, pela Coca-Cola, que lançou
um filme para televisão, criado e produzido na Romênia, integrando mensagens do
Twitter em tempo real, mostrando a marca se conectando com as conversas que
acontecem nessa rede social.
Na ação, intitulada “LetsEatTogether”, a marca instiga os usuários a enviarem
tweets, simultaneamente transmitidos no filme de TV, que convida os consumidores a
fazerem suas refeições com o produto e a resgatarem os diálogos das tradicionais
refeições do passado, divulgando-os pela rede social.
Considerações Finais
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