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19/02/2018 Paulo Francis por ele mesmo - Revista Cult


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Paulo Francis por ele mesmo

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19/02/2018 Paulo Francis por ele mesmo - Revista Cult

Uma entrevista até hoje inédita com o maior colunista da imprensa brasileira sobre suas
idéias, seu método de trabalho e sua biografia

Thales Guaracy

Há dez anos e meio, desembarquei em Nova York para uma reportagem sobre os
jornalistas que integravam o programa Manhattan Connection, do GNT, então
conhecido como o primeiro canal a cabo a fazer sucesso na TV brasileira. Minha
missão era entrevistar três mosqueteiros da imprensa, integrantes do programa –
Lucas Mendes, Nelson Motta e Paulo Francis – e fotografá-los diante de um táxi
amarelo, uma instrução específica, com o objetivo de caracterizar a cidade de Nova
York. Assim, fiz uma entrevista com Paulo Francis que, por circunstâncias só
explicáveis pelo temperamento ciclotímico do maior colunista da imprensa brasileira
em todos os tempos e por um chefe que fazia questão absoluta do táxi amarelo,
permaneceu inédita até aqui.

Feita originalmente para a revista Exame Vip, na qual eu trabalhava, a entrevista foi
vetada pelo próprio Francis, que se negou, depois de concedê-la, num gesto típico seu,
a posar com o tal táxi. “Não é nada contra você, que é um rapaz simpático”, disse ele,
“mas essa história de táxi amarelo é ridícula. Não faço isso. E digo mais: da próxima
vez que aparecer na imprensa, será como capa da revista Veja.” Sem saber, ele estava
sendo profético. De fato, seis meses mais tarde, morto por um ataque cardíaco em seu
apartamento, Francis seria o personagem da capa de Veja. E minha entrevista com ele
ganharia forma de documento histórico, hibernando em uma gaveta.

Ao retornar a São Paulo, em junho de 1996, com a entrevista de Francis desautorizada


para publicação, e sem a foto encomendada, a revista Exame VIP decidiu que, em vez
dos três mosqueteiros do Manhattan Connection, eu faria apenas um perfil de Nelson
Motta, apresentado como uma espécie de embaixador brasileiro em Nova York.

Minha missão com a revista estava cumprida. Guardei as fitas com a entrevista de
Francis como uma lembrança pessoal. Na conversa, à mesa do restaurante Bravo
Gianni, seu favorito, surgiu um relato completo de Paulo Francis sobre ele mesmo,
desde seu início como figurante de teatro, depois crítico cultural e, por fim, colunista
político. A conversa avançou sobre questões pessoais, como sua deficiência visual, que
o levou a se tornar uma pessoa introspectiva. “Sabe”, ele me disse, com os óculos na
mão, a olhar o vazio, “eu tenho olhos ruins”. Ele discorreu a respeito de sua ideologia
e seu método de trabalho – chegou ao requinte de fazer um curso sobre a bomba
atômica para tratar do assunto com mais propriedade. Mostrava-se um profissional
detalhista, uma pessoa sistemática e um homem extremamente afável, mas capaz de
se tornar subitamente mal-humorado – reviravoltas que eu pude sentir na pele.

Dez anos depois da morte de Francis, a publicação de sua entrevista esquecida


colabora para lembrá-lo. Creio que ele, onde estiver, perdoará.

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19/02/2018 Paulo Francis por ele mesmo - Revista Cult
THALES GUARACY – Alguém me disse que você passou um apuro com o seu gato no
fim do ano. É verdade?
PAULO FRANCIS – Meu gato teve um enfarte. Eu tinha ido a Roma, queria passar uma
semana lá, depois outra em Veneza. Já tinha ficado uma semana em Londres. Sozinho.
Para relaxar um pouquinho. Não tenho férias, né? Aí ele teve o enfarte! Tive de voltar.

T.G. – E como estava o gato?


P.F. – Ah, estava só meio de boca mole… Levei-o a um hospital de animais, na rua 60,
que parece desenho animado… Todos aqueles bichos passando de maca… E lá
cuidaram dele, está fazendo tratamento. Nós (ele e a mulher, Sonia Nolasco) temos
três gatos. Esse é o Bundeca, um gatinho muito safado, engraçado. Agora ele está
bem, mas tem de tomar fluidos, três vezes por semana.

T.G. – O resto da viagem foi cancelado?


P.F. – Ué, que eu posso fazer? Não tenho ninguém para resolver isso, assim, na última
hora. Tenho três empregos, ela (a mulher) trabalha como uma louca…. Nós
precisávamos de alguém trabalhando para nós, uma baby-sitter ou coisa assim.
Temos de ficar lá, vigiando o gato, dando injeção nele. Normalmente, um amigo meu,
íntimo, passa uns tempos aqui, em Nova York, no fim do ano, e fica tomando conta
dos gatos enquanto viajamos. Não vou fazer um amigo meu cuidar de um gato doente.
Só que eu preciso dessas duas semanas de descanso. Trabalho muito, escrevo muito.
Tem a televisão (sua coluna diária na TV Globo), mas o que me dá mais trabalho
mesmo é escrever para jornal (O Estado de S.Paulo). Tenho de me manter a par de tudo
o que está acontecendo… Este vai ser um ano de eleição aqui…

T.G. – Há quanto tempo você está aqui?


P.F. – Há quase 25 anos. Cheguei a Nova York em junho de 1971.

T.G. – Você se lembra da primeira vez em que pisou nessa cidade?


P.F. – Isso foi há muito tempo. Pisei aqui a primeira vez em setembro de 1954. Pouco
depois do suicídio de Getúlio Vargas. Vim tentar fazer um mestrado na área de teatro,
na Universidade Columbia. Eu me interessava muito por teatro. Interesso-me até hoje.
Naquela época, era paixão.

T.G. – No período em que você ficou na Universidade de Columbia, já trabalhava?


P.F. – Não. Meu pai morava aqui, em um apartamento na 55, West Side. Eu morava
com ele. Só no verão, uma vez, trabalhei como vendedor em uma livraria, mas era
fantástico. Certa vez, eu estava em um bar – bebia muito, nessa época –, que tinha
uma TV ligada. A televisão estava apenas começando. Apareceu um sujeito todo
estranho, chamado Elvis Presley, no programa de Ed Sullivan. Foi assim que vi Elvis
Presley, na sua estréia, pela primeira e última vez. Cinema custava 50 centavos, não
tinha inflação nenhuma. Começou a ter um pouquinho de inflação nos Estados Unidos
com a Guerra do Vietnã. Antes, a vida era baratíssima. Com um dólar, você comia bife
de fígado com batatas fritas e uma Coca-cola.

T.G. – Sua intenção era continuar a fazer teatro?


P.F. – Passei três anos estudando aqui, em Nova York, mas não fiz mestrado. Voltei ao
Brasil para dar uma olhada. Comecei a ver teatro intensamente. Trabalhei como ator,
um tempo, e diretor de teatro. Acabei sendo crítico. Fui crítico de teatro no Diário
Carioca e no Última Hora.

T.G. – Como foi sua experiência como ator?


P.F. – Eu fiz Frei Lourenço, do Romeu e Julieta… (o carpinteiro Jacob), Engstrand, no
Espectro,  de Ibsen…

T.G. – Como você entrou para o teatro?


P.F. – No Teatro de Estudantes, com o Pascoal Carlos Magno, um grande animador do
teatro brasileiro. Eu não tinha nada que fazer, estava brigado com meu pai – que
estava farto, furioso comigo, porque eu não fazia nada. Aí vi um anúncio de que
precisavam de pessoas para a temporada de teatro no Norte e Nordeste. Eu sou do Rio,
nunca havia ido ao Norte, ao Nordeste. Era muito novo, tinha 20 anos. E me
apresentei para segurar lança, essas coisas… Fazer alguns extras. Aí me ofereceram
alguns papéis. Eu dizia, mas como? Nunca havia pensado em ser ator. Tenho esse
problema de vista (segura os óculos de aro de fundo de garrafa, examina-os com seus
olhos esbugalhados), é uma vista muito ruim. Ensaiamos meses para essa temporada
e fomos. O Getúlio Vargas deu (à companhia de teatro) um avião DC-3, não sei se você
já ouviu falar.

T.G. – Já tomei esse avião no Quênia.


P.F. – Está vendo? Pelo que me consta, esse avião nunca caiu. No Brasil, era o avião do
Correio Aéreo Nacional. O Getúlio nos deu passagem e voávamos com o Correio. Na
verdade, o Getúlio, como todo político, deu só metade das passagens. Nós fomos de
Manaus a Recife. Fui um dos poucos atores brasileiros que se apresentaram em

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Teresina… Nós nos apresentamos também em São Luís do Maranhão, Natal, João
Pessoa. Nunca mais voltei. Eu tenho um amigo agora que está fazendo um jornal
diário em Manaus. É uma cidade muito simpática, mas é muito calor. Meus óculos em
Manaus ficavam embaçados. Precisavam inventar um pára-brisa para óculos. Eu faria
uma patente com isso e ficaria rico lá. Com o dinheiro, iria morar em Cannes, na
França.

T.G. – Como você virou crítico?


P.F. – É interessante porque nada do que fiz foi planejado. Foi tudo ao sabor do
momento. Essa história de crítico de arte, com o qual eu me tornei bastante
conhecido, por exemplo: não tinha a menor intenção. Entrei para ajudar uns amigos
meus que faziam críticas, para ver se a gente moralizava o teatro brasileiro. Moralizar
artisticamente, quero dizer. Parar de alojar espetáculo longe, por exemplo. No Última
Hora, eu trabalhava criticando televisão. Naquela época, em 1962, não havia nada para
criticar na TV (porque havia poucos programas). Aí eu passei a me concentrar nos
problemas políticos. E criticava os políticos. O Samuel Wainer, o proprietário do
jornal, gostou tanto que me colocou como crítico político. Foi acidental.

T.G. – E como voltou a morar em Nova York?


P.F. – Em 1964, quando houve o acontecimento militar, quer dizer, quando foi
derrubado o João Goulart e os militares tomaram o poder, eu tinha a coluna no Última
Hora, na qual atacava muito os militares. Não exatamente os militares, mas eu
defendia teses às quais eles pareciam ser contrários. Perdi os empregos, fiquei três
anos fazendo textos anônimos. Depois voltei para o Correio da Manhã, aí fui preso. Até
o Ato Institucional Número 5, fui preso quatro vezes.

T.G. – Ficou muito tempo na cadeia?


P.F. – Dois meses, cada vez. Começou a tornar-se mais difícil depois que escrevi um
artigo sobre minha infância no Colégio São Bento e outro artigo sobre uma ópera de
Wagner, que não tinham nada que ver com a política brasileira. Pensei: ‘Bom, esses
caras estão querendo me impedir de ganhar a vida.’. Pedi para trabalhar em O
Pasquim, na Tribuna da Imprensa e na televisão. Obtive uma bolsa de 15 meses da
Fundação Ford. E vim para cá em 1971.

T.G. – De que forma se instalou?


P.F. – Eu tinha algum dinheiro. Morava muito bem, no Greenwich Village. Isso porque
fui também professor visitante da Universidade de Nova York, com direito a morar em
um prédio de apartamentos da instituição. Fiz lectures sobre jornalismo e política.
Depois a minha vida melhorou muito, quando passei a trabalhar na revista Visão, que
era de propriedade do Said Farah, um homem inteligente lá de São Paulo. E em 1975,
fui para a Folha de S.Paulo. Na época, como o maior salário de correspondente da Folha.
Primeiro eles me pagaram freelancer para que eu cobrisse a morte do generalíssimo
Franco, na Espanha, em 1975. Gostaram do meu trabalho e me contrataram. Em 1981,
entrei para a TV Globo. Em 1990, saí da Folha e fui para O Estado.

T.G. – Qual foi a sua reportagem mais interessante?


P.F. – Reportagem não é o meu forte, sou mais um comentarista. Eu não sei não.
Estava muito orgulhoso, em 1974, da cobertura que eu fiz do escândalo de Watergate.
Agora estou convencido de que aquilo foi um lamentável equívoco. Watergate foi visto
como um grande erro do Richard Nixon e, na verdade, foi um erro idiota do partido,
que a imprensa aproveitou para destruir o presidente. Uma vez na vida, nesse caso, fui
maria-vai-com-as-outras. O Nixon é uma figura complexa e foi um dos maiores
presidentes dos Estados Unidos.

T.G. – Você chegou a vê-lo pessoalmente alguma vez?


P.F. – Claro, várias vezes. Em certa época, fui do corpo de imprensa da Casa Branca. É
um emprego para o qual você se habilita. Eles fazem um exame e você entra. Viajei
muito com o Jimmy Carter. Estive em todas aquelas negociações de armas nucleares.
Viajei com o Ronald Reagan. Aí me enchi e parei.

T.G. – Como foi a campanha de desarmamento nuclear do Carter?


P.F. – Foi uma loucura. Eu fiz um curso de seis meses sobre armas nucleares com um
homem chamado Paul Desmond, um dos maiores especialistas de armas nucleares do
mundo. Eram lectures, um abc sobre o assunto. No Brasil, ninguém tem a menor idéia
do que seja.

T.G. – Você fez esse curso com que objetivo?


P.F. – Na verdade, a minha estada aqui em Nova York é um grande doutorado. Fiz
vários cursos. A princípio, eu era apenas um amador dando palpites. Para entender de
política exterior, e de outras coisas, fiz cursos. É como matemática, álgebra: você
precisa saber a linguagem, caso contrário você bóia, fica sem saber inteiramente o que
está acontecendo. E fala bobagens.

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T.G. – Onde você fazia esses cursos?
P.F. – No Center For International Affairs. A bomba que destruiu Hiroshima era de
urânio. Em Nagasaki, eles testaram a de plutônio. Eram bombas sujas. Na década de
1950, houve o teste da bomba de hidrogênio. As pessoas pensam que a bomba nuclear
é uma bomba, mas não é. É uma reação em cadeia. Havia um planejamento para uma
bomba de cobalto, mas eles acabaram desistindo porque ninguém podia prever até
onde essa reação em cadeia iria.

T.G. – Você já passou algum susto na cidade? Assalto ou coisa assim?


P.F. – Nunca. Aliás, toda forma de crime caiu em Nova York.

T.G. – E do que você gosta mais aqui?


P.F. – Há mais dinheiro em Nova Iorque que na Suíça. Dinheiro traz outras coisas.
Tem museus, balé, teatro, tudo do bom e do melhor.

T.G. – E do mais caro, suponho.


P.F. – Não. Nova York é a cidade mais barata do Primeiro Mundo. A única coisa mais
cara aqui talvez seja o aluguel. Você não pode morar onde nós estamos,
razoavelmente, por menos de US$ 2 mil. Falo de Manhattan. Claro que você pode
também morar no Queens, no Brooklyn, no Bronx. O Queens é um bairro de classe
média, o Brooklyn também. Quase todo mundo que eu conheço mora fora de
Manhattan. Com um aluguel desses, a vida se torna impossível. Você paga um imposto
de renda brutal aqui. Eu nunca tive disso, mas meus colegas que melhor ganham na
TV Globo, jornalistas, se queixam amargamente porque deixam 40% do que ganham
em impostos. Tem o imposto geral, o INSS americano, que é o Social Security, o
imposto estadual. Você ganha 10 mil dólares por mês, recebe seis. Pode reaver algum
dinheiro na declaração, mas mesmo assim o imposto é alto.

T.G. – O Brasil já não está longe disso, não?


P.F. – Qualquer imposto no Brasil é uma doação. Porque não tem serviço público. Em
São Paulo, que é 60% da renda brasileira, o Tietê transborda e ninguém faz nada, é
uma tristeza.

T.G – O que você gosta de fazer em Nova York? Vem sempre aqui (ao Bravo Gianni)?
P.F. – Este restaurante é uma espécie de pub brasileiro. O Gianni, o proprietário, é
uma pessoa muito simpática. Esteve no Brasil há pouco tempo. E restaurante italiano,
há poucos iguais. O forte daqui é o jantar, lotado. Vêm celebridades. Você vive muito
bem nesta cidade, mas precisa ganhar 10 mil dólares por mês para viver sem se
aporrinhar.

T.G. – Por causa do aluguel?


P.F. – Também. Eu pago menos, porque arranjei uma galinha morta, mas isso é
porque eu moro aqui há muitos anos. Você pode comer fora, comprar um carro, ver os
melhores espetáculos. Não é que não possa viver por menos, mas para viver realmente
sem ficar contando os tostões, o leite das crianças, o aluguel, é isso. E hoje estão
pagando isso na imprensa brasileira, não? O real está valendo tanto… Soube de uma
pessoa que foi trabalhar como repórter na Folha de S.Paulo ganhando 15 mil dólares. O
mercado se diversifica. Você conhece o Hermano Henning? Saiu da Globo discutindo
propostas, cada uma delas mais incrível que a outra. Inclusive na TV do bispo (a TV
Record, de Edir Macedo). Ele disse, “quase aceitei, fiquei até meio sem graça”. Acabou
indo para o SBT.

 T.G. – Você iria?


P.F. – O problema do bispo é que, se você vai trabalhar para ele, fica um pouco
constrangido de tomar o dinheiro de fé, né?

T.G. – O que você gosta de fazer? Ainda vai ao teatro?


P.F. – Muito. Sou uma pessoa de gosto católico: música, balé, pintura. Agora tem no
Moma uma exposição de 160 quadros do Mondrian. Já a vi três vezes. E você aqui tem
todos os museus, é um paraíso. Tem o Citi Ballet, que é o balé do Balanshin, outra
maravilha. Eu não posso ver tudo (por causa do dinheiro), então passei minhas três
últimas noites vendo na televisão Orgulho e Preconceito, minissérie baseada no
romance da Jane Austen, uma maravilha. Cinema e televisão nesta cidade chamam-se
Jane Austen, que morreu em 1817. Os filmes baseados em histórias delas hoje são o
maior sucesso, estão mais quentes que o Quentin Tarantino. As pessoas aqui lêem
muito mais os “scripts” dela: Razão e sensibilidade, Emma, que tem três versões
diferentes.

T.G. – Que lugar de Nova York você recomendaria para morar?


P.F. – Com pequenas exceções do lado oeste, deve-se morar do lado leste. Entre a
Primeira Avenida e a Quinta. O lado oeste é um lugar muito bonito, mas meio barra
pesada. O lugar ideal é você morar aqui mesmo onde nós estamos. Você pode ir a pé

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para os melhores cinemas, os melhores restaurantes, ao teatro… Nova York é uma
cidade muito agradável de março a novembro. O clima é ameno. O verão tem alguns
dias muito quentes, mas em geral o calor não é muito intenso.

T.G. – Muita gente vem visitá-lo em Nova York?


P.F. – Só as pessoas que eu conheço, porque não sou atração turística.

T.G. – Eu digo jornalistas, por exemplo. O Elio Gaspari não é seu amigo?
P.F. – Olha, o Elio e eu nos divertimos muito quando ele morava em Nova York (como
correspondente da revista Veja). Nós almoçávamos aqui (no Bravo Gianni), daí
dávamos uma volta de 40 quarteirões para afinar a barriga e ver os loucos. Os loucos
são a maior atração de Nova York. Saem gritando por aí. Tem louco que entrou na era
da eletrônica e grita de microfone.

T.G. – Que roteiro vocês faziam?


P.F. – Saíamos daqui para ir à Quinta Avenida, na altura do Central Park. Aí, íamos
andando pela Quinta até a confluência com a 57, que é a maior esquina do mundo. Ali
você vê as mulheres mais bonitas do planeta. O Elio tem até uma piada ótima. Diz que
as mulheres quando ficam velhas passam lá para lembrar de quando eram gostosas e
bonitas. Porque vêem as outras, é claro.

T.G. – Você ainda caminha?


P.F. – É claro. Um dos maiores prazeres de Nova York é poder andar sem ser
assaltado. O Brasil chegou ao ponto de que no Rio de Janeiro estão cobrando taxa para
não lhe seqüestrarem. Mandam um recado: olha, você me manda R$ 5 mil, caso
contrário, seqüestro sua mulher. Ninguém pode viver assim. Eu nasci no Rio, quando
era a cidade mais cordial do mundo. Aí começou, na década de 1960 para 1970, essa
política que gerou multidões de pobres brasileiros e essas favelas criminosas.

T.G. – Você voltaria a morar no Brasil?


P.F. – O proprietário, aqui, o Gianni, foi lá e voltou dizendo que não dá. Uma das
características da minha vida é que não planejo nada. Vir para cá foi pelas
circunstâncias da ditadura. Acho que inconscientemente eu esperava que fosse acabar
o regime militar e a gente pudesse voltar a uma vida normal no Brasil, mas em 1970,
quando chegou aquele pessoal do (presidente Emílio Garrastazu) Médici… O Brasil
estava bem, ganhou a Copa do Mundo, crescimento econômico como nunca houve
igual, de 11% ao ano, o Delfim Netto era o Homem-Milagre…, mas de repente houve
um arrastão, prenderam deus e o mundo… Decidi ficar em Nova York.
E fui ficando.

T.G. – Seu afastamento do Brasil então foi também uma definição política?
P.F. – Eu sei que na sua geração isso não é muito comum, mas você faz um pequeno
tour no horizonte para ver quantas pessoas deram sua vida pelo comunismo, se
sacrificaram. Mais adiante você vê quantas pessoas deram suas vidas na guerra entre
os católicos e os protestantes. Talvez as melhores pessoas, ou muitas delas, tenham
sido destruídas por essas coisas que hoje nos parecem perda de tempo. Eu tenho
também esse lado, que é meio literário. Escrevi vários romances. É muito mais forte
que política. É meio misterioso.

T.G. – O Manhattan Connection foi também uma coincidência?


P.F. – Eu fico fascinado com essa reação em cadeia de acidentes. Esse programa, por
exemplo: as pessoas que vêm do Sul agora só falam nisso. Agradeço os cumprimentos,
mas entrei no programa por acaso. O Lucas Mendes, que mora aqui há uns 30 anos,
estava saindo da TV Globo e rearrumando a vida dele na TV Cultura. Resolveu fazer
esse programa e me convidou, mas puramente na esportiva. De repente, tem uma
repercussão enorme…

T.G. – Você acha que o sucesso do programa se deveu ao debate?


P.F. – O debate já existe na televisão. Os telespectadores gostam é do informalismo.
Televisão brasileira é muito fraque e cartola. Não há um mínimo de informalismo. E
em uma TV a cabo você pode se soltar muito mais. Ninguém pode se queixar daquilo
que dizem da TV comercial, na qual alguém invade a sua casa e diz algo que lhe
ofende. Aqui nos Estados Unidos, pouco a pouco, o cabo está comendo tudo. Eu só vejo
TV a cabo. Das grandes emissoras, eu só vejo os jornais. O jornal da ABC, tenho de ver
todo dia, porque o Jornal da Globo tem sua parte internacional tirada dali, temos os
direitos de reprodução.

T.G. – O que mais você recomendaria na cidade?


P.F. – O cenário do estúdio da TV Globo em Nova York é o Empire State Building. Não
vou lá há mais de 20 anos, contudo, tem uma hora maravilhosa em que você pode ir, à
tardinha, quando a luz natural está caindo e as luzes da cidade se acendem.

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T.G. – Bem, foi um grande prazer.
P.F. – Sim, mas (saiba que esta entrevista) foi um acidente, porque eu não tenho
tempo para essas coisas. Normalmente, a minha vida é muito atrapalhada.

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