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Resumo
Abstract
Site-specific art? Reflexões a respeito da performance em espaços não tradicionalmente dedicados a esta 131
U rdimento N° 17 | Setembro de 2011
"O que eu percebi, “diz Irwin" foi que de pesquisas que se desenvolvem ao longo
[o problema da arte pública] não tem destas quase cinco décadas, revelando um
nada a ver com [questões de] objeto ou
não objeto. Ele tem a ver com o objeto
dialogo onde a arte busca redefinir um
existir não em um vácuo de seu próprio espaço para si, porem ao mesmo tempo
significado, mas no mundo real, afetado acaba sendo definida esteticamente por
pelo mundo real" (DIEHL, 1999). estas espacialidades. Em confronto com o
termo site-specific e seus desdobramentos,
P
odemos estudar a uma mudança ocorrida na percepção e
performance em espaços uso do espaço poderia ter criado uma
alternativos com referência abordagem à arte que acaba por refletir
a diversos contextos uma condição de desterritorialização.
históricos que variam em Nota-se também que as mudanças
essência e propósito. Estas performances nas características dos centros urbanos
em geral dialogam com o espaço público, contemporâneos, que culminam no que
seja ele físico, social ou conceitual; incidindo Soja chama de Postmetropolis refletem
em diversos níveis em sua realidade de também neste novo gênero artístico.
base. Para cada tipo de interferência são Havendo a Postmetropolis dissolvido
normalmente definidas nomenclaturas que suas fronteiras durante o desenvolver do
buscam especificar a relação que esta arte capitalismo industrial, surgem diversos
estabelece com seu entorno. questionamentos que acabam por criar se
O que queremos dizer quando falamos não um senso de desterritorialização, ao
em performance em lugares alternativos? menos uma série de possibilidades novas
Alternativos a que? Quando usamos o de relação, percepção e ocupação do espaço
termo espaços alternativos, nos remetemos urbano. Todavia se considerarmos o espaço
a uma discussão que surge na metade como um lieu pratique, e se aceitarmos a
da década de 60, quando uma corrente ideia de Soja, então seria possível concluir
intitulada site-specific que descreveremos a que as tensões entre práticas e espaços são
seguir, propunha-se como reação ao papel mais relevantes que os espaços em si.
da instituição na arte. Neste mesmo período, Basando-se nestes conceitos podemos
o objeto de arte passa a ser considerado em estender nossas considerações para muito
relação ao seu contexto, propondo uma além de um espaço geográfico, conectando-
inversão com relação aos paradigmas do nos com o que Kwon chamará de arte
modernismo onde o objeto artístico tinha site funcional, procurando estabelecer
fim nele mesmo (KWON, 1997, p. 86). A relações entre espacialidades e níveis de
partir deste momento, diversas variações espacialidades, ou seja: entre espaços.
do termo surgem buscando definir de que Conceitos como os de ‘espaços de fluxo’, em
forma esta arte perceberia e incidiria no Manuel de Castells podem ser relevantes
espaço com o qual se relaciona. a tal analise. Castells introduz a ideia de
Em decorrência, alguns processos espaços de fluxos superando o sentido de
criativos que se focam na questão do espaço, espaço dos lugares, onde as dinâmicas de
acabam não só refletindo na maneira como geração de informação, conectam diferentes
este espaço é organizado e definido, mas espacialidades.
também redefinindo territorialidades. Com
o aparecimento do termo site-specific, se O que é site-specific?
evidencia o aspecto relacional de uma serie
Para Miwon Kwon o site-specific, mais
1 Bacharel em Estudos Teatrais pela Universidade de Bologna, do que ser definido, evidencia um carácter
com um ano no programa ERASMUS, na Leipzig Universitat. efêmero e transitório, elencaremos a seguir
Mestrado em Práticas de Performance e Pesquisa na Central
School of Speech and Drama: Performance Practices and uma série de autores que buscam definir e
Research. Doutoranda em Teatro na UDESC. apontar derivações para o termo site-specific.
Gillian McIver aponta duas acepções tendências atuais, em sua opinião, viriam
para o termo que segundo ela é controverso: a oscilar entre uma nostálgica tentativa
o trabalho feito especificamente para um de reterritorialização e definição de
local (site), e um trabalho feito em resposta identidades espaciais, e por outro lado a
e encontro com este local (McIVER). A este um nomadismo fluido e subjetivo (KWON,
segundo tipo de abordagem, a autora dá o 1997, p.8). Kwon busca redefinir o termo
nome de “site-responsive art”, coincidindo site-specific como `uma mediação cultural
com o que Robert Irwing chama de Site- de amplo carácter social, econômico e
determined/conditioned (IRWIN In: STILES processos políticos que organizam a vida e
1996, p. 152). o espaço urbano` (KWON, 1997, p.3)
Um verbete constante no site Variações e redefinições do termo:
da Tate gallery, define o site-specific Como Kwon aponta, a transitoriedade
como a arte que dialoga com o espaço da arte site-specific, acaba por gerar uma
circundante incorporando-o à obra e/ou certa polissemia. Escolhi desta forma três
transformando-o temporariamente ou autores para avaliar como as redefinições
permanentemente, sendo esta fisicamente deste termo e a criação de variantes,
acessível. O termo é associado à land podem denotar abordagens que
art e à noção corrente de arte pública intencionam incidir no espaço urbano de
entendida como a arte realizada fora maneiras especificas.
dos espaços tradicionalmente dedicados Gillian McIver usa o termo site
a ela. (Tate Gallery) responsive art como tentativa de revindicar
Na opinião de Miwon Kwon a gênese ou valorizar espaços públicos através
da arte site-specific revela quatro momentos de uma arte interdisciplinar. (McIVER,
principais; Seu surgimento é marcado pela 2003). Este processo se daria através da
crítica à instituições e à maneira como estas experimentação artística, estimulando a
viriam a incidir na arte em termos simbólicos, percepção “estranhada” do quotidiano e a
políticos e experienciais, considerando re-significação dos elementos componentes
as qualidade físicas do espaço como do espaço urbano, considerando as relações
determinantes na produção, apresentação e e efeitos que esta atividade poderia vir a ter
recepção da arte. Em um segundo momento com a localidade, seja espacialmente que
o site-specific é assimilado pelas culturas psicologicamente.
dominantes e incorporado no universo A abordagem responsiva atingiria
institucional. Em seguida, um novo diversos níveis espaciais, possibilitando
gênero, resgataria o aspecto comunitário com que o público se inter-relacione com
deste site especificidade, defendendo o o passado e o presente de um local; com
caráter temporário e participativo das impressões sobre a sua história e sobre as
obras produzidas, engajando `minorias' suas atividades atuais, além de sensações
e buscando uma arte processual. Neste físicas, texturas e demais aspectos subjetivos
sentido, Kwon ressalta como este tipo de do espaço. Através da imersão no espaço e
arte acabou exacerbando relações de poder da abordagem responsiva, o trabalho tem
e re-marginalizando grupos já apartados, a capacidade de fazer o público (re)pensar
sendo em prática o contrário de seu seja o espaço onde está, como a sua maneira
propósito (KWON, 1997, p. 6). de ocupar este espaço. Desta forma a autora
Finalmente a autora chama atenção acredita que a abordagem responsiva
para a desmaterialização do site, e à seja capaz de reintegrar fragmentos de
busca por uma identidade espacial em lugares perdidos e esquecidos, trazendo-os
uma sociedade onde os espaços foram novamente para a consciência das pessoas.
abstraídos, homogenizados e fragmentados O termo site-responsive, na acepção de
por conta do capitalismo tardio, vindo a Gillian é de natureza temporal, e refere-se
caracterizar a condição pós-moderna. As principalmente à instalação, incorporando
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