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prisão de Lula "comprova" Estado de


Direito — CartaCapital
por Intervozes — publicado 06/04/2018 15h34, última modificação
06/04/2018 16h26
13-17 minutos

Por Iara Moura, Bia Barbosa e Marcos Urupá*

Com a pompa que precede a previsão de um mestre místico, o


plantão da TV Globo e sua musiquinha – parte da memória histórica
brasileira – anunciou à nação: “O juiz Sérgio Moro acaba de
determinar a prisão do ex-presidente Luíz Inácio Lula da Silva”.

Concomitantemente, pronunciamentos de figuras públicas


sucederam-se nas redes sociais. Links e mais links de notícias e
declarações foram compartilhados.

Ao vivo, logo depois, BandNews e GloboNews seguiram, de


helicóptero, o carro em que Lula se deslocava até o Sindicato dos
Metalúrgicos de São Bernardo, no ABC paulista. Vivemos, no aqui e
agora, o desenrolar da história, como tragédia e como farsa.

No canal privado de notícias da Globo, os analistas apressaram-se


em desconstruir qualquer questionamento público sobre a decisão
do STF e de Moro. Gerson Camarotti acusou o PT de tentar criar a
narrativa de que a prisão era política. Lembrou sádica e
oportunamente que, dos seis ministros que negaram o habeas
corpus ao ex-Presidente, cinco foram indicados por governos
petistas.

Eliane Catanhêde denunciou o uso, por parte do partido, da pressão


externa de líderes da América Latina e da Europa. Citou a
manifestação de Rafael Côrrea e do ex-presidente Pepe Mujica
contra a prisão, afirmando que a estratégia dialogava com a usada
durante o processo de impeachment de Dilma Rousseff: a de afirmar
que as elites que a tiraram do poder também perseguem Lula. “Este
discurso cola lá fora, mas não tem eco aqui dentro”, concluiu
Catanhêde. “Estes governo bolivarianos não afetam em nada aqui”,
arrematou.

Enquanto os analistas se sucediam, imagens aéreas do Globocop


mostravam o aglomerado à espera de Lula em frente ao Sindicato
dos Metalúrgicos. A câmera esforçava-se num exercício voyeur
focando as janelas, uma a uma, a procura da imagem precisa. E que
imagem era essa? Contrariando a expectativa de alguns setores da
sociedade e da própria mídia, o despacho de Moro orientou o não
uso de algemas. O espetáculo midiático, montado, prescindia desse
detalhe.

Leia também:
Operação Aletheia e a nova aula global de manipulação midiática
Foco dos jornais não é prender Lula e sim mantê-lo inelegível

Passado o anúncio da decisão de Moro, as análises na GloboNews


voltaram-se à disputa eleitoral de 2018. A tese de que a transferência
dos votos de Lula não terá grande peso na decisão e de que os
eleitores de Lula seriam fieis à figura em si e não à ideologia
partidária foi repetida à exaustão. Nos intervalos das análises, a
sentença de Moro (outro documento carente de uma análise do
discurso aprofundada) era lida repetidamente.

No Jornal das 10, decorridas quase quatro horas da publicação da


sentença, o advogado de defesa de Lula, em rápida aparição,
destacou que ficou surpreso com a expedição do mandado e firmou
que o pedido de prisão era ilegal. Mas os comentaristas Merval
Pereira e Camarotti atestaram que não havia um clima de comoção
nacional e que esta seria apenas “mais uma prisão”.

Não obstante as imagens de milhares em marcha até São Bernardo,


as declarações de políticos e o anúncio de centrais sindicais e
movimentos dos protestos convocados para esta sexta-feira, Merval
concluiu: “Está tudo normal”.

“Não se trata de uma prisão política, houve toda uma investigação


sobre o tríplex, a defesa atuou”, ponderou Camarotti. “Destaco que,
com todo esse caminho jurídico percorrido, não pode o PT dizer que
existe injustiça”.

Jornal Nacional não ouve Lula

Numa edição de mais de uma hora de duração, o principal telejornal


do país foi quase todo dedicado, na noite de quinta-feira 5, à
decretação da prisão do ex-presidente Lula. Fazendo a retrospectiva
da decisão do STF sobre o pedido de habeas corpus no dia anterior
e de sua repercussão, o jornal, ao contrário do canal de notícias do
mesmo grupo, aparentou objetividade e isenção, com os
apresentadores e repórteres limitando-se ao relato dos
acontecimentos das últimas 24 horas.

Mas como diz o provérbio alemão: é nos detalhes que o diabo mora.
E aí vale destacar três pontos que permearam toda a edição da
quinta.
O primeiro, e mais impressionante – apesar de não inédito – foi a
ausência de qualquer declaração de Lula no telejornal, tanto sobre a
decisão do STF quanto sobre a decretação da prisão.

Lula pode não ter dado entrevistas à imprensa nas últimas horas,
mas falou em inúmeras ocasiões e espaços públicos sobre este
fato, e sua posição poderia ter sido facilmente recuperada pela
produção da emissora. Mas não o foi.

O posicionamento da defesa do ex-presidente foi apresentando


somente mediante a leitura de trechos de notas do advogado de
Lula, citados pelo apresentador William Bonner depois de 10 minutos
corridos da edição do jornal.

O desequilíbrio das falas contra e pró-Lula também foi nítido na


edição. Uma matéria de Brasília, trazendo a repercussão dos fatos,
citou duas falas de petistas contra cinco de outros políticos
defendendo a prisão.

Da senadora Ana Amélia (PP/RS), fervorosa opositora do PT, a frase


de que “ninguém está acima da lei”. Do deputado federal Rodrigo
Maia (DEM/RJ), presidente da Câmara, “o mandato ocorreu dentro
de um processo conduzido pela mais alta corte e onde foi respeitado
o direito de defesa”. E do governador de São Paulo e candidato à
presidência da República, Geraldo Alckmin, que “isso simboliza uma
importante mudança que vem ocorrendo no Brasil, com o fim da
impunidade”.

A única representante do Partido dos Trabalhadores que teve de fato


voz no Jornal Nacional foi a presidente da legenda, senadora Gleisi
Hoffmann, que mereceu 10 segundos para declarar que “esta é uma
prisão política”.

Gleisi apareceu numa reportagem somente no terceiro bloco do


jornal, que mostrou como havia sido o dia do ex-presidente Lula pós-
decisão do STF, reunido com lideranças partidárias em seu instituto.
A reportagem focada no PT foi mais curta (menos de dois minutos)
até que aquela que mostrou a repercussão internacional da
decretação da prisão.

A cobertura internacional destacada pelo JN mostrou diversos


jornais de outros países afirmando que o Brasil estava dividido. A
Globo, entretanto, não mostrou essa divisão.

Leia também:
Lula e o massacre do Jornal Nacional
O mecanismo da manipulação

Um terceiro aspecto característico do JN, nessa e em outras


ocasiões estratégicas pra história do País, é reforçar as ideias do
grupo por meio de declarações de entrevistados escolhidas
minuciosamente para ir ao ar. Assim, não é preciso um
posicionamento editorial direto para influenciar a opinião pública de
acordo com seus interesses.

Além da já mencionada “a lei vale para todos”, mas também do ex-


presidente tucano Fernando Henrique Cardoso, outras quatro
permearam todo o jornal: a de que as instituições estão cumprindo
sua função, como declarou um líder do MDB, partido do presidente
Michel Temer, a de que a Justiça deve ser célere, em resposta às
acusações de que Moro teria sido muito rápido para expedir a ordem
de prisão, a de que a carreira política de Lula teria acabado, ideia
reforçada por reportagens citadas do Washington Post e do The New
York Times; e, por fim, a de que a jurisprudência sobre a prisão a
partir de decisão em segunda instância não deve ser alterada.

Neste caso, o jornal produziu uma reportagem de sete minutos de


duração sobre as ações de declaração de constitucionalidade sobre
este tema, que tramitam no STF, com longas declarações da
ministra Rosa Weber dizendo que mudanças de jurisprudência em
curto prazo não são saudáveis ao Direito.

E que uma mudança na composição do STF ou na posição de um


ministro não justificariam rever este tipo de posicionamento. A
matéria terminou com discurso do ministro Alexandre Moraes,
segundo o qual, desde que a prisão pós-decisão em
segunda instância passou a ser válida em 2016, o combate à
corrupção ganhou muito no País.

Por fim, vale citar duas cerejas do bolo desta edição histórica, como
a Globo mesmo fez questão de destacar: mais uma tentativa de
caracterizar o PT como um partido violento – a emissora mostrou
imagens de uma briga que aconteceu em frente ao Instituto Lula e
afirmou que o partido teria dito que faria “tudo para impedir a prisão
do ex-presidente” – e as declarações escolhidas para o quadro “O
Brasil que queremos”, que encerrou o jornal da noite com metade
dos participantes falando sobre combate a corrupção, uma delas
afirmando que “os políticos corruptos tem que ser banidos do País”.

A voz do povo é a voz de Deus.

Editoriais sem máscaras

Na manhã desta sexta-feira 6, os jornalões estamparam o decreto da


iminente prisão de Lula. Logo abaixo da retranca “Prisão histórica”, a
manchete d’O Globo: “Moro decreta prisão e ordena que Lula se
entregue até as 17h”. Abaixo da manchete, um parágrafo com o lide
(O quê? Quem? Onde? Como?) pretendia localizar quem ainda não
estava em dia com as informações. No meio, o editorial “Prisão de
Lula reforça o Estado de Direito”.
Se no JN da noite anterior o Grupo Globo usou de declarações de
terceiros para fazer suas teses chegar ao público brasileiro, no
veículo impresso da empresa nada foi poupado:

“Fecha-se um ciclo na política brasileira, no momento em que um


líder populista esbarra na Constituição”, afirma o editorial logo em
seu início. “O mandado de prisão contra Lula confirma, por si só, que
os alicerces republicanos da democracia brasileira se fortaleceram”,
“mais do que nunca, vale a máxima republicana de que a Justiça é
para todos”, acrescentou.

Mas não foi só. O Grupo Globo, uma vez mais, reafirmou seu
compromisso editorial com a Operação Lava Jato – o que o fez, em
2017, a tentar derrubar o próprio Temer: “a ordem de prisão de Lula,
por sua vez, é o ponto mais alto de um processo de limpeza ética
por que passa a vida pública do País, a partir do fortalecimento de
instituições de Estado — Ministério Público, Judiciário, Polícia
Federal —, renovadas por gerações recém-chegadas de servidores
profissionais”.

“Especialistas em vitimização, Lula e PT tentam há tempos construir


o papel de mártires diante de tenebrosas conspirações “da direita”
(…) Mas a Lava-Jato destamparia o baú de falcatruas lideradas por
Lula e PT. Longe de envergonhar o país, como acha o ministro do
STF Gilmar Mendes, a condenação de um ex-presidente demonstra
a força das suas instituições”, concluiu o texto.

Leia também:

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à manipulação
No Estadão, a tonalidade discreta na manchete direta “Moro decreta
prisão de Lula” é imediatamente quebrada pela falta de diversidade e
da presença do contraditório na cobertura. E sem máscaras no
editorial “A manobra fracassada”, em que os donos do veículo
afirmam que “os ministros Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski
tentaram ganhar no grito o que não puderam ganhar por meio da
argumentação e da estratégia”. E o ex-presidente, que até para Moro
merece respeito especial em função da dignidade do cargo que
ocupou, é chamado ironicamente pela família Mesquita de “Sr. Lula
da Silva”.

Lá fora, de novo, mais profundidade

Na imprensa internacional, o discurso único de vitória democrática


contra a corrupção aparece contraposto por elementos contextuais e
analíticos mais profundos. A leitura de reportagens e análises a partir
de diversos sites de noticias evidencia uma série de perguntas não
respondidas e dúvidas sobre o respeito ao rito democrático – além,
claro, da divisão na opinião pública, já mencionada.

No portal da rede Al Jazeera: "Profunda divisão no Brasil, apos juiz


expedir mandado de prisão de Lula". O The New York Times tratou a
queda de Lula como “a mais dramática da história recente do País”,
lembrando que o ex-presidente saiu do governo ha oito anos com
87% de aprovação da população e que mantinha o percentual mais
alto de intenções de voto para as próximas eleições brasileiras, a
serem realizadas em outubro deste ano, informações estas
ausentes ou invisibilizadas pelos grandes veículos nacionais.

O francês Le Monde denominou Lula como "ícone da esquerda


brasileira", enquanto o espanhol El País ressaltou o fato de que o
mandado de Moro saiu antes do esgotamento do prazo para
recursos finais do processo e menos de 24 horas depois da votação
no STF.

Por aqui, a Folha de S.Paulo foi dos poucos veículos nacionais a


abrir espaço para esse tipo de questionamento.

O espetáculo midiático continua na sexta-feira 6, data do desfecho


de uma história com o final que a chamada grande mídia brasileira
ajudou a construir. Diferentemente do MBL, os grupos de
comunicação que controlam o poder das comunicações no Brasil
não precisarão soltar fogos. Como este blog destacou em outros
momentos, a praça pública onde Lula (e os ideários de esquerda
corporificados de maneira complexa e contraditória na sua liderança)
receberão sentença foi há muito tempo montada. Agora, é desfrutar
dos resultados. Triste episódio da nossa história.

* Colaborou Camila Nóbrega. Iara Moura, Marcos Urupá, Bia


Barbosa e Camila Nóbrega são jornalistas e integram o Intervozes.

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