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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE LETRAS

A Batalha e o Cerco de Meguido (c. 1457 a. C):


Tutmés III e a manutenção da presença egípcia na Ásia

Irene Alexandra Semião Tavares

Mestrado em História Militar


Batalhas na História: Casos de Estudo e Modelos de Análise
(Prof. Dr. João Gouveia Monteiro)

2018
Resumo

Durante muito tempo, os estudos sobre o Antigo Egipto se focaram somente em

túmulos, faraós, deuses e tesouros. A guerra sempre foi um assunto um pouco

negligenciado, por isso, neste trabalho iremos criar novas perspetivas sobre esta temática,

fazendo um estudo-caso sobre batalha e o cerco de Meguido. A análise deste conflito

muitas vezes é baseada em propaganda, então, estudaremos os pontos fortes e fracos de

ambos os exércitos - egípcio e cananeu - para assim observarmos a forma como ambos se

comportam em batalha, de modo a concluir sobre o que poderá ter acontecido realmente.

Isto tudo será complementado com uma explicação sobre as intenções do Egipto ao

avançar para a sírio-palestina e como o conseguiu fazer. No final, a nossa intenção é criar

novas interpretações e hipóteses, de modo a contribuir para esta área de estudo.

Palavras-chave: Tutmés III; Meguido; Síria-Palestina; Canaã.

Abstract

For a long time, studies about Ancient Egypt focused, only, in tombs, pharaohs,

gods and treasures. Warfare has always been a little overlooked, so, with this paper we

will create new prespectives about this matter, doing a study-case about the battle and

siege of Meguido. The traditional analysis of this conflict is often based on propaganda,

so, we will study the strengths and weaknesses of both the Egyptian and Cananite armies,

as well as how they behave in battle. All of this will be complemented with an explanation

about Egypt’s intentions in moving to Syria-Palestine, and how was this done. In the end,

our intention is to create new interpretations hypotheses, so we can contribute to this new

study area.

Key-words: Thutmose III; Megiddo; Syria-Palestine; Canaan.


Índice

Conteúdo Página

Introdução ......................................................................................................................... 1
O impulso para a expansão egípcia .................................................................................. 2
A batalha e o cerco de Meguido (c. 1457 a. C) ................................................................ 4
A batalha ....................................................................................................................... 7
O cerco ........................................................................................................................ 11
Conclusão ....................................................................................................................... 17
Anexos ............................................................................................................................ 19
Bibliografia consultada ................................................................................................... 25
Fontes ......................................................................................................................... 25
Bibliografia geral ........................................................................................................ 25
Introdução

O presente trabalho, inserido na Unidade Curricular do Seminário de Batalhas na

História: Casos de Estudo e Modelos de Análise pretende analisar e comentar o cerco e a

batalha de Meguido (c. 1457 a. C), de forma a retirar conclusões pertinentes sobre este

conflito. Para tal irão ser utilizados os Anais de Tutmés III1 como fonte, de forma cuidada,

devido a conter alguma propaganda, típica da época em questão, de modo a se estudar

certos aspetos e comprovar a sua veracidade. O que se pretende é observar o conflito com

os olhos da História Militar e não da literatura ou da ficção. Não se trata de estudar só

uma perspetiva, mas sim olhar para ambos os exércitos e perceber os seus diferentes

aspetos e a forma como se dispõem em batalha, assim como a importância de Meguido

para o estabelecimento de um poder egípcio firme na Ásia.

A escolha deste tema deve-se ao facto de não se encontrarem estudos

aprofundados sobre este conflito, especialmente sobre o cerco. Os que encontramos não

tiram outras conclusões senão as que já estão presentes nos Anais de Tutmés III, não

contribuindo muito para o estudo deste assunto. O autor que parece mais contribuir para

estas questões é Richard Gabriel, que iremos utilizar para nos auxiliar em alguns aspetos.

Outras conclusões que iremos retirar irão ser a resposta a várias hipóteses colocadas. Por

isso, no presente trabalho iremos responder a várias problemáticas sobre o tema: Como é

que o exército cananita perde para o Egipto? O exército egípcio foi assim tão perfeito

como nos descrevem as fontes? Que consequências teve o cerco tanto para os cananeus,

como para os egípcios? Qual foi a importância deste conflito?

1
Os Anais de Tumés III podem ser consultados em:
ARAÚJO, Luís Manuel de, “A batalha de Meguido”, em António Ramos dos Santos e José Varandas
(coord.), A Guerra na Antiguidade, II, Lisboa: Centro de História da Faculdade de Letras da Universidade
de Lisboa, 2006, pp. 116-125;

1
O impulso para a expansão egípcia

De modo a percebermos o avanço do Egipto para a Síria-Palestina, temos de

analisar a evolução do seu exército após a presença dos Hicsos. Antes do Império Novo

(1 550 a.C. - 1 070 a.C.), graças às suas fronteiras naturais2, o Egipto estava isolado, então

raramente tinha contactos militares com outros povos, à exceção da Núbia e da Líbia, na

forma de expedições punitivas.

O nível tecnológico do Egipto era ligeiramente superior ao dos seus vizinhos: o

bronze não era usado nas armas3, sendo estas relativamente leves nesta época4, mas,

mesmo assim, o Egipto conseguia conter incursões vindas da Núbia ou da Líbia, que eram

militarmente inferiores, tendo uma organização bastante tribal, por isso eram facilmente

controláveis, apesar de não deixarem de ser uma preocupação. Por isso, foram construídas

fortificações e postos de vigília a sul, depois da Primeira Catarata, para impedir a

passagem de alguma força invasora vinda da Núbia5. Existiam, no entanto, contactos

comerciais entre o Egipto e a Síria-Palestina desde muito cedo. Temos que nos recordar

que o Egipto tem necessidade de um recurso essencial, a madeira, nomeadamente a de

cedro, de boa qualidade, que vinha da zona da Síria-Palestina. Então, as relações

comerciais entre estas duas zonas eram bastante ativas. Porém, não existiam ainda

recursos para o Egipto avançar na conquista do corredor sírio-palestiniano ou para se

equiparar às potências militares desta zona.

Antes da vinda dos Hicsos, o Egipto possuía um exército bastante primitivo e não-

profissional. Não se encontrava a necessidade em formar um exército permanente, pois

2
Deserto a oeste, o deserto do Sinai, a costa mediterrânica e a primeira catarata no Assuão;
3
Já nos exércitos da síria-palestina o bronze era usado no armamento há bastante tempo;
4
Ver CREASMAN, Pearce Paul e WILKINSON, Richard H. (ed.). Pharaoh’s land and beyond: Ancient
Egypt and its neighbors, Oxford University Press, Nova Iorque, 2017, p. 93;
5
Ver anexos, figura 6;

2
os conflitos bélicos não eram frequentes, já que o Egipto tinha fronteiras naturais que lhes

davam uma certa proteção. O império egípcio começou a ser construído com a XVIII

dinastia. Depois da expulsão dos Hicsos pelo faraó Amósis, iniciou-se uma época de

expansão e cosmopolitismo, o Império Novo. A rápida expansão para o Médio Oriente e

a recuperação da Núbia6 começaram depois de o Egipto se ter encontrado dividido devido

à dinastia hicsa, que se instalou no Baixo Egipto, mais propriamente na cidade de Aváris,

no delta egípcio. Os egípcios ficaram encurralados na cidade de Tebas, no Alto Egipto,

entre dois dos seus inimigos – a norte os Asiáticos e a sul os Núbios7. Esta situação

causou, no Egipto, um sentimento de urgência em se desenvolver belicamente para,

assim, não permitir que nenhuma ameaça os possa comprometer de novo.

Os egípcios absorveram dos Hicsos, povo militarmente superior, imensa

tecnologia bélica, adaptando-a segundo as suas necessidades. Este armamento inclui:

armadura corporal, feita de pequenas placas de bronze revestidas de couro ou linho, a

Kopech8, um tipo de espada semelhante à cimitarra e o arco compósito9, ótimo para curtas

distâncias. Contudo, as principais inovações bélicas trazidas, e as que marcaram o Império

Novo, foram o carro de guerra e o cavalo, símbolos do poder militar desta época10. A

infantaria egípcia organizou-se graças a toda esta tecnologia, mas a marinha continuou

com a sua função: transporte de mantimentos e de soldados, como veremos com Tutmés

III.

6
Graças a esta falta de organização, sem progresso militar, aliado à falta de centralização governamental,
no Primeiro Período Intermediário (2181 a.C. – 2055 a.C.), os egípcios perdem a Núbia, o que fez com que
muitas fortalezas fossem tomadas, emergindo uma dinastia local em Kerma, na Alta Núbia;
7
Ver ARAÚJO, L. M. O Egipto faraónico. Uma civilização com três mil anos, Edições Arranha-céus,
2015, Lisboa, p. 95;
8
O bronze foi-lhes introduzido pelos Hicsos, já que os reinos da Ásia Menor tinham já um grande
desenvolvimento metalúrgico. Por isso, a partir daqui os egípcios passaram a lutar com armas de bronze.
9
Apesar do arco compósito ter sido introduzido pelos Hicsos, o arco de bastão continuou a ser utilizado e
preferido pelos egípcios, isto porque o primeiro era mais dispendioso e consumia tempo;
10
Ver SHAW, Ian, Egyptian Warfare and Weapons, Shire Publications, 1991, p. 42;

3
O Império Novo é caracterizado como um período de centralização política, de

profissionalismo militar e de cosmopolitismo, armas eficazes para se poder iniciar uma

ampla política expansionista. A projeção do poder militar longe do Egipto foi a melhor

tática para conter e submeter os povos que pudessem ser uma ameaça11. Uma das razões

para isto foi a existência de um exército moldado e moralizado por um faraó-general. Este

fator torna o exército predisposto para o combate e para a vitória. O movimento defensivo,

agora torna-se ofensivo.

A batalha e o cerco de Meguido (c. 1457 a. C)

O faraó era considerado, pelos egípcios, o rei de todo o mundo conhecido, então,

teoricamente, as fronteiras eram infinitas. As incursões na Ásia, iniciadas neste período,

seriam a imagem do Egipto nos quatrocentos anos seguintes. Esta presença na Ásia tinha

duas funções: facilitar o escoamento de produtos para o Egipto e servir de barreira para

invasões futuras. Tutmés I iniciou esta expansão alcançando o rio Eufrates12, mas com

Tutmés III é que houve uma presença definitiva e organizada do exército egípcio nesta

área13.

O período de junção dos reinados de Tutmés III e de Hatchepsut colidiu com a

época de expansão e crescimento do reino de Mitanni14. Com isto, a cidade-estado de

Kadesh cresceu rapidamente em mãos deste reino e ganhou influência nos estados de

Canaã até ao sul da cidade de Meguido. A consequência disto foi a diminuição da

influência egípcia nas cidades vassalas do norte de Canaã15. O reinado pacífico de

11
Ver HEALY, Mark e MCBRIDE, Angus, New Kingdom Egypt, Osprey Publishing, Londres, 1992, p.
10-11;
12
Os egípcios conheciam-no como o rio que corria ao “contrário”;
13
Ver idem, ibidem, pp.11-12;
14
Reino no noroeste e nordeste da Mesopotâmia;
15
Ver ARAÚJO, Luís Manuel de, “A batalha de Meguido”, em António Ramos dos Santos e José Varandas
(coord.), op cit, p. 97-98;

4
Hatchepsut16 não resolveu este problema, provocando uma falta de resposta egípcia e,

como consequência, o avanço da influência de Mitanni para sul, o que, por sua vez,

resultou em revoltas nas cidades vassalas dos egípcios, que tiveram que ser contidas 17.

Estas revoltas estão descritas nos Anais de Tutmés III como o motivo da primeira

campanha do faraó para “repelir os que atacavam as fronteiras do Egipto”18. Os

objetivos desta campanha eram claros: repelir os inimigos e “alargar as fronteiras do

Egipto”19.

Aquando da morte de Hatchepsut, quando Tutmés III assume verdadeiramente o

poder, o reino de Mitanni já tinha uma nova configuração. Desde a expulsão dos Hicsos,

os egípcios viam os sírios e cananeus como os herdeiros destes “invasores”20. Tutmés III

associava os sírio-mitannios ao prelúdio de uma “invasão” ao Egipto, por isso, sentiram

a necessidade de os atacar, tal como atacaram os Hicsos. No Império Novo, os conflitos

armados deixaram de ser apenas defensivos, para se tornarem meios de conquista e de

resposta a um inimigo21. Se os cananeus cruzassem o Monte Carmelo22 e ganhassem

poder no planalto, poucas forças egípcias estariam disponíveis para os travar antes que

eles chegassem a Gaza e a Charuhen23. Depois destes territórios, e até ao Egipto, não

existem fortificações naturais que os egípcios pudessem usar. Consoante isto, Tutmés III

teria que travar os Asiáticos antes que estes atravessassem o Monte Carmelo, para depois

vencê-los numa batalha e tomar a cidade de Meguido24. Este era o plano inicial. O que

16
Esta rainha concentrou-se mais no sul do império egípcio, chegando até ao Punt (atual Etiópia);
17
“Isso aconteceu no tempo de outros reis, quando a guarnição que lá estava se encontrava em Charuhen,
enquanto desde Yerasa até aos confins da terra grassava a rebelião contra sua majestade” - Consultar os
Anais de Tutmés III, ll. 13-15;
18
Consultar os Anais de Tutmés III, ll. 11-12;
19
Consultar os Anais de Tutmés III, ll. 19-20;
20
Os Hicsos provinham da região do Canaã.
21
Ver GABRIEL, Richard A., Thutmose III: The Military Biography of Egypt’s Greatest Warrior King,
Potomac Books, Inc., 2009, pp. 82-83;
22
Montanha em atual Israel;
23
Apesar disto, o este do Delta egípcio já era fortificado desde o Império Médio com fortes que controlavam
as rotas de Canaã e do sul do Sinai;
24
Ver idem, ibidem, p. 82;

5
conseguimos perceber pelos Anais de Tutmés III é que o rei de Kadesh e os príncipes de

outras cidades sírias se tinham refugiado nesta cidade, tornando a sua conquista algo

prioritário25. Além disto, Meguido era um centro nuclear estratégico e um vital ponto de

passagem que controlava o Norte de Canãa. Quem controlava Meguido, controlava toda

esta área.

Os Anais de Tutmés III expressam claramente os objetivos do faraó. No entanto,

não podemos ter a certeza se é uma fonte totalmente confiável, pois temos que nos

recordar que tem um teor propagandístico, o que é natural em fontes militares egípcias

desta época. Esta fonte só nos mostra a perspetiva egípcia, logo teremos que analisar os

pontos fracos e fortes de ambos os exércitos, e especular o que pode ter acontecido na

realidade. Afinal de contas, o Egipto, apesar de ter claramente vencido a batalha e o cerco,

também teve os seus pontos fracos que, obviamente, não estão totalmente mencionados

nos registos reais. Contudo, é uma fonte que nos pode fornecer imensa informação sobre

outros pormenores acerca da campanha e do saque, o que nos pode ajudar a compreender

a magnitude das conquistas de Tutmés III. Todavia, quando analisamos a fonte, parece

que o escriba se prendeu mais na enumeração do saque, do que na descrição da batalha e

do cerco em si. Contudo, não podemos deixar de assinalar a sua importância como

produção historiográfica pela descrição da tomada de prisioneiros e dos despojos de

forma minuciosa e muito precisa. Estratégias usadas pelo faraó também são bem

descritas, de forma evidente, como veremos.

25
“Esse miserável inimigo de Kadesh veio encerrar-se dentro de Meguido e encontra-se neste momento
lá. Ele reuniu em torno de si os príncipes de todas as terras estrangeiras” – Consultar Anais de Tutmés III,
ll. 24-25;

6
A batalha

Na marcha para Meguido, o abastecimento e a logística eram essenciais para

manter um exército de cerca de 10000 homens26, por isso os egípcios acampavam nas

cidades que ainda se aliavam ao faraó, o que foi fulcral para o provimento de comida e

água, facilitando o avanço do exército egípcio27. Além disto, como a marcha do exército

foi junto à costa mediterrânica, podem ter sido acompanhados por barcos com

mantimentos e contingentes28. Tutmés III também pode ter deixado guarnições nos

acampamentos por onde passou, caso houvesse uma retirada. O faraó poderia saber a

posição do inimigo a partir da espionagem que se fazia e da utilização de mensageiros,

assim, podia-se antever se os cananeus ainda estavam perto de Meguido 29. Estes foram

fatores que beneficiaram imenso os egípcios e que demonstram a organização e

profissionalização do seu exército nesta altura, comparando com o seu estado antes do

Império Novo. Isto também se pode demonstrar no cuidado que se tinha com os carros de

guerra: existe a possibilidade de estes nem irem montados durante toda a viagem, pois

podiam-se gastar ou mesmo estragar. As peças podiam ser transportadas por meio naval,

para assim não desgastar o exército em marcha. Depois podiam ser montados em cidades

onde os egípcios se abasteciam.

Para se chegar a Meguido, a partir de Yaham, existiam três hipóteses30: o caminho

para leste, que vai dar a Taanak; o caminho que iria dar ao norte de Meguido e, por fim,

a rota que conduz diretamente a Meguido, por um desfiladeiro, a partir do vale de Aruna,

lugar perfeito para uma emboscada. Nos Anais de Tutmés III assistimos a um concílio

entre o faraó e os seus generais, onde se discute que caminho se tomar, entre os que já

26
Ver idem, ibidem, p. 86;
27
Como é o caso da cidade de Yehem;
28
Ver anexos, figura 2;
29
Ver idem, ibidem p. 88;
30
Ver anexos, figura 9;

7
foram mencionados. Apesar do risco, o faraó decide ir diretamente para Meguido, pelo

vale de Aruna, pois o inimigo nunca esperaria que os egípcios tomassem o caminho mais

vulnerável31. Também poderia se ter tratado de uma questão de orgulho, em que Tutmés

III pretendida passar uma imagem de coragem aos cananeus, ao enfrenta-los diretamente

e não se esconder32. O vale de Aruna era bastante estreito, então o exército egípcio teria

de ter uma ordem de marcha em que Tutmés III iria na vanguarda e cada unidade iria

atrás do faraó33. O facto de este ter esperado pelo seu exército no final do desfiladeiro foi

crucial para a enfrentar o rei de Kadesh e mostrou uma grande capacidade de liderança

por parte do faraó, pois sem as unidades completas, existiria uma grande probabilidade

de se prejudicar em batalha 34 35.

Segundo Richard Gabriel, o exército egípcio era composto, essencialmente, por

contingentes de carros de guerra e infantaria, sendo neste último onde o exército se

apoiaria, estando, também, em maior número. Já no exército cananeu existia uma enorme

dependência nos carros de guerra, que se misturaram com a infantaria no campo de

batalha, não existindo uma organização36. Em Meguido, os egípcios colocaram, no centro,

os contingentes de carros de guerra, e nos flancos esquerdo e direito estava a infantaria37.

31
“Como podemos nós seguir por esta estrada que é estreita, quando se sabe que os inimigos nos estão
esperando [do outro lado] em grande número?”; “há dois caminhos a seguir. Um dirige-se para leste e
vai dar a Taanak, o outro fica a norte de Djefti, pelo que iremos sair a norte de Meguido. Que o nosso
valente senhor escolha um destes dois, mas não nos faça seguir por aquela estrada difícil” – Consultar os
Anais de Tutmés III, ll. 30-38;
32
“Será que sua majestade tomou um outro caminho porque tem medo de nós? – É assim que eles dirão”.
- Consultar os Anais de Tutmés III, ll. 45-46;
33
“Assim sua majestade decidiu que ele próprio seguiria à frente do seu exército, tendo cada homem sido
informado da ordem de marcha, cavalo atrás de cavalo, com sua majestade à frente das tropas” - Consultar
os Anais de Tutmés III, ll. 54-56;
34
“Sua majestade decidiu então esperar à entrada do vale para aguardar a chegada da retaguarda do seu
valoroso exército” – Consultar os Anais de Tutmés III, ll.79-80;
35
Por exemplo, Ramsés II (1279 a. C. - 1213 a. C.), na Batalha de Kadesh (1274 a.C.) não esperou para
que o seu exército estivesse reunido. As unidades de Ptah e Set só chegaram ao terreno de batalha mais
tarde, o que prejudicou o exército egípcio contra os Hititas e mostrou uma certa desorganização por parte
do faraó. Assim, a capacidade de um general organizar o seu exército e de ser paciente é crucial para o
sucesso em batalha;
36
Ver idem, ibidem, p. 89;
37
Ver anexos, figura 10;

8
Temos que reconhecer que os egípcios estavam mais organizados em campo de batalha

que os cananeus, pois estes últimos não esperavam um ataque preventivo, mas estavam

sim focados em preparar uma ofensiva e uma invasão ao Egipto. Não se pensou que

houvesse um ataque direto que colocasse os cananeus à defensiva, não tendo estes, tempo

de se preparar38. Não podemos dizer que o exército cananeu era desorganizado, até pelo

contrário, era bastante profissional, mas Tutmés III aproveitou-se bem do fator surpresa

e usou-o a seu favor. O exército do rei de Kadesh tinha vários fatores a sua vantagem, tal

como o bom conhecimento do terreno, bom equipamento, a presença de uma elite militar

de veteranos, em que a guerra era uma obrigação no seu status social, e o facto de terem

outras cidades vassalas a quem pedir ajuda.

Então, como é que um exército tão profissional perde para o Egipto? Isto deve-se

primeiramente ao facto de o rei de Kadesh não estar à espera de um ataque direto, como

já foi mencionado. Por isso, não teve tempo para organizar bem o seu exército, misturando

contingentes de carros de guerra com a infantaria39. Além disto, temos que nos recordar

que o exército cananeu era composto por príncipes de várias cidades, que falavam várias

línguas, o que dificulta imenso o comando do exército. Já no exército egípcio era

obrigatório se falar a mesma língua (era um requerimento no recrutamento) e havia uma

identidade cultural conjunta, por isso era um exército mais unido e moralizado, também

graças à mentalidade da maet40 e pelo facto de ter um faraó divino como comandante41.

Contudo, a falta de organização do exército cananeu ditou a sua derrota em campo de

batalha. A arma principal do Egipto era a organização e a boa logística, sendo que isto foi

crucial para a vitória.

38
Ver idem, ibidem, p. 110.
39
Ver idem, ibidem, p. 89;
40
A ordem (o Egipto) e o caos (os outros);
41
O exército egípcio também continha mercenários estrangeiros, mas estes eram “egipcianizados”.

9
O facto de o exército do rei de Kadesh se ter apoiado na utilização de carros de

guerra foi fatal, isto porque o terreno à volta de Meguido era instável, irregular e com

imensas árvores42. O carro de guerra só poderia ser usado na parte sul da cidade, onde o

terreno é mais plano. Já Tutmés III colocou os carros de guerra no centro e a infantaria

nos flancos, o que facilitou imenso a utilização do espaço de manobra43. Aqui a infantaria

egípcia era a maior ameaça porque conseguia envolver os carros de guerra cananeus. A

principal tática egípcia seria reduzir o espaço de manobra do exército do rei de Kadesh,

fazendo-os recuar.

Não podemos, no entanto, afirmar que os egípcios foram perfeitos em campo de

batalha, pois, naturalmente, tiveram as suas falhas que poderiam ter comprometido os

seus objetivos. Apesar de a tática de Tutmés III ter resultado, temos que propor que podia

não ter sido necessário um cerco depois. Talvez o faraó não esperaria um cerco, mas sim

somente uma batalha. Temos que nos recordar que os Anais de Tutmés III se focam,

principalmente, em descrever o saque deixado no campo de batalha e o que foi depois

recolhido pelo exército egípcio, tanto no cerco, como também nas cidades que foram

tomadas à sua volta. Como o exército egípcio tinha uma vitória garantida em batalha, o

exército do rei de Kadesh resguardou-se dentro da cidade de Meguido, deixando para trás

carros de guerra, cavalos e armamento44. A descrição da batalha nos Anais de Tutmés III

mostra-nos uma quebra na organização do exército egípcio, que se distraiu a saquear o

que o exército cananeu tinha deixado, enquanto os portões de Meguido se fechavam e o

rei de Kadesh estava a ser puxado para dentro. Os egípcios perderam uma oportunidade

de entrar na cidade. Isto pode significar que o faraó teria planeado somente um ataque ao

42
Ver anexos, figura 7;
43
Ver idem, ibidem, p.111;
44
“Quando viram sua majestade a avançar sobre eles, recuaram [para] Meguido com o medo estampado
nas faces, abandonando os seus cavalos, carros de ouro e prata”. – Consultar os Anais de Tutmés III, ll.
100-102;

10
exército cananeu? Pode ser que sim, porque um cerco após uma batalha poderia desgastar

o exército. Porém, Tutmés III, graças à clara vitória na primeira batalha, tinha agora um

exército preparado para realizar um cerco à cidade45.

O cerco

Apesar de a arqueologia egípcia não escavar cidades antigas amuralhadas, mas

sim túmulos, temos inúmeras representações iconográficas de cidades fortificadas e de

cercos, o que nos permite obter imensas informações de como estes poderiam ter sido.

Em Beni Hassan, encontramos representações de cercos durante os confrontos civis do

Primeiro Período Intermediário (2181 a.C. – 2055 a. C.) 46


. Então, podemos já assumir

que os egípcios tinham contacto com a guerra de cerco desde cedo e possuíam armamento,

como aríetes47, escadas e torres48. Não temos a certeza de onde vieram, mas podem ter

sido adquiridos com antigos contactos comerciais com a zona do Canaã e da

Mesopotâmia.

Os exemplos do Império Antigo (2686 a. C. – 2181 a.C.) que possuímos provêm,

essencialmente, do túmulo Inti49, um general egípcio, em Dishasha50. A partir daqui

podemos concluir que já empregavam escadas51 e sapadores para minar as paredes das

muralhas. Ataques semelhantes a cidades fortificadas aparecem no final do Primeiro

Período Intermediário e nos túmulos do princípio do Império Médio (2055 a. C. – 1650

45
“Se as tropas de sua majestade não distraíssem os seus corações a saquear os bens dos inimigos teriam
capturado Meguido nesse instante, quando o miserável inimigo de Kadesh e o miserável inimigo desta
cidade estavam a ser puxados do alto das muralhas apressadamente para nela se refugiarem. O temor de
sua majestade penetrou os seus corpos, os seus braços perderam força pelo poder do diadema real”. –
Consultar os Anais de Tutmés III, ll. 105-110;
46
Ver SHAW, Ian. Op cit, pág. 15-17;
47
Ver figura 5, em anexo;
48
Ver anexo, figura 1;
49
Ver anexo, figura 1;
50
Necrópole;
51
Ver anexos, figura 1;

11
a. C.) 52, em Beni Hasan53. Evidências físicas de ataques a fortificações vêm de fortes em

Buhen54, na Núbia, no entanto, os indícios diretos de tais ataques encontram-se nas fontes

literárias55. Um dos exemplos provenientes do Império Novo é o de Amósis56, que na

perseguição dos Hicsos pela síria-palestina, tomou Charuhen após 3 anos de cerco.

Em Meguido, depois de uma clara vitória egípcia no campo de batalha, o rei de

Kadesh e o seu exército fecham-se dentro da cidade. O objetivo dos egípcios ainda não

estava concluído, Meguido ainda não estava tomada, então o faraó ordena o que deverá

de ser feito57, a captura imediata da cidade. Como já foi explicado, o Egipto já pratica a

guerra de cerco desde muito cedo e podiam conseguir quebrar muitas muralhas dentro do

seu próprio território, mas tiveram grandes dificuldades em se adaptar à guerra de cerco

na Síria-Palestina, com muralhas de características muito diferentes. Aqui, o grau de

dificuldade aumenta58. O contacto mais impactante que os egípcios tiveram com este tipo

de muralhas foi com a tomada de Aváris e Charuhen, cidades dos Hicsos, povos

provenientes do Canaã. Contudo, mesmo com a grande quantidade de cidades fortificadas

neste local os egípcios não evoluíram as suas táticas de cerco de forma tão gradual como,

por exemplo, os Assírios59.

Já que, apesar das dificuldades, os egípcios sempre tiveram muito contacto com

a guerra de cerco, por que razão Meguido não foi tomada por assalto? Não se derrubaram

52
Ver anexos, figura 5;
53
Ver Introdução, em MORKOT, Robert G., The A to Z of Ancient Egyptian Warfare, Scarecrow Press,
Inc., Reino Unido, 2003;
54
Ver anexos, figura 8;
55
“Southern boundary, made in the year 8, under the majesty of the King of Upper and Lower Egypt,
Khekure (Sesostris III), who is given life forever and ever; in order to prevent that any Negro should cross
it, by water or sby land, with a ship, (or) any herds of the Negroes”. – Ver Ancient Records of Egypt , p.
319.
56
Primeiro faraó da XVIII dinastia;
57
“Capturem [habilmente] a cidade! Capturem [habilmente] a cidade, meus valentes soldados! […].
Atendendo a que todos os príncipes dos países do Norte estão lá dentro da cidade, a captura de Meguido
é a captura de mil cidades!” – Consultar Anais de Tutmés III;
58
GABRIEL, Richard A., op cit, p. 112;
59
Ver anexo, figura 1;

12
as muralhas? Segundo Richard Gabriel60, isto deve-se ao facto do armamento de cerco

egípcio só resultar com muralhas de barro/tijolo. Meguido estava amuralhada com pedra,

e aqui instrumentos como o aríete seriam inúteis. Os mineiros não iriam conseguir escavar

facilmente neste tipo de muralhas. Além disto, Tutmés III poderia querer reaproveitar as

muralhas para não precisar de gastar recursos ao reconstrui-las. Então porque não se

utilizou o ariete nos portões? O portão é uma zona construída de forma a ser facilmente

defendida, então era inútil ataca-la. Por isso, o exército egípcio colocou-se por toda a

muralha, em zonas que o exército cananeu não conseguiria defender prontamente.

Sem possibilidade de usar algum armamento de cerco, Tutmés III utilizou outro

método, construindo uma linha de defesa à volta da cidade, rodeando-a com um fosso e

erguendo uma paliçada com madeira das árvores de fruto caídas 61.Recordando que a

cidade se encontra no topo de uma colina, encontramos aqui uma defesa natural que tem

que ser aproveitada 62. A única parte acessível era a sul, o portão, onde o solo era mais

plano, logo não era necessário colocar grande parte do exército egípcio à volta da cidade,

nem era necessário construir torres de cerco, pois o terreno também não o permitiria.

Além disto, a própria geografia da cidade não permitia a saída nem a entrada de

contingentes nem de aliados do rei de Kadesh. O exército egípcio estava dividido em três

partes: um grupo estava no noroeste da cidade, o segundo estava no centro com o faraó e
63
um terceiro estava na zona sul . Com isto, outra parte do exército de Tutmés III

concentrou-se no saque e na conquista de cidades à volta de Meguido, ajudando a derrotar

60
Ver idem, ibidem, p. 188;
61
“Mediram a cidade e rodearam-na com um fosso, ergueram uma paliçada com madeira fresca de todas
as suas árvores de fruto” – Consultar os Anais de Tutmés III, ll. 126-127;
62
Ver idem, ibidem, p. 113;
63
Ver MARTINS, Daniela Filipa Ferreira. «Até aos pilares do céu» Estratégias de domínio político-
administrativo na síria-palestina no reinado de Tutmés III. Dissertação de Mestrado em História Antiga,
no ramo da Época Pré-Clássica, apresentada ao Departamento de História da Faculdade de Letras da
Universidade de Lisboa, Lisboa, 2013. Exemplar policopiado. Disponível em
http://repositorio.ul.pt/handle/10451/10932, p. 77;

13
lentamente os aliados mais próximos. Ao mesmo tempo, o Egipto ia recebendo alianças

destas mesmas cidades e os soldados também iam recolhendo cereais e frutos,


64
(recordando que a maior parte do exército era constituído por camponeses) . Assim, o

faraó desproveu o inimigo de recursos, com a tomada destas cidades, e o cerco durou sete

meses65, segundo a Estela66 de Gabel Barkal67.

Os egípcios beneficiaram imenso da vitória na primeira batalha, pois ficaram com

contingentes suficientes para aguentar um cerco de sete meses e ainda conquistar e

submeter cidades inimigas em torno de Meguido. Além disto, a maior parte dos soldados

e dos príncipes das cidades cananeias podiam já ter falecido em campo de batalha, isto

porque os contingentes de carros de guerra – onde subiam somente príncipes e soldados

de elite – foram quase todos destruídos. Então, era improvável que viesse auxílio de outras

cidades68. Portanto, isto foi mais um fator que levou à vitória egípcia. Tudo isto aliado à

fome que a cidade pode ter enfrentado, permitiu o faraó tomar a cidade.

A duração de um cerco podia ser ditada por fatores práticos que iriam influenciar

quanto tempo a cidade podia aguentar, dependendo da comida armazenada e do acesso a

água. Sabemos que Meguido tinha um bom sistema de fornecimento de água, a partir de

um túnel escavado desde a cidade até à fonte, que estava camuflada para não estar exposta

a inimigos possíveis69. Então, durante o cerco, a água pode não ter sido um problema para

os sitiados, o que explica a razão pela qual o cerco durou tanto tempo. Podemos assumir

64
Ver ARAÚJO, Luís Manuel de, “A batalha de Meguido”, em António Ramos dos Santos e José Varandas
(coord.), op cit, p. 108;
65
Ver idem, ibidem p. 108;
66
A Estela pode ser consultada em: ARAÚJO, Luís Manuel de, “A batalha de Meguido”, em António
Ramos dos Santos e José Varandas (coord.), op cit, p. 125-126;
67
É possível que este tempo seja um exagero por parte da Estela de Gebel Barkal, mas podemos presumir
que o cerco se deu durante muito tempo, porque a cidade pode não ter sido tomada pela sede, mas sim pela
fome;
68
Não existiam governadores para dar ordens.
69
Ver anexos, figura 11;

14
que tomar uma cidade pela fome torna o cerco mais longo do que pela sede70. Quando

uma cidade é cercada e o abastecimento é cortado, existem as seguintes consequências:

fome, sede e doenças. Como Meguido não tinha dificuldade em obter água, podemos

concluir que o cerco foi vencido a partir da fome, que facilita a propagação de doenças e,

por sua vez, leva à rendição da cidade.

Apesar de obterem facilmente abastecimentos a partir, não só do saque, mas

também do que foi trazido das suas cidades aliadas, podemos colocar a possibilidade de

que os egípcios, os sitiadores, também pudessem ter sofrido as consequências de um

cerco. Os egípcios acamparam durante sete meses no lado de fora da cidade. Contudo,

existe a possibilidade de o acampamento egípcio também ter sofrido dificuldades tais

como a falta de higiene71, o calor72 e a monotonia. Os primeiros dois fatores levam a

doenças e a perdas no exército, e o terceiro fator também é natural num cerco, já que

existem dias em que nada acontece, o que acaba por ter consequências psicológicas nos

soldados. Talvez Tutmés III tenha enviado parte do seu exército para conquistar outras

cidades à volta de Meguido para quebrar um pouco esta monotonia e não só para criar

novos aliados e tirar partido do saque.

Após a tomada de Meguido, Tutmés III, não aprisionou nem matou todos os
73
príncipes restantes, deixando-os seguir para as suas cidades respetivas . Isto não era

habitual, pois conhecemos a forma como os egípcios submetem os seus inimigos,

humilhando-os74, aprisionando-os, cortando-lhes as mãos (como aconteceu com os

70
O corpo humano aguenta a fome durante mais tempo do que a sede. Os cananeus, dentro da cidade,
podem ter começado a comer os animais. Apesar de ser macabro, não podemos retirar a possibilidade de
terem existido casos de canibalismo, o que explica o facto de o cerco ter durado tanto tempo.
71
Neste aspeto insere-se o facto de não tomarem banho com tanta frequência e a falta de limpeza dos
excrementos;
72
O cerco deu-se durante 7 meses, de Abril a Novembro, logo os egípcios aguentaram no mínimo 4 meses
de primavera e verão ou seja, um calor intenso;
73
Ver idem, ibidem, p. 108;
74
Ver anexos, figura 12;

15
Hicsos) e perseguindo-os. O faraó permitiu que estes príncipes voltassem a governar as

suas cidades, sempre com supervisão egípcia, claro. Estes príncipes podem ter-se tornado

“reis-fantoches” do faraó75, governando as cidades cananeias de maneira egípcia. Talvez

estes príncipes também pudessem controlar a região e dar um falso sentimento à

população de que o poder cananeu ainda governava a cidade, prevenindo, assim, revoltas

contra a presença egípcia, tal como tinham acontecido após a morte de Hatchepsut. Isto

era uma forma de criar um estado-tampão para prevenir invasões futuras ao Egipto.

75
“Depois sua majestade nomeou os novos chefes para [cada cidade] ” - Consultar os Anais de Tutmés III,
l. 146;

16
Conclusão

A tomada de Meguido foi essencial para o fortalecimento do poder egípcio no

Médio Oriente. Apesar de a fonte que utilizámos não fornecer todos os dados e ter um

carácter extremamente propagandístico, conseguimos utilizá-la para responder a muitas

das problemáticas apresentadas no início deste trabalho, contudo, também foi necessário

analisar outros fatores como a própria geografia do local, com a ajuda da análise de outros

autores como Richard Gabriel.

A vitória, tanto na batalha, como no cerco, foram a prova da capacidade de

liderança e de estratégia de Tutmés III, ao conseguir surpreender o exército cananeu.

Contudo, não podemos negar que o exército do rei de Kadesh tinha muitos fatores a seu

favor como o bom conhecimento da área, a posse de bom armamento e o auxílio do reino

do Mitanni, contudo a sua falta de organização no momento ditou a sua derrota. Tutmés

III conseguiu usar o fator-surpresa a seu favor. Apesar disto, o exército egípcio também

teve as suas falhas, porém, o faraó, graças a ter vencido gloriosamente a primeira batalha,

teve capacidade para fazer um cerco. Se na batalha inicial tivessem existido mais perdas

ou dificuldades, os egípcios podiam não ter tido capacidade de montar um cerco. A falta

de disciplina do exército egípcio no momento em que preferiram saquear o que foi

deixado para trás pelos cananeus, podia ter resultado num desastre, por isso, teve que se

gastar recursos e tempo para tomar a cidade por cerco. Porém, isto resultou ser benéfico,

pois não só se tomou Meguido, como também as cidades à sua volta, criando assim

abastecimento e aliados.

O cerco durou imenso tempo, o que é natural quando se toma uma cidade pela

fome, o que pode levar ao desespero. No entanto, podemos assumir que não foram só os

cananeus que sofreram com o cerco, mas os egípcios também, apesar dos recursos que

17
possuíam, devido ao calor e a doenças. Ambos os exércitos sofreram com o cerco, mas

foi graças a ele que Tutmés III triunfou e cumpriu o seu objetivo, evitar revoltas

novamente, ao se colocar os próprios governantes cananeus como “reis-fantoches” do

faraó. Se resultou inteiramente, não sabemos ao certo, mas como o rei de Kadesh escapou

e o Mitanni ainda tinha influência, podemos presumir que ainda houveram revoltas. Por

isso, Tutmés III realizou mais campanhas na Síria-Palestina. A batalha e o cerco de

Meguido fizeram parte da primeira campanha e foram só o primeiro passo, apesar da sua

grande importância, para controlar estas populações. Contudo foi graças a este pequeno

episódio que a presença egípcia na Ásia conseguiu prosperar por mais tempo.

Foi graças à tomada de Meguido que a receção de influências culturais e políticas

da Ásia prosseguem ainda mais do que com a chegada dos Hicsos no Segundo Período

Intermediário. A partir daqui a diplomacia começa a ter um papel bastante importante na

administração do império egípcio na Ásia. Os letrados egípcios começam a ter a

necessidade de falar acádico, a língua diplomática internacional da época. A partir daqui

o Egipto enriquece o seu próprio património cultural e adapta-se às circunstâncias do

Médio Oriente na altura.

18
Anexos

Figura 1 (Cerco egípcio a uma cidade fortificada na Ásia; Iconografia do túmulo de


Inti, em Dishasha76)

Figura 2 (rota do exército egípcio para Meguido 77).

76
Imagem retirada de: http://www.touregypt.net/images/touregypt/siege1.jpg (consultado a: 12/11/2017);
77
Imagem retirada de: GABRIEL, Richard A., Thutmose III: The Military Biography of Egypt’s Greatest
Warrior King, Potomac Books, Inc., 2009, pág. 88;

19
Figura 3 (cerco de Askalon de Ramsés II 78 79).

Figura 4 (Cena num túmulo em Tebas que mostra soldados egípcios a utilizar uma torre
de cerco móvel 80).

78
Nesta imagem podemos ver algum armamento de cerco utilizado pelos egípcios, além da tática de leva o
escudo às costas, que servia de proteção;
79
Imagem retirada de: http://www.touregypt.net/featurestories/siegewarfare.htm (consultado em:
14/11/2017);
80
Imagem retirada de: http://www.touregypt.net/featurestories/siegewarfare.htm (consultada em:
21/11/2017);

20
Figura 5 (cena num túmulo do Império Médio, em Beni Hasam que demonstra o uso do
aríete 81).

Figura 6 (fortificações e postos de vigília a sul82)

81
Imagem retirada de: SHAW, Ian. Egyptian Warfare and Weapons, Shire Publications, 1991, p. 17;
82
Imagem retirada de: http://www.touregypt.net/featurestories/fortresses.htm (consultada a: 28/11/2017);

21
Figura 7 (Fotografia aérea de Meguido na atualidade83)

Figura 8 (Fortaleza de Buhen, na Núbia, estabelecida provavelmente no reinado de


Seneferu III, durante o Império Antigo84)

83
Imagem retirada de: https://www.margaretmorsetours.com/israel-tours/tel-megiddo-and-druze-village/
(consultada em 1/12/2017);
84
Imagem retirada de: https://en.wikipedia.org/wiki/Buhen. (Consultada a: 4/12/2017);

22
Figura 9 (Rotas de Yehem, para Meguido85)

Figura 10 (Disposição tática de forças em Meguido86)

85
Imagem retirada de: SHAW, Ian. Egyptian Warfare and Weapons, Shire Publications, 1991, p. 84;
Imagem retirada de: GABRIEL, Richard A., Thutmose III: The Military Biography of Egypt’s Greatest
86

Warrior King, Potomac Books, Inc., 2009, p. 110;

23
Figura 11 (Túnel de fornecimento de água em Meguido87)

Figura 12 (Iconografia de Karnak - Tutmés III a submeter os seus inimigos88)

87
Imagem retirada de: http://www.generationword.com/devotions/sep/6b.html (Consultada a:
11/12/2017);
88
Imagem retirada de: https://www.pinterest.pt/pin/839639924247548259/ (Consultada a: 26/12/2017);

24
Bibliografia consultada

Fontes

Anais de Tutmés III, consultados em:

ARAÚJO, Luís Manuel de,

“A batalha de Meguido”, em António Ramos dos Santos e José Varandas (coord.), A


Guerra na Antiguidade, II, Lisboa: Centro de História da Faculdade de Letras da
Universidade de Lisboa, 2006, pp. 116-125;

Estela de Gabel Barkal, consultada em:

“A batalha de Meguido”, em António Ramos dos Santos e José Varandas (coord.), A


Guerra na Antiguidade, II, Lisboa: Centro de História da Faculdade de Letras da
Universidade de Lisboa, 2006, p. 125-126;

BREASTED, James (ed.),

Ancient Records of Egypt, History & Mysteries of Man, Londres, 1988;

Bibliografia geral

ARAÚJO, Luís Manuel de,

O Egipto faraónico: Uma civilização com três mil anos, Edições Arranha-céus, Lisboa,
2015;

ARAÚJO, Luís Manuel de,

“A batalha de Meguido”, em António Ramos dos Santos e José Varandas (coord.), A


Guerra na Antiguidade, II, Lisboa: Centro de História da Faculdade de Letras da
Universidade de Lisboa, 2006;

CREASMAN, Pearce Paul e WILKINSON, Richard H. (ed.),

Pharaoh’s land and beyond: Ancient Egypt and its neighbors, Oxford University Press,
Nova Iorque, 2017;
25
GABRIEL, Richard A.,

Thutmose III: The Military Biography of Egypt’s Greatest Warrior King, Potomac
Books, Inc., 2009;

HEALY, Mark e MCBRIDE, Angus,

New Kingdom Egypt, Osprey Publishing, Londres, 1992;

MARTINS, Daniela F. F.,

«Até aos pilares do céu» Estratégias de domínio político-administrativo na síria-


palestina no reinado de Tutmés III. Dissertação de Mestrado em História Antiga, no
ramo da Época Pré-Clássica, apresentada ao Departamento de História da Faculdade de
Letras da Universidade de Lisboa, Lisboa, 2013. Exemplar policopiado. Disponível em
http://repositorio.ul.pt/handle/10451/10932

MORKOT, Robert G.,

The A to Z of Ancient Egyptian Warfare, Scarecrow Press, Inc., Reino Unido, 2003;

SHAW, Ian,

Egyptian Warfare and Weapons, Shire Publications, Reino Unido, 1991;

26

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