Vous êtes sur la page 1sur 1

As palavras "longe”, “antigo” e similares são muito poéticas e agradáveis porque despertam

idéias vastas e indefinidas... [...] As palavras “noite", "noturno” etc, e as descrições da noite são muito
poéticas porque a noite, confundindo os objetos, só permite ao espírito conceber uma imagem vaga, indistinta;
incompleta, tanto dela quanto das coisas que ela contém . Da mesma forma "obscuridade”, “profundo” etc.

A luz do sol ou da lua, vista num lugar de onde não se possa vê-los ou não se possa descobrir
a fonte luminosa; um lugar somente em parte iluminado por essa luz; o reflexo dessa luz, e os vários efeitos
materiais que dela resultam; o penetrar dessa luz em lugares onde ela se torne incerta e impedida, e mal se
possa distingui-la, como através de um canavial, uma floresta, uma porta de varanda entreaberta etc. etc.; a
dita luz vista num lugar ou sobre um objeto etc. em que ela não entre nem incida diretamente, mas que aí
surja difusa ou rebatida, vinda de outro lugar ou de um objeto qualquer etc. em que ela se tenha refletido;
num vestíbulo, visto do exterior ou de dentro, ou ainda num alpendre etc.. todos esses lugares em que a luz se
confunde etc. etc. com as sombras, como sob um pórtico, uma varanda elevada e pênsil, em meio aos penhascos
e des penhadeiros, ou num vale, sobre as colinas vistas da parte da sombra, de modo a que estejam dourados
os cimos; o reflexo que produz, por exemplo, um vidro colorido sobre os objetos em que se reflitam os raios que
passam através desse mesmo vidro; todos esses objetos, em suma, que por diversas circunstâncias materiais e
ínfimas se apresentam à nossa vista, ouvido etc. de maneira incerta, imperfeita, incompleta ou fora do
ordinário etc.

Essa mesma luz é cheia de atrativo e sentimentalismo quando vista nas cidades, onde se
apresenta retalhada pelas sombras, onde a escuridão contrasta em muitos lugares com o claro, onde a luz em
muitas partes se degrada pouco a pouco, como sobre os telhados, onde alguns lugares recônditos ocultam a
vista do astro luminoso etc. etc. A esse prazer contribuem a variedade, a incerteza, o não se ver tudo, e poder-
se no entanto dar uma latitude à imaginação com respeito àquilo que não se vê. Da mesma forma refiro-me
aos efeitos similares que produzem as árvores, os alinhamentos, as colinas, os parreirais, as choupanas, as
palhoças, as desigualdades do solo etc. no campo. Inversamente, uma vasta planura uniforme, em que a luz se
espraia e difunde sem variedades ou obstáculos, onde a vista se perde etc. é igualmente agradabilíssima, pela
idéia de extensão indefinida que tal vista proporciona. Da mesma forma, um céu sem nuvens. A esse
propósito observo que o prazer da variedade e da incerteza prevalece sobre o da aparente infinitude e o da
imensa uniformidade. Daí que um céu variadamente esparso de pequenas nuvens será talvez mais agradável
de se ver que um céu completamente limpo; e a vista do céu terá talvez menos encanto que a da terra, do
campo etc. porquanto menos variada (e também menos semelhante a nós, menos íntima, menos ligada às
nossas coisas etc.). Na verdade, se vos estirardes de costas de modo a que não possais ver senão o céu,
separado da terra, provareis uma sensação muito menos agradável do que se estivésseis contemplando um
campo, ou considerando o céu em sua correspondência e relação com a terra, e a ela unido num mesmo ponto
de vista.

Cheia de encanto igualmente, pela razão supradita, é a vista que se tem de uma profusão
inumerável, de estrelas, por exemplo, ou de pessoas etc., agitadas num movimento variado, incerto, confuso,
irregular, desordenado, uma ondulação vaga etc. que o espírito não pode determinar nem conceber de maneira
distinta ou definida etc., como o de uma multidão, ou de um formigueiro, ou de um mar agitado etc. Da
mesma forma, uma profusão de sons irregularmente combinados e não distinguíveis uns dos outros etc. etc. etc.

ÍTALO CALVINO, Seis propostas para o próximo milênio: “Exatidão”.

Vous aimerez peut-être aussi