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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE COMUNICAÇÃO
PRODUÇÃO EM COMUNICAÇÃO E CULTURA
DISCIPLINA: OFICINA DE COMUNICAÇÃO ESCRITA
DOCENTE: ANNAMARIA PALÁCIOS

IAN CASTRO DE SOUZA

ARTIGO CIENTÍFICO
A SEGMENTAÇÃO DO MERCADO: O CARÁTER MULTIFACETADO DO CONSUMO

Salvador
2007.1
A segmentação do mercado: o caráter multifacetado do consumo

Ian Castro de Souza*

RESUMO

Visto a necessidade dos oligopólios capitalistas de promover uma efusão do seu mercado consumidor, foi preciso
um investimento massivo na internacionalização da sua produção. Mas esta expansão encontrou, no fenômeno da
globalização, um obstáculo difícil de ser aluído: a relutância de um mundo que acabara de descobrir o fenômeno do
cosmopolitismo em aceitar mercadorias oriundas de um sistema de produção serial. Como forma de subjugar este
empecilho surgiu a publicidade capitalista, que, com os meios de comunicação modernos, criou padrões específicos
de consumo e conformou os diversos segmentos sociais que se disseminavam nesses padrões, gerando assim os
indivíduos responsáveis pela manutenção da lógica capitalista, os consumidores ideais: grupos que, não abrindo mão
de sua ideologia primordial, compactuaram inconscientemente com o consumismo. Para compreender como se deu
este processo faz-se necessária uma re-conceituação de processos do âmbito da sociologia e da comunicação,
embasada em estudos prévios acerca do assunto e a análise de manifestações atuais.
Palavras-chave: a) globalização; b) segmentação; c) consumo; d) publicidade; e) face

Intróito: o modo de produção capitalista contra um mundo multifacetado


Em plena era do domínio do sistema capitalista de produção, faz-se necessário aos oligopólios investir na
internacionalização do consumo de seus produtos. Com o advento da globalização, e o inerente avanço dos meios de
comunicação, atingir os diversos pontos geográficos do planeta onde é possível vender, escoar, estes produtos é uma
tarefa que parece extremamente fácil, mas seu cumprimento apresenta um empecilho que a faz árdua: como
estimular o consumo de produtos homogêneos, massificados, em um mundo tão heterogêneo, onde coexistem
tendências tão efêmeras?
O fortalecimento da comunicação internacional promoveu a efusão de um fenômeno que antes existira em
proporções praticamente desprezíveis para o capitalismo; um fenômeno que se mostrou um obstáculo formidável ao
desenvolvimento mercadológico globalizado: a segmentação da sociedade – ou, se preferir, segmentação dos
consumidores.
A melhoria da comunicação entre as mais diversas regiões do globo terrestre ocasionou um processo de
desterritorialização da cultura: a formação de grupos sociais que, independente dos fatores tempo e espaço,
valorizam, simultaneamente, elementos de várias culturas. Deste modo, há a construção de uma cultura própria, com
valores sociais únicos e, o mais importante, sem uma região específica de culto – ela pode ser sustentada por
indivíduos que adotem aqueles valores para si em qualquer localidade do mundo.
São estas “culturas avulsas” que cedem a pequenas regiões valores tão discrepantes, enquanto, observando o
âmbito global, há uma perfeita coincidência daqueles valores. São elas que concedem o aspecto cosmopolita às
*
Graduando em Comunicação Social com habilitação em Produção em Comunicação e Cultura.

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metrópoles contemporâneas, por exemplo, onde há a existência simultânea de inúmeros segmentos sociais que
possuem relações de comportamento e de consumo semelhantes – ou “comunidades internacionais de interesse”
(NEGROPONTE apud AZEVEDO JUNIOR, 2001, p.2), termo que nós adotaremos para tratar desses grupos.
O intuito do presente artigo é, já elucidado o empecilho à manutenção do domínio do modo capitalista de
produção, apresentar e alumiar a solução por ela adotada a fim de eliminar tal estorvo, mostrando como ocorre a
consolidação deste processo a partir da re-visitação a conceitos de estudiosos da comunicação e da sociologia,
adequando-os à realidade e à ideologia capitalista. Mas, para entender tal solução, é preciso embasamento prévio
mínimo em relação ao estabelecimento das relações sociais dentro dessas comunidades de interesse.

Conceituando e re-conceituando: a face e suas implicações sociais


Como sobredito, os membros de toda e qualquer comunidade internacional de interesse sustentam os mesmos
comportamentos, valores sociais e – o aspecto mais relevante do estudo aqui realizado – hábitos de consumo. Erving
Goffman revelou em seus estudos acerca das relações sociais que o início do processo de inclusão social se dá, numa
interação, através da apresentação da “face” de um determinado indivíduo aos demais participantes daquela
interação, os quais, por sua vez, decidirão se aquele indivíduo está apto, ou não, a participar daquela interação. Face,
para Goffman, é um conjunto de valores socialmente aceitos (e, por tanto, inclusivos) que um indivíduo apresenta – o
que, no nosso estudo, varia entre os diferentes grupos sociais. (GOFFMAN, 1967)
É primordial para a compreensão deste conceito salientar que a face não é inerte; ela muda constantemente,
adaptando-se ao ambiente no qual o seu portador está inserido e aos interlocutores da interação social à qual ele
pretende se inserir (GOFFMAN, 1967). O mesmo processo de estipulação de face se dá de forma maximizada – e
um pouco mais complexa, como irei mostrar – no âmbito dos segmentos sociais como um todo.
Cada comunidade de interesse apresenta uma determinada face – já esta, a face da comunidade, é imutável, pois é
através dela que é feito o reconhecimento dos indivíduos que a ela pertencem. A identificação dos membros de uma
comunidade vem do reconhecimento de sua face – desse conjunto de valores que, naquele grupo, são inclusivos – em
um determinado indivíduo, ou seja, da semelhança entre a face do indivíduo e a face do grupo – da semelhança entre
a identidade pessoal e a identidade do grupo. No estabelecimento de uma relação social desse cunho são
imprescindíveis os cumprimentos de duas etapas iniciais que definem a aptidão do indivíduo a integrar-se naquele
grupo: tais etapas “consistem na efetiva e eficaz projeção de um eu aceitável e na confirmação de sua aceitação pelos
outros” (GOFFMAN, 1967, p.105-106). É assim que são determinados os membros de um segmento social: deve
haver o reconhecimento instantâneo da efígie como uma representação em menor escala daquela comunidade de
interesse e, o mais importante, a recíproca também deve ser verdadeira.

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Com a voraz e iminente necessidade do modo de produção capitalista de captar todo e qualquer consumidor em
potencial, há uma alteração na dinâmica das relações sociais e pode-se efetuar uma dupla expansão no conceito de
face originalmente proposto por Goffman. A primeira delas é a reformulação do conceito, não para ser aplicada a um
indivíduo ou grupo, e sim a um produto. Oriunda da influência da publicidade e seu cerne capitalista – como será
devidamente explanado a seguir –, nasce a idéia que não só os indivíduos possuem faces, mas também os produtos
que se destinam ao consumo de um segmento social específico. Esta face agregada ao produto, por mim tratada
como a “face do produto”, é o fator que o identifica como parte dos hábitos de consumo daquele grupo. A face do
produto é, por obrigação, uma réplica diminuta da face da comunidade de consumo a qual tal produto é destinado –
e, assim como a face do indivíduo quando comparada à face do grupo ao qual pertence, ela é facilmente identificável
com a do seu consumidor. E ainda é mais que isso: é a corroboração material dos valores do grupo social ao qual se
destina. Assim há uma segunda expansão do conceito de Goffman: a face torna-se um conjunto de valores e produtos
socialmente aceitos em uma determinada comunidade de interesse.

O consumo da face: a face dos produtos e a face de seus consumidores


No presente estudo, explorando e expandindo o conceito de face do produto apresentado anteriormente, iremos nos
ater exclusivamente ao processo de ratificação da identidade de uma determinada comunidade de interesse pelos seus
hábitos de consumo.
O ato de consumir, como alega Baudrillard, não se resume a uma prática material. Ele não acontece pela simples
utilização de uma mercadoria por seu caráter funcional: esta mercadoria é apenas um objeto-símbolo. Na lógica do
sistema capitalista de produção, o verdadeiro sentido do consumo é apropriar-se da carga semântica intrínseca àquele
bem de consumo, é a aquisição da conotação social que este possui em si. Uma carga semântica, uma conotação
social, um status quo, que não pode ser adquirido de nenhum outro jeito senão a partir da compra, do consumo, da
exibição daquele produto (BAUDRILLARD, 1989). Essa é a lógica do consumismo.
A relação entre a face do produto e a face do seu consumidor acontece seguindo esta lógica. O produto cede sua
face, construindo parte da face do seu consumidor. E é através deste consumo, desta apropriação e integração da face
do produto, que o indivíduo corrobora sua própria face. Essa confirmação se dá devido ao reconhecimento de seus
próprios valores (que, por sua vez, coincidem com aqueles do grupo no qual está inserido) naquele produto; a
aquisição deste propicia um reforço a estes valores, um lembrete permanente para aquele indivíduo e um aviso para
todos os outros que ele, de fato, pertence a um determinado grupo social. Na verdade, há uma equivalência entre as
faces do produto e consumidor que nos permite reconhecer ambos como parte de uma comunidade de interesse
maior. Baudrillard discute este processo de ressemantização da mercadoria:

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Reunimo-nos aqui, quanto a seu resultado, à lógica formal da mercadoria
analisada por Marx: assim como as necessidades, os sentimentos, a cultura, o
saber, todas as forças próprias do homem acham-se integradas como
mercadoria na ordem de produção e se materializam em forças produtivas para
serem vendidas, hoje em dia todos os desejos, os projetos, as exigências, todas
as paixões e todas e todas as relações abstratizam-se (e se materializam) em
signos e em objetos para serem compradas e consumidas. (1989, p. 207)

Tomemos o recente movimento metrossexual como ilustração para o melhor entendimento da idéia do consumo de
face. O grupo social intitulado metrossexual baseia-se na criação de um novo homem que, mantendo sua
heterosexualidade, aproxima-se, e até mesmo inclui-se, no universo feminino. Como uma forma de confirmação
desse ideal (e de todos os valores agregados a ele), estes homens consomem artigos, originalmente utilizados pelo
público feminino, relacionados à moda, estética, culinária, serviços e muitos outros elementos que, para os membros
deste grupo, são essenciais, pois proporcionam a eles o reconhecimento de sua integração no grupo dos
metrossexuais. Não pode haver um homem da comunidade metrosexual que não consuma estes artigos; mesmo que
compactue com seus ideais, ele simplesmente não seria parte da comunidade. Sem a apropriação destes produtos, o
reconhecimento deste homem como parte do grupo social deles não estaria totalmente corroborado. É essa
confirmação que dota o produto de uma face própria.
Assim, um produto estritamente ligado ao público metrossexual, por exemplo, quando consumido por um homem
já promove seu reconhecimento como parte do segmento social dos metrossexuais

A pseudoindividualização de um todo: uma publicidade que forja faces


Objetivando findar a situação-problema apresentada no início desta dissertação, o modo capitalista de produção
recorreu à divisão do mercado consumidor em segmentos específicos. A adoção dessa tática contribuiu bastante para
superar os limites de penetração de mercado, impostos pela produção em larga escala, nesses nichos sociais, mas se
mostrou uma alternativa que também apresentava suas limitações. Criar produtos e serviços diferenciados,
aparentando uma maior personalização, foi a solução encontrada para estreitar os laços entre produtor e consumidor;
mas ela não alcançaria seu ápice de funcionalidade enquanto não fossem especificados certos padrões mundiais de
consumo. Este era seu limite-mor.
É obvio que a segmentação do mercado realizada pelo sistema capitalista não poderia sanar a situação, por uma
razão mui simples: essa fragmentação do mercado é apenas uma forma de adaptação da lógica capitalista à
necessidade de expansão de mercado, não um rompimento com a fórmula de produção do capitalismo – até porque
mantém seu aspecto mais marcante: a produção em série. Foi exatamente aí que se fez necessária a evocação da
maior arma do capitalismo, um instrumento com amplo alcance e fácil assimilação pelo público: a publicidade.

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A princípio, pode parecer contraditória a idéia de segmentar o mercado para atingir um público maior, mas,
analisando tal estratégia em um âmbito global e contando com o apoio das abordagens publicitárias para sua
consolidação, pode-se perceber que é bastante pertinente.
A publicidade contemporânea, ao contrário do se pensa, está intrinsecamente ligada às relações sociais e não aos
objetos, aos produtos em si. Explicando esta frase a partir dos conceitos de face anteriormente estabelecidos: a
publicidade constrói uma face para os seus produtos, uma face correspondente a do público ao qual aquele produto é
destinado – uma face que, como sobrecitado, objetiva ratificar a inclusão desse público num determinado grupo
social. E efetuada a construção dessa face, a publicidade promove um efetivo endereçamento daquele determinado
bem de consumo. Mas, para entender como ocorre a construção da face de um produto através da publicidade, é
preciso antes perceber, e compreender, um processo de proporções muito mais amplas do qual a publicidade e sua
disseminação nas mais diversas mídias também é responsável; o processo do qual resultou o êxito da técnica de
fragmentação de mercado adotada pelo modo capitalista de produção; o processo que estipula os - tão necessários ao
capitalismo - padrões mundiais de consumo: a construção – ou, se preferir, deformação – da face dos receptores, dos
consumidores da mensagem publicitária.
Graças a sua veiculação mundial nos meios de comunicação (em massa, principalmente), a publicidade consolida
as supracitadas comunidades internacionais de interesse por meio de sua constante divulgação. Essa consolidação se
dá com o intuito de promover a formação de um mercado global que, apesar de segmentado, respeita a uma única
lógica, construída a partir da aproximação dos comportamentos e valores dessas comunidades a uma lógica comum
do sistema capitalista: o consumismo. Márcia Tosta Dias aponta esse caráter homogeneizado que o capitalismo
impele a esses diferentes grupos de interesse, permutando sua individualidade por uma pseudo-individualidade
adaptada ao atual modo de produção:

A diversidade, a segmentação, a variedade, a pluralidade, enunciadas pela era


da mundialização, por mais que tomem uma configuração específica neste fim
de século, são características fundantes da industria cultural e do capitalismo
global. (2000, p. 49)

E, adotando uma postura ainda mais fatalista, pode-se destacar o fato que “até as esferas resistentes vão sendo, aos
poucos, envolvidas pela lógica da produção de mercadorias, mesmo que persista a sua constituição original” (DIAS,
2000, p. 26), reafirmando a impossibilidade de coexistência do sistema de produção capitalista e uma manifestação
cultural autêntica incorruptível.
Não obstante consolidar essas comunidades, o papel das campanhas publicitárias é ainda maior no triunfo do
capitalismo sobre a sociedade: é através delas que são apresentados estímulos que induzem a padronização dos
comportamentos de um nicho social específico – como é percebido a partir da constante apresentação de estereótipos

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nos produtos midiáticos – e criando também a necessidade do ser individual de afirmar sua integração naquele grupo
a partir do consumo de mercadorias – ou melhor, do consumo da face daquelas mercadorias. Consolida-se então um
processo de eterna reciprocidade onde “o espectador constrói a imagem e a imagem constrói o espectador”
(AMOUNT, 1993, p. 81). Há assim um falso apoio e sustentação das comunidades internacionais de interesse e a
adequação de suas particularidades à lógica comum dos oligopólios. Adorno e Horkheimer sintetizam de forma
brilhante esta tendência mercadológica de homogeneização:

As particularidades do eu são mercadorias monopolizadas e socialmente


condicionadas, que se fazem passar por algo de natural. Elas se reduzem ao
bigode, ao sotaque francês, à voz grave da mulher de vida livre, ao Lubitsh
touch: são como impressões digitais em cédulas de identidade que, não fosse
por elas, seriam rigorosamente iguais e nas quais a vida e a fisionomia de
todos os indivíduos – da estrela de cinema ao encarcerado – se transformam,
em face do poderio universal. A pseudo-individualidade é um pressuposto
para compreender e tirar da tragédia sua virulência: é só porque os indivíduos
não são mais indivíduos, mas sim meras encruzilhadas das tendências do
universal, que é possível reintegrá-los totalmente na universalidade. (1985, p.
145)

O resultado disso é que em todo o mundo, independente da sua localização geográfica, há grupos sociais com
semelhantes hábitos de consumo e há também produtos para eles endereçados. Para ilustrar tal fato podemos mais
uma vez utilizar o grupo dos metrossexuais: dois metrossexuais colocados em localidades distantes uma da outra,
independente de sua nacionalidade, possuirão sempre os mesmos comportamentos, consultarão os mesmos veículos
midiáticos, seguirão as tendências de uma mesma moda, e, fatalmente, consumirão os mesmos produtos.
Agora, ciente do papel majoritário que a publicidade possui, é possível perceber que a forja da face dos produtos é
um exercício infinitamente menos complexo que o anterior. Em geral, a formação desse construto facial acontece a
partir dos efeitos da reprodução massiva de estereótipos nos produtos midiáticos – em virtude, principalmente, da
natureza publicitária concomitante a esses produtos. Como foi estudado por inúmeros pensadores da comunicação de
massa, existem efeitos inerentes a estes produtos; são deles que a publicidade se vale para a construção da face de
uma mercadoria.
O mais comum e eficaz desses estrategemas é a construção de um vínculo entre um determinado grupo social
(representado por um indivíduo ou um estereótipo de um grupo) e um determinado produto. Tal estratégia se vale,
em geral, da associação do produto com um indivíduo-modelo, uma pessoa cuja credibilidade e valor social sejam
amplamente conhecidos dentro do nicho-alvo. “O mecanismo dessa função de atribuição de status é patente na
propaganda-padrão com testemunhos em que „pessoas importantes‟ endossam um determinado produto”
(LAZARSFIELD; MERTON, 2000, p.115), em suma: essa associação concede ao produto a credibilidade, o valor

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social, o status quo do indivíduo-modelo, sua face. Face esta que, ao ser consumida, permitirá uma associação quase
direta entre o indivíduo-consumidor e o indivíduo-modelo. Clamam Adorno e Horkheimer que “a repetição cega e
rapidamente difundida de palavras designadas liga a publicidade à palavra de ordem totalitária” (1985, p. 155); em
nosso estudo isso se faz verdade quanto à imagem publicitária: a repetição massiva da imagem estereotipada, da
associação ao indivíduo-modelo, dá ao produto uma identidade a qual o consumidor anseia adquirir. Tal fenômeno é
amplamente conhecido e estudado no âmbito acadêmico da comunicação publicitária; são estas considerações de
Solange Bigal quanto à relação produto-face-consumidor:

O personagem ou os personagens mostrados de maneira estética na


publicidade são a própria materialidade do universo sígnico do publico-alvo
que, coloca o receptor diante de sua própia imagem sígnica, materializada no
desenho construído pela equivalência dos signos selecionados. A composição
estética publicitária faz com que esse receptor reconheça-se como consumidor
na imagem publicitária, ou que pelo menos, deseja ser o personagem que o
representa na publicidade. Quanto à identificação da marca, do serviço e do
produto, pode-se dizer que aí reside a eficiência da campanha publicitária, pois
ela retira a marca, o produto e o serviço de um rol de similares destacando-os
dos demais, ganhando um conceito que o distingue dos outros, concorrentes
ou não. Quanto à identificação do sujeito como um membro pertencente a um
grupo determinado, pode-se dizer que o sujeito reconhece uma imagem que é
a sua própria imagem como representação. (1999, p.58)

E, não o que vos escreve e sim o próprio sistema capitalista de produção, anuncia a partir dos conceitos de
Baudrillard (1995) e de Goffman (1967): A face do produto constitui e corrobora não só a face de um indivíduo
(identidade pessoal), mas também a face do grupo ao qual ele pertence (identidade social).

O endereçamento facial: a aproximação entre produto e consumidor


Ao que diz respeito à infinidade de produtos da indústria regida pelo capitalismo, visto os processos de forja de
face do consumidor e do produto, é possível afirmar que “para todos algo está previsto; para que ninguém escape, as
distinções são acentuadas e difundidas” (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p. 116). Já foi explicado anteriormente
como se dá o processo de distinção desses produtos e sua identificação com seus consumidores em potencial; e
também como a publicidade, aliada aos meios de comunicação em massa, é responsável por ele. Mas estes dois
últimos são ainda responsáveis pela efetiva distribuição desses bens de consumo a partir do que chamaremos de
endereçamento facial – endereçamento este que se dá simultaneamente à construção da face do produto, só que de
forma mais segmentada, direcionada e precisa.
O caráter global das comunidades de interesse é a chave para a eficácia desse endereçamento. É ele quem permite
a publicidade obter tamanho êxito em estabelecer contato com seu público-alvo: utilizando-se dos estímulos

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adequados para a sensibilização do público almejado, a mensagem publicitária é construída e veiculada em canais
seletos, que garantam que seus receptores possuam a mesma face que o produto. A construção dessa mensagem se dá
na própria construção da face daquele produto: ela é feita utilizando-se da linguagem, dos signos, dos valores e dos
indivíduos-modelo pertencentes à comunidade de consumo para a qual está sendo direcionada. A utilização desses
elementos familiares, e de significação única, a este segmento social desperta uma atenção diferenciada àquele
produto; transmite uma (falsa) sensação de individualização: é como se aquela mensagem e aquele produto fossem
idealizados apenas para aquele nicho específico de consumidores. Uma sensação que, apesar de falsa – porque, como
já dito previamente, tanto o sistema de produção quanto a comunicação contemporânea se baseiam na massificação,
e esta manifestação ideológica não aceita coexistir com nenhuma outra de natureza individualista –, é bastante
compreensível, pois estes consumidores foram, inconscientemente, moldados para aquele produto. Na verdade o que
houve foi apenas uma comutação: ao invés daquele produto ser feito para o consumidor, ele é que foi condicionado
para obter aquele produto. Uma inversão que, com base nas explanações anteriores em relação às faces, não influi na
identificação mútua entre consumidor e mercadoria.
As formas de veiculação dessa mensagem também são um elemento essencial para seu êxito. São selecionados os
canais, os meios, que já possuem uma relação com o público-alvo específico que se pretende atingir. Uma emissora
de televisão que possui sinal aberto, por exemplo, é uma forma um tanto quanto ineficaz de mobilizar um
determinado segmento social. Por abranger uma grande e indeterminada massa de receptores, a linguagem nela
utilizada precisa ser extremamente simples, pertencente à zona de convergência entre as diversas comunidades de
interesse que a consomem; o que é um empecilho no endereçamento dos seus anúncios, já que as faces dos seus
espectadores são as mais variadas possíveis. Uma forma de sanar este problema, ainda nas emissoras de sinal aberto,
é a divisão da grade de programação segundo a faixa etária de sua audiência: percebe-se claramente que o turno
matutino é um espaço divido entre o público infantil e o feminino, o vespertino é reservado ao público infanto-
juvenil e o noturno ao público adulto. Já nas emissoras de canal fechado, assim como em outros meios de
comunicação onde é possível uma maior segmentação, esse endereçamento da programação se dá de forma muito
mais efetiva. Essa fragmentação permite uma maior particularização e o estreitamento dos laços entre emissor e
receptor, potencializando assim a mensagem por eles transmitida devido a sua extrema pertinência àquele receptor. É
esta a lógica de canais de televisão altamente específicos, resumidos a tratar apenas de um determinado assunto e,
por conseqüência, voltados para um determinado nicho de consumidores, como o Discovery Channel, o National
Geografic Channel, o History Channel, o SportTV, a ESPN, a MTV, entre outros. Nestes canais, a divisão da grade
de programação é uma técnica secundária de direcionamento que funciona como uma espécie de filtro para elevar
mais ainda o nível de intimidade da relação emissor-receptor.

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É deste modo que funciona toda a lógica do aparentemente antagônico processo de segmentar – tanto o mercado
quanto os meios de comunicação – para maximizar o raio de alcance do capitalismo – tanto de seus produtos quanto
de sua mensagem consumista. Com a consolidação e a manutenção desses segmentos sociais desterritorializados e
padronizados, a veiculação de uma mensagem que tenha o mesmo nível de pertinência para os membros de uma
determinada comunidade de interesse em escala global torna-se muito mais fácil, rápida, efetiva e relativamente
barata – já que os meios são sempre os mesmos e os custos para reformular a mensagem nos diferentes pontos do
globo são praticamente insignificantes. A universalização hoje funciona de forma plena: ela utiliza uma publicidade
fortemente direcionada apelando diretamente ao consumidor desejado por meio de sua própria linguagem e
simbologia. A era em que a publicidade visava formar um determinado público consumidor já se foi; atualmente a
função por ela a ser desempenha é apenas intermediar a relação entre um público-alvo segmentado e um mercado tão
segmentado quanto.

Considerações Finais
O processo de consolidação da lógica do modo capitalista de produção não se findou. Não obstante as audaciosas
(e, não se pode negar, engenhosas) técnicas com as quais os oligopólios não mais produzem produtos para o mercado
e sim os mercados para seus produtos, o término deste processo está fadado a uma longa procrastinação. Os meios de
comunicação tornam-se cada vez mais precisos e interativos, aumentando exponencialmente sua influência sobre
seus usuários e o poder de persuasão da publicidade nela veiculada – seria muita ingenuidade pressupor que, em
algum momento, fosse possível haver uma desvinculação entre esses dois, visto que existe uma permanente relação
de sustentação financeira entre eles. O bombardeio das comunidades de interesse com suas maliciosamente
conformadas representações icônicas torna-se cada vez mais intenso, de forma que o universo referencial de
consumo – junto ao de conduta, é obvio – encaminhe-se à completa homogeneização. O globo ainda se encontra sob
o efeito deste processo de proporções titânicas.
O presente artigo não aspira estabelecer verdades e conceitos irrefutáveis, mas refletir em como as mudanças
ideológicas infligidas pelo modo capitalista não afetam apenas a relação do homem com a mercadoria e sim,
principalmente, a relação dele com seus semelhantes. A publicidade arquitetada com base nos ideais do vigente
sistema de produção é uma publicidade extremamente nociva: ela perscruta e perverte valores, sentimentos, desejos e
necessidades genuinamente humanas, transformado-as em títeres manipulados em função dos interesses do
capitalismo. É uma publicidade bastante eficaz, isso é indiscutível, mas também inumana, completamente desprovida
de responsabilidades sociais; para ela, e para o modo capitalista de produção em todas as suas instâncias, “o que
importa é subjugar o cliente que se imagina como distraído ou relutante” (ADORNO; HORKHEIMER, 1985, p.
153).

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