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Colaboradores O desastroso Mike

Escrito por Paulo Henrique


Hortência
Roseane Eu tinha 11 anos e pouco, dura idade como uma pedra
Arcelina vulcânica. De manhã ao atravessar os portões da escola,
André e, puro como eu ia com meu café com leite e com a cara
Gabriela lavada, era um choque deparar em carne e osso com o
homem que me fazia devanear por um abismal minuto
antes de dormir. Foi um minuto apenas, mas em
profundidade parecia ser um século de doçura.
Capitulo I Ferido, orgulhoso, com raiva, respondia com desafio:
pode mandar! Ele não mandava se não estaria me
Qualquer um que tivesse sido seu trabalho ele o
obedecendo. Mas eu o exasperava tanto que tornava a
abandonara, mudara de profissão e passara a ensinar na
ser doloroso pra mim ser o objeto doloroso daquele
rede pública, no primário: era tudo que até então
homem que de certo modo eu amava. Não amava como
sabíamos dele.
um homem que eu seria um dia, amava-o como uma
O professor era grande, magro e silencioso de criança que tentava desastradamente tentava proteger
ombros retraídos, usava paletó curto demais, óculos sem aquele adulto. Ele me irritava. De noite antes de dormir ele
aro e sim ele usava óculos daqueles quadrados, da época me irritava. Eu tinha 11 anos e pouco, dura idade como
de vovó, tinha um nariz grosso. E eu era atraído por ele, uma berinjela. De manhã ao atravessar os portões da
não por amor, mas pelo seu silêncio e pela paciência escola, puro como eu ia com meu café com leite e com a
controlada que ele tinha de nos ensinar, e que eu cara lavada, era um choque deparar em carne e osso
ofendido, adivinhei. Passei a comportar-me mal na sala, como o homem que me fazia devanear por um abismal
falava muito alto, cutucava com os colegas, interrompia a minuto antes de dormir. Foi um minuto apenas, mas em
aula com piadinhas, até que ele vermelho se levantava e profundidade parecia ser um século de doçura. De manhã
dizia: – como se eu não tivesse contado com a existência real
daquele que me desencadeara meus negros e obscuros
– Cale-se ou expulso o senhor da sala!
sonhos de amor – de manhã diante dele, com seu paletó
curto, em choque eu era jogado na vergonha, e na
assustadora esperança. A esperança era meu pecado e cuidado será tarde demais: menos, não era apenas isso.
meu medo maior. Minha mãe disse que tapete é feito de tantos fios que não
posso me resignar a escolher ou seguir um fio só; meu
Cada dia renovava-me com a mesquinha esperança
enredo vem de uma história que é feita de muitas histórias.
e a grande luta que eu fazia pela salvação daquele
E nem todas posso-lhes contar – uma palavra mais
homem. Eu queria/quero o seu bem, e em resposta ele me
verdadeira poderia ser ecoada de eco para eco, como se
odiava, brigava comigo. Contudo eu me tornara seu
pudesse desabar montanhas, ou tirar o gelo lá do alto
tormento e ao mesmo tempo um demônio, símbolo do
delas.
inferno que devia ser para ele ensinar aquela turma de
preguiçosos e desinteressados. Para mim tornara um
prazer já terrível ao ponto de não deixá-lo mais em paz. O
jogo como sempre, como sempre, me fascinava. Sem
saber que eu obedecia a velhas tradições, mas com uma
sabedoria com que os ruins já nascem – sabe aqueles
ruins que roem as unhas de espanto –, sem saber que
obedecia a uma das coisas que mais acontecem no
mundo, eu estava sendo a prostituta e ele o santo. Não,
talvez não seja isso. As palavras me antecedem e me
ultrapassam, elas tentam me modificar, e se não tomo
Assim, pois, não vos falarei no sorvedouro que havia disso tudo ele só percebia que eu lhe rasgava os bolsos.
em mim enquanto eu devaneava antes de adormecer. Se É verdade que nem mesmo eu sabia ao certo o que fazia,
não eu mesmo terminarei pensando que era apenas minha vida com o professor era invisível. Mas eu sentia
macia voragem o que me impelia para ele, esquecendo que meu
minha desesperada abnegação. Eu me tornei o seu
sedutor, dever esse que me impusera. Era de se lamentar
que tivesse caído em minhas mãos erradas a tarefa de
salvá-lo pela tentação, pois de todos os adultos e crianças
daquele tempo eu era provavelmente o menos indiciado.
“Ele não é flor que se cheire”, como dizia nossa
empregada. Mas era como se, sozinho com um alpinista
paralisado pelo terror do precipício, eu, por mais inábil que
fosse não poderia ajudá-lo a descer. Por mais arriscado
que fosse o meu lado, eu era obrigado a arrastá-lo para o
meu lado pois o dele era mortal. Era o que eu fazia, como papel era ruim e perigoso: impelia-me a voracidade por
uma criança importuna puxa um grandalhão pela aba do uma vida real que tardava e, pior que inábil, eu também
paletó curto. Ele não olhava para trás, não perguntava o tinha gosto em lhe rasgar os bolsos. Só Deus perdoaria o
que queria, e livrava-se de mim. Eu continuava a puxá-lo que eu era porque só Ele sabia do que me fizera e para o
pelo paletó, meu único instrumento era a insistência. E quê. Eu me deixava, pois, ser matéria dele, mas pela vida
crua e cheia de prazeres: eu era um adorador. Aceitava a Capitulo II
vastidão do que eu não conhecia eu confiava em mim.
Na tarde de domingo pegava-me pensando no dia
Seria para as escuridões da ignorância que eu seduzia o
seguinte, no que eu faria para chamar a atenção dele.
professor? E com o ardor de um Padre na cela. Padre
Mesmo eu não sendo um aluno aplicado, nenhum pouco
alegre e monstruoso, ai de mim. E nem disso eu poderia
interessado, mas fazia-lhe de tudo para que aqueles olhos
me vangloriar: na classe todos nós éramos igualmente
virassem para minha face. Segunda era dia de prova, e ao
monstruosos e suaves, ávida matéria de Deus, ou não?
entregar a minha, ele nem se quer me olhou, apenas
colocou friamente sobre minha carteira. Ele passeando de
carteira em carteira, parecendo um profeta, pergunta-me
se estou me sentindo bem, balanço somente a cabeça
com um sinal de positivo.

Algumas horas depois entrego minha prova, com uma


convicção de ser uma das melhores da turma, pois, eu,
fazia de tudo para chamar-lhe a atenção. Ao sair da sala
com minha cara lavada e alma demasiada. A figura do
professor para mim era de um ser que precisava ser salvo,
e eu super-herói que convertia o professor mal ao caminho
do bem. Mas ele era teimoso e rustico de nada adiantava acontecido. No outro dia fui para a aula às pressas,
o meu esforço. novamente com a cara lava e puro com meu café com
leite, afim de saber o que houvera acontecido com ele. Ao
chegar na sala deparo-me em carne e osso com ele, como
se nada tivesse acontecido. Ele permanecera sentado, e
sala pela primeira vez estava quieta e silenciosa, e eu me
roendo por dentro. O motivo ele não me contara, mas
sentia-me mais aliviado, pois ele estava ali na minha
frente.

Aprender eu não aprendia nada, o jogo de


atormenta-lo me consumira demais, humilhado por ser
nenhuma flor que se cheire, torturado por uma infância
grandiosa que eu temia nunca chegar ao fim.
Os dias se passaram e nada de serem entregues
as provas, confesso que já estava nervoso com tanta O professor era o meu rei da criação; havia a

demora; quando me surpreendi o professor havia faltado, esperançosa arma do pecado, eu me ocupava com medo

não me contive e fui até a direção para saber o motivo. em esperar; sem falar que eu estava permanentemente

Não me souberam responder, nem sabiam o que tinha ocupado em querer e não querer ser o que eu era.
Não, não era para irritar o professor que eu estudava, Capitulo III
só tinha tempo de crescer.
Muito tempo depois, tendo finalmente me organizado
em um corpo e sentindo-me mais garantido, pude-me
aventurar e estudar um pouco mais.
Foi uma pena o professor não ter visto tudo aquilo
que em quatro depois eu me tornara: aos quinze anos, de
mãos atadas, banho tomado, todo composto e arrumado,
ele provavelmente teria orgulho ao me ver como um cromo
de natal à varanda de um sobrado. Mas em vez dele,
passara um ex-amuiguinho meu, que gritava alto meu
nome, sem perceber que eu já não era mais um moleque
e sim um jovem digno, cujo nome jamais poderia ser
berrado pelas calçadas da cidade. “Que é?”, indaguei ao
intruso com a maior frieza. Recebi então como resposta
gritada a notícia de que o professor morrera naquela
madrugada. E gélido, de olhos abertos e compaixosos eu
Com a notícia da morte do meu estimado professor
olhava a rua vertiginosa a meus pés, minha compostura
vieram também as férias de fim de ano. Pude usar esse
quebrada como um espelho que acabara de cair ao chão.
tempo para refletir e amargurar minha perda. Passei muito
tempo lembrando dos momentos e das tentativas de
cativa-lo. Dos momentos de fúria que ele tinha ao chamar
minha atenção e até mesmo das raras vezes em que ele
esboçou o mínimo de simpatia para com a turma, que
muitas vezes eu bobo, achava que era para mim. Enfim ligava, sem falar a quantidades de professores, já estava
as férias desse ano foram diferentes, mas serviram para na segunda semana de aula e ainda não tivera visto todos.
organizar a minha mente e começar um ano letivo com a
Na manhã seguinte, fiz o mesmo percurso de
melhor inspiração de todas: a memória do meu querido
sempre, pegando a mesma condução que passara a duas
professor.
quadras da minha casa. Chegando a escola, sempre
x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x-x quinze ou dez minutos antes do portão principal abrir.
Aproveite esse tempinho para observar as pessoas que ali
Com o início do ano letivo, veio a escola nova, em
passavam, tudo pra mim, era novo.
um bairro mais distante de minha casa, pois a serie que
eu estava, com quinze anos, prestes a fazer dezesseis, Ao soar o sino, todos nós íamos para suas
iniciava mais um ciclo da minha vida, o ensino médio. respectivas salas. Sentava-me na cadeira da frente, do
lado da janela que dara para o pátio, próximo a mesa do
Era tudo novo, precisava pegar condução para
professor. Quase não conversava com ninguém, com o
chegar até a escola. Admito que achei horrível essa ideia,
tempo, talvez eu pudesse me entrosar.
mas me acostumei já na primeira semana.
A primeira aula seria de um professor que a sala
No ambiente escolar tudo também era novo e me
ainda não conhecera. Passara-se já quinze minutos, e ele
intimidava: a quantidade de alunos era bem maior que a
ainda não estava na sala, coisa rara de acontecer naquela
escola anterior; as normas eram mais rígidas e eu nem
escola.
Conversávamos bastante quando uma figura de Confesso que fiquei boquiaberto e um turbilhão de
imagem esbelta, estatura mediana, idade aparente de 25 coisas passou pela minha cabeça. De certo ele me
anos, com pele clara, com cabelos escuros encaracolados lembrava meu antigo professor, não pelo modo de se
entra na sala de forma rápida e chamativa. A turma fica vestir, nem pela sua espontaneidade, não sei o que era
em silencio e observa com dúvida a figura daquele jovem. que ele havia que me lembrara dele.
Seria nosso professor? Acredito que esse era o
- Bom dia professor... falou a turma em tom tímido
pensamento que também ecoava na cabeça dos outros
e recatado.
alunos.

- Sou Pedro, o professor de história.


– Bom dia galera! Exclamou o professor que
estava vestido um jeans desbotado, uma camiseta de
heróis infantil e um all star calçava os pés daquele homem.
Diferentemente da vestimenta dos outros professores com
mais idade.

A turma não respondeu, pois estava um tanto


perplexa com a primeira apresentação do professor.

– Bom dia galera! Não vão responder? Viram um


fantasma?
Capitulo IV Ouvi com um certo ar de desprezo, brincando com
o lápis na boca, como se quisesse deixar claro que suas
Com minha cabeça encostada na janela e o
histórias não me lubridiavam e que eu bem saberia o que
pensamento em outro lugar, automaticamente voltei a
ele era. Ele contara sem olhar uma vez sequer para mim,
quatro anos atrás. Foi talvez por tudo o que eu contei,
é que na falta de jeito para amá-lo e no gosto de persegui-
misturando e em conjunto, que escrevi a composição que
lo, eu também o acossava com o olhar: a tudo que ele
o professor mandara, ponto de desenlace dessa história e
dizia eu respondia com um olhar direto e reto, do qual
o começo de outras.
ninguém em sã consciência poderia me acusar.

– Vou contar uma história, disse ele, e vocês façam


De repente fui acordado dos meus pensamentos,
a composição, quem for terminando não precisa esperar
era o professor de história, com aqueles olhos castanhos
pelo sino, já pode ir para o recreio.
brilhantes, perguntando-me seu eu estará bem, apenas

O que ele contou: um homem paupérrimo que balancei a cabeça, dando sinal do sim, e com os braços

sonhara que descobriria um tesouro e ficara rico; cruzados, e com o rosto pra baixo, permaneci.

acordando, arrumou sua trouxa, saira em busca do


A sala de aula era silenciosa, bem diferente da
tesouro, andara o mundo todo, mas nada encontrou e
outra escola.
voltou para sua vida pobre; e como não tinha o que comer,
começara a plantar no seu quintal, tanto plantara, tanto Peguei-me pensando novamente na composição
colhera, tanto que começou a vender que terminou rico. que o professor passara para a turma. O que eu contei: a
mesma história que o professor porem com um enredo – Chegue mais perto...
diferente. Na pressa entreguei e sai correndo para o pátio.
Como é que um homem se vingava?
Eis que esqueço meu diário, volto imediatamente para
busca-lo, ao atravessar o portal da sala ele me fitava, o – ... pegue seu caderno... acrescentou ele.
professor era mesmo enorme e feio! Era a primeira vez
que estávamos frente a frente por nossa conta. A surpresa me fez subitamente olha-lo. Era só
isso, então!? Avancei um passo e estendi a mão.
Pela primeira vez eu estava só com ele, sem o
barulho da sala, sem a admiração que provocara. Tentei Mas o professor ficou imóvel e não entregou o
sorrir, sentindo que o sangue me sumia do rosto. Uma caderno.
gota de suor escorreu-me pela testa.
– Como é que lhe veio a ideia do tesouro que se
Foi quando ouvi meu nome. Ao som do meu nome disfarça?
eu me desipnotizara, e bem devagar vi o professor por
– Que tesouro - murmurei atormentado.
inteiro, ele era o homem da minha vida! O novo e o grande
medo. Pequeno, sonambulo, tremulo, sozinho, diante Ficamos nos olhando um para o outro em silencio.
daquilo que a minha fatal liberdade finalmente me levara.
– Ah, o tesouro!!!
Calmo, ele disse:
– O tesouro está escondido onde menos se – Você - repetiu lentamente - você é um menino
espera. É só descobrir! muito engraçado, sabe? Você é doidinho... disse ele
usando seu sorriso outra vez.
– Quem lhe disse isso?
Não, eu não era engraçado. Sem nem ao menos
– Ninguém, ora...respondi mancando. Eu mesmo
saber, eu era muito sério. Não, não era doidinho, a
inventei, disse trêmulo.
realidade era o meu destino, e era o que em mim doía nos

Então ele disse pela primeira vez usando o seu outros.

sorriso:
Depois de me olhar em silêncio por uns dois

– Sua composição do tesouro está tão bonita. minutos ele levantou-se e saiu.

Você... - ele acrescentou por um momento.


Senti como se o sangue voltasse a circular

– Você é um menino muito engraçado, disse ele. normalmente, e voltei a senti os dedos dos pés. Foi
quando o sinal tocou, era a hora de retornar para a sala.
Foi a primeira vergonha da minha vida. Abaixei os Após alguns minutos a sala já estava completa novamente
olhos, sem poder sustentar o olhar. com todos os alunos enfileirados.

Sim, minha impressão era a de que, apesar da sua O professor estava em sua mesa, parado com uma
raiva, ele de algum modo havia confiado em mim. das sobrancelhas mais arqueada que a outra, e mordia a
ponta do lápis, enquanto esperava que todos calassem a o que o professor havia pedido eu mal podia controlar
boca. minha ansiedade em saber o que ele faria...

Ele estava ali olhando para o fundo da sala sem


falar absolutamente nada, era nítido que seus
pensamentos voavam, muito, muito distante dali. De
alguma maneira aquilo me inquietava, me sufocava, eu
precisava saber no que ele estara pensando, o que o
levava para tão longe da realidade e como eu invejava
aquele pensamento, seja lá qual fosse eu queria ser parte
dele.

Exatos dez segundos do meu súbito ataque de


querer adivinhar seu pensamento, ele retornara à
realidade, toma um gole de café que estava sobre a mesa,
coça os olhos, respira fundo e depois de um sutil
pigarreado ele põe-se de pé e pede para que todos
peguem uma folha de papel em branco e caneta preta,
enquanto os alunos reviravam suas mochilas procurando
Acordei-me assustado, as lembranças do
professor era uma maneira que procurava para fugir da
sala de aula chata e barulhenta. Ele era a minha
lembrança mais bonita e dolorosa.

Amigos eu não tinha nenhum, o recreio era o pior


momento e foi assim no enorme parque do colégio novo,
que comecei a aprender a ser amado, suportando a dor e
o sacrifício de não merecer, apenas para suavizar a dor
de quem não ama, pois ele morrera.

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