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Estética da Subversão e da Violência nas Obras de Arte

de Francis Bacon e Frida Kahlo


Catarina Pinheiro*, Maria João Dias*, Alda Rosa**

Resumo: é duplo que comunica para um Outro. Não é


apenas um objecto transitivo, é um objecto
A partir das obras de Frida Kahlo e Francis Ba‑ transnarcísico. “O investigador que se pro‑
con, os autores discutem as dimensões da vio‑ põe como finalidade o estudo das estruturas
lência e do trauma presentes nas suas formas subjectivas não pode excluir da sua pesqui‑
criativas e no impacto criado no espectador. sa as suas próprias estruturas subjectivas”1.
Reflectem ainda sobre as suas ligações com a E a obra ressoa naquele que a vê.
clínica no impacto/fenómeno contratransfe‑ Também Hanna Segal2 refere que a obra nun‑
rencial e suas possibilidades transformacionais. ca é perfeitamente acabada. Quem olha dá a
Palavras­‑Chave: Criatividade; Violência; última demão, num diálogo inconsciente.
Trauma; Impacto Estético.
Partimos para este trabalho sabendo que esta‑
Aesthetic of the Subversion and mos nele nas reacções que estes dois pintores,
the Violence in Francis Bacon Frida e Bacon, nos provocam, procurando de‑
and Frida Kahlo’s Works of Art pois reflectir sobre as relações entre a dor, a
clínica e a criatividade.
Abstract: O que é que nos acontece quando estamos pe‑
Having Frida Kahlo and Francis Bacon´s rante um quadro de Francis Bacon ou de Frida
work as a starting point, the authors discuss Kahlo? Uma porosidade expõe­‑nos à invasão
the dimensions of violence and trauma pres‑ de sensações­‑gestos­‑afectos­‑imagens primiti‑
ent in their creative forms and on the impact vas. É o desamparo, a cólera, a perda de limi‑
produced on the spectator. They also reflect tes, a desintegração. É o retorno do ser à dor.
on its connections with the clinic on the im‑ Ao falar da sua reacção aos quadros de Bacon,
pact/countertransference phenomenon and D. Anzieu3 refere ter acreditado ouvir um grito
its transformational possibilities. de dor, de fome, de raiva. Magia da pintura que
sendo arte da vista, transporta uma sensação
Key­­‑ Words: Creativity; Violence; Ttrauma; sonora: ouvimos alguém gritar.
Aesthetic Impact. Ilustração do ataque às ligações, Bacon e Frida
falam da parte psicótica da mente. Aquilo que
é suposto conter – a roupa, a pele – rasga­‑se,
Ao apreciarmos uma dada obra de arte, par‑ fende­‑se, abre­‑se. O continente deixa escapar
tilhamos com o seu criador o estado de caos o conteúdo.
primitivo donde ela emergiu, e assim a obra Esta ligação entre dor e criatividade faz­‑nos
cresce e toma forma, construímos com o seu pensar igualmente na clínica, onde emergem
construtor. Se a obra é um duplo do artista,

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* Psicóloga Clínica: Serviço de Psiquiatria do Hospital Prof. Doutor Fernando Fonseca, EPE.
** Psiquiatra, Equipa de Tratamento de Torres Vedras, IDT.
Catarina Pinheiro, Maria João Dias, Alda Rosa

palavras, sons, acções, imagens de sofrimen‑ doloroso e âmago – do nosso ser. É o nosso
to. Clínica onde procuramos estabelecer estas contra­‑texto, e de vários autores que con‑
passagens das sensações mais primárias do ser sultámos, que procuramos colocar aqui.
à possibilidade de existir e de criar. Há assim uma analogia entre o trabalho psí‑
Neste sentido lembramos Simone Korff­‑Sausse4 quico do clínico e o funcionamento psíquico
que estabelece uma analogia entre o impacto do espectador. Trata­‑se de duas modalidades
que o discurso do paciente tem no clínico e o de conhecimento que conjugam arte e ciência.
impacto que a obra de arte tem no espectador. Há uma dimensão estética no trabalho clínico,
A autora diz­‑nos que mais do que tradutor, como procuraremos sublinhar.
o clínico é um leitor de poemas. A recepção Arte e ciência provêm da mesma fonte, aque‑
do poema – e de toda a obra de arte – impli‑ la das primeiras simbolizações emergentes da
ca processos psíquicos compreensíveis através experiência emocional primária a partir da
do modelo da contratransferência. Tal como a sensorialidade. Daqui o nosso fascínio por estes
contratransferência do clínico traz clarificações dois criadores que falam do humano, da nossa
quanto à vida psíquica do paciente, o contra­ clínica, da dor e suas formas de comunicação.
‑texto, homólogo da contratransferência, traz S. Heenen­‑Wolff5 propõe o termo de contra­
clarificações novas sobre a obra e o seu autor. ‑movimento contratransferencial, numa
Toda a obra de arte compreende uma transfe‑ reacção violenta, para pensar o conceito da
rência potencial ou virtual, pressupondo sem‑ contratransferência. Contra­‑movimento em
pre alguém a quem se dirige. O artista propõe a relação com um movimento em identificação
sua obra à simbolização. Não lhe chega tê­‑la re‑ projectiva do paciente, onde uma angústia de
alizado, importa ainda que ela seja recebida por morte é depositada no outro (clínico e espec‑
alguém que participa no processo de criação e tador, acrescentamos nós), testemunhando
que partilha a experiência emocional, tornada não apenas uma necessidade de a evacuar,
experiência estética. O espectador não é passi‑ mas também a espera de que o outro possa
vo, sendo a experiência estética um verdadeiro metabolizá­‑la, tornando­‑a digerível e supor‑
trabalho psíquico. As grandes obras contêm os tável. Dor na tela, como dor na palavra ou na
traços ou as inscrições do processo que as criou. acção, contra o estilhaçar, a pulverização, a
Por isso olhamos e voltamos a olhar, e jun‑ aniquilação.
to, sentimos e experimentamos os quadros A contratransferência, e principalmente aque‑
de Frida e de Bacon. Voltamos lá porque a la que é acompanhada de movimentos violen‑
sua obra fala connosco, colocando­‑nos em tos, está frequentemente em contacto com as
contacto com as partes mais primitivas da partes mais arcaicas do paciente. Da mesma
nossa existência, com o mais profundo – forma, alguma arte reenvia para estes elemen‑

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tos mais arcaicos do espectador. Só recebendo bundos, aos quais o terapeuta procura dar abri‑
estas imagens, sendo impregnado por elas, é go temporário. Turbulência e violência, mas
que, clínico e espectador poderão conhecê­‑las. também subversão, na mudança catastrófica
É impossível ver apenas um quadro de Frida que é operada nas obras de Frida e de Bacon.
ou de Bacon, são experiências que acontecem. A contratransferência, na clínica actual e na
Nicole Llopis­‑Salvan6 refere como na clínica forma de a perceber, encontra um novo para‑
actual, mais distante do neurótico e do verbal, digma psicanalítico, passando a uma aborda‑
se reduz a distância eu – outro, ficando um gem de zonas não representáveis, onde a sim‑
“corpo­‑a­‑corpo” psíquico, surgem as passagens bolização é posta à prova. Não se trata tanto
ao acto, a identificação projectiva, os movimen‑ de interpretar as representações inconscientes,
tos paradoxais. É esta a clínica que encontra‑ mas de as tornar possíveis, constituir o psíquico
mos nas nossas instituições: pacientes limite, ou lá, onde ele não está. Não é isto o que nos sur‑
momentos limite de uma cura, em contacto di‑ preende, inquieta e fascina em Bacon e Frida?
recto com o inconsciente do clínico. Dá­‑se uma
comunicação de inconsciente a inconsciente, O que impulsionou a composição de ideias,
como na arte. Em Bacon e Frida, encontramos informações e divagações que estão contidas
igualmente este corpo a corpo. Subversão na neste artigo são questões densas, dinâmicas
clínica e na arte que alteram a posição da escu‑ e conflituosas que fazem de nós o que somos.
ta e da recepção do poema/pintura/palavra. Pa‑ Seres que se ligam à vida com fervor: adoe‑
cientes e pinturas que arrombam, entram pelos cidos de tão intensos, amedrontados de tão
poros, fendem, instalam­‑se no nosso interior, necessitados, loucos de tão desejosos. Há uma
numa comunicação orgânica. união secreta entre beleza e terror.
Simone Korff­‑Sausse4 relembra Bion na ideia Na tentativa de nos mantermos vivazes, va‑
de que acedermos à comunicação não verbal mos gerando alternativas, criando artifícios e
implica deixarmos vir o desconhecido, o insó‑ desenvolvendo técnicas. Neste percurso, cujo
lito. Tal só é possível estando o clínico (ou es‑ único objectivo era mantermo­‑nos vivos, al‑
pectador) numa “capacidade negativa”, capaz guns têm uma capacidade criativa que trans‑
de incertezas, “sem memória, sem desejo e sem borda o criador, ultrapassando o objectivo
compreensão”, na tolerância ao desconhecido, inicial. São eles os artistas, que nos brindam
pronto a receber um pensamento emergente com as suas obras de arte, tornando o nosso
nesta zona de incerteza e turbulência. Na clíni‑ próprio percurso mais fácil e mais rico.
ca verifica­‑se a proposição bioniana de “pensa‑ Ao depararmo­‑nos com uma obra de arte so‑
mentos à procura de pensador”. Pensamentos mos por ela tocados, transportados para uma
errantes e selvagens, sem proprietário, vaga‑ experiência universal e, ao mesmo tempo,

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absolutamente íntima. Vemo­‑nos fielmente mais precoces. Ou seja, a apreciação de uma


reflectidos, ou distorcidos. obra de arte abre em nós um canal de comuni‑
Talvez estes breves instantes que experencia‑ cação directo com as nossas experiências pre‑
mos frente a uma obra de arte que tanto nos coces. Segundo o autor, nestas circunstâncias
fascina recriem momentos muito precoces, estabelece­‑se um modelo de mútuo envolvi‑
quando alguém, anonimamente, ordenava o mento entre o espectador e a obra, um tipo de
nosso mundo, adivinhando­‑nos. relação de objecto que raramente conseguire‑
Complementando estas ideias, podemos adop‑ mos reproduzir noutras circunstâncias.
tar o que nos sugere Christopher Bollas7 com A arte desperta em nós uma sensação de “fa‑
o seu conceito de objecto transformacional. miliaridade”, apesar de toda a estranheza que
Objecto que tem a sua matriz na tenra infância, o mundo pode gerar, a arte devolve­‑nos a cer‑
circunstância na qual a mãe, ou quem desem‑ teza de que “estamos em casa”.
penha este papel, concretamente altera a reali‑ A elaboração interna é também necessária face
dade e, efectivamente, transforma o ambiente, ao que Meltzer conceptualizou como sendo o
visando garantir a sobrevivência e possibilitar “conflito estético”, uma mãe bela por fora mas
o pleno desenvolvimento do seu bebé. Bollas inquietante por dentro já que desconhecida e
refere como no decorrer de toda a nossa vida, misteriosa, tendo o bebé de construí­‑la, criá­‑la.
estaremos à procura de novos objectos trans‑ “Experiência estética” do recém­‑nascido, assim
formacionais, que poderão estar dentro de nós, denominada por Meltzer, próximo das ideias de
fora de nós ou nos espaços intermediários. Bion. Não será esta experiência que as telas de
Seguramente, entre estes objectos transforma‑ Bacon e de Frida comunicam ao visitante?
cionais que farão parte da nossa vida muitos No que respeita as descobertas kleinianas, que
serão encontrados em manifestações artísti‑ pensam sobre o espaço da posição depressiva,
cas. Estarão à nossa volta sob a forma de mú‑ percebemos como os mesmos mecanismos ali‑
sica, pintura, poesia, escultura, arquitectura mentadores de um narcisismo maligno esta‑
e literatura, ou em qualquer outro fenómeno riam para a actividade criativa. Como nos diz
em que nos sentirmos tocados e entendidos M. Mancia8, trata­‑se de ”uma concepção bas‑
por quem nem sequer conhecemos. tante trágica da vida simbólica e da criati‑
Neste ponto, podemos também lembrar o que vidade que assenta no seguinte pressuposto:
Donald Meltzer7 nos diz quando desenvolve o sadismo originário, derivado da pulsão de
ideias referentes à estética e à apreensão do morte, deve ser a mola que incentiva o apa‑
belo. O impacto estético diz respeito a uma co‑ relho psíquico a trabalhar e a criar”.
municação pré­‑verbal, em que existe massivo Inspirado num trabalho de Natkin, P. Fuller9 diz
conteúdo afectivo, comum às nossas vivências num texto seu de 1974: “… a dinâmica da nos‑

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sa interacção com as telas assumiu a forma de e, ao transformar­‑nos, possibilita que sejamos


uma sedução numa experiência em que a dis‑ nós mesmos. Interrupções, diluições, tragédias
tinção entre o “exterior” e o “interior” da pin‑ intemporais onde Frida e Bacon nos colocam.
tura se tornava ambígua. O sentimento que “Como suportar o insuportável?”, pergunta
isto nos provocava era simultaneamente de D. Anzieu3 a propósito dos trabalhos de Bacon,
medo, horror e tragédia. É possível interpretar questão igualmente possível a partir de Fri‑
o facto dizendo que Natkin evoca um estadio da. Perante os quadros de ambos, o visitante
do nosso desenvolvimento em que era difícil precipita­‑se na dor.
distinguirmos entre o eu e o não eu; quando a A obra de arte está no cruzamento de dois ân‑
pele dos nossos corpos não conseguia dar uma gulos da condição humana: o amor e a mor‑
limitação concreta à percepção que tínhamos te. Contemplar um quadro deles é viver uma
do nosso próprio ser; um estadio em que não violência.
tínhamos a sensação de tempo (…).”. Tempo
antes da separação, tempo de indiferenciação,
tempo sem tempo. Subversão e Violência em Francis
Fuller pensa a pintura de Natkin, nas suas Bacon
“contradições entre a pele da pintura, como
membrana de limitação, definidora das Anzieu3 refere que, como Beckett, Bacon (e Fri‑
fronteiras do eu e do outro, e um espaço ilu‑ da, acrescentamos nós) dá figura ao inominá‑
sório e vaporoso que não nos permite a nós vel, ao absurdo, aos últimos sobressaltos. São
espectadores permanecer cá fora e nos atrai os corpos descarnados. Assistimos a uma luta
para o seu interior”9. Neste espaço sem limi‑ entre a força criativa e a fragilidade que é a
tes coabitava o tal sentimento de terror, pos‑ pintura, ou a vida, ou o homem…
sibilidade de diluição, de interrupção do que “Possivelmente nenhum artista do século
Winnicott chama de “continuar a ser”. XX exprimiu através da pintura a Tragédia
Talvez esta seja uma das principais caracterís‑ da existência mais realisticamente do que
ticas da obra de arte: recolocar­‑nos em relação Francis Bacon. (…) Em Bacon, a represen‑
ao tempo e ao espaço. A arte conduz­‑nos às tação do sentido da existência resulta inevi‑
nossas sensações originais, para que possamos tavelmente numa expressão violentamente
reconhecê­‑las e transformá­‑las; neste movimen‑ trágica. (…) E Bacon confronta­‑o através
to, ela recria­‑nos e garante que possamos pros‑ de uma interpretação tão concreta, pene‑
seguir em contacto com o que temos de mais trante e verdadeira da natureza humana,
autêntico. Podemos pensar que, num processo que acaba por transformar esse sentido
paradoxal, a apreciação artística transforma­‑nos, numa imanente e inquietante realidade.”10.

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Francis Bacon nasceu em Dublin em 1909, posição é separada em três telas distintas
sendo o segundo de cinco filhos. O pai, um ho‑ que são coordenadas de forma a configurar
mem autoritário, tornou­‑se treinador de ca‑ um tríptico. Este arranjo é de uma origina‑
valos após reforma do serviço militar. A mãe, lidade tão perturbante que Bacon voltará a
vinte anos mais nova, era sociável e culta. Em usá­‑lo com frequência. (…) O tom laranja
1914 muda­‑se para Londres. Sofre de asma espalhado sobre o espaço das três telas atin‑
crónica. As mudanças condicionaram a sua ge tão violentamente o observador como se
infância. Reconheceu a sua homossexualida‑ com o objectivo de lhe retirar todos os pode‑
de. Morre de ataque cardíaco em Madrid em res de percepção e eliminar a possibilidade
1992. de leitura das formas de acordo com con‑
“A teoria faz parte de um sistema racional, venções comuns de lógica racional”10.
e Bacon sabe, desde o princípio, que não se Lembramos aqui P. Luquet11 na sua observa‑
podem atingir estas conclusões utilizando o ção de que o artista e o pintor fazem um uso
pensamento racional, mas exclusivamente particular do símbolo: “Tendo condensado a
pela sua subversão. (…) É a capacidade maior energia pulsional possível, ele liga­
que Bacon tem de atingir o mais profundo e ‑a a elementos sensoriais perceptivos (eles
obscuro dos nossos sentimentos que torna os mesmos associados a prazeres) para for‑
seus quadros extraordinariamente verda‑ mar complexos sensório – simbólicos muito
deiros e consequentemente reais” 10. carregados de desejo e de descarga”. Trata­
‑se do elemento psíquico primário que serve
Contemplar um quadro seu é viver uma vio‑ a mentalização estética, e uma cor torna­‑se
lência, o que é confirmado pelo escândalo que fria, uma tonalidade agressiva. São os comple‑
se deu após a sua primeira exposição em Lon‑ xos emocionais sensório – simbólicos. “Tais
dres em 1945. organizações que utilizam a condensação,
“Francis Bacon firmou o início da sua car‑ o deslocamento, o simbolismo, são a acti‑
reira artística com a obra Três Estudos para vidade do pré­‑consciente metaprimário; ao
Figuras na base de crucifixação, em 1944 mesmo tempo que elas servem para a orga‑
(…). Esta obra manifesta uma terrível e ex‑ nização do ego”11.
pressiva violência. Não representa nenhum Bacon não se interessa em imitar a aparente
acto violento, mas uma indefinida e desu‑ realidade, sendo a pintura um acto indepen‑
mana violência que ocorreu num espaço dente, resultante das necessidades mais ín‑
invisível e num tempo fora dos limites do timas e instintivas do indivíduo, dominadas
quadro; imprimiu o seu horror nas formas pela profundidade, força bruta da expressão.
e nas cores da área que o rodeiam. A com‑ “O que a composição contraditória e dis‑

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torcida da massa cinzenta dos corpos com tivo requer, sem distinção ou hierarquias entre
outras cores transmite em três estudos é a elas. Questão clara em “O Nu Acocorado” onde
lacerante expressão de um grito, indepen‑ “o acto pictórico é manifestado num con‑
dente da sua essência e causa. É um gri‑ texto de tons humildes. O efeito geral é mo‑
to reduzido à sua força bruta, aquém da nocromático, a fim de que qualquer peque‑
necessidade humana normal de identificar na diferenciação de cor seja ressaltada em
e resolver as causas do mal­‑estar. Mais ani‑ relação à constante escuridão do cinzento,
mal do que humano, excessivo a ponto de do azul­‑escuro e do preto que absorvem o
se tornar desconhecido das suas próprias matiz. O acto de pintar é uma batalha que
implicações expressivas: sem capacidade de revela os traços como cicatrizes, que são pos‑
comunicar seja o que for de compreensí‑ teriormente dissipadas na imagem”10.
vel”10. Mais à frente, do mesmo autor, lemos: Já o tríptico funciona como uma catarse, tragé‑
“A boca do monstro a rosnar, que é prota‑ dia que representa o drama sofrido. “Mas este
gonista em Pintura 1946, causa uma im‑ equilíbrio está sujeito à ameaça inerente na
pressão indefinida, entre um sorriso único qualidade das cores e das harmonias, no hor‑
e o efeito asmático de um impostor emer‑ ror, que é ainda mais perturbador quando se
gindo de uma pletórica e obscura pressão. afirma através de formas da mais alta qua‑
(…) Bacon começou com a intenção de lidade estética. É como se a beleza, que o tra‑
pintar uma paisagem. À medida que ia pin‑ balho consegue recriar de forma absurda nas
tando, inseriu um chimpanzé num terreno suas várias consequências, estivesse rodeada
coberto de erva que quase o submerge. Em pelas ameaças de forças obscuras, o caos ro‑
seguida desdobrou­‑se numa ave de rapina, deando o Tríptico que foi momentaneamente
mas sucederam­‑se mudanças até tudo estar dominado pela arte e parecia estar no ponto
misturado na imagem final, onde o campo de reconquistar a sua superioridade”10.
acaba por desaparecer, e só restam alguns Sobre o retrato Bacon disse: “Ao pintar no
traços do chimpanzé e do pássaro, ain‑ retrato, o problema é encontrar uma téc‑
da que tenham sido incorporados noutras nica na qual se possam transmitir todas
ideias ou impressões indecifráveis”10. as pulsações de uma pessoa… O modelo é
A pintura significa tudo para Bacon, e os seus alguém de carne e osso e o que tem de se
elementos são inteiramente resolvidos na ex‑ apanhar é a sua emanação”10. Estudo para
pressão cromática. Não é possível distinguir Auto­‑Retrato revela como a pintura tem para
entre linha, cor e planos no espaço. Pintar é, Bacon uma função de ligação entre o mun‑
portanto, uma acção instantânea na qual ele do real da existência e o mundo subjectivo.
usa todas as ferramentas que o processo inven‑ Se os seus trabalhos exprimem o desconforto

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existencial do indivíduo, permitem a trans‑ que vestia a realidade. Se tal desintegração


formação do mundo subjectivo em realidade, for muito severa, a ordem que dá coesão à
reconhecimento do próprio enquanto sujeito. realidade desintegra­‑se também; o mundo
A pintura torna­‑se pele psíquica, estrutura toma a forma daquele estado mitológico e
delimitante do self, elemento primordial da sonhado, que supostamente existia antes da
coesão das partes do self. criação. O espaço começa a ficar vazio; com
a progressão da doença torna­‑se ilimitado,
Considerando o alcoolismo de Bacon, M. infinito, chato, sem profundidade. Os ob‑
Monjauze3 fala de uma pintura alcoóli‑ jectos, incluindo as outras pessoas, perdem
ca que se desdobra no não­‑figurativo, no a significação e a plasticidade”. Enquanto
não­‑significante, no não­‑histórico de mo‑ um doente expressa sentimentos solipsistas,
dernidade. Existiria assim uma diferença o artista provoca reacções significativas na
essencial entre a arte não alcoólica e a audiên­cia.
arte alcoólica, sendo dado que em Bacon A pulsão alcoólica, não podendo localizar­‑se,
a pintura é projecção do código arcaico do nem representar­‑se, fica cega e difusa, não
seu psiquismo. tem outro ritmo vital, senão as variações de
Os criadores alcoólicos, ou psicóticos, intensidade. São estas variações que evitam a
lançam­‑se na esperança louca de uma cria‑ extinção. A alcoolização, com a sua sucessão
ção de si próprios, enquanto sujeitos, pro‑ de estados, tem por finalidade manter o Eu na
curando dominar o seu caos pelo acto cria‑ instabilidade salvadora, conduzindo­‑o para o
dor. A criação tem uma função vital para o seu desaparecimento, da forma menos angus‑
psiquismo: de representação do Eu. Para o tiante possível.
criador, o público torna­‑se indiferente. Ba‑ M. Monjauze3 diz como o paradoxo alcoólico
con escolheu espontaneamente um grande opera do Eu para si próprio. A injunção não é
formato para as suas telas, dissuadindo à proferida do exterior, como na psicose. O ob‑
partida um possível comprador, “Eu pin‑ jecto não existe, ele não é dado pela mãe e en‑
to para mim”, disse, “não há ninguém a contrado/criado pela criança, como no espaço
quem interessar senão a mim”. transicional. O paradoxo alcoólico é intrínse‑
P. Fuller9 cita Billig e Burton­‑Bradley, que co, constitui a própria essência do alcoólico,
apontam as radicais diferenças entre a cria‑ procurar­‑se e não se alcançar senão fugindo,
tividade e a doença mental: “quando a per‑ manter­‑se na condição de perpetuar a queda.
sonalidade se desintegra, os limites que se‑ Segundo a mesma autora, o que caracteriza
param o indivíduo do seu meio rompem­‑se. Bacon é a omnipotência do paradoxo. Vê­‑se
Este fica privado da energia emocional com isso na profundidade da sua obra: a tela rec‑

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tangular, plana, imóvel; o corpo (troncado, balhos de Bacon. No primeiro estádio a maté‑
desmembrado, sem pele), apresenta­‑se num ria psíquica é vivida como líquida ou gasosa,
contexto de linhas e cores em que a intenção faltando­‑lhe a consistência e a contenção que
não é de circunscrever; o vidro não é palpável; apazigúe as angústias de esvaziamento e/ou
o redondo não fechar indica o que escapa, o explosão, dada a ausência da função con‑
círculo serve de ponto de fuga, em sentido li‑ tentora do eu­‑pele. Num segundo momento
teral; é o aplanamento que é fundo, é o plano estabelece­‑se um contacto consistente com um
que abre uma profundidade ilimitada. Uma objecto de apoio, objecto contentor, surgindo
pintura cega, táctil, explora uma superfície uma tolerância aos orifícios abertos no enve‑
móvel e falsa, que dá existência inquietante lope psíquico dado os primeiros pensamentos
ao vazio. ligados à ausência e à falta – fase de identifi‑
Nesta vertigem aparece o informe em gesta‑ cação adesiva em que mãe e bebé partilham
ção, fabricando a carne arrancada aos líqui‑ uma pele comum, interface partilhada que su‑
dos amnióticos por uma energia monstruosa. gere a separação em construção, estabelece­‑se
Nesta criação embrionária, a carne tende a a distinção dentro fora, através da membrana
cobrir­‑se de uma película, mas fica despro‑ que permite a separação e contacto do Eu com
vida de estrutura óssea interna. Nos anos o mundo. Num terceiro momento acontece a
sessenta/setenta, Bacon vai repetir um outro tridimensionalidade.
paradoxo da relação figura­‑fundo, a cabeça As pinturas de Bacon parecem traduzir o que
sem crâneo. Anzieu refere como a primeira forma do Eu­
Enquanto que a cabeça morta, estrutura pura, ‑pele ­‑ o envelope uterino, fornecido pelo útero
é um símbolo a meditar, as cabeças sem osso enquanto saco contentor, como um continente
de Bacon funcionam como a abjecção pura, anatamo­‑psíquico dos fragmentos emergentes
confundem sexo e cabeça, cabeças sem corpos, de consciência no feto, organizam­‑se as sensa‑
corpos sexuados sem cabeça, cabeças em forma ções de contenção física, de nutrição, de calor,
de sexo. Os esfíncteres são abertos e fechados ao num bem­‑estar geral e difuso que constitui o
acaso, paradoxo de um corpo sem órgão e a ór‑ lastro. Numa segunda fase a diferença entre
gãos indeterminados, polivalentes, temporários. o self corporal e psíquico é assegurada pelo
Antinomia de um corpo sem esqueleto, susten‑ envelope habitat, aqui coexistem vivências
tado pelas suas contracções localizadas. de integração, na experiência de residência
Na génese do Eu­‑pele, Anzieu12 refere­‑se à da mente no corpo, com momentos de não­
descrição que Houzel faz do espaço psíquico, ‑integração, de despersonalização. O envelope
processos de desenvolvimento que lembramos narcísico distingue o eu do não­‑eu. O enve‑
aqui por nos parecerem representados nos tra‑ lope individualizante imaginário permite a

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aquisição de um sentimento de individualida‑ imagens e afectos) serve para conter, transfor‑


de, por apoio da imagem espelhada pela mãe mar, elaborar e representar.
e pelo meio. Bacon constitui uma arquitectura interior da
Anzieu3, a propósito de Bacon, lembra que angústia primária, dá­‑se um triunfo da repre‑
“estética”, etimologicamente, diz respeito sentação sobre a destruição: beleza. É o envelo‑
à sensação, à experiência de ser sensível em pe psíquico que se encontra atingido nos seus
simultâneo com o sentido artístico: deslum‑ quadros. Está perturbada a função de vertica‑
bramento face à novidade, à beleza do mundo, bilidade, de suporte. Funções de manutenção
mas também o horror perante a existência, a e de contenção do Eu­‑pele que, perturbadas,
diversidade, o arbitrário, a força de penetração resultam em perdas de consensualidade (sem
das imagens dos objectos. olho, nariz), que permitem ver a profundida‑
A sensação encarna­‑se e descarna­‑se: é este de. Espaços interno e externo desarticulados.
o processo que Bacon pinta. A sensação é A violência não vem de golpes do exterior, mas
provada e experimentada. Pinta o alívio de da falta de cuidado materno interiorizado, que
sair da prisão tenebrosa e estreita do útero obriga a carne a contorções acrobáticas.
materno; a angústia da perda de limites, de A sensação sem sentido, sem lugar, sem con‑
ser devorado pelo ar, o espaço, de ser comido senso, é pulsão pura. Do corpo à tela, sem
pelos objectos. intermediário. O que ele lança na tela é o es‑
Entre outras, o Eu­‑pele assegura a função pasmo, é provavelmente por isso que aparece
de manutenção do psiquismo fornecendo a na sua pintura o par em cópula, como violên‑
solidez e unidade necessárias ao seu funcio‑ cia extrema do espasmo. A homossexualidade
namento, apoiando­‑se para tal no holding é da mesma ordem, utilizada para aumentar,
materno: identificação primária ao objecto de redobrar a contracção. A sexualidade, a cópu‑
suporte que permite a aquisição de um eixo la, não é relação, mas espasmo. O espasmo é o
vertical fálico, permitindo representações de tempo zero da cena primitiva.
frente e verso, reforço das superfícies dorsal A cena origina­‑se na mais pequena unidade
e ventral para a criação de um espaço inter‑ de descarga da excitação, repetida sem fim
médio de depósito. Quando esta função falha para evitar a extinção da vida. A cena primi‑
surge a inconsistência do eixo vertical, confi‑ tiva, na sua origem, é anterior ao par. Bacon
gurando uma superfície liquefeita que poderá projecta a vida violenta do corporal, sem in‑
estar nas origens de angústias de esvaziamen‑ termediário nem articulação, a um código
to, que correspondem às vivências do alcoóli‑ metafórico.
co. A função de Eu­‑pele continente (superfície O alcoolismo coloca em questão os conceitos
estável servindo de receptáculo de sensações, analíticos, o seu limite, a sua organização.

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Aspectos Psicológicos do Doente Oncológico

A  pintura de Bacon desqualifica as noções a sua vida para sempre, levando­‑a a constan‑
de prazer, de oralidade, de libido, de relação tes cirurgias e impossibilitando­‑a de ter filhos.
de objecto. Não se trata de pôr em causa, mas “Por que estudas tanto? Que segredo estás à
de um não­‑lugar radical. procura? A vida logo o revelará. Por mim, já
sei tudo, sem ler, nem escrever. Algum tempo
D. Anzieu3 compara Beckett, Bacon e Bion: os três atrás, talvez uns dias, eu era uma rapariga
colocam o irrepresentável na obra. Experimen‑ que caminhava por um mundo de cores cla‑
tando as fronteiras da ruptura psíquica, sobrevi‑ ras e tangíveis. Tudo era misterioso e havia
veram pela criação: na pintura, no romance e no algo oculto; adivinhar­‑lhe a natureza era um
intelectual. Três pessoas que não colocaram so‑ jogo para mim. Se tu soubesses como é ter‑
mente a sua dor numa criação, mas que criaram rível obter o conhecimento de repente, como
uma obra à imagem e com a melhor semelhança um relâmpago iluminando a Terra! Agora
possível da sua dor irremediável. vivo num planeta sofrido, transparente como
Nos auto­‑retratos de Bacon, o pintor vê­‑se sem gelo. É como se houvesse aprendido tudo de
olhos ou sem dorso. Beckett ouve vozes inter‑ uma vez, numa questão de segundos. As mi‑
mináveis, de que não está certo nem da ori‑ nhas amigas e colegas tornaram­‑se mulheres
gem nem do destino, estão elas em si, ou fora? lentamente. Eu envelheci em instantes e ago‑
Quem fala a quem e porquê? Debate de Bacon ra tudo está embotado e plano. Sei que não
com as sensações visuais: daí a sua vocação de há nada escondido; se houvesse, eu veria.”7
pintar. Debate de Beckett com as palavras en‑ “A natureza, talvez num intuito benevolen‑
tendidas: daí a sua vocação de escritor. Horror te, instilara no seu sangue um castigo de
do contacto nos dois. carácter nada científico: uma imaginação
O novo empirismo descreve o homem sem vivíssima que se mostrava nos seus sonhos
espécie, sem pessoa. Beckett dá­‑lhe a palavra. e também no estado de vigília. Essa divisão
Bacon fá­‑lo ver. Bion fá­‑lo compreender. entre imaginação e intelecto predispunha­‑o
a tornar­‑se um artista ou um neurótico; ele
estava entre aqueles cujo reino não é deste
Subversão e Violência em Frida mundo” (Sigmund Freud, citado7).
Kahlo
A Questão do Trauma
Destacamos um trecho de uma carta que Frida “…Yo soy la desintegración…” (Frida Kahlo
Kahlo escreveu, aos 18 anos, ao seu namora‑ num dos desenhos do seu diário em 1942).
do, um ano após o grave acidente que marcou A observação da obra pictórica da pintora con‑
temporânea Frida Kahlo (1910 (1907?) ­‑1954)7

Revista do Serviço de Psiquiatria do Hospital Prof. Doutor Fernando Fonseca, EPE • 29


Catarina Pinheiro, Maria João Dias, Alda Rosa

e, particularmente, a leitura do seu “diário” e os significativa, como se através dos seus desenhos
dados biográficos de que dispomos conduzem­ e quadros realizasse um auto­‑retrato íntimo da
‑nos a pensar mais detidamente na questão do sua vida, onde a dor e o corpo são as suas duas
“trauma” em psicanálise, particularmente, so‑ fontes de arte. Frida Kahlo foi, na verdade, uma
bre o “trauma acumulativo”7. mulher que despertou amor e ódio, admiração
Esta pintora devido às suas situações de vida e inveja de homens e mulheres. Paixão em al‑
e à forma como expressava as suas vivências guns dos mais importantes personagens do seu
e fantasias, através de desenhos e pinturas, tempo como Diogo de Rivera, Leon Trotsky e
permite­‑nos abordar dois modelos de situa‑ André Breton. A pessoa Frida Kahlo é, também,
ções traumáticas: “o trauma” tal como defi‑ um exemplo de reacção ao trauma através da
nido por Freud, localizável no tempo e com os criação artística: inicialmente numa relação
seus aspectos metapsicológicos, e o “trauma falhada com a figura materna e logo a seguir
acumulativo”, resultante de microtraumas‑ pelo sofrimento com a poliomielite, aos seis
tismos decorrentes – sobretudo – da falha da anos. Em 1925 sofre um acidente de viação, no
mãe como “escudo protector”7. qual parte a bacia e traumatiza a coluna ver‑
Masud Khan desenvolve a concepção de que a tebral, além de sofrer vários outros ferimentos,
mãe exerce uma função de escudo protector inclusive nos órgãos genitais.
do seu bebé, observação que, de certa forma, Durante a prolongada convalescença começa a
já havia sido feita por Freud7. pintar. O acidente determinou que Frida reali‑
As distorções do ego que se originam do trau‑ zasse dezenas de cirurgias ao longo da sua vida.
ma acumulativo, isto é, resultantes do fracasso Esses ferimentos criaram dificuldades para que
da mãe na sua função de escudo protector, e as a pintora conseguisse engravidar. Sofreu vários
consequentes invasões na emergente integração abortos que foram de certa forma representados
do ego da criança, tornam­‑se perceptíveis, ao que em desenhos e quadros, como aparece na lito‑
Freud chamou de “inconsistências, excentricida‑ grafia “Frida y el aborto o El aborto”.
des e loucuras dos homens”, um tipo de distúrbio A vida amorosa de Frida com Diogo Rivera,
de carácter e personalidade que, com frequência, conhecido pintor e seu marido, também se
são compatíveis com uma “vida normal”, ou ao caracterizou por situações de ruptura e so‑
que Winnicott13 determinou falso self. frimento. Vivendo e criando intensamente,
Frida Kahlo é hoje uma das mais significativas principalmente nos momentos de maior dor,
pintoras da América e os seus quadros figuram Frida Kahlo conseguiu ser e deixar a sua vida
nos mais importantes museus. A sua produção marcada na história das artes e dos homens.
artística representa, na maioria das vezes, as Magdalena Cármen Frida Kahlo y Calderón, nas‑
suas vivências pessoais de uma forma explícita e ceu no dia 6 de Julho, em Coyoacán, próximo da

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Aspectos Psicológicos do Doente Oncológico

Cidade do México. Posteriormente mudou a sua rem que tenha havido uma falha na função
data de nascimento apenas para 1910, a fim de da mãe da artista como “escudo protector”, no
prestar uma homenagem à Revolução Mexicana. sentido freudiano desse conceito, ocasionando
“Os seus pais foram Matilde Calderón Y o que Masud Khan considerou como “trauma
González, católica e mestiça, e Guilhermo acumulativo”. Várias outras produções pictóri‑
Kahlo, fotógrafo, judeu, descendente de ale‑ cas também são sugestivas para corroborar esta
mães austro­‑húngaros. Foi a terceira filha hipótese: entre elas podemos referir Mi naci‑
do casal, depois de Matilde Júnior e Adriana. miento o Nacimiento, em que a cabeça da mãe
A sua mãe engravidou novamente quando está coberta por um pano, alusão à morte da
Frida tinha dois meses e então nasceu Cristi‑ mãe que coincide com a pintura do quadro, e a
na. Frida foi entregue aos cuidados de uma cabeça do feto expressa dor e sofrimento.
ama­‑de­‑leite­‑índia, ‘que cheirava a pão de Outro aspecto importante que reforça a hipóte‑
milho e sabão, não falava muito mas can‑ se da falha da mãe como “escudo protector” é a
tava canções da sua terra, do Yucatan…”7. excessiva ligação de Frida com a figura paterna.
Numa entrevista com a crítica de arte Raquel Numa foto de 1926, vemos Frida junto da sua
Tibol, a artista contou factos da sua infância mãe e irmãs, vestida como um homem, revelan‑
relacionados com a sua mãe: “ A minha mãe do – talvez – uma dificuldade com a identifica‑
não me pôde amamentar porque quando ção materna e um forte complexo masculino. So‑
eu tinha onze meses nasceu a minha irmã bre o pai ela escreve num quadro pintado em sua
Cristina. Aleitou­‑me uma ama a quem la‑ homenagem (1951): “Pintei o meu pai Wilhelm
vavam os seios cada vez que eu ia sugá­ Kahlo, de origem húngaro – alemã, artista fo‑
‑los. Num dos quadros estou eu, com cara tógrafo de profissão, de carácter generoso, in‑
de mulher e corpo de bebé, nos braços da teligente e fino, valente porque sofreu durante
minha ama, enquanto dos seus seios o leite sessenta anos de epilepsia, porém jamais dei‑
cai como do céu”7. A pintora refere­‑se ao qua‑ xou de trabalhar e lutou, com fervor, contra
dro Mi nana y yo o Yo mamando. Parece, Hitler…Sua filha Frida Kahlo”7.
pela obra, reflectir uma relação fria, distante, O pai de Frida foi um fotógrafo retratista e po‑
sem contacto visual, com a ama, que apresen‑ demos ver que ela seguiu o mesmo caminho,
ta uma máscara negra de pedra. Frida Kahlo não com a máquina fotográfica, mas com os
considerava este quadro como um dos seus seus lápis e pincéis, retratando tanto a si pró‑
trabalhos mais fortes. pria (os seus trabalhos mais significativos são
As informações contidas nesse relato assim auto­‑retratos) como aos outros.
como a pintura da relação de amamentação, Até agora as nossas observações disseram res‑
na obra Mi nana y Yo o Yo mamando, suge‑ peito ao “trauma acumulativo”, resultante da

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falha na função materna. As transformações O grave acidente obrigou­‑a a permanecer na


de Frida não terminaram por aí, sofrendo vá‑ cama, imobilizada por mais de três meses, ten‑
rias situações traumáticas, como as expostas do começado a desenhar para vencer o tédio.
anteriormente, ao longo da sua vida. A cama foi coberta por um dossel onde foi
Em 1914, aos 6 anos, Frida é acometida pela fixado um espelho que permitia a Frida ver­
poliomielite, sofrendo pela doença e pelo in‑ ‑se e, ao mesmo tempo, tornar­‑se o seu pró‑
tensivo tratamento de reabilitação que tem de prio modelo. Assim ela começou a longa série
realizar. Não é menor o sofrimento quando as de auto­‑retratos, que constituem a maior e
outras crianças lhe chamam “Frida pata de mais significativa parte da sua obra. Sobre
palo” ou “Frida la coja”. este género de pintura ela disse: “… retrato­
A poliomielite deixou­‑a com uma perna mais ‑me porque passo muito tempo só e porque
curta o que, ocasionalmente, lhe causava sou o motivo que melhor conheço, e ainda,
dores e ulcerações o que, pouco antes da sua …como era jovem, a desgraça não atin‑
morte, levou à sua amputação. São muitos os giu um carácter trágico nesta ocasião…
desenhos e quadros onde esta situação é re‑ acreditei ter energia suficiente para fazer
tratada como, por exemplo, Mis Abuelos, mis qualquer coisa em vez de estudar para mé‑
padres y yo. dica. Sem prestar muita atenção comecei a
A 17 de Setembro de 1925, o autocarro onde Frida pintar”7.
viajava com o seu namorado Alejandro Gómez Na verdade o acidente marcou, profundamen‑
Árias, colidiu com um comboio, o que provocou te, a vida de Frida Kahlo. A partir de então
um grave acidente no qual morreram vários pas‑ ela padece de uma série de sofrimentos que a
sageiros. Frida sofreu muitos ferimentos e fractu‑ marcaram até ao fim da sua vida: longos perí‑
ras que exigiram um longo tempo de recupera‑ odos de imobilidade, numerosas cirurgias, úl‑
ção e resultaram em sequelas e sofrimentos, que ceras, amputação de uma perna, enfim, uma
a acompanharam ao longo da sua vida. série infindável e sofrida de sequelas.
O relatório médico revelava o seguinte: “Frac‑ O acidente, entretanto, com os seus iniludíveis
tura da terceira e quarta vértebra lomba‑ sofrimentos marcou o início da actividade pic‑
res, três fracturas da bacia, onze fracturas tórica da, agora, artista.
no pé direito, luxação do cotovelo esquerdo, Embora querendo muito ter filhos, como es‑
ferimento profundo do abdómen, produzi‑ creveu, Frida Kahlo nunca conseguiu levar as
do por uma barra de ferro que entrou pelo gestações até ao fim. A impossibilidade de ser
quadril esquerdo e saiu pelo sexo rasgando mãe, também está “retradada” em inúmeros
o lábio esquerdo. Peritonite aguda. Cistite trabalhos, inclusive um ao qual dá o signi‑
precisando de sonda por muitos dias…” 7. ficativo título de Frida y el aborto (1932),

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Aspectos Psicológicos do Doente Oncológico

onde os seus sentimentos estão claramente apaixonado, obcecado, sofrido e submisso.


representados. Em alguns dos auto­‑retratos, Embora alguns possam argumentar que Fri‑
inclusive, ela faz­‑se acompanhar de pequenos da teve muitos envolvimentos amorosos com
animais, especialmente macacos, que poderão outros homens, o seu vínculo com Diego Ri‑
representar no seu imaginário os abortos e os vera foi único.
filhos que não chegou a ter. Noutro quadro de Através da sua arte o sofrimento tornou­‑se
1932, realizado enquanto permanecia no Hen‑ “mais suportável” e ela passa a pintar a sua
ry Ford Hospital, a artista reproduz cruamente própria história clínica. Colocar a tela num
estas questões e expressa pictoricamente os limite determinado, organizada pela forma,
tratamentos que lhe eram efectuados neste pelo cheio e vazio, pelo claro e escuro, pelos
hospital. Ela realisticamente escreve: “Eu era volumes e pelas cores, pelas experiências trau‑
considerada surrealista, isto não é correcto. máticas, com as suas fantasias e ansiedades,
Eu nunca pintei sonhos. O que representei pode, efectivamente (dando um arranjo sim‑
era a minha realidade”7. bólico a esses registos pertencentes a estados
No que diz respeito à sua relação com Dio‑ primitivos da mente), propiciar um efeito re‑
go Rivera, ela conheceu­‑o ainda adolescente parador e curativo.
e manteve este amor até à sua morte. Dor e Evidentemente, esta é uma ideia bastante
paixão caracterizaram este relacionamen‑ corrente na psicanálise, mas Frida Kahlo
to que, tal como as outras experiências da oferece­‑nos, ao conhecermos a sua vida e
sua vida, está revelado nos seus desenhos e obra, um exemplo vivido da quotidiana ex‑
pinturas e nos textos do seu “diário íntimo”. periência humana: ao lado da criatividade
Diego foi, talvez, o maior pintor mexicano de primária, como Winnicott13 postula, en‑
sempre, e conviver intimamente com ele, re‑ contramos no dia a dia de cada um de nós
presentou certamente um elemento positivo uma pulsão, ou necessidade, que nos leva
para Frida. Por outro lado, ele ligava­‑se a ela a criar; pequenos gestos, ideias, sentimen‑
de uma maneira infantil e exigente, de tal tos e, mesmo, objectos artísticos que nos
forma, que ela o retrata muitas vezes como ajudam a suportar a luta para preservar e
um bebé, um menino ou como um filho que optimizar a vida, na incessante resistência,
embala. É importante realçar que, inclusive, como diria Freud quando se refere à duali‑
Diego tem um envolvimento com uma irmã dade instintiva, ao regresso ao inorgânico e
de Frida, o que precipita uma separação do às constantes feridas narcísicas que o existir
casal. Frida está, entretanto, sempre disposta determina…
a perdoá­‑lo e recebê­‑lo quando ele o desejar. Christopher Bollas, no seu livro Being a cha‑
Um amor para toda a vida, intenso, vigoroso, racter: Psychoanalysis and Self Experiences,

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Catarina Pinheiro, Maria João Dias, Alda Rosa

escreve7: “… um indivíduo pode, entre‑ é através da representação que escapamos à


tanto, lutar contra constelações interio‑ loucura. Este é o duplo poder da representa‑
res traumáticas e, por transformações do ção: estruturante ou intoxicante14.
trauma em obras de arte, alcançar certo A propósito recordamos A. Green15, que nos
domínio sobre os efeitos do trauma. A vi‑ coloca de novo o paradoxo, ao pensar o tea‑
são de que o artista transforma o trauma tro de Shakespeare: são as representações que
e o sofrimento psíquico num objecto artís‑ tornam Hamlet louco, e é pela representação
tico é uma perspectiva comum sobre a na‑ das representações que ele escapa à loucura.
tureza da criatividade… E um indivíduo É o teatro que salva Shakespeare da loucura, e
pode, na realidade, trabalhar um trauma que também salva Hamlet na peça dentro da
para transformar o seu status psíquico em peça. Trata­‑se da força elaborativa da repre‑
desenvolvimento, e a partir dele, surgir sentação. Que também salvou Bacon e Frida?
uma nova estrutura psíquica que marca Como diz Green, enquanto espectadores só
uma nova perspectiva. Assim, a regene‑ vemos o teatro cheio, habitado, vivo. Angus‑
ração emerge do jogo lúdico dedicado à tiante e misterioso é ver esse mesmo espaço
transformação do sofrimento psíquico e vazio. O continente torna­‑se visível. Outras
perspectivas traumáticas”. criações podem então surgir. “O teatro vazio
No caso de Frida Kahlo pintar principalmen‑ revela­‑nos a função da alucinação negati‑
te auto­‑retratos poderá representar esforços va, anterior à representação”15. Não o pró‑
do self em dar sentido­‑narrativa­‑conjunto­ prio negativo, pele rasgada, coesão perdida,
‑integração­‑sustentação a um self primitivo e que Bacon e Frida pintam? São conteúdos
fragmentado (e a um esquema corporal frag‑ sem continente. Ou conteúdos à procura de
mentado; morcelé no sentido lacaniano de um plano, de uma tela, de um outro. Lugar
fragmentado e pré­‑especular), possibilitando sem fundo, sem espaço, lugar do negativo.
a passagem do imaginário ao simbólico, por É a realidade indelimitada, fendida, rasgada
intermédio do “estágio do espelho”, melhor que aparece nos trabalhos destes dois pinto‑
dito, por intermédio dos seus auto­‑retratos. res, acordando em nós o “medo de perder
todo o sentido dos limites separados; par‑
ticularmente os limites existentes entre as
Subversão e Violência na Arte realidades tangíveis do mundo externo e as
realidades imaginativas do mundo interior
Um excesso de representação satura a mente, das sensações e das ideias; ou seja, o medo
fascina e impede o pensar. Eis o paradoxo: é a de enlouquecer”9. Milner encontra aqui algu‑
representação que desencadeia a loucura, mas mas das causas para o primeiro movimento de

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Aspectos Psicológicos do Doente Oncológico

recusa do público face à arte abstracta. Recusa tra organização enfraquecida”. Prótese, dor,
e escândalo também nas reacções às obras de violência, mas também subversão, mudança,
Bacon e Frida. reverberação, comunicação, criação.
Há um carácter de necessidade na sublima‑
ção. “Não somos nós, em primeiro lugar, Voltando à clínica, D. Kaswin – Bonnefond17
guiados pela necessidade de organização, fala­‑nos na transferência negativa onde
de modelo, de coerência interior, por esta as pulsões se processam num “para além do
necessidade de base que nos leva a desco‑ princípio do prazer”, na compulsão à repeti‑
brir a identidade na diferença, sem a qual ção. A experiência de dor suscita o desinvesti‑
a experiência se torna um caos”16. Mas é pre‑ mento “desobjectalizante”.
cisamente o caos inaugural, a ausência de co‑ Bion, no seu conceito de ataque aos vínculos,
erência, essa inorganização primeira e primá‑ fala de um desastre primitivo e de uma catás‑
ria, fundadora e fundida, que Bacon e Frida trofe permanente que não pode ser resolvida.
representam, colocando­‑nos numa viagem ao Desligamento na tentativa de destruir o ór‑
centro da terra, para o interior mais interior gão que sente a dor, como já falámos atrás
de cada um de nós. a propósito destes criadores. Quando as ex‑
Segundo Mancia8 é necessário que a criança periências com o objecto materno são más,
tenha ao seu lado uma mãe viva, que lhe me‑ um violento desinvestimento pode varrer a
tabolize as angústias, e não uma mãe morta memória da experiência e, no lugar da sa‑
– “objecto inanimado, deprimido, átono, tisfação alucinatória do desejo, emergir uma
insensível, distante”. Pelo que “a ‘mãe mor‑ realização alucinatória da dor14.
ta’ é essencialmente um objecto de desilusão Não é assim nas obras destes dois pintores?
para a criança, um objecto trauma que o É a repetida experiência de ruptura, do sen‑
obrigará a criar os seus próprios objectos sorial caótico, da tragédia, da penetração na
protéticos”. Questão que lembra alguns dos violência, é a pulsão pura que é expulsa e ex‑
dados que sabemos terem estado presentes/au‑ tinta. É a carne sem película, a película sem
sentes nas vidas destes dois pintores, e que são carne. O informe violento, a violência da for‑
espelhados, sem disfarces, nos seus trabalhos. ma. É a estética da subversão e da violência
P. Luquet11 refere como no caso da arte em nas obras de Frida Kahlo e de Francis Bacon.
sujeitos com patologia “a arte é, frequente‑ Estética da sensação, do corpo­‑a­‑corpo, da
mente, o último recurso que mantém, ‘em palavra devolvida à matéria.
vida psíquica’, sujeitos pré­‑psicóticos. A fun‑
ção estética pode tornar­‑se uma das bases Se encontramos em comum estas dimen‑
da estrutura do ego que substitui uma ou‑ sões em ambos os artistas, as diferenças

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Catarina Pinheiro, Maria João Dias, Alda Rosa

merecem ser aprofundadas, discriminadas 7. Outeiral, J. e Moura, L.; Paixão e Criativi‑


e percebidas. Procurámos pensar este im‑ dade. Estudos Psicanalíticos sobre Frida
pacto. Poderíamos seguir de impacto em Kahlo – Camille Claudel – Coco Chanel;
impacto, dentro da obra de cada um deles, Rio de Janeiro: Revinter Ed.; 2002.
procurando também aquilo que os separa/ 8. Mancia, M.; No Olhar de Narciso. Ensaios
diferencia, e certamente haveria mais a sobre a memória, o afecto e a criativida‑
acrescentar. de; Lisboa; Escher; 1990.
Talvez possamos voltar a estas obras deixadas 9. Fuller, P.; Arte e Psicanálise; Lisboa; Dom
por Bacon e Frida um dia, em breve, espere‑ Quixote; 1983.
mos. 10. Ficacci, L.; Bacon; Lisboa; Taschen Ed.;
2004.
11. Luquet, P. ; Notes Sur Quelques Problèmes
Bibliografia Par la Sublimation Dans L´Art Pictural ;
Revue Française Psychanalyse, 43 (5‑6),
1. Green, A.; Revelações do Inacabado sobre
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12. Anzieu, D.; Le Moi­‑peau; Paris; Dunod;
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2. Segal, H.; A Psycho­‑analytic approach to
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Rio de Janeiro; Imago Ed; 1975.
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14. Pinheiro, C.; Criações Sobre Leonardo da
3. Anzieu, D., M. Monjauze, M.; Francis
Vinci. Arte e Psicanálise; Lisboa; Climepsi;
Bacon ou le portrait de l´hommme déses‑
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15. Green, A. ; Hamlet et Hamlet. Une inter‑
4. Korff­‑Sausse, S.; Contre­‑transfert, clini‑
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ques de l´extrême et esthétique  ; Revue
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Française Psychanalyse; 2, 2006; 507‑520.
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5. Heenen­‑Wolff, S. ; De la Violence dans le
Formation du Symbole ; Revue Française
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