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Revista Brasileira de Física, Vol. 7, N?

3, 1977

O Efeito "Folha Seca"


B. LEROY*
Instituto de Física Teórica**, São Paulo SP

Recebido em 19 de Setembro de 1977

The main f e a t u r e s o f f l u i d f l o w s p a s t immersed s o l i d bodies a r e q u a l i -


t a t i v e l y reviewed. The importance o f t u r b u l e n c e and boundary l a y e r se-
p a r a t i o n i n d e t e r m i n i n g t h e r e s i s t a n c e t o t h e motion experienced by t h e
s o l i d body i s emphasized. F i n a l l y , we p r e s e n t as an a p p l i c a t i o n a qua-
litative explanation of t h e s o c a l l e d "dead l l e a f " e f f e c t w h i c h every
f o o t b a l l connoisseur i s acquainted w i t h .

Discutem-se q u a l i t a t i v a m e n t e os p r i n c i p a i s aspectos do escoamento de


f l u i d o s ao r e d o r de s ó l i d o s imersos, enfatizando- se a importância da
t u r b u l ê n c i a e do deslocamento da camada l i m i t e em d e t e r m i n a r a resistên-
c i a oposta p e l o sól ido. Como a p l icação, apresentamos uma e x p l icação
q u a l i t a t i v a do e f e i t o " f o l h a seca", e f e i t o que nenhum conhecedor de f u -
t e b o l pode i g n o r a r .

1. INTRODUÇAO

A aparente f r i v o l idade do assunto deste a r t i g o l e v a n t a a questão da con-


v e n i ê n c i a de se publ i c a r umas poucas páginas sobre o f u t e b o l em uma re-
v i s t a c i e n t í f i c a b r a s i l e i ra. E, todavia, b a s t a n t e provavel que a imen-

* Endereço permanen t e: Observatoire de Paris-Meudon, ~Épartement dlAstro-


physique ~ o n h e n t a Z e ,92190-Meudon, França.
** C . P . 5956, 01000-são Paulo SP.
sa m a i o r i a daqueles que sabem c h u t a r de "raspão" ignorem o por que do
comportamento p o s t e r i o r da b o l a : a f i n a l , a maneira de p r o d u z i r esseefei-
t o requer somente i n t u i ç ã o , t a l e n t o e e x p e r i ê n c i a . Quanto eventual
acusação de f r i v o l i d a d e , e l a só p o d e r i a v i r de alguem de humor d i f i c i l ,
p a r t i d á r i o a r r o g a n t e da c i ê n c i a austera: que permaneça e l e em sua t o r r e
de marfim!

Neste a r t i g o , dedicado aos colegas b r a s i l e i r o s que já conheceram a emo-


ção do f u t e b o l , procuramos desvendar alguns dos segredos desse jogo.

Convem, desde j á , observarmos e s t a r f o r a de questão um tratamento exaus-


t i v o do movimento da bola, do i n s t a n t e em que f o i golpeada a t é o momen-
t o em que, por assim d i z e r , encontrou o "fundo das redes". Assim, d e l i -
beradarnente, ignoraremos a i n f l u ê n c i a do vento, como também de e f e i t o s
menores como a a l t i t u d e e a umidade do a r . Essencialmente,limitar-nos-
-emos a e x p l i c a r a importância do a r , e de como se pode tirar partido
desse elemento n a t u r a l , ã p r i m e i r a v i s t a pouco t r a t á v e l .

Parece-nos p e r t i n e n t e mencionar o i n t e r e s s e demonstrado, no passado,por


c i e n t i s t a s i l u s t r e s pelos fenômenos f í s i c o s que se manifestam em d i v e r -
sos jogos. Contentar-nos-emos em c i t a r o ~ a r q u ê sG . G . de Coriolis e
sua "Théorie Mathématique des E f f e c t s du Jeu de Bi 1 l a r d " ( 1 8 3 5 ) , Lord
Rayleigh e seu a r t i g o "The I r r e g u l a r F l i g h t o f a Tennis B a l l " (18701, e
tambem J.J. Thomson, a u t o r de "Dynamics o f a G o l f B a l l " (1910).

2. EM TORNO DE UMA BOLA DE FUTEBOL, O AR SE COMPORTA COMO UM


FLUIDO INCOMPRESSIVEL!

A e x i s t ê n c i a do movimento, de um corpo s ó l i d o , r e l a t i v a m e n t e a um f l u i -
do onde se encontra imerso, dá l u g a r a uma f o r ç a de r e s i s t ê n c i a , agindo
sobre esse corpo, que se opõe ao movimento. Como essa f o r ç a tem origem
no movimento r e l a t i v o do corpo, é p e r f e i t a m e n t e e q u i v a l e n t e estudar- se
( i ) o escoamento do f l u i d o ao r e d o r do corpo em repouso, ou ( i i) o mo-
vimento do s ó l i d o no f l u i d o em repouso. Essa l i b e r d a d e de d e s c r i ç ã o é
mui t o importante na p r á t i c a . A f i n a l , não é f a c i 1 se t e r um observador
em repouso em r e l a ç ã o a uma bola em movimento. Por o u t r o lado, nada mais
f a c i l do que se f i x a r uma b o l a em um t u n e l de vento, onde o vento s e r i a
i n j e t a d o a uma v e l o c i d a d e i g u a l à da b o l a quando em voo, o movimento
das moléculas de a r tornando-se v i s í v e l a t r a v é s de pequenas partículas
b r i l h a n t e s em suspensão. e esse exemplo, t r a t a - s e de estudar o escoa-
mento e s t a c i o n á r i o do a r ao r e d o r da bola, o que e q u i v a l e ao estudo do
movimento u n i f o r m e da b o l a no a r ) .

Antes de empreend.ermos a d e s c r i ç ã o do escoamento do a r , ao r e d o r da bo-


l a , em função da v e l o c i d a d e de voo, faremos algumas considerações qua-
l i t a t i v a s p r e l i m i n a r e s que serão Ú t e i s para o entendimento do que se se-
gue.

E c l a r o que a r e s i s t ê n c i a do a r , ao movimento da b o l a , depende da sua


v e l o c i d a d e de voo v, de seu diamento d, e das propriedades d o a r quesão
c a r a c t e r i z a d a s por sua densidade p, v i s c o s i d a d e dinâmica rl e seu módulo
de e l a s t i c i d a d e E (que descreve a compressi b i 1i dade). Considerações d i -
1
mensionais indicam que a r e s i s t ê n c i a do a r tem a forma g e r a l se g uinte

1 pvd pv2
F = 7 py2. d2.,-yi-(f ,

o f a t o r (1/2) comparecendo como d e c o r r ê n c i a de nossa i rrevogável f ide-


1idade aos usos e costumes bem e s t a b e l e c i d o s ; f é uma função adimensio-
na1 de v a r i á v e i s adimensionais: pvd/n ( o número de Reynolds, N ~ e) p v 2 / ~
(o número de Cauchy, i g u a l ao quadrado do número de Mach NM. Para um gas
perfeito, o número de Mach v a l e N =v/c,
M onde c 5 a v e l o c i d a d e do som no
meio).

Em todos jogos de bola, as velocidades c a r a c t e r í s t i c a s são bem menores


que a v e l o c i d a d e do som. A f i n a l , mesmo um jogador de f u t e b o l excepcio-
nalmente v i g o r o s o não tem um c h u t e "supersÔnico"! Podemos p o i s ignorar
a i n f l u ê n c i a do número de Mach sobre o movimento, e assim não l e v a r em
conta a c o m p r e s s i b i l i d a d e do a r . E i s porque o a r será considerado, no
que segue, como um f l u i d o incompressivel.
3. O ESCOAMENTO LAMINAR

As f o t o s de escoamentos i n ~ o m ~ r e s s i v e i sa, baixas velocidades, têm o as-


p e c t o t i p i c o i n d i c a d o na F i g . I: as p a r t í c u l a s em suspensão deslocam-se
ao longo de curvas i n d i v i d u a i s p a r a l e l a s , as chamadas Zinhas de corren-
te, e o escoamento d i z - s e luminar. A s u p e r f í c i e , em um dado instante,
formada por todas as l i n h a s de c o r r e n t e que se apoiam sobre uma curva
fechada, a r b i t r á r i a , é o que se chama de tubo de corrente. Na Fig.1, as
l i n h a s de c o r r e n t e 1 e 2, e o espaço que e l a s delimitam, representam a
seção l o n g i t u d i n a l de uma porção de um desses tubos de c o r r e n t e .

Nota-se, nessa mesma f i g u r a , um estrangulamento dos tubos de corrente


acima e abaixo da b o l a (posições I I e I I ' ) , o que nos l e v a a uma conclu-
são importante. Com e f e i t o , como o movimento f o i suposto e s t a c i o n á r i o , a
quantidade de a r que atravessa uma seção t r a n s v e r s a l , A,, 5 frente da
bola, é a mesma que aquela a t r a v é s de uma seção t r a n s v e r s a l , A2, acima
da b o l a ( c f . ~ i g . 2 ) . V i s t o que a área de A, é menor que a de A , , a ve-
l o c i d a d e do a r será necessariamente maior em I I que em I, o que signi-
f i c a uma aceleração e n t r e I e 1 1 . ~ p õ s1 1 , aumenta a seção do tubo de
c o r r e n t e a t r á s da bola, em I I I , a área de A, sendo a mesma de AI, e o
a r é desacelerado do topo I I ã r e g i ã o I I I. Posto que a v e l o c i d a d e do a r
acima da b o l a é maior que à sua esquerda ( I ) , um pequeno volume do f l u i -
do ( v i sua1 izado graças 5s ~ a r t í c u l a sem sus p ensão) t e r á sua e n e r g i a c i -
&tica aumentada nesse trecho. E razoável perguntar- se aqui a origem
dessa energia. P e l o teorema da e n e r g i a c i n é t i c a (ou da f o r ç a v i v a ) , essa
v a r i a ç ã o da e n e r g i a provem necessariamente do t r a b a l h o r e a 1 i z a d o por
c e r t a s f o r ç a s ; o r a , as ú n i c a s f o r ç a s que podem i n t e r v i r , além da g r a v i -
dade (que é des p rezada), são as f o r ç a s de pressão. Conclue-se assim,
do f a t o do a r s e r a c e l e r a d o da f r e n t e ( I ) da b o l a ao seu topo ( II ) , que
e x i s t e um g r a d i e n t e n e g a t i v o de pressão de I para I I . ( s i m i l a r m e n t e ,
e x i s t e um g r a d i e n t e p o s i t i v o de ~ r e s s ã oe n t r e I 1 e 111). A existência
de um g r a d i e n t e de pressão, devido ao estrangulamento dos tubos de c o r -
r e n t e , pode ser v e r i f i c a d a experimentalmente u t i l i z a n d o - s e de um tubo
de V e n t u r i ( ~ i ~ . 3 )Nesse
. tubo, que apresenta uma c o n s t r i ~ ã o ,o a r 6
soprado a v e l o c i d a d e constante, e a ~ r e s s ã omedida nas d i f e r e n t e s se-
~ õ e s . Com e f e i t o , constata- se que a ~ r e s s ã odo a r é mais baixa n a c o n s -
t r i ç ã o , o que confirma o r e s u l t a d o t e ó r i c o fundamental que c o n s t i t u e o
acima
n

trrntr atrás

Fig.1 - Escoamento laminar ao r e d o r de uma b o l a .

Fig.2 - Estrangulamento dos tubos de c o r r e n t e no escoamento laminar.

Fig.3 - O tubo de V e n t u r i .
t e o r m a de D. BernouiZZi: o aumento da e n e r g i a c i n é t i ca de um elemento
de f l u i d o , ao longo de uma l i n h a de c o r r e n t e , é em magnitude i g u a l ao
t r a b a l h o do g r a d i e n t e de pressão, para escoamentos e s t a c i o n á r i o s .

4. O ESCOAMENTO TURBULENTO

Mostra a e x p e r i ê n c i a que, aumentado a velocidade, o comportamento t í p i -


co mostrado na Fig.1 desaparece a p a r t i r de um v a l o r c r í t i c o do número
de Reynolds da ordem de 1 para a e s f e r a 2 . Para uma b o l a de f u t e b o l ( d i -
o
âmetro de cerca de 22 cm), em voo em a r a 1 5 C e a uma pressãode 1 atm.,
o número de Reynolds (em função da v e l o c i d a d e v medida em ms-') v a l e

Assim, nas condições usuais de j o g o (onde as velocidades podem a l c a n ç a r


e mesmo u l t r a p a s s a r 80 km/h) tem-se NR > 1 , e o escoamento nunca é Ia-
minar.

Além do v a l o r c r í t i c o , as f o t o s revelam ( ~ i ~ . 4um


) comportamento muito
d i f e r e n t e daquela da Fig.1. Em f r e n t e , acima, e abaixo da b o l a , p e r s i s -
tem as l i n h a s de c o r r e n t e como no caso laminar; a t r á s , todavia, e l a s de-
saparecem em uma e s t e i r a composta de um grande número de pequenos tur-
b i 1 hões, e o escoamento é d i t o turbuZento.

O número de Reynolds nada mais é que a razão das f o r ç a s de i n é r c i a p e l a s


f o r ç a s de viscosidade. Enquanto e l e permanece pequeno, as f o r ç a s de
i n é r c i a ( c u j a tendência 6 d i f u n d i r as p a r t í c u l a s do f l u i d o ) são despre-
z í v e i s em c o n f r o n t o com as f o r ç a s viscosas, essas tendendo a manter um
escoamento e s t r a t i f icado: o escoamento é então laminar. Por o u t r o 1ado,
quando o número de Reynolds se t o r n a s u f i c i e n t e m e n t e grande, as partí-
c u l a s do f l u i d o se difundem, e desaparecem as l i n h a s de c o r r e n t e .

Por causa da viscosidade, o a r em c o n t a t o com a s u p e r f í c i e da b o l a deve


e s t a r em repouso em r e l a ç ã o à mesma. Experimentalmente, observa-se que
uma camada bem f i n a (denominada camada L i m i t e ) adere à s u p e r f i c i e ( F i g .
5).
Mostra a e x p e r i ê n c i a que, em g e r a l , o escoamento % laminar na camada
1imi t e ( p e l o menos para velocidades não demas iadamente e1evadas). O ra-
c i o c í n i o f e i t o bem ao começo se a p l ica: o f l u i d o % acelerado quando v a i
da f r e n t e para o topo da bola. Todavia, c o m a v e l o c i d a d e & n u l a sobre
a s u p e r f í c i e da bola, o f l u i d o não mais pode desacelerar na região a t r á s
da b o l a (ou, d i t o de o u t r a maneira, o f l u i d o não tem e n e r g i a s u f i c i e n t e
para u l t r a p a s s a r o g r a d i e n t e c o n t r á r i o de pressão e x i s t e n t e atrás da
bola), e a camada 1 i m i t e se desloca então da s u p e r f i c i e , ao mesmo tempo
que aparece uma c o n t r a - c o r r e n t e que dá l u g a r à e s t e i r a t u r b u l e n t a ( ~ i ~ .
5) .

5. O AR OP6ESE AO MOVIMENTO DA BOLA.. .


No 1ugar em que o c o r r e o deslocamento, a pressão é menor que à frente
da b o l a ; a pressão tendo d i m i n u i d o em uma r e g i ã o v i z i n h a da e s t e i r a t u r -
b u l e n t a ( a t r á s da b o l a ) % então transmitida a essa e s t e i r a , o que r e s u l -
t a em um g r a d i e n t e de pressão i m p o r t a n t e e n t r e as p a r t e de f r e n t e e de
t r á s da bola, a qual f i c a assim submetida a uma f o r ç a de resistência
( p o i s é d i r i g i d a para a p a r t e de t r á s ) . O escoamento perdeu sua sirne-
t r i a f r e n t e - t r á s , p e r s i s t i n d o porém a s i m e t r i a a l t o - b a i x o , de maneira
que a r e s i s t ê n c i a devida ao deslocamento da camada l i m i t e não tem com-
ponente t r a n s v e r s a l . Essa r e s i s t ê n c i a ( l o n g i t u d i n a l ) % denominada mms-
to (drag, em inglês; tra&zée, em f r a n c ê s ) .

6. ... MAS A RESISTENCIA NAO CRESCE INDEFINIDAMENTE


Se a v e l o c i d a d e do a r aumenta a i n d a mais, a e x p e r i ê n c i a mostra que o
deslocamento da camada l i m i t e o c o r r e em pontos mais para a p a r t e de
f r e n t e da s u p e r f i c i e da b o l a ( ~ i ~ . 6 ) .

E c l a r o , do que acabamos de d i z e r , que quão mais cedo ocorrer o desloca-


mento, ' t ã o mais i m p o r t a n t e será o a r r a s t o . ( ~ x p eimentalmente,
r observa-
-se, p.ex., que o a r r a s t o s o f r i d o p o r uma e s f e r a é aproximadamente i g u a l
a um t e r ç o daquele s o f r i d o por um disco, de i g u a l diâmetro, colocado p e r -
pend i c u l armente ao escoamento.) Podemos t o r n a r i s s o ma i s compreensível :
a f i m de manter um movimento t u r b u l e n t o é n e c e s s á r i o energia. Ora, essa
e n e r g i a só pode p r o v i r da b o l a que, consequentemente, perde velocidade;
quanto mais cedo o c o r r e r o deslocamento da camada 1 i m i t e , quão maior se-
r á a estei ra turbulenta, ocorrendo e n t ã o um número cada vez maior de
t u r b i l h õ e s que sugam cada vez mais energia, o a r r a s t o tornando- se cada
vez mais importante.

Continuando-se a aumentar a velocidade, é de se esperar então que c r e s -


ça a r e s i s t ê n c i a do a r , o que t o d a v i a não ocorre. Com e f e i t o , o escoa-
mento na camada l i m i t e , de espessura 6, só é laminar para v a l o r e s d o nü-
mero de Reynolds, N = p v 6 / ~ , i n f e r i o r e s ao v a l o r c r i t i c o 3 . U l t r a p a s s a -
R
do esse v a l o r , o escoamento torna- se t u r b u l e n t o , e f a l a - s e então de uma
camada l i m i t e t u r b u l e n t a ( ~ i ~ . 7 )Nota-se
. então uma d i m i n u i ç ã o da l a r -
gura da e s t e i r a t u r b u l e n t a . I s s o é' expl icado, qual i t a t i v a m e n t e , obser-
vando-se que, devido 2 t u r b u l ê n c i a na camada l i m i t e , t r o c a s de e n e r g i a
podem t e r l u g a r e n t r e as porções de f l u i d o i n t e r i o r e e x t e r i o r ãquela
camada. Um elemento de f l u i d o que, no caso de uma camada l i m i t e lami-
nar, não t e r i a e n e r g i a s u f i c i e n t e para u l t r a p a s s a r o g r a d i e n t e contrá-
r i o de pressão que v i g o r a a t r á s da bola, poderá e n c o n t r a r d e s t a vez f Ô -
l e g o b a s t a n t e chegar mais longe na r e g i ã o p o s t e r i o r ; o deslocamento da
camada l i m i t e t e r á l u g a r mais para t r á s da bola, reduzindo assim a l a r -
gura da e s t e i r a t u r b u l e n t a e, p o r t a n t o , o a r r a s t o .

A função f , que intervem na Eq. I , é h a b i t u a l m e n t e chamada de coeffcien-


t e de m a s t o (nota ç ão CARR); sua v a r i a ç ã o com o numero de Reynolds é
o b t i d a experimentalmente ( ~ i ~ . 8 )Observa-se
. uma d i m i n u i ç ã o de CARRa t é
v a l o r e s de NR da ordem de 5000; para NR e n t r e 5000 e cerca de 3 x 105,
CARR 6 aproximadamente constante; em seguida, e l e diminue brutalmente,
caindo a 1/4 ou 1/5 de seu v a l o r precedente, no momento em que surge a
t u r b u l ê n c i a na camada 1 i m i t e . Não se deve perder de v i s t a que, quando
o c o r r e essa queda brusca no c o e f i c i e n t e de a r r a s t o (às vezes chamada de
c r i s e de r e s i s t ê n c i a ) , a v e l o c i d a d e é mui t o grande e a compress i b i 1 i d a -
de do f l u i d o pode v i r a t e r um papel não d e s p r e z i v e l (o número de Mach
NM não mais é pequeno). Assim, as c o i s a s permaneceriam qual i tativamen-
t e as mesmas, só que i r i a aumentando o v a l o r do número de Reynolds a par-
t i r do qual se p r o d u z i r i a a c r i s e de r e s i s t ê n c i a , e a posição do d e s l o -
camento da camada 1 i m i t e d e s l o c a r - s e - i a para a f r e n t e da b o l a com o cres-
c e r de NM.
7. A BOLA QUANDO GIRA ABUSA DO AR

A t é aqui, consideramos uma b o l a sem qualquer rotação, r e s t r i n g i n d o - n o s


assim a um caso deveras i d e a l i z a d o . Quando a b o l a g i r a sobre s i mesma,
as 1 inhas de c o r r e n t e na v i z i n h a n ç a da sua s u p e r f Í c i e são arrastadas, o
que r e s u l t a em um escoamento t o t a l m e n t e d i f e r e n t e daqueles estudados an-
.
t e r i o r m e n t e ( ~ i g . 9 ) Como os fenômenos devidos ã t u r b u l ê n c i a permanecem
q u a l i t a t i v a m e n t e os mesmos, limitar- nos- emos a ao caso do escoamentola-
minar. O comportamento t í p i c o , i n d i c a d o na Fig.9, pode s e r reproduzido
matematicamente superpondo-se, ao movimento laminar da Fig.1, um movi-
mento i r r o t a c i o n a l do t i p o representado na Fig.10, onde o f l u i d o g i r a a
uma v e l o c i d a d e c o n s t a n t e juntamente com a b o l a . A superposição dos d o i s
movimentos mostra que a v e l o c i d a d e do a r acima da b o l a (no caso da ro-
tação indicada na Fig.10) é s u p e r i o r à v e l o c i d a d e abaixo da mesma. Dai
r e s u l t a , de acordo com o teorema de B e r n o u i l l i , que a pressão acima da
b o l a é maior que abaixo: a b o l a é p o r t a n t o submetida a uma f o r ç a d i r i g i -
da de b a i x o para cima, usualmente chamada de enipmo (Zift, em i n g l ê s ;
p o r t a n c e , em francês) .
A f i m de melhor compreender a origem do empuxo, faremos uso do c o n c e i t o
de cirrmZação. Consideremos, para simpl i f i c a r um escoamento bidimens i-
onal ( c u j a s 1 inhas de f o r ç a são representadas na ~ i ~ . l l )e , imaginemos
uma curva simples fechada C traçada no p l a n o do escoamento. A circula-
ção do f l u i d o (denotada por r) ao longo de C é dada p e l a i n t e g r a l da com-
+
ponente da v e l o c i d a d e v ao longo de C (Fig.11):

onde dx é o elemento de a r c o o r i e n t a d o em C.

N. Joukowski mostrou, em 1906, no. caso de um c i l i n d r o imerso transver-


salmente em um f l u i d o , e s t a r o empuxo FEMp1 igado à c i r c u l a ç ã o r pela r e -
lação bem simples

p sendo a densidade do f l u ido, e v a magnitude da velocidade. I s s o m s -


t r a claramente que a c I r c u l a ç ã o e s t á na origem do empuxo.
Fig.8 - A c r i s e de r e s i s t ê n c i a .

Fig.9 - O escoamento laminar ao redor de uma bola girando.

Fig.10 - Movimento i r r o t a c i o n a l .
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Em resumo, pode-se d i z e r que um corpo sólido, em movimento dentro de um
fluido, 6 submetido a uma força de r e s i s t ê n c i a que pode ser decomposta
. l o n g i t u d i n a l e transversalmente ao movimento, i.6, em a r r a s t o e empuxo,
respectivamente, e que o a r r a s t o tem por origem os fenômenos de deslo-
camento da camada 1i m i t e e de formação da e s t e i r a turbulenta, enquanto
o empuxo decorre da c i r c u l a ç ã o do f l u i d o à v01 t a do só1 ido.

8. APLICAÇOES: A BOLA ESTA COM VOCE!

Vejamos agora algumas aplicações de todos esses fenômenos a c i -


ma relatados. Vamos nos 1 i m i t a r , como j á o dissemos, ao jogo de futebol,
onde - é de se imaginar - a maioria dos que o praticam estão em s i t u a -
ção anãloga à de Monsieur ~ o u r d a i n ~p,o i s apl icam a aerodinâmica sem o
saber. Vejamos como.

A p r i m e i r a v i s t a , a presença do a r parece ser nefasta. De f a t o , se se


c a l c u l a o alcance, no vácuo, de uma bola chutada, sem " e f e i t o " ( i .é, sem
O
rotação), em uma direção fazendo um ângulo de elevação de 45 como p l a -
no do terreno, e com uma velocidade de 30 ms-', obtem-se cerca de 92m.
Levando-se em conta o a r r a s t o , por ação do a r sobre a bola, encontra-se
que o alcance c a i a 54m. Isso quer d i z e r que e l e c a i praticamente à me-
tade, apesar do e f e i t o favoravel da turbulência na camada l i m i t e à ve-
locidade considerada ( B = 4,6 x 105, CARR 0,2). Assim, debalde osme-
R
Ihores esforços despendídos pelo jogador, o empuxo será sempre un aspec-
t o negativo e certo.

8.1 . O "CHUTE DE R A S P A O ~

Quem já jogou f u t e b o l , ou tenha a s s i s t i d o p a r t i d a s de f u t e b o l , não pode


d e i x a r de t e r observado que a t r a j e t ó r i a da bola (ou, mais precisamente,
a projeção dessa t r a j e t ó r i a no terreno) frequentemente se a f a s t a da li-
nha reta. ~ e r ãv i s t o tambem uma bola voar em uma direção que a l e v a r i a
longe do gol e, todavia, encurvar-se e acabar entrando por um dos ângu-
l o s superiores da meta, encobrindo o g o l e i r o . A expl icação desse fe-
nômeno 6 muito simples. Como já mencionamos mais atrás, quando a bola
g i r a sobre s i mesma (i.é, a bola está com " efeito" ) e l a é submetida,
além da f o r ç a de a r r a s t o , a uma f o r ç a suplementar que é o empuxo. En-
quanto o a r r a s t o é l o n g i t u d i n a l e, assim, r e s t r i n g e - s e a f r e a r a bola,
e p o r t a n t o a r e d u z i r o seu alcance, o empuxo é t r a n s v e r s a l à d i r e ç ã o de
movimento, encurvando a cada i n s t a n t e a t r a j e t ó r i a da b o l a . Esse e f e i t o
é conhecido p e l o s f í s i c o s sob a denominação de " e f e i t o Magnus", em ho-
menagem ao f í s i c o alemão que f o i o p r i m e i r o a r e a l i z a r medidas experi-
mentais sobre o fenômeno. O e f e i t o e a a r t e de u t i l i z á - l o e s t ã o na o r i -
gem de m u i t a s proezas dos grandes "cobras". E, sem a menor dúvida, é ne-
cessár i o mui t o t a l e n t o e treinamento para se consegui r empregá-lo com
p e r f e i ç ã o e assiduidade.

Um jogador, no momento de c h u t a r a b o l a , dispõe, grosso modo, de q u a t r o


maneiras d i f e r e n t e s de 1 he comunicar um movimento de r o t a ç ã o sobre s i
mesma, i.6, de c h u t á - l a com " e f e i t o t 1 . Chutando a b o l a p r t a f r e n t e , ele
pode f a z e r com que e l a g i r e sobre s i mesma p r ' a f r e n t e ou p r ' a t r á s ( e i -
xo de rotação h o r i z o n t a l ) , ou p r ' o s lados ( e i x o de rotap,ão v e r t i c a 1 1;
c f . Fig.12.

Quando a b o l a s o f r e um raspão de b a i x o para cima ( ~ i g . 1 2 - a ) , a veloci-


dade do a r é mais b a i x a em sua p a r t e s u p e r i o r do que na i n f e r i o r , e o
empuxo tende então a t o r n a r a b o l a mais pesada, e sua t r a j e t ó r i a se en-
curva para baixo. Ora, como a t r a j e t ó r i a n a t u r a l j á 6 encurvada para bai-
xo, o e f e i t o desse empuxo é de d i m i n u i r o r a i o de c u r v a t u r a e, p o r t a n t o ,
de e n c u r t a r o alcance da bola.

No caso em que a b o l a s o f r e um raspão de cima para b a i x o ( ~ i 12-b)


~ . , nas
mesmas condições, t e r á a tendência inversa e subi r ã ( e l a e s t a r á subme-
t i d a a um v e r d a d e i r o empuxo). No caso em que a velocidade de rotação 6
t a l que o empuxo compense exatamente o peso da bola, essa ao invés de
assumir uma t r a j e t ó r i a aproximadamente parabÓl i c a , s e g u i r á por um c e r t o
tempo um caminho r e t i 1 Íneo, e o a 1 cance do " t i ro i ' aumenta rã. Ei s a i um
meio de desfazer os e f e i t o s n e f a s t o s do a r : pode-se aumentar o alcance,
da bola, chutando-a de raspão de cima para baixo.

As duas t r a j e t ó r i a s precedentes, embora encurvadas, têm uma projeção r e -


t i l i n e a sobre o plano do t e r r e n o por ser v e r t i c a l o empuxo. Se, t o d a v i a ,
o raspão é de molde a comunicar à b o l a uma rotação em t o r n o de um e i x o
v e r t i c a l ao gramado, o empuxo será h o r i z o n t a l , e a p r o j e ç ã o ortogonal
da t r a j e t ó r i a não será r e t i 1 ínea. Se a b o l a s o f r e um raspão da esquer-
da para a d i r e i t a ( r e l a t i v a m e n t e à d i r e ç ã o ( i . 6 , s e n t i d o ) de voo), é f a -
c i 1 de v e r que o empuxo tenderá a d e s v i a r a b o l a para a esquerda. (Si-
milarmente, e l a será desviada para a d i r e i t a , em um raspão da direita
para a es q uerda). São desse gênero os chutes que provocam as t r a j e t ó r i -
as m r a v i l h o s a m e n t e encurvadas que conseguem às vezes enganar mesmo os
g o l e i r o s mais a t i l a d o s .

. .. 8.2. O EFEITO "FOLHA SECA"

Todos esses e f e i t o s , espetaculares, n ã o são d i f í c e i s de ser consegui-


dos, e x i g i n d o t o d a v i a um treinamento metódico. No f u t e b o l , comoemqual-
quer o u t r a a t i v i d a d e , há aqueles " a r t i s t a s " de t a l e n t o incomparavel: o
c é l e b r e jogador b r a s i l e i r o , D i d i , f o i um dos poucos f u t e b o l i s t a s a con-
s e g u i r comunicar à b o l a uma r o t a ç ã o c u j o e i x o tem a d i r e ç ã o da veloci-
dade i n i c i a l , i.é, 6 l o n g i t u d i n a l . Dai r e s u l t a o n o t á v e l e f e i t o " folha
seca", que funcionou maravi 1hosamente bem no j o g o B r a s i l x França, na
Copa do Mundo de 1958, quando D i d i f e z o segundo g o l de sua equipe.

Se a b o l a recebe u m raspão da esquerda para a d i r e i t a , ela é desviada


para a esquerda, em p r i n c í p i o . Somente em p r i n c í p i o , embora frequente-
mente; de f a t o , se a b o l a 6 golpeada, da esquerda para a d i r e i t a , de ma-
n e i r a a que seu e i x o de r o t a ç ã o s e j a p a r a l e l o s velocidade i n i c i a l , não
haverá então nenhum empuxo e, p o r t a n t o , d e s v i o algum o c o r r e no começo da
t r a j e t ó r i a da b o l a (o escoamento em t o r n o da b o l a tem s i m e t r i a a x i a l ) ;
c f . Fig. 13-a. Pouco a pouco, sob ação da gravidade, a b o l a b a i x a de no-
vo e, assim, d e i x a de ser n u l o o ângulo que f a z o e i x o de r o t a ç ã o com a
d i r e ç ã o do movimento; c f . Fig.13-b (o momento a n g u l a r é uma constantede
movimento, i.6, o e i x o de r o t a ç ã o é i m u t a v e l ) . Imaginemos, então, para
s i m p l i f i c a r , que esse ângulo s e j a r e t o ( o e i x o de r o t a ç ã o e s t á acima da
d i r e ç ã o de movimento); c f . Fig.13-c. Pode-se ver, sem d i f i c u l d a d e , que
a b o l a s o f r e um empuxo que a f a z d e s v i a r para a d i r e i t a ! Compreende-se
p o i s por que o g o l e i r o francês, Abès, f o i pegado de surpreza p e l o t i r o
de D i d i .
\
-velocidade inicial

Fig.13 - O efeito " folha seca" .


Esperamos t e r conseguido s a t i s f a z e r a c u r i o s i d a d e dos colegas admirado-
r e s do f u t e b o l . Que as expl icações o f e r e c i d a s possam c o n t r i b u i r também
para uma apreciação mais j u s t a do t a l e n t o dos grandes jogadores em suas
c a r r e i r a s fugazes. A f t e r many a swnmer d i e s t h e swan...

AGRADECIMENTOS

Agradecemos a S t a i n l e s s S t i l l por sua serena tradução do o r i g i n a l d O o c ,


e p e l a c i t a ç ã o acrescentada a g u i s a de coda. Por mera questão de au-
tocons i s t ê n c i a , agradecemos a Adal b e r t o Bugl ione p o r suas sugestões na
elaboração destes agradecimentos.

A FAPESP nossos agradecimentos p e l o a p o i o f i n a n c e i r o recebido.

REFERENCIAS E NOTAS

1 . L. E. Sedov, S h i Z a r i t y and DhensionaZ ~ n a z y s i si n Mechanics ( ~ c a d e -


mic Press, 1959).
2. Deve-se n o t a r que o número de Reynolds c r í t i c o 6 uma função muito sen-
s í v e l da geometria das s u p e r f í c i e s que d e l i m i t a m o escoamento, e assim
pode v a r i a r de 1 a v a l o r e s da ordem de 1000, de acordo com o t i p o de es-
coamento; c f . J.K. Vennard e R.L. Street, EZernentary FZuid Mechanics
( 5 t h . e d i t i o n , J. Wiley, 1976) p.301.
3. Neste caso, o v a l o r c r í t i c o não é 1 . A camada l i m i t e pode s e r compa-
rada a um pequeno tubo c i l í n d r i c o p o i s o seu r a i o de c u r v a t u r a (igual
ao r a i o da b o l a ) é bem maior que o r a i o de sua seção t r a n s v e r s a l (apro-
ximadamente i g u a l à espessura da camada). Então, uma e s t i m a t i v a razoa-
v e l para o v a l o r c r í t i c o é a l g o como 2000 ( c f . J . K . Vennard e R.L.Street,
Zoc. cit.).
4 . Mo 1 i è r e , Le Bourgeois Genti Zhome.
5 . Sobre jogos de bola, pode-se c o n s u l t a r C.B. Daish, 'The P h y s e s o f
BaZZ Gumes" (The E n g l i s h U n i v e r s i t i e s Press, 1972).
6. Sobre o escoamento ao r e d o r de o b s t á c u l o s imersos , c o n s u l t e - s e R.H.
F. Pao, "FZuid Mechanics" ( J .W i 1ey , 196 1 ) .

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