AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL Nº 1.239.498 - PE (2018/0019264-5)
AGRAVANTE : ESTADO DE PERNAMBUCO
PROCURADOR : PELÓPIDAS SAORES NETO E OUTRO(S) AGRAVADO : ISRAEL FERREIRA DA SILVA AGRAVADO : ZINEIDE MARIA DE SOUZA ADVOGADOS : JOSÉ AFONSO BRAGANÇA BORGES - PE012178 ANTÔNIO ELIAS SALOMÃO E OUTRO(S) - PE003208 RAFAEL AGUIAR SALOMÃO - PE021942
DECISÃO
Zineide Maria de Souza e outro ajuizaram ação contra o Estado de
Pernambuco e outros, pleiteando indenização em razão da morte de seu filho, decorrente de abordagem feita por policiais militares no Carnaval de 2006, que teriam torturado e espancado o menor, obrigando-o a pular no rio, onde morreu por afogamento. O pedido foi julgado procedente, condenando o Estado no pagamento de R$ 350.000,00 (trezentos e cinquenta mil reais) por danos morais e materiais, com a devida correção (fls. 702-708). Em grau recursal, o Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco manteve a decisão, consignando pela modulação dos juros, nos termos da seguinte ementa (fls. 794-796):
DIREITO CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. APELAÇÃO E REEXAME
NECESSÁRIO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. MORTE DE MENOR. ATUAÇÃO DE POLICIAIS MILITARES. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA. EXCESSO DO VALOR FIXADO. NÃO CARACTERIZADO. HONORÁRIOS MANTIDOS. JUROS DE MORA. ENUNCIADO 12/TJPE. REEXAME NECESSÁRIO PARCIALMENTE PROVIDO. PREJUDICADO O RECURSO VOLUNTÁRIO. DECISÃO UNÂNIME. 1. Com o fim de se eximir da responsabilidade de reparar o suposto dano, o Estado de Pernambuco alega que a sentença não analisou corretamente as provas coligidas aos autos, desprezando a versão conferida pelo oficial responsável pela operação policial e que, acaso assim tivesse feito, restaria reconhecido a ausência do nexo causal entre o evento morte e as ações de seus agentes, decorrendo, como consectário lógico, a necessidade dos autores o ônus de provar suas alegações. 2. Ao contrário do afirmado pelo Estado de Pernambuco, no caso concreto, entende-se que se afigura presente o nexo causal e de acordo com acordo com o preceituado no art. 37, parágrafo 6º da Constituição Federal, as pessoas jurídicas de direito público responderão pelos danos que os seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa. 3. A vasta documentação acostada e produzida nestes autos depoimentos prestados em juízo não deixam dúvida que o evento morte adveio dos atos praticados pelos agentes estatais. Como bem assentou o magistrado de piso, cabia ao Estado, através de agentes, o dever legal de garantir a integridade do menor falecido, haja Documento: 81680559 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 27/04/2018 Página 1 de 5 Superior Tribunal de Justiça vista o mesmo ter sido apreendido em atuação policial, ficando sob sua custódia, devendo, por assim ser, responder objetivamente nos termos do já prefalado artigo da carta Magna. 4. Também sem qualquer amparo a afirmação do recorrente quanto à necessidade dos autores trazerem aos autos laudos descritivos de seus estados emocionais produzidos por psicólogos ou psiquiatras. O superior Tribunal de Justiça tem posicionamento pacífico no sentido de que a perda de um ente querido implica, naturalmente, intenso sofrimento por parte dos familiares. O abalo moral, em casos tais, é presumido (in re ipsa), sendo desnecessária sua cabal comprovação. 5. O apelante noticia que não foi demonstrado cabalmente que a vítima menor contribuía para o sustento de seus familiares, sendo, portanto, indevida a condenação em danos materiais. Dessume-se da inicial que o menor falecido labutava para ajudar sua genitora nas despesas da casa e, no depoimento pessoal a mesma afirma que aquele vendia CD's. Segundo orientação traçada pelo Superior Tribunal de Justiça há de ser presumido o dano material em face de morte de filho menor que não exercia atividade remunerada e integrava família de poucos recursos, como nos casos dos autos. 6. O togado monocrático fixou o valor da verba indenizatória em R$ 350.000,00 (Trezentos e cinquenta mil reais), englobando o dano material e moral. Como sabido, em regra, não é cabível ao STJ examinar a justiça do valor reparatório fixado pela instância inferior, porquanto tal providência depende da reavaliação de fatos e provas, inclusive, aquele Tribunal, por essa razão, consolidou entendimento no sentido de que a revisão do valor da indenização somente é possível quando exorbitante ou insignificante importância arbitrada, em flagrante violação dos princípios razoabilidade e da proporcionalidade. Todavia, Analisando fato morte de menor, por circunstâncias menos aterrorizantes narrada nestes autos, o STJ tem entendido que indenizatório fixado pelo togado monocrático, tem se afigura razoável. 7. Por sua vez, no que diz respeito aos honorários advocatícios, entendo que o valor fixado, ou seja, 10% (dez por cento) sobre o valor da condenação, também não merece retoque. A verba fixada obedeceu aos critérios constantes no § 30 do art. 20, do CPC/73, não se afigurando irrisório nem extrapolativo. Houve observância ao grau de zelo do profissional do patrono dos autores, não restando, também, caracterizado qualquer desprestígio do trabalho executado, nem enriquecimento sem causa. Assim, a mesma se apresenta razoável e proporcional ao trabalho desenvolvido nestes autos. 8. Os juros de mora devem observar os índices discriminados no Enunciado no 12 do Grupo de Câmaras de Direito Público deste TJPE. 9. Reexame Necessário provido parcialmente apenas para estabelecer que os juros de mora devem obedecer os índices descritos no Enunciado 12 do Grupo de Câmaras de Direito Público deste TJPE. Recurso voluntário, prejudicado. Decisão unânime.
Os embargos de declaração opostos foram rejeitados (fls. 835-841).
O Estado de Pernambuco interpõe recurso especial, com fundamento no art. 105, III, a, da Constituição Federal, alegando violação do art. 944 do Código Civil, sustentando que o valor fixado a título indenizatório mostra-se exorbitante, em desconformidade com os parâmetros adotados por este Superior Tribunal de Justiça. Com base nos precedentes que cita, pugna pela redução da verba para o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais). Documento: 81680559 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 27/04/2018 Página 2 de 5 Superior Tribunal de Justiça Contrarrazões ofertadas (fls. 865-882). É o relatório. Decido. O inconformismo está centrado na fixação do valor de R$ 350.000,00 (trezentos e cinquenta mil reais) a título indenizatório em razão da morte de menor, filho dos autores, por atuação da Polícia Militar. De fato, esta Corte de Justiça procede à revisão de verbas indenizatórias em situações bastante excepcionais: quando a verba tenha sido fixada em valor irrisório ou exorbitante. Confiram-se alguns julgados no sentido:
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL
NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO CUMULADA COM INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. CONCESSIONÁRIA DE SERVIÇO PÚBLICO. FORNECIMENTO DE ÁGUA. COBRANÇA INDEVIDA. PRETENSÃO DE AFASTAR A RESPONSABILIDADE CIVIL DA CONCESSIONÁRIA E DE REDUÇÃO DO VALOR INDENIZATÓRIO. CRITÉRIOS ESTABELECIDOS PELO TRIBUNAL DE ORIGEM COM BASE NAS PROVAS DOS AUTOS. IMPOSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO. AGRAVO REGIMENTAL DA CONCESSIONÁRIA DESPROVIDO. [...] 3. Não exige reparos o acórdão recorrido no que se refere à revisão do valor fixado a título de danos morais, uma vez que o quantum fora estipulado pelo Tribunal de origem em razão das peculiaridades do caso concreto (princípios da razoabilidade e da moderação, proporção do dano, capacidade econômica e financeira das partes, grau de culpa do ofensor e a finalidade educativa da indenização). A revisão do valor a ser indenizado somente é possível quando exorbitante ou irrisória a importância arbitrada, em violação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, o que não se observa, in casu, diante da quantia fixada pelo Tribunal a quo em R$ 3.940,00 (sendo o valor dado a causa R$ 20.000,00). 4. Agravo Regimental da Concessionária desprovido. (AgRg no REsp 1368509/MS, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 28/03/2017, DJe 06/04/2017, g.n.).
AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL - AÇÃO DE
REPARAÇÃO DE DANOS - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE DEU PARCIAL PROVIMENTO AO APELO EXTREMO. INSURGÊNCIA DOS RÉUS. [...] 4. O valor estabelecido pelas instâncias ordinárias a título de indenização por danos morais somente pode ser revisto nas hipóteses em que o valor se revelar irrisório ou exorbitante, distanciando-se dos padrões de razoabilidade, o que não se evidencia no caso em tela. 5. Quanto ao pensionamento, cabe ressaltar que a jurisprudência do STJ consolidou-se no sentido de ser esse devido, mesmo no caso de morte de filho(a) menor. E, ainda, de que a pensão a que tem direito os pais deve ser fixada em 2/3 do salário percebido pela vítima (ou o salário mínimo caso não exerça trabalho remunerado) até 25 (vinte e cinco) anos e, a partir daí, reduzida para 1/3 do salário até a idade em que a vítima completaria 65 (sessenta e cinco) anos. Precedentes. Incidência da Súmula 83/STJ. 6. No tocante ao termo inicial dos juros moratórios em relação aos danos morais fixados, a jurisprudência deste Tribunal consolidou-se no sentido de que, Documento: 81680559 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 27/04/2018 Página 3 de 5 Superior Tribunal de Justiça como se trata de responsabilidade extracontratual, a sua incidência ocorre a partir da data do evento danoso, nos termos da Súmula 54 do STJ. Precedentes. Incidência da Súmula 83/STJ. [...] 9. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp 1287225/SC, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 16/03/2017, DJe 22/03/2017, g.n.).
ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO
NO RECURSO ESPECIAL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. QUANTUM INDENIZATÓRIO. REVISÃO. SÚMULA 7/STJ. AGRAVO INTERNO IMPROVIDO. I. Agravo interno interposto contra decisão monocrática publicada em 05/08/2016, que, por sua vez, julgara recurso interposto contra decisum publicado na vigência do CPC/73. [...] IV. Ressalte-se que a jurisprudência deste Tribunal permite o afastamento do óbice, previsto na Súmula 7/STJ, apenas na hipótese de fixação em valor irrisório ou abusivo, circunstância inocorrente, no presente caso. Nesse contexto, não sendo o caso de valor exorbitante, não há como afastar, no ponto, a incidência da Súmula 7/STJ. Precedentes do STJ. V. Agravo interno improvido. (AgInt no AREsp 873.844/TO, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEGUNDA TURMA, julgado em 16/03/2017, DJe 27/03/2017, g.n.).
Para afastar tal óbice, seria necessário um confronto com outros
precedentes análogos com vistas à caracterização da alegada excessividade. Ocorre que o caso apresenta uma peculiaridade: o fato de ter sido definido o respectivo valor de forma cumulativa, ou seja, somando-se os danos morais e materiais, verbis (fl. 708, g.n.):
Ante o exposto, julgo PROCEDENTE o pedido dos autores e condeno o
Estado de Pernambuco ao pagamento de R$ 350.000,00 (trezentos e cinquenta mil reais) com o fito de indenizar os mesmos pelos danos morais e materiais sofridos em decorrência da perda do filho adolescente, vítima da conduta criminosa dos agentes estatais
Esse entendimento foi replicado pelo Tribunal a quo (fl. 795):
O togado monocrático fixou o valor da verba indenizatória em R$
350.000,00 (Trezentos e cinquenta mil reais), englobando o dano material e moral.
Dessa forma, ao englobar os dois tipos de dano em uma só verba, sem
fazer a especificação/distinção sobre cada um deles, a hipótese é singular, no que as decisões invocadas pelo recorrente como paradigma a tanto não se prestam, já que Documento: 81680559 - Despacho / Decisão - Site certificado - DJe: 27/04/2018 Página 4 de 5 Superior Tribunal de Justiça fazem referência somente aos danos morais, não havendo como viabilizar a caracterização da similitude necessária para o fim pleiteado. Ante o exposto, com fundamento no art. 253, parágrafo único, II, a, do RI/STJ, conheço do agravo para não conhecer do recurso especial. Publique-se. Intimem-se. Brasília (DF), 26 de abril de 2018.
MINISTRO FRANCISCO FALCÃO
Relator
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