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A Metodolo9ia da Pvoblematização e os

t::.nsinamentos de PaV\lo I-veive :


V\ma velação mais qV\e pevfeita 1

eusi Aparecida avas Berbel '

"e) mundo não é. () mundo está sendo. Como subjetividade

curiosa, inteligente, inrcrfcridora na objetividade com que


diulcricamcnrc me relaciono, meu papel no mundo nâo

é: sú o ele quem constata o que ocorre mas rarnhóm


o de quem intervem COIllO sujeito de ocorrências,"

Paulo Frcire

IN'I'IH )J)Uçi\()

Tratar da Metodologia da Problematizaçâo é um grande


prazer, mas falar sobre os ensinamentos de Paulo Freire é uma
incumbência difícil. Difícil quando ele próprio nos falou, através
dos videos, que assistimos ontem. Difícil quando grandes
conhecedores do seu pensamento já se pronunciaram e difícil
quando sabemos da sua imensa obra - 25 livros escritos em 42
anos de intenso trabalho e muitas outras publicações revelando
seu pensamento.
Pensar em sintetizar os seus ensinamentos em uma hora
de conversa é impossível e seria uma pretensão dizer que
iríamos fazer isso. Mas aceitamos esse convite para esta
palestra como mais um desafio e foi muito bom tê-I o aceito
porque nos permitiu aprender muito com a oportunidade de
prepararmos esta reflexão para estarmos aqui hoje
conversando com vocês.

I Palestra apresentada, com o título original de "A relação entre a Metodologia da


Problcrnatiznçâo e os ensinamentos ele Paulo Frcirc" no dia "I3/nó/97. durante a
Semana Paulo Frcirc, promovida pelo Departamento dc Lducaçâo - CJ·:CA/Ur,:L.
Para efeito desta publicação, o texto passou por ajustes c correções.
2 Doutora em r;ducação, Professora do Departamento de Educação da
Universidade Estadual de Londrina.
Temos trabalhado com a Metodologia da Problematização Vamos caracterizar a Metodologia da Problematização
e a temos divulgado também em todos os lugares que podemos. ai ravés das etapas do Arco de Maguerez e depois vamos trazer
Na revista SEMINA (1995 e 1996) procuramos, nos artigos algumas idéias dos ensinamentos de Paulo Freire para
que escrevemos, explicar como vimos entendendo e elaborando .stabelecer relações entre elas.
a Metodologia. Na SEMINA de 96, -buscamos também fazer a
relação com o conceito de práxis e a formação da consciência da As ETAPAS D/\ MI·:TODOLOGI/\ DA PROI3LI·:.\It\TIZ/\ÇAO r·: SU/\S
práxis, a partir de Vázquez (1977). Ci\RACTERís-r·ICt\S I3AsICAS.

Entre Vázquez e Paulo Freire encontramos vários


pontos convergentes, pelo fato de que ambos se apoiarem o Arco tem como ponto de partida a realidade vivida,
na dialética marxista. Cada um tem a sua característica, mas aquela parcela da realidade onde o tema que está sendo ou
têm pontos comuns que fomos encontrando, na medida em será trabalhado está acontecendo na vida real. Então, o ponto
que fomos revendo os textos de Paulo Freire. E ao rever de partida dos estudos é a realidade e o Arco prossegue,
alguns textos, nestes últimos dias, pudemos fortalecer com passando pelo estudo e vol tando para essa mesma realidade.
maior clareza, fundamentos teóricos para a Metodologia da Quais as etapas desta Metodologia da Problema-
Problematização, conforme a linha que temos seguido. tização que se utiliza do Arco de Maguerez? Ao desenvolver
Paulo Freire defendeu sempre uma Educação_ trabalhos com esta Metodologia, os alunos ou os participantes
yroblematizadora, uma Pedagogia problematizadora, ~a que são levados a observar a realidade de uma maneira atenta e
contrapondo-se à educação bancária ou à pedagogia bancária irão identificar aquilo que na realidade está se mostrando
pudesse servir para libertar o homem dos seus opressores e como carente, inconsistente, preocupante, necessário, enfim,
pudesse servir para a emancipação do homem, para a sua- problemático. O que está acontecendo ali de destoante,
humanização. - discrepante? Esses elementos são extraídos da realidade.
Bordenave e Pereira(1982), sem muito teorizar Neste momento os alunos estão problematizando a
inicialmente, utilizaram-se de um esquema de trabalho realidade. Com seu olhar atento, estão verificando o que é
construído por Charles Maguerez - o chamado Método do que há ali que precisa ser trabalhado, corrigido, aperfeiçoado.
Arco, para escrever textos que deram origem ao livro didático E daí, então, a partir de todos os aspectos verificados nesta
para formação de professores, chamado Estratégias de Ensino- realidade, é eleito um deles para ser investigado e para ser
Aprendizagem. De Maguerez não tivemos mais notícias, mas elaborada uma redação que expresse o problema. Ou então
no esquema construído por ele encontra-se um caminho são eleitos vários dos aspectos e vários problemas podem
metodológico capaz de orientar a prática pedagógica de um ser trabalhados.
educador preocupado com o desenvolvimento de seus alunos e Quando se trabalha com esta Metodologia com turmas
com sua autonomia intelectual, visando o pensamento crítico de alunos, tanto podemos eleger um tema, um problema para
e criativo e também a preparação para uma atuação política. ser trabalhado por toda a turma, quanto podemos eleger
Com este esquema que vou mostrar para vocês, é possível vários problemas e cada grupo ou pequeno grupo vai trabalhar
trabalhar por uma educação que gradativamente prepara o ser com um diferente. Por exemplo, temos trabalhado o tema
humano para ser cidadão e para se humanizar. avaliação com os alunos de Pedagogia e os grupos tomam

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di ferentes ângulos da avaliação que são problemáticos, para chave definidos para esclarecer o problema. Por quê? Porque se
estudar, a partir do observado na realidade das escolas onde pretende trabalhar com o problema para buscar solução para ;le.
elementos dos grupos atuam. Desde o início já fica bastante claro que todo o estudo levara o
Muito bem, definido um problema de estudo através da grupo à solução do problema, ou pelo menos ao encaminhamento
observação da realidade vivida, da realidade concreta, real para uma solução.
mesmo, então se faz um trabalhá de reflexão buscando-se O estudo todo é feito pelos alunos / participantes /
identificar quais os possíveis fatores que estão associados ao professores, en fim, pelas pessoas que queiram trabalhar com
problema, ou seja, por que será que existe esse problema esta metodologia. Pode ser um grupo de pessoas que quelra
identificado na realidade? O que será que o gerou? E quando resolver problemas de trabalho. Temos depoimentos sobre
encontramos algumas respostas, de fatores diretamente vários casos. Das possibilidades e dos resultados já temos
relacionados ao problema, continuamos perguntando: por que
certeza absoluta.
será que eles existem? Por que esses fatores foram gerados ou Depois de todo o estudo realizado, após aprofundarem
estão gerando esse problema? Então nós vamos, com os porquês, seus conhecimentos sobre o problema naqueles aspectos
avançando e aprofundando a busca das razões da existência do definidos na etapa dos pontos-chave, os alunos ou
problema. É com estas reflexões que os alunos são levados a
participantes comparam com as suas percepções iniciais,
levantar, ou definir, com os conhecimentos que têm naquele
possibilitando então rever pontos que agora ficaram mais
momento inicial do seu estudo, alguns pontos a estudar.
claros, mais elaborados, ou então fortalecer aspectos que
A definição do que estudar vai caracterizar a segunda
antes já eram tidos assim, de forma não muito científica,
etapa que é a dos Pontos-chave. Esta etapa estimula um
momento de síntese após a análise inicial que foi feita; é o mas estavam corretos.
Percebe-se, pelo estudo, que alguns aspectos devem
momento da definição do que vai ser estudado sobre o
ser mantidos, ou então realiza-se a revisão de pontos que
problema; é o momento de definir os aspectos que precisam
ser conhecidos e melhor compreendidos a fim de se buscar antes estavam mais ao nível do senso comum, ou seja, pelo
uma resposta para esse problema. estudo aprofundado, técnico, científico, legal, histórico,
Depois disso novamente se pergunta: como vamos filosófico e tc., é possível às pessoas que estão estudando
estudar? Este é o momento de escolha da forma do estudo e rever as suas posições e aprofundar conhecimentos, ter uma
das fontes de informação. Vamos buscar informações na consciência muito maior daquele problema e de sua influência
biblioteca, nos livros, nas revistas, nos relatórios de pesquisa, sobre o meio social.
nos programas de governo, nos arquivos, com especialistas, A partir do estudo, com a análise e a discussão dos
com professores que entendem do assunto, com a população, dados colhidos e as conclusões a que se pode chegar, está
com outros colegas etc. Vamos aplicar questionários, realizar terminada a Teorização e caminha-se para a etapa seguinte
entrevistas, solicitar depoimentos etc. Enfim, aqui se define que é o momento de elaborar as Hipóteses de solução.
a metodologia para realizar o estudo propriamente dito, na Esta deve ser uma etapa bastante criativa. Essa
etapa da Teorização. criatividade deve ser estimulada. Por quê? Porque se aquilo
Repetindo, a Teorização vai ser o momento da que se tinha e sobre que se agia, permitia que os problema:
investigação, do estudo propriamente dito, daqueles pontos- existissem, se os alunos ou professores, da maneira como Ja

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conheciam o assunto e já o trabalhavam, puderam perceber professores do Centro de Ciências da Saúde - CCS/UEL
novos problemas (às vezes não são novos os problemas, mas começou em 1992, na área da saúde, com um projeto especial
como temos trabalhado com professores, pedimos a eles que de ensino chamado PEEPIN, do qual participamos.
procurem identificar os problemas que eles mesmos estão A partir dai começamos um trabalho teórico-prático em
vivendo na sua sala de aula, n'1 sua escola), devem ser torno do Arco de Maguerez. Com esta (re)construção que vimos
criativos, devem superar aqueles conhecimentos e aquelas fazendo gradativamente, procuramos aplicar a Metodologia, ver
ações anteriores para poderem realizar alguma mudança seus resultados e ao mesmo tempo buscar seus fundamentos
naquela parcela da realidade. teóricos para justificá-Ia. E agora, hoje, estamos acrescentando
Isso significa que essas hipóteses devem ser bastante mais uma etapa neste trabalho. Buscamos nos ensinamentos
criativas no sentido de que é preciso ter ações novas, ações de Paulo Freire aspectos que estejam diretamente associados a
diferentes, elaboradas de uma outra maneira para se poder esta idéia que vimos trabalhando, isto é, desenvolver a
exercer uma di ferença na realidade de onde se extraiu o Metodologia da Problematização.
problema. Todas as possibilidades pensadas e elaboradas
devem ser registradas. A PRClI:lI.I·:IVI/WI/,M;Jio I'NQU/\NHJ UMA MI':'J'ODOI.OGIA Dh I·:NSINO

De posse das Hipóteses de solução, a próxima etapa é


da Aplicação à realidade. É uma etapa de prática, de ação Autores como Paulo Frei r e, José Carlos Libâneo,
concreta sobre a mesma realidade de onde foi extraído o Dermeval Saviani e outros têm apontado para a importância
problema. Então vejam: da realidade extraiu-se o problema, de uma Educação Problematizadora e para uma
sobre o problema foi realizado o estudo, a investigação e Pedagogia Problematizadora, ressaltando principios
toda uma discussão sobre os dados obtidos e, por fim volta- teóricos e sua justificativa, inspirados na concepção histórico-
se para essa mesma realidade com ações que a possam crítica da Educação.
transformar em algum grau. A finalidade maior é promover, Para realizar/concretizar uma concepção pedagógica é
através do estudo, uma transformação, mesmo que pequena, preciso lançar mão de meios adequados e coerentes com seus
naquela parcela da realidade. principios. O método do Arco de Charlez Maguerez, apresentado
Este é o esquema do Método do Arco de Maguerez, por Bordenave e Pereira, apresenta-se como uma idéia
que foi utilizado por Bordenave e Pereira (1982). Este arco metodológica bastante apropriada para se experimentar na
ficou como uma possibilidade à disposição das pessoas que prática vários princípios de uma Pedagogia Problematizadora,
lidavam com esse livro ao longo desses anos. A área da saúde visando uma educação transformadora da sociedade.
utilizou-se bastante do esquema, principalmente na Entendemos o esquema de Maguerez como o desenho
enfermagem, para treinamento de técnicos, auxiliares de de um método, - para o qual esse autor não nos deixou outras
enfermagem, e depois, na formação de enfermeiros no terceiro explicações -, e através do uso desse esquema no Ensino
grau também. Mais recentemente, nos últimos anos é que Superior, passamos a desenvolver um conjunto de explicações/
vimos explorando esse esquema como caminho metodológico interpretações para cada uma de suas etapas, para suas
para o ensino de primeiro, segundo e terceiro graus, mais características e para o significado com o qual desejamos ver
abertamente, iniciando com o trabalho que um grupo de esse método aplicado no ensino de 1° ao 3° Grau, na Formação

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Continuada de professores e também de outros profissionais de questionários, novas observações, consulta a fichários, leitura,
da Educação. resumo de livros, de artigos etc. Há uma ampla gama de alternativas
Vimos tratando de metodologia e não de pedagogia capazes de colher os dados que precisamos para compreender e
problematizadora ou educação problematizadora, como Paulo discutir o(s) problema(s).
Freire o fez, porque acreditamos, que, além dessa forma de Quando chegamos na fase da Aplicação à realidade,
trabalhar dentro da perspectiva de uma pedagogia dependendo do problema, das condições do grupo e das
problematizadora, existem muitas outras. O próprio método características da realidade, é preciso fazer um plano de
de alfabetização utilizado por Paulo Freire é um caminho atuação. Nesse momento cada grupo vai eleger a forma, os
apto para promover uma educação problematizadora e não procedimentos mais adequados, para realizar uma intervenção
nesta realidade para transformá-Ia em algum grau. Por
se utiliza exatamente do esquema do Arco. Então, a
exemplo, reunir pessoas para estudo, encaminhar cartas,
pedagogia problematizadora pode acontecer através de
publicar resultados, fazer palestras, elaborar cartazes, montar
diferentes caminhos. Diferentes caminhos que sejam
dramatizações de situações educativas, orientar condutas etc.
alinhados aos principios da concepção histórico-crítica,
Dizemos que a transformação será em algum grau
logicamente! Este é um caminho possível.
porque, dependendo do tipo de alunos que ten h am o s ,
Além disso, também chamamos de Metodologia
devemos esperar um certo nível de elaboração. Por exemplo,
porque nesse percurso, nesse caminho, através do Método
se estamos trabalhando com alunos do primeiro grau, temos
do Arco, a gente tem um conjunto de técnicas, procedimentos uma expectativa di feren te da que podemos ter se estivermos
e atividades que são organizadas para fazer um todo desse trabalhando com alunos do terceiro grau; e se estivermos
Arco, para iniciar o trabalho e completá-Io. Às vezes, trabalhando com professores do terceiro grau, a nossa
completar o estudo de um problema significa um reiniciar de expectativa pode ser de uma resposta mais complexa, mais
outros arcos, com os outros problemas que foram profunda. Se o grupo for de profissionais, por exemplo,
identificados durante o estudo. Então, temos, por exemplo, diretores de escolas, que têm um poder de decisão, que têm
como técnicas, a observação atenta, sistematizada, da elementos em mãos para tomar decisões, as condições no
realidade. Sobre os dados observados há todo um trabalho estudo são diferentes das de uma turma de 5" série de 1°
de discussão, de seleção, de eleição daquilo que é ou não Grau. Cada tipo de grupo vai definir um tipo de atuação
prioritário para ser estudado, do que é importante ou não é. possível e um grau diferente de intervenção na realidade.
Formula-se um problema de estudo, como uma Uma coisa que é possível afirmar para vocês desde já e
atividade de síntese. E aí vamos caminhando, questionando, sobre que eu tenho certeza, vocês vão concordar comigo, é que
refletindo, elegendo pontos-chave, que é um novo momento a Metodologia da Problematização tem um potencial imenso.
de síntese. Além disso, na Teorização, pela natureza do Vocês encontram explicações e exemplos em textos das duas
problema e da área de conhecimento em que se situe, vamos edições especiais da revista Sernina da UEL, de out./95 e nov./96 e
utilizar para seu estudo, técnicas e procedimentos adequados, nos dois livros intitulados "Metodologia da Problema-
nem sempre possíveis de serem previstos antes de se iniciarem os Lização..."(1998 a e 1998 b) AJj procuramos explicar a Metodologia
estudos, como exemplo: realização de entrevistas, solicitação de Ia Problematização com o entendimento que vamos tendo a cada
momento.
depoimentos, gravação, transcrição, análise de conteúdo, aplicação

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Provavelmente agora, com esta releitura de Paulo Freire, dependência, da submissão, da passividade, libertação de diversas
deveremos estar avançando um pouco nessa construção. Mas, WTIa formas de opressão. Uma educação problematizadora vai voltar-
coisa que estávamos dizendo e sobre que, temos certeza, vocês vão se para esse fim, para servir de libertação do ser humano, pelo
concordar conosco é que a Metodologia da Problematização é um conhecimento, pela ampliação da consciência.
recurso, um poderoso recurso metotlológico, para concretizar os A educação deve volta r-se parei a transformarão da
princípios teóricos e filosóficos de uma educação progressista e realidade. Ouvimos isto várias vezes esta Semana. Mas ... o
humanizadora, desde que estes princípios façam parte da homem só transforma a sua realidade quando ele próprio se
intencionalidade e do modo de ser do educador, pois não será transforma. Para isso a educação é importante, para que o
o mesmo se ela for utilizada como apenas mais uma técnica. homem se torne humanizado, para poder atuar como homem
Sintetizando, a Metodologia da Problematização tem uma no seu meio, na sua base. A Metodologia da Problemarização
orientação geral como todo método, dirigida por etapas distintas permite a transformação do sujeito que dela participa, pelas
e encadeadas a partir de um problema detectado. Encontra uma inúmeras elaborações intelectuais que realiza, de forma
fundamentação teórica na concepção de educação histórico- associada à percepção social, política, ética etc. da realidade,
crítica e constitui-se uma verdadeira metodologia entendida dependendo do objeto de estudo.
esta como um conjunto de métodos, técnicas, procedimentos O educador deve fazer sua arão educa tiua a partir das
ou atividades intencionalmente selecionados e organizados para razões do aprendiz e isso nós ouvimos ontem várias vezes
realização do propósito maior que é preparar o estudante/ser pelo Prof. José Misael do Valle. Disse ele que Paulo Freire
humano para tomar consciência de seu mundo e atuar também nos recomen d ava: "O proJessor J. tem que outnr. os a / unos. "
intencionalmente para transformá-Io, sempre para melhor, para Ouvir o quê? Ouvir o que ele sabe, o que ele precisa, o que
um mundo e uma sociedade que permitam uma vida mais digna ele quer, o que ele pergunta. Colocar o aluno para observar a
para o próprio homem. realidade, decidir o problema de estudo, os aspecros do
problema que julga necessários estudar e todas as outras
ALGUM/\S I.IÇOI·:S DI': 1,:oUCi\çAO hM PAULO FRI·:IRJ·: I': SUA RI" ..i\C;;\O elaborações que vai realizando é uma forma intensa de dar a
COM A MI'TOOOLOGII\ DA PROBLEMATIZAÇAo palavra ao aluno, permitindo sua expressão e valorizando-a.
Outra idéia é a de que aprender é apreender a razão de
A partir de agora vamos relembrar ensinamentos de ser do próprio objeto que se qmr aprender. Para isso é preciso
Paulo Freire, alguns apresentados por ele mesmo, cerca de sair das primeiras percepções sobre o objeto, que no caso
um mês antes de sua passagem (03/97), através da entrevista aqui é um problema, um aspecto da realidade e partir para
que deu a uma repórter de TV e a que assistimos na abertura um estudo mais aprofundado. Sair do senso comum e partir
desta Semana e depois vamos associando gradativamente as para o conhecimento elaborado. Apreender a razão de ser
suas idéias com o Arco de Maguerez já apresentado. para aprender a estrutura daquele tema, daquele problema,
Uma das lições que Paulo Freire nos ensinou é que a daquele aspecto da realidade. Paulo Freire nos faz lembrar a
educação deue servir para a libertação do ser humano. Que tipo fenomenologia, que indica que precisamos sair das percepções
de libertação? Libertação da ignorância, da escravidão, da primeiras e ir aprofundando os conhecimentos sobre o objeto
que estamos estudando e ir gradativamente nos aproximamos

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de sua essência. Esse caminho é perfeitamente possível, quando Paulo Freire também nos disse que não basta que o assunto
saímos da observação da realidade e depois passamos pela JeJa sZf!,Il~ficativopara o alu no enquanto indivíduo, mas é preciso
Teorização, onde aprofundamos conhecimentos, através de uma que seja sip,1lZjicati1JOpara o planeta. Que significa isso para
investigação. nós? Cremos que o estudo deve ser o despertar do cidadão, o
O educador deue ser 1Jigilal1te. Ouvimos isso também despertar do cidadão do mundo, não só o indivíduo localizado
através das palavras de Paulo l~reire na entrevista a que aqui e agora, mas o indivíduo que, em algum momento, poderá
assistimos na segunda-feira. A vigilânâa do educador transcender do seu meio mais próximo e sair para o mundo,
democrático é a de buscar a coerência entre o seu discurso e grande como ele é. Então, quando ele diz que o assunto deve
sna ação, entre a teoria e a prática. Esta tem de ser a vigilância
ser significativo para o planeta, ele nos chama a atenção para o
maior do educador, porque é muito fácil aderirmos às idéias
significado dos conteúdos que estamos propondo no dia-a-dia
e é muito complicado sermos coerentes, na nossa ação, com
para nossos alunos. Para quem servem aqueles conteúdos? São
as idéias às quais já aderimos, pelas quais nos apaixonamos,
significativos para quem? Será que são significativos para o aluno?
e as quais defendemos no discurso etc. Essa é uma chamada
- Já é uma grande coisa. Além disso, será que o aprendido, que
para nós, o tempo todo. Através da Metodologia da
tem a ver com o nosso aqui e agora, tem também relação com o
Problernatização, chegamos a uma ação prática transformadora,
que está acontecendo em outras partes do mundo? Por que
fruto da teoria trabalhada, passando antes pelas hipóteses de
solução elaboradas pelos próprios alunos. A relação entre a não nos preocuparmos com isso? O estudo sobre a realidade
teoria e a prática vai-se intensificando. associado à teoria já elaborada sobre o assunto é um modo de
Outra afirmação é que o aluno só aprende quando se transitar do próximo para o distante e do distante para o
envolve profundamente com a situ açdo. Isso também nós próximo, das partes para o todo e do todo para as partes,
ouvimos esta semana. Através da Metodologia da ampliando a condição de pensamento e de ação do estudante-
Problematização, há um envolvimento gradativo do aluno. cidadão.
A percepção primeira dele com o seu olhar sobre a realidade Outra chamada que 'ele nos fez é que lia era da injórlllaçclo,
vai-se aprofundando à medida que ele se pergunta os porquês os conhecimentos enuelbecem muito rapidamente. Mai s
daquele problema, define o que ele precisa estudar sobre o importante do que as informações, que na educação bancária
problema e vai ao estudo, realiza a pesquisa, a investigação são em geral memorizadas, é levarmos os nossos alunos a pensar,
propriamente dita. Ele vai-se envolvendo gradativamente com pensar a realidade e pensar a realidade criticamente. Repetindo:
o seu objeto de estudo e esse envolvimento cresce a tal ponto fazer pensar, pensar a realidade e criticamente. Pela Metodologia
até que ele chega a uma ação correspondente aos pensamentos da Problematização os participantes são levados a olhar a
gerados pelo estudo. Esse envolvimento o leva a fazer a realidade e começar a pensar sobre ela, pergLilltar-se pelas razões
relação entre a teoriae a prática, saindo de uma prática observada do que está acontecendo ali que lhes parece problemático -
e caminhando para urna nova prática agora elaborada pelos alunos. as ações problemáticas - e continuar a pensar refletida e
Há o desejo de agir, há a vontade, a determinação de agir de alguma criticamente através de todo o estudo que é realizado. Continua
maneira, porque ele fez o estudo teórico e muitas vezes também o sendo reflexivo e crítico até escolher uma ação capaz de
estudo empírico sobre o assunto, tendo a oportunidade de elaborar
modificar essa realidade em algum grau. Vejam que poderoso é
suas próprias idéias.
esse caminho na mão de um educador com a intenção de

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humanizar seus alunos! E combina perfeitamente com o que A escola tem que ser o /u,-f,ar da transcendência, tem que
Paulo Freire nos coloca. ser o lugar de pe1Zsar. Transcender significa estar sempre se
Isso significa que pensar e pensar a realidade criticamente superando. É para isso que a escola deveria existir e funcionar.
vai enfatizar aquele aspecto que nós colocamos ali, de você estar Além disso, disse Paulo Freire, a aprendizagem é facilitada se os
constantemente buscando os porquês, ao invés de aceitar que a novos con hecimentos são associados aos conhecimentos
coisa é assim e ponto. Não é tssim! Podemos perguntar de anteriores. Quando nós olhamos a realidade com os nossos
outra forma: Por que é assim? Por que isso aconteceu? Onde? olhos neste momento e passamos a questionar isso, e a conversar
Quando? Como? Por quem? Se essas pessoas construíram e a discutir e a lembrar etc., temos uma primeira visão dessa
assim, é possível que outras em outro momento, em outras realidade. Aí nós vamos buscar os dados elaborados, ou os dados
condições, construam de outra maneira. Esses porquês é que que estão sendo vividos, concretos, reais, para associar, para
vão levar a pensar criticamente a realidade e quando a pessoa se comparar, para reforçar ou para substituir a nossa visão anterior,
instrumentaliza com a habilidade de pensar, ela pode pensar mas existiu uma visão anterior como ponto de partida. Então,
outros temas, em outros momentos, em outros lugarcs, já que se eu tenho esse ponto de partida descrito, redigido, consciente,
ela tem essa habilidade com ela, dela. Os conteúdos eu tenho elementos para fazer essa associação constan temente.
memorizados são trocados constantemente pela necessidade de O resultado da teorização deve ser principalmente essa revisão
armazenar outros novos, mais atraentes, mais atuais etc. A ou este fortalecimento do pensamento inicial existente. Esta
habilidade de pensar não é substituída, mas ampliada associação é possível de ser feita porque partimos de um ponto
constantemente, com o exercício. Isso pode ser provocado pela real, do pensamento e do conhecimento existente nas pessoas.
Metodologia da Problematização. Fazemos a observação, definimos um problema,
Nessa linha de pensamento, Paulo Freire afirma para nós perguntamo-nos as causas e os determinantes, fazemos a
que formar é limito mais que treinar. Quanto a isso não há o teorização, a análise, e chegamos a uma nova ação. A
que comentar, porque sabemos muito bem a diferença entre aprendizagem que acontece nesse caminho vai permitir uma
treinar para alguma ação e formar. Agora, uma outra coisa quc associação e uma superação dos conhecimentos por conta
do envolvimento que o aluno tem.
reforça o trabalho neste caminho é que o ser IItI/1/anoé /111/ ser
Paulo Freire declarou amar os homens, amar as plantas,
inconclaso, daí a sua busca contínua. Nós estamos sempre em
os bichos etc. Além de amar os homens ou por amar os
um processo de aperfeiçoamento, estamos sempre em um
processo de vir a ser, de vir a ser mais, de vir a ser melhor. Isso homens, Paulo Freire acreditava na capacidade criadora de
significa uma mensagem tão importante que justifica estar todos os seres humanos, mesmo o mais alienado. O mais
constantemente buscando alterar em algum grau a realidade, porque alienado dos homens tem um potencial criador com ele e se
ela pode ser alterada. Nós podemos nos transformar, então nós ele não o faz é por falta de oportunidades, por falta de condições.
podemos também transformar a realidade, porque somos seres Daí a sua bandeira sobre a necessidade de atuar sobre a realidade
inconclusos e a realidade é uma realidade em permanente social para transformá-Ia, para que não haja situações de
transformação, em permanente movimento, em construcão. dominação que impeçam o homem de ser homem. Se refletimos
Principalmente a realidade social! Principalmente a realid'ade profundamente sobre cada uma dessas mensagens, temos pistas
cultural, onde a escola se insere, e neste sentido, é preciso manter de um caminho para nos humanizar. Com o simples ato de
essa busca através da educação, como lemos em Paulo Freire. pensar sobre elas.

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A HUl\[t\NJZr\çAo DO HO~[Hr "M P/\ULO FREJR" I, 1\ CONTRII3UIc,:/\O I' 'r cbcr como é que a realidade reage à nossa intervenção, à nossa
POSSíV"L D/\ Mln"ODOI.OGIt\ DA PR()BI.E~lt\TJZI\CA() ,I 'ao transformadora.
Outra passagem: umas das características do homem
As lições apresentadas até aqui são características ( {file somente ele é homem (p.25). Entre os animais, os
gerais do pensamento de Paulo Freire, que ouvimos nesta lobos não são os únicos animais porque existem os cavalos,
Semana. A partir de agora, gostaríamos de nos apoiar c xis te m os leões, existem os tigres, os elefantes. Mas o
especialmente em alguns textos de dois livros de Paulo Freire. horncrn, somente ele é homem. Somente ele é capaz de tomar
Não necessariamente na ordem em que foram escritos e distância frente ao Illtllldo} olhar a realidade, somente ele
apareceram para nós, mas pelos temas que eles tratam. Um po le distanciar-se do objeto para a d mi rá-Io. CO/l/O
deles é o livro "Canscienriraçào: teoria e prática da liber/apào} couseqiiência, os homens são capazes de agir conscientemente
ri nra ill!rodllÇ"ão ao pellsallleNlo de Pa/llo J ireire" (Editora sobre a realidade obietiuada (p.25). Só o homem é capaz de
Moraes, 3.ed.,1980). Nele vamos encontrar, entre outras luzcr isso. E com isso Paulo Freire nos mostra a grandeza
mensagens, a sua abordagem sobre a formação da consciência lue é ser Homem, ser Ser Humano.
crítica, essencial para a pedagogia p ro b lcm a ti z a d o ra. () Vejam, o homem é capaz de distanciar-se do objeto,
segundo é "A /)eda<~0l!)ado oprimido "} que em 1983 já estava -nião, quando eu proponho a meus alunos do mestrado olharem
na 13" edição, peja Edi tora Paz e Terra. N esse livro vamos para os problemas de ensino que eles estão vivendo, eles fazem
encontrar, num dos capítulos, as características da pedagogia 11111 certo distanciamento do problema quando colocam o
pro blema tizadora. problema por escrito e começam a pensar e a estudar sobre ele.
Reunindo alguns ensinarnentos dos dois livros, vamos Para quê? Para agir conscientemente sobre essa realidade que
fazer esta associação, da formação da consciência crítica ele próprio vi vencia, para transformá-Ia. É precisamente isto a
necessária para uma educação problematizadora. No livro /míxis hum an a.
COlIsúentização vamos encontrar a elaboração que Paulo Freire Para aqueles que já ouviram falar sobre práxis, em
fez sobre a importância social do desenvolvimento da consciência Paulo Freire vamos encontrar esse conceito impregnado em
do homem através da educação. Lia obra, assim como o encontramos em Adolfo Sanches
Uma das passagens é a seguinte: a edncaçào como Vázquez e os dois fizeram a leitura em Marx. "A. práxis bamana
prática da liberdade é tl1l1 ato de conbecin/ento, uma (' ri unidade indissolúoe! entre a lIIillha ação e a minb a reflexão
aproximação crítica da realidade (Freire,1980, p.25). Que relação sobre o mimdo", afirma Paulo Freire (1980, p.25). Sobre uma parcela
podemos fazer entre essa afirmação com o Método do Arco? do mundo, pois a cada momento nós estamos olhando para uma
A associação é evidente com o Arco como um todo. A educação parcela da realidade, uma parte do mundo.
como prática da liberdade e como um ato de conhecimento, Aqui o conceito de práxis é o de uma unidade
uma aproximação crítica da realidade é possível pela Metodologia inclissolúvel entre a minha ação e a minha reflexão sobre o
da Problernatização, A aproximação da realidade faz-se no primeiro mundo. O outro conceito é que a práxis é a reflexão e ação dos
momento quando vamos olhar intencionalmente para descobrir o homens sobre o mundo para transfor má-Io. V ázquez (1977,
que ela tem e continuamos com o olhar crítico sobre a realidade I .3-5) reforça essa idéia afirmando: a práxis é úma atividade
até constatarmos que podemos fazer alguma coisa sobre ela e consciente e intencionalmente transformadora. Se não tiver essas

16 17
características é uma prat1ca, simples prática. Mas dentro do chegando a uma percepção crítica daquele objeto, informada,
pensamento marxista, dentro da Filosofia da Praxis, com Adolfo analisada, refletida. A conscientização passa por esse processo,
Sanches Vázquez e pela elaboração por Paulo Freire, é preciso quando saímos da primeira percepção e vamos aprofundando o
ter a intencionalidade de transformar a realidade, e a gente só conhecimento sobre aquele objeto de uma maneira crítica e
pode fazer isso refletindo intenci;nal e conscientemente sobre reflexiva. Essa conscientização não pode existir fora da práxis,
a prática anterior para ter uma nova prática. E não é esse o ou melhor, sem o hábito da ação-reflexão.
Esta unidade dialética constitui de maneira permanente
desenho do Arco de Maguerez?
o modo de ser ou de transformar o mundo que caracteriza o
A conscientização para Paulo Freire implica, pois, que
Homem. O estudo que se faz visa transformar aquela parcela
ultrapassemos a esfera espontânea de apreensão da realidade.
da realidade; isso se faz pela ação e reflexão constante, e
Vejamos: quando nós, olhando pela primeira vez para uma
Paulo Freire diz que esse é o modo de ser do ser humano, de
determinada realidade - digamos que nós vamos à escola para
agir para transformar. E a conscientização, diz ele, só acontece
fazer uma observação sobre o que acontece em uma sala de
se nós aliamos a reflexão à ação. A pura ação nem sempre é
aula, ou vamos observar o que está acontecendo com um grupo
rran s fo r mad o ta. Ela pode ser repetitiva, pode mudar a
de pessoas reunidas com alguma finalidade - a primeira
aparência e não transformar nada.
percepção que temos é a primeira percepção, nada mais que Paulo Freire diz também que conscieuti-ração é /./?7I
isso. Então Paulo Freire nos diz que é preciso que ultrapassemos compromisso bisrárico, A conscientioaçâo está baseada na
a esfera espontânea de apreensão da realidade para cbegar/llos relação consciência - mnn do (1980, p.26). O ser que estuda,
a !lma esfera critica na qna] a realidade se dá como objeto estuda o mundo. Mas consciência de quem? Professores,
cognoscive! e na qual o homem asstoue uma posição alunos, pessoas, na sua relação com aquela parcela da realidade,
epistemológica (Freire, 1980, p.25). Bem, é preciso tomar aquela no nosso caso- a educação, a escola, o ensino, a sala de aula.
realidade para estudo, para poder superar aquela percepção Quanto mais conscienti-rados nos tornamos, mais capacitados
primeira, que às vezes é apenas uma percepção da aparência, e rstamos (p.28), e isso nós ouvimos ontem de novo.
começar a se perguntar sobre o que está acontecendo ali, buscar Nós estamos mais wp acitados para ser anunciadores
as razões, buscar entender, para então ter um pensamento e e denunciadores, ~fl,raçaJ ao compromisso de transformação
uma percepção mais profundos e críticos sobre o que está q/le assiosimos (Freire,1980, p.28). Anunciadores de idéias, de
acontecendo ali. A consaentioação, nesse sentido, é $1171 reste de propostas de solução, de alternativas, de valores positivos, de
realidade. Ouanto mais conscientioaçâo, mais se "des-vela" a .xemplos a seguir, e denunciadores de problemas, de incoerências,
realidade, mais se penetra na essência fenomêmica do objeto, [rente de inconsistências, de contradições, de inclignidades, de erros que
ao qual 170S encontramos para analisá-lo (p.25). ·stão acontecendo ao nosso redor.
Temos uma percepção primeira, temos um problema E ainda mais, para ser uálida a educação deve
eleito para estudar porque ele se apresentou a nós como considerar a vocação ontoló~fl,zú do homem (p.34). Qual a
problema, perguntamo-nos sobre suas causas, sobre suas
vocação ontológica do bomem? É a vocação de ser sujeito,
determinantes, vamos à teorização (com pesquisas sobre as
lvssa é a característica do bomem. Essa é a sua vocação
teorias, as informações práticas, legais, técnicas, históricas etc.).
ontológica. Ser sujeito e não objeto e considerar também as
Vamos desvelando o objeto inicialmente percebido e vamos
condições em que ele vive, em ta! lugar exato, em tal momento,

18 19
com tal contexto (p.34). É preciso ajudar o homem a ser sujeito. na realidade para mudá-Ia (Freire, 1980, p.35). Vamos ver um exemplo.
Nesse ponto podemos fazer uma comparação entre a Os meus alunos não conseguem aprender a operação aritmética da
Metodologia da Problematização e a metodologia da pedagogia divisão. Se eu observo isso e tomo isso como um dado da realidade,
bancária, da educação bancária, sobre que tantas vezes ouvimos problematizo e faço o caminho do Arco para trabalhar com a divisão
esta semana e lemos nos ensinamentos de Paulo Freire. a com meus alunos, o que acontece? Eu tenho uma ação educativa sobre
educação bancária o homem é' o objeto de depósito de a qual eu refleti, saindo de W11asituação concreta e eu como professora
conhecimentos, de informações, é objeto de manipulação. vou buscar, através do estudo, encontrar outras alternativas de como
Agora, será que, neste caminho - o do!\rco -, o nosso aluno ensinar divisão, com que recursos etc. É possível que eu encontre
continua sendo objeto de manipulação? Ele é estimulado, é fundamentos para várias possibilidades. Na aplicação à realidade, vou
provocado, é desafiado a trabalhar, com certeza! Porque só assim experimentando as formas encontradas para resolver a dificuldade de
ele se desenvolve! Mas, absolutamente não, ele não é objeto de meus alunos.
manipulação, porque ele vai tomando decisões, ele vai Aplicando a Metodologia da Problematização para
construindo durante o processo e enquanto ele constrói o aprender algo relativo a um problema de ensino ou de
conhecimento ele se constrói. aprendizagem, o professor encontra com certeza a solução e
Para ser válida, toda ação educativa deve ser precedida oferece isso para estimular também os alunos a encontrarem a
de uma reflexão sobre o homem e de uma análise do meio solução. A aplicação à realidade ou a prática transformadora é o
de vida concreta do homem concreto a quem queremos ponto culminante desta ação onde o homem é sujeito. Eu estou
educar (Freire, 1980, p.34). Educar ou ajudar a educar-se, e falando de divisão; poderia também colocar qualquer outro
ai o primeiro passo é a realidade. Isso está muito ligado com exemplo. Se nós ficamos repetindo aquilo que já fazemos ao
o método da alfabetização de Paulo Freire. No seu método invés de buscar uma outra forma mais criativa para resolver uma
de alfabetização, o ponto de partida é a realidade vivida do questão específica, nós não fazemos transformação nenhuma,
ser que vai ser alfabetizado. No espaço de nossa experiência, nem a do nosso aluno r;em a nossa. Mas nós podemos ir nos
quando eu trabalho com os meus alunos do Mestrado, a construindo enquanto profissionais da educação a cada pequeno
realidade tomada como ponto de partida é o ensino que eles detalhe para o qual procuramos uma resposta nova.
realizam; quando eu trabalho com a pedagogia, a realidade é o Paulo Freire afirmou que 1IIl/a educação que procnra
que as alunas estão vivendo na sala de aula, mas aqueles que desenuoluer a tomada de consciência e a atitude critica graças à
não estão com sala de aula porque trabalham com outras qual o homem escolhe e decide) liberta-o em lugar de submeté:
atividades, apoiam-se nos relatos dos colegas que têm uma 10) de domesticá-to, de adaptá-to (1980) p.35).
sala de aula ou na observação daquela realidade, como ponto Neste caso, quando os alunos realizam todo o estudo
de partida. a medida do possível, ponto de partida deve e chegam a elaborar hipóteses de solução, quando eles
ser sempre a análise da realidade vivida. escolhem o que fazer, quando eles elegem o que fazer, eles
Outro ponto que destaco é que o homem chega a ser sujeito não estão simplesmente repetindo aquelas coisas já prontas, mas
por uma reflexão sobre sua situação, sobre seu ambiente concreto e estão criando, estão elaborando, e ao elaborar e criar eles deixam
quanto mais ele refletir sobre a realidade, sobre a sua situação concreta, de ser submissos para serem ativos, para serem sujeitos naquela
mais ele emerge plenamente consciente, comprometido, pronto a intervir realidade.

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E na medida em que o homem integrado em seu contexto, Metodologia da Problematização. Essas coisas todas vão
reflete sobre este contexto e se compromete, aí eu vou repetir, acontecendo, por etapas diferentes e sucessivas. E todas essas
ele constrói a si mesmo e chega a ser sujeito (Freire, 1980, p.36). A coisas fazem do homem um ser não adaptado à realidade e aos
transformação vai acontecendo, em processo. Mesmo que não se outros, mas integrado.
faça nada para transformar a realidade de onde se extraiu o problema, Paulo Freire tem outra lição importante: "o homem não
a transformação acontece com as pessoas em processo. Mesmo pode participar ativamente da história, na sociedade, na
que seja pequena, a transformação acontece e é irreversível. transformação da realidade, se ele não é auxiliado a tomar
Quem passa a encontrar três maneiras de ensinar divisão consciência da realidade e da sua própria capacidade de
nunca mais vai ficar só com uma, pois vai ter três maneiras de transformá-Ia" (1980, p.40). Enquanto nós continuarmos com
ensinar divisão. Ele tinha uma, encontrou mais duas no seu o que Paulo Freire chamou de educação bancária, nunca nós
estudo, então ele é diferente, conhece mais, e por isso pode vamos chamar à atenção, auxiliar os alunos à tomada de
mais e por isso age mais e melhor. consciência sobre a realidade e sobre sua capacidade de
A resposta que o homem dá a um desafio não muda transformá-Ia. Daí afirmarmos que a Metodologia da
só a realidade com a qual ele se confronta: a resposta muda Problcmatização é um recurso, um caminho poderosíssimo
o próprio homem cada vez mais e sempre de modo diferente nesta linha de pensamento.
(Preire, 1980, p.37). Quando ele aprendeu duas formas de É preciso, portanto, fazer desta conscientização o primeiro
ensinar divisão, se ele continuar buscando encontrar outra, objetivo de toda a educação. Antes de tudo provocar uma atitude
já não é mais aquela segunda que ele aprendeu, já será uma crítica de reflexão que comprometa a ação. Vejam, não tem como
terceira. E se depois ele encontrar novos materiais para manipular não obter uma ação comprometida do sujeito que aprende se ele
aquelas formas de ensinar e já tiver uma outra forma, sempre estiver neste caminho, porque é ele quem vai construindo o
diferente. Nunca vai ser a repetição da mesma aprendizagem. É caminho, desafiado pelo professor, desafiado pelo grupo e pelo
sempre uma aprendizagem maior, e isso Piaget nos ensinou em desejo de transformar a realidade. E se a ele nunca for mostrado
profusão. Através do processo de assimilação e acomodação e de esse caminho, o da problematização, da conscientização e da
novos desafios, o crescimento vai complexificando nosso potencial possibilidade de atuar na realidade, ele nunca vai saber mesmo. A
de compreensão, de pensamento reflexivo e de atuação. Nunca escola tem a responsabilidade de ter uma ação coerente entre a sua
vamos repetir uma aprendizagem. A situação de aprendizagem teoria e a sua prática, entre seu conteúdo e o método que elege.
sempre será ampliada. Paulo Freire afirmou que a educação problematizadora
No mesmo ato de responder aos desafios que se nos está fundamentada na criatividade, e estimula uma ação e uma
apresentam no contexto de vida (só não somos desafiados reflexão verdadeira sobre a realidade, respondendo assim à
se não olharmos a realidade , porque se olharmos a realidade, vocação dos homens que não são seres autênticos senão quando
os desafios estão aí), nos desenvolvemos. Então, no ato de se comprometem na procura e na transformação criadora (1980,
responder aos desafios que lhe apresenta seu contexto de vida) o p. 80). Neste sentido, o da procura da transformação criadora,
Homem se cria) se realiza como sujeito (Preire, 1980, p.37), temos toda a busca, toda a procura do conhecimento e a etapa
porque esta resposta exige dele reflexão, crítica, invenção, eleição, da aplicação à realidade que é uma etapa de ação, de
decisão, organização, ação. E isso é possível pelo caminho da transformação criadora.

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Paulo Freire afirmou também que não se pode chegar à futuridade reuoiucionária (1983, p.84), diferente de adaptação,
conscientização crítica apenas pelo esforço intelectual, mas pela diferente de fatalismo, diferente de facilidade. Futuridade. É
práxis, pela autêntica união da ação e da reflexão (p.92), possível construir o futuro através de uma transformação daquilo
conforme já tínhamos lembrado. que se tem. Ele a chama de futuridade revolucionária.
Então vejam, se ficarmos apenas com o esforço Revolucionária quando se compara com o que acontece na
intelectual de teorização, não' vamos chegar a uma educação bancária. Daí que a educação problematizadora é
conscientização crítica. Para isso é preciso aliar a teorização profética. É possível pensar em alguma coisa que pode acontecer
com toda a proposta de entender a realidade e voltar para através dela e por isso ela é esperançosa.
ela. O mestre Paulo Freire nos ensinou que a conscientização
dos homens está condicionada pela realidade. A "Qualqller qlle seja a sitllação el)! qlle alguns homens
cOllsciwlização é antes de tudo /1111esforço para livrar 0.1
proilra»: aos outros qlle sejam sujeitos da sua busca,
homens dos obsrácnlos que os impedem de ler II11/a clara
se in staara como situafão uioleura. Não importa!ll 0.1
percepção da realidade(1980, p.94). O caminho da
meios /lJadospara esta proibição. Fazer as pessoas
problematização, que pode ser este ou outros, vai permitir
objetos é aliená-Las de su as decisões, que são
uma outra visão da realidade, saindo daquela percepção
rransferidas então para outros, ou pm"a outras pessoas.
primeira, para chegar a uma percepção mais elaborada.
O mo uimen to de busca atraués da educação
Na visão de Paulo Freire (1983, p.80),
problema/izadora pretira estar sempre dirigido para ser
"a educação probteruatiradora, de caráter autenticamente mais, para a btll7lallização do homem, porque esta é a
reflexivo, ill/plim Il1IJlJ constante ato de desuelamento da vocação do b0171em, embora isso seja contradito pela
realidade". QJfal/to mais problematizam, 0.1 educandos, C01/10 nossa bistâria" (Freire, 1983, p.85).
seres 110»nntdo e CO!llo mundo, tanto mais se sentirão desafiados.
Fi quanto 17Iaúdesafiados, mais obrigados a responder ao desafio, Além disso, é 11a' incidência da afão transformadora cios
e desafiados eles IJão compreender o desafio da própria ação homens sobre o mundo que resulta a sua própria bUl1lanizaf'ão
de raptar o desafio. E precisamente porque captam o desafio (p.86). Destacamos aqui a palavra incidência e é interessante
CO/IIOU11Iproblema em suas conexões C017/os outros num fixarmos este destaque. É possível tomar isso de diferentes
plano de totalidade, não C011l0algo já petrificado, algo já maneiras, mas gostaríamos de reforçar o seguinte sentido: da
definido, a compreensão tende a tornar-se conscientes/ente incidência da ação transformadora dos homens sobre o mundo
critica e por isso cada vez mais desalienada ". resulta sua humanização e da incidência da educação
problematizadora dos professores com seus alunos, dos
Nessa linha de pensamento, o desafio que o professor faz professores na escola, é que vai resultar o projeto de humanização
para os seus alunos, é uma oportunidade de ajudá-los a sair da desses homens no mundo.
alienação. A educação problematizadora se faz-se assim, um esforço
permanente do qual os homens vão percebendo, criticamente, como
estão sendo no mundo em que se acham.
A educação problematizadora, segundo Paulo Freire, é

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~-_~ ---------_~~
iIIi
FINALIZANDO NOSSA CONVERSA ... ensinamentos, porque esse é um caminho de muita contribuição
para nossa formação profissional, já que lidamos com o ser
Para encerrar, por uma questão de tempo e não por humano em desenvolvimento, em processo de humanização.
ter esgotado os ensinamentos deste EDUCADOR, podemos Além disso recomendamos que experimentem a
afirmar que temos em Paulo Fre}re fundamentos teóricos, Metodologia da Problematização com seus alunos, com seus
filosóficos e epistemológicos para apoiar e justificar a colegas de trabalho ou em seus estudos, para perceberem de
Metodologia da Problematização, já que esta constitui-se uma perto o potencial formativo dessa Metodologia que certamente
forma de praticar a Pedagogia problematizadora. se mostrará a vocês.
Tivemos com esta elaboração, a intenção de mostrar
Como a proposta de Maguerez ficou tanto tempo apenas
Uma possibilidade, sendo utilizada por poucas pessoas na RloFI\IÜ:.NCI/\S BIBI.IOCRÁFICi\S
educação em geral mas pôde, nesta Semana de Paulo Freire,
ser intensamente associada a seu pensamento, trazendo um
novo incentivo de aplicação de suas lições para a educação, BERBEL, N. A . N. A metodologia da problernatização no ensino superior
através de um caminho que há muito está à nossa disposição.
e sua contribuição para o plano da práxis. Semina, Londrina, v. 17,
Sabemos que existe um corpo de conhecimentos, de
Ed. Especial, p. 7-17, novo 1996.
idéias, de princípios da educação problematizadora que devem
Ser realizados através de um caminho, de um método, e com
BERBEL, N. A . N. (Org.) Metodologia da plVblematização: experiências
Certeza, um deles é a Metodologia da Problematização.
com questões de ensino superior. Londrina: Ed.UEL, 1998 a.
Ontem perguntávamos para nosso conferencista se
além do método de al fabetização, ou tros aspectos
metodológicos podiam ser lidos através de Paulo Frcire para BERBEL, . A . N. (Org.) Me/odologia da problelllatizaçc,o:
a educação em geral. Porque, na realidade de 1", 2° e 3" Graus, experiências com questões de ensino superior, ensino médio e clinica.

na Educação Continuada, no Ensino Supletivo, ou seja, na Londrina: Ed.UEL, 1998 b.


educação de adultos de todas as ordens, não há como aplicar o
rnétodo de alfabetização de adultos. BERBEL, . A. . Metodologia da problematização: uma alternativa
Então precisamos de outro caminho que sirva para uma metodológica apropriada para o ensino superior. Sell/illa, Londrina,
educação problematizadora para qualquer nível de atuação V. 16, n. 2, p.9-19, out.1995.
educativa, vocês concordam? Queríamos ouvir dele uma resposta
positiva, para reforçar os argumentos que traríamos para vocês BORDENAVE, J. D.; PEREIRA, A. M. Estratégias de ensino
hoje, mas infelizmente ele não tinha pensado neste aspecto, o aprelldizage1l/. 4. ed. Petrópolis : Vozes, 1982.
que nos levou a reforçar ainda mais o caminho que vimos
intencionalmente mostrar. FREIRE, P. /1 pedagogia do oprimido. 13. ed. Rio de Janeiro Paz e
Como conseqüência desse nosso entendimento, há uma Terra, 1983.
recomendação que desejamos fazer: a da leitura e releitura da
grande obra de Paulo Freire para ampliar a reflexão sobre seus

26 27

- - -=-~ --------------:--
FREIRE, P. COllSCielltizaFào: teoria e prática da libertação. Uma
introdução ao pensamento de Paulo Freire. 3. ed. São Paulo:
Moraes, 1980.

FREIRE, P. Pedago.gja ria autonomia. Saberes necessários à prática educativa.


7. ed. São Paulo: Paz e Terra, 1998, p.85.

V ÁZQUEZ, A. S. 1'//osojiCl ria práxis. 4. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra,


1977.

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