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Adriano Codato & Renato Perissinotto.


Marxismo como ciência social.
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Angelita Matos Souza

Marxismo como ciência social, de Adria- consideram brilhantes os textos de história


no Codato e Renato Perissinotto, recebeu o política (18 Brumário; As lutas de classes na
prêmio Anpocs de melhor obra científica em França) em oposição aos de economia (evo-
2012 e consiste na reunião de nove artigos lucionistas, mecanicistas, economicistas), a
já publicados sobre Estado, política institu- análise de Codato encanta pela ousadia em
cional e ação de classe em Marx e em alguns defender o “favoritismo do econômico” n’O
marxismos posteriores, como afirmam os 18 Brumário de Luís Bonaparte, em conso-
autores na Apresentação. De início, defen- nância com o Prefácio de 1859 da Crítica da
dem o marxismo como “uma ciência social Economia Política. Do contrário, afirma o au-
normal”, cujos postulados deveriam ser en- tor, tratar-se-ia “[...] de um caso curioso de in-
tendidos como hipóteses passíveis de serem volução. Marx teria desaprendido o marxismo
confirmadas ou refutadas. Ponto de vista esse sofisticado entre o livro sobre a política bona-
que tornaria possível o diálogo “com as teo- partista (1852) e o volume sobre a economia
rias sociais não marxistas ou explicitamente política clássica (1859)” (p. 7).
antimarxistas” (p. 227). A impressão de identificação do mate-
Não se trata de uma obra fácil de ler rialismo histórico à primazia do econômico
e resenhar, tanto devido ao conteúdo teó- se desfaz à medida que a leitura avança e a
rico denso como ao distanciamento crítico tese da correspondência entre as instâncias
dificultado pelas lembranças que a leitura política e econômica vai ocupando espaço
provocou: dos estudos de juventude e das no livro. A Codato parece interessar fun-
conversas em torno ou por efeito das aulas damentalmente a junção de “dois Marx” à
do Prof. Décio Azevedo Marques de Saes, a luz de Marx, não havendo como discordar
quem o livro é muito justamente dedicado. da “autoridade do econômico”, também em
Porém, resolvi arriscar abordando os capí- O 18 Brumário, tendo em vista a posição de
tulos com foco na temática da articulação Codato acerca do econômico:
entre as instâncias política e econômica.
Tema central no livro, discutido, sobretudo, Penso que o econômico pode ser entendido mais
exatamente como: (i) o interesse geral da classe
a partir d’O 18 Brumário de Luís Bonaparte burguesa – o ordenamento capitalista – que deve
e de um marcado interesse pela autonomia ser garantido sempre, mesmo quando a burgue-
do mundo político – ao encontro da propos- sia “perdeu sua vocação para governar” (18 Br., p.
ta dos autores: de diálogo entre marxismo e 500); (ii) a variável que em última instância de-
termina – o condicionamento, portanto – as ações
teoria das elites. políticas, as representações ideológicas etc. dos
No capítulo 1, Lendo Marx à luz de agentes sociais; (iii) a realidade última – o funda-
Marx, na contramão das interpretações que mento – dos conflitos entre as classes (p. 23; grifos
dos autores).

BIB, São Paulo, nº 73, 1º semestre de 2012, p. 119-122. 119


O capítulo 2, O Estado como Institui- econômica, pois, se assim fosse, segundo os
ção, procura demonstrar como “Marx possui autores, isso acabaria por dispensar a pesqui-
uma concepção de Estado que leva em conta sa de orientação materialista acerca da fun-
sim sua dinâmica institucional, seus procedi- cionalidade estatal.
mentos organizativos, sua hierarquia interna Temática retomada no capítulo 3, Marx
sem, entretanto, abrir mão da perspectiva e a Teoria Contemporânea do Estado. A
classista” (p. 38). Conforme Codato e Pe- partir da comparação entre as posições de
rissinotto, é possível identificar nos textos Marx n’O manifesto e n’O 18 Brumário, Pe-
políticos de Marx dois níveis: em um mais rissinotto reafirma a grande inovação intro-
geral e abstrato, os Estados francês e alemão duzida pela ideia de que a natureza de classe
são compreendidos a partir das suas funções do Estado independe do controle direto pela
reprodutivas; enquanto, no nível mais con- burguesia, como pode sugerir sentença d’O
juntural, se impõe a “separação” entre poder manifesto – do Estado como comitê executi-
de Estado e poder da classe, dimensão na qual vo dos negócios gerais da burguesia. Impos-
é possível compreender o Estado como insti- sível dar ideia do quanto o capítulo é bom,
tuição autônoma, tanto que: abordando a necessidade de destruição do
Estado burguês pela revolução proletária; a
Na briga política, os grupos políticos e sociais per- funcionalidade do Estado a partir da distin-
cebem o Estado como uma poderosa organização
capaz de definir a distribuição de recursos diversos
ção entre interesse geral e interesse particu-
(ideológicos, econômicos, políticos). Em função lar; e a autonomia do processo político, cuja
disso, lutam entre si para controlar diretamente dinâmica própria pode produzir (e produz
ou influenciar à distância os diferentes ramos do com frequência) efeitos indesejáveis e dis-
aparelho estatal (e não necessariamente para do-
minar). Nesse nível da análise é possível admitir o
funcionais à função obrigatória do Estado de
Estado, de um lado, e a(s) classe(s) em nome da(s) manutenção da ordem capitalista.
qual(is) ele governa, de outro, como realidades di- No capítulo 4, Poulantzas 1, 2 e 3, Co-
ferentes e autônomas, isto é, separadas. É possível, dato aborda as diferentes concepções do au-
portanto, pensar o poder de Estado como distinto
do poder da classe e em relação conflituosa com ela
tor grego a respeito do Estado – estrutural,
(p. 44; grifos dos autores). funcional e relacional – em convergência
com as posições políticas-estratégicas que
Neste capítulo, está em debate a tese da Poulantzas vai abraçando. Vale registrar
“[...] funcionalidade da superestrutura jurídi- sobre a primeira posição, do Estado como
co-política (em particular do Estado) para a estrutura e fator de coesão social, que os
realização dos interesses ‘a largo prazo’, ‘em efeitos de isolamento dos agentes em in-
termos gerais’ da classe dominante” (p. 57; divíduos particulares e de representação de
grifos dos autores). Basicamente, parece que unidade no povo-nação, produzidos pela
os autores estão a afirmar que assim como estrutura jurídico-política, não devem ser
a noção de autonomia relativa do Estado é vistos como meras “ilusões” produzidas
tema para pesquisa empírica, igualmente o por uma suposta instância ideológica, que,
é a tese da funcionalidade, a qual “[...] não como pondera Codato, não existe como
pode ser nem pressuposta, nem derivada instância específica.
como um corolário da Grande Teoria” (p. No capítulo 5, O Espaço Político se-
58). Dessa forma, a tese da funcionalidade gundo Marx, a questão é retomada por um
do Estado não estaria imbricada na tese da posicionamento (apresentado no capítulo 1)
correspondência entre estruturas política e contrário ao do alegado antagonismo entre

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“aparência e essência” n’O 18 Brumário. Em Seguindo com O 18 Brumário, Perissi-
resumo, Codato defende que a aparência notto demonstra como a análise classista da
não seja vista como mera ilusão a ser desmis- política por Marx não se reduz ao vínculo
tificada a fim de que se alcance a essência de econômico. O capítulo traz considerações
tudo: a luta entre classes sociais. Não, a ilu- interessantes sobre o conceito de classe na vi-
são é real, responsável por “[...] uma sorte de são culturalista (de Pierre Bourdieu e Klaus
fetichismo político análogo ao fetichismo da Eder) e em defesa da perspectiva marxista –
mercadoria” (p. 129), que permite avanços das classes como atores políticos importantes
históricos através do mundo político, na me- que agiriam mediados por uma minoria po-
dida mesmo em que os efeitos concretos do liticamente ativa (a elite política). Proposta
direito burguês/burocratismo condicionam de diálogo entre marxismo e teoria das elites,
a atuação do Estado capitalista. da qual os autores se ocuparão nos capítulos
A proposta é que o espaço político seja 8 e 9 – Marxismo ou Elitismo? e Por uma
encarado em sua autonomia “[...] como um Análise Societalista da Política.
mecanismo de mediação entre a estrutura po- Nestes capítulos finais, o marcado inte-
lítica e a estrutura econômica” (p. 147; grifo resse pela autonomia do mundo político as-
dos autores), cujo papel não se reduz à função sume sentido maior, o da proposta de diálogo
de ocultação aos agentes sociais da divisão e entre marxismo e teoria das elites. Uma ten-
dominação de classes. Ao que tudo indica, tativa de pensar as complexas ligações entre
Codato quer conservar a separação analítica o nível político e o econômico por meio das
entre as instâncias política e econômica, atri- duas tradições teóricas, “[...] a despeito de to-
buindo ao espaço político o papel de articu- das as suas notórias diferenças ideológicas” (p.
lá-las na prática, nem sempre no sentido da 226). Analiticamente, trata-se de identificar a
funcionalidade. O objetivo principal parece representação dos interesses de classe na atua-
ser o de defender que “[...] as análises políti- ção da minoria politicamente ativa: (1) estu-
cas do mundo político, das suas forças, dos dando os processos decisórios – no campo das
seus personagens, dos seus discursos não são ações da elite política; (2) analisando o con-
tão desprovidas de interesses assim” (p. 158). teúdo das produções discursivas, envolvidas
No capítulo 6, Considerações sobre o nas manifestações escritas ou faladas (artigos
Marxismo Analítico, Perissinotto relaciona de jornais, intervenções em periódicos, entre-
alguns problemas do marxismo analítico: vistas, discursos parlamentares, publicações
as críticas que autores filiados à corrente de entidades de classe); e (3) investigando a
fazem à explicação funcional, “tipicamente origem social dos seus membros.
marxista”, abordando ainda a insuficiência Nesse terreno, acredito que sejam os
do individualismo metodológico, da teoria procedimentos acima importantes à análise
da escolha racional e teoria dos jogos como social, especialmente da política econômica,
ferramentas para o “[...] marxismo vencer o a fim de se comprovar como as ações do Esta-
vazio explicativo da explicação funcional” do correspondem muito mais aos interesses
(p. 175). O autor reconhece as dificuldades de classes/frações dominantes que aos inte-
do marxismo contemporâneo em discutir resses das demais forças sociais. Não obstan-
o “[...] problema da classe social como ator te, por mais que a proposta dos autores possa
político coletivo” (p. 181) e avança sobre o ser pertinente, é controversa da perspectiva
tema no capítulo 7, Marx e a Análise Con- marxista, na medida em que parece confe-
temporânea de Classe. rir autonomia e importância demais às elites

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políticas. Ainda que de grande interesse, so- Por fim, a insistência na pesquisa em-
bretudo devido às possibilidades de desven- pírica como critério de cientificidade pode
damento dos interesses de classes, a inversão aborrecer os menos rigorosos, mas a centrali-
da ordem dos fatores pode alterar o produto. dade e análise d’O 18 Brumário, a qualidade
Dessa ótica, ninguém diria que central n’O da redação, a ironia fina, a tomada de posi-
18 Brumário sejam os personagens políticos, ções claras e instigantes fazem da leitura do
suas ideologias, partidos, discursos etc. livro um enorme prazer.

Palavras-chave: Marxismo; Ciência social; Teoria das elites; Estado e política.

Artigo recebido em 4/3/2013


Aprovado em 6/6/2013

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