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A palavra homeostasia significa a ma- nicos está concentrado no sangue. O equi-
nutenção das condições de funcionamen- líbrio e a distribuição de água, a regulação
to dos diferentes componentes celulares do do pH através os sistemas tampões, o con-
organismo. Todos os órgãos realizam fun- trole da coagulação e a regulação da tem-
ções que contribuem para a homeostasia. peratura correspondem a outras importan-
A comunicação entre os diversos órgãos é tes funções desempenhadas pelo sangue.
feita pelo sangue. Este, pode ser entendido As células do corpo humano, para fun-
como um sistema de transporte em que as cionar adequadamente, precisam consumir
artérias, veias e capilares seriam as vias per- oxigênio. As moléculas de hemoglobina
corridas. O sangue é o meio líquido que flui contidas nos glóbulos vermelhos do san-
pelo sistema circulatório entre os diversos gue transportam o oxigênio aos tecidos e,
órgãos transportando nutrientes, hormô- quando a sua oferta é reduzida, o funcio-
nios, eletrólitos, água, resíduos do metabo- namento celular se deteriora, podendo ces-
lismo celular e diversas outras substânci- sar e determinar a morte.
as. A fisiologia do sangue estuda as suas O volume de sangue contido no siste-
múltiplas funções em interação com a nu- ma circulatório (coração, artérias, veias e
trição dos demais tecidos do organismo. capilares) constitui o volume sanguíneo to-
O deslocamento do sangue no sistema tal, também chamado volemia. Um adul-
circulatório ocorre por ação da bomba to, dependendo do seu porte físico, pode
cardíaca e da sua condução pelas artérias, ter de 4 a 8 litros de sangue no organismo.
veias e capilares. O sangue circula no or- Em geral, a volemia tem relação com a ida-
ganismo humano, transportando oxigênio de e o peso dos indivíduos (Tabela 6.1). O
dos pulmões para os tecidos, onde é libera-
do nos capilares. Ao retornar dos tecidos,
o sangue conduz o dióxido de carbono e os
demais resíduos do metabolismo celular,
para eliminação através da respiração, do
suor, da urina ou das fezes.
O sistema de defesa do organismo con-
tra doenças e a invasão de germes patogê- Tabela 6.1. Volemia estimada.
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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA
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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE
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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA
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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE
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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA
glóbulos vermelhos aproveita restos de he- de polipeptídeos chamados cadeias alfa (a)
mácias envelhecidas e destruidas. O ferro e um par de polipeptídeos chamados ca-
contido na hemoglobina é reaproveitado, deias beta (b). O pigmento ou radical heme
para formar novas moléculas do pigmen- contém moléculas de ferro no estado
to. Células fagocitárias do baço, fígado, ferroso e é o responsável pela cor verme-
gânglios linfáticos e da própria medula en- lha da hemoglobina.(Fig. 6.2).
carregam-se de destruir os glóbulos verme- A cadeia alfa-globina é constituida por
lhos envelhecidos. À seguir, lançam na cir- um grupo de 141 resíduos de aminoácidos
culação o ferro que sobra, para que possa e tem o peso molecular de 15.750 Daltons.
ser reaproveitado. A produção de hemáci- A cadeias beta é formada pela união de 146
as exige a presença de cianocobalamina resíduos de aminoácidos e tem o peso
(vitamina B12) e um fator da mucosa do molecular de 16.500 Daltons. A hemoglo-
estômago, chamado de fator intrínseco, que bina A resultante, tem um peso molecular
se combina com a vitamina B12. O ácido aproximado de 64.725 Daltons.
fólico também participa do processo de for- A estrutura química da molécula da he-
mação e maturação das hemácias. moglobina foi demonstrada por Perutz e
Kendrew que, em 1962 receberam o prê-
HEMOGLOBINA
A hemoglobina é o principal compo-
nente da hemácia. Ela é formada no inte-
rior dos eritroblastos na medula óssea.
A hemoglobina é o pigmento respon-
sável pelo transporte do oxigênio para os
tecidos e confere à hemácia a sua colora-
ção avermelhada. Quando a quantidade de
hemoglobina combinada com o oxigênio é
grande, o sangue toma a coloração verme-
lho viva, do sangue arterial. Quando a com-
binação com o oxigênio existe em peque-
nas quantidades, a coloração do sangue é
vermelho escura, do sangue venoso.
A hemoglobina é formada pela união
de radicais heme com uma proteina, cha-
mada globina. Cada molécula de hemoglo-
bina contém quatro moléculas do radical
heme e dois pares de cadeias de polipeptí-
deos, estruturalmente formadas por diver- Fig. 6.2. Esquema da molécula da hemoglobina A que
sos amino-ácidos. A hemoglobina A, do mostra os os quatro grupos heme ligados às cadeias de
polipeptídeos (alfa e beta) e a ligação do radical heme
adulto, é formada por um par de cadeias com as quatro moléculas de oxigênio.
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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE
mio Nobel de química, pelos seus traba- duas cadeias do tipo gama (g). A hemoglo-
lhos com aquele pigmento. A configura- bina F se mantém nas hemácias circulantes
ção química da hemoglobina permite um em grande quantidade, nos recém-natos e
aproveitamento excepcional; cada molécu- vai desaparecendo gradualmente nos pri-
la pode transportar quatro moléculas de meiros meses de vida, para dar lugar à he-
oxigênio. A combinação química do radi- moglobina A, predominante no sangue do
cal heme com a molécula de oxigênio é indivíduo adulto.
facilmente reversível, o que facilita a sua A capacidade de oxigenação dos teci-
captação nos capilares pulmonares e a sua dos pelo sangue está relacionada ao núme-
liberação nos capilares dos tecidos. A li- ro de glóbulos vermelhos circulantes e à
gação do oxigênio à hemoglobina é do quantidade de hemoglobina que contém.
tipo cooperativo. Isto significa que a liga- No adulto normal, cada 100 ml. de sangue
ção de uma molécula de oxigênio ao gru- contém aproximadamente 15 gramas de
po heme facilita a ligação da segunda hemoglobina.
molécula, que torna mais fácil a ligação A forma bicôncava dos glóbulos ver-
com a terceira molécula e, mais fácil ain- melhos é ideal para a absorção e libera-
da, a ligação com a quarta e última mo- ção rápida de gases. A ausência de nú-
lécula, numa espécie de reação cuja ve- cleo também favorece o transporte de
locidade aumenta à medida em que vai oxigênio, porque a célula pode conter
sendo processada. A oxihemoglobina é a maior quantidade de hemoglobina, con-
molécula da hemoglobina saturada com tribuindo para sua maior eficiência por
quatro moléculas de oxigênio. unidade de volume.
Durante as primeiras fases do desen- A estrutura molecular tetramérica,
volvimento embrionário do ser humano, o com quatro moléculas do radical heme e a
sangue contém uma hemoglobina embrio- característica ligação cooperativa com o
nária, chamada hemoglobina E, composta oxigênio, permitem à hemoglobina modi-
por duas cadeias de polipeptídeos do tipo ficar a sua afinidade pelo oxigênio, depen-
alfa e duas cadeias de tipo epsilon (e). Du- dendo de diversos fatores, como o número
rante o estágio de vida fetal a hemoglobi- de moléculas de oxigênio já combinadas à
na embrionária é substituida pela hemo- sua própria molécula, a presença e quanti-
globina fetal, denominada hemoglobina F. dade de dióxido de carbono, o pH do san-
Este tipo de hemoglobina, tem enorme afi- gue, a temperatura e a quantidade de fos-
nidade pelo oxigênio, e constitui uma fatos orgânicos presentes. Esses fatores
adaptação fisiológica, com a finalidade de constituem um importante mecanismo de
extrair mais oxigênio da circulação mater- controle, que permite à hemoglobina cap-
na da placenta, que tem uma PO2 relativa- tar oxigênio em um instante e liberá-lo efi-
mente baixo. A hemoglobina fetal é forma- cientemente no instante seguinte.
da pelos quatro radicais heme ligados à A afinidade pelo oxigênio e a capaci-
duas cadeias de polipeptídeos alfa (a) e dade de liberação desse gás, são descritas
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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA
por equações e curvas que representam a lula, reduzindo o PO2 intracelular e com-
dissociação da hemoglobina. A curva de prometendo o metabolismo celular.
dissociação da hemoglobina representa a A afinidade da hemoglobina pelo oxi-
relação entre a pressão parcial de oxigênio gênio é um fenômeno dinâmico que pode
no sangue e o percentual de saturação da ser afetado por diversos mecanismos. As
hemoglobina. O sangue que deixa os pul- manipulações da fisiologia induzidas duran-
mões tem uma PO2 de 100 mmHg e, nes- te a circulação extracorpórea, como a hi-
sas condições, a hemoglobina está plena- potermia, as alterações do equilíbrio áci-
mente saturada. A curva de dissociação de- do-base, a hemodiluição e outras, podem
monstra o percentual de saturação da modificar a afinidade da hemoglobina pelo
hemoglobina correspondente a cada valor oxigênio, levando à alterações da satura-
da PO2 do sangue, conforme demonstra o ção e da liberação do oxigênio nos tecidos.
gráfico da figura 6.3. A curva de dissociação da hemoglobi-
A análise da curva de dissociação da na pode ser modificada por alterações do
hemoglobina e a influência de diversos fa- pH. Se o sangue se tornar ácido, com o pH
tores na sua configuração, facilitam a com- de 7,2 por exemplo, a curva de dissociação
preensão dos mecanismos de liberação do se desloca cerca de 15% para a direita. Se
oxigênio nos tecidos. Quando a afinidade o sangue, ao contrário, estiver alcalino, com
da hemoglobina pelo oxigênio está aumen- o pH de 7,6, a curva se desloca para a es-
tada, menos oxigênio é liberado nos teci- querda. O aumento da concentração do
dos. O consumo celular de oxigênio dimi- dióxido de carbono e o aumento da tem-
nui a sua concentração no ambiente em peratura corporal, também deslocam a cur-
que a célula se encontra. Com a redução va para a direita.
da concentração do oxigênio, o gradiente Quando a afinidade da hemoglobina
do oxigênio através a membrana celular se pelo oxigênio está aumentada em rela-
reduz e menos oxigênio se difunde na cé- ção ao normal, a curva de dissociação se
desvia para a direita e, menos oxigênio é
liberado. Se a afinidade da hemoglobina
está diminuida a curva de dissociação se
desvia para a esquerda e o oxigênio é li-
berado com mais facilidade. A presença
de grandes quantidades de hemoglobina
fetal desvia a curva de dissociação da
hemoglobina para a esquerda, no feto e
no recém-nato, facilitando a liberação de
oxigênio aos tecidos.
Fig. 6.3. Curva de dissociação da hemoglobina. Mostra
a correlação da saturação de oxigênio com a p02 do
sangue. Alterações da curva refletem modificações do HEMATÓCRITO
sangue produzidas por diversos fatores, conforme
explanação do texto. A massa de glóbulos vermelhos exis-
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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA
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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE
sobre o ser humano começam à partir dos comumente encontrada. Já foram identifi-
2.400 metros. cadas e catalogadas mais de 300 tipos dife-
A policitemia mais importante é a de rentes de hemoglobinas, das quais cerca de
origem patológica e pode ser primária ou 10% podem se acompanhar de alterações
secundária. funcionais e clínicas. Estas alterações da
Policitemia Primária – A medula óssea hemoglobina são raras e são encontradas
produz quantidades excessivas de hemáci- apenas em alguns indivíduos de uma mes-
as, sem que isso represente qualquer me- ma família. Sua importância reside no fato
canismo de adaptação. O tipo clássico é a de que um paciente portador dessas anor-
Policitemia vera, uma condição neoplási- malidades pode eventualmente, ser subme-
ca ou tumoral dos órgãos produtores de tido à circulação extracorpórea e a
células sanguíneas. Ela gera uma excessi- hemoglobinopatia potenciar o desenvolvi-
va produção de eritrócitos, leucócitos e mento de crise hemolítica severa, capaz de
plaquetas. O hematócrito nestas pessoas comprometer a função renal.
pode chegar aos 70 ou 80%. O sistema Anemia Falciforme – É relativamente co-
vascular se torna intumescido, muitos ca- mum na população negra especialmente da
pilares são obstruidos devido à viscosidade África Central, onde parece ter se origina-
do sangue, que nesta doença, pode aumen- do, por mutação genética. Na atualidade a
tar até cinco vezes em relação ao normal. sua distribuição é bastante extensa, graças
Policitemia Secundária – Os tecidos do à migração do povo africano para a maio-
organismo são hipóxicos, como ocorre ria dos continentes. A doença ou seus tra-
nas cardiopatias congênitas cianóticas ços são facilmente encontrados na popu-
que se acompanham de shunt intra-car- lação negra ou em seus descendentes, in-
díaco da direita para a esquerda. A clusive em nosso país.
hipóxia crônica, estimula o organismo a A alteração primária da anemia
produzir glóbulos vermelhos em excesso, falciforme ocorre na hemoglobina. Existe
lançando-os na circulação para aumen- alteração de um dos resíduos de aminoáci-
tar a oferta de oxigênio aos tecidos. O do nas cadeias da globulina beta, originan-
hematócrito destas crianças pode alcan- do um tipo de hemoglobina chamada he-
çar os 80% e a viscosidade do sangue moglobina S. A composição anormal da
aumenta proporcionalmente. Nestas cir- porção globina da hemoglobina, favorece
cunstâncias, a hemodiluição pré-opera- a fácil cristalização do pigmento no interi-
tória é importante para favorecer a per- or das hemácias, além de tornar as células
fusão e a oxigenação tissulares, durante mais frágeis. Os cristais da hemoglobina S
a circulação extracorpórea. são longos e tendem a alongar as hemáci-
Com freqüência, as alterações das hemá- as, alterando a sua forma normal no san-
cias são devidas à alterações da hemoglo- gue. Quando a hemoglobina S cristaliza e
bina, como ocorre na anemia falciforme, que se alonga, a hemácia deformada assume um
é, provavelmente, a hemoglobinopatia mais formato curvo, como uma “foice”, fato que
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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA
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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE
LEUCÓCITOS
O organismo possui um eficiente sis-
tema de combate aos diferentes agentes
agressores, tóxicos ou infecciosos como
bactérias, fungos, vírus e parasitas. Este Tabela 6.2.Tipos de leucócitos no sangue periférico.
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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA
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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE
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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA
PLAQUETAS
As plaquetas são corpúsculos ou frag-
mentos de células gigantes, os megacarió-
citos, formadas na medula óssea. Elas tem
a forma de discos diminutos arredondados,
e na realidade, não representam células e
sim corpúsculos celulares. Os magacario-
citos se fragmentam em plaquetas, que são Tabela 6.3. Principais propriedades das plaquetas.
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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA
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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE
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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA
o sistema de antígenos Rh. O sangue é clas- Esses antígenos das hemácias também são
sificado em grupos, conforme a presença conhecidos como aglutinógenos, pela sua
dos antígenos do sistema ABO nas hemá- capacidade de produzir aglutinação das
cias e em tipos, conforme a presença dos células do sangue.
antígenos Rh no plasma.
ANTICORPOS DO PLASMA
SISTEMA ABO No plasma sanguíneo existem anticor-
Na superfície das hemácias podem exis- pos produzidos por determinação genética
tir dois antígenos específicos desse sistema, de cada um dos genótipos. Os indivíduos
denominados antígeno A e antígeno B. De- com sangue do grupo A, que tem o antígeno
vido ao modo de transmissão hereditária des- A nas hemácias, possuem os anticorpos
ses antígenos, os diferentes indivíduos podem anti-B. Os indivíduos com sangue do gru-
ter apenas um dos antígenos, ambos ou ne- po B, tem anticorpos anti-A; os indivíduos
nhum dos antígenos, em suas hemácias. do grupo AB não tem anticorpos e os indi-
A presença dos antígenos A e B é de- víduos do grupo O possuem ambos os an-
terminada por genes que existem em ticorpos, anti-A e anti-B. Os anticorpos do
cromossomas adjacentes, um gene em cada plasma sanguíneo também são chamados
cromossoma. A presença dos genes deter- de aglutininas, pela sua capacidade de re-
mina se a hemácia irá conter o antígeno. agir com os antígenos das hemácias pro-
Por essa razão, existem seis possibilidades duzindo aglutinação celular (Tabela 6.4).
de combinações genéticas, uma vez que As aglutininas (anticorpos) são gama-
cada indivíduo recebe dois genes, um de globulinas, e a sua maior parte correspon-
cada progenitor. As possibilidades genéti- de a moléculas de imunoglobulinas das fra-
cas são OO, OA, OB, AA, BB e AB. Essas ções IgM e IgG.
combinações de genes são conhecidas As aglutininas só começam a ser for-
como genótipos; cada indivíduo possui um madas após o nascimento, estando com-
dos seis diferentes genótipos. O genótipo pletas, após os primeiros meses de idade.
OO determina a presença do grupo san-
guíneo O; os genótipos OA e AA determi- SISTEMA OU FATOR Rh
nam o grupo sanguíneo A; os genótipos OB Além dos grupos sanguíneos O,A,B e
e BB determinam o grupo sanguíneo B, AB outros sistemas de antígenos determi-
enquanto o genótipo AB determina o gru-
po sanguíneo AB.
O sangue do grupo A contém hemáci-
as com o antígeno A e o sangue do grupo
B contém hemácias com o antígeno B. O
sangue do grupo AB contém hemácias com
os antígenos A e B e o sangue do grupo O
Tabela 6.4. Características dos Diferentes Grupos
contém hemácias sem nenhum antígeno. Sanguineos.
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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE
nam características do sangue, dos quais o dois sistemas A-B-O e Rh, a distribuição
mais importante é o sistema ou fator Rh. dos diferentes tipos sanguíneos na popula-
Existem seis tipos comuns de antíge- ção, passa a ser a da tabela 6.6.
nos Rh, designados por C, D, E, c, d, e.
Um indivíduo que tem o antígeno C, não
terá o antígeno c; ao contrário, o indiví-
duo que não tem o antígeno C, sempre
terá o antígeno c. A mesma relação ocor-
re com os antígenos D-d e E-e. A forma Tabela 6.5. Grupos sanguíneos na população geral.
de transmissão dos caracteres relaciona-
dos ao fator Rh, faz com que cada pessoa
tenha um antígeno de cada um dos três
pares. Os antígenos C, D e E, podem es-
timular o desenvolvimento de anticorpos
anti-Rh, que causam reações às transfu-
sões. Os indivíduos que possuem um dos
três antígenos, C,D ou E são chamados
de Rh(+), ou Rh positivo. Os demais in-
divíduos, que possuem os antígenos c, d Tabela 6.6. Incidência dos diferentes tipos sanguíneos na
e, são chamados de Rh(-), ou Rh negati- população.
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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA
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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE
de superior a 50%. A insuficiência renal agu- Alguns indivíduos são portadores dos
da é causada pela reação antígeno-anticor- agentes causadores das doenças, mas não
po, com liberação acentuada de substân- apresentam os seus sintomas ou sinais. São
cias tóxicas que produzem intensa vaso- chamados de portadores sadios. Quando o
constrição renal. A hemólise dos eritrócitos sangue destes portadores é doado, transmi-
circulantes, a queda da pressão arterial, o te a doença ao receptor, quase sempre de
fluxo renal reduzido e o débito urinário uma forma aguda e de evolução rápida.
baixo, acompanham o quadro clínico. A É imprescindível verificar a presença
vasoconstrição renal e o choque circula- daquelas doenças, antes de liberar o san-
tório agem em conjunto, na origem da in- gue para a doação. Os portadores de vírus
suficiência renal. ou outros agentes infecciosos não podem
As reações anafiláticas são o resultado ser doadores, em nenhuma circunstância.
da ação das proteinas plasmáticas do doador, Os doadores de sangue, em nosso
mas, algumas vezes, podem ser devidas aos meio, são habitualmente testados para a
anticorpos do receptor que reagem com os presença de malária, doença de Chagas,
leucócitos do sangue transfundido, liberan- hepatites A, B,C e D, sífilis, e a presença
do inclusive a histamina dos basófilos. do vírus HIV, causador da AIDS.
Na atualidade, a grande preocupação
TRANSMISSÃO DE DOENÇAS com a transmissão de doenças por inter-
PELAS TRANSFUSÕES médio das transfusões, está diretamente re-
As transfusões de sangue ou dos seus lacionada aos riscos da transmissão do ví-
componentes não são procedimentos isen- rus da imunodeficiência adquirida (HIV)
tos de riscos. A transfusão de sangue cole- e outros não menos graves. A contamina-
tado de portadores de diversas doenças ção via transfusões, nos anos oitenta, viti-
pode contaminar os indivíduos receptores mou uma grande quantidade de hemofíli-
das transfusões. Numerosas doenças po- cos e outros receptores, em todo o mundo.
dem ser transmitidas pelas transfusões, das O vírus, aparentemente, pode permanecer
quais as mais importantes são as diversas no organismo por vários anos, sem que
formas de hepatites e outras viroses, malá- hajam manifestações da doença. Em de-
ria, doença de Chagas, sífilis e AIDS ou terminadas circunstâncias, contudo, a
SIDA (Síndrome da Imunodeficiência doença pode se manifestar muito rapi-
Adquirida), além de citomegalovirus e damente, após a transfusão do sangue
retroviroses transmitidas pelos vírus infectado pelo vírus.
HTLV-I e HTLV-II, dentre outras. A trans- Os elevados riscos da transmissão de
missão da doença de Creutzfeldt-Jacob, doenças pelas transfusões, tem estimulado
popularmente conhecida como uma vari- as equipes ao desenvolvimento de proto-
ante do “mal da vaca louca” em seres hu- colos especiais, visando à redução do uso
manos é objeto de numerosos estudos, de sangue, durante a cirurgia e a circula-
principalmente na Inglaterra. ção extracorpórea.
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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA
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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE
hemostasia, que consiste de um conjunto lesão vascular. A primeira reação das pla-
de fenômenos que visam interromper a quetas em contato com superfícies não
perda continuada de sangue. revestidas por endotélio, mesmo que de
Existem três mecanismos principais, natureza biológica, é a adesão. Aquele con-
que se destinam a interromper a perda de tato ativa as plaquetas que, imediatamen-
sangue através de um vaso lesado, e que te, aderem à superfície não endotelial. A
constituem os alicerces da hemostasia. Es- seguir, as plaquetas entumescem, assumem
ses mecanismos são: resposta vascular, ati- formas irregulares com prolongamentos ou
vidade plaquetária e coagulação do sangue. pseudópodos, tornam-se pegajosas, secre-
tam e liberam grandes quantidades de
1. RESPOSTA VASCULAR enzimas, difosfato de adenosina (ADP) e
Quando um vaso sanguíneo é lesado, tromboxano A2. A presença da trombina
ocorre imediata contração da sua parede, contribui para acelerar a agregação das pla-
que reduz o fluxo de sangue no seu interi- quetas, enquanto o tromboxano A2 atua
or, na tentativa de interromper a perda de sobre as plaquetas próximas, agregando-as
sangue. A redução de calibre do vaso re- às plaquetas anteriormente ativadas, para
sulta da contração das suas fibras muscu- formar o grumo ou tampão. A serotonina
lares e o espasmo vascular local pode du- liberada pelas plaquetas, contribui para
rar até 20 ou 30 minutos. manter a vasoconstrição. A conversão do
Os tecidos injuriados liberam diversas trifosfato de adenosina em difosfato, libe-
substâncias, como serotonina, histamina e ra energia para manter a agregação das pla-
a tromboplastina tissular, modernamente quetas. O fator IV plaquetário inibe a ati-
denominada fator tissular, capaz de atuar vidade anticoagulante da heparina, para
nas duas vias da coagulação. Localmente, preservar o grumo e permitir a formação
a serotonina induz vasoconstrição que con- do coágulo.
tribui para a eficiência do mecanismo
vascular da hemostasia. Tanto a serotonina, 3. FORMAÇÃO DO COÁGULO
como a histamina, se liberadas em grandes O mecanismo hemostático final se
quantidades, são absorvidas e, na circula- constitui na modificação das proteinas do
ção sistêmica tem efeito vasodilatador, que plasma para a formação do coágulo no lo-
tende a reduzir a pressão arterial e, em con- cal da injúria do vaso, interrompendo a
seqüência minimizar a perda sanguínea. perda de sangue. Substâncias da parede
vascular lesada, das plaquetas, como o fa-
2. ATIVIDADE PLAQUETÁRIA tor III plaquetário, e proteinas plasmáticas
Quando as plaquetas ou trombócitos aderem à parede vascular lesada, inician-
entram em contato com os tecidos, no vaso do o processo de coagulação do sangue. A
lesado, aderem à região da injúria e agre- formação do coágulo é resultado de com-
gam-se a outras plaquetas, formando um plexas alterações de um conjunto de pro-
tampão plaquetário, que busca obstruir a teinas do plasma, cuja etapa final é a trans-
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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA
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CAPÍTULO 6 – FISIOLOGIA DO SANGUE
com os nomes pelos quais são mais conhe- A via mais comum é a via extrínseca,
cidos. Note que a relação não inclui o fa- que ocorre pela lesão de vasos sanguíneos
tor VI, que ainda não foi descrito. ou à partir de estímulos tissulares. Na via
Tradicionalmente a coagulação do san- extrínseca, uma substância dos tecidos, a
gue tem sido estudada de um modo simpli- tromboplastina (FT) é liberada no local da
ficado, para favorecer a compreensão des- injúria do endotélio vascular e desencadeia
se fenômeno de alta complexidade. Os me- as reações da coagulação. A tromboplastina
canismos da coagulação do sangue, tecidual ou fator III, se combina com o fa-
conforme a natureza do estímulo desenca- tor VII (acelerador da conversão da
deador, tem sido propostos como se ocor- protrombina do soro), na presença do fa-
ressem seguindo duas vias distintas, conhe- tor IV (cálcio), para ativar o fator X (
cidas como via intrínseca e via extrínseca, Stuart-Prower), conforme o diagrama da
capazes de serem ativadas simultânea ou figura 6.8.
separadamente, convergindo ambas para A via intrínseca envolve a ativação de
uma via terminal comum que consiste na um fator existente no sangue, o fator
formação do coágulo. A coagulação, con- Hageman (fator XII), também conhecido
tudo, na prática ocorre de um modo bas- como fator de ativação pelo contato. Este
tante diferente e as vias intrínseca e ex- fator se ativa ao contato com qualquer su-
trínsecas são interdependentes e sem limi- perfície que não seja o endotélio vascular
tes tão precisos quanto se aceitava, até e, em seguida ativa o fator XI. Ambos os
alguns anos passados. O fator tissular (FT) fatores forçam a ativação do fator IX que,
é o desencadeador do fenômeno da coa- por uma vez ativado, converte o fator VIII
gulação e pode atuar sobre fatores da coa-
gulação tanto da via intrínseca quanto da
via extrínseca.
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FUNDAMENTOS DA CIRCULAÇÃO EXTRACORPÓREA
(fator anti-hemofílico) à sua forma ativa, IV. Contudo, a ação mais importante da
que forma um complexo com o cálcio e um trombina ocorre sobre o fator I (fibrino-
fosfolipídeo (fator plaquetário III). Este gênio). A trombina fragmenta o fibrino-
complexo do fator VIII, cálcio e o gênio em um monômero da fibrina e dois
fosfolipídeo, ativa o fator X (Fig. 6.9). outros peptídeos, os fibrinopeptídeos A
As vias extrínseca e intrínseca de ati- e B. Os monômeros da fibrina se unem
vação da coagulação iniciam-se à partir de para formar os filamentos de fibrina, atra-
estímulos diferentes, mas convergem na vés a polimerização. Os filamentos de
ativação do fator X. O resultado da ativa- fibrina aderem entre sí, estimuladas pelo
ção da via extrínseca ou da via intrínseca fator XIII, o fator estabilizador da fibrina,
é o mesmo, a presença do fator X ativado. que exige a presença da trombina e do
A via extrínseca é mais veloz que a intrín- cálcio. A malha de fibrina resultante, en-
seca. À partir da ativação do fator X, ambas globa plaquetas, hemácias e plasma, for-
as vias, extrínseca e intrínseca, seguem a mando o coágulo definitivo. A antitrom-
mesma via comum de estimulação, até a bina III (ATIII) é um inibidor da
formação do coágulo final (Fig. 6.10). trombina circulante e contribui para im-
O fator X ativado, juntamente com pedir a polimerização da fibrina.
o fator V (pró-acelerina), o fator IV (Cál- As plaquetas retidas no interior dos
cio) e o fosfolipídeo convertem o fator II coágulos liberam certas substâncias pró-
(protrombina) em trombina. A trombina coagulantes. À medida que o coágulo se
estimula uma série de reações, como a retrai, as bordas dos vasos sanguíneos rom-
agregação plaquetária, a liberação de pidos aproximam-se, para o final da
serotonina, ADP e do fator plaquetário hemostasia.
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potenciais aplicações das células-tronco tâncias especiais, cada vez mais raras. As
totipotenciais (embrionárias) tem desvi- incompatibilidades de outros sistemas san-
ado as atenções da comunidade científi- guíneos são detectadas pelas provas cruza-
ca para os transplantes de tecidos e de das. A grande disponibilidade de doadores,
órgãos e, conseqüentemente, tem estimu- em relação aos demais transplantes, faz
lado a busca de doadores compatíveis ou com que um doador compatível seja en-
a busca de métodos capazes de minimi- contrado com grande facilidade.
zar os efeitos das pequenas incompatibi- Ao contrário do que ocorre com a
lidade que, naturalmente, são decorren- córnea, os órgãos vascularizados e habitu-
tes da necessidade de aproveitar-se ao almente transplantados, como coração,
máximo o sempre escasso número de pulmão, pâncreas, rim e fígado, represen-
doadores disponíveis. tando os principais, requerem uma avalia-
O transplante de órgãos tornou-se uma ção completa do doador, em busca de do-
modalidade de tratamento de pacientes enças capazes de serem transmitidas ao re-
portadores de diversas doenças, em seus es- ceptor. Além disso, a remoção dos órgãos a
tágios terminais. Vários tipos de transplan- serem transplantados apenas pode ser fei-
tes de órgãos são feitos com grande mar- ta após a constatação da morte cerebral
gem de sucesso enquanto outros transplan- que requer uma bateria de exames e avali-
tes são tecnicamente mais complexos ou ações neurológicas por um grupo de espe-
dependem de uma compatibilidade quase cialistas, conforme um protocolo definido
absoluta para que não haja rejeição. A bar- pela legislação específica.
reira imunitária, contudo, ainda constitui Em linhas gerais podemos dizer que um
o grande obstáculo, à aceitação dos órgãos potencial doador deve preencher os se-
transplantados. Uma linha de drogas anti- guintes critérios:
rejeição procura “domar” a acentuada ati- Não apresentar insuficiência orgânica
vidade do sistema de defesa do organismo que comprometa a função dos órgãos ou
que interpreta o órgão transplantado como tecidos que possam ser doados, como in-
um “agente agressor ou invasor”. suficiência renal, hepática, cardíaca, pul-
monar, pancreática e medular;
TRANSFUSÃO (TRANSPLANTE) Não apresentar doenças infecto-con-
DE SANGUE tagiosas transmissíveis por meio do trans-
O transplante mais realizado no mun- plante, como soropositivos para HIV, he-
do é o transplante de tecidos sangue-san- patite C, doença de Chagas, etc...
gue, ou seja, a transfusão de sangue entre Não apresentar sepsis ou falência múl-
dois indivíduos, doador e receptor. A com- tipla de órgãos;
patibilidade exigida refere-se exclusiva- Não apresentar neoplasias, exceto tu-
mente aos sistemas de antígenos ABO e mores restritos ao sistema nervoso central,
Rh. Recomenda-se sempre transfundir carcinoma de pele;
sangue do mesmo tipo, exceto em circuns- Não apresentar doenças degenera-
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