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atellanae), peças populares, burlescas, grosseiras, equiva-

lentes às festas em honra a Baco; cultivaram-nas Pompônio


e Nóvio; a comédia paliata (comoedia palliata), assim cha-
mada pela vestimenta (pallium) usada pelos atores, seme-
lhante à dos gregos: seguia o modelo da comédia nova; co-
média togata, caracterizada por emprego da toga, indumen-
Disciplina: “Técnicas de Redação e Interpretação” tária romana, bem como a praetexta, que identifica a comé-
Turma: 3ª. Série do Ensino Médio dia praetexta. A despeito de alguns nomes respeitáveis, co-
Responsável: Prof. Adriano Tarra Betassa Tovani Cardeal mo Plauto, Terêncio e outros, a comédia não alcançou, em
Tema redacional 04: Horário eleitoral gratuito no Brasil: é Roma, os níveis atingidos na Grécia, como, aliás, reconhece
desfaçatez duma política cômica ou criticismo duma comé- Quintiliano (X, 1, 99). A comédia latina compunha-se de
dia política? prólogo, diálogo (diverbium) e acompanhamento musical
(flauta); ignorava o coro. Durante a Idade Média, a comédia
Comédia. Do grego antigo komoidi/a (“komoidía”), do la- praticamente deixou de circular, e o termo passou a designar
tim comoedia. Controvertida a origem do vocábulo grego: toda narrativa ou poema de epílogo feliz, como a Divina Co-
derivaria de ko/moj (“kômos”), o festim popular em louvor média, de Dante Alighieri. No fim dos tempos medievais,
de Baco, ou de ko/maj (“kómas”), aldeia, pois, segundo Po- ou seja, após o século XIII, representavam-se farsas, mo-
ética, de Aristóteles, os comediantes tiravam seu nome de mos, arremedilhos ou breves cenas cômicas, que anuncia-
“andarem os atores de aldeia em aldeia, por não serem pre- vam a ressurreição da comédia como fora praticada pelos
zados na cidade” (1448b). Tanto quanto a etimologia do vo- gregos e a retomada do sentido primitivo do vocábulo. Com
cábulo, a gênese da comédia mergulha em trevas: conside- a Renascença, não só a palavra reassumiu a primitiva signi-
ra-se, ainda na esteira de Aristóteles (1449a8), que a comé- ficação, como também o teatro cômico adquiriu estrutura fi-
dia resulta dos cantos fálicos, em homenagem a Dioniso ou xa sem perder desembaraço (divisão em três atos) e ergueu-
Baco. Ao findar do inverno, organizavam-se, na Grécia, fes- -se ao grau de beleza que havia logrado entre os gregos. Ini-
tins em louvor da primavera, encarnada em Baco, deus do cialmente, destacou-se Gil Vicente e o teatro popular, esta-
vinho e da inspiração poética: em procissão, conduzindo um belecendo um liame entre as escassas representações medie-
enorme falo, em andor, o povo entoava cânticos gratulatóri- vais e o surgimento da nova idade para a dramaturgia. [...]
os entremeados de danças e libações alcoólicas. Com o tem- No transcurso dos séculos, a comédia sofreu natural meta-
po, supõe-se que os cantos adquirissem tonalidade jocosa ou morfose até chegar à fisionomia que ostenta modernamente.
satírica, e suscitassem movimentos histriônicos, livres e de- Em parte, por isso e, em parte, devido a fatores intrínsecos,
sordenados. Por fim, algum poeta, decerto inspirando-se na a noção de “comédia” tem sido objeto de longas e discutí-
tragédia, resolveu agrupar as manifestações orgiásticas nu- veis análises. Para Aristóteles (Poética, 1499a32), define-se
ma peça única, que, sofrendo sucessivos aprimoramentos, como “imitação de homens inferiores; não, todavia, quanto
viria a transformar-se na comédia, cuja aparição oficial dar- a toda espécie de vícios, mas só quanto àquela parte do torpe
-se-ia em 486 a.C. E Aristóteles resume a questão nestes ter- que é o ridículo. O ridículo é, apenas, certo defeito, torpeza
mos: as mutações experimentadas na comédia “estão ocul- anódina e inocente, como bem o demonstra, por exemplo, a
tas, pois que delas se não cuidou desde o início: só passado máscara cômica que, sendo feia e disforme, não tem expres-
muito tempo o arconte concedeu o coro da comédia, que ou- são de dor”.
trora era constituído por voluntários. E também só depois
que teve a comédia alguma forma é que achamos memória (MOISÉS, Massaud. Dicionário de termos literários. São
dos que se dizem autores dela. [...] Não se sabe, portanto, Paulo: Cultrix, 2004, p. 79-80).
quem introduziu máscaras, prólogo, número de atores e ou-
tras coisas semelhantes” (1449b, 1449b3). Na Grécia, a co- Código Eleitoral Brasileiro
média evoluiu em três fases: a comédia antiga, estruturada
em quatro partes: prólogo, párodo (caracterizado por irrom- Parte Quinta
pimento festivo do coro, trajando máscaras e roupagem de Disposições várias
vário tipo), episódios (as cenas dialogadas entre dois atores, Título II
permeadas pelas intervenções do coro), êxodo (desenlace); Da Propaganda Partidária
ainda ocorria a parábase (interlúdio coral), correspondente
à suspensão da ação e a uma espécie de chamada dos espec- Art. 240. A propaganda de candidatos a cargos eleti-
tadores à realidade; via de regra, glosavam-se assuntos polí- vos somente é permitida após a respectiva escolha pela con-
ticos ou sociais; dentre seus cultores, sobressai Aristófanes; venção. Parágrafo único. É vedada desde quarenta e oito ho-
a comédia mediana, de assunto mitológico ou puramente li- ras antes até vinte e quatro horas depois da eleição qualquer
terário, no início, e de índole social, mais adiante; caracteri- propaganda política mediante radiodifusão, televisão, comí-
za-se pela ausência do coro; representam-na Antífanes, Ale- cios ou reuniões públicas.
xis e outros; a comédia nova, decorrente da anterior, gira em Art. 241. Toda a propaganda eleitoral será realizada
torno das paixões, sobretudo o amor, e dos costumes; estru- sob a responsabilidade dos partidos e por eles paga imputan-
turalmente, prima pela economia dos acontecimentos e a do-lhes solidariedade nos excessos praticados por seus can-
simplicidade na configuração das cenas, e pelo emprego do didatos e adeptos. Parágrafo único. A solidariedade prevista
diálogo; representam-na, entre outros, Filêmon, Apolodoro neste artigo é restrita aos candidatos e aos respectivos parti-
de Carystos e Menandro, dos quais o último é o mais impor- dos, não alcançando outros partidos, mesmo integrantes de
tante e um dos mestres da comédia que se desenvolveria em uma mesma coligação.
Roma após o declínio na Grécia. Entre latinos, distinguem- Art. 242. A propaganda, qualquer que seja a sua for-
-se as seguintes modalidades de comédia: atelanas (fabulae ma ou modalidade, mencionará sempre a legenda partidária
e só poderá ser feita em língua nacional, não devendo em-

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pregar meios publicitários destinados a criar, artificialmen-
te, na opinião pública, estados mentais, emocionais ou pas-
sionais. Parágrafo único. Sem prejuízo do processo e
das pe-nas cominadas, a Justiça Eleitoral adotará medidas
para fa-zer impedir ou cessar imediatamente a propaganda
realizada com infração do disposto neste artigo.
Art. 243. Não será tolerada propaganda: I –de guerra,
de processos violentos para subverter o regime, a ordem po-
lítica e social ou de preconceitos de raça ou de classes; II –
que provoque animosidade entre as forças armadas ou con-
tra elas, ou delas contra as classes e instituições civis; III –
de incitamento de atentado contra pessoa ou bens; IV – de
instigação à desobediência coletiva ao cumprimento da lei
de ordem pública; V – que implique oferecimento, promes-
sa ou solicitação de dinheiro, dádiva, rifa, sorteio ou vanta-
gem de qualquer natureza; VI – que perturbe o sossego pú-
blico, com algazarra ou abusos de instrumentos sonoros ou
sinais acústicos; VII – por meio de impressos ou de objeto
que pessoa inexperiente ou rústica possa confundir com mo-
eda; VIII – que prejudique a higiene e a estética urbana ou
contravenha a posturas municiais ou a outra qualquer restri-
ção de direito; IX – que caluniar, difamar ou injuriar quais-
quer pessoas, bem como órgãos ou entidades que exerçam
autoridade pública. § 1º. O ofendido por calúnia, difamação
ou injúria, sem prejuízo e independentemente da ação penal
competente, poderá demandar, no Juízo Civil a reparação
do dano moral respondendo por este o ofensor e, solidaria-
mente, o partido político deste, quando responsável por ação
ou omissão a quem que favorecido pelo crime, haja de qual-
quer modo contribuído para ele. § 2º. No que couber aplicar-
-se-ão na reparação do dano moral referido no parágrafo an-
terior, os artigos 81 a 88 da Lei nº 4.117, de 27 de agosto de
1962. § 3º. É assegurado o direito de resposta a quem for in-
juriado difamado ou caluniado através da imprensa, rádio,
televisão, ou alto-falante, aplicando-se no que couber os ar-
tigos 90 e 96 da Lei nº 4.117, de 27 de agosto de 1962.

(“Código Eleitoral”. In: Vade mecum acadêmico de Direi-


to. São Paulo: Rideel, 2009, p. 616).

Constituição da República Federativa do Brasil

Art. 221. Produção e programação das emissoras de


rádio e televisão atenderão aos seguintes princípios: I – pre-
ferência às finalidades educativas, artísticas, culturais e in-
formativas; II – promoção da cultura nacional e regional e
estímulo à produção independente que objetive sua divulga-
ção; III – regionalização da produção cultural, artística e jor-
nalística, conforme percentuais estabelecidos em lei; IV – o
respeito aos valores éticos e sociais da pessoa e da família.

(“Constituição Federal”. In: Vade mecum acadêmico de


Direito. São Paulo: Rideel, 2009, p. 74)

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A arma do riso cular, e, com isso, chegamos à constatação mais característi-
ca (e, talvez, a mais desconcertante também) da literatura
Quentin Skinner humanista e médica da qual estamos falando: a de que essa
alegria expressa pelo riso sempre está associada a sentimen-
Ao final de Além do bem e do mal, Nietzsche nos diz: tos de desprezo, quando não de ódio – o ódio de Descartes.
“Eu iria ao ponto de me aventurar a classificar os filósofos Entre humanistas, um dos primeiros argumentos nesse sen-
segundo o escalão de seu riso”. Ele sente aversão violenta tido é apresentado por Castiglione, para quem, “a cada vez
pelos filósofos que, em suas palavras, “procuraram atribuir que rimos, sempre estamos zombando de alguém e despre-
má fama ao riso”. E considera Thomas Hobbes (1588-1679) zando alguém”, estamos sempre “buscando zombar dos ví-
especialmente culpado dessa falha, acrescentando que a ati- cios”. E os escritores médicos expõem a mesma teoria de
tude puritana dele é exatamente o que se poderia esperar de maneira mais completa. Possivelmente, a mais sutil análise
um inglês. Na realidade, sua acusação se baseia num erro de feita sobre esse ponto é a de Joubert em seu Tratado do riso.
citação do que Hobbes diz sobre riso na filosofia. Mas, Nie- Cito seu primeiro capítulo: “Qual é o tema do riso?”. E ele
tzsche (1844-1900) tinha razão, sem dúvida, quando obser- responde que rimos de “tudo o que é ridículo, quer seja algo
vou que Hobbes, em comum com a maioria dos pensadores dito, quer seja feito”. Mas qualquer coisa que consideremos
de sua era, dava como certo e evidente que o riso é um tema ridícula, ele explica no segundo capítulo, será sempre “algo
pelo qual filósofos devem se interessar seriamente. A meu que vemos qual feio, deformado, desonesto, indecente, mal
ver, esse interesse começa a tomar vulto nas primeiras déca- intencionado e indecoroso. Um estilo comum de nosso riso
das do século 16, em especial entre humanistas tão eminen- sempre é o escárnio ou a zombaria”. Esse argumento é mui-
tes como Baldessare Castiglione (1478-1528), no seu O cor- to desenvolvido pela geração seguinte, sobretudo por aque-
tesão (1528), Rabelais em seu Pantagruel (1533) e Juan Lu- les que gostariam de ligar as observações dos humanistas às
is Vives, em De anima et vita (1539), sem falar em diversos de uma literatura médica em plena eclosão. Talvez o mais
textos de Erasmo. Mais tarde no mesmo século, pela primei- importante escritor a ter se esforçado para forjar esses laços
ra vez desde a Antiguidade, começou a surgir uma literatura seja Robert Burton, num texto espantoso, A anatomia da
especializada não apenas nos aspectos psicológicos do fenô- melancolia (1621). Ele começa por nos dizer, em seu prefá-
meno, mas também nos fisiológicos. O pioneiro, nessa área, cio, que, “quando rimos, condenamos aos outros, condena-
foi o médico Laurent Joubert (1529-1582), de Montpellier, mos o mundo de fraquezas e desvarios”, acrescentando que
cujo Tratado do riso foi lançado em Paris, em 1579. Pouco “o mundo nunca antes teve tantos desvarios a serem conde-
mais tarde diversos tratados comparáveis apareceram na Itá- nados, nunca antes esteve tão repleto de pessoas que são
lia, incluindo De risu, ac ridiculis (1598), de Celso Mancini, tolas e ridículas”. Do mesmo modo, como destaca Descartes
De risu (1603), de Antonio Lorenzini, e Phisici et philoso- em As paixões da alma, “embora o riso pareça ser dos prin-
phi Tractatus de risu (1603), de Elpidio Berrettario, no mes- cipais sinais da alegria, ela não pode ser causa de riso, a não
mo ano. Pode parecer surpreendente que tantos médicos te- ser que seja apenas moderada e, ao mesmo tempo, misturada
nham se debruçado com tanto entusiasmo sobre um tema es- com alguma dose de ódio ou admiração”. Hobbes, em Os e-
sencialmente humanista (entre eles, é evidente, figurava Ra- lementos da lei, tinha dito isso vários anos antes: “A paixão
belais), e esse é um enigma sobre o qual voltarei a falar mais do riso nada mais é do que uma glória repentina que surge
tarde. No momento, quero me limitar a falar dos filósofos e de uma repentina concepção de alguma eminência em nós
chamar a atenção para o grande destaque conferido ao tema mesmos, quando nos comparamos com as fraquezas dos ou-
por muitos dos maiores expoentes da nova filosofia na gera- tros ou com as nossas fraquezas passadas. Esses sentimen-
ção seguinte. Descartes analisa o lugar do riso entre as emo- tos de glória são sempre desdenhosos, sempre uma questão
ções em sua última obra As paixões da alma (1648). Hobbes de glorificar a nós mesmos em relação aos outros, de modo
trata de muitas das mesmas questões em Os elementos da que, quando alguém ri de nós, triunfa sobre nós e zomba de
lei e, novamente, em Leviatã. Espinosa (1632-1977) defen- nós”. Assim, segundo essa análise, na visão de todos esses
de o valor do riso no livro 6 da Ética, e diversos seguidores escritores, se você se vê gargalhando, duas coisas devem ter
declarados de Descartes manifestam um interesse especial acontecido. Você deve ter se dado conta de algum vício ou
pelo fenômeno, sendo exemplo notável deles Henry More, fraqueza desprezível em seu eu anterior ou (melhor ainda)
em seu Account of virtue. A pergunta que quero formular em outra pessoa. E deve ter tomado consciência disso de
com relação a tudo isso é simplesmente a seguinte: por que maneira a gerar um sentimento de superioridade que é reple-
todos esses autores se consideram na obrigação de interes- to de alegria. Vale notar que, segundo essa tradição de pen-
sar-se seriamente pelo riso? Me parece que a resposta deve samento, é preciso traçar um contraste marcante entre riso e
ser procurada no fato de que todos estão de acordo quanto a sorriso. O riso, de modo geral, exprime escárnio, mas o sor-
um ponto fundamental. Esse ponto é que a questão mais im- riso é interpretado como expressão natural de prazer e, espe-
portante que se coloca com relação ao riso é a das emoções cialmente, de afeto e encorajamento. Por exemplo, Thomas
que o provocam. Uma das emoções envolvidas, concordam Browne, outro médico impregnado de saber humanista, faz
todos, deve necessariamente ser alguma forma de alegria ou referência a essa distinção em seu trabalho Pseudodoxia
felicidade. Entre autores humanistas, Castiglione, em O cor- epidêmica (1640), num trecho em que trata do enigma esco-
tesão, enfatiza que “o riso é observado apenas na humanida- lástico que indaga se Cristo alguma vez riu. Sua resposta é
de, e é sempre sinal de certa jovialidade e certo ânimo alegre que, mesmo que concedamos que ele nunca o haja feito, não
que o homem sente no interior de sua mente. No prazo de podemos imaginar que ele nunca tenha sorrido, pois seu sor-
uma geração, todos que escreviam sobre o assunto já tinham riso teria sido a mais certeira prova de sua humanidade. Essa
passado a dar essa premissa como certa. Descartes observa visão do sorriso como expressão de alegria e amor o liga ao
simplesmente que “o riso parece um dos principais sinais da sublime e, especialmente, às imagens cristãs do Paraíso co-
alegria”, e Hobbes conclui, ainda mais vivamente, que “o ri- mo estado de alegria eterna. Encontramos várias expressões
so sempre é alegria”. Entretanto, também era amplamente semelhantes de êxtase na arte do Renascimento, nas quais
reconhecido que essa alegria devia ser de tipo bastante parti- geralmente nos é informado – por gestos das mãos ou pelos

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olhares repletos de sentimento lançados para o alto – que o é dito e feito, ou entre as verdades da natureza. Um século
objeto da alegria é, de fato, celestial. Entretanto, no caso mais tarde, essa questão é levada adiante por Quintiliano (c.
mais célebre de todos, o de La Gioconda (1503-1506), de 35-95) em sua Institutio oratoria, de longe o mais completo
Leonardo da Vinci, a fonte da alegria interior que leva a Mo- dos tratados sobre a arte da eloquência escritos na Antigui-
na Lisa a sorrir permanece um mistério, que confere à tela dade. Para Quintiliano, o riso (ridere) é irrisão (deridere).
seu caráter eternamente enigmático. Creio que, nesse ponto, Logo, diz ele, “quando rimos, estamos nos glorificando com
a estética romântica obliterou um contraste importante, se relação ao outro, porque nos demos conta de que, compara-
bem que o tenhamos conservado na linguagem do dia a dia. do a nós, ele sofre de uma fraqueza ou debilidade desprezí-
Teóricos românticos da estética, como Edmund Burke, gos- vel”. Assim, desde o ponto onde estamos, parece claro que
tam de vincular o sublime ao belo, como no título de famoso a contribuição de autores da Renascença para a teoria do ri-
ensaio de Burke (Uma investigação filosófica sobre a ori- sível foi bem menos original do que eles quiseram admitir.
gem de nossas ideias do Sublime e do Belo). Mas, na teoria Os humanistas tinham uma dívida considerável para com a
da época clássica e do Renascimento que examino, sempre literatura retórica da Antiguidade, sobretudo com a análise
existe o contraste entre o sublime, que nos faz sorrir, e o ri- de Cícero em De oratore. Apesar disso, seria engano deixar
dículo, pelo qual demonstramos desprezo rindo. E continua- entender que os autores do início da época moderna apenas
mos a dizer que apenas um passo separa o sublime do ridícu- repetiram passivamente as idéias de suas autoridades clássi-
lo. A ideia de que o sorriso expressa amor, enquanto o riso cas. Devo destacar agora que aos argumentos que herdaram
reflete escárnio, estava destinada a durar muito tempo. Se, eles acrescentaram duas análises importantes. Em primeiro
por exemplo, formos olhar o ensaio de Baudelaire Da essên- lugar, os autores médicos conferem uma importância de na-
cia do riso, de 1855, nós o veremos ainda declarando que o tureza fisiológica inteiramente nova ao papel do repentino,
riso é diabólico e, a título de explicação, citando fato de que e, por conseguinte, da surpresa, na provocação do riso, in-
ele tem suas raízes no orgulho e no desdém, os mais mortais troduzindo na discussão por primeira vez a concepção-cha-
dos pecados capitais. Apesar de sua influência considerável, ve da admiratio – ou “admiração”, “espanto”. Aqui a análise
porém, essa explicação está longe de ser autoevidente, e me pioneira, segundo pude determinar, foi a de Girolamo Fra-
parece natural começar por indagar sobre sua origem. Quan- castoro, em seu De sympathia (1546). Cito: “As coisas que,
do e onde surgiu essa visão do riso e como ela chegou a e- geralmente, nos levam a rir devem ser dotadas de certa novi-
xercer uma influência tão poderosa sobre a filosofia do Re- dade e devem aparecer diante de nós de maneira repentina
nascimento e do início da época moderna? A mais frequen- e inesperada. Quando isso acontece, temos um sentimento
temente citada observação de Aristóteles sobre o riso vem de admiração que, por sua vez, gera em nós um sentimento
do texto conhecido na Antiguidade romana como De de alegria e prazer. O inesperado gera a admiração, a admi-
partibus animalium, no qual o autor nota que os seres huma- ração gera a alegria e é a alegria que nos faz rir”. Essa des-
nos são as únicas criaturas que riem. Para minha finalidade coberta é imediatamente retomada pelos filósofos. É especi-
atual, porém, suas observações mais relevantes podem ser almente o caso de Descartes, para quem a admiração é uma
encontradas em sua Arte retórica, especialmente no trecho paixão fundamental. Resumo sua análise intensamente me-
do livro 2 no qual Aristóteles (384 a.C.–322 a.C.) discute os canicista: quando o sangue é impelido “para o coração por
modos da juventude. Chama a atenção o fato de que a pri- qualquer leve sentimento de ódio, ajudado pela surpresa da
meira tradução desse livro para o inglês tenha sido obra de admiração”, os pulmões se dilatam subitamente, “empurram
Thomas Hobbes, que o publicou por volta de 1637. Nessa os músculos do diafragma, do peito e da garganta, por meio
tradução, segundo Hobbes, Aristóteles (livro 2, capítulo 12) dos quais fazem mexer-se os do rosto, e é apenas essa ação
diz que “o gracejo é uma injúria repleta de ânimo, e essa in- do rosto, com essa voz inarticulada e descontrolada, à qual
júria consiste em desonrar a outro para nosso próprio diver- chamamos o riso”. Mas são exatamente os mesmos aspectos
timento, de modo que o riso é sempre expressão de nosso que encontramos na análise anterior de Hobbes em Os ele-
desprezo. A isso devemos acrescentar o que diz Aristóteles, mentos da lei. Também ele insiste no papel da surpresa, ar-
em sua Poética, especialmente no trecho curto que dedica à gumentando que “à medida que uma mesma coisa deixa de
mimese manifesta na comédia. A comédia, ele escreve, trata ser ridícula quando se torna velha ou usual, a causa do riso,
do que é risível, e aquilo que é risível é um aspecto do que seja ela qual for, deve ser nova e inesperada”. Ele também
é vergonhoso, feio ou vil. Se nos vemos rindo de alguém, é destaca que a causa do riso deve ser “alguma coisa que pro-
porque essa pessoa manifesta um defeito ou uma marca de voca a admiração”. A outra contribuição importante à teoria
vergonha que, mesmo não dolorosos, a tornam ridícula. As- do riso feita pelos teóricos do início da época moderna se o-
sim, os mais risíveis são aqueles que nos são, de alguma ma- rigina de uma lacuna que eles observaram na análise origi-
neira, inferiores, embora de caráter não inteiramente vicia- nal de Aristóteles. Como já vimos, a tese de Aristóteles em
do. Mas a principal tradição do pensamento da Antiguidade Poética é que o riso reprova a falha de caráter, à medida que
dentro do qual adotamos esse conceito do riso como expres- exprime e pede sentimentos de desprezo para com aqueles
são do desprezo não é médica, e sim retórica, e emana dire- que se comportam de maneira ridícula. Mas como observam
tamente da análise aristotélica tirada da Retórica. Nós a en- nossos autores, Aristóteles, de maneira pouco habitual para
contramos desenvolvida sobretudo por Cícero (106 a.C.–43 ele, deixou de oferecer uma definição do ridículo e, por con-
a.C.), cujo grande tratado sobre a arte da eloquência, De seguinte, de indicar quais falhas de caráter específicas são
oratore, inclui no seu livro 2 o discurso “De ridiculis”. Cito: as mais suscetíveis de provocar o riso de desdém. É possível
“O campo apropriado do riso é restrito a questões que sejam, que Aristóteles tenha analisado essas questões no livro 2 da
dalgum modo, indignas ou deformadas, pois a causa princi- Poética, que, como é sabido, tratava da comédia. Mas esse
pal da hilaridade, senão a única, é o tipo de observação que texto se perdeu no final da Antiguidade, e nada se sabe sobre
distingue e chama a atenção, de maneira que não é em si in- o assunto. Para autores médicos, a questão do que Montai-
decorosa, para alguma coisa que é de alguma maneira inde- gne iria chamar de “vícios ordinários” não apresentava ne-
corosa ou inconveniente”. Assim, continua Cícero, o verda- nhum interesse. Para humanistas, porém, ela frequentemen-
deiro tema da comédia é sempre a desproporção entre o que te parecia ser a mais importante de todas, e é a análise de

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Castiglione que parece ter exercido a influência maior. A i- A razão, dizem eles, é que não é verdade, de maneira algu-
deia fundamental de Castiglione, tirada diretamente de Cí- ma, que o riso, às vezes, seja suscitado por sentimentos de
cero, é de que os vícios ou defeitos de caráter que podemos alegria pura. O contra-argumento deles, extremamente inte-
esperar ridicularizar com maior êxito são aqueles que apre- ressante, é de que, se você acredita no contrário, engana a si
sentam alguma desproporção em relação às verdades da na- mesmo. Não somos levados a rir exceto pelo tipo de senti-
tureza, e, em especial, aqueles que traem o que ele chama mento de desprezo que uma sátira bem-sucedida consegue
de uma visão “afetada” de nosso próprio valor. E ele nos diz suscitar. A reação quase unânime dos autores humanistas e
que existem três vícios principais dessa natureza: a avareza, médicos de que falo, e isso desde o tratado pioneiro de Lau-
a hipocrisia e a vaidade. Deve-se observar até que ponto es- rent Joubert, é que, qual diz o próprio Joubert em seu capítu-
se argumento sempre foi reconhecido pelos autores cômicos lo introdutório, o riso nunca expressa a alegria, mas apenas
do início do período moderno. As comédias de Ben Johnson o desprezo ou desgosto. Publicado alguns anos mais tarde,
são repletas de puritanos hipócritas, e o Tartufo de Molière o exemplo mais célebre dessa réplica é Defesa da poesia, de
oferece o retrato acabado do intrigante maquiavélico que se Philip Sidney, no final do qual ele critica os autores de co-
faz passar por devoto. Entretanto, entre os teóricos do Re- médias pelo que considera ser sua opinião errônea de que o
nascimento, é à soberba ou vaidade que se atribui a impor- riso, às vezes, é causado pela felicidade ou o prazer. O riso,
tância maior. No ponto em que estamos, você certamente i- responde Sidney, nunca é provocado senão por sentimentos
magina – como imaginavam muitos pensadores na época – de desprezo. Assim, o que ele faz é uma exposição da teoria
que a teoria da época clássica e do Renascimento que acabo clássica do riso como expressão de alegria misturada com
de expor certamente contém um erro. Afinal, certamente é ódio e desprezo. Mas a questão que devemos nos fazer sobre
falso que rimos apenas quando vemos que alguém tem uma os autores dos quais falei é, me parece, o porquê de essa teo-
opinião desproporcional a seu próprio respeito, de tal modo ria ser tão importante aos olhos deles. Por que eles conside-
que nosso riso sempre expressa nosso desprezo? É verdade raram o riso um tema de importância filosófica, até mesmo
que o riso, às vezes, exprime não sentimentos alegres de su- médica? Quero me voltar a essa questão agora, e, portanto,
perioridade, mas simplesmente a alegria – como dizem in- ao que há de essencial nestas observações. Para os médicos,
gleses, a alegria de viver. Está, aí, exemplo mais célebre, a a importância da teoria clássica está no fato de que ela con-
objeção que faz Espinosa à teoria clássica, no livro 4 de sua fere ao riso um lugar na promoção da boa saúde. Como ex-
Ética. E Spinoza utiliza esse argumento para introduzir sua plica Joubert com detalhes, é especialmente benéfico incen-
defesa do teatro e, de maneira mais geral, do lado mais leve tivar a alegria em indivíduos de temperamento frio e seco e,
da vida, que ele considera não apenas compatíveis com a vi- portanto, dotados de coração pequeno e duro. Toda pessoa
da virtuosa que Ética procura nos apresentar, mas parte inte- que tiver o azar de nascer com esse temperamento, ou, como
grante dessa vida. Já tínhamos encontrado essa objeção em diz Joubert, com esses humores, sofre de um excesso de bile
alguns autores médicos do Renascimento, sem dúvida preo- negra no baço, o que suscita sentimentos de ira, que, se não
cupados em tomar uma distância em relação a Aristóteles e forem tratados, conduzem à perda de ânimo e, finalmente, à
à escolástica. Mas, seguindo a objeção feita por diversos melancolia. Mas é notável que esse raciocínio não é válido,
desses autores, notadamente Fracastoro, o que dizer dos be- a não ser que o riso seja efetivamente uma expressão natural
bês? Os bebês riem, mas será que podemos realmente enxer- do desprezo. E acredito que é esse tipo de raciocínio que ex-
gar seu riso como expressão de desprezo pelas falhas de ca- plica por que médicos entusiasmaram-se tanto com a ideia,
ráter? Pouco provável. Mais tarde, especialmente no Ilumi- essencialmente retórica, de que o riso é, de fato, uma expres-
nismo inglês, vemos surgir o mesmo argumento anti-aristo- são natural do desprezo. Se, agora, retornarmos aos filóso-
télico também como resposta a Hobbes, além de servir co- fos, e mais especialmente aos retóricos, encontraremos um
mo defesa geral da idéia de que pode existir um riso pura- tipo de raciocínio inteiramente diferente. Para esses autores,
mente benevolente. É esse o teor dos artigos de Addison so- o fato de o riso exprimir desprezo interessa essencialmente
bre o riso publicado na Spectator em 1711. E também o de à esfera do discurso público. Como o riso é uma manifesta-
Reflexões sobre a risada, de 1725, em que Francis Hutche- ção exterior dessas emoções particulares, dizem eles, pode-
son discorda especificamente das idéias de Hobbes. Talvez, mos esperar fazer dele uma arma de potência incomparável
mais interessante de todos seja o prefácio a Joseph Andrews, para o debate moral e político. É uma afirmação de peso, e
do escritor Henry Fielding, no qual este traça uma distinção é com a explicação dela que quero concluir. Talvez eu deva
marcada entre o cômico e o que ele descreve como burlesco. começar pelo postulado mais fundamental herdado pelos fi-
A comédia reprova as falhas de caráter, diz ele, “mas o bur- lósofos do Renascimento da cultura retórica da Antiguidade
lesco, que contribui mais do que qualquer outra coisa ao riso romana. Para apresentar esse postulado nos termos que aca-
prazeroso nunca o faz por meio do desprezo”. Trata-se, mais bariam ganhando forma de provérbio, sempre existem dois
do que isso, de inverter nossas expectativas, criando justa- lados opostos de qualquer questão nas ciências morais e pú-
posições surpreendentes ou outras formas de incongruidade. blicas. Como explica Quintiliano, em toda questão que diz
O efeito, se der certo, nos fará rir, mas, diz Fielding, em tais respeito às ciências humanas, em oposição às ciências natu-
ocasiões nosso riso será “repleto de bom humor e benevo- rais, sempre será possível “empregar as armas dum discurso
lência”. Essa observação assinala toda uma teoria rival so- poderoso in utramque partem, ou seja, para dar razão a uma
bre o que nos leva a rir. Apesar disso é muito importante re- das partes”, de modo que nunca será possível demonstrar
conhecer que essa categoria do riso benevolente, e, por con- sem sombra de dúvida que apenas uma das partes tem razão.
seguinte, do gênero da comédia não satírica, não foi, por as- Isso implica (e esse argumento foi em grande parte recupe-
sim dizer, ignorada pelos autores médicos e retóricos dos rado pela filosofia pós-moderna em seu tempo) que não po-
quais falei. Eles reconheciam que, se por comédia entende- de haver conclusão (de uma discussão) nas ciências morais,
mos simplesmente qualquer narrativa que termina bem, cer- de modo que a única maneira de conduzir tais discussões
tamente podem existir comédias não satíricas. Mas se enten- deve ser pela forma de diálogo. Considerava-se à época que
demos por comédia uma forma literária na qual a intenção existiam duas ciências morais principais. Uma delas era o
é provocar o riso, então toda comédia é e deve ser satírica. direito, foro de exercício da retórica judiciária, em que pro-

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curamos chegar a um veredicto em conformidade com a Jus- autores sobre o tipo de emoção suscitada pelo riso e, em se-
tiça. A outra era a política, foro do exercício da retórica deli- guida, sobre o tipo de emoções que serão efetivamente sus-
berativa, onde procuramos convencer o povo a agir de ma- citadas se se conseguir provocar o riso numa plateia. Como
neira benéfica para o Estado. Na realidade, operamos com já vimos, a teoria clássica – para dizê-lo da forma mais sim-
esses postulados retóricos ainda hoje. No tribunal, os inte- ples possível – afirma que rir sempre significa rir de alguém.
grantes do júri ainda precisam chegar ao veredicto ouvindo Mas isso quer dizer que, se conseguíssemos provocar o riso
os argumentos apresentados pelas duas partes em cada jul- contra nossos inimigos dialéticos, teríamos conseguido fa-
gamento, de lados opostos do recinto do tribunal. As assem- zer que fossem desprezados. Eis por que uma capacidade de
bleias representativas do Renascimento tinham dois lados, suscitar o riso é vista qual arma tão fatal para o debate, e por
um de frente para o outro, como ainda é o caso hoje na Câ- que, portanto, lhe é dada uma importância tão grande na ar-
mara dos Comuns (é por isso que, na Grã-Bretanha, não po- gumentação. Conseguir provocar o riso tem por efeito dire-
demos ter mais de dois partidos políticos). A questão tem to, como se diz, diminuir nossos adversários. E, de maneira
dois lados, e o objetivo deve ser defender seus argumentos mais indireta, como já disse Cícero, isso tem por efeito en-
de tal maneira que, como vamos continuar a dizer, você grandecer nosso lado no argumento, já que, em comparação
consiga convencer seu público a decidir a seu favor ou colo- ao do adversário, ele parecerá preferível. Mesmo assim, re-
car-se a seu lado, de modo que, como também continuare- tóricos ainda acham necessário explicar como podemos es-
mos a dizer, ele adote a mesma posição que você quanto à perar suscitar emoções tão profundas por meios exclusiva-
questão em pauta. Essa imagem sobrevive à época moderna mente linguísticos, com uso de tropos escarnecedores. Eles
com a opinião segundo a qual a maior façanha de um orador pensam, evidentemente, que o êxito da empreitada, a produ-
em um parlamento sempre será a de fazer seu adversário tro- ção de um sentimento de desprezo pelo absurdo humano,
car de partido, ou seja, levá-lo a “atravessar a sala”. Seu ob- depende em parte do que se vai dizer. Mas recordemos as i-
jetivo essencial, portanto (apelando para outro trocadilho deias deles sobre o efeito específico e devastador que pro-
que sobrevive no inglês) será de falar winningly, ou seja, de duz o riso se, e apenas se, formos repentinamente levados a
modo a conquistar o outro para a defesa de sua própria cau- ver que alguma coisa ou pessoa é absurda. É aqui, dizem e-
sa. Mas eis a questão essencial: como fazê-lo? Não se che- les, que se torna muito útil conhecer certos segredos retóri-
gará a isso com o raciocínio, já que reconhecemos que será cos. Pois os tropos zombeteiros são vistos como exatamente
possível encontrar razões igualmente boas para defender um os meios linguísticos que, corretamente empregados, pos-
argumento ou o outro. Como, então? Não sem alguma hesi- suem o poder de provocar exatamente o gênero de surpresa
tação, os teóricos da retórica da época clássica e do Renasci- que vai gerar a reação do riso. Nossa história chega ao fim
mento respondem que o orador deve aprender a reforçar seu dentro do contexto do que o sociólogo Norbert Elias (1897-
raciocínio com a energia apaixonada de seu discurso. Em 1991) chamou de o processo da civilização, do qual um as-
outras palavras, ele terá que aprender como suscitar em seu pecto maior foi, na cultura europeia moderna, a exigência
público envolvimento puramente emocional a favor da parte crescente do controle, pela vontade, de várias funções cor-
que ele defende. Logo, o cerne do argumento é um jogo de porais até então vistas como involuntárias. Ao que tudo in-
palavras deliberado envolvendo as palavras “mover” e “co- dica, o riso faz parte da classe das ações aparentemente in-
mover”. Um dos objetivos do debate moral ou político sem- voluntárias que as pessoas de temperamento refinado se pre-
pre deve ser de mover ou comover o público para levá-lo a ocupam especialmente em controlar. Já tínhamos encontra-
aderir a seu ponto de vista. Mas a única maneira de alcançar do essa ideia no final do século 17, mas a análise que faz re-
esse objetivo será falar ou escrever, de modo que as pessoas ferência a ela (pelo menos na cultura inglesa) aparece nos a-
não apenas fiquem convencidas, mas “fortemente comovi- nos 1740, numa das cartas do conde de Chesterfield a seu
das”. É esse poder que leva um adversário a mudar de parti- filho, em que ele trata do comportamento ideal do cavalhei-
do, a passar para o seu lado. Ele só será movido se se sentir ro. Em sua carta, o conde declara que “nada é tão grosseiro
comovido. Essas discussões deixam os retóricos diante de ou indecoroso quanto um riso audível, de modo que o riso é
uma questão de importância prática considerável. Existem algo acima do que pessoas sensatas e bem nascidas devem
técnicas específicas que poderíamos aprender e aplicar para se erguer”. A razão disso é que o riso revela, de maneira ver-
conseguir despertar as emoções profundas de uma plateia? gonhosa, a perda do controle sobre o próprio corpo. Como
Sim, existem, segundo Cícero e Quintiliano, e a técnica que diz Chesterfield, rir é “baixo e indecoroso sobretudo em vir-
é preciso cultivar, antes de mais nada, é aquela que permite tude do som desagradável que provoca e da chocante defor-
manipular figuras e tropos do discurso. Como diz a persona- mação do rosto que suscita quando a ele sucumbimos”. Por-
gem Crasso em De oratore, é sobretudo nisso que consiste tanto, começou-se a pensar, na Inglaterra da época do Ilumi-
o meio graças ao qual você pode esperar falar winningly, ou nismo, que, embora continue a ser verdade que o riso expri-
seja, de maneira a conquistar seu público para a defesa de me sobretudo a emoção do desprezo, e mesmo que se deseje
sua causa. Mas parece natural responder que a manipulação sempre, ao mesmo tempo, exprimir e suscitar essa mesma
das figuras e dos tropos parece exercer efeito retórico bas- emoção, não queremos nos deixar sermos flagrados no ato
tante modesto. Como pode ter resultados tão espetaculares? de exprimir essa emoção dessa maneira. Precisamos de algo
Os retóricos clássicos têm diversas respostas para essa ques- mais controlado e, como acrescenta Chesterfield explicita-
tão, mas a principal é que podemos recorrer a uma categoria mente, essa necessidade pode ser satisfeita, já que, na reali-
específica do que eles chamam de “tropos escarnecedores”, dade, o riso não é nada involuntário. Em lugar disso, como
com a finalidade de suscitar o riso. Quando Quintiliano pri- ele diz, “o riso pode, facilmente, ser restrito com um pouco
meiro introduz essa sugestão, reconhece que “ela certamen- de reflexão e educação”. O que, então, substitui o riso quan-
te parecerá trivial, mas não o é, pois esse uso do humor alia- do ele é suprimido? A resposta – e concluirei com ela – é a-
do à capacidade de inspirar pena é, de fato, o meio de susci- quilo que, em inglês, foi chamado, sem grande elegância, de
tar as emoções que exercem maior efeito”. Agora, fica claro sub-laugh. Mas o que é esse sub-laugh? A ideia se exprime
por que esses autores veem tal dom como tão importante na melhor em francês porquanto o que nos pedem que façamos,
área do discurso público. Basta recordar as análises desses quando temos vontade de rir, é sous rire – sorrir. Assim, mi-

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nha história termina com a supressão do riso em nome do impedimentos externos; e qual a que se adapta às diversas
decoro e com a sua substituição pelo sorriso desdenhoso. E condições em que possa ser posta em prática. Como é quase
Chesterfield conclui o conselho a seu filho dizendo: “Desejo impossível que muitas pessoas possam realizar a melhor
profundamente que você seja visto sorrindo com frequência, forma de governo, o bom legislador e o bom político devem
mas que nunca seja ouvido rindo durante toda sua vida”. saber qual é a melhor forma de governo em sentido absoluto
e qual é a melhor forma de governo em determinadas condi-
(Folha de S. Paulo, “Mais!”, 04.08.2002) ções (Política, IV, 1, 1288b21). Nesse sentido, segundo A-
ristóteles, a política tem duas funções: 1ª. descrever a forma
Política. s.f. (sXV) 1 arte ou ciência de governar 2 arte ou de Estado ideal; 2ª. determinar a forma do melhor Estado
ciência da organização, direção e administração de nações possível em relação a determinadas circunstâncias. Efetiva-
ou Estados; ciência política 3 orientação ou método político mente, a política como teoria do Estado seguiu o caminho
4 arte de guiar ou influenciar o modo de governo pela orga- utópico da descrição do Estado perfeito (segundo o exemplo
nização de um partido, influência da opinião pública, alicia- da República de Platão) ou caminho mais realista de modos
ção de eleitores etc. 5 prática ou profissão de conduzir negó- e instrumentos a melhorar a forma do Estado, o que foi feito
cios políticos 6 cerimônia, cortesia, urbanidade 7 fig. habili- pelo próprio Aristóteles numa parte de seu tratado. Tais du-
dade no relacionar-se com os outros, tendo em vista a obten- as partes, todavia, nem sempre são facilmente distinguíveis
ção de resultados desejados. ETIM gr. politikê (sc. tékhné) e nem sempre foram distintas. Quando, a partir de Hegel, o
“(ciência) dos negócios do Estado etc.” SIN/VAR ver sino- Estado começou a ser considerado “o deus real”, e o caráter
nímia de delicadeza ANT ver antonímia de delicadeza PAR da divindade do Estado foi aceito pela historiografia, a polí-
politica (fl. politicar). tica, como teoria do Estado, pretendeu ter caráter descritivo
e normativo ao mesmo tempo. Logo, Treitschke esboçava a
(HOUAISS, Antônio et al. Dicionário Houaiss da língua sua tarefa no seguinte sentido: “A tarefa da política é trípli-
portuguesa. Rio de Janeiro: Objetiva, 2009, p. 1519). ce: em primeiro lugar, deve investigar, através da observa-
ção do mundo real dos Estados, qual é o conceito fundamen-
tal de Estado; em segundo lugar, deve indagar historicamen-
te o que os povos quiseram, produziram e conseguiram – e
por que conseguiram – na vida política; e, em terceiro lugar,
fazendo isso, consegue descobrir algumas leis históricas e
estabelecer os imperativos morais” (Politik, 1897, I, p. 2-3).
Como, já na obra de Treitschke, a política, como teoria do
Estado, muitas vezes foi teoria do Estado como força, pois
este é de fato o significado de qualquer divinização do Esta-
do. A política como arte e ciência de governo é conceito que
Platão expôs e defendeu em Político, com nome de “ciência
régida” (Político, 259a-b), que Aristóteles assumiu qual ter-
ceira tarefa da ciência política. “Um terceiro ramo da inves-
tigação é o que considera de que maneira surgiu um governo
e de que maneira, depois de ter surgido, pôde ser conservado
durante o maior tempo possível” (Política, IV, 1, 1288b27).
Foi esse o conceito de política cujo realismo cru Maquiavel
Política. Do grego politikh/; do latim politica. 1. Com es- acentuou com as palavras famosas “E muitos imaginaram
se nome, foram designadas várias coisas, mais precisamen- repúblicas e principados que nunca foram vistos nem conhe-
te: 1ª. a doutrina do direito e da moral; 2ª. a teoria do Estado; cidos como existentes. Porque é tanta a diferença entre co-
3ª. a arte ou a ciência do governo; 4ª. o estudo dos comporta- mo se vive e como se deveria viver, que quem deixa o que
mentos intersubjetivos. O primeiro conceito foi exposto em faz pelo que deveria fazer aprende mais a arruinar-se do que
Ética, de Aristóteles. Investigação em torno do que deve ser a preservar-se, pois o homem que em tudo queira professar-
o bem e o bem supremo, segundo Aristóteles, parece perten- -se bom é forçoso que se arruíne em meio a tantos que não
cer à ciência mais importante e mais arquitetônica: “Essa ci- são bons. Donde ser necessário ao príncipe que, desejando
ência parece ser a política. Com efeito, ela determina quais conservar-se, aprenda a poder não ser bom e deixar de sê-lo
são as ciências necessárias nas cidades, quais o que cidadão ou não, segundo a necessidade” (O príncipe, XV).
deve aprender e até que ponto” (Ética a Nicômaco I, 2, 1094
a26). Esse conceito da política teve vida longa na tradição (ABBAGNANO Nicola. Dicionário de filosofia. Tradução
filosófica. Hobbes, por exemplo, dizia: “A política e a ética, de Ivone Castilho Benedetti; Alfredo Bosi. São Paulo: Mar-
ou seja, a ciência do justo e do injusto, do equânime e iníquo tins Fontes, 2014, p. 900-901).
podem ser demonstradas a priori, visto que nós mesmos fi-
zemos os princípios pelos quais se pode julgar o que é justo
e equânime, ou seus contrários, quer dizer, as causas da jus-
tiça, que são as leis ou as convenções” (De homine, X, § 5).
Nesse sentido, Althusius dava a seu tratado sobre o direito
natural o título de Politica methodice digesta (1603), e todas
as obras sobre o direito natural foram consideradas tratados
de política. O segundo significado do termo foi exposto em
Política, de Aristóteles: “Está claro que existe uma ciência
a que cabe indagar qual deve ser a melhor constituição: qual
a mais apta a satisfazer nossos ideais sempre que não haja

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